Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
336/14.3TBGMR-C.G1
Relator: ANTÓNIO SANTOS
Descritores: ADMINISTRADOR DE INSOLVÊNCIA
NOMEAÇÃO
FUNDAMENTAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/27/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: a) Após as alterações introduzidas no CIRE pelo DL 282/2007, de 7/8, a indicação no âmbito da petição inicial do devedor da entidade a nomear – pelo Juiz – como Administrador da Insolvência, circunscreve-se aos casos de processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos.
b) Ainda que assim não fosse (admitindo-se que em quaisquer processos pode o devedor propor/indicar a nomeação de um concreto Administrador da Insolvência), não é porém tal proposta vinculativa para o Juiz, não se lhe impondo, em princípio, aceitar sempre tal indicação a menos que existam razões que a desaconselhem.
c) É que, importa não olvidar, após as alterações introduzidas no CIRE pelo DL 282/2007, de 7/8, verificou-se um alargamento do poder decisório do juiz em sede de nomeação do administrador judicial provisório e do administrador da insolvência, pois que, doravante e em ambas as situações, passou a dizer-se ( nos artºs 32º e 52º ) que o Juiz pode ter em conta a proposta eventualmente contida na petição.
d) Porém, tendo o devedor no âmbito da sua petição inicial indicado desde logo a pessoa que, no seu entendimento, deveria merecer a nomeação como Administrador Judicial, justificando-o e solicitando-o ao Juiz, porque as decisões proferidas sobre qualquer pedido (cfr. artº 158º,nº1, do CPC) são sempre fundamentadas, impõe-se então ao Juiz do processo, quando seja ela desatendida, que justifique sumariamente as razões da sua decisão .
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães
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1.Relatório.
J… e mulher M…, e residentes no concelho de Guimarães vieram ambos apresentar-se à insolvência, invocando encontrarem-se ambos impossibilitados de cumprir as obrigações vencidas, sendo que em sede de respectiva petição inicial logo indicaram para desempenhar as funções de Administrador Judicial de Insolvência a Drª. C…, com Domicílio profissional em Braga, conhecida em juízo e alegadamente dispondo dos necessários conhecimentos e capacidade técnica para o efeito.
Na sequência do referido e em face do disposto no artº 28º do CIRE, por sentença de 13/2/2014 o Exmº Juiz titular dos autos declarou a insolvência dos requerentes J… e M…, e nomeou ( não obstante a indicação dos requerentes em sede de petição inicial ) como Administrador da insolvência o Dr. J…, com domicílio profissional na Rua…, em Barcelos.
1.1.- Notificados da sentença judicial referida, e inconformados com a decisão que a integra na parte em que, desatendendo a indicação de ambos - constante do requerimento inicial - , nomeou o Exmº Juiz a quo e como Administrador da insolvência o Dr. J…, que não a Drª. C… e tal como haviam solicitado, da mesma vieram ambos os insolventes apelar.
Na respectiva peça recursória, formularam os apelantes as seguintes conclusões:
A. A sentença ora em crise é parcialmente nula, nos termos do artigo 615, n.º 1 al. b).
B. Com efeito, o Tribunal “A Quo” na sentença que declarou a insolvência procedeu à nomeação do respectivo administrador, ao abrigo do art. 36º, nº 1, al. d) do CIRE, não tendo acolhido a indicação que foi feita pelos ora Recorrentes, enquanto insolventes que se apresentaram à insolvência.
C. Nomeou antes para o exercício de tal cargo uma outra pessoa – o Sr. Dr. J…, com domicílio profissional … em Barcelos – não justificando o porquê desta opção, em detrimento da nomeação pelos insolventes,
D. Ou seja, o Tribunal A Quo não fundamentou minimamente a sua opção, não expôs os motivos que o levaram a ignorar a indicação feita pelos insolventes, optando por nomear pessoa diferente.
E. Tal omissão integra a nulidade prevista no art. 615º, nº 1, al. b) do Novo Cód. do Proc. Civil, onde se estatui que «é nula a sentença quando (...) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justifiquem a decisão.»
F. Do mesmo modo, a posição assumida pelo Tribunal equivale à falta de pronúncia quanto à proposta apresentada pelos requerentes, o que também configura uma nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1 al. d) do C.P.C., que desde já se invoca.
G. Tal nulidade restringe-se, na presente situação, à questão que aqui se encontra em análise, tratando-se, assim, de uma nulidade parcial do despacho recorrido, nos termos do art. 613º, nº 3 do Novo Cód. do Proc. Civil.
H. E assim sendo, haverá que declarar nula a sentença recorrida, na parte que respeita à nomeação do administrador da insolvência, cabendo depois, por força do disposto no art. 665º, nº 1 do Novo Cód. do Proc. Civil ao tribunal da Relação conhecer do objecto da apelação.
I. Devendo este substituir-se ao tribunal recorrido e, com referência aos elementos factuais que decorrem do processo,proceder à nomeação do administrador da insolvência.
J. Ora, não resultando dos autos que tenha sido indicada outra pessoa para o exercício do cargo aqui em questão, nem que a nomeação efectuada pelo tribunal recorrido tenha sido para observância do disposto na parte final do art. 13º, nº 2 da Lei nº 22/2013, de 26.2.,
K. Outra não poderá ser a solução, que não a nomeação como administradora da insolvência da pessoa indicada pelos insolventes, referenciada como a que melhor serve os interesses dos mesmos e dos seus credores: Sra. Dra. C… que também utiliza o nome abreviado de D…, com domicílio profissional na Praça…, Porto, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
1.2.- Não foram apresentadas contra-alegações.
1.3.- Thema decidendum
Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir direccionam-se para :
a) o conhecimento da invocada nulidade - parcial - da decisão apelada;
b) o não atendimento, em sede de sentença apelada, da indicação efectuada pelos apelantes no que à nomeação do administrador de insolvência diz respeito, razão porque se impõe a alteração da decisão, nomeando-se como Administrador de insolvência a pessoa indicada pelos apelantes logo em sede de petição inicial .
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2. Motivação de Facto.
Com interesse para a decisão da presente apelação importa considerar tão só a factualidade a que se alude no relatório do presente acórdão e para a qual se remete .
2.1.- Para além dela, importa porém considerar/atender que, no âmbito do cumprimento do disposto no artº 617º, nº1, do CPC, proferiu o Exmº Juiz a quo o seguinte despacho :
“ Na sua motivação sustentam os recorrentes ser nula a sentença na medida em que da mesma não consta a motivação da decisão que optou pela nomeação do Sr. Dr. J… como administrador da insolvência, em detrimento daquela Sra. Administradora que tinham indicado na petição inicial.
Assiste razão aos recorrentes dado que, naquele segmento, a sentença não se mostra fundamentada, o que configura nulidade nos termos do artigo 615º, nº 1, al. b) do N.C.P.C.
Suprindo-se essa nulidade ao abrigo do disposto nos artigos 617º, nºs 1 e 2 e 641º, nº 1 do N.C.P.C., consigna-se que se não optou pela indicação feita pelos devedores em virtude de ser procedimento deste tribunal, na falta de mecanismo que proceda à designação aleatória dos administradores de insolvência, fazer essa nomeação de modo a assegurar, tanto quanto possível, uma distribuição equitativa de nomeações.
Notifique.”
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3.Motivação de direito.
3.1.- Da nulidade - parcial - da decisão recorrida.
Reconhecendo o tribunal a quo, padecer a decisão apelada do vício a que alude o artº 615º, nº1, alínea b), do CPC, certo é que proferiu despacho a corrigi-lo [ que é o que consta do item 2.1. dos presentes autos ] , razão porque, mostrando-se prejudicado o conhecimento do referido e prévio objecto recursório, importa de imediato incidir a nossa atenção sobre a questão principal que integra o objecto da apelação.
Ademais, por força do nº2, da citada disposição legal, sempre o recurso interposto para a incidir sobre a nova decisão.
3.2.- Do não atendimento, em sede de sentença apelada, da indicação efectuada pelos apelantes no que à nomeação do administrador de insolvência diz respeito. (1)
Consideram os apelantes, em parte “amparados” por algumas decisões de Tribunais da Relação (2), que no âmbito da nomeação do administrador da insolvência e não obstante ser a mesma da competência do Juiz ( cfr. artº 52º,nº1, da Lei nº 39/2003, de 22 de Agosto- doravante designado apenas por CIRE ), se logo no requerimento inicial o devedor que impetra a declaração da sua insolvência ( cfr. artº 18º, nº1, do CIRE), propõe/indica a pessoa a nomear para desempenhar o cargo de administrador da insolvência, deve o Tribunal aceitar tal indicação, a não ser que haja motivos que a desaconselhem, o que deve então justificar, indicando-os.
A questão trazida à presente apelação, porém, fundamentalmente após as alterações introduzidas no CIRE pelo DL nº 282/2007, de 7 de Agosto, não tem sido objecto de entendimentos exactamente coincidentes, consubstanciando em rigor uma vexata quaestio, o que se alcança outrossim, para além das decisões já referidas, de diversos outros Acs. da segunda instância, designadamente do Tribunal da Relação de Lisboa (3), do Tribunal da Relação do Porto (4), do Tribunal da Relação de Évora (5) e, finalmente, também do Tribunal da Relação de Coimbra (6).
Importa, pois, explicar qual o nosso entendimento, maxime qual a interpretação que se nos afigura mais adequada em face das alterações introduzidas no CIRE pelo DL nº 282/2007, de 7 de Agosto, tarefa que se mostra em muito facilitada em consequência de todas as supra apontadas decisões da segunda instância e que sobre a questão já se pronunciaram ( ex abundantis e ad nauseam, e perfilhando entendimentos antagónicos), sendo que decisões existem outrossim que apontam inclusive para a irrecorribilidade (7) da decisão proferida pelo Juiz no âmbito de nomeação do administrador da insolvência [ com base no entendimento de que a questão integra-se no campo do uso legal de poder discricionário do juiz que é insusceptível de impugnação - cfr. arts. 52º, nº 2 e 32º, nº 1 do CIRE e 156º, nº 4 e 679º do C. P. Civil ] .
Ora Bem.
Na sequência do disposto no artº 28º, porque a apresentação à insolvência por parte do devedor pressupõe o reconhecimento pelo próprio da sua situação de insolvência, e não existindo motivo para a prolação de decisão de indeferimento ou de aperfeiçoamento ( cfr. artº 27º ), segue-se de imediato a decisão/sentença de declaração de insolvência do requerente devedor, devendo ela revestir o conteúdo descrito no artº 36º, designadamente ( cfr. alínea d), do artº 36º), integrar a decisão de nomeação do administrador da insolvência, com a indicação do seu domicilio profissional.
Tal decisão, como bem notam Carvalho Fernandes e João Labareda (8), consubstancia um acto essencial , cuja omissão determina a nulidade da sentença, todavia suprível, pois que o administrador da insolvência é uma figura nuclear do instituto, essencial à marcha do processo e a quem são cometidas, entre outras de carácter predominantemente preparatório ou instrumental, as tarefas relativas à liquidação do património do devedor.”.
Aquando do cumprimento do disposto na alínea d), do artº 36º, necessariamente há-de o Juiz ter em atenção o disposto no artº 52º, com a epígrafe de “ Nomeação pelo Juiz e estatuto “ , rezando ele que :
1- A nomeação do administrador da insolvência é da competência do Juiz.
2 - Aplica-se à nomeação do administrador da insolvência o disposto no n.º 1 do artigo 32.º, podendo o juiz ter em conta as indicações que sejam feitas pelo próprio devedor ou pela comissão de credores, se existir, cabendo a preferência, na primeira designação, ao administrador judicial provisório em exercício de funções à data da declaração da insolvência.
3 - O processo de recrutamento para as listas oficiais, bem como o estatuto do administrador da insolvência, constam de diploma legal próprio, sem prejuízo do disposto neste Código (…)”.
E , do mesmo modo, e para o mesmo efeito ( porque para ele remete o próprio artº 52º citado ), não olvidará também o Juiz o que resulta do artº 32º, sob a epígrafe de “ Escolha e remuneração do administrador judicial provisório “ , dispondo ele que :
“ 1- A escolha do administrador judicial provisório recai em entidade inscrita na lista oficial de administradores da insolvência, podendo o juiz ter em conta a proposta eventualmente feita na petição inicial no caso de processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos ”.
2- O administrador judicial provisório manter-se-á em funções até que seja proferida a sentença , sem prejuízo da possibilidade da sua substituição ou remoção em momento anterior, ou da sua recondução como administrador da insolvência .
3- (…) “.
Na sequência do disposto nas supra citadas normas do CIRE, e ao invés do que sucedia antes das alterações nelas introduzidas pelo Dec. Lei nº 282/2007 de 07 de Agosto [ por exemplo o nº 1, do artº 32º , dispunha que “ a escolha do administrador judicial provisório recai em entidade inscrita na lista oficial de administradores da insolvência, tendo o juiz em conta a proposta eventualmente feita na petição inicia “, e o nº 2, do artº 52º, que “ Aplica-se à nomeação do administrador da insolvência o disposto no nº 1 do artigo 32, devendo o juiz atender igualmente às indicações que sejam feitas pelo próprio devedor ou pela comissão de credores, se existir,e cabendo a preferência, na primeira designação, ao administrador judicial provisório em exercício de funções à data da declaração da insolvência ] manifesto é que, como bem chamam à atenção Carvalho Fernandes e João Labareda (9), enveredou o legislador ( ainda que não se descortinem razões justificativas para o efeito ) por um alargamento do poder decisório do juiz em sede de nomeação do administrador judicial provisório e do administrador da insolvência, pois que, agora, e em ambas as situações, passou a dizer-se que o Juiz pode ter em conta a proposta eventualmente contida na petição.
Acresce ainda e a reforçar outrossim o poder decisório do juiz, que a própria atendibilidade da proposta eventualmente feita na petição inicial está circunscrita aos processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos [ cfr, nº1, do artº 32º (10) ] , pois que assim o diz o próprio legislador ( cfr, artº 9º,nº1, do CC ) em sede de preâmbulo do DL nº 282/2007, expressando-se nos seguintes termos : “ Finalmente, em quarto lugar, é restringida a possibilidade de designação de um administrador da insolvência na petição inicial aos casos em que seja exigida a prática de actos que requeiram especiais conhecimentos”.
Temos assim que, perante o que agora dispõem ambas as citadas disposições legais do CIRE ( artºs 32º e 52º ), considerando o disposto no artº 9º, nºs 1 a 3, do Código Civil, e não olvidando que em sede de interpretação ou apreensão do sentido da lei, o primeiro degrau de onde há-de partir o intérprete é o do texto da lei, devendo ele começar por extrair o significado verbal que delas resulta, segundo a sua natural conexão e as regras gramaticais (11), importa desde logo, a nosso ver, arredar o entendimento que por algumas decisões é acolhido no sentido de que, quando só o devedor indica a pessoa a nomear para o cargo e integra ela as listas oficiais, deve ( quando a lei diz que o Juiz pode ) então o Tribunal , em princípio, acolher tal indicação, a não ser que haja motivos que a desaconselhem.
É certo que, para todos os efeitos ( e tal como sucedeu in casu ) , tendo o devedor no âmbito da sua petição inicial indicado desde logo a pessoa que, no seu entendimento, deveria merecer a nomeação como Administrador Judicial , justificando-o e solicitando-o ao Juiz, quer porque a tal indicação não estava obrigado ( não integra ela o conteúdo necessário da petição inicial. Cfr- artº 23º ) , quer porque as decisões proferidas sobre qualquer pedido ( cfr. artº 158º,nº1, do CPC) são sempre fundamentadas, impõe-se sempre, mas sobretudo quando desatendida , que o Juiz sobre a mesma se pronuncie, indicando as razões da sua decisão divergente.
Mas, em consonância com o que resulta da Lei, considerando o disposto no artº 8º, nº 2, do Cód. Civil, e sendo a nomeação do administrador da insolvência uma atribuição da sua competência , quando a exerce não pode o Juiz ver o seu campo de decisão limitado/restringido, a ponto de dever necessariamente seguir a proposta eventualmente feita na petição inicial pelo devedor, pois que, no âmbito da sua competência, apenas se encontra ele obrigado a respeitar a imposição que decorre do nº1, do artº 32º ( dever a escolha recair sobre entidade inscrita na lista oficial de administradores da insolvência) e, bem assim, a preferência a que alude o nº 2, do artº 52º ( dar preferência , na primeira designação, ao administrador judicial provisório em exercício de funções ).
No sentido apontado, e para além dos Ac.s já citados (12), pode ver-se ainda Luís M. Martins (13), interpretando outrossim a expressão do legislador de “podendo” ( inserta nos artºs 32º e 52º), como que traduzindo uma mera faculdade do Juiz em atender às indicações que forem feitas pelo devedor.
Postas estas breves considerações, e descendo agora à tramitação dos autos , vemos que in casu ( em face do que resulta da alegação factual inserta na petição inicial ) não está em causa a situação a que alude o nº1, do artº 32º, in fine do CIRE ( que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos ), razão porque em rigor nem sequer ao devedor assistia a faculdade de, em sede de petição inicial, propor a designação de um determinado administrador da insolvência.
Mas, ainda que assim não se entendesse, e sendo verdade que os ora apelantes indicaram e impetraram na respectiva petição inicial a nomeação pelo Juiz do processo de determinado Administrador da Insolvência, o certo é que sobre tal pedido se pronunciou expressamente o Juiz em sede de sentença, desatendendo-o ( como o podia fazer ) e justificando as razões (cuja pertinência para o efeito do mérito da apelação são totalmente irrelevantes ) que o levavam a não atender à indicação dos devedores.
Em face do exposto, e porque como vimos não estava o Juiz do processo obrigado/vinculado a atender à proposta ou indicação feita pelo devedor e ora apelante, nenhuma censura nos merece a sua decisão, proferida de resto no âmbito da respectiva competência ( cfr. artº 52º,nº1 ).
Concluindo, deve assim a apelação improceder in totum, sendo de manter a decisão apelada.
IV- SUMÁRIO ( cfr. Artº 663º,nº7, do CPC )
a) Após as alterações introduzidas no CIRE pelo DL 282/2007, de 7/8, a indicação no âmbito da petição inicial do devedor da entidade a nomear – pelo Juiz – como Administrador da Insolvência, circunscreve-se aos casos de processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos.
b) Ainda que assim não fosse (admitindo-se que em quaisquer processos pode o devedor propor/indicar a nomeação de um concreto Administrador da Insolvência), não é porém tal proposta vinculativa para o Juiz, não se lhe impondo, em princípio, aceitar sempre tal indicação a menos que existam razões que a desaconselhem.
c) É que, importa não olvidar, após as alterações introduzidas no CIRE pelo DL 282/2007, de 7/8, verificou-se um alargamento do poder decisório do juiz em sede de nomeação do administrador judicial provisório e do administrador da insolvência, pois que, doravante e em ambas as situações, passou a dizer-se ( nos artºs 32º e 52º ) que o Juiz pode ter em conta a proposta eventualmente contida na petição.
d) Porém, tendo o devedor no âmbito da sua petição inicial indicado desde logo a pessoa que, no seu entendimento, deveria merecer a nomeação como Administrador Judicial , justificando-o e solicitando-o ao Juiz, porque as decisões proferidas sobre qualquer pedido (cfr. artº 158º,nº1, do CPC) são sempre fundamentadas, impõe-se então ao Juiz do processo, quando seja ela desatendida, que justifique sumariamente as razões da sua decisão .
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4. Decisão.
Em face do supra exposto,
acordam os Juízes na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães , em , não concedendo provimento ao recurso de apelação apresentado pelos devedores/insolventes :
4.1.- Manter a decisão do tribunal a quo .
Custas pela massa insolvente.
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(1) Deixa-se consignado na presente nota que, por razões de economia de meios, e porque ademais e entretanto nada se alterou por via legislativa que nos tenha forçado a alterar a nossa anterior posição, o presente acórdão segue de perto ( demasiado) a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15/11/2011, Proc. nº 440/11.0TBLNH-A.L1-1, e do qual fomos também o respectivo relator .
(2) “Alinhando” pelo entendimento ao qual aderem os ora apelantes, podem ver-se, de entre outros, v.g. : os Ac.s do Tribunal da Relação de Guimarães de 27/9/2012, de 27/1/2011 e de 22/2/2011; a Decisão individual do Tribunal da Relação de Lisboa de 19/4/2004 e os Acs. do Tribunal da Relação do Porto de 28/1/2014 ( Proc. nº 1006/13.5TBMCN-E.P1), de 22/10/2013 ( Proc. nº 1546/13.6TBPVZ-A.P1 ), de 24/9/2013 ( Proc. nº 210/13.0TBPRG-C.P1 ) , de 9/10/2012 (4912/12.0TBVNG-A.P1) e de 11/5/2010, todos eles disponíveis in www.dgsi.pt.
(3) Cfr. Acs. de 17/5/2011, de 5/3/2013 e de 21/3/2013, todos eles disponíveis in www.dgsi.pt.
(4) Cfr. Acs de 21/10/2013 ( Proc. nº 974/13.1TBPFR-A.P1 ) e de 7/7/2011, disponíveis in www.dgsi.pt.
(5) Cfr. Ac. de 1/1/2013, Proc. nº 58/12.0TBETZ-B.E1, e disponível in www.dgsi.pt
(6) Cfr. Ac. de 26/2/2013, Proc. nº 2/13.7TBTND-A.C1, e disponível in www.dgsi.pt.
(7) Cfr. v.g. os Acs. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19/6/2012 ( Proc. nº 617/12.0TBALM-A.L1-1) e de 6/3/2012 (14232/11.2T2SNT-G.L1-7), ambos in www.dgsi.pt.
(8) In Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Quid Júris , 2009, pág. 240.
(9) Ibidem, pág. 178/179
(10) Cfr. Carvalho Fernandes e João Labareda, ibidem, pág. 179.
(11) Cfr. Domingues de Andrade, In Ensaio Sobre a Teoria da Interpretação das Leis, 4ª Edição, Coimbra, 1987, pág. 139.
(12) E de entre muitos outros o do tribunal da Relação de Lisboa, de 17/5/2011 e o do tribunal da Relação do Porto, de 7/7/2011 .
(13) In “ Processo de Insolvência”, Almedina, 2ª ed., 2010, pág. 186.
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Guimarães, 27/3/2014
António Santos
Figueiredo de Almeida
Ana Cristina Duarte