Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
122/17.9T8VCT.G1
Relator: RAMOS LOPES
Descritores: MATÉRIA DE FACTO
ACIDENTE DE VIAÇÃO
MONTANTE DOS DANOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/21/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (do relator):

I. Na reapreciação da matéria de facto, no âmbito da previsão dos artigos 662º, nº 1 e 640º, nº 1 do CPC, impõe-se que a Relação repondere os elementos probatórios produzidos nos autos, averiguando se os mesmos permitem afirmar, de forma racionalmente fundada, a veracidade da realidade alegada (ou o inverso, quando o facto tenha sido julgado provado pela primeira instância).

II. Em tal actividade, fazendo jus aos poderes que lhe são atribuídos enquanto tribunal de segunda instância que garante um segundo grau de jurisdição em matéria de facto, deve a Relação efectuar uma autónoma apreciação crítica das provas produzidas, em vista de formar uma convicção autónoma.

III. Mostra-se prudente, ponderado, equilibrado, adequado e justo, conforme aos padrões jurisprudenciais, o montante de quarenta mil euros para valorizar o dano não patrimonial sofrido por lesado com 95 anos que, como consequência do evento lesivo sofreu traumatismo crânio-encefálico, fracturas e ferimentos na face, fractura da coluna cervical e hematomas dispersos, sofreu período de ‘encarceramento’ em estabelecimentos de saúde próximo dos três meses, padeceu quantum doloris de grau 5 numa escala de 1 a 7, ficou a padecer ao nível das sequelas definitivas de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 30 pontos e sofreu prejuízo ao nível da afirmação pessoal, por perda de autonomia.

IV. Por se tratar de danos leves – desacompanhados de circunstâncias concretas que revistam, objectiva e razoavelmente, intensidade e/ou profundidade suficiente para atingir o patamar de gravidade erigido pelo art. 496º, nº 1 do CC para convocar a tutela do direito – não são susceptíveis de indemnização o susto sofrido com o embate, o desgosto ao ver o veículo danificado e o incómodo e nervosismo por se ver privado do uso do veículo durante o período subsequente ao embate e até ao termo da reparação.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães(1)
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RELATÓRIO

Apelante/apelado: Manuel (…) (posição agora ocupada pelos seus habilitados sucessores Manuel (…), Domingos (…), Maria (…), Delfina (…), José (…) e Inácio (…))
Apelante/apelada: (…), SA
Apelado: Joaquim (…)
Apelada: (…) – Companhia de Seguros, SA

Manuel (…), intentou acção destinada à efectivação da responsabilidade civil emergente de acidente de viação demandando (…), SA, pedindo a sua condenação no pagamento da indemnização líquida no valor de 464.023,30€, acrescida de juros de mora desde a citação, e de indemnização ilíquida a fixar posteriormente, relativamente a danos patrimoniais e não patrimoniais por si sofridos como causa adequada de acidente de viação que imputa a conduta culposa de condutor de veículo seguro na ré.

Contestou a ré, pugnando pela improcedência da acção.

Apresentou-se o autor a deduzir incidente de intervenção principal provocada da (…) Companhia de Seguros, SA, pedindo a condenação desta no pedido, enquanto seguradora da responsabilidade civil do outro veículo interveniente no embate e no caso de resultar provado o factualismo alegado pela ré (…) (ainda que condenação solidária no pedido, na proporção da culpa apurada).

Admitido o incidente, contestou a interveniente, concluindo pelo julgamento da causa em conformidade com a prova a produzir em audiência.

Após saneado o processo (com saneador tabelar a afirmar a validade e regularidade da instância, identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova), foi decidido apensar a acção que com o nº 1235/17.2T8VCT corria termos no juízo local cível de Viana do Castelo, intentada por Joaquim (…) contra a (…) Seguros Gerais, S.A, para haver desta indemnização de 16.785,21€ pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos com embate cuja eclosão imputa a conduta de condutor de veículo seguro na ré, tendo esta na contestação pugnado pela improcedência da acção.

Apensada, viria tal acção a ser saneada (com afirmação tabelar da validade e regularidade da instância, identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova) e, realizado julgamento (no qual viria o autor Manuel (…) a alterar o pedido, solicitando que relativamente à ajuda de terceira pessoa fosse fixada renda vitalícia mensal no valor de 2.250,00€), foi proferida sentença que:

A- julgou parcialmente procedente a acção intentada pelo autor Manuel (…) e, absolvendo a interveniente (…) Companhia de Seguros, SA, do pedido, condenou a ré, (…), Seguros Gerais, SA, a pagar-lhe as quantias:

- de dezassete mil trezentos e quatro euros e trinta cêntimos (17.304,30€), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento,
- de quarenta mil euros (40.000,00€), acrescida de juros de mora a contar da data da sentença até integral pagamento, e
- de quatrocentos e cinquenta euros (450,00€) a título de renda mensal e vitalícia, a pagar até a cada dia 8 do mês a que diga respeito (sob pena de contagem de juros de mora, à taxa legal de 4%, a partir desse respectivo dia); e

B- julgou parcialmente procedente a acção intentada pelo autor Joaquim (…) e condenou a ré (…), Seguros Gerais, SA, a pagar-lhe as quantias:

- de sete mil quatrocentos e sessenta e seis euros e vinte e um cêntimos (7.466,21€), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a 9/05/2015 até integral pagamento,
- de mil e seiscentos euros (1.600,00€), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento, e
- de mil euros (1.000,00€), acrescida de juros de mora a contar da data da sentença até integral pagamento.

Não se conformando com o assim decidido, apelam o autor Manuel (..) e a ré (…), SA (esta apelando da decisão quanto às duas acções).

O autor Manuel (…) – discordando do montante indemnizatório arbitrado como compensação pelos danos não patrimoniais (que defende ser fixado no montante peticionado de 150.000,00€) e bem assim do termo inicial da contagem dos juros (que defende ser o da data da citação), pretendendo ainda a condenação da interveniente nas indemnizações fixadas e/ou a fixar no caso de, na sequência de recurso da ré, vir esta a ser absolvida total ou total parcialmente do pedido – formula as seguintes conclusões:

- o autor, ora recorrente Manuel (…) peticionou a quantia de 150.000,00 € a título de indemnização/compensação por danos de natureza não patrimonial;
- a sentença recorrida, porém, apenas fixou, a este título, a quantia de apenas 40.000,00 €;
- este montante é exíguo, para compensar o autor Manuel (…) dos danos e padecimentos sofridos;
- deve ser fixado, em via de recurso, a este título, ao autor/recorrente Manuel (…), o montante de 150.000,00 €;
- o qual se acha justo e equitativo;
- sobre o montante fixado a título de compensação por danos de natureza não patrimonial, a sentença recorrida fez incidir os juros moratórios apenas a contar da data da prolação da sentença, em primeira instância (“… a contar da data desta sentença …”), até efectivo pagamento;
- por imperativo legal, devem ser fixados os juros moratórios, sobre a quantia relativa à indemnização/compensação fixada pelos danos de natureza não patrimonial, não só em relação ao valor de 40.000,00€, já fixada em primeira instância, mas também sobre o valor de 150.000,00€, que se peticiona, no presente recurso, seja fixado pelo Tribunal de Recurso, partir da data da citação, até efectivo pagamento;
- a indemnização de 40.000,00€ e/ou 150.000,00€, a fixar pelo Tribunal de Recurso, conforme ora peticionado, não são verbas actualizadas – pressuposto de aplicação do Douto Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 4/2002 (D.R. de 27 de Junho de 2002) –, com referência à data da decisão, em Primeira Instância;
- se assim fosse, poderia aceitar-se a fixação dos juros moratórios, apenas a contar da data da decisão em Primeira Instância (tão-só e apenas em relação à indemnização/compensação de 40.000,00€ e/ou 150.000,00€, a fixar pelo Tribunal de Recurso, conforme ora peticionado, fixada e/ou a fixar por danos de natureza não patrimonial);
10ª- no caso dos autos, o valor fixado de 40.000,00€ e/ou 150.000,00€, a fixar pelo Tribunal de Recurso, conforme ora peticionado, em que a Ré/recorrida foi ou vai ser condenada é inferior e, quando muito, igual ao que o Autor/Recorrente Manuel (…) peticionou, a este propósito150.000,00€;
11ª- por essa razão, não tem, nem pode ter aplicação a doutrina estabelecida no Acórdão de Fixação de Jurisprudência, do Supremo Tribunal de Justiça nº. 4/2002, de 9 de Maio de 2002, publicado no Diário da República, Série I-A, de 27 de Junho de 2002;
12ª- tal Acórdão Uniformizador apenas diz respeito às indemnizações/compensações relativas aos danos de natureza não patrimonial, desde que as mesmas sejam objecto de actualização – o que não sucedeu no caso dos autos – com referência à data da prolação da sentença em primeira instância;
13ª- já assim decidiu, entre muitos outros, o Supremo Tribunal de Justiça, na Revista nº. 3076/05, em Acórdão subscrito pelos Exmos. Juizes Conselheiros Pires da Costa, Custódio Mendes e Mota Miranda – Acção Ordinária nº 2/2002, 2º Juízo, do Tribunal Judicial de Ponte de Lima;
14ª- os juros sobre a quantia relativa à indemnização/compensação por danos de natureza não patrimonial devem, assim, ser contados, desde a data da citação, até efectivo pagamento;
15ª- decidindo de modo diverso, fez a sentença recorrida má aplicação do direito aos factos provados e violou, entre outras, as normas dos artigos 496º., nº. 1, 562º., 564º., nº. 2 e 805º., do Código Civil, do Código de Processo Civil;
16ª- pode a Ré, ora Recorrida Companhia de Seguros “(…) SEGUROS, S.A.” vir a interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância – Juízo Central Cível, Juiz 3, de Viana do Castelo;
17ª- se, na sequência de eventual recurso a interpor pela Ré Companhia de Seguros “(…) SEGUROS GERAIS, S.A.”, vier a ser decidido no sentido da sua absolvição total ou parcial;
18ª- por se entender que, por absurdo, a culpa na produção do acidente de trânsito que deu origem à presente acção é total ou parcialmente imputável ao condutor do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula … – Joaquim (…) –, seu segurado;
19ª- deve – neste caso - a referida co-ré Companhia de Seguros “(…) COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.” ser ou ser também – total ou parcialmente – condenada a pagar ao autor, ora recorrente Manuel (…), o total – ou parte delas, conforme eventual graduação de culpas apuradas – das indemnizações líquida e ilíquida já fixadas e/ou a fixar, na sequência do presente recurso, acrescidas dos juros de mora, contados à taxa legal de 4% ao ano, a partir da data da citação, até efectivo pagamento.

A ré (…), Seguros Gerais, SA – impugnando a decisão da matéria de facto, defende que ambas as seguradoras (ela, apelante, e a interveniente (…)) são responsáveis em igual medida pela ocorrência do embate, que o autor Joaquim (…) não sofreu danos não patrimoniais que mereçam a tutela do direito e que os danos não patrimoniais foram fixados ao autor Manuel (..) com exagero – conclui as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo Meritíssimo Tribunal “a quo” que julgou as acções parcialmente procedentes e, em consequência:

a. Absolveu a chamada COMPANHIA DE SEGUROS (…), S.A. dos pedidos
b. Condenou a Ré (…) SEGUROS GERAIS, S.A. a pagar ao A. MANUEL (…):

- A quantia de € 17.304, 30, acrescida de juros de mora, à taxa legal 4% contados desde a citação até integral pagamento
- A quantia de € 40.000,00 acrescida de juros de mora, à taxa legal 4% contados desde a citação até integral pagamento
- A quantia de € 450,00 a título de renda mensal e vitalícia (devida pelos danos futuros), a pagar pela ré ao autor até a cada dia 8 do mês a que diga respeito, e sob pena de contagem de juros de mora, à taxa legal de 4%, a partir desse respectivo dia
c. Condenou a Ré “(…) SEGUROS GERAIS, S.A.” a pagar ao A. JOAQUIM (…) a quantia de € 7.466,21 acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde 9.05.2015 até integral pagamento, a quantia de € 1.600,00, acrescida de juros de mora à taxa legal ed 4%, contados desde 9.05.2015 até integral pagamento, e a quantia de € 1.000, acrescida de juros de mora contados desde a data da sentença até integral pagamento.
2. Salvo o devido respeito por melhor opinião, a Douta sentença proferida não faz uma correcta interpretação e ponderação da prova produzida, com a consequente incorrecta decisão sobre a matéria de facto, não fazendo igualmente uma adequada subsunção jurídica dos factos e com a consecutiva desapropriada aplicação do direito, pelo que não pode a Seguradora recorrente concordar com os fundamentos que a sustentam.
3. Insurge-se, pois, a Seguradora recorrente quanto à decisão proferida sobre a matéria de facto, quanto à apreciação da concreta dinâmica do evento danoso e apuramento do respectivo responsável pela sua ocorrência.
4. Bem como, e independentemente da decisão proferida quanto à responsabilidade pelo ressarcimento dos danos decorrentes do acidente, dos montantes indemnizatórios fixados pelo Mmo. Tribunal a quo a ambos os AA. recorridos no que concerne aos danos não patrimoniais.

ISTO POSTO

5. Tendo por base a factualidade supra referida, o Mmo. Tribunal a quo considerou que a responsabilidade pela ocorrência do acidente e, consequentemente, pelo ressarcimento dos danos dele advenientes, era de imputar, exclusivamente, ao veiculo seguro na ora recorrente, concretamente, o veiculo de matricula ….
6. A Seguradora recorrente não se conforma com tal entendimento, considerando que o mesmo advém, desde logo, de uma desajustada apreciação e valoração da prova e, consequentemente, de erro de julgamento.

DO ERRO DE JULGAMENTO:

DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA:

7. Tal como se demonstrará infra, o Meritíssimo Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento quanto à decisão da matéria de facto, consubstanciado numa desadequada análise da prova, no que concerne aos factos vertidos no item 3 dos factos não provados (“Momentos antes do embate, o condutor do veículo de matrícual … tinha realizado uma ultrapassagem”), que deveria ter sido julgado provado
8. Na verdade, considera a recorrente Seguradora que a decisão proferida andou mal no que diz respeito à apreciação da prova referente aos supra apontados pontos de facto.
9. Desde logo, e sempre com o máximo respeito por diverso entendimento, andou mal o Mmo. Tribunal a quo ao não ter valorado positivamente o depoimento da testemunha ILÍDIA …, prestado em audiência de julgamento de 15/05/2018, com inicio pelas 15.36.03 e fim pelas 16.11.47, gravado no ficheiro 20180515153602_1432579_2871824
10. Com efeito, do depoimento da aludida testemunha decorre, sem margem para dúvidas, que o veículo de matrícula …, nos momentos que precederam o embate, tinha realizado uma manobra de ultrapassagem, tendo, inclusive, ultrapassado o veículo que esta testemunha conduzia.
11. Ora, salvo o devido respeito por diverso entendimento, em face do que foi referido pela Testemunha ILÍDIA … em sede de audiência de julgamento, não se vislumbra que tenham ocorrido quaisquer contradições e ou falta de clareza na exposição das circunstâncias em que ocorreu o acidente.
12. Na verdade, atendendo às circunstâncias da via – recta com boa visibilidade – só se compreende que o embate tenha ocorrido, se o A. JOAQUIIM tivesse acabado, como refere a testemunha ILÍDIA, de regressar à sua hemi-faixa de rodagem, após a descrita ultrapassagem.
13. Se assim não fosse, atenta a visibilidade da via, sempre teria tido oportunidade de ver a traseira do veículo seguro na recorrente e, pelo menos, reduzir a velocidade ou sinalizar a sua presença buzinando, de forma a evitar o embate.
14. Ao contrário do que se aduz na douta decisão recorrida, e sempre com o máximo respeito por entendimento diverso, a concreta dinâmica do evento fará muito mais sentido se, como resulta do depoimento da citada testemunha, o A. JOAQUIM (…) tivesse procedido a manobra de ultrapassagem.
15. Ademais, não tem qualquer cabimento que o Mmo. Tribunal “a quo” se funde, para a prova desta factualidade referente à dinâmica do evento, no depoimento da testemunha Bruno (…), GNR, que não presenciou o acidente, em detrimento de outro – o de ILÍDIA (…) – que, de forma inelutável, assistiu ao acidente, podendo ver o que realmente se passou.
16. Impunha-se, pois, perante a prova produzida e supra retratada, julgar provados os seguintes factos:

“Momentos antes do embate, o condutor do veículo de matrícula … tinha realizado uma ultrapassagem”
17. Aditando-se, pois, ao elenco da materialidade julgada provada, uma alínea com tal redacção.
18. Ao contemplar diverso entendimento, andou mal o Mmo. Tribunal a quo, incorrendo em manifesto erro de julgamento.

DO DIREITO:

19. A ora propugnada alteração da decisão quanto à matéria de facto implica, necessariamente, a alteração da decisão de mérito a causa, e no que diz respeito à imputação da responsabilidade pela ocorrência do acidente.

DA RESPONSABILIDADE PELA OCORRÊNCIA DO ACIDENTE:

20. Perante a factualidade efectivamente dada como provada e relativa à concreta dinâmica do evento danoso em apreço nos presentes autos, impõe-se concluir, pois, que não foi apenas a manobra realizada pela condutora do veículo seguro a ora recorrente a manobra causal do acidente, tendo, outrossim, o A. JOAQUIM (…), ao ter encetado uma manobra de ultrapassagem naquele concreto local e circunstâncias, também contribuído decisivamente para a eclosão do evento.
21. Com efeito, urge aqui repristinar a factualidade que resultou provada e relevante para apreciação da culpa na produção do evento danoso.
22. Assim, resultou provado que:

- A Estrada Nacional n.º …, no local do embate, configura um traçado rectilíneo, com uma extensão superior a 800 metros, onde existem várias entradas de residências e estabelecimentos de ambos os lados da faixa de rodagem
- A faixa de rodagem da referida via tem uma largura de 5,5 metros e permite o desenvolvimento do trânsito automóvel nos seus dois sentidos de marcha, encontrando-se a faixa de rodagem dividida em duas hemi-faixas, com a largura de 2,75 metros cada uma e separados entre si por um traço longitudinal contínuo.
- Para quem se situe no local do embate, consegue avistar a faixa de rodagem e as bermas, em toda a sua largura e em qualquer dos dois sentidos de marcha, ao longo de uma extensão superior a 300 metros.
- Nas referidas circunstâncias de tempo e lugar, o veículo de matrícula … transitava pela Estrada Nacional nº … pela metade direita da faixa de rodagem, atento o sentido Darque – Ponte de Lima, a velocidade não concretamente apurada.
- Por sua vez, momentos antes do embate, o veículo de matrícula… encontrava-se imobilizado no logradouro no sentido aludido em 11, com a sua parte frontal apontada em direcção à casa de habitação e a sua parte traseira apontada em direcção à faixa de rodagem da Estrada Nacional nº ….
- A condutora do veículo de matrícula … pretendia penetrar, com o referido veículo, na faixa de rodagem da Estrada Nacional e prosseguir a sua marcha no sentido Darque – Ponte de Lima.
- E sem recorrer ao auxílio de terceira pessoa passou a circular com o referido veículo de marcha atrás, a velocidade não apurada, apontando a parte traseira, de forma oblíqua, em direcção a Darque.
- Tendo transposto a berma asfáltica e ido invadir a metade direita da faixa de rodagem, atento o sentido de Darque – Ponte de Lima.
- Numa altura em que o veículo de matrícula … se encontrava a uma distância não superior a 7 metros.
- Tendo ocorrido o embate entre a parte frontal direita do veículo de matrícula … e a parte traseira esquerda do veículo de matrícula … e na hemi-faixa direita, atento o sentido Darque-Ponte de Lima. - Momentos antes do embate, o condutor do veículo de matrícula … tinha realizado uma ultrapassagem
23. Mostra-se inequívoco que, tal como se aduziu na douta sentença aqui posta em crise, que a condutora do veículo de matrícula … (seguro na ora recorrente) actuou de forma negligente pois saía de marcha atrás de uma saída privada, impondo-se-lhe, para além da cedência de passagem aos veículos que circulavam na via, que se rodeasse de cuidados na realização a manobra.
24. Porém, não se pode jamais olvidar que o A. JOAQUIM (…) (conduzindo o veículo seguro na “(…)”) também protagonizou uma conduta imprevidente e em violação das mais elementares regras estradais.
25. Com efeito, o mesmo efectuou uma manobra proibida, que consiste numa ultrapassagem em local onde tal lhe estava vedado – atenta a existência de linha longitudinal contínua.
26. Mas para além disso realizou essa ultrapassagem de forma igualmente temerária, ultrapassando vários veículos de uma só vez.
27. Violou, assim, o A. JOAQUIM (…) o disposto no art. 38º do C.E.
28. Sendo que, de igual modo, a sua manobra foi também causal do embate, porquanto não fosse a ultrapassagem em causa, o mesmo poderia e deveria ter avistado o veículo seguro na ora recorrente.
29. Nessa medida, e sempre com o máximo respeito por diverso entendimento, sempre deveria ter-se imputado a culpa na ocorrência do evento, a ambos os condutores, e na mesma proporção, por terem ambos contribuído em igual medida para a ocorrência do embate.
30. Ao consignar diverso entendimento, andou mal o Mmo. Tribunal a quo.
31. A douta sentença proferida deverá, assim, ser revogada e substituída por outra que, pugnando pela alteração da decisão de facto nos termos supra expendidos, aplique o direito em conformidade com o acabado de expor e, considerando que ambos os condutores contribuíram, a título de culpa, e em igual medida para a ocorrência do acidente, condene ambas as Seguradoras RR no ressarcimento dos danos peticionados nos autos, e de acordo com as indemnizações que doutamente se entender fixar, na proporção de 50% para cada uma.

SEM PRESCINDIR:

32. Ainda que assim não seja doutamente entendido, o que por mero dever de patrocínio se equaciona, sempre se dirá que andou igualmente mal o Mmo. Tribunal a quo, em sede de fixação e atribuição dos valores indemnizatórios a ambos os AA.
33. Não se conforma, pois, a Seguradora recorrente com os valores indemnizatórios fixados, a ambos os AA. a título de danos não patrimoniais:

A INDEMNIZAÇÃO ATRIBUIDA A TÍTULO DE DANOS NÃO PATRIMONIAIS AO A. JOAQUIM (…)

34. O Mmo. Tribunal a quo entendeu que em face dos “incómodos, desgosto, susto e nervosismo sofridos pelo autor Joaquim (…)”, se mostrava justo e adequado fixar uma indemnização a título de danos não patrimoniais no montante de € 1.000,00.
35. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, considera a recorrente Seguradora que os “danos” que resultaram provados quanto ao A. JOAQUIM e considerados para efeitos de dano não patrimonial, não são merecedores de tutela jurídica, e portanto, do fixado ressarcimento.
36. Com efeito, tal como se alude no Douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15/04/2009, Processo 08P3704:

É consensual a ideia de que só são indemnizáveis os danos não patrimoniais que afectem profundamente os valores ou interesses da personalidade física ou moral, medindo-se a gravidade do dano por um padrão objectivo, embora tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, mas afastando-se os factores subjectivos, susceptíveis de sensibilidade exacerbada, particularmente embotada ou especialmente requintada, e apreciando-se a gravidade em função da tutela do direito; o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado – cf. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, pág. 576; Vaz Serra, RLJ, ano 109.º, pág. 115; e os Acs. do STJ de 26-06-1991, BMJ 408.º/538, de 09-12-2004, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 137, de 11-07-2007, Proc. nº 1583/07 - 3.ª, de 26-06- 2008, Proc. n.º 628/08, CJSTJ 2008, tomo 2, pág. 131, de 22-10-2008, Proc. n.º 3265/08 - 3.ª, e de 29-10-2008, Proc. nº 3380/08 - 5.ª”.
37. No caso em apreço, em face dos factos que resultaram provados, é de considerar, os danos resultantes para o A. JOAQUIM (…) foram, de facto, puras contrariedades ou transtornos e, cuja gravidade não se mostra, à luz dos padrões legais, ressarcível, e muito menos de modo a sustentar a indemnização de Euro 1.000,00 que lhe foi atribuída
38. Nessa medida, e sempre com o máximo respeito por entendimento diverso, a douta sentença proferida, neste concreto conspecto, incorreu em manifesta violação do disposto no art. 496º do Cód. Proc. Civil.
39. Deverá, pois, ser a douta sentença proferida revogada e substituída por outra que, absolva a recorrente Seguradora do pedido deduzido a título de danos não patrimoniais ao A. JOAQUIM (…).

DO QUANTUM INDEMNIZATUR ATRIBUIDO A TÍTULO DE DANOS NÃO PATRIMONIAIS AO A. MANUEL (…)

40. Por sua vez, o no que diz respeito aos danos não patrimoniais fixados ao A. MANUEL (…), reputou o Mmo. Tribunal a quo como justa a e adequada uma compensação no valor de € 40.000,00.
41. Não se conforma a Seguradora recorrente com o quantum indemnizatório assim fixado, por considerar que o mesmo se mostra excessivo perante a facticidade que, nesta matéria, resultou provada.
42. Considera a Seguradora recorrente que o Meritíssimo Tribunal a quo se orientou por critérios que embora fundados na equidade, se mostram desfasados da actual realidade e, portanto, desconformes às orientações jurisprudenciais.
43. Recorde-se que o recurso à equidade não afasta a necessidade de cumprir as exigências do princípio da igualdade, o que implica a procura de uma uniformização de critérios, naturalmente compatível com as circunstâncias do caso concreto.
44. E sob pena da equidade se consubstanciar em verdadeira arbitrariedade.
45. Assim, importa aferir a adequação da compensação fixada na sentença recorrida, apelando a decisões traçadas pelas instâncias superiores, enquanto critérios-padrão, e de acordo com o disposto no art. 8º n.º 3 do Cód. Civil.
46. Sendo consabido que a fixação da compensação por danos não patrimoniais implica o recurso aos padrões definidos pela jurisprudência, e de molde a obter-se uma uniformização de critérios que evite o subjectivismo na determinação do quantum indemnizatur.
47. E que se têm entendido, de forma praticamente unânime, que esta compensação tem de revestir um papel significativo, procurando um justo grau de compensação e não se compadecendo com a atribuição de valores simplesmente simbólicos, certo é que se tivermos em linha de conta que os nossos tribunais superiores têm entendido como justo e adequado fixar uma indemnização de Euro 20.000,00 para a dor incomparável e verdadeiramente irressarcível da perda de um filho, facilmente depreendemos que o valor equivalente fixado nos presentes autos para os danos morais sofridos pela Apelada, se mostra completamente excessivo e desajustado.
48. Assim sendo, tendo por base os supra citados arestos, e atendendo à factualidade considerada provada e relevante para esta questão (sobretudo a períodos de défice funcional total, quantum doloris, demais dores e padecimentos havidos por força do acidente, e sobretudo atendendo à idade avançada do lesado), temos que se mostraria justo e adequado o montante nunca superior a Euro 30.000,00, a título de danos não patrimoniais sofridos pelo A. MANUEL (…).
49. Ao consignar diverso entendimento, andou mal o Mmo. Tribunal a quo, incorrendo em verdadeira violação do disposto no art. 496º do Cód. Civil,
50. Por tal motivo, deverá igualmente desta sede, ser a douta sentença revogada e substituída por outra que, nos termos supra exposto, altere o valor indemnizatório fixado a título de danos não patrimoniais ao A. MANUEL (…).
51. O que se deixa expressamente alegado, para todos os devidos efeitos legais.

Contra-alegaram à apelação da ré (…) os apelados – interveniente (…) e autores Manuel (…) e Joaquim (…) -, todos defendendo a improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida.

Não resulta dos autos que a ré (…) tenha deduzido contra-alegações à apelação do autor Manuel.
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Tendo entretanto falecido o autor Manuel (…), foi (antes da subida dos recursos) proferida decisão que julgou habilitados como seus sucessores Manuel (…), Domingos (…), Maria (…), Delfina (…), José (…) e Inácio (…).
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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Do objecto do recurso

Considerando, conjugadamente, a sentença recorrida (que constitui o ponto de partida do recurso) e as conclusões das alegações dos apelantes (por estas se delimita o objecto dos recursos, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso - artigos 608º, nº 2, 5º, nº 3, 635º, nºs 4 e 5 e 639, nº 1, do CPC), as questões a decidir reconduzem-se:

a- na apelação interposta pelo autor Manuel (…) (posição agora ocupada pelos seus habilitados sucessores)
- apreciar do montante arbitrado pelos danos não patrimoniais,
- apreciar do termo inicial do cômputo dos juros moratórios sobre o montante dos danos não patrimoniais, e
- apreciar (no caso de eventual procedência, total ou parcial, de recurso da ré a propósito da questão da responsabilidade pela obrigação de indemnizar) da eventual responsabilidade da interveniente nas indemnizações fixadas e/ou a fixar;

b- na apelação interposta pela ré (…)
- apreciar da pretendida alteração da decisão da primeira instância sobre a matéria de facto (pois que a ré a impugna, nos termos do art. 640º, nº 1 e 662º, nº 1 do CPC),
- apreciar, caso haja que alterar a decisão sobre a matéria de facto, da medida da responsabilidade da apelante,
- apreciar, quanto à acção intentada pelo Manuel (…), do montante arbitrado pelos danos não patrimoniais, e
- apreciar, quanto à acção intentada pelo autor Joaquim (…), da existência de dano não patrimonial que mereça a tutela do direito e, na positiva, do seu montante.
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FUNDAMENTAÇÃO
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Fundamentação de facto

Na sentença recorrida consideraram-se provados os seguintes factos:

1- No dia ../../2015, pelas 9,30 horas, na Estrada Nacional nº …, ao quilómetro nº 2,700, na freguesia de …, concelho de Viana do Castelo, ocorreu um embate entre o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula … e o veículo automóvel ligeiro de mercadorias de matrícula ….
2- O veículo de matrícula … pertencia e era conduzido, na altura do embate, pelo autor Joaquim (…).
3- O veículo de matrícula …, pertencente a António (…), era, na altura do embate, conduzido por Júlia (…).
4- A Estrada Nacional nº …, no local do embate, configura um traçado rectilíneo, com uma extensão superior a 800 metros, onde existem várias entradas de residências e estabelecimentos de ambos os lados da faixa de rodagem.
5- A faixa de rodagem da referida via tem uma largura de 5,5 metros e permite o desenvolvimento do trânsito automóvel nos seus dois sentidos de marcha, encontrando-se a faixa de rodagem dividida em duas hemifaixas, com a largura de 2,75 metros cada uma e separadas entre si por um traço longitudinal contínuo.
6- O seu piso era pavimentado a asfalto.
7- Na altura do embate o tempo estava chuvoso e o piso encontrava-se molhado, mas limpo e em bom estado de conservação.
8- A referida Estrada Nacional apresentava, em ambos os lados, bermas pavimentadas a asfalto, com a largura de cerca de 1,5 metros cada uma, delimitadas da faixa de rodagem por linhas brancas, sem soluções de continuidade.
9- Para quem se situe no local do embate, consegue avistar a faixa de rodagem e as bermas, em toda a sua largura e em qualquer dos dois sentidos de marcha, ao longo de uma extensão superior a 300 metros.
10- A velocidade permitida no local é de 50 Km/hora.
11- No local do embate, existe na margem direita da Estrada Nacional nº …, tendo em conta o sentido Darque – Ponte de Lima, uma casa de habitação, com o nº de polícia ….
12- Entre a berma do lado direito da Estrada Nacional, atento o referido sentido, e a referida habitação existia um logradouro o qual é vedado, em relação à berma que lhe é adjacente, através de gradeamento de ferro, fixo em pilares de estrutura em cimento armado, com uma altura de cerca de 1,40 metros.
13- O acesso do referido logradouro à Estrada Nacional nº … é permitido através de uma abertura ou portão, com a largura de 4 metros.
14- Nas referidas circunstâncias de tempo e lugar, o veículo de matrícula … transitava pela Estrada Nacional nº …, pela metade direita da faixa de rodagem, atento o sentido Darque – Ponte de Lima, a velocidade não concretamente apurada.
15- Por sua vez, momentos antes do embate, o veículo de matrícula … encontrava-se imobilizado no logradouro aludido em 11, com a sua parte frontal apontada em direcção à casa de habitação e a sua parte traseira apontada em direcção à faixa de rodagem da Estrada Nacional nº ….
16- A condutora do veículo de matrícula … pretendia penetrar com o referido veículo na faixa de rodagem da Estrada Nacional e prosseguir a sua marcha no sentido Darque – Ponte de Lima.
17- E sem recorrer ao auxílio de terceira pessoa passou a circular com o referido veículo de marcha atrás, a velocidade não apurada, apontando a parte traseira, de forma oblíqua, em direcção a Darque.
18- Tendo transposto a berma asfáltica e ido invadir a metade direita da faixa de rodagem, atento o sentido de Darque – Ponte de Lima.
19- Numa altura em que o veículo de matrícula … se encontrava a uma distância não superior a 7 metros.
20- Tendo ocorrido o embate entre a parte frontal direita do veículo de matrícula … e a parte traseira esquerda do veículo de matrícula …, e na hemifaixa direita, atento o sentido Darque – Ponte de Lima.
21- Em consequência, o veículo de matrícula … rodou para o seu lado direito, tendo embatido com a parte lateral esquerda contra o tranqueiro do portão e ficado imobilizado sobre a berma situada no lado direito da faixa de rodagem da Estrada Nacional nº …, tendo em conta o sentido Darque – Ponte de Lima, com a sua parte frontal apontada em direcção a Darque.
22- Ainda em consequência do embate, o veículo de matrícula … despistou-se, tendo ido imobilizar-se, a cerca de 35 metros, sobre a metade esquerda da faixa de rodagem da Estrada Nacional nº …, atento o sentido Darque – Ponte de Lima, em posição enviesada, com a parte frontal apontada em direcção a Ponte de Lima.
23- O autor Manuel (…), na altura do embate, seguia como passageiro no veículo de matrícula …, sentado no banco de trás, do lado direito e com o cinto de segurança apertado.
24- Em resultado do embate, o autor Manuel (…) sofreu traumatismo crânio-encefálico, fracturas e ferimentos na face, fractura da coluna cervical e hematomas dispersos.
25- Após o embate, o referido autor foi transportado, de ambulância, para a Unidade de Saúde do Alto Minho, EPE, de Viana do Castelo, onde lhe foram prestados os primeiros socorros, tendo sido efectuados diversos exames radiológicos e TAC’s e sutura das feridas.
26- Dada a gravidade das lesões sofridas, o autor Manuel (…) foi transferido para o Hospital de Braga, onde foi submetido a uma intervenção cirúrgica maxilofacial, tendo aí ficado internado ao longo de um período de 8 dias, em estado de coma.
27- Foi novamente transferido para a Unidade de Saúde do Alto Minho, EPE, de Viana do Castelo, onde permaneceu ao longo de um período de 2 meses.
28- Durante tal período, o autor manteve-se retido no leito, onde tomou as suas refeições e fez as suas necessidades.
29- Usou colar cervical durante cerca de dois meses.
30- Ao fim do referido período de internamento, o autor foi transferido para a Unidade de Cuidados Continuados da Santa Casa da Misericórdia de Ponte de Lima, onde se manteve internado ao longo de um período de 8 dias.
31- Após foi ainda transferido para a Unidade de Cuidados Continuados “…”, em Viana do Castelo, onde se manteve internado até ao dia 15/05/2015.
32- E onde lhe foi ministrado tratamento de fisioterapia ao longo de 20 sessões.
33- Depois regressou à sua casa de habitação, onde já antes residia com uma filha, o marido desta e os netos, dada a sua idade avançada.
34- Nos primeiros dias, o autor ainda conseguia levantar-se do leito, por períodos curtos e com o auxílio de um andarilho e de cadeira de rodas.
35- Após, o autor deixou de se movimentar pelos próprios meios e passou à situação de acamado, encontrando-se dependente de terceira pessoa para vestir-se, alimentar-se e mobilizar-se.
36- Antes do embate, o autor encontrava-se algaliado cronicamente e colostomizado, e já necessitava da ajuda de terceira pessoa para tratar da higiene pessoal e do saco de colostomia.
37- Em consequência do embate e das lesões sofridas, a necessidade de ajuda de terceira pessoa ao autor aumentou em cerca de 3 horas diárias.
38- O autor vai necessitar da ajuda de terceira pessoa até ao final da sua vida.
39- A data da consolidação das sequelas sofridas pelo autor Manuel (…) ocorreu em 24/02/2016.
40- As lesões sofridas pelo autor determinaram um período de défice funcional temporário total fixável em 82 dias e um período de défice funcional temporário parcial fixável em 284 dias.
41- E um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 30 pontos.
42- Ainda em consequência do embate e das lesões sofridas, o autor sofreu um ‘quantum doloris’ no grau 5, numa escala de 1/7.
43- E sofreu os incómodos inerentes à intervenção cirúrgica, aos períodos de internamento e de acamamento.
44- No momento do embate e nos instantes que o precederam, o autor sofreu um enorme susto.
45- Em consequência do embate, o autor despendeu no relatório médico junto aos autos com a petição inicial a quantia de 500,00€, em despesas hospitalares a quantia de 54,30€ e numa certidão para instruir o processo a quantia de 20,00€.
46- Como consequência directa e necessária do embate, ficou inutilizado o vestuário e o calçado que o autor usava, em valor não inferior a 150,00€.
47 O autor Manuel (…) nasceu no dia ../../1919.
48- Em resultado do embate, o veículo de matrícula … sofreu danos, cuja reparação ascendeu à quantia de 7.466,21€, quantia esta paga pelo autor Joaquim (…) no dia 8/05/2015, data em que o veículo lhe foi entregue já reparado.
49- À data do embate o veículo de matrícula … tinha o valor comercial de 6.500,00€ e os salvados ascendiam ao valor de 500,00€.
50- A ré (..) – Seguros Gerais, SA, através de carta enviada ao autor Joaquim (…) em 18/03/2015, que este recepcionou, comunicou-lhe que a reparação do veículo se estimava em 10.703,02€, considerando existir perda total.
51- Em consequência do embate e da reparação subsequente, o veículo de matrícula … sofreu uma desvalorização do valor comercial em montante não inferior a 1.000,00€.
52- O autor Joaquim (…) utilizava o veículo de matrícula … para fazer as compras de abastecimento da sua casa de habitação, para transportar o autor Manuel (…) aos consultórios médicos e para todas as suas deslocações, nomeadamente, de natureza pessoal, familiar e de lazer.
53- E tinha pelo mesmo grande apreço, tendo sofrido desgosto por vê-lo danificado.
54- O autor ficou privado de utilizar o veículo de matrícula … desde a data do embate até ao dia 8/05/2015.
55- Durante tal período de tempo, o autor Joaquim (…) sofreu incómodos e nervosismo.
56- E teve necessidade de utilizar transportes alternativos, no que despendeu quantia concretamente não apurada.
57- Em consequência do embate, o autor Joaquim (…) sofreu um enorme susto.
58- O autor Joaquim (…) despendeu a quantia de 56,00€ na certidão de participação de acidente junta à petição inicial dos autos apensos.
59- A responsabilidade civil por danos causados a terceiros emergentes da circulação do veículo de matrícula … encontrava-se transferida para a ré (…) Seguros, SA, por contrato de seguro, titulado pela apólice nº ….
60- A responsabilidade civil por danos causados a terceiros emergentes da circulação do veículo de matrícula … encontrava-se transferida para a interveniente (…) - Companhia de Seguros, SA, por contrato de seguro, titulado pela apólice nº ….
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Além doutros (cuja elencagem não interessa à economia da presente decisão), julgou a sentença recorrida como não provado o seguinte facto:

- momentos antes do embate, o condutor do veículo de matrícula … tenha realizado uma ultrapassagem.
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Fundamentação de direito

A. Da impugnação da decisão da matéria de facto

Importa começar a apreciação das apelações pela suscitada impugnação da decisão da primeira instância sobre a matéria de facto – questão que se apresenta como precedendo lógico-juridicamente as demais (questões jurídicas, que pressupõem a estabilização da matéria de facto a valorizar).

A decisão da primeira instância sobre a matéria de facto, alicerçada na apreciação de elementos probatórios sujeitos à livre apreciação do juiz (art. 607º, nº 5, 1ª parte, do CPC) – v. g., documentos particulares sem valor confessório e depoimentos de testemunhas –, pode ser alterada pela Relação quando (ao que à presente decisão importa) cumprido pelo apelante o ónus de impugnação prescrito no art. 640º, nº 1 do CPC; em tais casos, a Relação, ‘assumindo-se como verdadeiro tribunal de instância, está em posição de proceder à sua reavaliação, expressando a partir deles, a sua convicção com total autonomia’, devendo reponderar a questão de facto em discussão e expressar de modo autónomo o seu resultado (confirmando a decisão, decidindo em sentido oposto, ou, num plano intermédio, alterando a decisão no sentido restritivo ou explicativo) (2) – reapreciação que não pode confundir-se com um ‘novo julgamento’, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter (3).

A reapreciação da matéria de facto pela Relação, no âmbito da previsão dos artigos 662º, nº 1 e 640º, nº 1 do CPC, importa a reponderação dos elementos probatórios produzidos nos autos, averiguando se permitem afirmar, de forma racionalmente fundada (com base nas regras comuns da lógica, da experiência, do bom senso e, quando for o caso, dos ensinamentos da ciência), a veracidade da realidade alegada (ou o inverso, quando o facto tenha sido julgado provado pela primeira instância).

Nesta actividade, os poderes do Tribunal da Relação, não podem ser restritivamente circunscritos à simples apreciação do juízo valorativo efectuado pelo julgador a quo, ou seja, ao apuramento da razoabilidade da convicção formada pelo juiz da primeira instância face aos elementos probatórios disponíveis no processo, devendo antes a Relação, fazendo jus aos poderes que lhe são atribuídos enquanto tribunal de segunda instância que garante um segundo grau de jurisdição em matéria de facto, efectuar uma autónoma apreciação crítica das provas produzidas (em vista de formar uma convicção autónoma), alterando a decisão caso adquira, face a essa autónoma apreciação dos elementos probatórios a que há-de proceder, uma diversa convicção (4).

De afastar, pois, o destoante e anacrónico argumento ainda esgrimido pelos apelados autores nas suas contra-alegações – o de que só no caso de erro grosseiro na apreciação da prova, incumprimento de normas relativas à produção de prova ou prolação de decisão sem o mínimo alcance na prova produzida é que poderá alterar-se a decisão da primeira instância.

Cumpriu a apelante os ónus impostos no art. 640º, nº 1, alíneas a), b) e c) do CPC ao recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto – especifica o ponto de facto que considera incorrectamente julgado, indica o sentido que preconiza para o seu correcto julgamento e identifica os concretos meios de prova que impõem decisão diversa, enunciando de forma clara os reais motivos da sua discordância (fazendo análise crítica da prova produzida).

Ademais, em cumprimento do nº 2 do art. 640º do CPC, porque funda a discordância em meio probatório (depoimento testemunhal) gravado, indicada com exactidão as passagens da gravação que fundamentam a sua posição (tendo mesmo procedido à transcrição do depoimento).

Impõe-se assim a este tribunal apreciar da impugnação da decisão da matéria de facto

A análise crítica dos elementos probatórios (em ordem à justificação racional da decisão – elemento verdadeiramente estruturante e legitimador desta, que lhe confere a natureza de decisão, afastando-a do que seria uma simples imposição judicial) consiste na sua apreciação e valorização, tanto individual como conjugada (na sua relacionação reversiva – na sujeição dos elementos probatórios a mútuos testes de compatibilidade), à luz das regras da normalidade, da verosimilhança, do bom senso e experiência da vida (das leis da ciência, quando for o caso).

Esta apreciação transcende a averiguação da sinceridade das testemunhas – a decisão da matéria de facto assenta numa convicação objectivável e motivável, a que se acede por via da razão, alicerçada em elementos de lógica e bom senso. Trata-se de um processo de análise de todos os elementos probatórios cujo produto final há-de ser o resultado da sua valorização e compatibilização lógica e racional. Aprecia-se não só a valia intrínseca de cada um dos elementos probatórios (da consistência, coerência e verosimilhança de cada um dos referidos elementos, tomado individualmente) mas também a sua valia extrínseca (da conjugação e compatibilidade entre todos eles).

As provas (art. 342º do CC) têm por função a demonstração da realidade dos factos. Através delas não se busca criar no espírito do julgador a certeza absoluta da realidade dos ‘factos’ – ‘se a prova em juízo de um facto reclamasse a certeza absoluta da verificação do facto, a actividade jurisdicional saldar-se-ia por uma constante e intolerável denegação de justiça’ (5) –, mas antes produzir o que para a justiça é imprescindível e suficiente – um grau de probabilidade bastante, face às circunstâncias do caso e às regras da experiência da vida.

A prova como demonstração efectiva (segundo a convicção do juiz) da realidade de um facto ‘não é certeza lógica mas tão-só um alto grau de probabilidade suficiente para as necessidades práticas da vida (certeza histórico-empírica)’ (6).

Estes considerandos conduzirão o tribunal na reapreciação da matéria impugnada.

Julgou a decisão recorrida como não provado que ‘momentos antes do embate, o condutor do veículo de matrícula … tenha realizado uma ultrapassagem’.

Motivando o assim decidido esclareceu-se ter sido determinante, no ‘atinente aos factos do acidente’, para além da participação de acidente, as declarações de parte e depoimento de testemunhas, que descreveram de forma coincidente e consentânea com as características do local as partes dos veículos embatidas e seu posicionamento na via após o acidente, não se mostrando já unívocos tais elementos a propósito da dinâmica do acidente.

Na parte relevante para apreciação da questão suscitada no âmbito da apelação, referiu a decisão recorrida:

Com efeito, a condutora do veículo seguro na ré, ao contrário do asseverado pelo autor e pela testemunha Delfina …, afirmou que o embate ocorreu quando se encontrava imobilizada na berma.

Ora tal versão, para além, de não ter tido o acolhimento de qualquer outro meio probatório, não nos mereceu credibilidade.

Relativamente a tal questão tivemos desde logo em consideração o depoimento da testemunha Bruno (…), o qual, no âmbito do referido processo de inquérito, procedeu à observação e reconstituição do acidente com vista à determinação das circunstâncias em que ocorreu o mesmo e identificou as suas causas prováveis, tendo elaborado o relatório final cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 55 e seguintes. A análise levada a cabo por esta testemunha corroborou na essência a descrição do acidente efectuada por Joaquim (…) e por Delfina (…), condutor e ocupante do veículo … e encontra eco e o devido suporte nos registos fotográficos efectuados ao local do embate.

Esta testemunha caracterizou o embate como sendo uma colisão traseira excêntrica, o que resulta patente e evidenciado nos registos fotográfico dos veículos intervenientes no embate, nomeadamente, das partes embatidas. Na verdade, e sendo certo que o embate ocorreu entre a parte frontal direita do veículo do autor e a parte traseira esquerda do veículo seguro na ré e que este, em consequência rodopiou para a direita indo embater com a parte lateral esquerda no tranqueiro do portão de onde havia saído, é manifesto que o embate nunca poderia ter ocorrido na berma, como a testemunha Júlia quis fazer crer.

Por outro lado, o depoimento da testemunha Ilidia (…), também não nos mereceu credibilidade. Veja-se que o depoimento desta testemunha, para além de não ter sido corroborado pelo depoimento das demais testemunhas, também não se coaduna com os demais elementos objectivos acima elencados.

A ser verdade que o autor teria realizado uma ultrapassagem momentos antes do acidente e só tivesse retomado a sua mão no local do embate, afigura-se-nos que dificilmente as partes embatidas seriam as acima aludidas.

De todo o modo, e analisados os diversos depoimentos prestados pela dita testemunha quer no âmbito do processo de inquérito (cf. autos de inquirição de testemunhas constantes de fls. 39 e seguintes), quer no âmbito da averiguação levada a cabo pela RNP (cfr. relatório de averiguação junto a fls. 93 a 101), quer nos presentes autos concluímos que os mesmos não são uniformes, sendo mesmo contraditórios em aspectos fundamentais, designadamente, quanto ao número de veículos ultrapassados e quanto ao facto do autor só ter retomado a sua mão no local do embate.

Diga-se ainda, que a testemunha Luís (…) referiu que, quando tomou conta da ocorrência, ninguém mencionou a existência de uma ultrapassagem, o que seria no mínimo estranho, caso tal manobra tivesse ocorrido nos termos relatados pela testemunha Ilidia (..).

A apelante sustenta que do depoimento da testemunha Ilídia (…) decorre, sem margem para dúvidas, que o veículo …, nos momentos que precederam o embate, tinha realizado manobra de ultrapassassem (e por isso defende dever ser julgado provado tal facto considerado como não provado pela decisão recorrida), tendo mesmo ultrapassado o veículo conduzido pela testemunha, não se vislumbrando no seu depoimento quaisquer contradições e/ou falta de clareza, antes sendo a descrição que faz da dinâmica do acidente a que faz mais sentido – atendendo às circunstâncias da via (recta com boa visibilidade), só se compreende que o embate tenha ocorrido se se considerar que o autor Joaquim (…) tinha acabado de regressar à sua hemi-faixa de rodagem, após a ultrapassagem, pois doutra forma teria tido oportunidade de ver a traseira do veículo seguro na recorrente (e de reduzir a velocidade ou buzinar para assinalar a sua presença) –, acrescentando não ter cabimento que o tribunal se funde, para apreciar de tal factualidade, no depoimento da testemunha que tomou conta da ocorrência, mas que não presenciou o evento.

Apreciados os elementos probatórios produzidos nos autos conclui-se que apenas a testemunha Ilídia (…) refere ter o condutor do veículo … (o autor Joaquim (…) – veículo no qual seguia com passageiro o Manuel (…)) procedido a uma manobra de ultrapassagem, pois de nenhum outro resulta a realização de tal manobra, mormente das declarações de parte e demais depoimentos prestados em audiência – o Joaquim (…), ouvido em declarações de parte, nega ter efectuado qualquer manobra de ultrapassagem (referindo ainda não haver outro trânsito no sentido de marcha em que prosseguia, à frente ou atrás, também não existindo trânsito em sentido contrário); a Júlia (…) (condutora do veículo de mercadorias … seguro na apelante) também o não referiu (ainda que tenha começado o seu depoimento referindo não se recordar de pormenores do acidente), assim como o não referiu o Luís (…) (soldado da GNR que se deslocou ao local para tomar conta da ocorrência e que afirmou não lhe ter sido na altura referida por quem quer que fosse a realização de uma manobra de ultrapassagem por parte do veículo ligeiro …).

Por isso que só poderia concluir-se pela veracidade do facto impugnado se a análise do depoimento da referida testemunha o sustentasse consistentemente – analisado intrinsecamente e relacionado conjugadamente com os demais elementos. O que não acontece.

Como realçado na decisão recorrida, os depoimentos prestados pela testemunha Ilídia (…) no inquérito criminal, depois no âmbito de procedimento de averiguação promovido pela seguradora e, por fim, em audiência de julgamento, mais do que não serem uniformes, apresentam versões incompatíveis (contraditórias).

Falta de uniformidade e incompatibilidade que não radica em simples diferenças provindas do normal esbater de memória em razão do passar do tempo nem se reconduz às pequenas discrepâncias ocorridas aquando da repetição dum depoimento, antes respeitando a aspectos verdadeiramente conformadores da estrutura lógica da versão apresentada sobre a dinâmica do embate – aspectos de importância fundamental e nuclear cuja inconciliabilidade não encontra justificação em desculpáveis e normais erros de memória e que revelam a incongruência e inconsistência intrínsecas da versão apresentada pela testemunha.

No âmbito do inquérito criminal (constando a cópia das suas declarações a fls. 48 a 50 dos autos principais), afirmando recordar-se com clareza dos factos, declarou que transitava no sentido Darque/Ponte de Lima na retaguarda de veículo de marca Volkswagen, que por sua vez circulava na retaguarda outros dois veículos; que circulava (assim como os demais referidos veículos) a uma velocidade de cerca de 50 Km/h; que entretanto o veículo Volkswagen iniciou manobra de ultrapassagem aos veículos que seguiam na sua dianteira, tendo tal manobra sido iniciada e finalizada em local com marca contínua no eixo da faixa de rodagem; que o final da manobra de ultrapassagem teve o seu termo praticamente no ponto onde ocorreu o acidente; que no momento em que o Volkswagen iniciou a ultrapassagem, porque despertada a sua atenção dada a perigosidade da situação, apercebeu-se dum veículo de mercadorias (carrinha) a sair de marcha atrás duma entrada particular; que no momento em que a avistou, a carrinha já tinha a parte da retaguarda a entrar na faixa de rodagem, na via da direita, face ao sentido Darque/Ponte de Lima; que o veículo Volkswagen, ao chegar ao ponto de embate, teve de voltar novamente à via de trânsito da direita por circular em sentido contrário outro veículo, correndo o risco de colisão; que no momento da colisão o veículo de mercadorias (carrinha) estava em posição oblíqua face ao eixo da faixa de rodagem e a ocupar parcialmente metade da via de trânsito da direita, considerando o sentido de trânsito Darque/Ponte de Lima; que as partes embatidas foram a parte frontal direita do Volkswagen e traseira lado esquerdo do veículo de mercadorias; referiu, por fim, que o condutor do Volkswagen poderia ter evitado o embate se não tivesse efectuado a manobra de ultrapassagem e que se não embatesse na carrinha tinha embatido no veículo que circulava em sentido contrário.

Em procedimento de averiguações promovido pela ré afirmou a Ilídia (…) (em declaração escrita por si subscrita – cópia junta a fls. 101 dos autos) conduzir o seu veículo no sentido Darque/Ponte de Lima quando viu o carro que seguia à sua frente a proceder a ultrapassagem em linha contínua; que entretanto vê uma carrinha a sair de marcha atrás para a via, sendo que a mesma parou na berma junto ao portão; que após viu o veículo que ia em ultrapassagem ‘a voltar à sua mão quando embate na carrinha do lado esquerdo traseira’; que ‘a carrinha branca estava ligeiramente um pouco na faixa de rodagem aquando do embate mas parada’.

Em audiência de discussão e julgamento (depoimento a cuja audição integral se procedeu), admitindo relação de parentesco com a condutora do veículo seguro na ré (prima da mãe), referiu (em resumo) circular na retaguarda de dois veículos – todos circulando a velocidade inferior a 50 km/h –, tendo sido ultrapassada (assim como os outros dois) pelo veículo conduzido pelo autor Joaquim (…) (no qual circulava como passageiro o Manuel (…)); que tal manobra de ultrapassagem terá sido iniciada a cerca de 500 metros do local onde viria a ocorrer o embate; que aquando do início da manobra de ultrapassagem se apercebeu logo que embate viria a ocorrer (sentiu que o veículo conduzido pelo autor Joaquim (..) iria embater no veículo seguro, que efectuava manobra de marcha atrás); não precisou nunca a distância a que estava do veículo de mercadorias o veículo ligeiro quando terminou a manobra de ultrapassagem e retomou a sua hemi-faixa de rodagem; nunca referiu que o retomar da metade da faixa direita de rodagem tivesse sido determinado pela necessidade de evitar embate com veículo que circulasse em sentido contrário; referiu que circulava um veículo em sentido contrário (um camião), que em virtude do embate parou e não pôde passar (em razão da posição em que os veículos ficaram imobilizados).

A incongruência e incompatibilidade das versões apresentadas pela testemunha Ilídia (…) nos seus depoimentos é patente – mais do que a sensível discrepância quanto à questão de também ter sido ultrapassada pelo veículo conduzido pelo autor Joaquim (…) ou de seguir na sua retaguarda e de este ter ultrapassado os dois veículos que seguiam na sua dianteira (como afirmado nos autos de inquérito – também no procedimento de averiguações promovido pela apelante), importa notar a manifesta incompatibilidade entre a afirmação feita no âmbito do inquérito de que o condutor do veículo automóvel se viu forçado a terminar a manobra de ultrapassagem e retomar a metade direita da faixa de rodagem porque corria o risco de colidir com veículo que circulava em sentido contrário (afirmou até que se não tivesse embatido na carrinha, teria embatido nesse veículo que circulava em sentido contrário) e as declarações prestadas em audiência, onde tal risco de colisão não só não foi afirmado como até referiu que o camião que vinha em sentido contrário parou em razão do embate (e não pôde passar dada a posição dos veículos após o embate – sendo certo que o veículo conduzido pelo autor Joaquim (…), como se constata pela análise do cróquis junto com a participação, a fls. 35 dos autos principais, ficou a ocupar parcialmente a metade esquerda da faixa de rodagem considerando o seu sentido de marcha, a cerca de 35 metros do ponto de embate).

Assim, enquanto no depoimento prestado no âmbito do inquérito referiu que o autor Joaquim (…) se viu confrontado com a necessidade de retomar a metade direita da via para evitar a colisão com veículo que circulava em sentido contrário, então embatendo no veículo seguro na apelante (o que pressupõe – a proximidade determinante da afirmada necessidade de retomar a metade direita para evitar a colisão e o local onde o veículo do autor se viria a imobilizar – que os veículos conduzido pelo autor Joaquim (…) e veículo terceiro a circular em sentido contrário se tivessem cruzado, antes ou imediatamente depois do embate mas sempre antes do veículo conduzido pelo autor Joaquim (…) invadir a metade esquerda da via até imobilizar), já no depoimento prestado em audiência omitiu a Ilídia (..) qualquer referência a tal premência no retomar da faixa de rodagem, tanto mais que afirmou que o veículo (camião) circulava em sentido contrário a distância que permitiu ao veículo automóvel conduzido pelo autor Joaquim (…) imobilizar-se na metade esquerda da via e ao camião parar antes de o atingir (antes de chegar ao ponto onde o veículo do autor se imobilizou, 35 metros depois do ponto do embate).

Ademais, é também manifesta a inconsistência intrínseca da versão apresentada pela testemunha no inquérito criminal – acaso o autor Joaquim (..) tivesse a necessidade de retomar a metade direita da faixa de rodagem para evitar a colisão com o veículo que circulava em sentido contrário, certamente também o veículo que acabava de ser ultrapassado (além dos outros, incluindo o conduzido pela testemunha) teria sido forçado a estancar a sua marcha (e tal necessidade/premência não foi manifestada pela testemunha).

Acresce que a incongruência e falta de consistência afectam também a versão aventada pela testemunha em audiência (ainda que com base nela se não pudesse alicerçar a conclusão de que a manobra de ultrapassagem terminou próximo do local onde viria a ocorrer o embate – atente-se que a testemunha admitiu não poder precisar a que distância se encontrava o veículo ligeiro da carrinha quanto retomou a metade direita da faixa de rodagem) – se a ultrapassagem a três veículos, que circulam a velocidades inferiores a 50 km/h, é iniciada cerca de 500 metros dum determinado ponto onde se encontra um outro veículo a efectuar manobra de marcha atrás, saindo de uma propriedade privada para entrar na via, certamente que tal manobra de ultrapassagem não se prolongará pelos 500 metros e muito menos impedirá que a manobra de marcha atrás então iniciada não seja completada com sucesso.

Efectivamente, resultando das leis da física que um qualquer corpo em movimento percorre, a uma velocidade de 10 km por hora, uma distância de 2,77 metros por segundo (10.000 metros : 3.600 segundos = 2,77 m/s), poderemos considerar, ponderando que a berma tinha no local do embate 1,50 metros e que na realização da manobra de marcha atrás não era empegue velocidade superior a 10 km/h, que desde o ponto em que atinge a berma, saindo do espaço da residência particular, até atingir o ponto do embate considerado (cerca de 0,50 metros no interior da faixa de rodagem) (7), teria a condutora do veículo seguro na ré demorado pouco mais de um segundo.

Durante esse período de tempo (um segundo), o veículo conduzido pelo autor Joaquim (…), que segundo a testemunha tinha já iniciado a manobra de ultrapassagem, circulava a velocidade superior a 50 km/h (referiu a testemunha que os veículos que o autor Joaquim (…) ultrapassava circulavam a tal velocidade); supondo que circulava a 70 km/h – uma simples suposição, para efeitos de exposição do raciocínio –, percorreria distância pouco inferior a 20 metros (19,45 metros). Ou seja, considerando o depoimento da testemunha em audiência, estando o veículo seguro na ré no ponto em que viria a ser embatido (com a sua traseira a ocupar 0,50 metros no interior da faia de rodagem), ainda o veículo conduzido pelo autor Joaquim (…) se encontraria a cerca de 480 metros do local, em plena manobra de ultrapassagem.

Porque para percorrer 500 metros, circulando a uma velocidade de 70 km/h, necessitaria o veículo do autor Joaquim (…) de cerca de 25 segundos, certamente a condutora do veículo da ré (iniciando a manobra de marcha atrás, como referido pela testemunha, em momento temporal próximo ao do início da ultrapassagem) teria já concluído a manobra e não se teria verificado o embate.

Conclusão válida ainda que se pondere que o autor Joaquim imprimia ao seu veículo velocidade de 100 km/h (suposição feita apenas e só para demonstração do argumento) –percorreria então a cada segundo 27,79 metros e assim necessitaria de 18 segundos para completar os 500 metros, período temporal ainda assim mais do que suficiente para que a manobra que a condutora do veículo da autora se propunha realizar fosse completada em plena segurança.

Noutra perspectiva, também o depoimento pela testemunha prestado em audiência é incongruente. Não havendo premência ou necessidade de terminar a ultrapassagem e de retomar a direita, não se entende a razão pela qual o autor Joaquim realizaria tal manobra com o veículo seguro na ré a ocupar parcialmente a metade direita da via, podendo simplesmente continuar a progredir na via esquerda e, passado o veículo seguro na ré, então sim retomar a faixa de rodagem.

Tanto basta para demonstrar da intrínseca inconsistência do depoimento da testemunha Ilídia (…) e da sua manifesta insuficiência para fundar resposta positiva à matéria impugnada e (bem) julgada não provada na decisão recorrida.

Face aos precedentes considerandos, não pode o tribunal concluir, de forma racional e objectivamente fundada (com o grau de probabilidade suficiente para as necessidades práticas da vida), que ‘momentos antes do embate, o condutor do veículo de matrícula … tenha realizado uma ultrapassagem’ (8) – pelo contrário, a conjugação dos elementos probatórios impõe se considere, como o fez a decisão recorrida, não provada tal matéria.
Face ao exposto, não pode deixar de ser mantida a decisão da matéria de facto.

B. Da (medida da) responsabilidade da apelante

Mantida a decisão de facto, fácil concluir pelo inteiro acerto da decisão recorrida ao concluir pela culpa exclusiva da condutora do veículo seguro na ré pela eclosão do embate – omitiu deveres de cuidado exigíveis no caso concreto e adequados a evitar o embate, pois que (como resulta dos factos provados com os números 14º a 19º), conduzindo o seu veículo em marcha-atrás provinda do logradouro de casa de habitação que margina a via, invadiu a metade direita da estrada, considerando o sentido prosseguido pelo veículo conduzido pelo autor Joaquim (…), quando este se encontrava a uma distância não superior a 7 metros.

Culpa exclusiva, pois, já que ao autor Joaquim (…) nenhum comportamento se lhe pode imputar que tenha contribuído para a ocorrência do embate.

Assim, é a ré apelante, por força do contrato de seguro pelo qual para si foi transferida a responsabilidade civil por danos causados a terceiros com a circulação do veículo …, obrigada (exclusiva) a indemnizar.

Breve nota para deixar esclarecido (só por isso conhecemos da impugnação de facto) que a considerar-se poder ser também ao autor Joaquim (…) atribuída a co-responsabilidade na eclosão do embate (em termos de culpas concorrentes), apenas no âmbito da acção por ele intentada tal teria reflexo à luz do preceituado no art. 570º do CC, pois que nenhuma consequência teria na acção respeitante ao Manuel (…) (seguia como passageiro do veículo conduzido pelo autor Joaquim (…) e não tendo qualquer culpa na produção do embate nem tão pouco para o agravamento dos danos, sempre a ré teria de responder pela totalidade dos danos, dada a regra da solidariedade prescrita no art. 497º, nº 1 do CC).

Tal conclusão implica (artigos 663º, nº 2 e 608º, nº 2, ambos do CPC) a desnecessidade de apreciar da questão suscitada na apelação do autor Manuel (…) sobre a eventual responsabilização da interveniente pelas indemnizações a si devidas.

C. Do montante do dano não patrimonial arbitrado ao Manuel (…)

Não questionam as partes a existência do dano não patrimonial sofrido pelo Manuel (…), censurando autor e ré a decisão recorrida quanto ao montante indemnizatório arbitrado (40.000,00€) – o autor sustenta a sua exiguidade, defendendo que deve ser fixado no montante peticionado de 150.000,00€; a ré sustenta a sua excessividade e desfasamento da realidade (e desconformidade com os critérios jurisprudenciais), pugnando pela sua redução para montante não superior aos 30.000,00€.

Segundo o artigo 496º nº 1 do CC, na fixação da indemnização devem atender-se os danos não patrimoniais que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito.

A indemnização por danos não patrimoniais (aqueles que não atingem os bens materiais do lesado ou que, de qualquer modo, não alteram a sua situação pa­trimonial, ou seja, aqueles danos que têm por objecto um bem ou interesse sem conteúdo patrimonial, insusceptível, em rigor, de avaliação pecuniária) não visa propriamente ressarcir ou tornar indemne o lesado, mas oferecer-lhe uma compensação que contrabalance o mal sofrido ou até uma satisfação (tal dano, porque relativo a bens que não integram o património do lesado, apenas pode ser compensado com a obrigação pecuniária imposta ao lesante, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização) (9).

De atentar que na responsabilidade civil por factos ilícitos a indemnização por danos não patrimoniais reveste uma natureza mista: se por um lado visa compensar o lesado (função essencialmente reparatória), não lhe é alheio o propósito (acessório) de reprovar, sancionar ou castigar o lesante pela conduta causadora do dano (10).

O montante da reparação pecuniária dos danos não patrimoniais é fixado equitativamente em atenção ao grau de culpa do lesante, sua situação económica e demais circunstâncias relevantes (artºs. 496º, nº 3 e 494º do CC).

Equidade não significa arbitrariedade, antes convocando juízo que atenda o curso normal das coisas, a particular situação do caso concreto e o próprio dano a reparar – no caso, a particular situação do lesado que, nascido em Setembro de 1919 (com noventa e cinco anos ao tempo do evento lesivo), sofreu traumatismo crânio-encefálico, fracturas e ferimentos na face, fractura da coluna cervical, além de hematomas dispersos, necessitando de intervenção cirúrgica e tratamentos vários, sofrendo encarceramento hospitalar e em casas de saúde, passando a movimentar-se apenas com ajudas técnicas (andarilho e cadeira de rodas) e a necessitar de ajuda de terceiros para vestir-se, alimentar-se e mobilizar-se, determinando-lhe as sequelas definitivas com que ficou um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 30 pontos (havendo ainda que ponderar o quantum doloris fixado no grau 5 numa escala de sete pontos).

O apelo a critérios de equidade tem em vista encontrar no caso concreto a solução mais justa - a equidade é uma forma de justiça concreta, que intenta superar a própria ideia de justiça já cristalizada pela norma legal, pois que o ‘equitativo, sendo embora o justo, não o é em conformidade com a lei, mas antes como aperfeiçoamento do justo legal’ (11).

Norteia a decisão a particular situação do caso concreto e a gravidade do dano que importa reparar (a indemnização deve ser proporcionada a esta), as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida, sendo este um dos domínios onde mais necessário se torna o bom senso, o equilíbrio e a noção das proporções com que o julgador deve decidir (12).

O critério legal a atender para a fixação do montante indemnizatório do dano não patrimonial é o da sua gravidade, nos termos do art. 496º, nº 1 do CC.

O valor compensatório deve, desde logo, ser adequado e suficiente para conter em si a afirmação da validade do bem tutelado (para lá de proporcionado à reprovação ou castigo pela conduta causadora do dano).

O ponto de referência – a unidade de medida ou unidade de conversão do valor imaterial lesado a dinheiro – para a justa medida do montante compensatório é encontrado nos padrões jurisprudenciais atinentes à indemnização destes danos.

Pedimos vénia para realçar as judiciosas, criteriosas e prudentes considerações expendidas no douto Acórdão do STJ de 5/07/07 (13). Começando por enfatizar estarem os tribunais agora sensibilizados para a quantificação credível dos danos não patrimoniais (credível para o lesado e credível para a sociedade, respeitando a dignidade e o primado dos valores do ser, como acontece com a integridade física e a saúde) e, por isso as indemnizações adequadas passarem, com cada vez maior frequência, por uma mais acentuada valorização dos bens da personalidade física, espiritual e moral atingidos pelo facto danoso, bens estes incindivelmente ligados à afirmação pessoal, social e profissional do indivíduo, bens que hoje valem hoje mais do que ontem, salienta o douto acórdão a importância do recurso a tais padrões jurisprudenciais, mencionando não ser conveniente, dada a função cometida ao STJ (refere-se, claro está, à função cometida ao STJ de contribuir para a uniformização da jurisprudência, mas isso vale também aqui, inteiramente, atento o princípio legal da interpretação e aplicação uniforme do direito – art. 8º, nº 3 do CC), alterar de ‘forma brusca os critérios de valoração dos prejuízos; não deve perder-se de vista a realidade económica e social do país’, sendo ‘vantajoso que o trajecto no sentido duma progressiva actualização das indemnizações se faça de forma gradual, sem rupturas e sem desconsiderar (muito pelo contrário) as decisões precedentes acerca de casos semelhantes’, pois não podem nem devem os tribunais contribuir para ‘alimentar a noção de que neste domínio as coisas são mais ou menos aleatórias, vogando ao sabor do acaso ou do arbítrio judicial’ – a ‘justiça tem ínsita a ideia de proporção, de medida, de adequação, de relativa previsibilidade; é tudo isto que no seu conjunto origina o sentimento de segurança, componente essencial duma sociedade assente em bases sólidas (uma das quais é justamente a do primado do direito)’.

Refere Almeida e Costa (14), que dentro dos danos não patrimoniais resultantes de lesões podem descortinar-se quer as dores físicas e sofrimentos psicológicos (o ‘pretium doloris’), quer a perda de capacidade de descanso ou de fruição dos prazeres da vida, quer a afectação da integridade anatómica, fisiológica ou estética, quer a perda de expectativas de duração de vida.

A tutela da personalidade humana – art. 70º do CC – protege os indivíduos contra as ofensas ilícitas ou ameaças de ofensa à sua personalidade física, organização composta não só por bens ou elementos constitutivos (v. g. a vida, o corpo e o espírito), mas também por funções (v. g. a função circulatória e a inteligência), por estados (p. ex. a saúde, o prazer e a tranquilidade) e por forças, potencialidades e capacidades (os instintos, os sentimentos, a inteligência, o nível de educação, a vontade, a fé, a força de trabalho, a capacidade criadora, o poder de iniciativa, etc.) (15).

Presentemente constata-se a tendência para alargar o círculo de danos ressarcíveis, conformando o ordenamento à compreensão abrangente do ser humano – o ‘homo faber ou homo economicusda época industrial dá lugar ao homo ludicus ou homo aestheticusda época do lazer, da cultura e da informação’, e a ‘pessoa humana corporeamente encarnada dá-se a conhecer em todas as suas concretas dimensões (v. g., trabalhador, pai de família, amigo, ser lúdico e relacional) e interioriza e vivencia como todas elas são decisivas no seu estado de equilíbrio físico-psíquico’ (16).

Componentes relevantes do dano não patrimonial, ao lado do dano biológico – visto na sua vertente de alteração morfológica, enquanto privação da capacidade de utilizar o corpo da forma como antes do evento lesivo o lesado fazia, a perda da fruição dos prazeres da vida e mesmo a diminuição da expectativa da duração da vida –, surgem o ‘pretium doloris’ – as dores físicas e psíquicas (desgostos, inibições, frustração, revolta, etc.) sofridas e a sofrer pelo lesado, danos estes clamam por compensação devida e condigna, em função da sua gravidade –, o prejuízo de afirmação pessoal (dano indiferenciado que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes – familiar, profissional, afectiva, recreativa, cultural, cívica), o prejuízo da saúde geral e da longevidade (o dano da dor e o défice de bem estar, e que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem estar da vítima e o corte na expectativa de vida) e a perda de qualidade de vida.

A matéria de facto apurada espelha a vasta extensão e elevado grau de gravidade das lesões (e suas consequências permanentes) sofridos pelo autor, que então contava 95 anos de idade e se encontrava algaliado cronicamente e colostomizado (e já necessitava da ajuda de terceira pessoa para tratar da higiene pessoal e do saco de colostomia).

Relembrem-se – pois que tal é importante para apreender cabalmente a gravidade do dano – as lesões e sequelas advindas ao lesado e ligadas ao evento por nexo de causalidade adequada:

- sofreu traumatismo crânio-encefálico, fracturas e ferimentos na face, fractura da coluna cervical e hematomas dispersos,
- transportado para a Unidade de Saúde do Alto Minho de Viana do Castelo, onde lhe foram prestados os primeiros socorros e efectuados diversos exames (radiológicos e TAC’s) e suturadas as feridas, foi transferido para o Hospital de Braga e aí submetido a intervenção cirúrgica maxilofacial, ficando internado oito dias, em estado de coma,
- novamente transferido para a Unidade de Saúde do Alto Minho, de Viana do Castelo, aí permaneceu durante dois meses, mantendo-se retido no leito, onde tomou as suas refeições e fez as suas necessidades,
- usou colar cervical durante cerca de dois meses.
- findo o internamento, foi transferido para a Unidade de Cuidados Continuados da Santa Casa da Misericórdia de Ponte de Lima, onde se manteve internado por oito dias,
- foi então transferido para a Unidade de Cuidados Continuados “…”, em Viana do Castelo, onde se manteve internado até ao dia 15/05/2015, sendo-lhe ministradas vinte sessões de tratamento de fisioterapia,
- regressou então à sua casa de habitação, onde já antes residia com uma filha, o marido desta e os netos, dada a sua idade avançada,
- nos primeiros dias conseguiu levantar-se do leito, por períodos curtos e com o auxílio de um andarilho e de cadeira de rodas, deixando após de se movimentar pelos próprios meios, passando à situação de acamado, encontrando-se dependente de terceira pessoa para vestir-se, alimentar-se e mobilizar-se,
- em consequência das lesões sofridas no embate, a necessidade de ajuda de terceira pessoa ao autor aumentou em cerca de 3 horas diárias,
- vai necessitar da ajuda de terceira pessoa até ao final da sua vida, - a data da consolidação das sequelas sofridas pelo autor Manuel (…) ocorreu em 24/02/2016,
- as lesões sofridas pelo autor determinaram um período de défice funcional temporário total fixável em 82 dias e um período de défice funcional temporário parcial fixável em 284 dias e um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 30 pontos,
- além dos incómodos inerentes à intervenção cirúrgica, aos períodos de internamento e de acamamento, e em consequência do embate e das lesões sofridas, o autor sofreu um ‘quantum doloris’ no grau 5, numa escala de 1/7.

Esta factualidade demonstra que os componentes do dano não patrimonial acima mencionados alcançam níveis elevados.

Referência para o período de ‘encarceramento’ em estabelecimentos de saúde a que o autor Manuel (…), então com 95 anos de idade, esteve sujeito para tratamento – desde 25/02/2015 (data do embate), até 15/05/2015. Retido no leito nos primeiros dois meses e oito dias (e nos primeiros oito dias em estado de coma), usando também colar cervical, esteve depois internado em unidades de saúde de cuidados continuados, aí recebendo outros tratamentos.

Regressado a casa, deixou de se movimentar pelos próprios meios, passando à situação de acamado e dependente de terceira pessoa para tarefas que até então realizava sozinho (vestir-se, alimentar-se e mobilizar-se) – dano que não se esgota numa apreciação meramente fisiológica, pois que constitui também um prejuízo com especial relevo ao nível da afirmação pessoal, por perda de autonomia (e até de auto-estima, atendendo à idade avançada).

Ao nível das sequelas definitivas (e, portanto, no campo da irreversibilidade), além de ter deixado de se locomover pelos próprios meios e passar à situação de acamado e da ajuda de terceira pessoa ter aumentado em cerca de três horas diárias (para os actos que antes realizava sozinho), ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 30 pontos – sequela cujas consequências também se não contêm no âmbito puramente fisiológico (afectação do corpo, na sua vertente funcional), projectando-se ao nível psicológico (a consciência das suas maiores limitações e da perda de parte substancial da sua autonomia).

O pretium doloris é também consideravelmente elevado – atingiu o grau 5 numa escala ascendente de sete graus.

O prejuízo da saúde geral é também acentuado, sendo patente a efectiva e apreciável diminuição da sua qualidade de vida.

A decisão recorrida teve em conta todos estes factos afigurando-se prudente, ponderado, equilibrado, adequado, justo e conforme aos padrões jurisprudenciais o montante que encontrou para valorizar o dano (40.000,00€) – p. ex., o douto Acórdão STJ de 19/04/2018 (17), que fixou em 45.000,00€ o dano não patrimonial de lesada que, com 45 anos de idade, se viu sujeita a duas intervenções cirúrgicas, a longo período de clausura hospitalar, que ficou a padecer de extensas sequelas anátomo-funcionais, traduzidas em deficit funcional permanente de 26 pontos, correspondente a uma IPP de 42,2495%, sofreu um dano estético de grau 4, numa escala de 1 a 7, padeceu de quantum doloris de grau 5 numa escala de 1 a 7, além do desgosto de se ver fisicamente limitada e sem perspectivas futuras em termos laborais.

Do exposto resulta a improcedência de ambas as pretensões recursórias – quer a da ré, de ver reduzido o montante arbitrado a este título na decisão recorrida, quer a do autor (posição agora ocupada pelos seus habilitados sucessores) de o ver elevado.

D. Do termo inicial do cômputo dos juros moratórios sobre o montante do dano não patrimonial arbitrado ao autor Manuel (…)

Sustenta o autor/apelante Manuel (…) (posição entretanto ocupada pelos seus habilitados sucessores) que os juros sobre a indemnização fixada a título de danos não patrimoniais devem ser contados desde a data da citação, como peticionado, e não desde a data da sentença, como decidido, dado aquele valor não ter sido objecto de actualização.

A improcedência deste segmento da apelação é manifesta, pois que o montante arbitrado a título de dano não patrimonial foi encontrado tendo por referência o valor da moeda à data da decisão, como nela expressamente se refere ao mencionar-se que os valores arbitrados a título de indemnização por danos não patrimoniais foram actualizados à data da prolação da decisão.

Assim que tendo a indemnização sido objecto de cálculo actualizado (como teve o cuidado de expressar o tribunal ‘a quo’), a condenação em juros de mora a partir da data da decisão, em aplicação da doutrina fixada no AUJ nº 4/2002, de 9/05, publico no DR, 1ª série, de 27/06/2002, mostra-se juridicamente inatacável.

Improcede, pois, também neste segmento, a apelação do autor Manuel (…).

E. Da existência do dano não patrimonial merecedor da tutelar do direito (e, na afirmativa, sua medida) quanto ao autor Joaquim (…)

A sentença recorrida, ponderando o susto, o desgosto, os incómodos e o nervosismo sofridos pelo autor Joaquim (..), considerou terem tais danos suficiente gravidade para merecer a tutela do direito, entendendo adequada para a respectiva compensação a indemnização de mil euros (1.000,00€).

Não se conforma a apelante (…) com o assim decidido por entender que os danos apurados não são merecedores de tutela jurídica, tratando-se de simples contrariedades ou transtornos cuja gravidade não se mostra ressarcível à luz dos padrões legais, muito menos de modo a sustentar a indemnização de mil euros.

Apurado a este propósito (matéria elencada nos factos provados com os números 53º a 57º) que o autor Joaquim (…) tinha apreço pelo seu veículo automóvel ligeiro de passageiros, sofrendo desgosto por vê-lo danificado, sofreu incómodos e nervosismo por se ver privado do mesmo desde o embate (em 24/02/2015) até 8/05/2015 (sendo que o utilizava em todas as suas deslocações) e sofreu susto no embate.

Breve parêntesis para referir que se expurgam da matéria a considerar as expressões adjectivas que, contendo juízos de valor, foram levadas (indevidamente) à fundamentação de facto – a adjectivação do apreço (‘grande’) pelo veículo (facto 53º) ou do susto (‘enorme’) sofrido no embate (facto 57º).

O quadro fáctico apurado revela, além do desgosto por ver o seu veículo danificado, o susto sofrido no embate e o incómodo e nervosismo sofridos durante o período em que o autor se viu privado de utilizar o veículo.

A vexata quaestio suscitada na apelação reside – antes de apreciar da justeza do montante arbitrado encontrado para o compensar – em apurar se tal dano do autor, considerando a matéria provada, é merecedor da tutela do direito, isto é, se tem a gravidade atendível para atingir o patamar mínimo convocado pelo art. 496º, nº 1 do CC para desencadear a tutela do direito.

Em tal apreciação deve lançar-se mão de critérios objectivos (sempre alicerçados nas circunstâncias concretas do caso), afastando-se factores de índole puramente subjectiva (e depurando uma tal análise da discricionariedade própria das sensibilidades de cada um). Não pode o tribunal deixar de guiar-se aqui pelas regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida.

O dano terá suficiente gravidade para merecer a tutela do direito quando o diagnóstico do quadro factual a dirimir revelar, em termos de razoabilidade, que o sofrimento padecido é inexigível, do ponto de vista da resignação (sendo as circunstâncias concretas os sintomas dessa gravidade e até do respectivo grau, desde o grave ao gravíssimo) (18) – ou, dito doutro modo, não menos assertivo e impressivo, quando se está perante um daqueles casos em que qualquer pessoa de reacção mediana, justificadamente, e para aliviar ou afastar o sofrimento, procuraria intencionalmente prazeres com dispêndio de dinheiro (19).

Ao erigir a sua gravidade como critério para tutelar o dano não patrimonial, não pretendeu a lei ‘configurá-lo pelo seu carácter excepcional, no sentido de coisa insuportável ou exorbitante’, antes pretendendo aludir à acepção vulgar do termo, que ‘comporta a ideia de coisa relativamente intensa ou relativamente profunda, segundo as circunstâncias’ (20).

Determinante, neste campo, a ponderação das circunstâncias concretas que acompanham as diferentes situações do dano – um ‘simples susto, no sentido de mero sobressalto ou medo repentino, pode causar um choque emocional; mas, em princípio, não se reveste de gravidade, porque não passa de incómodo fugaz’, reconhecendo-se que em determinadas circunstâncias podem os sustos ‘causar gravíssimas consequências sobre a sensibilidade anímica da pessoa, com fortes reflexos na saúde’; igualmente para as contrariedades, estados de frustração ou contratempos ‘que, em determinadas ocasiões, podem casuar dor moral relevante, pela sua duração, sobretudo em pessoas’ economicamente menos favorecidas, como acontecerá no caso do que, ‘sem culpa, vê inutilizado o seu veículo e fica impedido de continuar uma viagem, longe de casa e com crianças de colo ou doentes a seu lado’ (21).

No caso dos autos, nenhuma circunstância concreta caracteriza ou adjectiva a crua situação – o susto no embate, o desgosto por ver danificado o veículo e o nervosismo e incómodos durante o período em que se viu daquele privado.

Nada permite alcandorar o susto com o embate (não havendo notícia de qualquer consequência sobre a sua sensibilidade anímica ou saúde emocional ou psíquica) e desgosto do autor Joaquim (…) ao ver o veículo danificado ao patamar de intensidade ou profundidade que torne um tal dano inexigível, do ponto de vista da resignação.

A mesma conclusão vale para os incómodos e nervosismo sofridos no período em que do veículo se viu privado.

Não se quer significar que tal não configure dano não patrimonial com causa directa no evento lesivo. Pretende tão só realçar-se que não vem demonstrada matéria (e tal é matéria factual constitutiva do invocado direito do autor) que adjective e caracterize tal dano (sofrimento ou padecimento psíquico) com a suficiente gravidade para ser tutelado pela ordem jurídica. Da singeleza dos factos a este propósito apurados não resulta que a intensidade do sofrimento (do susto, do desgosto ao ver o veículo danificado e do incómodo e nervosismo por se ver privado do uso do seu veículo durante o período subsequente ao embate e até ao termo da reparação) extravase o âmbito dos incómodos, arrelias e desconforto contidos nos danos não indemnizáveis e atinja gravidade que o diferencie, em termos de exuberância, daquele que é normalmente sentido por qualquer pessoa em casos idênticos (ou seja, que de acordo com um critério objectivo, esse padecimento se diferencie suficientemente do que são os normais sofrimentos do quotidiano social - normais situações psicológicas negativas).

Noutros termos – os danos apurados são leves, sem a intensidade e/ou profundidade suficiente para atingir o patamar da ressarcibilidade.

Por tal razão – não permitir a matéria provada concluir que a situação traduz sofrimento do autor merecedor da tutela do direito (de intensidade superior ao normal sofrimento do quotidiano social) –, não se justifica atribuir ao autor Joaquim (…) indemnização por danos não patrimoniais, procedendo, por isso, nessa parte, a apelação da ré.
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DECISÃO
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Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível:

A- relativamente à acção interposta pelo autor Manuel (..) (cuja posição na lide é agora ocupada pelos seus habilitados sucessores), em julgar totalmente improcedentes as apelações (autor e ré), mantendo a sentença recorrida,
B- relativamente à acção interposta pelo autor Joaquim (…), em julgar parcialmente procedente a apelação da ré e, em consequência, mantendo-a quanto a tudo o demais, em revogar a sentença recorrida na parte em que arbitrou ao autor a indemnização de mil euros (1.000,00€) a título de danos não patrimoniais, absolvendo a ré de tal pedido.
Quanto à acção interposta pelo autor Manuel (…), os seus habilitados sucessores e a ré suportarão as custas das respectivas apelações.
Relativamente à acção interposta pelo réu Joaquim (…), ele e a ré suportarão as custas da apelação e da acção na proporção do decaimento.
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Guimarães, 21/03/2019
(por opção exclusiva do relator, o presente texto não obedece às regras do novo acordo ortográfico)


1. Apelação nº 122/17.9T8VCT.G1 Relator: João Ramos Lopes Adjuntos: Jorge Teixeira José Fernando Cardoso Amaral
2. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição, Almedina, p. 290.
3. Autor e obra citados na nota anterior, p. 300.
4. Defendiam-no a propósito do regime processual anterior ao introduzido pela Lei 41/2013, de 26/07, ao nível da doutrina, Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2ª edição revista e actualizada, pp. 283 a 286 e Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª edição, p. 227 (referindo que, por se encontrar na posse dos mesmos elementos de prova que a 1ª instância, a Relação, se entender, dentro do princípio da livre apreciação da prova, que aqueles elementos impõem uma decisão diferente sobre o ponto impugnado da matéria de facto, alterará a decisão que sobre ele incidiu – a reapreciação da prova pela Relação coincide em amplitude com a da 1ª instância); ao nível da jurisprudência (tirada no âmbito da vigência do anterior regime processual), p. ex., os Acórdãos do STJ de 01/07/2008, de 25/11/2008, de 12/03/2009, de 28/05/2009 e de 01/06/2010, no sítio www.dgsi.pt/jstj. Posição que a doutrina e a jurisprudência vêem mantendo (e veementemente reforçando) quanto ao regime processual vigente – p. ex., na doutrina Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição, Almedina, p. 298 a 303 (máxime 302 e 303) e na jurisprudência, por mais recente, o Acórdão do STJ de 8/01/2019, no sítio www.dgsi.pt/jstj.
5. A Varela, RLJ, Ano 116, p. 339.
6. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 191.
7. Dados (a largura da berma e o ponto de embate) expostos no cróquis que acompanha a participação de acidente de viação, a fls. 35 dos autos.
8. Não nos ocupámos da manifesta conclusividade que encerra a matéria em questão. Impõe-se porém dizer, em homenagem ao rigor técnico que se exige às decisões judiciais, que um eventual deferimento da pretensão recursória nesta vertente implicaria traduzir o invocado ‘imediatismo’ pela concreta distância entre o ponto correspondente ao termo da manobra de ultrapassagem e o concreto ponto do embate.
9. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª edição, p. 601.
10. Cfr., p. ex., acentuando este carácter repressivo e sancionatório, A. Varela, obra citada, p. 608 e Meneses Cordeiro, Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedades Comerciais, Lex, 1997, p. 481, que dá nota do carácter punitivo da indemnização (o seu papel retributivo e carácter preventivo).
11. Castanheira Neves, Questão de Facto - Questão de Direito, 1967, p. 317, citando Aristóteles.
12. A Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª edição, p. 605, nota 4.
13. Relatado pelo Exmo. Juiz Conselheiro Nuno Cameira, no sítio www.dgsi.pt/jstj.
14. Direito das Obrigações, 5ª edição, p. 478, em nota.
15. Rabindranath Capelo de Sousa, O Direito Geral de Personalidade, p. 200, citado no Acórdão da R. Porto, C.J., Ano XXII, Tomo II, p. 206.
16. João António Álvaro Dias, Dano Corporal, Quadro Epistemológico e aspectos resarcitórios, Almedida, 2001, pp. 13 e 14 e 100.
17. Relatado pelo Exmo. Juiz Conselheiro António Piçarra, no sítio www.dgsi.pt/jstj.
18. Dario Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, 3ª edição, p. 132.
19. Ac. S.T.J. de 15/03/2007 (João Bernardo), no sítio www.dgsi.pt/jstj.
20. Dario Martins de Almeida, obra citada, p. 130.
21. Mais uma vez, Dario Martins de Almeida, obra citada, p. 132.