Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4/16.1T8VRL.G3
Relator: LÍGIA VENADE
Descritores: REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
TEMPESTIVIDADE
RECLAMAÇÃO DA CONTA DE CUSTAS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/23/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I A apresentação do requerimento a solicitar a dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente ou redução da mesma, é extemporâneo se apresentado após a elaboração da conta de custas.

II A conta de custas não deve refletir o decaimento na ação; a decisão proferida quanto à repartição das custas releva em sede de custas de parte.

III Não havendo vencimento integral de uma das partes a taxa remanescente é incluída na conta final, independentemente da proporção do decaimento.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I RELATÓRIO.

A R. C. F., notificada do despacho proferido em 9.12.2019 que lhe indeferiu a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça bem como a reclamação apresentada relativamente á conta elaborada, e com o mesmo não se conformando, veio interpor recurso apresentando alegações com as seguintes
-CONCLUSÕES-

1 – A decisão recorrida foi no sentido de considerar extemporâneo o pedido de dispensa ou redução da taxa de justiça remanescente e de considerar improcedente a reclamação da conta requerida a titulo subsidiário.
2 – Para fundamentar a tese da extemporaneidade do requerido pela Recorrente, o d. despacho recorrido consubstancia-se na jurisprudência que diverge quanto ao prazo de apresentação do requerimento de dispensa ou redução da taxa de justiça remanescente, uma vez que uma parte dessa jurisprudência assenta no pressuposto de que a dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente terá de ocorrer no prazo do trânsito em julgado da decisão e outra parte da jurisprudência assenta no pressuposto de que tal pedido poderá ser efetuado até à elaboração da conta.
3 – Já quanto ao pedido de reclamação/reforma da conta de custas, o Mmo. Juiz a quo fundamenta o seu indeferimento com a conclusão que a conta de custas foi corretamente elaborada, afirmando, ainda, que a conta não pode imputar custas a cada parte em proporção distinta da fixada em sede de decisão de custas.
4 – Como se infere do teor do requerimento apresentado, a recorrente destrinçou no seu requerimento as duas questões de direito de forma separada e autónoma, qual seja, em primeiro lugar, o pedido de dispensa ou redução do pagamento da taxa de justiça remanescente e, em segundo lugar e a titulo subsidiário, o pedido de reclamação da conta de custas.
5 – Com o devido respeito e salvo melhor entendimento, parece-nos que a decisão proferida no d. despacho, quanto ao pedido de dispensa ou redução da taxa de justiça remanescente, padece de ilegalidade por violação do art. 6º, nº 7 do RCP.
6 - Antes da introdução do art. 6º, nº 7 pela L. 7/2012, de 13.02, o Tribunal Constitucional foi chamado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade do art. 6º, do RCP, na redacção introduzida pelo DL nº 52/2011, de 13.04, tendo julgado inconstitucionais, por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no art. 20º da CRP, conjugado com o princípio da proporcionalidade, decorrente dos arts. 2º e 18º, nº 2, 2ª parte, da CRP, as normas contidas nos arts. 6º e 11º, conjugados com a tabela I-A anexa, do RCP, na redacção introduzida pelo referido DL nº 52/2011, de 13.04, quando interpretadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da acção sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título – ver o Ac. nº 421/2013, de 15.7.2013, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.
7 - E foi no cumprimento do decidido pelo Tribunal Constitucional que o legislador alterou a lei e introduziu o nº7, do art. 6º, do RCP.
8 - Do disposto neste normativo constata-se que se encontra lá contido um comando dirigido ao juiz no sentido de, oficiosamente e em conformidade com os pressupostos legais, poder dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça a considerar na conta final;
9 - Não contém o aludido preceito nenhum comando exigindo às partes que, antes da elaboração da conta, se lhes imponha em quaisquer circunstâncias requerer a dispensa.
10 - A circunstância de o juiz poder agir oficiosamente no sentido da dispensa (ou redução) do pagamento do remanescente, antes da sentença ou decisão final, não implica que o benefício ou vantagem que para as partes advém da oficiosidade concedida ao juiz seja convertido num ónus, impedindo-as de requerer a dispensa com a notificação da conta que, essa sim, fixa o valor a pagar, designadamente quando apenas com a conta se fixa a base tributável em valor diverso do atribuído à causa pelos interessados.
11 - Conforme tem vindo a ser entendido a nível dos tribunais superiores, “os critérios de cálculo da taxa de justiça devem pressupor e garantir um mínimo de proporcionalidade entre o valor cobrado ao cidadão que recorre ao sistema público de administração da justiça e o custo/utilidade do serviço que efectivamente lhe foi prestado”, salvaguardando-se, dessa forma, os princípios constitucionais referidos no mencionado acórdão do TC – Cfr. Ac. da RL de 21.04.2015, P. 2339/05.0TCSNT.L1-7 (Maria do Rosário Morgado) em wwww.dgsi.pt.
12 - A tramitação dos presentes autos revelou-se simples e não comportou custos consideráveis ou dispendiosos para o sistema judicial, limitando-se essencialmente, no que respeita à actividade processual susceptível de gerar o pagamento de remanescente, aos articulados, requerimentos das partes, produção de prova, e recurso em um grau quanto à decisão de fundo.
13 – Sobre a complexidade da causa e a conduta das partes já se havia pronunciado o Tribunal da Relação de Guimarães quando determinou a revogação da parte decisória que pretendia agravar as custas à recorrente, com os seguintes fundamentos:
«Contudo, tendo em atenção que as questões em análise não são de elevada especificação jurídica, nem importam a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso, e que as diligências probatórias não foram morosas, não implicaram a audição de um elevado número de testemunhas, nem a análise de meios de prova complexos, concluímos que o montante da taxa de justiça que resulta da consideração do valor da ação não se revele intoleravelmente desadequado/desproporcionado por reporte à quantidade e qualidade dos serviços prestados».
«Assim sendo, revoga-se a decisão nesta parte.»
14 - Face ao decidido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, é o Mmo. Juiz a quo que não usou oficiosamente do poder consignado no art. 6º, nº 7 do RCP, entendendo a recorrente que os montantes resultantes da elaboração da conta de custas a final se revelam excessivos face ao processado desenvolvido e de, por isso mesmo, ter requerido a dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente após a notificação da conta de custas.
15 – Ademais, e como resulta do disposto no nº 7, do art. 6º, do RCP e no nº 1, do art. 7º, da Portaria 419-A/2009, de 17 de Abril, o "remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final (...)" e "Findo o processo e registados todos os movimentos contabilísticos, é elaborada a conta (...)", ou seja, o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça pode ser apresentado após a notificação às partes da conta de custas, dentro do prazo disponível para a reclamação da dita conta.
16 - Do disposto nos preceitos acima enunciados decorre que a questão da dispensa do remanescente não se pode considerar abrangida pelo caso julgado da sentença ou acórdão finais, uma vez que estes se limitam a fixar definitivamente a repartição da responsabilidade pelas custas, mas não o montante das mesmas.
17 - Só depois de elaborada a conta final do processo é que o tribunal e as próprias partes ficam a conhecer o valor exato da taxa de justiça que seria devida e se encontram em condições para apreciar devidamente se o valor da taxa de justiça é ou não é excessivo e desadequado face ao circunstancialismo do processo.
18 - Pelo que e salvo o devido respeito por melhor opinião, a notificação da conta de custas nunca pode ser o momento a partir do qual o requerimento de dispensa submetido pelas partes deixa de ser tempestivo, mas apenas o momento a partir do qual o juiz deixa de poder decidir a questão por sua própria iniciativa.
19 - Na medida em que as referidas disposições legais não possibilitam uma interpretação no sentido de ser extemporâneo o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, após a elaboração da conta de custas.
20 - Destarte, entende a recorrente que a lei não prevê nenhum momento processual para as partes influenciarem a decisão do juiz sobre a dispensa, total ou parcial, do remanescente da taxa de justiça em momento anterior à elaboração da conta e, em bom rigor, a ausência de dispensa só é conhecida pelas partes com a notificação da conta.
21 - De facto, não tem sido pacífica na nossa jurisprudência a questão de saber até que momento pode ser decidido a dispensa que resulta do disposto no art. 6º, nº 7 do RCP.
22 - Em sentido contrário ao propugnado no despacho recorrido e conforme refere a Conselheira, Ana Paula Boularot, que votou vencida, no Ac. Do STJ, proc.1286/14.9TVLSB-A.L1.S2, disponível em www.dgsi.pt:
«Ora, para além de estarmos perante uma dualidade de prazos, não se podendo pois afirmar que se trata de um entendimento predominante, sendo que um e outro prazo para além de não serem compatíveis entre si, não encontram qualquer respaldo na legislação aplicável, pois a condenação no pagamento das custas ocorre na decisão final, e a elaboração da conta de custas, com a inerente liquidação da taxa de justiça, tem lugar após aquela decisão e no prazo de dez dias após o trânsito em julgado da decisão final, como deflui do disposto no artigo 29º, nº1 do RCProcessuais, não podendo, no bom rigor dos princípios, estar a correr um prazo para a parte exercer um direito, concomitantemente com outro para a secretaria elaborar a conta de custas».
23 - Face à dualidade de prazos propugnados na jurisprudência fundante da decisão do Mmo Juiz a quo, não se pode concluir que a tese propuganada no despacho recorrido se trata de um entendimento predominante, uma vez que estamos perante uma dualidade de critérios quanto ao prazo para se requerer a dispensa ou redução da taxa de justiça remanescente.
24 - Bem pelo contrário, a jurisprudência que merece o nosso total acolhimento, não é assim tão minoritária e vai toda no sentido de que a dispensa do pagamento pode ser requerida após a elaboração da conta, em sede de reclamação, fundando-se, dentre outros argumentos, na necessidade de correcção da desproporção entre o valor cobrado de taxa de justiça e o custo implicado na acção, e ainda no facto de o legislador não ter fixado qualquer prazo para a parte interessada provocar a decisão do juiz -
Ver acórdãos do STJ de 14.02.2017, no processo n.º 1105/13.3T2SNT.L2.S1 (Conselheiro Júlio Gomes) e de 12.10.2017, no processo nº 3863/12.3TBSTS-C-P1.S2 (Conselheiro Salazar Casanova); ver também os acórdãos da Relação de Lisboa de 03.12.2013, no processo nº 1586/08.7TCLRS-L2-7, de 27.02.2018, no proc. 5988/09.3TVLSB.L1-7, da Relação de Coimbra, de 29/04/2014, proc. 2045/09.6T2AVR-B.C2., da Relação de Guimarães, de 11.01.2018, Proc. 501/07.0TBVPA-G.G1 e da Relação de Évora de 12.07.2018, no processo n.º 1973/16.7T8STR.E2, da Relação do Porto de 07.11.2013, no processo n.º 332/04.9TBVPA.P1 e de 11/04/2019, processo n.º 1874/17.1T8VNG.P2, todos consultáveis em www.dgsi.pt.
25 - Em recente acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 10/07/2019, no proc. Nº 797/12.5TVPRT-A.G2, consultável em www.dgsi.pt, foi decidido que:
1 - A taxa de justiça é o valor que cada interveniente deve prestar, por cada processo, como contrapartida pela prestação de um serviço.
2 - A dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida depende da especificidade da situação processual, além da complexidade maior ou menor da causa e da conduta processual de cada uma das partes, por força do disposto no artº 6º, nº 7, do Regulamento de Custas Processuais (RCP).
3 - A teleologia da norma em causa não permite uma situação de intolerável desproporcionalidade entre a atividade judiciária despendida e o montante da taxa de justiça que é imputada ao requerente.
4 - Nada tendo sido dito quanto a essa dispensa na sentença, pode a mesma ser decidida posteriormente, designadamente no momento em que se aprecie o requerimento de reclamação/reforma da conta de custas (sendo o erro na qualificação do meio processual corrigido oficiosamente pelo juiz).
26 - É do entendimento da recorrente que requerendo a parte responsável pelo pagamento das custas a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, no prazo que a lei lhe concede para reclamar da conta, como foi o caso, não se vê, nem a decisão recorrida esclarece, qual o fundamento legal para considerar intempestivo tal requerimento.
27 - E no caso sub judice, impunha-se uma decisão do Tribunal a quo na determinação, ex oficio, da dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente, uma vez que a Relação de Guimarães já se tinha pronunciado que o presente processo não se reveste de especial complexidade, que as questões em análise não são de elevada especificação jurídica, nem importam a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso, e que as diligências probatórias não foram morosas, não implicaram a audição de um elevado número de testemunhas, nem a análise de meios de prova complexos.
28 - Como se infere da análise do presente processo, o valor exagerado das custas a pagar resultou apenas do elevado valor do processo, independentemente da sua complexidade, não havendo correspondência entre os custos da atividade jurisdicional e o valor total das taxas que estão a ser solicitadas.
29 - Verifica-se, portanto, face à tramitação do processo e ao teor/natureza das questões decididas, que o valor das custas é desadequado, porquanto é manifestamente desproporcional ao serviço prestado.
30 – Não pode, ainda, o Tribunal olvidar-se que deve existir correspectividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais, de acordo com o princípio da proporcionalidade consagrado no art. 2º da CRP e atendendo ainda ao direito de acesso à justiça acolhido no art. 20º igualmente da CRP, tudo visto e ponderado, na sequência do exposto, deverá revogar-se o despacho recorrido e deferir-se o requerido, devendo a conta de custas a elaborar desconsiderar o remanescente da taxa de justiça.
31 - Pelo que a taxa de justiça já liquidada é manifestamente suficiente, justa, proporcional e adequada, justificando-se, em face da correcta conduta processual das partes e da não excepcional complexidade do processo, conforme já determinado pela Relação de Guimarães, que se proceda à dispensa da taxa de justiça remanescente e o requerimento do pedido de dispensa ou redução da taxa de justiça remanescente é tempestivo.
32 - Ao não ter decidido da forma como propugnado pela recorrente quanto à dispensa ou redução da taxa de justiça remanescente, o despacho em crise, violou o disposto nos arts. 7º, nº 6 do RCP, art. 7º, nº 1, da Portaria 419-A/2009, de 17 de Abril, arts. 6º, 7º, 193°, 547° e 529º, nº 2, todos do CPC, arts. 20º, 2º e 18º, nº 2 e 266º, nº 2 todos da CRP e art. 6°, n° 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
33 - Requereu, ainda, a recorrente, subsidiariamente, a reclamação da conta de custas.
34 - Fundamentou a reclamação com base na omissão da conta de custas notificada à recorrente quanto às taxas de justiça pagas pelas partes no incidente de intervenção de terceiros, alegando em sua defesa a violação do art. 30º do RCP.
35 - Mais alegou que do teor da conta de custas apresentada não se infere qual a percentagem atribuída, proporcionalmente, a cada uma das partes em conformidade com o seu vencimento e decaimento de causa, nos termos do libelo condenatório.
36 - Em requerimento complementar a recorrente reclamou que a secretaria deveria imputar de forma igualitária a conta de custas a ambas as partes independentemente da proporção do decaimento, levando-se, ainda, em conta a taxa de justiça já liquidada.
37 - Tendo, ainda, esclarecido que a proporção do decaimento apenas tem relevância para efeitos de custas de parte.
38 - O despacho recorrido, corroborando a informação prestada pelo Sr. Oficial de Justiça e que teve a concordância do Ministério Público, concluiu que a conta de custas foi corretamente elaborada, afirmando que a conta não pode imputar custas a cada parte em proporção distinta da fixada em sede de decisão de custas, julgando improcedente a reclamação da conta de custas.
39 – Conforme demonstrado nos pontos I, II e III, da alínea B das presentes alegações e que por uma questão de economia processual, se remete a sua leitura e análise, facilmente se chega à conclusão que mal andaram as entidades que se pronunciaram pela correta elaboração da conta e, consequentemente, o despacho em crise.
40 – Conforme apresentado no ponto I, da alínea B das presentes alegações, a conta notificada à recorrente apresenta o valor total a pagar de: 5.924,80€, apresentando uma diferença a mais na conta da quantia de 416,80€ - (5.904,80€ - 5.508,00€ = 416,80€).
41 – Daí que se impõe a reforma da conta de custas por a mesma não se encontrar calculada nos termos e em conformidade com a tabela do Sindicato dos Funcionários de Justiça.
42 - Mas existe ainda outra discrepância na conta de custas notificada à R. e que diz respeito à origem das taxas aplicáveis à ação e aos recursos.
43 - Conforme se constacta do teor da conta notificada é lá feito constar no “item 1 – Taxas aplicáveis”, quanto à origem: “Outro”;
44 – Assim e no bom rigor da aplicação da lei, a origem de cálculo deve ser “Processo” e não “outro”, conforme lá feito constar.
45 - Em requerimento complementar a recorrente reclamou que a secretaria deveria imputar de forma igualitária a conta de custas a ambas as partes independentemente da proporção do decaimento, levando-se, ainda, em conta a taxa de justiça já liquidada.
46 - Tendo, ainda, esclarecido que a proporção do decaimento apenas tem relevância para efeitos de custas de parte.
47 - Na verdade e após a entrada em vigor da L. nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, as Secretarias judiciais deixaram de efetuar o cálculo dos respectivos decaimentos, devendo ser incluída na conta final a taxa de justiça devida, levando-se em conta a taxa já paga, independentemente da proporção do decaimento.
48 - É às partes a quem incumbe o ónus de imputar a título de custas de parte o decaimento e não as Secretarias Judiciais.
49 - Ao contrário do que é fundamentado no despacho em crise, a recorrente não alegou que o decaimento imputado na conta deveria ser igual, mas tão só que a secretaria deveria imputar de forma igualitária a conta de custas a ambas as partes independentemente da proporção do decaimento.
50 - E o entendimento da recorrente tem como fundamento o referido na pag. 98 das “Custas Processuais – Guia Prático”, Centro de Estudos Judiciários, 3ª Edição, Abril de 2015, quando é lá expressamente referido que:
«Caso ambas as partes sejam responsáveis em virtude de ter havido decaimento (sucumbência) de cada uma, será elaborada uma conta para cada uma, na qual se imputará o valor referente ao remanescente, independentemente da proporção do decaimento, tendo em conta que o acerto dos valores será feito através do instituto de custas de parte previsto nos artigos 25.º e 26.º do Regulamento das Custas Processuais e nos artigos 30.º a 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17/04».
51 – Finalmente e como demonstrado no ponto III, da alínea B das presentes alegações, e para a qual, por uma questão de economia processual, se remete a sua leitura e análise, constata-se que existe erro de cálculo da proporção do decaimento imputado a ambas as partes na conta de custas notificada, por esta não atribuir proporcionalmente o decaimento dos pedidos de ambas as partes em conformidade com o libelo condenatório.
52 – Em conformidade com o libelo condenatório foi lá decidido, a título de custas, a seguinte condenação:
«Custas por A. e intervenientes, por um lado, e pela R., por outro lado, na proporção dos respectivos decaimentos (tendo-se para o efeito em conta o modo de cálculo/fixação do valor da ação constante de fls. 185) – art. 527º, nºs 1 a 3 do CPC».
53 - Na verdade, considerando o valor que foi fixado pelo Mmo. Juiz à causa de 486.821.37 €, e tendo a R. sido condenada a pagar ao A. a quantia total de 102.000,00 € (100.000,00€ + 2.000,00 €) e decaído no valor da reconvenção de 85.971,26 €, a R. decaiu na ação em mérito na proporção de 38,61% e o A. e intervenientes decaíram na ação em mérito na proporção de 61,39%.
54 - Mas não é esta a realidade contabilística expressa na conta de custas notificada às partes.
55 - Depois de compulsados os presentes autos, constata-se que a R. foi notificada para pagar a conta de custas no valor de 5.924,80 € (cinco mil e novecentos e vinte e quatro euros e oitenta cêntimos);
56 - E o A. e Intervenientes foram notificados para pagar a conta de custas no valor de 2.949,20 € (dois mil novecentos e quarenta e nove euros e vinte cêntimos);
57 - Considerando os valores calculados pela Secretaria pode-se concluir que houve uma inversão da proporção do decaimento que deve ser imputado a cada uma das partes,
58 - Na medida em que, calculando os valores em crise através do uso da regra matemática de três simples, a R. decaiu na proporção de 66,77%;
59 - E o A. e Intervenientes decaíram na proporção de 33,23%;
60 - Com o devido respeito, do exposto se conclui que o cálculo da proporção do decaimento das partes reportado na conta de custas notificadas a ambas as partes, não corresponde ao teor da decisão condenatória e que as mesmas também neste domínio se encontram erradamente calculadas.
61 - Parece-nos que face ao valor da ação e ao veredicto condenatório e acima expressamente descrito, não restam dúvidas, porque a matemática assim o desmente, que a conta de custas também se encontra viciada por erro de cálculo na determinação da proporção do decaimento que incumbe a cada uma das partes, e que, por isso mesmo, deve a mesma ser reformada.
62 - Ao não ser determinado a reforma da conta de custas conforme propugnado pela recorrente, o despacho em crise, ressalvando sempre o devido respeito por melhor entendimento, violou o preceituado nos arts. 527º e 529º, ambos do CPC, e nos arts. 29º, 30º, 25º, nºs 1 e 2 e 26º, todos do RCP.

Pede provimento ao recurso, devendo o despacho recorrido ser revogado, e, consequentemente ser a recorrente dispensada, in totum, do pagamento do valor remanescente da taxa de justiça; subsidiariamente, b - quando assim não se entenda, o que apenas se concebe por mero dever de patrocínio, deve proceder-se à sua redução para um valor justo e proporcional ao serviço prestado; c – Ser, ainda, a conta de custas anulada e reformada nos termos propugnados pela recorrente, tudo com as demais consequências legais.
***
O M.P. apresentou contra alegações, com as seguintes

-CONCLUSÕES-

A. Vem o recurso interposto do despacho judicial proferido a 09-12-2019 (ref.ª 33968612) que, sinteticamente, julgou “(…) extemporâneo e desadequado o requerimento apresentado, não conhecendo, consequentemente, da pretensão de fundo no mesmo suscitada de dispensa ou redução do remanescente da taxa de justiça. (…) e julgou “(…) improcedente a reclamação da conta de custas. (…)”;
B. O valor da causa nos presentes autos foi fixado em € 486.821,37 (em sede de Audiência Prévia - cfr. ref.ª 30377553), nos termos das disposições conjugadas dos art.os 297º, n.os 1 e 2, 299.º, n.os 1 e 2, 301.º, n.º 1 e 306.º, n.os 1 e 2, todos do C.P.C.;
C. Concordamos in totum com o Tribunal a quo quando decidiu que a dispensa ou redução do remanescente da taxa de justiça não pode ser requerida e apreciada depois de elaborada a conta e notificada às partes;
D. O limite temporal final, para ser requerida a dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça é aquele que antecede a elaboração da conta [como têm vindo a decidir, de forma absolutamente maioritária, os nossos tribunais superiores - entre outros, Ac. Do TRG de 04-05-2017, do TRP de 26-04-2018, do TRC de 15-01-2019, do TRL de 22-02-2018, 20-09-2018, 15-11-2018 e 28-02-2019; e do STJ de 13-07-2017, 03-10-2017, 12-10-2017, 22-05-2017, 11-10-2018, 1112-2018, 26-02-2019 e 24-10-19, todos disponíveis para consulta in www.dgsi.pt];
E. Se, por um lado, o art.º 6.º, n.º 7, do R.C.P., não consagra o limite temporal para se requerer e decidir da referida dispensa ou redução, por outro lado, preceitua de forma expressa que o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta final (pelo que a referida dispensa tem de ter lugar antes de elaborada a conta final, sob pena de, assim não se entendendo, se praticarem atos inúteis em violação do disposto no art.º 130º, do C.P.C.);
F. A ré, recorrente, salvo o devido respeito, incorreu em erro de interpretação normativa relativamente a esta primeira parte da motivação; é que, depois de elaborada a conta de custas, as partes são notificadas da mesma, mas apenas para dela poderem reclamar ou pedir a sua reforma, o que fez, e mereceu despacho de indeferimento (com o qual também concordamos integralmente, nesta parte, pelos fundamentos de direito a que aduziremos);
G. Decidiu o Tribunal a quo, com sustentação no disposto no art.º 30.º, n.º1 do R.C.P., numa interpretação restritiva que, no nosso humilde entendimento também se impõe, que “(…) a conta de custas deve conter as custas dos incidentes, apenas quando tais custas tenham alguma repercussão sobre o cálculo do valor das custas a pagar e não também quando não tenham qualquer repercussão sobre o valor das custas a pagar (pois de outra forma estaríamos perante a prática de um ato inútil). (sublinhado nosso);
H. Ora, porque as custas pagas no âmbito do incidente de intervenção de terceiros não tem qualquer repercussão/relevância sobre o valor das custas que qualquer das partes venha a ter de pagar, não procede, também nesta parte, a argumentação da ré;
I. Da conta de custas infere-se à saciedade, porque concretizada, qual a percentagem do decaimento de cada parte, que é a que consta da decisão proferida quanto a custas;
J. Como decidiu sabiamente o Tribunal a quo “(…) No que à ação/reconvenção diz respeito, o decaimento da R. foi total quanto ao montante de € 200.000,00 (valor dos pedidos 2 e 3 da p.i.); já quanto ao valor de € 175.000,00 (valor do pedido 6 da p.i.), o decaimento da R. foi nulo; e quanto ao valor de € 25.850,11 (valor dos pedidos 7 e 8 da p.i.), o decaimento da R. corresponde ao da percentagem correspondente a € 2.000,00; e, por fim, o decaimento da R. foi total quanto ao valor de € 85.971,26 (valor da reconvenção);
K. Foi com base na decisão proferida quanto a custas e nos decaimentos acima mencionados, que a conta foi elaborada, pelo que, no nosso modesto entendimento, apresenta-se corretamente elaborada;
L. A conta não pode imputar custas a cada parte em proporção distinta da fixada em sede de decisão de custas e, contrariamente à pretensão da ré e ao que a mesma alega nesta parte [tal como o deixa expresso o Tribunal a quo] na decisão de custas não se fixou que as mesmas se repartiriam em partes iguais entre as partes, pelo que, na conta de custas não se poderia proceder a tal repartição;
M. Veio a ré reclamar da conta de custas que constitui, tão só, e como o próprio nome indica, uma reacção contra um erro de contagem, com vista a que esta seja alterada em conformidade com a lei, não constituindo meio processualmente adequado para a formulação do pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida ou para a obtenção desse benefício, porque, salvo o devido respeito, as alegações da ré entrecruzam-se nessas duas questões;
N. Atentos os fundamentos do decidido e os normativos aplicáveis, não incorreu o despacho recorrido em qualquer vício e/ou ilegalidade;
O. Não violou o Tribunal a quo quaisquer normativos, designadamente, os artigos 6.º, n.º 7, 25.º, n.os 1 e 2, 26.º, 29.º e 30.º, do R.C.P., art.º 7.º, n.º 1, da Portaria 419A/2009, de 17 de Abril, 6.º, 7.º, 193.°, 527.º, 529.º, n.º2 e 547.°, todos do C.P.C., 20.º, 2.º e 18.º, n.º 2 e 266.º, n.º 2 todos da C.R.P., 6.°, n.° 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem;
P. Não nos merece censura o despacho proferido pelo Tribunal a quo, com o qual concordamos in totum, devendo o mesmo ser mantido e assim improceder o recurso, em todas as suas vertentes de argumentação.
Conclui dizendo que deverá ser negado provimento ao recurso, confirmando-se, in totum, o despacho recorrido por nenhum agravo ter feito à Lei e por nenhum reparo nos merecer.
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Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II QUESTÕES A DECIDIR.

Decorre da conjugação do disposto nos artºs. 608º, nº. 2, 609º, nº. 1, 635º, nº. 4, e 639º, do Código de Processo Civil (C.P.C.) que são as conclusões das alegações de recurso que estabelecem o thema decidendum do mesmo. Impõe-se ainda ao Tribunal ad quem apreciar as questões de conhecimento oficioso que se resultem dos autos poder/dever de que se fará uso nos autos como veremos.

Impõe-se por isso no caso concreto e face às elencadas conclusões decidir se:

-o requerimento da R. pedindo dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente é tempestivo;
-sendo tempestivo, se o pagamento deve ser dispensado ou reduzido o respetivo valor;
-se a conta de custas se apresenta bem elaborada.
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III MATÉRIA A CONSIDERAR.

Da análise dos presentes autos decorre que:

1) Na ata de audiência prévia de 4/11/2016 foi proferido o seguinte despacho, que transitou:
“Fixo à causa o valor de € 486.821,37 – arts. 297º, n º 1 e 2, 299º, n º 1 e 2, 301º, n º 1 e 306º, n º 1 e 2, do C.P.C.
Tal valor corresponde ao valor da acção, valor a que se reportam os pedidos 2) e 3) ou seja, o valor do contrato em causa, ou seja, € 200.000,00 + o valor a que se reporta o pedido 6) que, à data da propositura da acção já ascendia ao valor líquido de € 175.000,00 + o valor dos pedidos 7) e 8); mais o valor da reconvenção de € 85.971,26.”
2) Por sentença de 6/6/2017 foi decidido que:
“Declaro que a R. prometeu vender os prédios identificados em 1 dos factos provados, nos termos e condições alegados nos arts. 18º a 29º, da p.i.; Declaro que a resolução do contrato promovida pela R. é inválida e ineficaz; condeno a R. a restituir/pagar ao A. a quantia de € 100.000,00 (cem mil euros), recebida a título de sinal e princípio de pagamento; condeno a R. a pagar ao A. juros de mora sobre a tal importância de € 100.000,00, contados desde a citação até integral pagamento; condeno a R. a pagar ao A. a quantia de € 2.000,00 (dois mil euros); condeno a R. a pagar ao A. juros de mora sobre a tal importância de € 2.000,00, contados desde a citação até integral pagamento; condeno o A. a restituir à R. as alfaias agrícolas prometidas vender, reconhecendo, porém, ao A., o direito de retenção das mesmas, até que a R. lhe pague a quantia de € 100.000,00 e respectivos juros moratórios; condeno a R., como litigante de má fé, numa multa de 5 (cinco) UC; julgo improcedentes os demais pedidos, absolvendo A., Intervenientes e R. dos mesmos.
Porque a contestação reconvenção é prolixa, considero a acção de especial complexidade e determino a aplicação à R. dos valores da taxa de justiça constantes da tabela I – C, do R.C.P.
Custas por A. e Intervenientes, por um lado, e pela R., por outro lado, na proporção dos respectivos decaimentos (tendo-se para o efeito em conta o modo de cálculo/fixação do valor da acção constante de fls. 185) – art. 527º, n º 1 a 3, do C.P.C.”
3) Por Acórdão de 27/6/2019 foi decidido confirmar a sentença, exceto na parte que determinou a aplicação à R. dos valores da taxa de justiça constantes da tabela I-C do RCP, que se revogou; mais se atribuíram as custas á apelante/R.
4) Por decisão de 3/5/2016 foi decidido admitir a requerida (pela R.) intervenção principal provocada de C. N. e esposa A. F.; mais foram imputadas as custas do incidente ao A. – art. 527º, do C.P.C. e art. 7º, n º 4 e tabela II, do R.C.P..
5) Após decisão de reclamação apresentada contra a nota de custas de parte, em 8/11/2019 o processo foi remetido à conta.
6) Em 11/11/2019 foi elaborada a conta corrente do processo e a conta cfr. fls. que aqui se dá por reproduzida.
7) Nessa mesma data foi enviada notificação ao ilustre mandatário com guia e à R..
8) Em 24/11 a R. apresentou requerimento em que conclui “Termos em que se requer a V. Ex.a se digne declarar nulas e sem qualquer efeito as guias ora reclamadas e, consequentemente, deverá limitar-se o valor da causa pelo montante máximo de 275.000 € (duzentos e setenta e cinco mil euros), dispensando a R. do pagamento da taxa de justiça calculada sobre o valor remanescente da causa. Subsidiariamente e se assim se não entender,- sempre a taxa de justiça remanescente deverá ser reduzida de forma significativa assim se adequando “a taxa de justiça devida ao efetivo custo do processo”; - Se assim se não entender, deverá determinar-se a reforma da respectiva conta de custas nos termos e em conformidade com o supra requerido e exposto.”
9) Por requerimento de 25/11 diz a R.: “Em complemento ao requerimento por si apresentado, em 24/11/2019, com a referencia 2140065, cumpre, ainda, dizer que, a não ser dado provimento ao pedido de isenção do pagamento do remanescente da taxa de justiça, e no cumprimento do RCP aprovado pela Lei 7/2012, de 13/02, a secretaria deveria imputar de forma igualitária a conta de custas a ambas as partes independentemente da proporção do decaimento, levando-se, ainda, em conta a taxa de justiça já liquidada. Pelo que a proporção do decaimento apenas tem relevância para efeitos de custas de parte. Destarte e salvo o devido respeito, impõe-se concluir que a conta de custas notificada padece de erro uma vez que aplicou o critério do decaimento (sucumbência) indevidamente. Atento o exposto, e na hipótese de não ser dado provimento ao pedido de isenção do pagamento do remanescente da taxa de justiça, deverá a conta de custas ser retificada por não cum-prir com os princípios supra enunciados.”
10) Em 27/11 é elaborada COTA-INFORMAÇÃO (artº 31º,n4 do R.C.P.) nos seguintes termos:
“Tendo em conta os requerimentos de 24.11.2019 e 25.11.2019 por parte da ré e,
contrariamente ao aí referido, COM TODO O DEVIDO RESPEITO, as partes são
responsáveis pelo impulso processual nos termos do artº 529º, nº2 do C.P.C e artº
6º, nº7 do R.C.P., tal como defendido no guia prático, 3ª edição de Abril de 2015 do
Centro de Estudos Judiciários (página 84). Ou seja, uma vez que não foi dispensado
o pagamento do remanescente da taxa de justiça nos termos do artº 6º,nº7 do
R.C.P., o contador só poderia ter cumprido/seguido esse dispositivo…
Por sua vez, as taxas pelas pelas intervenções não serão de levar à conta
processual, até porque, não houve condenação diversa relativamente às taxas
devidas por tal impulso (INTERVENÇÃO).-
Assim, EM MINHA MODESTA OPINIÃO, as contas estão devidamente elaboradas,
obedecendo aos critérios legais, estando, por sua vez, devidamente
anotadas/justificadas nas observações colocadas em cada uma das situações (no
corpo das respectivas contas) e obedecem ao DECAIMENTO, conforme decisões
de fls 381, de 18.05.2018 e fls 459, de 27.06.2019.-
Todavia, COM TODO O DEVIDO RESPEITO, não cabe ao "contador" aferir se as
taxas, conjugadas com o valor processual, são, ou não, exageradas, pois resultam
das normas processuais (artº 6º, nº7 do R.C.P. e artº 529º, nº2 do C.P.C.).-“
11) Em 4/12 o M.P. manifesta a sua concordância com a cota que antecede.
12) Em 9/12 foi proferida a decisão recorrida, que julgou extemporâneo e desadequado o requerimento apresentado, não conhecendo, consequentemente, da pretensão de fundo no mesmo suscitada de dispensa ou redução do remanescente da taxa de justiça. E que julgou improcedente a reclamação da conta de custas.
***
IV- O MÉRITO DO RECURSO.

A primeira questão a decidir nos autos prende-se com a tempestividade do requerimento em que a R. solicita a dispensa de pagamento da taxa de justiça remanescente ou, subsidiariamente, a sua redução.

Quer a R., que o Tribunal recorrido, situaram devidamente a questão: saber, no caso, se o requerimento pode ainda ser apresentado depois de elaborada e notificada à parte juntamente com a respetiva guia de pagamento –e dentro do prazo de 10 dias contados dessa notificação; ou se pelo contrário o momento para suscitar essa apreciação já se tinha ultrapassado. E quer a R., quer o Tribunal, citaram abundante jurisprudência onde os argumentos a favor da tese da R. e da tese do Tribunal são abordados de forma cabal.

Resta-nos pois tomar posição no caso concreto (-sendo que, noutros casos, ainda se poderia discutir o momento processual próprio, no período que se situa entre a decisão final do processo e a elaboração da conta).

Afloramos essa matéria no processo nº. 31797/18.0YIPRT.G1 (Acórdão de 24/10/2019 desta seção), em que, não obstante não se ter apreciado a questão porque não se chegou aí a cogitar, manifestamos tendência no sentido da tempestividade do requerimento apresentado após a notificação da conta de custas final; simplesmente esse caso tinha particulares contornos que assim nos induziu, ou seja, tratava-se de uma situação em que por força do nº. 8 do artº. 6º RCP entretanto introduzido impunha-se o não pagamento, o que não foi aplicado pelo contador e não foi considerado pelo Tribunal.

Neste caso concreto a situação coloca-se de forma diversa, ou seja, a taxa impunha-se porque não era caso de dispensa de pagamento por força da lei ou por determinação do juiz, foi considerada e bem pelo contador, e só quando notificada para pagar a parte pede a dispensa ou redução ao abrigo do nº. 7 do artº. 6º.
Por outro lado, não podemos ser alheios à tendência da orientação do nosso STJ, que acolhe maioritariamente a posição que foi a seguida pelo Tribunal recorrido. Ainda recentemente, no Ac. do STJ de 24/10/2019 (wwwdgsi.pt) o Tribunal pronunciou-se no sentido de que o requerimento tem de ser apresentado sempre antes da elaboração da conta. Os argumentos parecem-nos irrebatíveis, estando expostos de uma forma extremamente clara e simples e que aqui adotamos e adaptamos à nossa visão: quando o processo é remetido à conta a responsabilidade pelas custas está definitivamente fixada pela decisão final, ultrapassado o prazo de reforma e recurso (artº. 616º, nºs. 1 e 3, do C.P.C.); a conta deve ser elaborada de acordo com o artº. 30º do RCP; o incidente de reforma ou reclamação da conta não visa incidir sobre questões de ordem legal ou constitucional atinentes á decisão quanto a custas, visando “atacar-se” apenas a conta propriamente dita; não estando expresso um limite temporal, a literalidade da norma em causa inculca a ideia de que, quando é elaborada a conta final, já a situação foi alvo de decisão (oficiosa ou a requerimento), e por isso é que a secretaria notifica da conta e simultaneamente para pagar o valor em falta; por outro lado, a admitir-se a “alteração” do valor a atender por força da apreciação posterior à elaboração da conta, então a sua realização configuraria sempre um ato que poderia redundar em inútil, violando o princípio que informa o nosso direito processual relativo ao seu impedimento; por último ainda, as partes, porque nestas causas estão obrigatoriamente representadas por advogado face ao seu valor, sabem previamente qual o montante que lhes vai ser imputado logo após o trânsito da sentença, e todos os custos estão definidos e são objeto da nota justificativa e discriminativa de custas de parte a enviar em à parte contrária no prazo de 10 dias após o trânsito (artº. 25º RCP) –a qual pode ser retificada até 10 dias após a notificação da conta, parece-nos que tendo em vista alguma divergência de entendimento, designadamente da quantificação do decaimento-, pelo que se impõe que também atempadamente tenham o impulso processual necessário para despoletar a dispensa ou redução da taxa remanescente.

Nesta Relação destacamos o Ac. de 27/6/2019, que adequa a interpretação seguida aos preceitos constitucionais, citando jurisprudência o Tribunal Constitucional, embora aí, e a final, a questão se colocasse face ao nº. 8 do artº. 7º, do RCP (tal como no nosso acórdão “supra” citado).

A violação de preceitos constitucionais, designadamente de acesso à justiça e da proporcionalidade (bem como o artº. 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem que consagra o direito de acesso a um processo equitativo), face à exigência do valor que se considera excessivo é matéria que se coloca em fase anterior e que teria que ver com a possibilidade de reforma ou recurso da decisão final na matéria de condenação em custas. E é nesse sentido que se deve ver o Ac. do Tribunal Constitucional citado pela recorrente, e que tem que ver precisamente com a necessidade da previsão que resultou expressa no nº. 7 da norma.

De facto, também Salvador da Costa nos diz que “passado o prazo de recurso ou de pedido de reforma da decisão quanto a custas, não podem as partes, por exemplo, na reclamação do acto da contagem, impugnar algum vício daquela decisão, incluindo a sua desconformidade com a Constituição ou com algum dos princípios nela consignados” (in “Custas Processuais”, 6ª ed., pág. 241). E, repete (pag. 135) “A reclamação do acto de contagem não constitui meio idóneo de suscitar a questão da existência de pressupostos da dispensa do pagamento do aludido remanescente, porque se traduz na concretização do decidido a propósito das custas “lato sensu””.
Já quanto à tempestividade de se colocar tal questão, o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 527/2016 de 4/10 (wwwdgsi.pt), decidiu que “a norma extraída do n.º 7 do artigo 6.º do RCP, introduzido pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro, na interpretação segundo a qual é extemporâneo o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça apresentado no processo, pela parte que dele pretende beneficiar, após a elaboração da conta de custas, não viola o princípio da tutela jurisdicional efetiva, designadamente na dimensão de garantia de um processo justo, nem se vê que interfira com qualquer outro parâmetro constitucional”. E mais diz ser evidente “o interesse na fixação de um momento preclusivo para o exercício da faculdade de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça”, já que “sem tal fixação, a conta do processo não assumiria caráter definitivo, ficando como que suspensa de um comportamento eventual do destinatário da obrigação de custas não referenciado no tempo”. E conclui, “a previsão de um limite temporal para o exercício daquela faculdade não se mostra arbitrária, sendo útil para a realização dos fins de boa cobrança da taxa de justiça.” E diz ainda que esta interpretação “é coerente com a sucessão de atos do processo: a decisão final é proferida; depois transita em julgado; após o trânsito em julgado, o processo é contado; a conta é notificada às partes, que dela podem reclamar. Independentemente de qual seja a melhor interpretação do direito infraconstitucional (matéria sobre a qual não cabe ao Tribunal Constitucional emitir pronúncia), a fixação do apontado efeito preclusivo no momento em que o processo é contado tem coerência lógica com o processado (na medida em que a conta deverá refletir a referida dispensa)”, não se tratando, por isso de “um efeito que surpreenda pelo seu posicionamento na marcha processual.” E diz-se também no Acórdão que “a gravidade da consequência do incumprimento do ónus – que consiste na elaboração da conta sem a redução ou dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça – é ajustada ao comportamento omitido” já que “se a parte não deduziu o pedido correspondente, a conta é elaborada nos termos gerais decorrentes da tabela legal”, sendo entendimento uniforme o de que a reclamação da conta “não é meio adequado a fazer valer uma isenção, já que tal meio processual se destina unicamente a reagir à elaboração irregular da conta, não sendo esse o caso quando ela se mostra conforme à decisão condenatória e à lei (cfr. Acórdãos n.ºs 60/2016, 211/2013, 104/13 e 83/2013, entre muitos outros), raciocínio que, por identidade de razão, vale para o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça”.
Por outro lado, e face aos argumentos aventados nas alegações de recurso, a decisão relativa a custas não fixa o seu montante, mas a responsabilidade pelo pagamento, resultando a concretização do valor das tabelas anexas ao RCP. Assim proferida a decisão, e se o tribunal nada disse foi porque entendeu que não se justificava o uso oficioso do nº. 7 do artº. 6º, então a parte que entenda de forma diferente deve reagir pelo menos antes da elaboração da conta, senão antes do trânsito da decisão (-matéria que suscita outra controvérsia que aqui não exploramos).
Não é argumento o facto desta Relação ter revogado o agravamento da taxa e os motivos em que se baseou para o efeito, já que tal diz respeito precisamente à falta de motivo para o agravamento da taxa, sendo este o raciocínio inverso, ou seja, a sua redução –os argumentos e raciocínio a favor da primeira decisão não conduzem necessariamente a favor da segunda; e, repete-se, ainda que assim fosse em causa está a tempestividade do requerimento, não se chegando à sua apreciação de mérito.

Por tudo o exposto, devendo neste item improceder a apelação, deve manter-se a decisão recorrida, ficando prejudicado o conhecimento do restante objecto do recurso –artº. 608º, nº. 2, do C.P.C..
*
Cabe apreciar agora o segmento do recurso em que a R. se insurge contra o indeferimento da sua reclamação à conta de custas elaborada nos autos –artigos 33 e seguintes das conclusões de recurso.
Começando por apreciar as questões suscitadas por uma ordem lógica, cremos que há que começar por dizer que assiste razão à recorrente quando diz que a conta de custas não deve refletir o decaimento na ação. Assim é desde a reforma operada nesta matéria, abrindo-se um novo paradigma em sede de custas processuais, em que o que interessa ao processo é que os pagamentos das taxas devidas estejam assegurados, sendo fora do processo e em sede de custas de parte que o decaimento das partes se reflete.

O atual Regulamento das Custas Processuais aprovado pelo Decreto-lei nº. 34/2008 de 26/2 (artº. 6º), conjugado com o C.P.C. (artºs. 529º, nº. 2, e 530º) dão-nos a noção de taxa de justiça, obrigando ao seu pagamento (e restringindo à parte que nos interessa tratar) à parte que demande na qualidade de A./requerente ou R./requerido, recorrente ou recorrido; está portanto o seu pagamento ligado diretamente à atividade processual que a parte pretende desenvolver no processo, como contrapartida relativa ao serviço “justiça”. Portanto, o seu pagamento ao longo do processo e de acordo com a respetiva etapa nada tem que ver com os conceitos de vencimento ou decaimento.

Igualmente quanto aos encargos, dispõem os artºs. 529º, nº. 3, e 532º, C.P.C., e como regra geral, que cada parte paga os encargos a que dá origem e se forem produzindo no processo.

Estes pagamentos “passam-se” no processo.
Por sua vez os artºs. 529º, nºs. 1 e 4, e 533º, C.P.C., tratam da responsabilidade pelas custas de parte, definindo-as, e aqui sim a sua distribuição assenta no critério da repartição de custas e nos conceitos de parte vencida e vencedora, e decaimento. Ora, o ressarcimento de eventual crédito duma parte sobre a outra de acordo com a decisão que condene em custas, passa-se fora do processo, cabendo à parte que pretender reclamar tais quantias fazê-lo de acordo com o disposto no nº. 3 do artº. 533º –apresentando à outra parte nota discriminativa e justificativa de acordo também com o artº. 25º do RCP, podendo a reclamação respetiva ser feita de acordo com o que dispõe a Portaria nº. 419-A/2009 de 17/4, artº. 33º.

Por último, a conta de custas apenas há-de refletir a imputação dos encargos, de acordo com a condenação e na proporção da condenação –artº. 24º, nº. 2, RCP. Conforme refere Salvador da Costa, “R. das C.J. –Anotado e Comentado, pag. 382 da 4ª edição, “Não se trata de uma autónoma conta de custas de parte envolvente da vertente dos encargos, porque o sistema não a comporta, certo que elas, em regra, não integram o ato de contagem. Perante este quadro, o normativo em análise pretende reportar-se ao registo a débito na conta de custas da parte vencida, na proporção em que o for, segundo a respetiva sentença condenatória, do correspondente valor dos encargos da sua responsabilidade. Nesta perspetiva, a proporção da condenação das partes na causa lato sensu é que define, em termos quantitativos, a imputação do valor dos encargos a débito do vencido na respetiva conta de custas, concretizável por via de uma operação aritmética proporcional.”
No mais, e relativamente às custas de parte, remete-se para a nota justificativa tal como prevista no artº. 25º do RCP, a enviar para o tribunal e para a parte vencida. Aqui também, e como já referido, está refletida a condenação em custas –cfr. artº. 26º, nº. 1. Conforme resulta da alínea e) desse artigo, o ato de contagem de custas de parte acaba por ser feito pelas partes. Também o seu pagamento é feito diretamente pela parte vencida à parte credora –artº. 26º, nº. 2, RCP.
Em suma, o que pretendeu este RCP? Que todas as despesas do processo, nomeadamente o ato de utilização do serviço, estejam asseguradas no próprio processo, e retirar do tribunal a distribuição entre as partes desses valores de acordo com a sua condenação.
Discorrendo a propósito dos artºs. 15º, nº. 2, e 14º, nº. 9, do R.C.P., diz o Ac. da Rel. do Porto de 7/11/2013 (wwwdgsi.pt) “Estas disposições devem-se ao facto de o Regulamento das Custas Processuais ter trazido uma profunda alteração do regime de cálculo e cobrança das custas de parte. O artigo 447.º-D do Código de Processo Civil, introduzido pelo Regulamento das Custas Processuais, veio com efeito incluir no conceito de custas de parte as taxas de justiça paga e determinar que a sua quantia fosse objecto de uma nota discriminativa e justificativa. Na Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de Abril, que regula o modo de elaboração, contabilização, liquidação, pagamento, processamento e destino das custas processuais, multas e outras penalidades, na redacção que lhe foi dada pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de Março, que alterou aquela de modo a compatibilizá-la com as inovações introduzidas pela Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, que já vimos aplicar-se ao processo, o artigo 30.º, n.º 1, dispõe, concomitantemente, que “as custas de parte não se incluem na conta de custas”, uma vez que as mesmas passaram a ser reclamadas directamente entre as partes, servindo para o efeito a referida nota discriminativa e justificativa. Dispõe, com efeito, o artigo 25.º do Regulamento das Custas Processuais, na versão aplicável aos autos, que “até cinco dias após o trânsito em julgado … as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respectiva nota discriminativa e justificativa”, devendo constar dessa nota os “seguintes elementos: a) …; b) Indicação, em rubrica autónoma, das quantias efectivamente pagas pela parte a título de taxa de justiça; c) …; d) …; e) Indicação do valor a receber, nos termos do presente Regulamento”. E dispõe depois o artigo 26.º que “as custas de parte integram-se no âmbito da condenação judicial por custas …” e são “são pagas directamente pela parte vencida à parte que delas seja credora”, uma vez que a condenação da parte vencida em custas compreende o “pagamento dos seguintes valores, a título de custas de parte: a) Os valores de taxa de justiça pagos pela parte vencedora, na proporção do vencimento…”. Daqui resulta que o pagamento de taxa de justiça é sempre efectuado a final no processo ao tribunal, mesmo pela parte que entretanto beneficiou da dispensa do seu pagamento prévio e independentemente de ter obtido vencimento de causa.
No atual Código de processo Civil a conclusão a tirar dos artºs. 529º e 533º não é diferente, e é nesse sentido que deve continuar a ler-se o artº. 30º, nº. 1, do RCP. O que este artigo significa não é que a conta de custas é elaborada segundo o decaimento –o que importa para as custas de parte- mas sim que a conta é feita integrando todas as fases e apensos processados, todos os impulsos e tramitação até à última decisão, todos os valores em dívida no processo.
No caso dos autos não há encargos a considerar, pelo que quanto a tal nenhuma ressalva há a fazer.
Portanto, a conta enviada à recorrente apenas lhe pode imputar o valor das taxas por si devidas no processo.
A única ressalva que se poderá colocar tem que ver precisamente com o remanescente da taxa de justiça. O artº. 14º do RCP na redação da Lei nº. 7/2012 de 13/2 veio acrescentar (além do mais) o seu nº. 9, em que se diz que “Nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do nº. 7 do artigo 6º e o responsável pelo impulso processual não seja condenado a final, o mesmo deve ser notificado para efectuar o referido pagamento, no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que ponha termo ao processo”.
Ora, o que se passou a discutir é se não havendo vencimento total mas parcial igualmente se impõe esta tramitação. E Salvador da Costa, na mesma obra a pags. 180, defendeu que não. Ou seja, a notificação para o pagamento à parte vencida só é feita quando há um vencimento integral da outra parte; se assim não for então é incluída na conta final, seguindo a “regra geral”, de acordo com o impulso processual.
Esta norma do artº. 14º, nº. 9, foi declarada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional –Acórdão nº. 615/2018 de 21/11 (http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20180615.html) quando impõe a obrigatoriedade de pagamento do remanescente da taxa de justiça ao réu que venceu totalmente o processo, obrigando-o a pedir o montante que pagou em sede de custas de parte.
Também não é essa a situação destes autos.
Assim, não havendo um vencimento integral de uma das partes como resulta da análise da condenação final obtida no processo, então a taxa remanescente é incluída na conta final.
Conforme cita a recorrente, diz-se no Guia Prático das Custas Processuais do CEJ de 2015 a pags. 98 que “Caso ambas as partes sejam responsáveis em virtude de ter havido decaimento (sucumbência) de cada uma, será elaborada uma conta para cada uma, na qual se imputará o valor referente ao remanescente, independentemente da proporção do decaimento, tendo em conta que o acerto dos valores será feito através do instituto de custas de parte previsto nos artigos 25.º e 26.º do Regulamento das Custas Processuais e nos artigos 30.º a 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17/04.”
Passemos para as outras questões, suscitadas pela recorrente, e voltaremos mais à frente à análise da conta .
Se na conta se deve fazer referência a “Processo” em vez de “Outro”, tal é perfeitamente irrelevante pois que daí não resulta qualquer prejuízo para a recorrente, embora seja útil a menção do impulso a que respeita cada valor de taxa devida/paga, pelo menos num campo destinado a observações. Cremos que a referência a “Outro” resultará do facto de se ter introduzido manualmente no programa informático os valores que no caso se quis atender –ou seja o decaimento; pois que, sem essa “alteração” manual, e introduzindo apenas o valor do processo, o programa faz os cálculos apenas relativos às taxas devidas sem atender ao decaimento, como é nosso entendimento que deve ser feito.
Uma outra observação se impõe: as multas devem constar de um cálculo separado das taxas –o que também não sucedeu-, pois que, se não for efetuado o pagamento voluntário das taxas devidas no prazo legal, então sobre o valor em dívida acrescem juros legais, o que não sucede com a multa que tem antes um acréscimo –artº. 28º, nº. 3, do RCP. Todavia, se as multas já estão pagas, não é necessário liquidá-las. De facto, muito embora a redação do artº. 30º, nº. 2, RCP, conjugando esse com o artº. 29º, nº. 1, a), do RCP, não havendo quantias em dívida –que se pode ver por cada “espécie” a ser considerada (incidente, multa…)-, dispensa-se a realização da conta de custas. Face às alusões feitas no recurso, e aplicando o que se disse, a taxa devida pelo incidente de intervenção não terá de constar da conta pois que é perfeitamente irrelevante no caso, já que nada há em dívida no processo relativamente ao mesmo.
Face á posição que assumimos, ficaria pois prejudicada a verificação de erro de cálculo do decaimento, uma vez que o mesmo não deve ter-se por refletido na conta a elaborar nos autos.
Contudo, para quem entenda que o cálculo deve ser feito de acordo com o decaimento impõe-se que, igualmente num campo destinado a observações, o contador faça constar o decaimento que em concreto calculou, o que não sucedeu no caso –nem na informação prestada no incidente de reclamação deu conta desse seu cálculo. E verificado o raciocínio feito na 1ª instância no despacho recorrido quanto ao decaimento (com o qual concordamos face ao despacho que fixou o valor da ação e à condenação final), e independentemente de não importar para a decisão a proferir nesta nossa posição, não pode deixar de anotar-se que esse decaimento não está na realidade refletido na conta elaborada. Pois que esse seria:

.decaimento da R.: 200.000,00 + 2.000,00 + 85.971,26 = € 287.971,26;
.decaimento da A.: 175.000,00 + 23.850,11 = € 198.850,11;
287.971,26 x 100: 486.821,37€ = 59,1328% (decaimento da R.);
198.850,11 x 100: 486.821,37€ = 40,8466% (decaimento da A.);
-decaimentos também diferentes dos encontrados pela recorrente)-;
-taxa de justiça devida pela ação: € 4.386,00
-taxa de justiça devida por cada um dos recursos: € 2.193,00.

Por este prisma a conta da R. seria:

.acção:
-taxa já paga – 1.632,00;
-remanescente em dívida – 2.754,00 + 2.754,00 (porque se trata da taxa das duas partes) = 5.508,00€ x 59,1328% (decaimento da R.) = € 3.257,03 - em dívida;
-1º recurso (sem contra-alegações e com custas a cargo da parte vencida a final):
-taxa já paga – 816,00;
-remanescente em dívida – 1.377,00 x 59,1328% (decaimento da R.) = € 814,26 - em dívida;
-2º recurso (sem contra-alegações e com custas pela apelante –R.):
-taxa já paga – 816,00;
-remanescente em dívida – € 1.377,00.

Portanto, ao contrário do que se refere na decisão recorrida, a elaboração da conta não respeitou a proporção fixada na sentença, pelo que oficiosamente (suscitado ou não) impunha-se a sua correção -artº. 31º, nº. 2, RCP.
Na posição que assumimos, ou seja, a conta deve considerar as taxas em divida sem o decaimento, temos: € 2.754,00 (ação) + € 1.377,00 (1º recurso) + € 1.377,00 (2º recurso) –já este valor coincide com o encontrado em sede de alegações de recurso da recorrente.
Em suma, quanto a esta ponto do recurso, cremos que se impõe a elaboração de nova conta que obedeça aos critérios legais “supra” mencionados, designadamente que tenha em consideração apenas as taxas devidas no processo pelo impulso processual da recorrente, independentemente do seu decaimento, conforme resultava do requerimento feito complementarmente em sede de reclamação da conta e que devia ter sido deferido.
Mais se impõe por ofício, em virtude do deferimento da reclamação no sentido e com o alcance por nós propugnado, que também a conta do A. seja reformada de acordo com os mesmos princípios. Por sua vez tal implicará novo acerto de contas entre as partes, em sede de custas de parte. A título de nota e reforçando a “tempestividade” deste acerto em virtude não só da consideração do remanescente da taxa mas também da reforma da conta, diremos ainda que o Tribunal Constitucional no Acórdão 696/2016 de 20/12 (que se pode consultar no mesmo endereço) julgou não inconstitucional o conjunto do artº. 14º e do artº. 25, nº. 1, se interpretado no sentido de que uma nota de custas atinente ao remanescente da taxa de justiça pode ser apresentada fora de prazo previsto no dito artº. 25º, no caso da secretaria omitir a notificação a que o artº. 14º se reporta. Aliás, o artº. 25º, nº. 1, prevê atualmente a possibilidade de retificação da nota justificativa após a notificação da conta de custas, mesmo sem se por a questão da reforma.
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V DISPOSITIVO.

Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação em julgar o recurso parcialmente procedente e, em consequência, dar provimento parcial à apelação, e decide-se manter o indeferimento do requerimento de dispensa/redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça, por extemporâneo, e revogar a decisão recorrida na parte que indefere a reclamação da conta de custas, devendo quer a conta da R./recorrente, quer a conta do A., ser reformadas em conformidade com o exposto nesta decisão.
Custas do recurso na proporção de metade pela recorrente –artº. 527º, nºs. 1 e 2, do C.P.C..
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Guimarães, 23 de abril de 2020.
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Os Juízes Desembargadores
Relator: Lígia Paula Ferreira Sousa Santos Venade
1º Adjunto: Jorge dos Santos
2º Adjunto: Heitor Pereira Carvalho Gonçalves

(A presente peça processual tem assinaturas eletrónicas)