Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1334/10.1TBVVD.G1
Relator: ALCIDES RODRIGUES
Descritores: USUCAPIÃO
REGRAS LIMITATIVAS DO FRACCIONAMENTO DE PRÉDIOS RÚSTICOS
DETERMINAÇÃO DA LEI APLICÁVEL
MOMENTO RELEVANTE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/30/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - A data ou momento relevante para aferir se o reconhecimento do direito de propriedade, adquirido por usucapião, infringe ou não as invocadas regras legais limitativas do fraccionamento de prédios rústicos é a do início da posse.
II - Tendo a usucapião efeitos retroativos à data do início da posse (cfr. art. 1288º do CC do CC), será a lei vigente nessa data que indicará se pode haver fraccionamento do prédio e se o mesmo for fracionado em violação da lei quais as consequências que daí decorrem.
III - À luz da lei vigente em meados da década de 80 o fracionamento de prédios rústicos em área inferir à unidade de cultura não seria nulo, quando muito anulável, a arguir no prazo de 3 (três) anos, sob pena de caducidade da ação de anulação (primitiva redação dos n.ºs 1 e 3 do art. 1379º do CC).
IV - Estando em causa uma divisão material de prédios rústicos e não se verificando qualquer questão de natureza urbanística, a anulabilidade do ato de fracionamento de prédios rústicos, em violação do disposto no art. 1376º do CC, não impede a aquisição originária do direito de propriedade por via da usucapião.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

M. B. e M. L. intentaram a presente acção especial de divisão de coisa comum contra 1) M. A.; 2) M. C.; 3) R. C.; 4) C. O.; 5) R. O.; e 6) M. F..
Para tanto, e em síntese, alegaram serem donos e legítimos possuidores de ¼ dos prédios identificados no art.º 1.º da p.i. (o prédio A) descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º .../220201 e inscrito na matriz predial sob o artigo ...; e o prédio B) descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º .../220201 e inscrito na matriz predial sob o artigo ...); a Requerida M. A. é dona e possuidora de ½ dos mesmos prédios; e os 2.º a 6.º Requeridos são donos e legítimos possuidores de ¼ dos ditos prédios.
Os direitos de Requerentes e Requeridos foram adquiridos por via sucessória.
Os dois prédios são indivisíveis em substância.
Concluíram pedindo que se pusesse termo à divisão, adjudicando-se ou vendendo-se os prédios, por serem indivisíveis em substância.
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Citados, contestaram apenas as Requeridas M. F. e R. O., invocando que os ditos prédios se encontram já divididos por usucapião entre os interessados, na proporção das respectivas quotas.
Deduziram reconvenção pedindo a condenação dos autores e dos demais co-réus a reconhecer a existência de três prédios distintos, divididos e demarcados, desde meados da década de 80, abstendo-se de praticar quaisquer actos que perturbem ou impeçam a existência ou o exercício dos referidos direitos, com todas as legais consequências, nomeadamente declarando-se que as Rés M. F., R. O. e sua irmã C. O. são únicas donas e legítimas possuidoras do prédio correspondente à parcela de terreno devidamente demarcada e dividida com a área de cerca de 420 m2, sita no Lugar da ..., freguesia de ..., concelho de Vila Verde.
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Entretanto, pelo falecimento da A. M. B., foram habilitados como seus herdeiros R. B., B. B. e J. P..
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Posteriormente, foi suscitado o incidente de habilitação de adquirente, tendo sido habilitado J. P. como adquirente para prosseguir a causa em substituição dos demais herdeiros de M. B., dado ter adquirido o direito sobre os prédios em causa nos autos por contrato de partilha e conferência de 18.01.2014.
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Findos os articulados, foi elaborado despacho saneador, no qual foi afirmada a validade e a regularidade da instância, tendo sido dispensada a seleção da matéria de facto assente e controvertida.
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Procedeu-se à realização da audiência de julgamento (cfr. acta de fls. 442 e 443).
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Posteriormente, o Mm.º julgador “a quo” proferiu sentença (cfr. fls. 444 a 451), nos termos da qual julgou «totalmente procedente, por provada, a acção e improcedentes os pedidos reconvencionais e, consequentemente», decidiu:

«A) Declarar verificada a situação de compropriedade relativamente aos prédios descritos em 1)-A) e 1)-B) dos Factos Provados, na proporção de ¼ (um quarto) para o Requerente habilitado J. P.; ½ (metade) para a Requerida M. A.; e ¼ (um quarto) para os herdeiros de J. C. e mulher, I. O., os aqui Requeridos M. C., R. C., C. O., R. O. e M. F.;
B) Declarar indivisível a realidade predial única composta pelos prédios descritos supra em 1)-A) e 1)-B);
C) Absolver o Requerente habilitado J. P. e os Requeridos M. A., M. C., R. C. e C. O. da totalidade dos pedidos reconvencionais deduzidos pelas Requeridas/Reconvintes R. O. e M. F.;
D) Condenar o Requerente habilitado J. P. e as Requeridas M. F. e R. O. nas custas da fase declarativa da acção e das reconvenções, na proporção de metade para o primeiro e metade para as últimas.
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Em consequência, provada a compropriedade e a indivisibilidade da coisa, determina-se a passagem do presente processo à fase da conferência de interessados, nos termos do art.º 929.º, n.º 2, do C.P.C., a fim de se adjudicar ou vender a unidade predial indicada no art.º 1.º da p.i.
Após trânsito, abra conclusão a fim de se designar data para a realização da conferência de interessados».
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Inconformadas, as Rés M. F. e R. O. interpuseram recurso dessa sentença (cfr. fls. 453 a 458) e, a terminar as respetivas alegações, formularam as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«1ª - O Tribunal a quo apesar de ter dado como provado que os prédios rústicos devidamente identificados na petição inicial se encontram divididos em três parcelas distintas há mais de vinte anos e que, são ocupados e tratados pelos Reconvintes com a convicção de que tais parcelas lhes pertencem e de que exercem um direito próprio, decidiu considerar tal fracionamento ilegal por desrespeitar a imposição legal de não fracionamento de parcelas de terreno aptas para cultura com área inferior à unidade de cultura (lei nº89/2019, de 3 de Setembro).
2ª - Efetuando, assim, uma errada aplicação do direito quando não reconheceu a usucapião in caso, ainda que dando como provados todos os elementos constitutivos da referida usucapião (animus e corpus).
3ª - A usucapião, sendo uma forma originária de aquisição de direitos, pode incidir sobre parcela de terreno inferior à unidade de cultura, contrariando o regime jurídico que proíbe o fraccionamento de prédios rústicos por ofensa à área de cultura mínima.
4ª - Deste modo, e considerando a data em que ocorreu o acto material da divisão – meados da década de 80 - o início da posse dos réus/reconvintes sobre a parcela de terreno em causa, e o lapso de tempo entretanto decorrido com manutenção ininterrupta dessa mesma posse, tem de concluir-se que esta determinou a aquisição originária, por usucapião, do direito de propriedade sobre a parcela de terreno em causa.
5ª - Todavia e fazendo-se cumprir o princípio geral da aplicação das leis no tempo, nos termos do art.º 12º, n.º1 e nº 2 do Código Civil, “a lei só dispõe para o futuro, ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular”.
6ª - No seu n.º 2, 1º parte esclarece ainda que, “quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se em caso de dúvida, que só visa os factos novos (…)”.
7ª – Pelo que, só por aqui devia ter sido reconhecida e declarada procedente a reconvenção deduzida!
8ª – Por outro lado, os negócios celebrados contra disposição legal de carácter imperativo são, em regra, nulos (art. 294.º do CC), podendo a nulidade ser, em princípio, invocada a todo o tempo por qualquer interessado e até ser declarada oficiosamente pelo tribunal (art. 286.º do CC); porém, a não fixação de um prazo para a sua arguição não afecta os direitos que hajam sido adquiridos por usucapião.
9ª- Assim sendo, não pode uma aquisição a título originário e prevista no nosso ordenamento jurídico, ser inviabilizada por uma norma posterior colocando em causa um direito há muito adquirido, devendo o reconhecimento judicial da mencionada usucapião, no caso em apreço, sobrepor-se e prevalecer sobre o fracionamento ilegal do prédio.
10ª - No modesto entendimento das Recorrentes continua a inexistir qualquer norma excepcional que estabeleça taxativamente que a posse mantida sobre parcela de terreno com área inferior à unidade de cultura não conduz à usucapião, cujos efeitos se retrotraem, por força do disposto no artigo 1288º do Código Civil, à data do início da posse.
11ª - Devendo, portanto, entender-se que as normas impeditivas do fracionamento não se situam, manifestamente, em plano de prevalência sobre as relativas à usucapião.
12ª – Tendo, inclusive, sido entretanto proferido acórdão do STJ, em data posterior à entrada em vigor da Lei 89/2019 de 03 de Setembro que conclui no mesmo sentido por si adoptado antes da entrada em vigor da referida lei: “acórdão do STJ Proc. N.º 317/15.0T8TVD.L1.S2, relatora Fátima Gomes de 24.10.2019, posterior á alteração da nova Lei n.º 89/2019, de 3 de Setembro, que veio introduzir uma nova redacção ao art.º 48º, n.º 2, da lei n.º 111/2015, de 27 de Agosto, o mesmo vem confirmar e bem, o que a tendência jurisprudencial maioritária tem defendido: “A expressão “disposição em contrário” ressalvada pelo art.1287º do CC, não abarca a situação prevista no art. 1376º do mesmo código, na medida em que inexiste qualquer norma excepcional que estabeleça, taxativamente, que a posse mantida sobre parcela de terreno com área inferior à unidade de cultura não conduz à usucapião.

NESTES TERMOS e nos melhores de direito, revogando a douta decisão recorrida, substituindo-a por outra que julgue a Reconvenção Procedente e assim se fazendo a pretendida
JUSTIÇA».
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Contra-alegou o recorrido J. P. pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção da sentença recorrida (cfr. fls. 459 e ss.).
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo (cfr. fls. 462).
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Foram colhidos os vistos legais.
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II. Delimitação do objeto do recurso

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a única questão que se coloca à apreciação deste Tribunal consiste em saber se o instituto da usucapião prevalece, ou não, sobre a norma constante do art. 1376º, n.º 1, do Código Civil, que impede o fracionamento da propriedade rústica em parcelas de área inferior à unidade de cultura.
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III. Fundamentos

IV. Fundamentação de facto

A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:

1. Encontram-se descritos na Conservatória do Registo Predial ... os seguintes imóveis:
A) «PREDIO RÚSTICO, denominado “CAMPO DE …, de cultivo, com a área indicada de 2.300 m2, a confrontar de norte com A. B., nascente com herdeiros de R. S., Sul com J. E., poente J. B., inscrito na matriz sob o artigo ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº .../220201; e
B) «PREDIO RÚSTICO, denominado “CAMPO DE …, de cultivo, com a área indicada de 2.150 m2, a confrontar de norte com A. B., nascente e poente herdeiros de R. S., Sul com A. J., inscrito na matriz sob o artigo ..., descrito na competente conservatória do Registo Predial ... sob o nº .../220201 [art.º 1.º da p.i.].
2. No âmbito da escritura pública de partilha outorgada em treze de Outubro de mil novecentos e setenta no extinto Cartório de vila Verde, por óbito de Maria, foram partilhados os prédios rústicos acima referidos [art.º 2.º da p.i.].
3. Tais prédios foram partilhados em regime de compropriedade, nas proporções a seguir indicadas e aos seguintes interessados:
a) ¼ (um quarto) para a interessada, já falecida, R. S., viúva na altura, residente que era no lugar das …, freguesia de ..., em Vila Verde;
b) ½ (metade) para o interessado A. C. e mulher R. D., já falecidos, residentes que eram no lugar de …, freguesia de ..., Vila Verde; e
c) ¼ (um quarto) para o interessado J. C. e mulher I. O., já falecidos, residentes que eram no lugar de …, freguesia de ..., Vila Verde [art.º 3.º da p.i.].
4. A aludida R. S. faleceu em .. de Janeiro de 1987, com descendentes, tendo-se procedido á partilha dos bens deixados por esta através do inventário facultativo que correu termos no tribunal Judicial de Vila Verde sob o nº 108/93 do 2º Juízo [art.º 4.º da p.i.].
5. No qual, entre outros bens, foi ali relacionado e partilhado o ¼ (um quarto) dos prédios identificados em 1), sob o verba nsº 5 (cinco) e 6 (seis) [art.º 5.º da p.i.].
6. Por via do referido inventário, M. B. e marido, M. L., para preenchimento do seu quinhão receberam, entre outros, o referido ¼ (um quarto) dos prédios identificados em 1) [art.º 6.º da p.i.].
7. Aos originários comproprietários na proporção de ½ ou 2/4, dos prédios identificados em 1), nomeadamente A. C. e mulher R. D., já falecidos, sucederam como único e universal herdeiro testamentário o também já falecido J. D. [art.º 7.º da p.i.].
8. Após o óbito de J. D., este deixou descendentes como herdeiros, tendo sucedido então na titularidade da ½ (metade) que ao mesmo pertencia dos prédios identificados em 1), a Sra. M. A. [arts. 8.º e 9.º da p.i.].
9. O comproprietário do restante ¼ (um quarto) dos prédios identificados em 1), J. C., faleceu tendo-lhe sucedido a mulher, I. O., entretanto já falecida em 11 de Fevereiro de dois mil e dois, tendo-lhe sucedido como herdeiros dois filhos e três netos, aqui 2.ºs a 6.ºs Requeridos, herança esta que permanece indivisa [art.º 10.º da p.i.].
10. Os dois prédios referidos em 1) têm a área total de cerca de 5.800 m2, localizando-se no PDM de Vila Verde em zona de “Espaços Agrícolas de Conservação” [art.º 14.º da p.i.].
11. Cerca de 10 ou 12 anos após a data referida em 2), os comproprietários iniciais procederam à divisão material dos falados prédios [art.º 4.º das contestações].
12. Tendo dividido os prédios em três parcelas de terreno distintas [art.º 5.º das contestações].
13. A partir de então cada um dos iniciais comproprietários passou a cuidar, cultivar e colher a parcela de terreno que lhe foi atribuída [art.º 6.º da contestação da Req.ª M. F. e 5.º da contestação da Req.ª R. O.].
14. As parcelas resultantes da divisão material foram demarcadas com cabritas de divisão e uma sebe [art.º 7.º da contestação da Req.ª M. F.].
15. Pelo menos desde meados da década de 80, os referidos R. S., A. C. e mulher e J. C. e mulher, passaram a deter, usar e ocupar cada uma das parcelas de terreno, como prédios distintos, demarcados e autónomos [arts. 10.º e 11.º da contestação da Req.ª M. F. e 7.º da contestação da Req.ª R. O.].
16. Cultivando-os e fazendo-os cultivar, colhendo batatas, milho, feijão, hortícolas e outros produtos, com tal exclusividade e independência, [arts.º 12.º e 13.º da contestação da Req.ª M. F. e 9.º da contestação da Req.ª R. O.].
17. Com a convicção de que tais parcelas lhe pertenciam, de que exerciam um direito próprio, que não lesavam e de que tais condutas não causavam danos ou prejuízos a quem quer que fosse [art.º 14.º da contestação da Req.ª M. F. e 10.º da contestação da Req.ª R. O.].
18. Tais actos foram praticados pelos referidos R. S., A. C. e mulher e J. C. e mulher ininterruptamente, desde meados da década de 80, à vista de toda a gente, sem qualquer oposição [art.º 15.º da contestação da Req.ª M. F. e 11.º da contestação da Req.ª R. O.].
19. No seu interesse e proveito, com ânimo de exclusivos donos [art.º 31.º da contestação da Req.ª M. F. e 25.º da contestação da Req.ª R. O.].
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E deu como não provados:

a) Art.º 4.º da contestação da Req.ª M. F. [provado apenas o que consta do facto 11].
b) Art.º 6.º da contestação da Req.ª M. F. [provado apenas o que consta do facto 13].
c) Art.º 7.º da contestação da Req.ª M. F. [provado apenas o que consta do facto 14].
d) Art.º 10.º da contestação da Req.ª M. F. [provado apenas o que consta do facto 15].
e) Art.º 16.º da contestação da Req.ª M. F. e 12.º da contestação da Req.ª R. O..
f) Arts. 27.º da contestação da Req.ª M. F. e 22.º da contestação da Req.ª R. O. [quanto à área].
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V. Fundamentação de direito.

1. Da prevalência da usucapião sobre as normas que proíbem o fracionamento da propriedade rústica, por ofensa da área de cultura mínima.
1.1. No caso dos autos estamos no âmbito de uma ação especial de divisão de coisa comum, proposta em 4/11/2010, ao abrigo do disposto no art. 1052º e ss. do Código de Processo Civil - aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44129, de 28-12-1961 (e sucessivas alterações) -, que tem como pressuposto a compropriedade sobre uma unidade predial constituída por dois prédios rústicos e por finalidade a efetivação do direito à divisão que o art. 1412º do Código Civil (abreviadamente CC) confere aos comproprietários, tendo sido alegada a indivisibilidade em substância da coisa, por impedimento legal, visto a respetiva área ser inferior à da unidade de cultura, nos termos do art. 1376º do CC e da Portaria n.º 202/70, de 21/04.
Em sede de contestação/reconvenção, os RR./reconvintes alegaram, porém, que os aludidos prédios já se encontram física e materialmente divididos pelos interessados em três parcelas distintas, há mais de vinte anos, na proporção das respetivas quotas, divisão essa consolidada por usucapião, que os reconvintes invocaram em via reconvencional.
Malgrado ter dado como provado que os referidos prédios rústicos se encontram divididos materialmente em três parcelas distintas há mais de vinte anos e que são ocupados e cultivados pelos interessados com a convicção de que tais parcelas lhes pertencem, de que exercem um direito próprio, à vista de toda a gente e sem qualquer oposição, no seu interesse e proveito, com ânimo de exclusivos donos (pontos 11 a 19 dos factos provados), o Tribunal recorrido considerou ilegal a pretensão das requeridas da divisão da unidade predial por usucapião, já que a mesma implicaria o desrespeito da imposição legal de não fracionamento de parcelas de terreno aptas para cultura com área inferior à unidade de cultura, aduzindo para o efeito que a invocação da aquisição por usucapião fica afastada por força da proibição prevista no disposto no art. 48º, n.º 2, da Lei n.º 111/2015, de 27/08, na redação introduzida pela Lei n.º 89/2019, de 3 de Setembro, a qual, por nela se integrar, dada a sua natureza interpretativa, influencia a interpretação do art. 1376º, n.º 1, do CC.
Concluiu, por isso, que a dita unidade predial deverá ser considerada ainda não dividida e legalmente indivisível, pelo que determinou a procedência da ação e a total improcedência dos pedidos reconvencionais.

Insurgem-se as recorrentes contra essa solução jurídica, apresentando, em resumo, os seguintes argumentos:

- A usucapião, sendo uma forma originária de aquisição de direitos, pode incidir sobre parcela de terreno inferior à unidade de cultura, contrariando o regime jurídico que proíbe o fracionamento de prédios rústicos por ofensa à área de cultura mínima.
- Atenta a demonstração dos elementos constitutivos da usucapião, é de concluir que esta determinou a aquisição originária, por usucapião, do direito de propriedade sobre a parcela de terreno em causa.
- Não obstante a alteração do art. 48º, n.º 2, da Lei n.º 111/2015, de 27/08, introduzida pela Lei n.º 89/20189, de 3/09, a proibição aí imposta, atento o princípio geral da aplicação das leis no tempo previsto no art. 12º, n.ºs 1 e 2 do CC, não pode inviabilizar uma aquisição a título originária anterior, pelo que o reconhecimento judicial da mencionada usucapião deve sobrepor-se e prevalecer sobre o fracionamento ilegal do prédio.
- Continua a inexistir qualquer norma excecional que estabeleça taxativamente que a posse mantida sobre parcela de terreno com área inferior à unidade de cultura não conduz à usucapião.
- As normas impeditivas do fracionamento não se situam, manifestamente, em plano de prevalência sobre as relativas à usucapião.

No caso, não oferece controvérsia que o quadro factual provado retrata uma divisão em três parcelas, não formalizada, de dois prédios rústicos, os quais correspondem na prática a uma única unidade predial, com a área total de cerca de 5.800 m2, divisão essa efetuada em meados da década de 80, data a partir da qual cada um dos iniciais comproprietários passou a cuidar, cultivar e colher a parcela de terreno que lhe foi atribuída, no convencimento de que lhe pertencia como prédio autónomo e de que não prejudicava ninguém.
Tal posse, resultante do fracionamento de facto da propriedade, nos termos acordados, decorrente de uma divisão de coisa comum, não é titulada, visto que o negócio devia ser celebrado por escritura pública (art. 89.º, al. a) do Código do Notariado de 1967, com as sucessivas alterações).
Também não se mostra controvertido que a divisão dos aludidos prédios constitui fracionamento que desrespeita o art. 1376.º, n.º 1, do CC, pois da divisão resultam parcelas inferiores à unidade de cultura.
Por isso, a divisão será ainda anulável, nos termos previsto na primitiva redação do n.º 1 do art. 1379º do CC [ou nula, se lhe for já aplicável o regime do 1379.º, n.º 1, do CC, com a redação dada pela Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto], por violação das normas que proíbem o fraccionamento de prédios rústicos contidas no art. 1376º do mesmo diploma e art. 1º da Portaria n.º 202/70 e não concorrer nenhuma excepção das admitidas no art. 1377º do CC.
Delineado, pois, o objeto do dissenso e o quadro fáctico apurado, vejamos como decidir.
Antes de mais, importa traçar o quadro legal aplicável ao caso sub júdice.
Nos termos do art. 1376º, n.º 1, do CC, “[o]s terrenos aptos para cultura não podem fraccionar-se em parcelas de área inferior a determinada superfície mínima, correspondente à unidade de cultura fixada para cada zona do País; importa fraccionamento, para este efeito, a constituição de usufruto sobre uma parcela do terreno”.
O fraccionamento de um prédio rústico pressupõe a sua divisão por dois ou mais proprietários, implicando a transferência do domínio para outrem, designadamente por venda (1).
O citado normativo proíbe o fracionamento dos prédios rústicos aptos para cultura se alguma das parcelas resultantes de tal operação ficar abaixo da unidade de cultura fixada para essa zona do país.
Essa limitação relativa ao fracionamento de prédios rústicos imposta pelo n.º 1 do art. 1376º do CC respeita apenas aos terrenos aptos para a cultura, ou seja, próprios para fins agrícolas, florestais ou pecuários (2).
As restrições ao fracionamento de prédios aptos para cultura decorrem de razões de interesse público relacionadas com a defesa da viabilidade e rentabilização económica, pretendendo-se evitar a criação de micro-parcelas pouco rentáveis (3). É ainda uma necessidade do ordenamento do território que justifica a previsão de tal regime legal (4).
A proibição de fracionamento opera quando, por virtude desse fracionamento, os prédios rústicos se mantenham destinados a exploração agrícola (5) (6).

Por sua vez, prescreve o art. 1379.º do CC (7) que:

«1 – São anuláveis os actos de fraccionamento ou troca contrários ao disposto no artigo 1376.º (…).
2 – Têm legitimidade para a acção de anulação o Ministério Público (…).
3 – A acção de anulação caduca no fim de três anos a contar da celebração do acto (…)».

De acordo com o n.º 1 da base I e n.º 2 da base XXXIII da Lei n.º 2116, de 14/08 (8) (que regulou a matéria do fracionamento e emparcelamento de prédios rústicos), o art. 1º da Portaria n.º 202/70, de 21/04, fixou a área de unidade de cultura, em hectares (ha), para as diversas Regiões de Portugal continental, com referência aos tipos de cultura agrícola dos terrenos, classificando-os, para tal efeito, em terrenos de sequeiro e terrenos de regadio, subdividindo estes em terrenos de cultura arvense e terrenos de cultura hortícolas.

Segundo o quadro constante daquela Portaria, as unidades de cultura fixadas para a região de Braga, onde se integram os prédios em causa, são:

i) - para os terrenos de regadio/arvenses – 2,00 ha/20.000m2;
ii) – para os terrenos de regadio/hortícolas – 0,50 ha/5.000m2;
iii) – para os terrenos de sequeiro – 2 ha/20.000m2.

O Dec. Lei n.º 384/88, de 25-10, revogou a Lei n.º 2.116, de 14/08/62, e procurou “aperfeiçoar e ampliar os mecanismos reguladores do fracionamento de prédios rústicos e de explorações agrícolas”, estabelecendo:

No seu art. 19º, n.º 1, que “ao fracionamento e à troca de terrenos com aptidão agrícola ou florestal aplicam-se, além das regras dos arts. 1376º e 1379º do CC, as disposições da presente lei”.

No seu art. 20º, n.º 1, que “a divisão em substância de prédio rústico ou conjunto de prédios rústicos que formem uma exploração agrícola e economicamente viável só poderá realizar-se:

a) – Para efeitos de redimensionamento de outras explorações, operada nos termos da presente lei;
b) – Para reconversão da própria exploração ou se a sua viabilidade técnico-económica não for gravemente afectada;
c) – Se da divisão resultarem explorações com viabilidade técnico-económica;
d) – Se do fraccionamento não resultar grave prejuízo para a estabilidade ecológica”.

Complementarmente, o Dec. Lei n.º 103/90, de 22/03, veio estatuir:

No seu art. 45º, que «1 – A divisão a que se refere o artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 384/88, de 25 de Outubro, só se pode realizar sob parecer favorável da respectiva direcção regional de agricultura, emitido a requerimento do interessado.

2 – Decorridos 30 dias sem que o parecer a que se refere o número anterior seja emitido, considera-se para todos os efeitos a existência de parecer favorável.
3 – Verificada a situação prevista no número anterior, a direcção regional de agricultura respectiva deve, a pedido dos interessados, passar de imediato certidão comprovativa de tal facto».
No seu art. 47.º que «1 – São anuláveis os actos de fraccionamento ou troca de terrenos com aptidão agrícola ou florestal que contrariem o disposto no artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 384/88, de 25 de Outubro.
2 – Têm legitimidade para a acção de anulação o Ministério Público, a DGHEA ou qualquer particular que goze de direito de preferência no âmbito da legislação sobre o emparcelamento ou fraccionamento.
3 – O direito de acção de anulação caduca decorridos três anos sobre a celebração dos actos referidos no n.º 1.
4 – A DGHEA tem igualmente legitimidade para a acção de anulação a que se refere o artigo 1379.º do Código Civil»;

E, no seu art. 53.º, que «[e]nquanto não foram fixadas as unidades de cultura nos termos do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 384/88, de 25 de Outubro, mantém-se em vigor a Portaria n.º 202/70, de 21 de Abril».

Entretanto, em 27 de agosto de 2015, entrou em vigor a Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto (cfr. art. 65º), que, tendo como objetivo “criar melhores condições para o desenvolvimento das atividades agrícolas e florestais, de modo compatível com a sua gestão sustentável nos domínios económico, social e ambiental, através da intervenção na configuração, dimensão, qualificação e utilização produtiva das parcelas e prédios rústicos”, estabeleceu o regime jurídico da estruturação fundiária, alterando o Código Civil e revogando os Decretos-Leis n.ºs 384/88, de 25 de outubro e 103/90, de 22 de março.
No seu art. 26.º, n.º 5, estabeleceu que:

«Entende-se por unidade de cultura a superfície mínima de um terreno rústico para que este possa ser gerido de uma forma sustentável, utilizando os meios e recursos normais e adequados à obtenção de um resultado satisfatório, atendendo às características desse terreno e às características geográficas, agrícolas e florestais da zona onde o mesmo se integra».

Especificamente, no que concerne ao fracionamento, no seu art. 48.º estabeleceu que:

«1 - Ao fracionamento e à troca de parcelas aplicam-se, além das regras dos artigos 1376.º a 1381.º do Código Civil, as disposições da presente lei.
2 - Quando todos os interessados estiverem de acordo, as situações de indivisão podem ser alteradas no âmbito do emparcelamento rural ou da valorização fundiária, pela junção da área correspondente de alguma ou de todas as partes alíquotas, a prédios rústicos que sejam propriedade de um ou de alguns comproprietários.
3 - Da aplicação do disposto nos números anteriores não podem resultar prédios com menos de 20 m de largura, prédios onerados com servidão ou prédios com estremas mais irregulares do que as do prédio original».

No seu art. 49.º que:

«1 - A unidade de cultura é fixada por portaria do membro do Governo responsável pela área do desenvolvimento rural e deve ser atualizada com um intervalo máximo de 10 anos.
2 - As transmissões e a transferência de direitos que se verifiquem no âmbito da execução dos projetos de emparcelamento integral efetivam-se independentemente dos limites da unidade de cultura».

E, no seu art. 59.º, veio alterar o disposto no art. 1379º do CC, dando-lhe a redação atual, que se reproduz:

«1 - São nulos os atos de fracionamento ou troca contrários ao disposto nos artigos 1376.º e 1378.º.
2 - São anuláveis os atos de fracionamento efetuado ao abrigo da alínea c) do artigo 1377.º se a construção não for iniciada no prazo de três anos.
3 - Tem legitimidade para a ação de anulação o Ministério Público ou qualquer proprietário que goze do direito de preferência nos termos do artigo seguinte.
4 - A ação de anulação caduca no fim de três anos, a contar do termo do prazo referido no n.º 2».

Por sua vez, a Portaria n.º 219/2016, de 9 de agosto, publicada ao abrigo do disposto no art. 4.º, n.º 3 e art.º 49.º da mencionada Lei n.º 111/2015, revogou expressamente a Portaria n.º 202/70, de 21/04, e fixou a unidade de cultura a que se refere o art. 1376.º do CC, estabelecendo (para a zona do Alto Minho) para os terrenos de regadio 2,5 (hectares) e para o terreno de sequeiro 4 (hectares).

Por fim, a Lei n.º 89/2019, de 3 de setembro – que procedeu à primeira alteração à Lei n.º 111/2015, de 27/08, que estabelece o regime jurídico da estruturação fundiária –, introduziu a seguinte alteração ao art. 48.º da aludida Lei n.º 111/2015:
«[...]
1 - ...
2 - A posse de terrenos aptos para cultura não faculta ao seu possuidor a justificação do direito a que esta diz respeito, ao abrigo do regime da usucapião, sempre que a sua aquisição resulte de atos contrários ao disposto no artigo 1376.º do Código Civil.
3 - São nulos os atos de justificação de direitos a que se refere o número anterior.
4 - (Anterior n.º 2.)
5 - (Anterior n.º 3.)»

Da enunciação legal antecedente podemos concluir que a alteração introduzida ao art. 1379º do CC pela Lei n.º 111/2015 consistiu na autonomização e inovação das consequências jurídicas previstas para os atos de fracionamento ou troca contrários ao disposto nos arts. 1376º e 1378º, relativamente aos atos de fracionamento efetuado ao abrigo da alínea c) do art. 1377º, passando a violação das primeiras a padecer do vício de nulidade (retomando a sanção da nulidade que também estava prevista na Base I da Lei n.º 2116, de 14 de Agosto de 1962), e mantendo a segunda a regra anterior da anulabilidade.
Desta forma, o legislador, em 2015, consagrou expressamente a nulidade para os atos de fracionamento ou troca que sejam contrários ao disposto nos arts. 1376º e 1378º, ou seja, que consistam no fracionamento do prédio rústico em parcelas inferiores à unidade de cultura vigente na zona geográfica, quando anteriormente a consequência jurídica prevista para esses atos estava limitada à mera anulabilidade, a arguir no prazo de 3 (três) anos, sob pena de sanação.
Assim, quando era aplicável o regime previsto no citado art. 1379º, n.ºs 1 e 3 do CC, na sua versão anterior à introduzida pela Lei n.º 111/2015, estando prevista expressamente a anulabilidade, encontrava-se afastada a aplicação do art. 294.º do CC, ou seja, em termos de invalidade dos atos de fracionamento e respetivas consequências jurídicas, tratava-se de atos anuláveis (e não nulos, como atualmente sucede), devendo a ação de anulação ser proposta no prazo de três anos, a contar da celebração do acto, sob pena de caducidade da ação.
Ao invés, à luz do atual regime vertido no art. 1379º, n.º 1, do CC, a lei sanciona com a nulidade o acto de fracionamento em desrespeito pelo art. 1376º, o que significa a impossibilidade de sanação da invalidade do acto pelo mero decurso do tempo, com todas as consequências daí decorrentes, nomeadamente a sua invocação a todo o tempo por qualquer interessado e conhecimento oficioso pelo tribunal, conforme as regras gerais do art. 286º do CC (9).
*
1.2. Conforme já se deixou dito, a questão objeto do presente recurso consiste em decidir se a usucapião – assente em actos de posse prolongada, pública e pacífica –, como forma originária de adquirir, deve prevalecer sobre as normas que regem o fracionamento de prédios rústicos de área inferior à unidade de cultura da área geográfica da localização dos prédios.

Como é sabido, a enunciada questão tem sido objeto de diferentes soluções na jurisprudência e na doutrina, tendo-se formado duas linhas decisórias distintas:

i) Uma posição – propugnada pelas recorrentes – defende que o fracionamento do prédio rústico em parcela de área inferior a superfície correspondente à unidade de cultura fixada para essa zona do país não obsta à invocação da usucapião, verificados os respetivos pressupostos, prevalecendo sobre o regime prescrito no art. 1376.º do CC (10).
Esta orientação assenta basicamente no conceito de posse previsto no art. 1287.º do CC e conteúdo normativo da usucapião, bem como na ausência de norma excecional que estabeleça taxativamente que determinada posse não conduz à usucapião.
Segundo uma tal linha de entendimento, apesar de ter por indiscutível que a nulidade pode ser, em princípio, invocada a todo o tempo por qualquer interessado e pode (até) ser declarada oficiosamente pelo tribunal (art. 286º do CC), a circunstância da não fixação de um prazo para a sua arguição «não afecta os direitos que hajam sido adquiridos por usucapião» (11).
Argumenta-se ainda que a «possibilidade da sua invocação perpétua (da nulidade) pode, porém, ser precludida, no aspecto prático, pela verificação da prescrição aquisitiva (usucapião)» (12).
Também Castro Mendes (13) defendia que não obsta à aquisição por usucapião de parte de prédio, dividido verbalmente pelos anteriores comproprietários, o facto de a sua superfície ser inferior a meio hectare, tendo em conta o valor da unidade de cultura fixado pela Portaria 202/70, de 21/4, mantida em vigor pelo art.º 53.º do Dec. Lei n.º 103/90, de 23/3.
Esta era igualmente a interpretação de Antunes Varela e Pires de Lima, em anotação ao art. 1379º na redação anterior à alteração introduzida pela Lei n.º 111/2015, onde a esse propósito referem o seguinte (14): “Se, através de um negócio jurídico nulo (v.g., por falta de forma) se realizar um fracionamento ou uma troca contrários ao disposto nos art.ºs 1376.º e 1378.º, e se, na sequência disso, se constituírem as situações possessórias correspondentes, aqueles preceitos não obstam a que estas situações se consolidem por usucapião, logo que se verifiquem todos os requisitos legais. Embora as regras sobre fracionamento e troca de terrenos aptos para cultura sejam determinadas por razões de interesse público, os negócios que as infrinjam só são impugnáveis dentro de um prazo bastante curto (o prazo indicado no n.º 3). Decorrido este prazo, a violação da lei deixa de relevar seja para que efeito for, não podendo, por conseguinte, impedir a aquisição de direitos por usucapião)".
Por outro lado, e no que se reporta à expressão legal disposição em contrário que o art. 1287.º do CC ressalva, os defensores desta posição defendem que a mesma não abarca o referido n.º 1 do art. 1376.º uma vez que inexiste qualquer norma excecional que estabeleça, taxativamente, que a posse mantida sobre parcelas de terreno com área inferior à unidade de cultura não conduz à usucapião, ou seja, que as mesmas não podem ser adquiridas por usucapião (15).
E quanto ao argumento no sentido de que a sanção de nulidade, agora, imposta pelo art. 1379º, n.º 1 do CC, na redação dada pela Lei n.º 111/2015, para os actos de fracionamento violadores da unidade de cultura, ser bem elucidativa da vontade do legislador reafirmar o caráter imperativo dessa norma e confirmar a não prevalência da usucapião sobre as regras legais de proibição de fracionamento, tanto mais, que ficando sujeita ao regime estatuído nos art.ºs 294º e 286º, ambos do C. Civil, pode ser invocada a todo o tempo por qualquer interessado e pode até ser declarada oficiosamente pelo tribunal, refutava-se o mesmo, porquanto, como já ensinava Manuel de Andrade (16), «o princípio de que a nulidade absoluta pode, por via de acção, ser invocada a todo o tempo, não prevalece sobre a doutrina da prescrição aquisitiva».
ii) Em sentido contrário, outra posição defende que uma eventual aquisição originária por usucapião não prevalece sobre as regras imperativas de ordenamento territorial (17).
Invocam desde logo o estatuído no art. 1287º do CC, nos termos do qual se estabelece que a usucapião opera “salvo disposição em contrário”.
De tal disposição e das razões que subjazem, por exemplo, à proibição de atos de fracionamento contrários a diretrizes de natureza imperativa que decorrem de sucessivos diplomas que regulam a gestão do território retiram alguns autores a inviabilidade de, através da invocação da usucapião, se ultrapassarem os bloqueios colocados àquele fracionamento e que transparecem dos dispositivos anteriormente citados.
Assim o defendem designadamente Mónica Jardim e Dulce Lopes (18), onde concluem que “razões ponderosas há – de interesse público, ainda que não urbanístico – para controlar o cumprimento deste requisito, sob pena de, também aqui, se deixar entrar pela janela aquilo a que se quis fechar a porta”.
Semelhante posição é assumida por Fernando Pereira Rodrigues (19) quando refere que “a usucapião é um meio alternativo de constituição do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo através da posse, no pressuposto de que essa aquisição, em abstrato, também poderia ter lugar através de outro meio legal de aquisição, designadamente o negócio jurídico ou o contrato”. Acrescenta o mesmo autor que “não pode funcionar como válvula de escape para se adquirir o bem que de outro modo nunca seria suscetível de aquisição”, concluindo que “se um prédio urbano ou um prédio rústico, em termos legais, não podem ser objeto de fracionamento, não pode o mesmo operar-se mediante invocação da usucapião, ainda que no plano da realidade empírica ele se verifique”.
Em sentido similar, refere Armando Triunfante (20) que, depois da alteração introduzida pelo art. 59º da Lei n.º 11172015, de 27/08 (“são nulos os atos de fracionamento ou troca contrários ao disposto nos artigos 1376.º e 1378.º”), o legislador deu “um sinal significativo que o imperativo de impedir o parcelamento de prédios inferiores à unidade de cultura é também de ordem pública. A sua violação passou a ser sancionada com a nulidade e não apenas com a anulabilidade.
Parece-nos, em conformidade, ter desaparecido o argumento principal daqueles que admitiam a possibilidade de usucapião. Agora, julgamos poder sustentar, com alguma segurança, a inadmissibilidade de tal usucapião. Com efeito, se o legislador não permite o fracionamento numa hipótese em que ambas as partes estão de acordo (esse acordo será, inclusivamente, nulo), carece de sentido permitir o mesmo resultado através da usucapião. (…)” A “usucapião, enquanto modalidade de aquisição originária de direitos reais, justifica-se quando à inércia do titular se contrapõe o dinamismo do possuidor. Não pode a mesma usucapião servir para ultrapassar normas imperativas de indiscutível interesse público”.
Esta é também a posição de Luís Filipe Cravo (21) ao referir que presentemente, e por efeito da conjugação do disposto no art. 1376º, nº1, com o nº1 do art. 1379º, ambos do Código Civil, o ato de fracionamento padece de nulidade, não produzindo quaisquer efeitos jurídicos”, “[d]onde, perante a invalidade do fracionamento da parcela, naturalmente que só pode estar excluída a situação de usucapião”.
*
1.3. Face à diversidade de situações que, relacionados com a questão da violação das regras de fracionamento dos prédios agrícolas, surgem nos tribunais e da complexidade que tal aporta ao tratamento da dita questão, julgamos ser de reconhecer de que a resposta a dar às diferentes realidades em apreço não tem de ser necessariamente igual (22).

Como se explicita no Ac. do STJ de 08/11/18 (relator Abrantes Geraldes), in www.dgsi.pt., “relativamente a situações que envolvam a violação de normas imperativas cominadas com a nulidade verifica-se uma tendência jurisprudencial para a inviabilidade de contornar essa proibição através da invocação da usucapião.
É igualmente de afastar a invocação da usucapião “quando está em causa a violação de regras de direito do urbanismo ligadas, por exemplo, ao regime dos loteamentos urbanos”.
Já, porém, estando em causa o regime de fracionamento de prédios rústicos sem objetivos urbanísticos, (…), a solução que vem sendo adotada pela jurisprudência” do “Supremo Tribunal de Justiça é de sentido inverso”.

Pela sua pertinência importa ainda destacar o estudo do Conselheiro Salazar Casanova, intitulado “Usucapião, Acessão Industrial e Construção Clandestina”, inserido na compilação do Centro de Estudos Judiciários “A Interação do Direito Administrativo com o Direito Civil” (23), no qual, a propósito do fracionamento de propriedade rústica e usucapião, refere o seguinte (pp. 87/88):

«64. Importa ainda considerar os casos em que houve fracionamento da propriedade rústica em parcelas com área inferior à unidade de cultura.
65. A lei proíbe o fracionamento em área inferior à unidade de cultura (artigo 1376.º/1 do Código Civil). Este é um preceito de interesse público ainda que não urbanístico. No entanto, a lei não fulminava com nulidade a violação desta norma, mas com a mera anulabilidade, embora conferindo ao Ministério Público legitimidade para instaurar ação.
66. Tais situações de fracionamento podem resultar de negócio jurídico em que houve violação do referido artigo 1376.º/1 do Código Civil, por erro, seja ele quanto à área do imóvel a fracionar, quanto à natureza do terreno ou quanto a outro elemento que importe à determinação da área de unidade de cultura, relevando ainda situações em que se admitiu permuta de terrenos em violação do artigo 1378.º do Código Civil; mas resultam também de negócios jurídicos nulos (divisão de coisa comum, partilha) de que resultaram situações possessórias correspondentes.(…)
67. Não se duvidando de que o interesse público, no que respeita às transformações fundiárias em que não se pretenda a construção, é o do emparcelamento, a usucapião seria também aqui de excluir tanto mais que a anulabilidade apenas se pode alcançar na sequência de negócios jurídicos e não por via do controlo das situações possessórias. O interesse público, também aqui, prevaleceria contra a usucapião que se limitaria às situações possessórias consolidadas na sequência da não impugnação de negócios anuláveis. (…)
68. No entanto, a doutrina e a jurisprudência têm reconhecido a usucapião no caso de fracionamento de prédio em parcelas com área inferior à unidade de cultura(…).
69. Este entendimento, que pressupunha incorrer o fracionamento de prédio rústico em anulabilidade, está prejudicado quando se trate de reconhecer a aquisição da propriedade por usucapião com fundamento em situação possessória iniciada na vigência do artigo 1379.º/1 do Código Civil com a redação dada pela Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto que passou agora a prescrever no n.º1 que "são nulos os atos de fracionamento ou troca contrários ao disposto nos artigos 1376.º e 1378.º"».
Abra-se aqui um breve parêntesis na transcrição que vimos fazendo para referir que, a propósito da aplicação da lei no tempo, igualmente defende Luís Filipe Pires de Sousa (24) que, tendo a Lei n.º 111/2015 entrado em vigor em 27/09/2015, a nova redação do art. 1379º, n.º 1, do CC, aplica-se aos atos ilícitos de fracionamento ou troca ocorridos a partir de 27/09/2015 (art. 12º, n.º 2, primeira parte do CC). Ou seja, os atos ilícitos de fracionamento ou troca ocorridos até 26/09/2015 permanecem anuláveis, sendo nulos apenas os praticados a partir de 27/09/2015.

E, versando já sobre a cindibilidade do fracionamento em relação ao loteamento, acrescenta o Conselheiro Salazar Casanova no citado estudo (p. 94):

108. Afigura-se-nos que hoje o interesse público, no tocante ao direito do urbanismo, não parece centrar-se tanto na inviabilização absoluta dos actos de fragmentação da propriedade, mas antes na edificabilidade contra legem.
109. Há, no entanto, uma ideia base que tem atravessado a nossa legislação: impedir que a construção clandestina se desenvolva a coberto de operações de divisão de propriedade.
110. Por isso, não se pode aprioristicamente, perante os casos que se deparam nos tribunais, considerar que a usucapião com base numa situação possessória desencadeada sobre parcela de um imóvel que foi dividido deve ser sempre decretada por não serem atendíveis os interesses que são prosseguidos pelo direito urbanístico; tão pouco deve ser sempre negada a usucapião, por se pressupor que a divisão de um imóvel, designadamente quando se geram parcelas com área inferior à unidade de cultura, se traduz sempre numa operação de loteamento.
111. Neste ponto de interacção da usucapião e do direito do urbanismo temos por certo que os tribunais, sensata e paulatinamente, vão continuar a prestar a sua colaboração para o aperfeiçoamento do Direito”.

Concordando com este entendimento, também no Ac. do STJ de 12/07/2018 (relator Fonseca Ramos), in www.dgsi.pt., se preconiza a questão do tratamento diferenciado a dar às diferentes situações que envolvem a questão da usucapião em casos de fracionamento de terrenos agrícolas, posto que, como aí se refere, só “casuisticamente e não aprioristicamente, devem os tribunais apreciar a validade dos actos de divisão e fraccionamento da propriedade rústica, em casos como o versado no recurso”.
Sendo essa a posição a que se adere, importa, porém, aferir se a entrada em vigor da Lei n.º 89/2019, de 03.09.2019 tem alguma implicação no caso submetido à nossa apreciação, posto se depreender ter sido a mesma considerada decisiva no sentido da decisão tomada na sentença recorrida.

O citado diploma - relembre-se -, que procedeu à primeira alteração à Lei n.º 111/2015, de 27/08, que estabelece o regime jurídico da estruturação fundiária, alterou o art. 48º, estabelecendo:

«2 - A posse de terrenos aptos para cultura não faculta ao seu possuidor a justificação do direito a que esta diz respeito, ao abrigo do regime da usucapião, sempre que a sua aquisição resulte de atos contrários ao disposto no artigo 1376.º do Código Civil.
3 - São nulos os atos de justificação de direitos a que se refere o número anterior».

Como se refere (e bem) na sentença recorrida, “embora referindo-se apenas à situação da justificação de direitos, situação prevista no art.º 24.º do mesmo diploma, não poderá, obviamente, a regra deixar de se aplicar a qualquer outro meio processual que implique a aquisição prescritiva de direitos sobre terrenos aptos para cultura com área inferior à unidade de cultura. É a interpretação que melhor se coaduna com o elemento histórico - o supra abordado combate ao fracionamento de terrenos aptos para cultura - e com o factor da unidade do sistema jurídico, nos termos do art.º 9.º, n.º 1, do Código Civil.
E sendo assim, como cremos que é, a aludida disposição influencia a interpretação do art.º 1376.º, n.º 1, do Código Civil, no sentido de a proibição aí prevista se aplicar mesmo à aquisição de terrenos aptos para cultura de área inferior à unidade de cultura ao abrigo do regime da usucapião”.
Esta foi, identicamente, a posição perfilhada nos acórdãos desta Relação de 05/12/2019 (relatora Anizabel Sousa Pereira) e de 20/02/2020 (relator Jorge Teixeira), ambos disponíveis in www.dgsi.pt., nos quais se concluiu ser inquestionável que “o legislador veio tomar posição sobre esta temática e actualmente prevê naquela norma excepcional taxativamente que determinada posse não conduz à usucapião”, plasmando assim uma norma interpretativa que visou colocar um ponto final na controvérsia e à qual não é extensível o princípio da não retroatividade das leis (art. 13º, n.º 1, do CC).
Como é sabido, no tocante à aplicação das leis no tempo, o art. 12º do CC consagra, como princípio geral, o da não retroatividade das leis, estabelecendo, na 1ª parte do n.º 1, que a “lei só dispõe para o futuro”, e não sobre o passado.
Daí que, em regra, as leis não possam ser retroativas, isto é, não possam dispor sobre o que se passou na vida real antes da sua entrada em vigor, não podendo, por exemplo, declarar nulos ou anuláveis atos praticados ou contratos celebrados à luz de normas que os considerassem válidos à data da sua prática ou celebração (25).
Acrescenta a 2ª parte do citado preceito, “ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular”.

E o art. 13º do CC, sob a epígrafe “Aplicação das leis no tempo. Leis interpretativas”, estabelece, no seu n.º 1, que:

A lei interpretativa integra-se na lei interpretada, ficando salvos, porém, os efeitos já produzidos pelo cumprimento da obrigação, por sentença passada em julgado, por transacção, ainda que não homologada, ou por actos de análoga natureza”.

Integrando-se a lei interpretativa na lei interpretada quer-se com isto dizer que, relativamente a leis desta natureza, não há que aplicar o princípio da não retroatividade consignado no art. 12º do CC.
Nas palavras de J. Baptista Machado (26), “a razão pela qual a lei interpretativa se aplica a factos e situações anteriores reside fundamentalmente em que ela, vindo consagrar e fixar uma das interpretações possíveis da LA com que os interessados podiam e deviam contar, não é susceptível de violar expectativas seguras e legitimamente fundadas. Poderemos consequentemente dizer que são de sua natureza interpretativas aquelas leis que, sobre pontos ou questões em que as regras jurídicas aplicáveis são incertas ou o seu sentido controvertido, vem consagrar uma solução que os tribunais poderiam ter adoptado. (...)
Para que uma LN possa ser realmente interpretativa são necessários, portanto, dois requisitos: que a solução do direito anterior seja controvertida ou pelo menos incerta; e que a solução definida pela nova lei se situe dentro dos quadros da controvérsia e seja tal que o julgador ou o intérprete a ela poderiam chegar sem ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e aplicação da lei. Se o julgador ou o intérprete, em face de textos antigos, não podiam sentir-se autorizados a adoptar a solução que a LN vem consagrar, então esta é decididamente inovadora”.

Sendo assim, acompanhamos igualmente a fundamentação da sentença recorrida quando nela se explicita:

«Ora, no que tange à aquisição pela via da usucapião de parcelas de terreno apto para cultura com área inferior à unidade de cultura, embora existindo uma tendência jurisprudencial maioritária anterior à entrada em vigor da Lei n.º 89/2019, de 3 de Setembro, que propendia para a sua aceitação, esta não era uniforme, havendo uma corrente jurisprudencial, seguramente minoritária, no sentido da sua não admissibilidade, (…). Destarte, a lei nova veio consagrar, relativamente a uma questão controversa, uma interpretação do art.º 1376.º, n.º 1, do Código Civil, a que os tribunais já poderiam chegar em face do texto antigo e que, efectivamente, já era partilhada por uma certa corrente jurisprudencial. Por esse motivo, podemos concluir que o art.º 48.º, n.º 2, da Lei n.º 111/2015, de 27 de Agosto [na redação introduzida pela Lei n.º 89/2019, de 03.09], tem natureza interpretativa, integrando-se a proibição constante do mesmo na lei interpretada».

De facto, perante as supra enunciadas divergências (quer na jurisprudência, quer na doutrina) “relativas à questão de saber se a usucapião, como forma originária de adquirir, pode ou não incidir sobre parcela de terreno inferior a unidade de cultura, contrariando o regime previsto no art.º 1376.º/1 do CC, torna-se manifesta a natureza interpretativa da referida norma, da iniciativa, aliás, do órgão legislativo nacional próprio – art. 161º, al. c) da CRP -, como meio de pôr termo à patente diversidade de decisões sobre aquela temática, situando-se a solução definida pela nova lei dentro dos quadros da controvérsia, optando por uma das teses” (27).
Temos, portanto, que, no domínio da sua vigência, perante factos consubstanciadores de uma posse conducente à usucapião, como forma originária de adquirir, não pode aquela usucapião incidir sobre parcela de terreno inferior a unidade de cultura, contrariando o regime previsto no art. 1376.º, n.º 1 do CC (28).
Ora, dispõe o art. 1287.º do CC que a «posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua atuação: é o que se chama usucapião» (sublinhado nosso).
Passando, pois, o art. 48º, n.º 2, da Lei n.º 111/2015, na redação introduzida pela Lei n.º 89/2019, a prever que uma posse exercida sobre terreno apto para cultura que tenha na sua génese um fracionamento ilegal não pode conduzir à usucapião, essa norma é subsumível naquela previsão “salvo disposição em contrário”.
Donde se conclua que, da conjugação do disposto no art. 48º, n.º 2 da Lei n.º 89/2019, de 03.09 e arts. 1376.º, n.º 1, com o n.º 1 do art. 1379.º, na sua versão atual, fica excluída a aquisição, por usucapião, de parcela de terreno inferior à área correspondente à unidade de cultura (29).
Dito isto, importa, todavia, atermo-nos aos limites da chamada retroatividade da lei interpretativa.
Considerando-se a lei interpretativa integrada na lei interpretada, significa isto que retroage os seus efeitos até à data da entrada em vigor da antiga lei, tudo correndo como se tivesse sido publicada na data em que o foi a lei interpretada (30).
Porém, no período decorrido entre a entrada em vigor da lei interpretada e o da lei interpretativa, múltiplos factos e atos jurídicos podem ter sido praticados, porventura de harmonia com uma interpretação diferente daquela que agora é consagrada na lei interpretativa. Seria uma “grave injustiça que ficassem eliminados ope legis, ou pudessem vir a ser anulados ope judicis, todos os atos praticados medio tempore; sobretudo se esses atos tivessem tido carácter definitivo, final, conclusivo, dando lugar a casos resolvidos” (31).
Daí que se mostre consagrado que a retroatividade da lei interpretativa não é irrestrita, dado que não atinge todos os factos passados e todos os efeitos já produzidos.
Por isso na 2ª parte do n.º 1 do art. 13º do CC determina-se que a lei interpretativa não atinge os efeitos já produzidos, ao abrigo da lei interpretada, pelo cumprimento das obrigações, pelo caso julgado, pela transacção ou actos de natureza análoga.
Podemos assim concluir que a lei interpretativa “tem carácter retroactivo integrando-se na lei interpretada, com que fica constituindo um todo único”, sendo que “a essa retroactividade escapam os efeitos já produzidos” (32).
Todavia, mesmo não lhe sendo aplicável o princípio da não retroactividade, a lei interpretativa nunca poderá estender os seus efeitos para além do início da vigência da Lei interpretada (33), posto que a eficácia retroativa das leis interpretativas é reportada ao momento do início de vigência da lei interpretada.
Deste modo, como se assinala no citado acórdão desta Relação de 20/02/2020 (relator Jorge Teixeira), a questão que se coloca é a de saber “como solucionar as situações factuais existentes e reportadas na verificação dos requisitos da usucapião a momento anterior aos da consagração do repúdio legal da criação de novos prédios rústicos com área inferior à unidade de cultura, que apenas se tornou absoluto com a Lei n.º 111/2015, pois que, no âmbito da vigência do art. 1379º, nº 1, do CC, com a redacção que previa a anulabilidade para os actos jurídicos de fraccionamento dos prédios rústicos, em razão da convalescença admitida por via da caducidade do direito de a arguir e da eficácia não automática daquela invalidade, afastava-se ou não se considerava haver impossibilidade legal da autonomização das parcelas, que o novo regime legal agora consagra, no referido preceito legal”.

Ora, como resulta do art. 1287º do CC, o instituto da usucapião assenta na existência da posse, definida, nos termos do art. 1251º do CC, como a que se manifesta quando alguém atua (corpus) por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real (animus) (34), mantida, de forma ininterrupta, pacífica e pública (35) (cfr. arts. 1261º, 1262º, 1293º, al. a), 1297 e 1300º, n.º 1, do CC), durante um certo lapso de tempo, o qual varia em função da natureza do bem (móvel ou imóvel) sobre que incide e de acordo com os caracteres da mesma posse (titulada ou não titulada e de boa fé ou de má fé – cfr. arts. 1259º, 1260º e 1294º, todos do CC) (36) (37).

Refere Menezes Cordeiro:

A usucapião em termos materiais assenta na excelência de uma posse qualificada e longa, surgindo como fonte legitimadora do domínio. O possuidor mostrou merecer ser proprietário. Paralelamente, qualquer outro pretendente veio a colocar-se, pelo seu desinteresse, na posição inversa de não merecer mais a titularidade que, de facto, enjeitou.

Em suma: a usucapião realiza a velha aspiração histórico-social de reconhecer o domínio a quem, de facto, trabalhe os bens disponíveis e lhes dê utilidade pessoal e social”.

A usucapião é, assim, uma forma de aquisição originária do direito de propriedade, que, no dizer do Ac. do STJ de 27/06/2006 (relator Alves Velho), in www.dgsi.pt., «se funda direta e imediatamente na posse, cujo conteúdo define o do direito adquirido, com absoluta independência relativamente aos direitos que antes dessa aquisição tenham incidido sobre a coisa (…)».

Continuando a citar o referido acórdão, aí se refere que, “invocada a usucapião, como forma de aquisição, justamente porque de aquisição originária se trata, irrelevam quaisquer irregularidades precedentes e eventualmente atinentes à alienação ou transferência da coisa para o novo titular, sejam os vícios de natureza formal ou substancial.
O que passa a relevar e a obter tutela jurídica é a realidade substancial sobre a qual incide a situação de posse. Concorrendo, aferidas pelas características desta, os requisitos da usucapião, os vícios anteriores não afectam o novo direito, que decorre apenas dessa posse, em cujo início de exercício corta todos os laços com eventuais direitos e vícios, incluindo de transmissão, anteriormente existentes”.

Invocada como título de aquisição da propriedade a usucapião (art. 303º “ex vi” do art. 1292º, ambos do CC) e quando se reconheça a verificação dos correspondentes requisitos legais (posse prolongada no tempo; por período suficiente), os seus efeitos retrotraem-se à data do início da posse (cfr. art. 1288º do CC), adquirindo-se o direito de propriedade no momento em que se iniciou a posse (cfr. art. 1317º, al. c), do CC).
Tendo a usucapião efeitos retroativos à data do início da posse, a lei aplicável é, sem dúvidas, a vigente à data do início da posse, pois é esse o momento em que, em conformidade com a lei, o direito de propriedade se deve considerar constituído. Será assim essa lei que indicará se pode haver fraccionamento do prédio e se o mesmo for fracionado em violação da lei quais as consequências que daí decorrem (38).

Em face do exposto, se, por um lado, nos merece concordância a afirmação contida na sentença recorrida no sentido de que o art. 48.º, n.º 2, da Lei n.º 111/2015, de 27/08, na redação introduzida pela Lei n.º 89/2019, de 03/09, reveste natureza imperativa e que a proibição dele constante se integra na lei interpretada, dela, porém, discordamos na parte em que pugna pela sua (direta e imediata) aplicação ao caso sub júdice para concluir pela ilegalidade da pretensão das requeridas no sentido de visarem o reconhecimento da divisão da unidade predial constituída pelos dois prédios rústicos descritos no ponto 1) dos factos provados, por usucapião, em parcelas com área inferior à unidade de cultura.
Como vimos, a data que releva para aferir se foram ou não violadas normas legais imperativas que tutelam o interesse público é a data do início da posse, ou seja, meados da década de 80, pelo que é de excluir a aplicação ao caso em apreço da proibição imposta no art. 48.º, n.º 2, da Lei n.º 111/2015, na redação dada pela Lei n.º 89/2019.
Importa, por isso, repristinar o que anteriormente explicitámos quanto à solução a adotar em função do tratamento diferenciado a dar às diferentes situações que envolvem a questão da usucapião em casos de fracionamento de prédios rústicos aptos para cultura, pois que só “casuisticamente e não aprioristicamente, devem os tribunais apreciar a validade dos actos de divisão e fraccionamento da propriedade rústica” (39).

No caso, estamos perante uma divisão material de prédios rústicos, sem que se intrometa qualquer outra questão de natureza urbanística que porventura encontre nas respetivas regras consequências mais gravosas do que a anulabilidade prevista na primitiva redação do n.º 1 do art. 1379º do CC.
E, tendo-se verificado a divisão material dos prédios em três parcelas em meados da década de 80, a partir daí iniciou-se uma situação de posse prolongada e ininterrupta sobre cada uma das referidas parcelas de terreno, o que, independentemente do vício de anulabilidade que sequer foi invocado por qualquer dos interessados, determinou a constituição originária do direito de propriedade sobre cada uma delas por via do instituto da usucapião (40).
Considerando, pois, a natureza da posse exercida pelas requeridas (por um lado, os actos materiais de posse começaram a ser praticados em meados da década de 80, e, por outro, o lapso de tempo entretanto decorrido com manutenção de posse ininterrupta) “e sendo a usucapião um instituto do direito privado com enorme relevância jurídica na estabilização e consolidação de situações baseadas numa posse digna de relevância no âmbito do direito real de propriedade e atendendo a que a protecção da segurança e a da confiança na actuação dos possuidores é inerente a um direito que, nascendo ex novo, sobrepuja e desconsidera actuações, ainda que ilícitas, que não afectam retroactivamente a posse relevante e boa para a usucapião”, é de concluir que as requeridas “adquiriram o direito de propriedade originariamente pela via da usucapião” (41).

No caso dos autos, a posse das recorrentes, apesar de não titulada e de não ter sido objeto de registo, é de boa fé (42) (pontos 15 a 19 dos factos provados), ocorrendo a usucapião ao fim de 15 anos (art. 1296º do CC), já consumada à data da propositura da ação (43).
Assim, na consideração de que, no caso dos autos, a usucapião opera de pleno, procedem as conclusões das recorrentes, o que determina a improcedência da ação de divisão de coisa comum e a procedência do pedido reconvencional.
*
Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 527º do CPC, a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte que lhes tiver dado causa, presumindo-se que lhes deu causa a parte vencida, na respetiva proporção.
Como a apelação foi julgada procedente, mercê do princípio da causalidade, as custas da apelação serão da responsabilidade dos recorridos e as da ação (incluindo as da reconvenção) a cargo dos AA./requerentes (art. 527º do CPC).
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Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, n.º 7 do CPC):

I - A data ou momento relevante para aferir se o reconhecimento do direito de propriedade, adquirido por usucapião, infringe ou não as invocadas regras legais limitativas do fraccionamento de prédios rústicos é a do início da posse.
II - Tendo a usucapião efeitos retroativos à data do início da posse (cfr. art. 1288º do CC do CC), será a lei vigente nessa data que indicará se pode haver fraccionamento do prédio e se o mesmo for fracionado em violação da lei quais as consequências que daí decorrem.
III - À luz da lei vigente em meados da década de 80 o fracionamento de prédios rústicos em área inferir à unidade de cultura não seria nulo, quando muito anulável, a arguir no prazo de 3 (três) anos, sob pena de caducidade da ação de anulação (primitiva redação dos n.ºs 1 e 3 do art. 1379º do CC).
IV - Estando em causa uma divisão material de prédios rústicos e não se verificando qualquer questão de natureza urbanística, a anulabilidade do ato de fracionamento de prédios rústicos, em violação do disposto no art. 1376º do CC, não impede a aquisição originária do direito de propriedade por via da usucapião.
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VI. DECISÃO

Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação, e, em consequência, revogando a sentença recorrida, decidem:

- Julgar totalmente improcedente a ação.
- Julgar procedente a reconvenção, condenando os autores e os demais co-réus a reconhecer a existência de três prédios distintos, divididos e demarcados, desde meados da década de 80, abstendo-se de praticar quaisquer actos que perturbem ou impeçam a existência ou o exercício dos referidos direitos, com todas as legais consequências, nomeadamente declarando-se que as Rés M. F., R. O. e sua irmã C. O. são únicas donas e legítimas possuidoras do prédio correspondente à parcela de terreno devidamente demarcada e dividida com a área de cerca de 420 m2, sita no Lugar da ..., freguesia de ..., concelho de Vila Verde.
Custas da ação a cargo dos AA./requerentes e da apelação a cargo dos apelados (art. 527º do CPC).
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Guimarães, 30 de abril de 2020

Alcides Rodrigues (relator)
Joaquim Boavida (1º adjunto)
Paulo Reis (2º adjunto)




1. Cfr. Ac. do STJ de 7/06/2011 (relator Nuno Cameira), disponível em www.dgsi.pt.
2. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. III, 2ª ed. Coimbra Editora, p. 259.
3. Cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, Processos Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas, 2017, Almedina, p. 35.
4. Cfr. Armando Triunfante, Lições de Direitos Reais, Almedina, p. 191.
5. Cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, Processos Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas, 2017, Almedina, p. 39.
6. A proibição do fracionamento, como resulta do art. 1377º do CC, não é aplicável: «a) A terrenos que constituam partes componentes de prédios urbanos ou se destinem a algum fim que não seja a cultura; b) Se o adquirente da parcela resultante do fraccionamento for proprietário de terreno contíguo ao adquirido, desde que a área da parte restante do terreno fraccionado corresponda, pelo menos, a uma unidade de cultura; c) Se o fraccionamento tiver por fim a desintegração de terrenos para construção ou rectificação de estremas».
7. Na redação anterior à introduzida pela Lei n.º 111/2015, de 27.08, entrada em vigor em 27/09/2015.
8. Cujo n.º 1 previa que “os terrenos aptos para cultura não podem fracionar-se em parcelas de área inferior a determinada superfície mínima correspondente à unidade de cultura fixada pelo Governo para cada zona do País”, cominando o n.º 2 com a “nulidade” os atos de divisão contrários ao disposto no n.º 1.
9. Cfr. Luís Filipe Cravo, Estudos em Comemoração dos 100 anos do Tribunal da Relação de Coimbra, “Fracionamento da Propriedade: será a usucapião um instituto em vias de extinção?”, Almedina, 2018, pp. 125 a 134.
10. Cfr., a título exemplificativo, os acórdãos do STJ de 18/06/2019 (relatora Graça Amaral), de 30/05/2019 (relatora Rosa Ribeiro Coelho), de 01/03/2018 (relatora Rosa Tching), de 12/07/2018 (relator Fonseca Ramos), de 04/02/2014 (relator Fernandes do Vale), de 27/06/2006 (relator Alves Velho) e de 19/10/2004 (relator Azevedo Ramos), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
11. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, p. 263.
12. Cfr. Mota Pinto, “Teoria Geral do Direito Civil, 3ª ed. Atualizada, Coimbra Editora, p. 611.
13. Cfr. Teoria Geral, 1979, Vol. II, p. 235.
14. Cfr. obra citada, p. 269.
15. Cfr., Ac. do STJ de 18/06/2019 (relatora Graça Amaral), in www.dgsi.pt.
16. Cfr. Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. II, Almedina, 1987, p. 418.
17. Cfr., a título exemplificativo, os acórdãos do STJ de 30.4.2015, (relator Salazar Casanova), de 26.01.2016 (relator Sebastião Póvoas), de 06.03.2014 (relator Salazar Casanova), de 02.02.2010 (relator João Camilo) e Acs. da RE de 25.05.2017 (relator Tomé Ramião) e de 26.10.2017 (relator Canelas Brás), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
18. Cfr. “Acessão industrial imobiliária e usucapião parciais versus destaque”, em Da Intersecção entre o Direito Civil e o Direito Urbanístico, p. 810.
19. Cfr. Usucapião, Constituição Originária de Direitos Através da Posse, p. 35.
20. Cfr. obra citada, pp. 191/192.
21. Cfr. Estudo citado, pp. 125 a 134.
22. Cfr., neste sentido, Acórdão desta Relação de 13/02/2020 (relatora Margarida Sousa), disponível em www.dgsi.pt.
23. Disponivel in http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/civil/eb_Interacao_Adm_Civil.pdf.
24. Cfr., obra citada, p. 39.
25. Cfr. Diogo Freitas do Amaral, Código Civil Anotado, Vol. I (artigos 1º a 1250º), Almedina, Coord. Ana Prata, 2017, pp. 31/32.
26. Cfr. A aplicação da lei no tempo e no espaço, in Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1995, pp. 246-247.
27. Cfr. Ac. desta Relação de 05/12/2019 (relatora Anizabel Sousa Pereira), disponível in www.dgsi.pt.
28. Cfr. Ac. desta Relação de 20/02/2020 (relator Jorge Teixeira), disponível in www.dgsi.pt.
29. Cfr. Acs. desta Relação de 05/12/2019 (relatora Anizabel Sousa Pereira) e de 20/02/2020 (relator Jorge Teixeira), disponíveis in www.dgsi.pt.
30. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, obra citada, p. 62.
31. Cfr. Diogo Freitas do Amaral, obra citada, p. 35.
32. Cfr. Galvão Telles citado por A. Santos Justo, in Introdução ao Estudo do Direito, 4ª ed., Coimbra Editora, 2009, p. 390.
33. Cfr. Ac. desta Relação de 20/02/2020 (relator Jorge Teixeira), disponível in www.dgsi.pt.
34. O “corpus”, enquanto elemento material ou empírico, identifica-se com os actos materiais praticados ou com o exercício de certos poderes de facto sobre a coisa. O “animus”, como elemento psicológico-jurídico, traduz-se na intenção de se comportar como titular do direito real correspondente aos actos praticados. – cfr. Mota Pinto, Direitos Reais, lições coligidas por Álvaro Moreira e Carlos Fraga, Almedina, 1971, p. 181.
35. Fala-se em posse boa para a usucapião à posse que permite a aquisição do direito real de gozo, a qual deverá revestir determinadas características, nomeadamente, ser pública e pacífica. Isso retira-se, no tocante aos imóveis, do art. 1297º do CC, que estabelece que, “se a posse tiver sido constituída com violência ou tomada ocultamente, os prazos da usucapião só começam a contar-se desde que cesse a violência ou a posse se torne pública”. Como se refere no Ac. do STJ de 11/09/2012 (relator Nuno Cameira), in www.dgsi.pt., “a posse boa para usucapião é somente a que for pública e pacífica, ou seja, a exercida de modo a poder ser conhecida pelos interessados e adquirida sem coacção física ou moral, nos termos do art. 255.º do CC”, sendo que “os restantes caracteres da posse – o ser de boa ou má fé, titulada ou não e registada ou não – influem no prazo necessário para a aquisição por usucapião”.
36. Não havendo registo do título nem da mera posse, sendo a posse de boa fé, o prazo para a usucapião é de quinze anos; sendo a posse de má fé, o prazo para a usucapião é de vinte anos (art. 1296º do CC).
37. Cfr. Ac. do STJ de 1/03/2018 (relatora Rosa Tching), disponível in www.dgsi.pt.
38. Cfr. Acs. do STJ de 08/11/2018 (relator Abrantes Geraldes), 2/05/2019 (relatora Maria da Graça Trigo) e de 24/10/2019 (relatora Fátima Gomes), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
39. Em função do já enunciado entendimento sufragado nos Acs. do STJ de 08/11/2018 (relator Abrantes Geraldes) e de 12/07/2018 (relator Fonseca Ramos), disponíveis in www.dgsi.pt., bem como no citado Estudo do Conselheiro Salazar Casanova.
40. Cfr. Ac. do STJ de 08/11/2018 (relator Abrantes Geraldes), in www.dgsi.pt.
41. Cfr. Ac. do STJ de 12/07/2018 (relator Fonseca Ramos), in www.dgsi.pt.
42. Mostrando-se ilidida a presunção estabelecida no art. 1260º, n.º 2, do CC, nos termos da qual a posse não titulada presume-se de má fé.
43. Contudo, a idêntica conclusão se chegaria na hipótese de não se considerar ilidida a enunciada presunção de má fé da posse não titulada prescrita no art. 1260º, n.º 2, do CC, cuja usucapião ocorreria ao fim de 20 anos (art. 1296º do CC).