Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
7032/20.0T8VNF-A.G1
Relator: ALDA MARTINS
Descritores: PERÍODO EXPERIMENTAL
SUCESSÃO DE CONTRATOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/20/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
Sumário (elaborado pela Relatora):

I – Nos termos do n.º 4 do art. 112.º do Código do Trabalho, o período experimental é reduzido ou excluído em função da duração de anteriores contratações do mesmo trabalhador pelo mesmo empregador, para a prestação de actividade idêntica, designadamente através de contrato a termo, contrato de trabalho temporário, contrato de prestação de serviços ou estágio profissional, e, em geral, em todas as situações em que a prévia prestação da actividade cumpriu a função atribuída ao período experimental, justificando a exclusão ou redução deste para obviar a que, na prática, se alcançasse a ampliação dos prazos máximos legal ou convencionalmente estabelecidos para a sua duração, com a consequente ampliação do direito de denúncia livre e sem indemnização.
II – Ocorrendo entre as prestações da actividade uma dilação que possa acarretar modificações significativas, mormente tecnológicas ou organizacionais, incluindo a nível dos colegas, superiores hierárquicos ou dirigentes com que o trabalhador terá de se relacionar, susceptíveis de se reflectirem diferentemente na adaptabilidade e desempenho deste, relativamente às contratações anteriores, justifica-se a utilização plena do período experimental estabelecido legal ou convencionalmente.
III –Tendo o trabalhador prestado o seu trabalho ao empregador durante 70 dias entre 01/08/2019 e 09/10/2019, o período experimental de 90 dias estabelecido por CCT estava reduzido a 20 dias no contrato celebrado por aqueles no subsequente mês de Novembro, e, assim, ainda que tendo vigorado este contrato apenas entre 14/11/2019 e 22/12/2019, a dispensa pelo empregador nesta última data ultrapassava já em 19 dias o termo do período experimental.

Alda Martins
Decisão Texto Integral:
1. Relatório

M. J. intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra Transportes X, Lda., pedindo:

a) a declaração de ilicitude do despedimento promovido pela ré;
b) a condenação da ré a pagar-lhe;
a. em substituição da reintegração, uma indemnização no montante de 2.100,00 €;
b. as retribuições, complementos salariais e ajudas de custo desde 6 de Janeiro de 2020 até ao trânsito em julgado da decisão;
c. o montante de 2.232,06 € referente às retribuição e ajudas de custo de Dezembro de 2019 e Janeiro de 2020, vencidas e não pagas;
d. o montante de 2.500,00 € a título de indemnização por danos não patrimoniais;
tudo acrescido de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa legal em vigor, desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Alega, em síntese, que, depois de já ter laborado para a ré entre 01/08/2019 e 09/10/2019, foi contratado por esta em 11/11/2019 para sob a sua autoridade e direção exercer as funções de motorista internacional de pesados, mediante o pagamento da retribuição mensal de 630,00 €, acrescida do complemento salarial de 31,50 € a que se refere a cláusula 45.ª do CCT aplicável, bem como de uma ajuda de custo TIR no valor mensal de 130,00 € e da compensação pecuniária prevista nas cláusulas 48.ª e 61.ª desse mesmo CCT, no montante de 63,00 € e 372,60 €, respetivamente, para além do pagamento das ajudas de custo diárias, no montante de 36,40 €. No dia 06/01/2020, o legal representante da ré despediu-o verbalmente, pelo que entende tratar-se de um despedimento ilícito, o qual quer ver declarado. Para além das consequências de tal ilicitude, pretende a condenação da ré no pagamento de uma série de créditos laborais que diz estarem em dívida e que elenca.
A ré contestou, admitindo a existência do contrato de trabalho mas dizendo que este teve início em 14/11/2019 e que a dispensa do autor ocorreu em 22/12/2019 e não na data alegada pelo mesmo, motivo pelo qual defende que ocorreu no decurso do período experimental, tanto mais que a profissão de motorista deve ser considerada altamente qualificada, sendo aquele de 180 dias. No mais, impugna a restante matéria alegada pelo autor e termina pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.
Realizou-se audiência prévia, após o que proferiu-se despacho saneador, onde, além do mais, se entendeu que os autos reuniam todos os elementos necessários à imediata decisão parcial do mérito do pedido, que terminou com o seguinte dispositivo:
«Assim e nos termos expostos, julgo a ação parcialmente procedente por provada e, consequentemente:
A) declaro ilícito o despedimento do autor M. J., promovido pela ré Transportes X, Lda.;
B) condeno a ré Transportes X, Lda. a pagar ao autor M. J.;
a. em substituição da reintegração, uma indemnização no montante de 2.100,00€ (dois mil e cem euros);
b. as retribuições, complementos salariais e ajudas de custo vincendas, desde 16 de novembro de 2020 até ao trânsito em julgado da presente decisão, no valor mensal de 1.292,80€ (mil, duzentos e noventa e dois euros e oitenta cêntimos);
c. o montante de 1.664,27€ (mil, seiscentos e vinte e quatro euros e vinte e sete cêntimos), referente à retribuição e ajudas de custo devidas até 22 de dezembro de 2019;
tudo acrescido de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa legal de 4%, desde a citação até efetivo e integral pagamento.
A repartição da responsabilidade por custas será determinada a final, consoante o decaimento na parte ainda em discussão.»

A ré interpôs recurso do despacho saneador-sentença, formulando as seguintes conclusões:

«1. A decisão recorrida baseia toda a sua linha de fundamentação no pressuposto errado de que a r. não tenha posto em causa a existência de contrato de trabalho anterior, que teria vigorado entre as partes entre 01/08/2019 e 09/10/2019.
2. E que por isso mesmo o A. não foi despedido no período experimental, o que levaria, inexoravelmente ao despedimento ilícito.
3. Ora, salvo o devido respeito por diferente opinião, não pode a recorrente estar de acordo com tal decisão.
4. O n.º 4 do artigo 112.° do Código do Trabalho não estabelece qualquer limite temporal para a sucessão contratual.
5. Por outro lado, não cremos justificável que o facto do empregador ter conhecido um determinado profissional, em certa data e circunstâncias, constitua motivo suficiente para o legislador conjecturar que as qualidades daquele tenham permanecido imutáveis. Assim, e uma vez decorrido um período de tempo com alguma duração (dois três meses) deverá entender-se que o empregador, querendo contratar por tempo indeterminado poderá dispor de um período de prova, destinado a comprovar se se conservam as qualidades daquele profissional que anteriormente já exerceu a sua atividade. (VG. Código do Trabalho Comentado, Diogo Vaz Marecos, 2017, 3.ª Edição pp. 312 e ss.)
6. Ora se assim é, como parece que é (até porque foi o A. que se despediu na primeira ligação laboral com a r., dando inclusivamente nota de que “aquela profissão não seria o seu sonho, o seu sonho seria andar com uma banda do tipo “U2”), o que levantou uma nuvem de suspeitas quanto às qualidades e capacidades do A. para o exercício das funções de motorista de TIR, tudo leva a crer que o período experimental, in casu, não deve nem pode ser reduzido, devendo aplicar-se o período experimental de 90 dias da CCT, que ainda estava a decorrer, o que torna, de forma absolutamente transparente, o despedimento LICITO.
7. A decisão recorrida viola os artigos 112.º e 114.º do Código do Trabalho e a clausula 6.º, n.° 1, al. c) da CCT celebrada entre ANTRAM e FECTRANS publicada no BTE 1.ª série, n.º 34, de 15 de setembro de 2018.»

O autor não apresentou resposta ao recurso da ré.
O recurso foi admitido como apelação, para subir imediatamente, em separado, com efeito meramente devolutivo.
Recebidos os autos nesta Relação, o Senhor Procurador Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, tendo a ré respondido a discordar.
Vistos os autos pelas Exmas. Adjuntas, cumpre decidir.

2. Objecto do recurso

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil –, a questão colocada pela Apelante a este Tribunal é a de saber se o autor foi dispensado no decurso do período experimental e tal dispensa não equivale a despedimento ilícito.

3. Fundamentação de facto

Os factos provados são os seguintes:

A) A ré é uma sociedade comercial que se dedica à atividade de transporte rodoviário de mercadorias;
B) No exercício da sua atividade, a ré admitiu, ao seu serviço, o autor;
C) Para tanto, a ré celebrou com o autor um contrato de trabalho de forma verbal, com início em Novembro de 2019;
D) O autor já anteriormente havia laborado para a ré, nomeadamente no período compreendido entre 01/08/2019 e 09/10/2019;
E) A partir de Novembro de 2019, o autor começou a trabalhar sob a autoridade, direção e fiscalização da ré, com a categoria de motorista de pesados internacional;
F) Como contrapartida do trabalho prestado, a ré acordou pagar ao autor a retribuição de:
a. 630,00 € de retribuição base;
b. complemento salarial de 31,50 € a que se refere a cláusula 45.ª do CCT aplicável;
c. uma ajuda de custo TIR no valor de 130,00 € mensais;
d. a compensação pecuniária prevista nas cláusulas 48.ª e 61.ª desse mesmo CCT, no montante de 63,00 € e 372,60 €, respetivamente;
e. ajudas de custo diárias, no montante de 36,40 €;
G) Por sua vez, o autor obrigou-se perante a ré a laborar para esta um período de trabalho diário de 8 horas, ou seja, de 40 horas semanais;
H) À relação laboral entre autor e ré aplicava-se o CCT celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS, publicada no BTE 1.ª série, n.º 34, de 15 de Setembro de 2018;
I) A ré não pagou ao autor a retribuição devida pelo trabalho prestado no mês de Dezembro de 2019.
J) O autor prestou trabalho à ré entre, pelo menos, 14/11/2019 e 22/12/2019, deixando de o fazer em virtude de a ré o ter dispensado.

4. Apreciação do recurso

Como se referiu, a questão colocada pela Apelante a este Tribunal é a de saber se o autor foi dispensado no decurso do período experimental e tal dispensa não equivale a despedimento ilícito.
Assim, nos termos dos arts. 607.º, n.º 4, 662.º, n.º 1 e 663.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, pela sua pertinência, determina-se oficiosamente o aditamento sob a alínea J) do seguinte facto admitido pelas partes nos articulados (que, não obstante não consignado como tal, foi tido em conta pelo tribunal recorrido na fundamentação jurídica): «O autor prestou trabalho à ré entre, pelo menos, 14/11/2019 e 22/12/2019, deixando de o fazer em virtude de a ré o ter dispensado.»
Posto isto, temos que se provou com interesse que a ré celebrou com o autor um contrato de trabalho na forma verbal, com início em Novembro de 2019, para o exercício de funções de motorista de pesados internacional, e que o autor prestou trabalho à ré entre, pelo menos, 14/11/2019 e 22/12/2019, deixando de o fazer em virtude de a ré o ter dispensado. Mais se provou que o autor já anteriormente havia trabalhado para a ré no período compreendido entre 01/08/2019 e 09/10/2019.
De acordo com o art. 111.º, n.ºs 1 e 2 do Código do Trabalho, o período experimental corresponde ao tempo inicial de execução do contrato de trabalho, durante o qual as partes apreciam o interesse na sua manutenção, devendo agir de modo a que possam alcançar tal finalidade.
Tendo em conta tal desiderato, nos termos do art. 114.º, n.º 1 do mesmo diploma, durante o período experimental, salvo acordo escrito em contrário, qualquer das partes pode denunciar o contrato sem aviso prévio e invocação de justa causa, nem direito a indemnização.

Quanto à duração do período experimental, estabelece o art. 112.º do mesmo Código:
1 - No contrato de trabalho por tempo indeterminado, o período experimental tem a seguinte duração:
a) 90 dias para a generalidade dos trabalhadores;
b) 180 dias para trabalhadores que:
i) Exerçam cargos de complexidade técnica, elevado grau de responsabilidade ou que pressuponham uma especial qualificação;
ii) Desempenhem funções de confiança;
iii) Estejam à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração;
c) 240 dias para trabalhador que exerça cargo de direcção ou quadro superior.
2 - No contrato de trabalho a termo, o período experimental tem a seguinte duração:
a) 30 dias em caso de contrato com duração igual ou superior a seis meses;
b) 15 dias em caso de contrato a termo certo com duração inferior a seis meses ou de contrato a termo incerto cuja duração previsível não ultrapasse aquele limite.
3 - No contrato em comissão de serviço, a existência de período experimental depende de estipulação expressa no acordo, não podendo exceder 180 dias.
4 - O período experimental, de acordo com qualquer dos números anteriores, é reduzido ou excluído, consoante a duração de anterior contrato a termo para a mesma actividade, de contrato de trabalho temporário executado no mesmo posto de trabalho, de contrato de prestação de serviços para o mesmo objecto, ou ainda de estágio profissional para a mesma actividade, tenha sido inferior ou igual ou superior à duração daquele, desde que em qualquer dos casos sejam celebrados pelo mesmo empregador.
5 - A duração do período experimental pode ser reduzida por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou por acordo escrito entre partes.
6 - A antiguidade do trabalhador conta-se desde o início do período experimental.

No caso dos autos, tendo o autor sido contratado para o exercício de funções de motorista de pesados internacional, e sendo aplicável o CCT celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS, publicado no BTE 1.ª série, n.º 34, de 15 de Setembro de 2018, o período experimental era de 90 dias, nos termos da respectiva cláusula 6.ª, n.º 1, al. c), prevalecendo sobre eventuais períodos superiores que decorressem do n.º 1 do art. 112.º do Código do Trabalho, por força do n.º 5 do mesmo.
O tribunal a quo também partiu desse entendimento de que o período experimental era de 90 dias, mas, invocando o n.º 4 do citado art. 112.º, atendeu na sua contabilização ao tempo de trabalho prestado pelo autor à ré entre 01/08/2019 e 09/10/2019 (70 dias), considerando que, ainda que o contrato tivesse vigorado apenas entre 14/11/2019 e 22/12/2019 (39 dias), a dispensa pela ré teria ocorrido já depois de findo o período experimental, equivalendo a despedimento ilícito.
No seu recurso, a Apelante aceita que o período experimental do autor era de 90 dias mas rejeita a sua redução por aplicação do aludido n.º 4 do art. 112.º do Código do Trabalho.
Esta disposição prescreve a redução ou exclusão do período experimental em função da duração de anteriores contratações do mesmo trabalhador pelo mesmo empregador, para a prestação de actividade idêntica, designadamente através de contrato a termo, contrato de trabalho temporário, contrato de prestação de serviços ou estágio profissional. E, embora esta enumeração pareça apontar prima facie no sentido da inserção da regra no âmbito da política de combate às práticas fraudulentas na contratação precária, a redacção aberta da norma, abrangendo, quer situações de utilização indevida, quer situações de utilização lícita daquelas formas de contratação, leva a concluir que a razão de ser do preceito radica sobretudo na presumida desnecessidade de sujeição do novo contrato ao normal período experimental, por as partes já terem um conhecimento mútuo que justifica a sua redução ou exclusão. A solução, aliás, já era deduzível de princípios gerais aplicáveis àquelas e outras situações em que existe um prévio conhecimento recíproco das partes relevante para a apreciação do interesse na celebração ou manutenção do contrato de trabalho. Assim, por maioria de razão, deve entender-se que a norma abarca a hipótese em que mais compreensivelmente se imporia à luz de tal propósito, ou seja, a de o mesmo trabalhador já ter executado a mesma actividade para o mesmo empregador através de um contrato de trabalho por tempo indeterminado, como parece ser o caso dos autos. (1)
Em suma, diremos que a teleologia da norma contida no n.º 4 do art. 112.º do Código do Trabalho autoriza que a mesma se aplique a todas as situações em que uma prévia prestação da actividade cumpriu a função atribuída ao período experimental, justificando a exclusão ou redução deste para obviar a que, na prática, se alcançasse a ampliação dos prazos máximos estabelecidos legal ou convencionalmente para a sua duração, com a consequente ampliação do direito de denúncia livre e sem indemnização.
Em face do exposto, considera-se que a norma em apreço não deixa de ter aplicação no caso dos autos pelo mero facto de não estar provado que o trabalho prestado pelo autor à ré entre 01/08/2019 e 09/10/2019 teve na sua base um contrato a termo, um contrato de trabalho temporário, um contrato de prestação de serviços ou um estágio profissional.
A Recorrente, aliás, não faz uso de tal argumento, limitando-se a discutir a aplicabilidade da regra em razão da dilação entre as sucessivas contratações, defendendo que, «(…) decorrido um período de tempo com alguma duração (dois, três meses), deverá entender-se que o empregador, querendo contratar por tempo indeterminado, poderá dispor de um período de prova, destinado a comprovar se se conservam as qualidades daquele profissional que anteriormente já exerceu a sua atividade (…)».
Ora, concede-se que seja relevante uma dilação que possa acarretar modificações significativas, mormente tecnológicas ou organizacionais, incluindo a nível dos colegas, superiores hierárquicos ou dirigentes com que o trabalhador terá de se relacionar, susceptíveis de se reflectirem diferentemente na adaptabilidade e desempenho deste, relativamente às contratações anteriores, justificando a utilização plena do período experimental estabelecido legal ou convencionalmente. (2)
Sucede que, na situação sub judice, entre os 70 dias de trabalho no âmbito do primeiro contrato e os 39 dias de trabalho no âmbito do segundo, mediou um período de apenas 35 dias, demasiadamente exíguo para se presumir qualquer alteração relevante, que a ré também não alegou na sua contestação.
Consequentemente, uma vez que o autor já prestara o seu trabalho à ré durante 70 dias entre 01/08/2019 e 09/10/2019, o período experimental do contrato celebrado pelas partes no subsequente mês de Novembro estava reduzido a 20 dias, nos termos do citado art. 112.º, n.º 4 do Código do Trabalho, e, assim, ainda que tendo vigorado o contrato apenas entre 14/11/2019 e 22/12/2019, a dispensa pela ré nesta última data ultrapassava já em 19 dias o termo do período experimental.
Sobre situação envolvendo formas de contratação diversas das previstas literalmente na norma em referência, e interrupções entre os vínculos, veja-se o Acórdão da Relação do Porto de 13 de Junho de 2018, proferido no processo n.º 5333/17.4T8PRT.P1 (3), em que se entendeu, conforme respectivo sumário, que “[s]endo a trabalhadora contratada a termo incerto, depois de ter realizado anteriormente, até cerca de quatro meses antes, funções no âmbito de contrato de emprego - inserção que se sucedeu a contrato de estágio em contexto de trabalho, por um período que totalizou cerca de dois anos, tal facto permitiu suficientemente às partes verificarem a conveniência da manutenção da sua vinculação laboral, determinando assim a eliminação do período experimental estabelecido no contrato, por força do disposto no artigo 112.º, n.º 4, do Código do Trabalho.”
Também com interesse para esta temática, vejam-se ainda o Acórdão da Relação de Coimbra de 4 de Novembro de 2011, proferido no processo n.º 446/10.6T4AGD.C1, o Acórdão da Relação de Lisboa de 4 de Junho de 2014, proferido no processo n.º 685/12.5TTLRS.L1-4, e o Acórdão da Relação do Porto de 8 de Novembro de 2018, proferido no processo n.º 349/18.6T8MTS.P1. (4)
Por todo o exposto, a dispensa do autor pela ré configura um despedimento ilícito, na medida em que efectuada sem base legal, designadamente por ter ocorrido fora do período experimental, como concluiu o tribunal a quo.
Improcede, pois, o recurso.

5. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação improcedente e em confirmar a decisão recorrida.
Custas pela Apelante.
20 de Janeiro de 2022

Alda Martins
Vera Sottomayor
Maria Leonor Barroso



1. V. Pedro Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, Principia, 3.ª ed., pp. 583-585.
2. Aut. cit., op. cit., p. 585.
3. Disponível em www.dgsi.pt.
4. Disponíveis em www.dgsi.pt.