Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
83/15.9GAAMR.G1
Relator: TOMÉ BRANCO
Descritores: PRISÃO SUBSIDIÁRIA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
ARGUIDO DESEMPREGADO
PRESTAÇÃO DE TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/16/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário: I) Considerando o preceituado no artº 49º, nº 3, do CPP, é de suspender a execução da prisão subsidiária a um arguido que está desempregado, não possui rendimentos, tem a seu encargo a tutela judicial de dois menores de 11 e 12 anos e vive a cargo da sua companheira que é o sustento do seu agregado familiar.
II) A suspensão deverá, no entanto, ficar sujeita, como impõe o citado preceito legal, à condição de prestação de trabalho a favor da comunidade, a concretizar pelos serviços de reinserção social, pelo número de horas que corresponde aos dias de prisão subsidiária.
Decisão Texto Integral: Recurso nº 83/15.9GAAMR.G1

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

No Proc. supra referido da Comarca de Braga Instância Local secção Competência Genérica – J1, em que é arguido José A., foi proferido despacho que indeferiu a pretensão do recorrente para que, nos termos do art. 49 nº 3 do Cód. Penal, fosse suspensa a execução da prisão subsidiária fixada para a multa em que a arguido foi condenado.

O arguido José Nunes interpôs recurso desta decisão.
A questão a decidir é tão só a de saber se deve ser suspensa a execução da prisão subsidiária.

O Ministério Público quer na 1ª Instância quer neste Tribunal de Relação é do parecer de que o recurso não deve merecer provimento.
Cumpriu-se o disposto no art. 417 nº 2 do CPP.
Colhidos os vistos cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃOTendo em atenção que são as conclusões do recurso que definem o seu objecto, nos termos do disposto no art. 412º, nº 1 do Código de Processo Penal, a questão colocada no requerimento de interposição do recurso à apreciação deste tribunal, consiste em saber se deve ser suspensa a execução da prisão subsidiária fixada ao recorrente.
Resulta dos autos o seguinte:
O arguido José A. foi condenado, por decisão transitada em julgado, pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação de conduzir do artº 3º, nº 1, do DL 2/98, na pena de 95 dias de multa, à taxa diária de €5,50.
Na sequência de notificação que lhe foi feita para proceder ao pagamento da multa e com a menção expressa de que "...se não liquidar a pena de multa terá de cumprir prisão subsidiária."(vide fis. 48), e já fora do prazo concedido para proceder ao pagamento da multa, o arguido veio apresentar o requerimento de fls. 50 e 51, solicitando que a pena de multa lhe seja substituída por dias de trabalho a favor da comunidade, indicando as razões porque não efectuou o pagamento.
Em face da extemporaneidade do requerimento apresentado pelo arguido, o Mm.° Juiz "a quo" determinou que o mesmo fosse novamente notificado para proceder ao pagamento da multa, com a advertência de que não o fazendo teria que cumprir a prisão subsidiária (fls. 62).
Dado que, na sequência, desta nova notificação o arguido nada veio fazer, foi proferido despacho em 26 de Novembro de 2015, determinado o cumprimento de 63 dias de prisão subsidiária (fls. 71).
Notificado do teor deste douto despacho veio o arguido apresentar requerimento, em que nos termos do n.° 3 do art.° 49.° do C.P.P. requer a suspensão da execução da pena de prisão, subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro (fls. 76 e 77)
Tal pretensão foi-lhe indeferida através do despacho recorrido, com fundamento de que os elementos constantes dos autos “não resulta de um modo inequívoco que arguido não está em condições de exercer qualquer actividade remunerada que lhe permita pagar a multa”.
Conforme declaração da junta de freguesia datada de 9.12.2015 (fls. 78), o arguido está “desempregado sem qualquer rendimento regular”, tendo a seu encargo sob tutela judicial de dois menores de 11 e 12 anos, sendo a sua companheira A…, auxiliar de limpeza o único elemento empregado deste agregado familiar e o único sustento da família. Mais se atesta que a família do recorrente “está referenciada como necessitada de apoio social e comunitário”.
O arguido encontra-se inscrito como candidato a emprego, no Serviço de Emprego de …, desde 30.09.2015, conforme declaração de 30.09.2015 (fls. 53).

Como se referiu no relatório deste acórdão, a questão do recurso está só em saber se deve ser suspensa a execução dos 63 dias de prisão subsidiária.
Comecemos por transcrever a norma do art. 49º, nº 3 do CPP que trata do caso: “Se o condenado provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável, pode a execução da prisão subsidiária ser suspensa, por um período de um a três anos, desde que a suspensão seja subordinada ao cumprimento de deveres de regras de conduta de conteúdo económico ou financeiro. …”.
No despacho impugnado considerou-se, tão somente como fundamentos para o indeferimento da pretensão do arguido que “em face das declarações do arguido produzidas na audiência de julgamento e do teor dos documentos juntos aos autos que atestam a sua condição económica e social e da douta promoção do DM do MP, não resulta de um modo inequívoco que o arguido não está em condições de exercer qualquer actividade remunerada que lhe permita pagar a referida multa”.
O termo «imputável», usado na norma do art. 49 nº 3 do Cód. Penal, aponta para a formulação de um juízo sobre a «culpa» do condenado no não pagamento da multa. A «culpa» consiste no juízo de censura ético-jurídica dirigida ao agente por ter actuado de determinada forma, quando podia e devia ter agido de modo diverso (Eduardo Correia, Direito Criminal, vol. I, pág. 316). Quando se ajuíza a «culpa», mais do que a correcta formulação de bons princípios, importa a ponderação do caso concreto, com todas as variáveis conhecidas do julgador.
Pois bem, segundo o teor constante dos documentos relevantes para o apuramento das reais condições pessoais do recorrente a que acima fizemos referência, o arguido José A. está desempregado, não possui rendimentos e vive a cargo da sua companheira que é o sustento do agregado familiar do arguido. É um quadro de vida francamente precário.
Não deve ser “censurado” por não ter pago a multa. Ou, para usar a terminologia da lei, “o não pagamento da multa não lhe é imputável”. Face aos actuais patamares do custo de vida, o caso afigura-se de evidência suficiente para dispensar mais considerações.
Deve, pois, ser suspensa a execução da prisão subsidiária.
Atenta a pena aplicada, a suspensão deverá durar 12 meses. Acresce que será condicionada, como impõe o art.49.º n.º3 do C.Penal, à prática de “deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro”, de forma a salvaguardar o sentido da finalidade da pena.
A imposição de deveres ou regras de conduta, de conteúdo não económico ou financeiro funcionará assim, nestes casos como o necessário sentido da pena como um «mal», para quem a cumpre, sob pena de se assim não fosse, se deslegitimar a própria função social que a pena traz insita” – Ac.R.Porto de 2/11/2011, supra citado.
No caso presente, a condição para que se suspenda a execução da prisão subsidiária será a prestação de tarefas a favor da comunidade (o arguido face ao requerimento que apresentou visando a suspensão da execução da prisão subsidiária, não se opõe a isso), pelo número de horas que corresponde aos dias de prisão subsidiária, ou seja, 36 horas de trabalho, a concretizar pelos serviços de reinserção social.
Resta decidir:
DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente o recurso interposto pelo arguido e, em consequência, alterando a decisão recorrida, suspende-se a execução da prisão subsidiária, pelo período de 12 meses, mediante a condição do arguido prestar 36 horas de trabalho a favor da comunidade, a concretizar pelos serviços de reinserção social.
Sem custas.
Processado por computador e revisto pelo primeiro signatário (artº 94º, nº 2 do C.P.P.)
Guimarães,









José Maria Tomé Branco (relator) / Cruz Bucho (Adj