Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
383/13.2TBFAF.G1
Relator: ANA TEIXEIRA
Descritores: CONCURSO REAL DE INFRACÇÕES
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/26/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONCEDIDO PARCIAL PROVIMENTO
Sumário: «I) O artº 11º, nº 1, al. a) do DL nº 366-A/97, não se encontra numa relação de concurso aparente de normas com o artº 32º, nº 2, al. b) do DL nº 173/08.
II) O concurso, in casu, é efectivo, pois constitui uma situação em que o agente comete efectivamente várias contraordenações e a sua responsabilidade contempla todas as infracções praticadas.
Decisão Texto Integral: O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES SECÇÃO CRIMINAL

I - RELATÓRIO

1. No processo de contra ordenação n.º383/13.2 TBFAF., do Tribunal Judicial da Comarca de Fafe, a arguida M. & M., limitada foi condenada nos seguintes termos [fls.1368 ]:
«(…) Decisão

Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida pela recorrente "F. - M. & M., Lda", e, em consequência:

- Declaro nulo o procedimento administrativo no que concerne à infração descrita no auto de notícia n." 383/2011;

- Revogo a decisão final da autoridade administrativa no que concerne à condenação da arguida pela infração descrita no referido auto de notícia n." 303/2011;

- Condeno a arguida na coima de €17.500,OO pela prática de uma contraordenação ambiental grave, prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 18° e 32º, n." 2, alínea b) do decreto-lei n.º 173/2008 e artigo 22º, n.º 3, alínea b) da Lei n.º 50/2006 na redação dada pela Lei n.º 89/2009;

- Condeno a arguida na coima de € 2.500,00 pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 5º, n.º 1 e 11º, alínea a) do decreto-lei n." 366-A/1997, de 20 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo decreto-lei n.º92/2006, de 25 de Maio;

- Operando o cúmulo jurídico, condeno a arguida na coima única de €18.500,00 (dezoito mil e quinhentos euros).

- Consigna-se que, em caso de recurso, não é aplicável aos processos de contraordenações ambientais a proibição da reformaria in pejus, artigo 74º da Lei 5012006.

*

(…)»

2. Inconformada, a arguida recorre, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões [fls.306 ]:
«(…)
CONCLUSOES
1. 1 a Vem o presente recurso interposto da sentença recorrida que condenou a recorrente na coima de 17.500 euros pela prática de uma contraordenação prevista nas disposições conjugadas dos art°s 18° e 32° n.º2 al. b) do DL 173/08 e pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelos art°s 5° n''I e 11° al. a) do DL 366-A/97 de 25 de Maio na coima de 2.500 €, sendo em cúmulo jurídico na coima única de 18.500 E.
2a É entendimento da recorrente que:
a) cometeu uma só contraordenação ambiental;
b) a coima deveria ser especialmente atenuada, nos termos do Regime Geral das Contraordenações (doravante RGCO);
quando assim não se entenda
c) deveria ser aplicado à recorrente o regime do art° 49°-A da Lei Quadro das Contraordenações Ambientais (doravante LQCOA).
3a A Licença Ambiental foi criada tendo por pano de fundo a Lei de Bases do Ambiente - Lei 11/87 - e a Diretiva Comunitária 96/61/CE, tendo como fito substituir toda a multiplicidade de licenças que existiam neste âmbito na legislação nacional e comunitária e com o fim de assegurar a proteção do ar, da água e do solo, e de prevenir ou reduzir a poluição sonora e a produção de resíduos, com o objetivo de alcançar um nível elevado de proteção do ambiente no seu todo - art° 18° n.º1 do DL 173/08.
4a Para o efeito, tal licença para além de fixar as condições gerais constantes das alíneas do n,º2 do art° 18° do DL 173/08, deve, ainda, prever condições suplementares por forma a garantir o cumprimento do objetivo de qualidade ambiental - art° 18° n.º3 do DL 173/08.
5a O art° 32° n.º2 al. b) do sobredito Decreto- Lei abrange todas as condições constantes da licença ambiental, pelo que toda e qualquer violação da licença ambiental constitui contraordenação, seja ela das alíneas do n.º2 do art° 18° - cuja enumeração é exemplificativa, como se vê do uso do vocábulo "designadamente" - seja das condições suplementares previstas no n.º3 do mesmo artigo.
6a O DL 366-A/97 de 20 de Dezembro pretendia "enfrentar o problema da gestão de resíduos gerados pelas sociedades industrializadas ", por forma a prosseguir uma "politica integrada de gestão de resíduos ", relativamente a embalagens, sendo, por isso, o seu âmbito de aplicação tangente com o do DL. 173/08, na medida em que ambos versavam sobre matéria ambiental.
T' Sucede que, como condição essencial ou condição suplementar - o que irreleva, tendo em conta que nos termos do disposto no art° 32° n.º2 al. b) qualquer violação das condições previstas no art° 18° da Lei 173/08, constitui contraordenação -, a Licença Ambiental concedida à recorrente tem como condição imposta pela licença, precisamente a gestão de resíduos das suas embalagens (cfr. fls. 7 e seguintes dos autos - designadamente fls. 10 verso dos autos).
8a Assim, quanto à sua aplicação ao tipo de "instalação" da recorrente, o art° 11 ° n.º 1 al. a) do DL 366-A/97 encontra-se numa relação de concurso aparente de normas com o art° 32° n.º2 al. b) do DL 173/08, tendo em conta que este último, seguindo os comandos da Lei de Bases do Ambiente e da Diretiva supra referida instituiu uma Licença Ambiental única que deve ser cumprida em toda a sua extensão e que abarca a gestão de resíduos, tal como a sua norma punitiva a abarca - art°s 18° n" l , 2 e 3 e 32° n,º2 al. b).
9a Ou seja, a recorrente foi punida pelo mesmo facto: por incumprir a Licença Ambiental em cujas condições consta o dever de adesão à gestão de embalagens e resíduos de embalagens, pelo art° 11° aI. a) do DL 366/97, quando, efetivamente, a sua punição deveria ser considerada unicamente pelos art°s 18° n.º1, 2 e 3 e 32° aI. b) do DL 173/08, porquanto as condições da Licença Ambiental já incluem o dever de gestão de embalagens e resíduos de embalagens.
10ª Tais normas encontram-se, como se disse, numa relação de concurso, neste caso aparente e numa relação de subsidiariedade (cfr. Germano Marques da Silva, Direito Penal Português, tomo I, 23 edição revista, pago 333 supra citado.
11ª Deve, assim, considerar-se que a contraordenação prevista no art° 32° n.º2 al. b) do DL 173/08, revogou tacitamente a norma do art° 11 ° al. a) do DL 366/97, quando como condição suplementar da Licença Ambiental se prevê a gestão de embalagens ou de resíduos de embalagens, ou quando assim não se entenda existe concurso de normas, que determina a aplicação apenas do art° 18°
e 32° n02 al. b) do DL 173/08.
12ª Aliás, deve do mesmo passo considerar-se que quando a licença ambiental estabeleça como condição a gestão de embalagens e de resíduos de embalagens, a condenação simultânea pela prática de uma contraordenação prevista nos art°s 18° e 32° n,º2 al. b) do DL 173/08 e pela contraordenação prevista nos art°s 11° n.º1 al. a) do DL 366-AJ97, constitui violação do princípio ne bis in idem, sendo inconstitucional.
13ª Assim, a recorrente deveria ser apenas condenada por uma contraordenação prevista nos art°s 18° e 32° n02 al. b) do DL 173/08.
14ª A testemunha Álvaro B. - inspetor da CCDRN -, cujo depoimento foi tido como sério e credível, afirmou em audiência de julgamento que a empresa deu resposta a todas as questões levantadas pela testemunha no relatório inicial com exceção do medidor de caudal na captação, ou seja, tal testemunha confirmou que todas as irregularidades estavam sanadas aquando da segunda inspeção, com exceção daquela que foi dada como não provada, ou seja, provou-se, em contrário, que aquando da segunda inspeção a recorrente já possuía medidor de caudal.
15a Ora, como bem se constata da sentença recorrida não existiu qualquer dano concreto no meio ambiente, pelo que a gravidade da contraordenação não pode ser considerada elevada, sendo que, por outro lado, como da mesma sentença decorre a recorrente regularizou todas as falhas constatadas no auto de notícia e fê-lo no prazo para a apresentação da defesa, não tendo tido qualquer benefício
económico com a prática da contraordenação, inexistindo quaisquer fatores agravativos da coima previstos no art° 20° n03 da Lei 50/06 ou antecedentes contraordenacionais.
16a A imediata reparação dos ilícitos cometidos, no prazo da defesa, indicia que houve arrependimento sincero, por parte da recorrente.
17a Por outro lado, não basta para afastar a atenuação especial da pena que se considere que a culpa é elevada, porquanto há que ter em conta a ilicitude do facto - que é diminuída em face do cometimento da infração por negligência - e, principalmente, a necessidade da pena atento o facto de no prazo de defesa, a recorrente ter regularizado todas as situações que apontou o auto de notícia.- cfr. o acórdão do STJ de 20/6/96, Proc. 48500.
18a Acresce que, a recorrente manteve uma boa conduta posterior à infração dado que tomou uma posição ativa na eliminação das infrações, não cometendo qualquer outra infração - cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código Penal, 2a edição atualizada, pago 274.
19a Pelo exposto, tendo em conta, designadamente, os princípios que subjazem à determinação da medida da coima em geral e nos processos contraordenacionais ambientais, em particular, deve a coima ser especialmente atenuada, nos termos do art° 18° n.º3 do RGCO, 72° n.º2 als. c) e d) do Código Penal, reduzindo-se a coima em consonância à quantia de 8.000 €, tendo em conta ainda o supra exposto relativamente ao facto de a recorrente dever ser condenada apenas pela prática de uma contraordenação.
20a Mesmo que assim não fosse de entender, a recorrente estava em condições de beneficiar do disposto no art° 49°-A da LQCOA, não sendo verdade que a LQCOA não se aplique à contraordenação prevista no art° 11 ° al. a) do DL 366- AJ97, como se diz na decisão administrativa que é parcialmente coonestada pela sentença recorrida.
21 a Isto porque, nos termos do disposto no art° 2° n02 da Lei 50/06 dispõe-se que o regime fixado na presente lei é igualmente aplicável à tramitação dos processos relativos a contraordenações que, integrando componentes de natureza ambiental, não sejam expressamente classificadas nos termos previstos no art° 77°, exceto quando constem de regimes especiais, ou seja, relativos à reserva agrícola nacional e aos recursos florestais, fitogenéticos, agrícolas, cinegéticos, pesqueiros e aquícolas das águas interiores - art° 2° n.º3.
22a Não é, ao contrário do que se diz na sentença recorrida, "facto inequívoco que a arguida não assumiu a sua responsabilidade ".
23a Com efeito, a recorrente pode aceitar a sua responsabilidade pela prática da contra ordenação, não a aceitando acriticamente. Na verdade, a recorrente explicou na sua defesa e na impugnação apresentada o porquê de ter cometido a infração, o que teria de relevar em sede de culpa e medida da coima.
24a Da leitura do art° 49°-A da Lei 50/06 não se retira que a decisão sobre a aplicação dessa norma deva ser feita "antes da apreciação do mérito dos factos"
ou que implique a assunção de responsabilidade por parte da recorrente, embora, como é evidente, a recorrente ao solicitar como pedido subsidiário a aplicação do art° 49°-A esteja a reconhecê-los.
25a Repare-se que a apresentação do requerimento solicitando a aplicação do art° 49°-A n.º 1 não suspende o prazo para apresentação da defesa (art" 49°-A n.º6 da Lei 50/06). Ou seja, a decisão do requerimento ao abrigo dessa norma pode ser feito na defesa, porquanto é no prazo desta que o mesmo deve ser apresentado.
26a As alterações à Lei em matéria do montante e da fixação da coima introduzidas pela Lei 89/09 decorrem de um erro confessado do Governo, cometido aquando da elaboração da LQCOA, porquanto como o afirmou o Secretário de Estado do Ambiente na sessão plenária de aprovação da proposta de lei "não estivemos bem na proposta que apresentámos nessa altura. Mostra a prática de três anos de aplicação da lei que há vários limites de coimas claramente desajustados da realidade socioeconómica portuguesa. Isto é notório em particular nos limites mínimos das contraordenações ambientais que carecem de uma revisão em baixa. É a única forma de poder graduar a pena adequadamente. - consultável no site da Assembleia da República.
27a Tal erro terá sido corrigido, através da Lei 89/09, para além do mais, com a introdução do art° 49°-A, sendo que como se diz na exposição de motivos da proposta de lei n.º 273/X que deu origem à Lei 89/09 dizia-se o arrependimento decorre, não se dizer que se está arrependido, mas sim de se diligenciar no sentido de remover as causas da infração por sua iniciativa, demonstrando com esta conduta claro arrependimento. " Ou seja, é através de atos materiais que afastem as causas da infração que se aquilata da existência de "arrependimento" .
28a Acresce que, a recorrente cumpria todos os requisitos do disposto no art° 49°-A, no entanto, tais requisitos não foram verificados pela decisão recorrida.
29a De facto, como se considerou no despacho de fls. 1098 a arguida não é reincidente, nem foi condenada, aliás, nestes autos como tal cessou a sua conduta ilícita e demonstrou tê-lo feito no prazo de 15 dias úteis após a notificação para a defesa, como demanda o art° 49°-A n,º 1 da LQCOA.
30a A recorrente foi acusada e notificada em princípios de Fevereiro de 2011, no âmbito do Proc. n° 163/11 - único aqui em causa - por não cumprir os termos da licença ambiental, porquanto:
a) Não tinha medidor de caudal com totalizador;
Quanto a esta parte a recorrente demonstrou já o possuir, o que fez alegando tal factualidade na defesa e demonstrando-o documentalmente através de requerimento expedido para o processo de contraordenação em 26/1/12 constante de fls. 456 e seguintes dos autos, no qual juntou fotografias do medidor de caudal.
b) Não demonstrou ter realizado 4 monitorizações das águas residuais tratadas pela ETARI;
Quanto à monitorização das águas residuais a recorrente demonstrou tê-la feito no ano seguinte - 2010 - como se atesta pelo documento n.º 2 junto com a defesa a fls. 107 dos autos.
c) Diversos resíduos, nomeadamente embalagens contaminadas, plásticos, papel e cartão e lamas de ETAR, estão a ser armazenadas no exterior das instalações em espaço não coberto e não impermeabilizado, enquanto aguardam encaminhamento,
A recorrente alegou no seu art° 35° da defesa que já possuía armazém para colocar os resíduos cumprindo a Licença Ambiental (cfr. a defesa de fls. 91 dos autos) e demonstrou-o documentalmente como se pode ver de fls. 467.
d) O valor na fonte FF3 e na Fonte FF4, excede o VLE fixado para o parâmetro COV;
e) Não procedeu ao autocontrolo da emissão de gases das fontes fixas de emissões gasosas existentes no seu estabelecimento industrial;
A recorrente demonstrou documentalmente estar a fazer o autocontrolo da emissão de gases e a cumprir os VLE máximos constantes da Licença Ambiental, como se constata da defesa e dos documentos de fls. 108 e seguintes.
f) Não demonstrou ter submetido a gestão das suas embalagens e resíduos de embalagens ao sistema integrado ou de consignação.
A recorrente demonstrou na defesa que já tinha o certificado ponto verde para o ano de 2010, como se pode ver de fls. 116 - doc. N.º4 junto com a defesa.
31 a Quer isto dizer que a recorrente estava em condições de beneficiar da aplicação do disposto no art° 49°-A da LQCOA, sendo que tal verificação não foi feita quer na decisão administrativa, quer na sentença recorrida.
32a Assim, porque tal verificação incumbe à autoridade administrativa, os autos devem baixar à autoridade administrativa para proferir decisão quanto a tal matéria.
33a A sentença recorrida violou ou fez errada aplicação das normas supra referidas e, como tal, não pode manter-se.
Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, revogar-se a sentença recorrida que deve ser
substituída por acórdão no qual:
a) se considere que a recorrente cometeu uma só contraordenação;
b) seja atenuada especialmente a coima aplicada, nos termos do disposto nos art°s 72° n.º2 als. c) e d) do Código Penal e 18° n.º3 do RGCO;
ou quando assim não se entenda
c) seja determinada a aplicação do disposto no art° 49°-A n''I da LQCOA, sendo para o efeito remetidos os autos à autoridade administrativa para aquilatar do preenchimento dos seus requisitos,
Pois, assim se decidindo, se fará
JUSTIÇA!

(…)»

3. Na resposta, o Ministério Público refuta todos os argumentos do recurso, pugnando pela manutenção do decidido [fls.1430 ].
4. Procedeu-se a realização da audiência com obediência ao formalismo legal
5. A sentença/acórdão recorrida deu como provados e não provados os seguintes factos, seguidos da respectiva motivação [fls. ]:
«(…) Factos Provados:

Dos Factos:

Produzida a prova e discutida a causa, resultou provada a seguinte factualidade (com relevância para a causa):

1.

A sociedade F.- M. & M., SA, com sede na Zona Industrial, Fafe, foi objeto de ação de inspeção, a 10 de Novembro de 20 I O, pelas nove horas, desenvolvida pela Inspeção-geral para verificação do cumprimento da diversa legislação ambiental
2.

o estabelecimento industrial da F. - M. & M., SA encontrava- se em laboração à data da ação de inspeção.

3.

A F. - M. & M., SA é titular da Licença Ambiental n." 9/2005 (LA), de 4 de Abril de 2005.
4.

A empresa está autorizada a utilizar o domínio hídrico para efeitos de captação de águas subterrâneas através de um furo (captação AC2).

5.

Esta autorização estabelece um volume máximo de extração de 3225 m3/mês (ponto 3.1.3.2 da LA).
6

À data da primeira ação de inspeção, a empresa não tinha instalado medidor de caudal com totalizador destinado a controlar o volume de águas.

7.

Ao não se colocar o medidor de caudal com totalizador, não se permite a verificação do cumprimento do volume máximo de água captado por mês.

8.

Ao não se colocar o medidor de caudal com totalizador deixa de ser possível a inclusão no Relatório Ambiental Anual (RAA) do volume extraído no furo (em m3/mês), bem com as leituras dos valores indicados nos respetivos caudalímetros e os valores exatos do consumo específico mensal de água na atividade PCIP, expresso em quantidade de água consumida nas etapas de lavagem/m2 de superfície tratada.
9.

A F. - M. & M., S.A não demonstrou ter realizado as 4 monitorizações das águas residuais tratadas pela ET AR! da instalação, no ano de 2009.
10.

A arguida não enviou para a autoridade administrativa, não obstante ter sido solicitado, os relatórios de auto controlo relativos ao ano de 2009.

11.

No Relatório Anual Ambiental relativo a 2009, no ponto 5.3, p. 9, a empresa ao indicar a qualidade das águas residuais, não indica as datas em que foi realizada a amostragem.

12.

Na data da primeira inspeção à arguida, existiam no local diversos resíduos, nomeadamente embalagens contaminadas, plásticos, papel e cartão e lamas de ET AR, que estavam a ser armazenados no exterior das instalações em espaço não coberto e não impermeabilizado, enquanto aguardavam encaminhamento para destino final.
13.

o autocontrolo das emissões atmosféricas da 2.a campanha de caracterização, no ano de 2010, foi realizado em 15 de Setembro para a fonte FF3 e em 16 de Setembro para a fonte FF4.

14

Na fonte FF3 e na Fonte FF4, o valor medido corrigido para um teor de 8% de 02 e gás seco nos efluentes gasosos para o parâmetro Compostos Orgânicos Voláteis (COV), 114 mgINm3 para a fonte FF3 (folha 49 em anexo ao auto de notícia) e 386 mgINm3 para a Fonte FF4 (folha 50 em anexo ao auto de notícia), excede o VLE fixado para o parâmetro COV no Quadro 11.1 do ponto 1 do anexo II da LA n." 912005 (50 mglNm3).
15.

A arguida não procedeu ao auto controlo da emissão de gases das fontes fixas de emissões gasosas existentes no seu estabelecimento industrial (fontes FFl a FF7) e reguladas pela LA, nos anos de 2008 e 2009.
16.

A F. - M. & M., S.A. coloca no mercado nacional os seus produtos embalados (perfis ou peças de alumínio envolvidos em filme de plástico e cartão para separar as peças).
17.
À data da primeira inspeção a arguida não tinha submetido a gestão das suas embalagens e resíduos de embalagens a um sistema integrado ou de consignação de rótulos para identificação dos resíduos de acordo com os códigos LER.

18.

No dia 03 de Outubro de 2011, pelas dez horas, foi desenvolvida uma nova ação inspetiva por parte da autoridade administrativa, para verificação do cumprimento da diversa legislação ambiental.

19.
o estabelecimento industrial da F. - M. & M., SA encontrava- se em laboração à data da ação de inspeção.

20.

Na data referida em 18, encontrava-se colocado nas instalações da arguida o medidor de caudal com totalizador.

21.

No âmbito do exercício da sua atividade a arguida tinha obrigação de conhecer e cumprir o enquadramento legal em que a mesma poderia ser validam ente exercida.
22.
A arguida não agiu com a diligência necessária para cumprir as obrigações legais inerentes ao exercício da atividade por si prosseguida e, de que era capaz no que concerne às infrações que lhe são imputadas.

23.

No ano de 2010 a arguida apresentou um lucro tributável de 478.143,91.

24.

No ano de 2011 a arguida apresentou um lucro tributável de € 213.861,65.

*

Factos provados da impugnação judicial:

25.

A arguida era uma sociedade por quotas, sendo seus iniciais titulares Zulmira T., Preciosa B., Maria da Conceição M., Maria de Lurdes M., José M., Maria M., João M. Mendes e Carlos M., em comum e na proporção de 1/8 para cada um dos titulares.

26.

A gerência da empresa pertencia a José C. e Zulmira T..

27.

Desde 20 de Abril de 2010, a empresa mudou de administração.

28.

A arguida contratou uma empresa de consultoria - a Real Factor - Consultoria, Engenharia e Representações, Lda. - que gere todas as questões ligadas ao cumprimento das normas ambientais.

29.

Atualmente a arguida ao utilizar o domínio hídrico para efeitos de captação de águas subterrâneas através de um furo já utiliza o medidor de caudal com totalizador por forma a conhecer com rigor os volumes totais de água extraídos do furo.

30.

Atualmente a arguida dispõe novamente de local de armazenamento devidamente coberto e impermeabilizado, o que fez imediatamente após a inspeção.

3l.

Logo após a inspeção - em 30/12/10 - a arguida aderiu ao Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagens (SIGRE), estabelecido com a sociedade Ponto Verde.
32.

A arguida, no início de 2008, efetuou um pedido de alteração para monitorização pontual trienal relativamente às emissões em causa,

33.

Pedido esse que já havia sido feito em 2007 e que apenas foi respondido no final do ano de 2009, informando que a competência relativamente a tal matéria era da Associação Portuguesa do Ambiente.

*

Factos não provados (com relevância para a causa):
- A arguida não incluiu no Relatório Ambiental Anual (RAA) de 2010 o volume extraído no furo (em m3/mês), bem com as leituras dos valores indicados nos respetivos caudalímetros e os valores exatos do consumo específico mensal de água na atividade PCIP, expresso em quantidade de água consumida nas etapas de lavagem/m2 de superfície tratada.


Factos não provados da impugnação judicial:
- A nova administração da empresa tendo constatado que alguns dos requisitos da licença ambiental não estavam a ser cumpridos, de imediato tomou medidas no sentido de regularizar todas as situações que foram assinaladas, e de continuar com o cumprimento estrito das regras ambientais que a arguida sempre se pautou,
- A arguida, aquando da inspeção a que foi submetida já tinha por deliberação da nova administração decidido adquirir e instalar o medidor de caudal com totalizador.


- Ocorre que, tendo em conta uma anormal pluviosidade no mês de Outubro, uma parte das instalações da arguida ficaram danificadas.
- Tendo a Administração canalizado todas as verbas que tinha disponíveis para acorrer a essa urgência.
- A impugnante prontamente uniu esforços para repor a parte das instalações afetadas em funcionamento, bem como aproveitar tal oportunidade para instalar o medidor de caudal com totalizador, o que veio a suceder.
- Ora, até à altura em que a impugnante pôs em funcionamento o caudalímetro, esta não deixou de monitorizar o volume de água extraído do furo licenciado.
- Com efeito, essa monitorização - conforme se refere no Relatório de Inspeção era feito por estimativa.
- Sendo certo que, o volume de água nunca poderia exceder aquele constante da licença ambiental, porquanto tal licença, como se disse, tinha em conta uma produção ideal por parte da fábrica e não aquela que se verifica que é bastante abaixo da produção constante da licença.
- Quer isto dizer que a monitorização da água extraída do furo sempre foi feita, sendo que a impugnante logo que foi chamada à atenção para colocar o caudalímetro, o fez,
- Não se demonstrando, em nenhum momento, que a impugnante tenha ultrapassado os volumes de água extraída do furo constantes da licença ambiental.
Assim, o volume de água extraído do furo constava do Relatório Anual Ambiental,
Embora tal volume fosse apurado através de estimativa, como se afirma na pág. 7 do Relatório de Inspeção 1084/11.

- Sendo certo que, essa estimativa se encontrava muitíssimo abaixo dos valores máximos indicados na licença ambiental.
- Na verdade, a arguida possui documentos de uma das monitorizações feitas no ano de 2009.

- E realizou as monitorizações na ETARI referentes ao ano de 2010, ou seja, a partir do momento em que assumiu funções.
- A arguida sempre acautelou o armazenamento dos seus resíduos,
- Devido ao circunstancialismo supra descrito, a uma anormal pluviosidade no mês de Outubro, a arguida ficou temporariamente sem o local adstrito ao armazenamento dos seus resíduos por ter sido destruído pela intempérie. - Não obstante a destruição dessas instalações, a arguida sempre acautelou que os resíduos estivessem devidamente acondicionados por forma a não contaminar os solos, pelo que se tratou de uma situação anómala e temporária.
- A arguida sempre havia procedido ao autocontrolo das emissões atmosféricas.
- Os caudais em causa das 6 fontes verificados ao longo das diversas caracterizações e de acordo com o referido no relatório de 14/12/07 eram ínfimos.

- A arguida não estava obrigada a realizar a monitorização anualmente.
- No entanto, os valores das monitorizações de 2010 referentes às fontes FF3 e FF4 eram discrepantes relativamente ao permitido pela licença, tendo em conta que existia uma descalibração dos queimadores das fontes em causa.
- Ora, é precisamente tendo em conta uma descalibração que é ordenada por lei a monitorização, sendo que a arguida só poderia ser punida se não reparasse imediatamente os aludidos queimadores,
- O que fez logo em seguida à referida monitorização.
- A arguida é primária, nunca tendo sido acusada de qualquer outra contraordenação ambiental.

- Toda a atividade da arguida é pautada pelo rigoroso cumprimento das normas legais, designadamente das ambientais,
- Tendo-se dotado de todas as infraestruturas necessárias ao cumprimento estrito das normas de proteção do ambiente,
- A tudo isto acresce que a arguida sempre se mostrou colaborante com as investigações realizadas e empenhada em repor a legalidade.

*

Consigna-se que o tribunal não respondeu à matéria da impugnação judicial que constitui alegações de direito, juízos conclusivos ou meras repetições do que já consta da decisão final da autoridade administrativa.


(…)»

II – FUNDAMENTAÇÃO

6. Como sabemos, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente (art. 412º, nº 1, in fine, do C.P.P., Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 2ª Ed., III, 335 e jurisprudência uniforme do S.T.J. - cfr. acórdão do S.T.J. de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, pág. 196 e jurisprudência ali citada e Simas Santos / Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 5ª Ed., pág. 74 e decisões ali referenciadas), sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios enumerados no art. 410º, nº 2, do mesmo Código.
7. Face às conclusões apresentadas, que delimitam o objecto do recurso, importa decidir as seguintes questões:
· Condenação em apenas uma contraordenação
· Quando assim não se entenda que atenue especialmente a coima nos termos do regime geral das contraordenações
· Que seja aplicado á recorrente o regime do artigo 49º-A da lei quadro das contraordenações ambientais;

· Condenação em apenas uma contraordenação
A recorrente entende que deve considerar-se que a contraordenação prevista no art° 32° n.º2 al. b) do DL 173/08, revogou tacitamente a norma do art° 11 ° al. a) do DL 366/97, quando como condição suplementar da Licença Ambiental se prevê a gestão de embalagens ou de resíduos de embalagens, ou quando assim não se entenda existe concurso de normas, que determina a aplicação apenas do art° 18° e 32° n.º2 al. b) do DL 173/08.
Daí que considere que foi punida pelo mesmo facto: por incumprir a Licença Ambiental em cujas condições consta o dever de adesão à gestão de embalagens e resíduos de embalagens, pelo art° 11° aI. a) do DL 366/97, quando, efetivamente, a sua punição deveria ser considerada unicamente pelos art°s 18° n.º1, 2 e 3 e 32° aI. b) do DL 173/08, porquanto as condições da Licença Ambiental já incluem o dever de gestão de embalagens e resíduos de embalagens.
Acrescenta ainda que no seu entender quando a licença ambiental estabeleça como condição a gestão de embalagens e de resíduos de embalagens, a condenação simultânea pela prática de uma contraordenação prevista nos art°s 18° e 32° n,º2 al. b) do DL 173/08 e pela contraordenação prevista nos art°s 11° n.º1 al. a) do DL 366-AJ97, constitui violação do princípio ne bis in idem, sendo inconstitucional.
Analisemos a questão
Estão em causa as seguintes normas:

Artigo 18° do DL 173/2008:
1- A licença ambiental tem em consideração os documentos de referência sobre as MTDs para os sectores de atividade abrangidos pelo presente decreto-lei e inclui todas as medidas necessárias ao cumprimento das condições referidas nos artigos 5 e 7º, a fim de assegurar a proteção do ar, da água e do solo, e de prevenir ou reduzir a poluição sonora e a produção de resíduos, com o objetivo de alcançar um nível elevado de proteção do ambiente no seu todo.

2 - A licença ambiental fixa, ainda, designadamente:
a) Os valores limite de emissão para as substâncias poluentes, especialmente as constantes do anexo ii, suscetíveis de serem emitidas pela instalação em causa em volume significativo, tendo em conta a sua natureza e potencial de transferência de poluição de um meio físico para outro, concretamente água, ar e solo, exceto nos casos referidos no n. º 7;
b) As indicações que, na medida do necessário, garantam a proteção do solo e das águas subterrâneas, o controlo do ruído e medidas sobre a gestão dos resíduos gerados pela instalação;
c) Medidas de monitorização das emissões da instalação, incluindo a descrição da metodologia e frequência das medições e o processo de avaliação das medições, de modo a assegurar a verificação do cumprimento das condições da licença;
d) A obrigação de comunicação periódica à AP A dos dados resultantes da monitorização das emissões da instalação;
e) Medidas relativas às condições não habituais de exploração que possam afetar o ambiente, designadamente o arranque, as fugas, as avarias, as paragens momentâneas e a desativação definitiva da instalação;
j) A obrigação de informação à AP A, à EC e à IGA O'I, no prazo máximo de vinte e quatro horas, de qualquer incidente ou acidente que afete significativamente o ambiente, sem prejuízo do disposto no Decreto-Lei n.º 254/2007, de 12 de Julho;
g) O prazo de validade da licença ambiental, que não pode exceder 10 anos.
3 - A licença deve, ainda, prever condições suplementares por forma a garantir o cumprimento do objetivo de qualidade ambiental, se para esse efeito forem exigíveis condições mais restritivas do que as que podem ser obtidas com a utilização das melhores técnicas disponíveis.
4 - A AP A pode, sempre que necessário, complementar ou substituir, na licença ambiental, os valores limite de emissão previstos na alínea a) do n.º 2 por parâmetros ou medidas técnicas equivalentes.
5 - Sem prejuízo do disposto no n.º 3, os valores limite de emissão referidos na alínea a) do n.º 2 e os parâmetros e as medidas técnicas equivalentes referidos no número anterior devem:

a) Basear-se nas MTDs, sem impor a utilização de uma técnica ou de uma tecnologia específicas;
b) Ter em consideração as características técnicas da instalação em causa, a sua implantação geográfica e as condições ambientais do local, nomeadamente a compatibilização das utilizações por parte dos diferentes utilizadores dos meios recetores.
6 - Em qualquer dos casos previstos no número anterior, as condições da licença ambiental devem prever disposições relativas minimização da poluição a longa distância ou transfronteiras e garantir um nível elevado de proteção do ambiente no seu todo.
7 - A licença de uma instalação abrangida pelo anexo i ao Decreto-Lei n. o 233/2004, de 14 de Dezembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 72/2006, de 24 de Março, não deve incluir um valor limite de emissão aplicável às emissões diretas de um gás com efeito de estufa, previsto no mesmo anexo, a menos que seja necessário assegurar que não é causada qualquer poluição local significativa.
Artigo 32°, 0.° 2, alínea b) do mesmo diploma legal:
Constitui contraordenação ambiental grave, nos termos Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, a prática, pelo operador, dos seguintes atos:
b) Não cumprimento das condições impostas pela licença, fixadas nos termos do artigo 18.º.
Artigo 5°, n.º 1 do DL 366-A/1997 com as alterações introduzidas pelo DL n.º 92/2006:
Para efeitos do cumprimento das obrigações estabelecidas no artigo anterior, os operadores económicos podem optar por submeter a gestão das suas embalagens e resíduos de embalagens a um dos dois sistemas, de consignação ou integrado, cujas normas de funcionamento e regulamentação são as constantes do presente diploma e da portaria mencionada no artigo 9. º
Artigo 11º, n.º 1, alínea a) do mesmo diploma legal:
Constitui contraordenação, punível com coima de € 50,00 a € 3740,00, no caso de pessoas singulares, e de € 500,00 a € 44.890,00, no caso de pessoa coletiva:
a) A colocação no mercado, pelo embalador ou importador, de produtos embalados sem que a gestão das respetivas embalagens ou resíduos de embalagens tenha sido assegurada nos termos do n.º 1 do artigo 5.º e das portarias previstas no artigo 9.º.

Face ao quadro normativo indicado impõe-se analisar se no caso em apreço estamos perante situação de concurso aparente como pretende a recorrente

Na determinação da responsabilidade criminal dos agentes que praticam factos penalmente relevantes podem suceder situações de anulação ou concurso de infrações, sempre que o agente com a sua conduta cometa uma pluralidade de infrações. As quais podem traduzir o preenchimento de vários tipos de crimes, ou do mesmo tipo mais do que uma vez.
A teoria do concurso permite distinguir os casos nos quais as normas em concurso requerem uma aplicação conjunta, das situações em que o conteúdo da conduta é absorvido por uma única das normas.
- Concurso efetivo ou concurso de crimes: constitui a situação em que o agente comete efetivamente vários crimes e a sua responsabilidade contempla todas essas infrações praticadas;
- Concurso aparente ou concurso de normas: uma vez que a conduta do agente só formalmente preenche vários tipos de crimes, na concretização da sua responsabilidade a aplicação de um dos crimes afasta a aplicação de outro ou outras de que o agente tenha também preenchido os elementos típicos.
Em rigor não se pode falar em verdadeiro concurso de crimes, mas tão só em concurso de normas (concurso legal), o qual se traduz num problema de determinação da norma aplicável [O concurso estabelecido entre as normas revela-se meramente aparente, sendo de excluir a aplicação cumulativa, pois não se aplicam todos os preceitos].
A relação de concurso aparente consagra-se por conexões de subordinação e hierarquia, podendo identificar-se essencialmente três tipos de relações:
1) Relação de especialidade
Uma norma encontra-se numa relação de especialidade em relação a outra quando acrescenta mais um tipo incriminador, não a contradizendo contudo. Neste sentido, vê-se que por força de uma relação de especialidade em que as normas se podem encontrar, tanto pode subsistir a norma que contenha a moldura penal mais elevada, como a norma que contenha a moldura penal mais baixa.
2) Relação de subsidiariedade
Nos casos em que a norma vê a sua aplicabilidade condicionada pela não aplicabilidade de outra norma, só se aplicando a norma subsidiária quando a outra não se aplique. A norma prevalecente condiciona de certo modo o funcionamento daquela que lhe é subsidiária. Distinguem-se dois tipos:
a) Subsidiariedade expressa: é a própria lei que afirma expressamente que uma norma só se aplica se aquela outra não se puder aplicar;
b) Subsidiariedade implícita ou material: resulta quando em face de um raciocínio imperativo, se chega à mesma conclusão, ou seja, quando por força de uma interpretação verificar-se que a relação que existe entre as normas não pode deixar de ser uma relação de subsidiariedade.
Existem tendencialmente ou em princípio quatro grandes situações em que as normas se encontram numa relação de subsidiariedade implícita ou material:
1º Diz-se que as incriminações de perigo ou os crimes de perigo se encontram numa relação de subsidiariedade implícita ou material em relação aos crimes de lesão.
2ºCasos em que subsiste uma imputação a título negligente e doloso, sendo certo que a responsabilidade por facto negligente é subsidiária à imputação por facto doloso;
3º Diferentes formas de participação ou autoria;
4º Entre as condutas de omissão e por ação.
3) Relação de consunção
Quando um certo tipo legal de crime faça parte não por uma definição do código, mas por uma forma característica, a realização de outro tipo de crime, ou seja, quando tem uma discrição típica suficientemente ampla que abranja os elementos da discrição típica da outra norma.
A finalidade das normas concentra-se sempre na tutela de bens jurídicos, sendo possível identificar em cada tipo legal a ratio da conduta descrita.
A relação de consunção acaba por colocar em conexão os valores protegidos pelas normas criminais. Não deve confundir-se com a relação de especialidade, pois ao contrário do que se verifica naquela relação de concurso de normas, a norma prevalecente não tem necessariamente de conter na sua previsão todos os elementos típicos da norma que derroga.
A doutrina acima exposta, embora direcionada para o crime importa ter presente que a mesma é também transponível para o direito das contraordenações.
No caso em apreço foram imputadas á arguida duas infrações. A primeira relacionada com a violação da licença ambiental relativa à ausência de caudalímetro e a que se refere à violação dos limites apostos na licença ambiental para as emissões atmosféricas. E a segunda que diz respeito à inexistência de um sistema integrado de resíduos.
Da factualidade apurada resulta que "o operador fica obrigado à instalação de medidores de caudal com totalizador que permitam conhecer com rigor os volumes totais de água extraídos das referidas captações".( ponto 3.1.3.2, da licença ambiental) E conforme se afere da factualidade apurada não existia caudalímetro. Para além disso ficou demonstrado que a arguida excedeu os valores limite de emissão mencionados no anexo II, ponto 1, quadros 11.1, II.2 e 11.3 da licença ambiental.
No que respeita aos resíduos resulta da factualidade apurada que “- Na data da primeira inspão à arguida, existiam no local diversos resíduos, nomeadamente embalagens contaminadas, plásticos, papel e cartão e lamas de ETAR, que estavam a ser armazenados no exterior das instalações em espaço não coberto e não impermeabilizado, enquanto aguardavam encaminhamento para destino final.
- À data da primeira inspeção a arguida não tinha submetido a gestão das suas embalagens e resíduos de embalagens a um sistema integrado ou de consignação de rótulos para identificação dos resíduos de acordo com os códigos LER. “
Resulta do exposto que o artigo 11º e o artigo 18º focam realidades distintas e não podem, tal como pretende a recorrente considerar-se que o art° 11 ° n.º 1 al. a) do DL 366-A/97 se encontra numa relação de concurso aparente de normas com o art° 32° n.º2 al. b) do DL 173/08, tendo em conta que este último, seguindo os comandos da Lei de Bases do Ambiente e da Diretiva supra referida instituiu uma Licença Ambiental única que deve ser cumprida em toda a sua extensão e que abarca a gestão de resíduos, tal como a sua norma punitiva a abarca - art°s 18° n.º l , 2 e 3 e 32° n,º2 al. b) pois que o concurso aparente ou concurso de normas só teria aqui lugar se a conduta da arguida recorrente só formalmente preenchesse vários tipos de contraordenações e na concretização da sua responsabilidade a aplicação de uma das contraordenações afastasse a aplicação de outra ou outras de que o agente tenha também preenchido os elementos típicos.
O concurso neste caso é efetivo: constitui a situação em que o agente comete efetivamente várias contraordenações e a sua responsabilidade contempla todas essas infrações praticadas;
Improcede, pois, nesta parte, a pretensão da recorrente.
Quando assim não se entenda que atenue especialmente a coima nos termos do regime geral das contraordenações
No caso em análise, de acordo com o preceituado no artigo 22º,n.º3 alínea b) da lei 50/2006 estamos perante uma moldura abstrata que vai de 15.000,00 euros a 30.000,00 euros.
O tribunal respeitando o estabelecido pelo artigo n.º 1 da L.Q.C.A. que diz "A determinação da coima e das sanções acessórias faz-se em função da gravidade da contraordenação, da culpa do agente, da sua situação económica e dos benefícios obtidos com a prática do facto". Estatui ainda o n° 2 daquela mesma disposição legal que "Na determinação da sanção aplicável são ainda tomadas em conta a conduta anterior e posterior do agente e as exigências de prevenção", procedeu á determinação da coima tendo em conta que a conduta foi imputada a título de negligência, que não se provou qualquer benefício económico com a prática do ato e levou em linha de conta a circunstância de a arguida posteriormente á prática do facto ter regularizado as falhas apontadas. Finalmente levou em linha de conta a situação económica da arguida que considerou favorável e entendeu a gravidade elevada por causa de duas violações da licença ambiental
O artigo 18.º, n.º3. do RGCOC preceitua que “quando houver lugar à atenuação especial da punição por contraordenação, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos a metade”.
Consideramos ser aplicável em processo contraordenacional o artigo 72.º, do Código Penal – ver, neste sentido, Acórdão do TRE, de 17/9/2009, Processo n.º 693/08.0TBPTG.E1, relatado pelo Exmo. Desembargador António Latas, e Acórdão do TRC, de 5/12/2012, Processo n.º 598/12.0TBTMR.C1, relatado pelo Exmo. Desembargador Alberto Mira.
Conforme ensina a doutrina, o legislador sabe estatuir, à partida, as molduras penais atinentes a cada tipo de factos que existem na parte especial do Código Penal e em legislação extravagante, valorando para o efeito a gravidade máxima e mínima que o ilícito de cada um daqueles tipos pode assumir.
Porém, entende, ainda, a doutrina, que o sistema só pode funcionar de forma justa e eficaz se contiver válvulas de segurança, vendo estas como circunstâncias modificativas.
Por isso, quando, em hipóteses especiais, existam circunstâncias que diminuam por forma acentuada as exigências de punição do facto, deixando aparecer a sua imagem global especialmente atenuada, relativamente ao complexo padrão de casos que o legislador teve em mente à partida, aí haverá um caso especial de determinação da pena, conducente à substituição da moldura penal prevista para o facto por outra menos severa.
Resumindo a tendência dominante na nossa jurisprudência, que segue a par a mencionada doutrina, podemos afirmar que a atenuação especial da pena só em casos extraordinários ou excecionais pode ter lugar, uma vez que, para a generalidade dos casos normais, existem as molduras penais normais, com os seus limites máximos e mínimos próprios.
Há que ver, então, se se justifica, no caso concreto, a atenuação especial da coima.
Conforme resulta dos factos dados como provados, a conduta, negligente, da arguido traduziu-se na falta de instalação de medidor de caudal com totalizador destinado a controlar o volume de águas que impede a verificação do cumprimento do volume máximo de água captado por mês e existiam no local diversos resíduos, nomeadamente embalagens contaminadas, plásticos, papel e cartão e lamas de ET AR, que estavam a ser armazenados no exterior das instalações em espaço não coberto e não impermeabilizado, enquanto aguardavam encaminhamento para destino final, situações quer foram logo de seguida regularizadas.
Ainda que estejamos na presente de uma infração qualificada como grave, como já vimos, temos de convir que aquilo que esteve na origem da omissão da recorrente e a sua conduta no sentido de repor a legalidade da situação, o mais breve possível - algo pouco vulgar nos dias de hoje -, traduzem uma acentuada diminuição da ilicitude ínsita no comportamento da arguido e, como tal, impõem a redução da coima.
Em face do exposto, a moldura punitiva normal ora em causa é manifestamente desproporcionada, justificando-se, por isso, a atenuação especial da coima.
De entre a moldura de 7.500.00 a 15.000,00 euros que lhe passa a corresponder em relação ao estipulado no artigo 22º,3 e para a ausência de sistema integrado de resíduos onde se estabelece no artigo 11º do DL 92/2006 que a moldura vai de 500 euros a 44.890,00 euros reduzida a metade o limite máximo por força do disposto no n.º4 do artigo 17º, também esta passa a ser reduzida a metade.
Assim, no quadro a considerar entendemos adequado fixar para a primeira situação a medida da pena de 10.000,00 euros e para a segunda situação 500 euros.
De acordo com o artigo 27º da lei 50/2006, tendo a recorrente praticado várias contraordenações ambientais é punida com uma coima cujo limite máximo resulta da soma das coimas concretamente aplicadas às infrações em concurso e a coima não pode ser inferior à mais elevada das coimas concretamente aplicadas às várias contraordenações ambientais.
Sopesando a factualidade dada como provada e a conduta da arguida posteriormente aos factos, este tribunal considera adequado operando o cúmulo, fixar a coima única de 10.000,00 euros.

III – DISPOSITIVO

Pelo exposto, os juízes acordam em:

· Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo recorrente
· - Condenam a arguida F. M. & M., limitada na coima de €10.000,00 pela prática de uma contraordenação ambiental grave, prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 18° e 32°, n.º 2, alínea b) do decreto-lei n." 173/2008 e artigo 22°, n.º 3, alínea b) da Lei n.º 50/2006 na redação dada pela Lei n." 89/2009 e artigo 72º do Código Penal ;
· - Condenam a referida arguida na coima de € 500,00 pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 5°, n.º 1 e 11°, alínea a) do decreto- lei n.º 366-AI1997, de 20 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo decreto-lei n.º92/2006, de 25 de Maio e artigo 72º do Código Penal;
· - Operando o cúmulo jurídico, condenam a arguida na coima única de €10.000,00 (dez mil euros).
· Não é devida tributação