Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
39/08.8PBBRG-K.G1
Relator: PAULO SERAFIM
Descritores: INCIDENTE RECUSA
REQUISITOS LEGAIS
CONVENCIMENTO SUBJETIVO RECUSANTE
INDEFERIMENTO
ARTº 43º
NºS 1 E 2 DO CPP
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/27/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECUSA
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I – Após dedução do requerimento de recusa em primeira instância, não podem ser admitidas, valoradas, por extemporaneidade, novas alegações e provas juntas pelo recusante já no tribunal superior competente para a decisão do incidente.

II - Constituindo um princípio basilar, estruturante, da jurisdição penal, e, concomitantemente, o seu fito, a descoberta da verdade material e a boa decisão da causa, a concretização destas finalidades não pode prescindir da existência de um julgamento “justo”, o que implica para os envolvidos o direito a um tribunal independente e imparcial, como é assegurado pelo art. 6º, § 1º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

III - A seriedade e gravidade do motivo ou motivos causadores da suspeição ou desconfiança sobre a imparcialidade do juiz têm de ser considerados objetivamente, não bastando, no caso do pedido de recusa, um mero convencimento subjetivo por parte do recusante para que se tenha por verificada a ocorrência da suspeição. É a partir do senso e da experiência comuns que tais circunstâncias devem ser ajuizadas.

IV - O facto de as exas. Juízas em causa terem proferido decisões contrárias aos interesses processuais do requerente em processos distintos não significa só por si que se possa considerar o juízo a proferir por elas como condicionado pelas anteriores decisões e por isso que constitua fundamento de recusa.

V - O meio processual próprio para o arguido requerente impugnar os despachos de cujo mérito e legalidade discorda é a interposição de recurso, o que ele, aliás, fez, no legítimo exercício do seu direito à defesa.

VI - É absolutamente normal que os juízes que compõem o tribunal coletivo em questão sejam “amigos” (no sentido a que se referem as redes sociais), como nenhum espanto causa o facto de conhecerem os respetivos cônjuges (um deles também juiz). Não se olvida que o recusante quer com isso significar que se um dos juízes fosse permeável a fatores externos que toldassem a sua desejada e impreterível imparcialidade para o julgar, tal amizade poderia “influenciar” negativamente os demais, de modo a que todos se unissem para o prejudicar. Contudo, no caso vertente, não prova o requerente que qualquer desses juízes tenha praticado qualquer ato processual que, clara e ostensivamente, tivesse o intuito de o prejudicar, impedindo-o de ter um julgamento justo e imparcial, nem essa imparcialidade ou animosidade para com o arguido resulta das alegadas condutas adotadas por aqueles nas suas vidas particulares.
Decisão Texto Integral:
(Recusa)

Acordam, em conferência, os Juízes desta Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I – RELATÓRIO:

▪ No âmbito do Processo Comum Coletivo nº 39/08.8PBBRG, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga - Juízo Central Criminal de Braga - Juiz 3, o arguido J. C. deduziu, nos termos do art. 45º, nº1, al. a), do CPP, o presente incidente de recusa dos juízes de Direito que compõem o respetivo Tribunal Coletivo, P. M., L. M. e F. V., pedindo a sua procedência com as legais consequências.

Para tanto, após a respetiva alegação fáctica, conclui:

“a) Antes do julgamento do processo 39/08.8PBBRG se ter iniciado, em Janeiro de 2016, o desfecho do mesmo já estava pensado por aqueles juízes – com sentença de condenação – porque a Juíza L. M. já fez outros julgamentos do arguido J. C. e condenou-o sempre a penas de prisão (não existe uma sentença desta Juíza onde tenha absolvido o J. C.) tendo até chegado a mandar recolher ADN do J. C. com uso a força compulsiva e foram os Tribunais Superiores a dar razão ao J. C. e a anular todos esses despachos de recolha do ADN.
b) Antes do julgamento do processo 39/08.8PBBRG a Juíza P. M. julgou e condenou o arguido J. C. à ordem de outro processo.
c) Ainda muito tempo antes do início do julgamento, o Juiz F. V. era, e é, amigo pessoal do J. L. e amigo de todos os restantes Juízes e Juízas e maridos destas. E que, como se viu a posteriori, a proximidade é tanta que até perguntavam entre eles se havia romenos por aí!
d) O Juiz F. V. (… para os amigos) sabia perfeitamente que alguns negócios automóveis estavam naqueles autos do processo 39/08.8PBBRG e em documentos da Polícia Judiciária, etc., eram oriundos do Stand do J. L., e que o J. L. era seu amigo pessoal.
e) Depois do incidente de recusa apresentado em Junho de 2016, é que há aquela troca de mensagens entre o Juiz F. V. e a Juíza P. M. sobre os romenos, e, se até aí já se suspeitava fortemente da falta de imparcialidade, é precisamente depois deste episódio que, a 6 de Fevereiro de 2017, os três Juízes proferem um despacho a alterar todo o texto da acusação, imputando mais crimes ao J. C., agravando a qualificação jurídica dos mesmos só ao arguido J. C. e acrescentaram os elementos objetivos e subjetivos que a acusação não tinha, violando a jurisprudência nº 1/2015 do STJ.
f) Depois da defesa do arguido J. C. ter dito a 14 de Fevereiro de 2017, que o coletivo de Juízes não podia juridicamente falando, fazer aquelas alterações porque o J. C. não dava (nem deu, nem dá) autorização, o Tribunal reputou aquelas de “não substanciais” ao abrigo do art. 358º do CPP, fazendo de conta que o artigo 1º alínea f) do CPP não diz que uma “Alteração substancial dos factos” é aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de uma crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis”.
g) A defesa do arguido J. C. alertou, ainda, que o Tribunal além de estar a cometer um rol de ilegalidades, estava também a cometer um tratamento diferenciado entre os arguidos, nomeadamente porque o arguido N. S. que também estava acusado pelo nº1 do art. 256º do CP, quanto a esse arguido não houve qualquer agravamento.
h) No despacho de 14 de Fevereiro de 2017, em resposta às defesas apresentadas, aqueles três Juízes vieram dizer, em relação à defesa do arguido N. S., por escrito e por despacho judicial, o seguinte:
“No que respeita ao requerimento apresentado no dia de hoje, 14-02-2017, pela defesa do arguido N. S., e uma vez que o mesmo requerimento se traduz em meras considerações sobre a qualificação que foi feita sobre a comunicação de factos na sessão do passado dia 06-02-2017, nomeadamente, sessão em que se havia comunicado a alteração substancial ou não substancial, e naquilo que se traduz na discordância do arguido quanto a essa mesma qualificação, nada a ordenar, uma vez que a defesa não indicou qualquer meio de prova suplementar ou adicional quanto às comunicadas alterações”.
i) Depois do arguido J. C. apresentar um recurso, que deu entrada em Março de 2017, onde era dito que tinha instaurado um processo crime contra o coletivo de juízes pelo tratamento diferenciado que fizeram entre o arguido J. C. e N. S., os três juízes vieram, de imediato, dizer:
j) Por despacho datado de 13 de Março de 2017, e já depois de lerem o recurso do arguido J. C. (que até foi admitido na segunda parte desse mesmo despacho), que por mero lapso se esqueceram de comunicar ao arguido N. S. a alteração da agravante do crime argumentando que só tinham feito essas comunicações à defesa do J. C. (o que não era verdade, visto o N. S. ter respondido em 14-02-2017).
K) O que estes Juízes fizeram neste despacho de 13 de Março de 2017 foi uma enormíssima mentira! Nunca houve nenhum lapso, houve sim intencionalidade!
l) Então, se no despacho judicial de 14 de Fevereiro de 2017 responderam à defesa do arguido N. S., conforme descrito na alínea h) deste incidente, e só depois de terem lido a resposta por escrito que o arguido J. C. apresentou nesse mesmo dia 14 de Fevereiro onde, entre o mais, se dizia taxativamente onde e como, é que o despacho de 13 de Março de 2017, proferido pelos três juízes, que invoca o “mero lapso” é uma tentativa de tapar/esconder tudo aquilo que estava a ser apanhado e descoberto sobre a falta de imparcialidade destes três juízes para com o arguido J. C., já que nunca poderia ser um lapso a falta de comunicação porque o Tribunal lhe apresenta uma resposta ao arguido N. S. sobre a resposta daquele, ambas datadas de 14 de Fevereiro de 2017!
m) Logo depois disto, em Junho de 2017, quando estava a decorrer o segundo incidente de recusa contra o Coletivo no processo 39/08.8PBBRG bem como, paralelamente, uns recursos e reclamações interpostas contra aqueles despachos, o Juiz F. V. aparece “sabe-se lá como” no processo 224/11.5JABRG para negar o cúmulo jurídico (que negou por duas vezes!) e, passado pouco tempo, nesses mesmos autos 224/11.5JABRG vem a juíza P. M. perguntar se o J. C. não quer desistir dos autos que tinha dirigido ao Conselho Superior da Magistratura sobre a atuação do Juiz F. V..
n) Como o arguido J. C. estava preso no E.P. de Braga até Junho de 2018, e por não ter acesso a determinadas bases de dados e às redes sociais, só muito recentemente é que descobriu que havia fortes ligações de amizade entre todos (dentro e fora do Tribunal) já depois de ter apresentado uma queixa crime ao Supremo Tribunal de Justiça, em 2019, e ter dado uma entrevista às televisões.
O) Neste momento, a Magistrada do MP titular dos autos 39/08.8PBBRG passou a ser, em 2019, a Dra. N. B., também esta amiga de todos os juízes, com likes e corações trocados no Facebook, tendo saído dos autos o Procurador J. A.”.
Mais informa o arguido que os juízes que recusa já não se encontram em funções no Tribunal onde corre termos o processo em causa.
Juntou vários documentos tendentes a comprovar o por si alegado.
▪ Nos termos e para efeitos do disposto no art. 45º, nº3 do CPP, os juízes visados pronunciaram-se nos seguintes termos:

- Exma. Juíza P. M.:
“Exmos. Srs. Juízes Desembargadores do Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, atento o novo incidente de recusa deduzido e o disposto no art. 43.º, n.º 1 e 3, 44.º e 45.º, n.º 1, al. a) e n.º 3, todos do C.P.Penal, cumpre apenas informar o seguinte:

- desde a data em que se deu início ao julgamento nos autos principais a 11.01.2016, tiveram lugar, designadamente, as seguintes ocorrências processuais:
a) incidente de recusa do Magistrado do Ministério Público, que deu entrada em 15.02.2016, após a realização da 2.ª sessão de julgamento, o qual foi indeferido, por decisão de superior hierárquico de 17.03.2016 (fls. 38 a 41 do apenso D);
b) incidente de recusa da signatária, na qualidade de Juiz presidente do Tribunal Colectivo, que deu entrada em 13.06.2016, data da 7ª sessão de julgamento, que veio a ser indeferido, por decisão de 12.07.2016 (fls. 124 a 129 do apenso E);
c) incidente de recusa do Tribunal Colectivo, por requerimento entrado a 14.03.2017, na sequência do que foi dada sem efeito a continuação dos trabalhos com produção suplementar de prova que se encontrava agendada para o dia 21.03.2017. O incidente suscitado foi indeferido por decisão de 18.04.2017, que foi objecto de reclamação, também ela indeferida (fls. 211 a 214, 229 e 230 do apenso F);
d) incidente de recusa do Tribunal Colectivo, por requerimento entrado a 21.06.2017, que foi indeferido por decisão do TRG de 11.07.2017, decisão essa que foi objecto de arguição de nulidade, indeferida por decisão do mesmo Tribunal de 28.07.2017 (fls. 201 a 205 e 266 do apenso H);
e) incidente de recusa da signatária, na qualidade de Juiz presidente do Tribunal Colectivo, por requerimento entrado em juízo aos 23.10.2018, ainda pendente nesse mesmo Tribunal (apenso I), onde a 17.12.2018 foi indeferido o incidente, decisão que foi objecto de arguição de nulidades, bem como foi deduzido incidente de recusa dos Srs. Juízes Desembargadores titulares do incidente, sendo aquelas arguidas nulidades conhecidas por acórdão recentemente proferido a 25.11.2019, cujo trânsito em julgado ainda não foi certificado.
- quanto às razões invocadas para fundamentar o presente incidente de recusa da signatária, e em face do teor das mesmas, apenas importa dizer que:
a) ao contrário do aduzido pelo arguido, a signatária respeitou sempre a verdade processual, nunca se tendo deliberada ou inadvertidamente afastado dela;
b) sempre agiu, e age, norteada por princípios de objectividade, isenção e imparcialidade e tudo fez, e faz, para que os mesmos princípios sejam compreendidos, nada a movendo a não ser a procura da verdade material e da Justiça.

Assim, Vªs. Ex.ªs decidirão o presente pedido de recusa como sempre segundo a lei.
Integre neste apenso certidão com a informação indicada de seguida e com as cópias certificadas das seguintes peças:
- acta da 1.ª sessão de audiência supra indicada;
- fls. 38 a 41 do apenso D;
- fls. 124 a 129 do apenso E;
- fls. 211 a 214, 229 e 230 do apenso F;
- fls. 201 a 205 e 266 do apenso H;
- informação prestada a 31.10.2018 pela signatária e as decisões do TRG proferidas a 17.12.2018 e a 25.11.2019, todos no apenso I, cujas folhas se desconhecem porque ainda não remetido à 1.ª instância.”
- Exma. Juíza L. M.:
“Exmos. Srs. Juízes Desembargadores do Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, atento o novo incidente de recusa deduzido e o disposto no art. 43.º, n.º 1 e 3, 44.º e 45.º, n.º 1, al. a) e n.º 3, todos do CPPenal, cumpre referir o seguinte:
- a signatária não tem qualquer interesse pessoal no processo;
- na sua actuação e durante os cerca de 25 anos de exercício da Magistratura Judicial sempre se regeu e rege-se por princípios de imparcialidade, isenção e estrito cumprimento da legalidade.
No entanto, Vossas Excelências farão como sempre melhor JUSTIÇA.”
- Exmo. Juiz F. V.:
“Exmos. Srs. Juízes Desembargadores do Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, tendo o novo incidente de recusa deduzido e o disposto no art. 43.º, n.º 1 e 3, 44.º e 45.º, n.º 1, al. a) e n.º 3, todos do CPPenal, cumpre referir o seguinte:
- O signatário não tem qualquer interesse pessoal no processo;

- Na sua actuação e durante os anos de exercício da Judicatura sempre se regeu, e rege-se, por princípios de imparcialidade, isenção e estrito cumprimento da legalidade.
Vossas Excelências farão como sempre melhor JUSTIÇA”.

▪ Por despacho proferido pelo Relator em 19.12.2019 (referência 6779762, junto a fls. 147 dos autos), determinou-se a solicitação ao tribunal de primeira instância de envio de certidão da acusação ali proferida, a fim de se aquilatar se J. L., mencionado no requerimento de recusa, assume posição de sujeito ou interveniente processual e, na afirmativa, em que termos e qual o objeto da sua participação nos factos ajuizados. Nessa conformidade, a mencionada certidão contendo a aludida peça processual, foi enviada a este Tribunal no dia 20.12.2019 e encontra-se junta aos autos a fls. 154 a 187.
No sobredito despacho, indeferiu-se, por impertinente, a peticionada tomada de declarações ao arguido recusante neste Tribunal da Relação.

▪ Por requerimento que deu entrada neste tribunal da Relação em 27.12.2019, o arguido J. C., veio invocar nova factualidade, no seu entender suscetível de reforçar a suspeição que lançou sobre os juízes que compõem o Tribunal Coletivo no processo 39/08.8PBBRG, e, bem assim, juntar nova prova documental.
Por novo requerimento que deu entrada neste tribunal da Relação em 20.01.2020, o arguido J. C., veio invocar outra nova factualidade, no seu entender suscetível de reforçar a suspeição que lançou sobre os juízes que compõem o Tribunal Coletivo no processo 39/08.8PBBRG.

▪ Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência, cumprindo, pois, conhecer e decidir.
*
II – Questões a decidir:

II.1 – Questão prévia:

● Da inadmissibilidade da junção de nova motivação e prova documental neste Tribunal:

Por requerimentos que deram entrada neste tribunal da Relação em 27.12.2019 e 20.01.2020 (referências 170386 e 171451, respetivamente), o arguido J. C., veio invocar nova factualidade, que reputa de superveniente e no seu entender suscetível de reforçar a suspeição que lançou sobre os juízes que compõem o Tribunal Coletivo no processo 39/08.8PBBRG, e, bem assim, com o primeiro dos preditos requerimentos, juntar nova prova documental.
Temos para nós que as novas alegações e correlativa prova documental que dessa factualidade inovadora o recusante pretende produzir, não podem ser admitidas, valoradas, por extemporâneas, em sede da presente apreciação do incidente de recusa por ele deduzido.
Desde logo, o art. 45º, nº1 do Código de Processo Penal (CPP) fixa como momento próprio para a junção dos elementos fácticos e probatórios destinados a fundamentar o requerimento, o da dedução deste – obviamente, em primeira instância(1).
Ademais, uma eventual tempestividade da nova fundamentação e prova não resulta, sem mais, do disposto no art. 165º, nº1 do CPP, que estabelece como limite temporal para a junção de documentos, nos termos excecionais ali previstos, o encerramento da audiência em primeira instância.

Aliás, o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão nº 90/2013, publicado no Diário da Republica nº 85/2013, de 03/05/2013, decidiu:

«Não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 165.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretado no sentido em que não é admissível, após a prolação da sentença da 1.ª instância, a junção de documentos em sede de recurso que abrange a matéria de facto, mesmo quando esses documentos foram produzidos após aquele momento, só então sendo do conhecimento do arguido.»
É também nosso entendimento que a audiência a que se reporta o nº1 do art. 165º do CPP é a que corre em primeira instância, regulada nos arts. 311º e seguintes desse diploma legal.
Excecionalmente, poder-se-á defender a admissibilidade de junção de documentos já em fase de recurso, quando o tribunal superior possa conhecer de questões de facto nos precisos termos referidos no art. 410º do CPP, em que seja consentida renovação da prova, ou, no caso específico do Supremo Tribunal de Justiça, aprecie recurso de revisão de sentença.
Todavia, tal circunstancialismo excecional não se verifica in casu, porquanto, frisa-se, estamos no âmbito de um incidente de instância, e não de um recurso, muito menos com impugnação, nos termos legais, da matéria de facto.
Conclui-se, destarte, que este Tribunal da Relação está legalmente impedido de conhecer dos novos factos e meios probatórios deduzidos pelo recusante já neste tribunal e, como tal, posteriormente à apresentação do requerimento de recusa em primeira instância.

II.2 - Thema decidendum:

● No âmbito do presente requerimento de recusa cumpre aquilatar da verificação, ou falta dele, de motivo de suspeição sobre a imparcialidade dos Meritíssimos Juízes que integram o tribunal coletivo no processo em questão.
*
III – APECIAÇÃO:

Estipula o art. 43º do Código de Processo Penal (doravante nomeado, abreviadamente, CPP) – redação da Lei nº 59/98, de 25.08:

“ 1 – A intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.
2 – Pode constituir fundamento de recusa, nos termos do nº1, a intervenção do juiz noutro processo ou em fases anteriores do mesmo processo fora dos casos do artigo 40º.
3 – A recusa pode ser requerida pelo Ministério Público, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis.
4 – O juiz não pode declarar-se voluntariamente suspeito, mas pode pedir ao tribunal competente que o escuse de intervir quando se verificarem as condições dos números 1 e 2.
5 – Os atos processuais praticados por juiz recusado ou escusado até ao momento em que a recusa ou a escusa forem solicitados só são anulados quando se verificar que deles resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo; os praticados posteriormente, só são válidos se não puderem ser repetidos utilmente e se se verificar que deles não resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo”.

Os prazos legais para formulação do requerimento de recusa ou do pedido de escusa encontram-se previstos no art. 44º do mesmo diploma legal, nos seguintes termos: “O requerimento de recusa e o pedido de escusa são admissíveis até ao início da audiência, até ao início da conferência nos recursos ou até ao início do debate instrutório. Só o são posteriormente, até à sentença, ou até à decisão instrutória, quando os factos invocados como fundamento tiverem tido lugar, ou tiverem sido conhecidos pelo invocante, após o início da audiência ou do debate”.

O requerimento de recusa e o pedido de escusa devem ser apresentados, juntamente com os elementos em que se fundamentam, perante o tribunal imediatamente superior, no caso, tratando-se de requerimento que incide sobre Juízes de tribunal de primeira instância, perante o Tribunal da Relação – cf. art. 45º, nº1, al. a), do CPP.

In casu, temos que o requerimento de recusa em apreço foi tempestivamente apresentado, porquanto anteriormente à prolação da sentença no processo em causa, invocando o recusante factos ocorridos após o início da audiência e outros que, alegadamente, só chegaram ao seu conhecimento após tal data.
Por outro lado, o requerimento é dirigido ao tribunal competente, este Tribunal da Relação de Guimarães.

Constituindo um princípio basilar, estruturante, da jurisdição penal, e, concomitantemente, o seu fito, a descoberta da verdade material e a boa decisão da causa, a concretização destas finalidades não pode prescindir da existência de um julgamento “justo”, o que implica para os envolvidos o direito a um tribunal independente e imparcial, como é assegurado pelo art. 6º, § 1º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (2).
A imparcialidade, enquanto exigência específica de uma decisão judicial, materializa-se, no essencial, na inexistência de pré-juízos ou preconceitos em relação à matéria a decidir e/ou às pessoas afetadas pela decisão.
Nessa decorrência, a lei processual penal, no seu Título I, Capítulo VI – onde se inserem os sobreditos normativos legais –, regula a questão concernente à capacidade do juiz, visando, por um lado, a obtenção das máximas garantias de objetiva imparcialidade da jurisdição e, por outro lado, assegurar a confiança da comunidade relativamente à administração da justiça.
Como sabiamente menciona Cavaleiro de Ferreira (in “Curso de Processo Penal”, I, pág. 237-239, “Importa considerar sobretudo que, em relação ao processo, o juiz possa ser reputado imparcial, em razão dos fundamentos da suspeição verificados, sendo este também o ponto de vista que o próprio juiz deve adoptar, para voluntariamente declarar a sua suspeição. Não se trata de confessar uma fraqueza, a impossibilidade de vencer ou recalcar questões pessoais, ou de fazer justiça, contra eventuais interesses próprios, mas de admitir ou de não admitir o risco de não reconhecimento público da sua imparcialidade pelos motivos que constituem fundamento da sua suspeição”.

Como decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13.09.2006, Processo nº 06P3065, disponível em www.dgsi.pt, na sua vertente subjetiva, a imparcialidade do juiz significa uma posição pessoal, do foro íntimo do juiz, caracterizada pela inexistência de qualquer predisposição no sentido de beneficiar ou prejudicar qualquer das partes com a sua decisão. Na vertente objetiva, a imparcialidade traduz-se na ausência de quaisquer circunstâncias externas, no sentido de aparentes, que revelem que o juiz tenha um pendor a favor ou contra qualquer das partes, afetando a confiança que os cidadãos depositam nos tribunais (3).

A seriedade e gravidade do motivo ou motivos causadores da suspeição ou desconfiança sobre a imparcialidade do juiz têm de ser considerados objetivamente, não bastando, no caso do pedido de recusa, um mero convencimento subjetivo por parte do recusante para que se tenha por verificada a ocorrência da suspeição.

É a partir do senso e da experiência comuns que tais circunstâncias devem ser ajuizadas (4).
Destarte, sabendo-se que, por vezes, ocorrem circunstâncias particulares que podem colidir com o comportamento isento e independente expectável do julgador, colocando em causa a sua imparcialidade, bem como a confiança dos sujeitos processuais e do público em geral (comunidade) na aplicação da justiça, para o efeito de apreciação do requerimento de recusa, o que releva determinar é se um cidadão médio, representativo da comunidade, pode, fundadamente, suspeitar que o juiz, influenciado pelo (s) facto (s) que lhe servem de fundamento, deixe de ser imparcial e prejudique/beneficie algum dos sujeitos/intervenientes processuais.

Volvendo ao caso vertente, para mais esclarecida e percetível análise, subsumiremos os fundamentos invocados pelo arguido para obter a recusa dos senhores Juízes do Tribunal Coletivo em dois grupos:

A) A atuação processual dos mesmos em processos anteriores e/ou no processo em questão;
B) A atuação extra processual (“fora do processo”) daqueles juízes; a alegada relação de amizade do Exmo. Juiz F. V. com J. L., e daquele com os restantes juízes membros do coletivo.

♦ No que tange aos fundamentos que aqui se agrupam em A), dir-se-á o seguinte:
Não abordaremos aqui, obviamente, os factos alegados pelo arguido nos números 1 a 10 e 18 do ponto I – Resumo – e na al. m) das conclusões, os quais já sustentaram outros incidentes de recusa interpostos contra os senhores Juízes P. M. e F. V., que vieram a ser julgados improcedentes pelo Tribunal da Relação de Guimarães, por decisões transitadas em julgado (cfr. fls. 26 a 35 e 119 a 121).
Por outro lado, não colhe como suficiente para a pretendida recusa o argumento alegado pelo recusante nas suas conclusões a) e b), concernente às invocadas anteriores condenações do mesmo, noutros processos, pelas Meritíssimas Juízas L. M. e P. M..
Nada mais tendo sido invocado, e muito menos comprovado, quanto à eventual “injustiça” (mormente, propositada) dessas condenações, tal fundamento não constitui motivo, sério e grave, para recusar a intervenção das mencionadas magistradas neste novo julgamento. O facto de as referidas juízas terem proferido decisões contrárias aos interesses processuais do ora requerente em processos distintos não significa só por si que se possa considerar o juízo a proferir por elas como condicionado pelas anteriores decisões e por isso que constitua fundamento de recusa.
Na verdade, o simples receio ou temor de que o juiz, no seu subconsciente, já tenha formulado um juízo sobre o thema decidendum, não pode servir de fundamento para a recusa deste, cumprindo demonstrar e provar elementos concretos que constituam motivo de especial gravidade – assim decidindo, a título exemplificativo, o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14/07/2015, processo nº 142/11.7GAOLH-A.E1, disponível em www.dgsi.pt.
O que bem se compreende, uma vez que, sendo os motivos de suspeição menos nítidos do que as causas de impedimento, poderiam ser, por isso, fraudulentamente invocados para afastar o juiz, pelo que se impõe que haja uma especial exigência quanto à objetiva gravidade da invocada causa de suspeição, pois, de outro modo, estava facilmente encontrado o meio de contornar o princípio do «juiz natural», constitucionalmente consagrado no art. 32º, nº9, da Constituição da República Portuguesa.
Acresce que, a alegada falta de imparcialidade dos Meritíssimos juízes resultante de uma alegada desigualdade de tratamento do arguido J. C. face ao coarguido N. S., com prejuízo para o primeiro, no decurso de comunicações de alterações factuais, tidas pelo Coletivo como não substanciais, no decurso da audiência de julgamento – conclusões e) a l) –, foi já objeto de análise por este Tribunal da Relação de Guimarães, negando procedência a mais um requerimento de escusa dirigido pelo arguido contra os mesmos juízes, por decisão transitada em julgado – cfr. certidão junta a fls. 122 a 124 (Acórdão de 18/04/2017, proferido no Processo nº 39/08.8PBRG-F.G1).
Como doutamente se refere no predito aresto e por nós é sufragado, «O requerente apenas demonstra a sua discordância relativamente a actos processuais praticados no processo dos quais, de resto, interpôs os respetivos recursos, que foram admitidos. Trata-se de situações normais nos processos»; «Também não existe qualquer indício de que os Srs. Juízes tenham, por qualquer forma, desfavorecido o requerente ou lhe tenham dado tratamento diferenciado dos demais intervenientes processuais»; e «As decisões foram proferidas de acordo com a interpretação considerada de acordo com as normas legais aplicáveis».
Em conformidade, o meio processual próprio para o arguido J. C. impugnar aqueles despachos, de cujo mérito e legalidade discorda, é a interposição de recurso, o que ele, aliás, fez, no legítimo exercício do seu direito à defesa.
Ademais, mesmo face ao invocado pelo recusante somente se poderia eventualmente extrair a conclusão de que a omissão inicial do tribunal ao não comunicar ao arguido N. S. a alteração da agravante do crime de falsificação em apreço era suscetível de acarretar “benefício” para este (ainda que inconscientemente, como resulta da ulterior reposição da correta tramitação processual), mas já não que o arguido requerente tivesse sido prejudicado pela decisão do tribunal – o que parecendo a mesma coisa, não o é, de modo relevante – e, muito menos, intencionalmente.
Por conseguinte, também não se vislumbra, por este motivo, qualquer imparcialidade intencional do coletivo de juízes de modo a causar prejuízo processual ao recusante, o qual nunca ficou privado de lançar mão dos mecanismos legais próprios para atacar o despacho do Tribunal que decidiu existirem alterações não substanciais de factos descritos na acusação, e que, corretamente, lhas comunicou, tendo aquele recorrido dessa decisão, designadamente por entender que se tratariam antes de alterações substanciais.
Por último, é absolutamente normal e compreensível do ponto de vista processual, o despacho da Mma. Juíza Presidente do Tribunal Coletivo, P. M., proferido nos autos 244/11.5JABRG, que determinou a notificação do arguido para que informasse se mantinha interesse no requerimento por si dirigido ao Conselho Superior de Magistratura, perante a circunstância de, tratando-se de incidente de aceleração processual relacionado com a retenção de uma reclamação para o tribunal superior, entretanto, ter sido ordenada a sua subida (cf. documento nº8, junto a fls. 105 dos presentes autos). Com efeito, trata-se de agilizar o andamento do processo, evitando atos processuais e trâmites dilatórios, inúteis, aliás, proibidos pela lei processual (cfr. art. 130º do CPC, aplicável por remissão do art. 4º do CPP).
Destarte, não merece acolhimento o fundamento de recusa expresso na alínea m) das conclusões (nº 49 da motivação).

♦ O segundo grupo de argumentos (B) deduzidos pelo arguido J. C. encontram-se vertidos nos nºs 1 a 17 e 21 a 37 do ponto I (“Resumo”) e nas alíneas c) e d) das conclusões.
Vejamos agora se, face ao invocado pelo recusante, existem atitudes, fora do processo, significativas e relevantes, que permitam legitimamente desconfiar de uma intervenção objetivamente suspeita dos juízes em causa ou de algum deles.
Compulsados os motivos invocados e meios probatórios produzidos, não vislumbrámos que ocorra fundamento (sério e grave) que coloque em dúvida a imparcialidade de qualquer dos magistrados membros do tribunal coletivo.
Ressuma de tudo que o arguido J. C., ou alguém por ele, de modo injustificado e censurável, se dedicou a imiscuir-se nas vidas privadas dos Senhores juízes, não se coibindo de fazer referências a locais frequentados e a trajetos efetuados por estes e, coisa grave, seus filhos.
Desde logo, o alegado temor pela sua integridade física e pela sua própria vida, decorrente do acesso a conversações estabelecidas na rede social Facebook entre os juízes P. M. e F. V. a propósito da existência de romenos, mostra-se descabido e infundado.
Nada no contexto das conversações indicia que aqueles magistrados se referiam a cidadãos de nacionalidade romena que iriam “contratar” para maltratar fisicamente o arguido, na sequência de este ter deduzido outro incidente de recusa dos juízes. Até poderiam estar-se a reportar a outro processo judicial em que fossem intervenientes cidadãos de nacionalidade romena.
Aliás, só o arguido saberá porque associa os “romenos” – especificamente – a pessoas prontas a bater ou a matar outrem. E contratados para o efeito por juízes!
Logo, o seu alegado temor não se encontra minimamente justificado do ponto de vista objetivo dos factos.
Por outro lado, é absolutamente normal que os juízes em questão sejam amigos entre si – pelo menos, ao nível das redes sociais -, como nenhum espanto causa o facto de conhecerem os respetivos cônjuges (um deles também juiz).
Não se olvida que o recusante quer com isso significar que se um dos juízes fosse permeável a fatores externos que toldassem a sua desejada e impreterível imparcialidade para o julgar, tal amizade poderia “influenciar” negativamente os demais, de modo a que todos se unissem para o prejudicar.
Contudo, como vimos até ao momento, não prova o recusante que qualquer desses juízes tenha praticado qualquer ato processual que, clara, ostensiva e comprovadamente, tivesse o intuito de o prejudicar, impedindo-o de ter um julgamento justo e imparcial.
Nem essa imparcialidade ou animosidade para com o arguido resulta das alegadas condutas adotadas por aquele nas suas vidas particulares.
Posto isto, damos aqui por assente, uma vez que não foi infirmado ou contrariado pelos juízes recusados nas respostas que apresentaram, que o senhor Juiz F. V. é amigo no Facebook de J. L., comerciante de automóveis e com quem o arguido já teve negócios nessa área, que não terão corrido bem, conduzindo à instauração de processos judiciais (cível e crime).
Entre esses negócios conta-se, alegadamente, o relativo ao veículo automóvel de marca Audi, matrícula EQ.
Ora, compulsado libelo acusatório, constata-se que o mencionado J. L. não é sujeito ou interveniente processual nos autos e que não faz parte do objeto do processo (definido pelo teor da acusação) qualquer negócio envolvendo o veículo de marca Audi, matrícula EQ, mas antes 47 outros veículos distintos.
A única referência à predita viatura encontra-se plasmada na página 51 da acusação (fls. 5800 dos respetivos autos) quando se enumeram os bens e objetos que foram apreendidos na habitação do arguido J. C., entre eles uma apólice de seguro dirigida a J. P. e relativa ao veículo em questão. Mas, acentua-se, nenhuma conexão se vislumbra entre aquele documento e os factos que estão em discussão no processo 39/08.8PBBRG, os quais, segundo a acusação, são suscetíveis de integrar a prática pelo arguido, em coautoria e concurso real, de diversos crimes de falsificação de documento, burla qualificada e detenção ilegal de arma.
Ademais, do teor dos prints de páginas de Facebook dos Meritíssimos Juízes e do J. L. juntos pelo arguido com a dedução do incidente de recusa não se descortina qualquer conversação entre este e aqueles, incluindo com o juiz F. V., que denote particular conhecimento ou especial relação de confiança e amizade entre eles.
O restante alegado pelo recusante, como já dissemos, retrata uma incursão pelas vidas privadas dos magistrados em causa, sem qualquer relevância prática, porquanto não ressuma daí que qualquer deles, ou os seus cônjuges, tenha cometido qualquer ato ilegal.
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Por conseguinte, o requerimento de recusa mostra-se manifestamente infundado, sendo a motivação aduzida incapaz de consubstanciar motivo, sério e grave, para que, segundo as regras da experiência comum e da lógica, um homem médio possa colocar em causa a imparcialidade do coletivo de juízes do processo para proceder a um julgamento justo do arguido recusante.
Impõe-se, destarte, a sua improcedência.
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IV - DISPOSITIVO:

Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Guimarães:

Julgar improcedente, nos termos do art. 43º, nºs 1 e 2 do CPP, o pedido de recusa formulado nos autos pelo arguido J. C. contra os Excelentíssimos Juízes P. M., L. M. e F. V..

Nos termos do art. 45º, nº7 do CPP, condena-se o Requerente ao pagamento de 7 UC.
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Guimarães, 27 de janeiro de 2020,

Paulo Correia Serafim (relator)
Nazaré Saraiva

(Acórdão elaborado pelo relator, e por ele integralmente revisto, com recurso a meios informáticos – cfr. art. 94º, nº 2, do CPP)



1. Apesar de entendermos não se tratar de caso de aplicação supletiva das normas processuais civis, em virtude de, como vimos, existir expressa previsão no código de processo penal (cfr. art. 4º do CPP), sempre se dirá que a idêntica conclusão chegaríamos por recurso ao preceituado, conjugadamente, nos arts. 122º, nºs 1 e 3, e 293º, nº1, ambos do Código de Processo Civil, os quais, tratando o requerimento de dedução de suspeição como um incidente da instância, impõem que o recusante, logo no respetivo requerimento, indique os fundamentos da suspeição e ofereça o rol de testemunhas ou requeira outros meios de prova.
2. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, relativamente à imparcialidade garantida no referido art. 6º, § 1, tem entendido que esta deve apreciar-se de um duplo ponto de vista: aproximação subjetiva, destinada à determinação da convicção pessoal de tal juiz em tal ocasião, ou seja, ao pensamento por ele manifestado numa dada situação concreta, não podendo traduzir qualquer preconceito ou prejuízos pessoais, sendo que a imparcialidade pessoal do juiz se deve presumir até prova em contrário; e também segundo uma apreciação objetiva, isto é, se ele oferece garantias bastantes para excluir a este respeito qualquer dúvida legítima. O Tribunal Constitucional também tem reconhecido a mencionada dupla vertente do conceito de imparcialidade na consagração constitucional do princípio do acusatório e do princípio do processo justo e equitativo.
3. No mesmo sentido, vejam-se, entre outros, os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 17.10.2018, Processo nº 8436/12.8TDPRT-C.P1, e de 16.12.2015, Processo nº 2402/11.8TAGDM-A.P2.
No sentido exposto, vejam-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16.11.2005, Processo nº 10184/05, 3ª Secção, em www.dgsi.pt; do Tribunal da Relação de Évora de 16.09.2008, CJ, 2208, IV, p. 271; do Tribunal da Relação de Coimbra de 10.07.1996, CJ, Ano XIX, Tomo IV, p. 62; do Tribunal da Relação de Lisboa de 09.03.2006, CJ, Ano XXXI, Tomo II, p. 133.