Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4716/15.9T8VCT-A.G1
Relator: PEDRO ALEXANDRE DAMIÃO E CUNHA
Descritores: DILIGÊNCIAS DE PROVA
DESPACHO SANEADOR
CONHECIMENTO IMEDIATO DO MÉRITO DA CAUSA
VÁRIAS SOLUÇÕES PLAUSÍVEIS DA QUESTÃO DE DIREITO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/16/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: “I. Uma diligência de prova só pode considerar-se impertinente se não for idónea para provar o facto que com ela se pretende provar, se o facto se encontrar já provado por qualquer outro meio de prova, ou se carecer de todo de relevância para a decisão da causa.
II. O conhecimento imediato do mérito da causa no despacho saneador, permitido na alínea b) do n.º 1 do artigo 595º do CPC, só poderá acontecer (i) quando toda a matéria de facto se encontre provada por confissão expressa ou tácita, por acordo ou por documentos, (ii) quando seja indiferente, para qualquer das soluções plausíveis, a prova dos factos que permanecem controvertidos, e (iii) quando todos os factos controvertidos careçam de prova documental.
III. Nessa medida, mostrando-se ainda controvertidos factos alegados pelo Autor que, com relevância, contendem com a causa de pedir subjacente aos pedidos sobre os quais o Tribunal decidiu pronunciar-se no despacho saneador, estava vedado àquele Tribunal conhecer imediatamente, nessa fase processual, do mérito desses pedidos.
IV. As despesas judiciais e os honorários do Mandatário da parte que obtém ganho de causa são recuperados (total ou parcialmente) através das custas de parte (artigos 533º, nº 2, alínea d) do CPC e 25º e 26º do Regulamento das Custas Processuais), não sendo atendível a consideração desse valor através da formulação de um pedido indemnizatório específico dirigido a esse valor.”
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

Recorrente(s): - AA;

- BB

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AA veio instaurar a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra BB .
Para tanto, alega que a Ré foi condenada a pagar ao Autor a quantia de € 75.000,00 no âmbito do processo judicial que correu os seus termos sob o nº 2683/13.2TBVCT nesta Comarca de Viana do Castelo.
Sustenta que a Ré já procedeu ao pagamento da quantia em que foi condenada (€ 75.000,00) e, bem assim, procedeu ao pagamento de € 4.036,98 correspondente ao estorno relativo a 48 prestações do prémio de seguro mensal.
Alega, no entanto, que a Ré não pagou ao Autor metade das prestações relativas ao crédito bancário que não seriam devidas se a Ré tivesse liquidado o capital seguro à data da participação do sinistro, retroagindo os pagamentos à data da comprovação da invalidez profissional permanente.
Entende que a Ré é responsável pelo pagamento da quantia de € 18.790,25, correspondente a metade do valor das prestações do empréstimo bancário pagas entre Março de 2011 e até Julho de 2015.
Alega ainda que a Ré é responsável pelo pagamento das quantias mencionadas nos artigos 13º, 15º e 16º.
Alega que a conduta da Ré causou danos patrimoniais e não patrimoniais e, pelos danos não patrimoniais, pede uma indemnização no valor de € 5.000,00.
Termina pedindo que a presente acção seja julgada procedente por provada e em consequência a Ré condenada:
- a pagar ao Autor a quantia de € 18.790,25 a titulo de prestações de capital e juros vencidos de Março de 2011 até Julho de 2015,
- a pagar ao Autor os juros civis à taxa de 4% vencidos até efectivo e integral pagamento e que à data se orçam em € 3.620,08;
- a pagar ao Autor a rentabilidade de 2% ao ano, de tais montantes no valor de € 1.810,04;
- a pagar ao Autor a quantia de 3.000,00 euros a título de dano patrimoniais suportados com honorários aos seus mandatários;
- a pagar ao Autor a quantia de € 1.500,00 euros a título de danos patrimoniais suportados com custas e taxas judiciais;
- a pagar ao Autor a quantia de 300 euros a título de danos patrimoniais suportados com deslocações;
- a pagar ao Autor a quantia de 5 mil euros a título de danos não patrimoniais.
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Contestou a Ré por impugnação, alegando fundamentalmente que:
- na acção referida pelo Autor defendeu que na data da invalidez profissional permanente as coberturas da apólice já haviam cessado;
- na sequência do soçobrar da sua defesa nessa acção procedeu à liquidação integral do capital garantido pela apólice que era de 75.000 € ao seu beneficiário que era o Banco BB;
- Alega que nesta sequência não consegue descortinar qual o fundamento para pagar ao Autor a verba que o mesmo peticiona, já que encontrando-se esgotado o capital, nada mais deve ao Autor;
-Impugna também os demais pedidos formulados pelo Autor.
Termina pedindo a acção seja julgada improcedente por não provada e a Ré absolvida do pedido.
Pede ainda a condenação do Autor como litigante de má-fé.
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Respondeu o Autor mantendo a posição vertida na petição inicial.
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Realizada Audiência Prévia, a mesma foi interrompida, tendo o A. sido convidado a concretizar o alegado nos arts. 6º, 8º, 11º, 13º a 15º, 18º e 21º da petição inicial, “… dadas as insuficiências e imprecisões acima evidenciadas…”.
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Correspondeu ao convite o Autor, tendo apresentado petição inicial corrigida.
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Exerceu a Ré o princípio do contraditório quanto a esse novo articulado apresentado pelo Autor, mantendo a posição que havia apresentado na contestação.
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Foi designada nova Audiência prévia.
Em sede de Audiência prévia, foi proferida a seguinte decisão::
“Despacho Saneador
Valor da acção
Fixa-se o valor da acção em € 34.413,28 (artigos 297º, nº. 1 e 306º nº. 2 do C.P.C.).
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Saneamento
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
Não há nulidades que invalidem o processado.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias. Têm legitimidade para o presente processo.
Inexistem outras nulidades, questões prévias ou excepções que cumpra, neste momento, conhecer.
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O estado dos autos permite o conhecimento e a apreciação parcial do mérito da causa, concretamente dos pedidos formulados sob os pontos nº. 1, 2, 4, 5, e 6, por referência ao novo articulado apresentado e cujos pedidos constam a fls. 87 dos autos, sem necessidade de mais provas, pelo que iremos de imediato apreciar os aludidos pedidos.
Para efeitos de apreciação e conhecimento dos pedidos, consideram-se assentes, por acordo das partes, os seguintes factos:
-1 O autor interpôs uma acção neste Tribunal que correu os seus termos sob o nº. 2683/13.2TB (extinto 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Viana do Castelo), onde peticionou a condenação da Ré a pagar ao Banco BB a quantia de € 75.000,00, correspondente ao capital seguro indexado ao seu crédito habitação, contraído naquele banco com o nº. 026970031335.
-2 Uma vez que lhe havia sido fixada uma incapacidade permanente, global e definitiva de 74%, reportada ao ano de 2012, por ser portador de doença cardíaca e oncológica.
-3 O capital seguro correspondente à apólice denominada “Seguro BB Crédito à Habitação 2” com o nº. 3201, é metade do empréstimo solicitado pelo Autor e pela sua esposa ao BB com o nº. 026970031335 e que totalizava na data da contratação, em Março de 2010 a quantia global de € 150.000,00.
-4 A acção referida em 1. foi julgada procedente, nos termos constantes do documento junto a fls. 13 a 18 dos presentes autos.
-5 A Ré já pagou ao BB a quantia em que foi condenada (€ 75.000,00).
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Primeiro pedido
O Autor peticiona a condenação da Ré no pagamento de € 18.790,25, a título de capital e juros vencidos de Março de 2011 e até Julho de 2015 e respectivos juros.
Sustenta tal pedido nos termos do contrato celebrado e entende que, após a interpelação da ré acompanhada da documentação comprovativa da incapacidade permanente, global e definitiva de 74%, a ré deveria ter pago de imediato o capital do seguro correspondente à apólice.
Tal não sucedeu, circunstância que levou o Autor a instaurar a acção mencionada no artigo 1º da petição inicial.
De acordo com o alegado, a situação de mora ocorrida causou-lhe este prejuízo.
Como é sabido, a mora no cumprimento das obrigações gera, ou pode gerar, a obrigação de indemnizar.
Contudo, o Autor tinha que demonstrar que, caso a Ré tivesse liquidado a quantia correspondente ao capital máximo do seguro na data em que foi interpelada para o fazer (ponto 12 dos factos provados na decisão proferida no âmbito do processo nº 2683/13.2TB), nunca teria liquidado estes montantes. Ou seja, que a liquidação do valor das prestações entre a data da interpelação e a data em que tal capital foi pago, não seria devido.
Contrariamente, o que se constata é que essas quantias sempre seriam devidas. Com efeito, embora não tenha sido expressamente alegado qual o valor em divida à data da interpelação, sabe-se que em 29 de Abril 2013 (menos de um mês antes da interpelação) o empréstimo associado à apólice registava um valor em dívida de € 130.155,02. Ora, se a Ré tivesse liquidado a quantia de € 75.000,00 nessa data, estaria ainda em dívida ao Banco que concedeu o empréstimo a quantia de cerca de € 55.000,00. Esta quantia em dívida é manifestamente superior ao valor que o Autor quantifica como sendo o valor das prestações entre a data da interpelação e a data do capital seguro.
Aliás, a forma como o Autor estrutura a causa de pedir é errónea e confusa, não obstante o convite ao aperfeiçoamento formulado pelo Tribunal. Veja-se que o Autor pede a condenação da ré na quantia de € 18.790,25, a título prestações de capital e juros vencidos de Março de 2011 e até Julho de 2015. No entanto, a incapacidade que justificou a interpelação da Ré reporta-se ao ano de 2012, sendo que a Ré foi interpelada para pagar em Maio de 2013, desconhecendo-se a data concreta do pagamento (porque não foi alegado, apenas se sabe que cumpriu após ter sido condenada no âmbito do processo 2683/13.2TB) e, no artigo 6º da petição inicial, o autor sustenta que são devidos pela Ré os valores do capital vencido desde a data da interpelação extrajudicial e até à data do efectivo pagamento (valor, ainda que não concretamente alegado, forçosamente distinto e bem inferior aos alegados € 18.790, 25).
Nestes termos, não tendo o Autor alegado factos que, a resultarem provados, demonstrariam que o pagamento das prestações ao Banco não teria ocorrido se a ré não se demorasse a cumprir o contrato, nunca se poderia concluir que o pagamento de tais prestações (sempre em valor substancialmente inferior aos alegados € 18.790,25) constituiriam um prejuízo para o Autor e imputável à Ré.
Por estes motivos, o pedido formulado não pode proceder.
Assim sendo e em face do exposto, julga-se improcedente o pedido formulado pelo Autor de condenação da ré no pagamento da quantia de € 18.790,25 e, consequentemente, dos respectivos juros contabilizados no valor de € 3.620,08.
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Quarto, quinto e sextos pedidos
O Autor pretende que a ré seja condenada no pagamento das quantias de € 3000,00 (honorários devidos a mandatário), € 1.500,00 (taxas de justiça) e € 300,00 (deslocações).
Ora, estes valores têm enquadramento nas custas de parte, previstas nos artigos 25º e 26º do Regulamento das Custas Processuais, devem ser aí reclamados ou deveriam aí ter sido reclamadas e não em acção autónoma.
Nestes termos, sem necessidade de mais alegações, improcedem os aludidos pedidos.
Notifique.
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Os autos ainda não contêm, neste momento, todos os elementos necessários à apreciação dos pedidos formulados sob os pontos 3 e 7, por referência ao novo articulado apresentado pelo Autor e cujos pedidos constam de fls. 87, sendo necessário produzir prova, prosseguindo a acção nesta parte para julgamento, procedendo-se, de imediato, à identificação do objecto do litígio e à enunciação dos temas de prova.
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Objecto do litígio
A violação do contrato de seguro celebrado entre as partes e as consequências de tal violação para o Autor.
*
Temas da prova
Considerando o teor dos articulados das partes, apresentam-se como temas de prova os seguintes:
1)- Os concretos montantes pagos pelo Autor ao Banco que lhe concedeu o empréstimo, entre a data da interpelação extrajudicial da Ré e a data de pagamento do capital seguro;
2)- Saber se após a resposta dada pela Ré à sua interpelação de 22 de Maio de 2013, o Autor se afligiu, se sentiu angustiado, ansioso, profundamente chocado e se se viu obrigado a recorrer a ajuda médica;
3)- As perturbações causadas pela conduta da Ré na vida do Autor.
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Notifique.
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Os presentes foram notificados e declaram ficar bem cientes, não tendo havido reclamações pela mandatária do autor, quanto aos despachos proferidos.
(…)
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Em seguida, a Mmª. Juíza concedeu a palavra aos ilustres mandatários das partes para apresentarem os seus requerimentos probatórios.
Requerimentos Probatórios
A Autora renova o requerimento probatório junto aos autos com a petição inicial, nomeadamente testemunhas e documentos, requerendo as declarações de parte do Autor nos termos do artigo 466º do C.P.C., por ser matéria da qual tem conhecimento directo e essencial à descoberta da verdade material e boa decisão da causa, nomeadamente à matéria indicada nos artigos 8º, 18º, 24º, 27º, 30º a 36º da petição inicial rectificada e ainda art. 4º e 5º da nova contestação.
A Ré reitera o requerimento de prova apresentado, aditando a seguinte prova:
Testemunhal: Mário Pinheiro, com domicílio profissional na Avenida dos Aliados, nº. 2 Porto, cuja notificação se requer
Documental: requer a notificação do Autor para vir identificar o seu médico de família ou assistente e a subsequente notificação deste para juntar aos autos toda a documentação clínica de que disponha relativa ao Autor posterior a Abril de 2013.
Requer também a realização de perícia médico-legal psiquiátrica à pessoa do Autor, requerendo-se prazo de 48 horas para indicar os quesitos.
Pretende-se, quer com a prova documental quer pericial infirmar os alegados danos psicológicos.
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Após, foi proferido o seguinte:
Despacho:
Relativamente ao requerimento probatório do Autor, admito a prova documental e testemunhal oferecida.
Admito as declarações de parte do Autor, relegando-se para o dia da audiência de julgamento os factos sobre os quais o Autor poderá prestar declarações.
*
Relativamente ao requerimento probatório da Ré, admito a prova documental e prova testemunhal oferecida.
Indefere-se a requerida solicitação do registo criminal do autor por se entender, em face da matéria que se mostra controvertida e necessária à boa apreciação da causa, que esta diligência não tem qualquer interesse, nem irá contribuir para a respectiva decisão.
Determina-se a notificação do Autor nos termos ora requeridos pela Ré.
A Ré solicitou a realização de uma perícia, devendo indicar logo, sob pena de rejeição o respectivo objecto (artigo 475º do C.P.C.) tendo, contudo, solicitado o prazo de 48 horas para o efeito.
Uma vez que se entende que é este o momento para identificar o respectivo objecto, convida-se a Ré neste momento a fazê-lo, sob pena de rejeição.
*
Dada a palavra à Ilustre mandatária da Ré para se pronunciar quanto aos quesitos, a ré indica como objecto da perícia a realização de exame psiquiátrico ao autor com vista a apurar os concretos danos, se é que existiram, decorrentes do facto de a Ré não lhe ter liquidado o capital seguro no exacto momento em que o autor lhe comunicou estar incapaz.
Indicou os seguintes quesitos:
Diga o Sr. Perito se, na sequência daqueles factos, o autor ficou angustiado, de tal modo que tal facto lhe demandou necessidade de tratamento médico?
Deve o Sr. Perito esclarecer qual ou quais os concretos danos de natureza psicológica susceptíveis de afectar a saúde do Autor decorrente do facto acima referido.
*
Seguidamente a Mmª Juíza proferiu o seguinte
Despacho:
O Autor peticiona uma indemnização a título de danos não patrimoniais, fundamentando tal pedido na factualidade alegada nos artigos 30º a 36º do articulado oferecido.
Tais factos foram postos em causa pela Ré mostrando-se, assim, controvertidos.
Considerando a concreta factualidade alegada pelo Autor, entende-se que a diligência ora requerida não tem pertinência para a apreciação dos factos em discussão.
De salientar que o Autor alegou ter recorrido à ajuda médica, no entanto, não especificou que as perturbações, ansiedade e alterações no sistema nervoso atingiram tal dimensão ou gravidade que essa ajuda médica ocorreu no âmbito do foro psiquiátrico.
Em face do exposto, indefere-se a realização da perícia.
Notifique.
*
(…) “.
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É justamente desta decisão que:
A) o Recorrente/Autor veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“1-O Recorrente não se pode conformar com o conteúdo do despacho saneador que julgou improcedente o pedido formulado pelo Autor de condenação da Ré no pagamento da quantia de €18.790,25 e, consequentemente dos respectivos juros contabilizados no valor de €3.620,08, e ainda julgou improcedente a condenação da ré nas quantias de €3.000,00 (honorários devidos a mandatário), €1.500,00 (taxas de justiça) e €300,00 (deslocações).
2- Verifica-se, no despacho saneador, uma incorrecta apreciação da matéria de facto e a subsunção da mesma ao direito, quando a Meritíssima juiz “a quo” entende que:
- O Autor tinha de demonstrar que, caso a Ré tivesse liquidado a quantia correspondente ao capital máximo do seguro na data em que foi interpelada para o fazer, nunca teria liquidado estes montantes.
- Os valores peticionados a título de honorários devidos a mandatários, taxas de justiça e deslocações, devem ser reclamados em sede de custas de parte.
3- Apesar de para efeitos de empréstimo só existir um contrato no valor de €150.000,00, para efeitos de seguro, existiam dois contratos cada um com um valor de €75.000,00 de capital segurado, correspondendo ao Autor uma apólice (nº013201) no valor de €75.000,00 e para a sua esposa outra apólice no valor de €75.000,00 (nº 022858).
4- Conforme consta das condições gerais e especiais do seguro BB Vida anexado e contratado por força do crédito habitação, a Ré, após interpelação do Autor acompanhada da documentação comprovativa da incapacidade permanente, global e definitiva de 74% deveria de imediato ter pago o capital de seguro correspondente à apólice denominada seguro BB-2, uma vez que nos termos daquele contrato de apólice, e para efeitos da mesma, o contrato financeiro é o contrato de crédito pessoal ou crédito habitação celebrado entre a entidade financeira e o tomador segurado que se encontra associado à subscrição da apólice.
5- Na interpelação à Ré, o Autor apenas accionou a sua apólice que possuía o valor global de €75.000,00, pelo que a da sua esposa ainda continuava em vigor de facto.
6- Assim, entre a data de interpelação para pagamento e a sentença que condenou a Ré ao pagamento da totalidade do capital segurado na apólice do Autor, no valor de €75.000,00, o Autor viu-se obrigado a despender da quantia de €18.790,25.
7- Caso a Ré tivesse cumprido pontualmente a sua obrigação, apenas teria disposto da quantia de €18.790,25 respeitante ao montante coberto pela da sua esposa.
8- Comprova-se ainda que existiu por parte da Ré um incumprimento contratual uma vez que o remanescente entre o capital seguro e o capital em dívida, no que concerne à Apólice do Autor, não foi paga ao Autor, impedindo o Autor de dispor livremente do dinheiro e fazer face a despesas da vida corrente.
9- O Autor não pode de modo algum se conformar com a decisão/ despacho saneador, por tudo quanto supra exposto e que se dá por integralmente reproduzido por uma questão de economia processual.
10- A decisão proferida afecta gravemente a pretensão do Autor ficando cabalmente demonstrado que a sua impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil, pelo que ao abrigo do disposto no artigo 644º, nº2, alínea h), se interpõem recurso da decisão/despacho saneador.
11- Em síntese, a decisão /despacho saneador recorrido, violou o disposto, entre outros, no artigo 406º,nº1, artigo 798º, artigo 799º e artigo 563º todos do Código Civil.
Deverá pois ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, revogado o despacho saneador, e substituída a decisão recorrida por outra conforme o direito.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE VªS EXªS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO RECURSO”
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B) a Recorrente/Ré veio, de igual modo, interpor Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“A) Não se conforma o Recorrente com o Despacho Saneador proferido nos presentes autos, em que o Tribunal que indeferiu, parcialmente, o seu requerimento probatório.
B) De facto, em sede de Contestação que instrui o presente recurso, o R., aqui Apelante, veio requerer ao tribunal recorrido, entre outros meios de prova, que ordenasse a junção aos autos do registo criminal do A. do qual constassem os registos activos e os que se encontrem em histórico.
C) Pretendendo, com tal documento, fazer o Recorrente contraprova do alegado pelo Autor nos artigos 18.º parte final, 19.º e 20.º da Petição Inicial (renumerados para os artigos 30.º, 31.º e 32.º da nova Petição Inicial junta aos autos em vinte e três de maio de dois mil e dezasseis).
D) Uma vez que, com base tais factos, e alegando a ofensa dos mesmos por parte da Ré aqui Recorrente, o Autor termina peticionando a quantia de cinco mil euros a título de indemnização por danos não patrimoniais.
E) Ora, sendo alegado tais factos, considera o Apelante, que cumpre comprová-los em juízo, de onde surge o seu requerimento de prova, requerendo a junção aos autos do registo criminal do Autor, para que se prove então indubitavelmente nos autos que aquele é, efectivamente, a pessoa de bom-nome, ordeira, pacata, com a excelente reputação de que se arriga gozar, e com porte moral e cívico irrepreensível que alega ser.
F) Até mesmo porque, cabendo ao Autor o ónus da prova dos factos que alega, este tentará fazê-lo através da prova testemunhal arrolada e que o Tribunal admitiu.
G) Todavia, o Tribunal, no Despacho Saneador de que se recorre decidiu indeferir a requerida solicitação do registo criminal do autor por entender que, em face da matéria que se mostra controvertida e necessária à boa apreciação da causa, esta diligência não teria qualquer interesse, nem iria contribuir para a decisão a proferir.
H) Sendo permitido ao Autor fazer prova dos factos por si alegados, não logra o Apelante entender por que motivo não poderá exercer o seu direito de obter contraprova do alegado, em igualdade de direitos que assistem à parte contrária.
I) No caso sub judice, considera o Apelante que fazer contraprova do alegado pelo Autor nos seus artigos 18.º a 20.º da petição inicial, diminui indubitavelmente o seu risco processual, diminuição essa aliás que se pode mesmo quantificar monetariamente, já que o Apelante, caso veja serem considerados provados os factos ali alegados, será condenado no pedido formulado pelo Autor no artigo 26.º, ou seja, cinco mil euros.
J) Não pode o Apelante deixar de discordar com o Tribunal recorrido, quando considera que o meio de prova recorrido por aquele não possui qualquer interesse nem terá qualquer influência numa decisão a proferir posteriormente.
k) Basta aliás atentar para os pontos 2) e 3) dos temas de prova fixados no Despacho Saneador de que se recorre para facilmente se concluir que a sentença a ser proferida terá, obrigatoriamente de se pronunciar quanto à prova ou não dos factos alegados no pontos 18.º a 20.º da Petição Inicial, e terá necessariamente, sob pena de nulidade, de fundamentar tal decisão segundo a prova produzida.
L) Mantendo-se a decisão de indeferir o pedido de junção aos autos do certificado do registo criminal do autor, tal prova apenas poderá ser feita (ou não) através da prova indicada pelo Autor, o que resultaria numa desigualdade processual inadmissível, sem falar na grande diferença que é patente entre uma prova documental emanada de uma entidade fidedigna e a prova testemunhal.
M) O Despacho Saneador de que se recorre, decidiu ainda indeferir o pedido de realização de perícia médico-legal psiquiátrica à pessoa do Autor, requerida pelo ora Apelante em sede de Audiência Prévia, com a pretensão de infirmar os alegados danos psicológicos cujo ressarcimento é peticionado pelo Autor.
N) Considerando que, face à matéria controvertida, e considerada a factualidade alegada pelo Autor, a perícia requerida não teria pertinência para a apreciação dos factos em discussão.
O) Ora, o pedido formulado pelo Autor, no que aos danos não patrimoniais diz respeito, assenta na factualidade por ele alegada nos artigos 30.º a 36.º da Petição Inicial aperfeiçoada, resumidamente: Angustia, ansiedade, ofensa à honra, dignidade, bom nome e consideração, profundo choque e ofensa que o obrigaram a recorrer a ajuda médica e medicamentosa para a ansiedade e nervosismo que persistem até aos dias de hoje, perturbações, alteração do sistema nervoso e perturbações do sono.
P) Sendo estes os factos a provar, não logra o Apelante compreender como pode o Tribunal recorrido considerar que uma perícia médico-legal psiquiátrica, com os quesitos que constam da ata da diligência de audiência prévia, não tem qualquer pertinência para a apreciação dos factos em discussão.
Q) Face aos temas de prova fixados, a sentença a ser proferida terá obrigatoriamente de se pronunciar quanto à prova ou falta de prova destes factos, e terá de fundamentar tal decisão segundo a prova produzida.
R) Mantendo-se a decisão de indeferir o pedido de realização de perícia médico-legal psiquiátrica, tal prova apenas poderá ser feita (ou não) através da prova indicada pelo Autor, o que resultaria numa desigualdade processual inadmissível e numa prova deficitária baseada em mera prova testemunhal sem qualquer conhecimento especializado dos factos.
S) Quanto aos dois indeferimentos de diligências de prova reproduzidos no Despacho Saneador de que se recorre, cabe ainda referir que decorre do direito constitucional de acesso à justiça plasmado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa o direito a todas as partes processuais partes alegarem os factos em que assentam as suas posições, e demonstrarem-na em juízo através da prova e dos meios concretos de prova por si oferecidos e requeridos.
T) Este direito constitucionalmente consagrado funciona para todas partes processuais e bilateralmente, ou seja, compreende também o direito à contraprova, o direito a infirmar em juízo o alegado pela parte contrária através da prova e dos meios concretos de prova por si oferecidos e requeridos.
U) A decisão da qual se recorre fere os mais elementares e basilares princípios do nosso ordenamento jurídico, nomeadamente o princípio da descoberta da verdade.
V) Pois prescreve de forma transparente e imperativa o artigo 411.º do CPC que “Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer”.
W) O Código de Processo Civil saído da reforma de 95/96 veio alargar os poderes instrutórios e consagrar poderes cognitivos do Tribunal, consagrando um verdadeiro princípio da livre investigação dos factos.
X) No caso sub judice, dir-se-á que o Tribunal a quo foi bastante “poupado” na sua acção, manifestamente não fazendo uso dos poderes que se lhe reconhecem e que o legislador lhe concedeu, negando ao Recorrente um Direito que lhe assiste e negando, em razão última, a descoberta da verdade material.
Y) Sendo indubitável que a prova dos factos alegados pelo Autor, e cuja contraprova o Recorrente pretendia fazer através dos meios de prova requeridos e indeferidos, se reflectirá na sentença a proferir a final, todo o risco processual em que incorre o Apelante decorre da prova ou falta de prova desses factos.
Acresce que,
Z) Sempre incumbiria ao Tribunal por sua iniciativa requerer a produção de prova que o ajudasse a uma verdadeira decisão de mérito, nos termos que desenvolvemos, quanto mais se dirá quanto essa prova é sugerida por uma das partes.
AA) Os indeferimentos que estão na mira do presente recurso ficam assim patentemente aquém da dimensão que o artigo 20º da Constituição da Republica Portuguesa comporta.
AB) Com efeito, a lei ordinária, no caso as normas do CPC, concretizam a Constituição com o fim último do acesso à Justiça, ao Direito e aos Tribunais, pelo que a sua inconsideração redunda numa violação do Princípio do Acesso à Justiça que esse artigo consagra.
AC) Cumulativamente, é de concluir que, no que concerne ao complemento do requerimento probatório apresentado pelo Réu em sede de Audiência Prévia, e do Despacho que sobre ele recaiu, igualmente não restam dúvidas que, sendo a perícia médico-legal psiquiátrica a prova por excelência em casos como o do autos em que são alegados danos não patrimoniais resultantes de alegada afectação da psique, não poderia o Tribunal ter prescindido de tal elemento, mostrando-se violado o n.1 do art. 436º do C.P.C.
AD) É entendimento unânime que o Julgador está obrigado a analisar o conjunto da prova, à luz do bom senso, das regras da experiência, do conhecimento da vida. Ao restringir-se os meios de prova, como decorre do despacho posto em crise, coarcta-se aquele dever pois o Julgador ficará limitado à prova testemunhal que vier a ser produzida. E a prova testemunhal, como nos diz o bom senso, é a que se reveste de menor fiabilidade.
AE) O processo civil é um processo de partes, gozando estas de iguais direitos: é o denominado princípio da igualdade.
AF) Outro princípio que preside à Lei Processual Civil é o do contraditório, plasmado no artigo 3º do CPC. Ao negar ao Recorrente o direito a ver a prova requerida produzida, o Tribunal a quo violou de forma ostensiva aquele princípio.
AG) Assim, e salvo o devido respeito, e pelos fundamentos que ante se aduziram, mal andou o tribunal a quo ao impedir a produção de prova que se afigurava de extrema relevância para a correta, justa e imparcial decisão da causa.
Nestes termos e noutros melhores de direito que V/Exa. Doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e revogado o despacho recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que admita as diligências probatórias requeridas pelo Recorrente na sua Contestação e em sede de Audiência Prévia e, face ao efeito devolutivo do presente recurso, declare nulos os termos subsequentes do processado que dessa admissão dependam absolutamente”, nomeadamente a Audiência de Julgamento.”
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Foram apresentadas contra-alegações.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação:
- o Recorrente/Autor coloca(m) a(s) seguinte(s) questão(ões) que importa apreciar:
a) se o Tribunal decidiu bem quando julgou improcedente o seu pedido de condenação da Ré no pagamento da quantia de € 18.790,25.
b) saber se os valores peticionados a título de honorários devidos a mandatários, taxas de justiça e deslocações, devem ser reclamados em sede de custas de parte, tal como entendeu o Tribunal Recorrido.
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- e a Recorrente/Ré coloca(m) a(s) seguinte(s) questão(ões) que importa apreciar:
1. saber se o Tribunal Recorrido devia ter deferido as diligências probatórias requeridas pela Recorrente ( requerimento a solicitar a junção de certificado criminal do Autor; e requerimento a solicitar a realização de prova pericial)
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
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Como factualidade relevante interessa aqui ponderar apenas os trâmites processuais já atrás consignados no relatório do presente Acórdão e o teor da decisão proferida na parte posta em crise pelos Recorrentes e que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.

B)- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Quanto ao Recurso interposto pela Recorrente/Ré BB.

Por se tratar de um recurso que tem por objecto questões processuais (indeferimento de diligências probatórias), julga-se ser mais conveniente, em termos de ordem lógica de conhecimento, começar por apreciar o Recurso interposto pela Recorrente BB.
Propõe a Recorrente, como objecto do recurso, a questão de saber se as diligências probatórias por si requeridas deviam ter sido admitidas por serem pertinentes em relação ao objecto do litígio.
Na verdade, a Recorrente, em sede de Audiência prévia, requereu as seguintes diligências probatórias:
1ª- a realização de perícia médico-legal psiquiátrica à pessoa do Autor, tendo indicado como objecto “infirmar os alegados danos psicológicos” do Autor.
Na sequência apresentou os seguintes quesitos:
“Diga o Sr. Perito se, na sequência daqueles factos, o autor ficou angustiado, de tal modo que tal facto lhe demandou necessidade de tratamento médico?
Deve o Sr. Perito esclarecer qual ou quais os concretos danos de natureza psicológica susceptíveis de afectar a saúde do Autor decorrente do facto acima referido; “
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2ª - e a junção aos autos de certificado do registo criminal.
“,,, para que se prove então indubitavelmente nos autos que aquele é, efectivamente, a pessoa de bom-nome, ordeira, pacata, com a excelente reputação de que se arriga gozar, e com porte moral e cívico irrepreensível que alega ser….”.
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O Tribunal Recorrido indeferiu estes requerimentos probatórios com os seguintes fundamentos:

“Indefere-se a requerida solicitação do registo criminal do autor por se entender, em face da matéria que se mostra controvertida e necessária à boa apreciação da causa, que esta diligência não tem qualquer interesse, nem irá contribuir para a respectiva decisão.
(…)
O Autor peticiona uma indemnização a título de danos não patrimoniais, fundamentando tal pedido na factualidade alegada nos artigos 30º a 36º do articulado oferecido.
Tais factos foram postos em causa pela Ré mostrando-se, assim, controvertidos.
Considerando a concreta factualidade alegada pelo Autor, entende-se que a diligência ora requerida não tem pertinência para a apreciação dos factos em discussão.
De salientar que o Autor alegou ter recorrido à ajuda médica, no entanto, não especificou que as perturbações, ansiedade e alterações no sistema nervoso atingiram tal dimensão ou gravidade que essa ajuda médica ocorreu no âmbito do foro psiquiátrico.
Em face do exposto, indefere-se a realização da perícia.
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Ora, é justamente destas duas decisões de indeferimento das diligências probatórias que a Recorrente discorda, considerando-as pertinentes para o apuramento dos temas da prova ainda controvertidos.
Vejamos se tem razão.
O direito à prova é um dos corolários do direito à tutela jurisdicional efectiva, de consagração constitucional: art. 20º da Constituição da República Portuguesa (CRP).
Dado que o juiz julga “secundum allegata et probata”, sobre as partes recai o ónus de demonstrar a realidade dos factos que alegaram: art. 341º e 342º do CC.
Isto sem prejuízo do dever de cooperação entre as partes, e entre estas e os magistrados, incumbindo ao juiz remover qualquer obstáculo de índole probatória que as partes aleguem estar a condicionar o seu ónus probatório: art. 7º do CPC.
Por outro lado, dispõe o artigo 4º do Código de Processo Civil, na parte que nos interessa que, o tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no uso dos meios de defesa; trata-se de uma emanação do princípio do contraditório, que encontra a sua consagração no artigo anterior, no que concerne à possibilidade de utilização dos meios de prova, no sentido de assegurar o que se designa usualmente pelo princípio de igualdade de armas.
Neste sentido, a lei processual coloca ao dispor dos intervenientes um naipe de meios de prova de que cada um deles pode lançar mão, dentro dos limites estabelecidos e, entre os quais, se encontram, quer a solicitação ou requisição de documentos de terceiros (arts. 432º e 436º do CPC), quer a prova pericial (artigos 467º e ss. do CPC), que são justamente os meios de prova que a aqui Recorrente/Ré requereu.
Ora, perante esse requerimento, incumbia obviamente ao Tribunal Recorrido pronunciar-se sobre a admissibilidade e pertinência do requerimento probatório apresentado, designadamente, em nome do princípio da economia processual e da proibição da prática de actos inúteis (art. 130º CPC), bem como do dever de gestão processual (art. 6º CPC).
No entanto, o Tribunal, nessa pronúncia, deve ter sempre presente a ideia de que, na admissão dos meios de prova, não pode rejeitar um qualquer dos meios indicados pelas partes, com base na convicção pré-formada da sua relevância/eficácia para prova de determinado facto em concreto.
Por outro lado, importa ter em atenção que, tal como resulta do disposto no artigo 410º do CPC, a instrução tem por objecto os temas da prova enunciados, ou, quando não houver lugar a esta enunciação, os factos necessitados de prova.
E nessa medida, impõe-se a conclusão de que a admissibilidade dos meios de prova depende do objecto do processo que, aliás, no caso concreto, já foi indicado pelo Tribunal Recorrido.
Aqui chegados, importa referir que o Tribunal indeferiu ambos os requerimentos com fundamento na sua impertinência para a discussão da causa.
Ora, salvo o devido respeito pela opinião contrária, não podemos acompanhar a decisão proferida quanto à prova pericial requerida pela Recorrente.
Na verdade, tendo em conta os temas da prova, desde logo, seleccionados pelo Tribunal Recorrido(1), surge como uma evidência que o objecto da prova pericial indicado pela Recorrente tem pertinência para a discussão da matéria de facto.
Com efeito, é entendimento deste Tribunal que uma diligência de prova só pode considerar-se impertinente se não for idónea para provar o facto que com ele se pretende provar, se o facto se encontrar já provado por qualquer outro meio de prova ou se carecer de todo de relevância para a decisão da causa(2).
Ora, o Requerimento da Ré/Recorrente no que concerne à prova pericial não encaixa manifestamente em nenhuma destas situações.
Na verdade, o requerimento de realização de prova pericial apresentado pela Ré/Recorrente tem, conforme já se referiu, pertinência em relação aos temas de prova seleccionados pelo próprio Tribunal Recorrido, e visa efectuar a contraprova da matéria de facto alegada pelo Autor.
Tanto basta para considerar a pertinência do requerimento da Ré/Recorrente em solicitar a realização de prova pericial com o objecto que propõe.
Um outro tanto já não sucede com o requerimento que visa a junção aos autos do certificado de registo criminal do Autor.
Na verdade, este requerimento já preenche uma das situações atrás referidas como justificativas da impertinência do requerimento.
Com efeito, é patente que o requerimento apresentado, não só não é idóneo para provar o facto que com ele se pretende provar, como além do mais carece, de todo, de relevância para a decisão da presente causa (e mesmo para provar a factualidade que a Recorrente invoca em apoio da sua tese).
*
Pelo exposto, e nos termos dos dispositivos legais citados, decide-se, pois, nesta parte do Recurso, julgar o mesmo parcialmente procedente quanto à parte do despacho recorrido que indeferiu o requerimento da Ré relativo à realização de prova pericial.
Nesta conformidade, impõe-se a revogação parcial do despacho recorrido, com a consequência de se dever ordenar a notificação da parte contrária, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 578º, n.º 1 do Código de Processo Civil e o posterior normal prosseguimento do processo.
Na parte remanescente do Recurso, mantém-se, pois, integralmente a decisão recorrida.
*
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Quanto ao Recurso do Recorrente/ Autor José Lima
São duas as questões que o Recorrente levanta.
a) saber se o Tribunal decidiu bem quando julgou improcedente o seu pedido de condenação da Ré no pagamento da quantia de € 18.790,25.
b) saber se os valores peticionados a título de honorários devidos a mandatários, taxas de justiça e deslocações, devem ser reclamados em sede de custas de parte, tal como entendeu o Tribunal Recorrido.
*
Comecemos por apreciar a primeira questão.
Conforme decorre do relatório elaborado, o Tribunal Recorrido, considerando que “… o estado dos autos permite o conhecimento e a apreciação parcial do mérito da causa, concretamente dos pedidos formulados sob os pontos nº. 1, 2, 4, 5, e 6, por referência ao novo articulado apresentado e cujos pedidos constam a fls. 87 dos autos, sem necessidade de mais provas…”,
decidiu conhecer, desde logo, do mérito do pedido formulado pelo Autor (interessa-nos agora apenas os três primeiros pedidos).
Para tanto, depois de considerar determinados factos como assentes, entendeu que:
“… o Autor tinha que demonstrar que, caso a Ré tivesse liquidado a quantia correspondente ao capital máximo do seguro na data em que foi interpelada para o fazer (ponto 12 dos factos provados na decisão proferida no âmbito do processo nº 2683/13.2TB), nunca teria liquidado estes montantes. Ou seja, que a liquidação do valor das prestações entre a data da interpelação e a data em que tal capital foi pago, não seria devido.
Contrariamente, o que se constata é que essas quantias sempre seriam devidas. Com efeito, embora não tenha sido expressamente alegado qual o valor em divida à data da interpelação, sabe-se que em 29 de Abril 2013 (menos de um mês antes da interpelação) o empréstimo associado à apólice registava um valor em dívida de € 130.155,02. Ora, se a Ré tivesse liquidado a quantia de € 75.000,00 nessa data, estaria ainda em dívida ao Banco que concedeu o empréstimo a quantia de cerca de € 55.000,00. Esta quantia em dívida é manifestamente superior ao valor que o Autor quantifica como sendo o valor das prestações entre a data da interpelação e a data do capital seguro.
Aliás, a forma como o Autor estrutura a causa de pedir é errónea e confusa, não obstante o convite ao aperfeiçoamento formulado pelo Tribunal. Veja-se que o Autor pede a condenação da ré na quantia de € 18.790,25, a título prestações de capital e juros vencidos de Março de 2011 e até Julho de 2015. No entanto, a incapacidade que justificou a interpelação da Ré reporta-se ao ano de 2012, sendo que a Ré foi interpelada para pagar em Maio de 2013, desconhecendo-se a data concreta do pagamento (porque não foi alegado, apenas se sabe que cumpriu após ter sido condenada no âmbito do processo 2683/13.2TB) e, no artigo 6º da petição inicial, o autor sustenta que são devidos pela Ré os valores do capital vencido desde a data da interpelação extrajudicial e até à data do efectivo pagamento (valor, ainda que não concretamente alegado, forçosamente distinto e bem inferior aos alegados € 18.790, 25).
Nestes termos, não tendo o Autor alegado factos que, a resultarem provados, demonstrariam que o pagamento das prestações ao Banco não teria ocorrido se a ré não se demorasse a cumprir o contrato, nunca se poderia concluir que o pagamento de tais prestações (sempre em valor substancialmente inferior aos alegados € 18.790,25) constituiriam um prejuízo para o Autor e imputável à Ré.
Por estes motivos, o pedido formulado não pode proceder.
Assim sendo e em face do exposto, julga-se improcedente o pedido formulado pelo Autor de condenação da ré no pagamento da quantia de € 18.790,25 e, consequentemente, dos respectivos juros contabilizados no valor de € 3.620,08.”
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Discorda o Recorrente/Autor desta decisão, considerando que:
5. Na interpelação à Ré, o Autor apenas accionou a sua apólice que possuía o valor global de €75.000,00, pelo que a da sua esposa ainda continuava em vigor de facto.
6- Assim, entre a data de interpelação para pagamento e a sentença que condenou a Ré ao pagamento da totalidade do capital segurado na apólice do Autor, no valor de €75.000,00, o Autor viu-se obrigado a despender da quantia de €18.790,25.
7- Caso a Ré tivesse cumprido pontualmente a sua obrigação, apenas teria disposto da quantia de €18.790,25 respeitante ao montante coberto pela da sua esposa.
8- Comprova-se ainda que existiu por parte da Ré um incumprimento contratual uma vez que o remanescente entre o capital seguro e o capital em dívida, no que concerne à Apólice do Autor, não foi paga ao Autor, impedindo o Autor de dispor livremente do dinheiro e fazer face a despesas da vida corrente.
9- O Autor não pode de modo algum se conformar com a decisão/ despacho saneador, por tudo quanto supra exposto e que se dá por integralmente reproduzido por uma questão de economia processual.
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Cumpre decidir.
Conforme resulta do exposto, a questão que o Recorrente coloca, no fundo, é a de saber se o Tribunal Recorrido podia ter proferido, desde já, decisão de mérito sobre os três pedidos formulados, tendo em conta os elementos factuais que o processo dispunha no momento em que foi proferida a decisão.
Com efeito, o Tribunal Recorrido para antecipar o julgamento (parcial) de mérito considerou que os factos alegados pelo Autor (mesmo depois da apresentação da petição inicial corrigida) eram insuficientes para determinar a procedência dos aludidos pedidos.
Tal decorre do seguinte passo da fundamentação da decisão recorrida: “… não tendo o Autor alegado factos que, a resultarem provados, demonstrariam que o pagamento das prestações ao Banco não teria ocorrido se a Ré não se demorasse a cumprir o contrato, nunca se poderia concluir que o pagamento de tais prestações (sempre em valor substancialmente inferior aos alegados € 18.790,25) constituiriam um prejuízo para o Autor e imputável à Ré….”.
Ora, compulsados os articulados apresentados pelo Autor, a verdade é que não podemos acompanhar esta conclusão do Tribunal Recorrido.
Com efeito, o Autor alega nos articulados que apresentou, de uma forma concretizada, um conjunto de factos de onde decorre que o seu alegado prejuízo corresponderá às quantias que teve que pagar (indevidamente, na versão do Autor) entre a data de interpelação para pagamento da Ré e a data da sentença que condenou a Ré ao pagamento da totalidade do capital segurado na apólice do Autor e que alegadamente decorrem, em termos causais, do alegado incumprimento da Ré da obrigação que sobre si recaía no âmbito do contrato de seguro celebrado com o Autor.
Ou seja, decorre das alegações fácticas do Autor que este alega que só teve que pagar as quantias que constituem o seu peticionado prejuízo, porque a Ré não cumpriu a obrigação que sobre si recaía no âmbito do contrato de seguro.
Assim, contrariamente ao que ficou referido na decisão recorrida, o Autor alega (mesmo) que o pagamento das prestações ao Banco não teria ocorrido, se a Ré não se demorasse a cumprir o contrato.
Isso resulta, de uma forma expressa, entre outros pontos da matéria de facto alegada, por exemplo, dos itens 8º a 15º da p. i. (alegado incumprimento da Ré), 16º a 22º da p. i. (alegado prejuízo -correspondente ao valor de metade das prestações relativas ao crédito bancário que não seriam devidas se a Ré tivesse liquidado o capital seguro à data da participação do sinistro- conforme expressamente alega no item 17º da p.i.).
Nessa medida, peticionando o Autor o ressarcimento dos danos provocados por esse alegado incumprimento imputável à Ré, considera-se que os factos alegados pelo Autor, integrando a causa de pedir dos pedidos que formula, permitirão, caso o Autor consiga provar essa factualidade, sustentar a procedência da acção.
Com efeito, ao Autor incumbiria alegar, como causa de pedir dos pedidos aqui em discussão, o alegado incumprimento do contrato por parte da Ré e os alegados prejuízos que esse incumprimento determinou causalmente na sua esfera patrimonial.
Ora, como se referiu, compulsados os articulados apresentados pelo Autor, resulta evidente que este, não só alegou essa factualidade correspondente ao incumprimento da Ré, como também alegou o prejuízo que essa conduta da Ré alegadamente lhe causou.
(outra questão será a de saber se o Autor logrará provar esses factos; e outra questão ainda será, no caso de isso se verificar, saber se os cálculos que o Autor efectua correspondem realmente aos valores que alega ter pago indevidamente em virtude desse alegado incumprimento da Ré- tudo questões sobre as quais o Tribunal só se poderá pronunciar após ser produzida prova, uma vez que tais factos mostram-se, nesta fase processual, ainda controvertidos)
Nesta conformidade, não se pode acompanhar o Tribunal Recorrido na fundamentação que apresenta para decidir, de uma forma antecipada e parcial, o mérito da presente acção (no que concerne aos três primeiros pedidos formulados).
Decorre, assim, do exposto, que, contrariamente ao defendido pelo Tribunal Recorrido, mostram-se ainda controvertidos factos alegados pelo Autor e que contendem com a causa de pedir dos aludidos três primeiros pedidos formulados pelo Autor.
Tais factos, por se encontrarem controvertidos deverão merecer ainda a enunciação de um ou mais temas da prova atinentes à averiguação do alegado prejuízo invocado pelo Autor correspondente às quantias que alegadamente teve que pagar (indevidamente, na versão do Autor) entre a data de interpelação (extrajudicial) para pagamento da Ré e a data da sentença que condenou a Ré ao pagamento da totalidade do capital segurado na apólice do Autor.
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Como é sabido, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 595º do CPC, o despacho saneador destina-se a “conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos ou de alguma excepção peremptória”.
Tal acontecerá (i) quando toda a matéria de facto se encontre provada por confissão expressa ou tácita, por acordo ou por documentos, (ii) quando seja indiferente, para qualquer das soluções plausíveis, a prova dos factos que permanecem controvertidos, e (iii) quando todos os factos controvertidos careçam de prova documental.
Além disso, entende-se que o conhecimento do mérito da causa, total ou parcialmente, só deve ter lugar quando o processo contenha todos os elementos necessários para uma decisão conscienciosa, segundo as várias soluções plausíveis de direito e não tendo em vista apenas a partilhada pelo juiz da causa.
Assim, a exemplo do que sucedia no anterior art. 511º do CPC, o juiz, ao identificar o objecto do litígio e ao fixar os temas da prova (art. 596º do CPC), deve (continuar a) seleccionar para a matéria de facto (para os temas da prova), aquela que seja relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis de direito.
Nesta conformidade, “…o conhecimento imediato do mérito só se realiza no despacho saneador se o processo possibilitar esse conhecimento, o que não ocorre se existirem factos controvertidos que possam ser relevantes, segundo outras soluções igualmente plausíveis da questão de direito: ao despacho saneador não cabe antecipar qualquer solução jurídica e, muito menos, desconsiderar quaisquer factos que sejam relevantes segundo outros enquadramentos possíveis do objecto da acção. De maneira que se os elementos fornecidos pelo processo não justificarem essa antecipação, o processo deve prosseguir para a fase da instrução, realizando-se a apreciação do mérito na sentença final”(3).
Na verdade, “… quando o juiz coloca a si próprio a questão de saber se tem, efectivamente, condições para conhecer do mérito da causa, no despacho saneador, o mais frequente é ser duvidoso o sentido da resposta. Quer dizer, poucos serão os processos em que, na fase intermédia, o juiz pode, claramente, concluir que todos os factos alegados estão provados ou não provados… Por outro lado, esta dificuldade é agravada pela perspectiva de a questão de direito poder ter mais do que uma solução, implicando que o relevo dos referidos factos (ainda que controvertidos) varie em função desta ou daquela solução jurídica…”(4).
Assim, por uma questão de cautela, e para esse efeito, o Juiz deverá usar um critério objectivo, isto é, tomando como referência indicadores que não se cinjam à sua própria convicção acerca da solução jurídica do problema(5).
Ora, no caso dos autos, conforme resulta do exposto, contrariamente ao defendido pelo Tribunal Recorrido, entende-se que existem factos alegados pelo Autor que, podendo conduzir à procedência das suas pretensões, ainda se mostram controvertidos.
Nesta conformidade, afigura-se-nos que, tendo em conta o exposto, o Tribunal Recorrido não podia, desde já, proferir a decisão aqui posta em crise.
Conclui-se, pois, que os presentes autos devem prosseguir os seus ulteriores termos processuais, no que concerne aos três primeiros pedidos formulados pelo Autor, completando-se o despacho destinado a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova (os já mencionados que contendem com a matéria de facto já referida e ainda os que o Tribunal recorrido entender ser pertinente formular), sendo de admitir que, produzindo-se prova sobre essa factualidade, seja proferida uma decisão conscienciosa da questão de mérito aqui precipitadamente decidida.
Assim, procedendo a Apelação, nesse exacto ponto, deve ser revogada a sentença, com a consequência de, em 1ª Instância, dever retomar-se a fase de saneamento do processo, substituindo-se a decisão aqui revogada por decisão que atenda àquela matéria de facto que se considerou relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis para a questão de direito, à luz das posições assumidas nos articulados e do regime dos arts. 597º, 595º e 596º do CPC.
Assim, e pelo exposto, deve proceder a presente apelação, revogando-se esta parte da decisão impugnada, que deve ser substituída por outra que dê obediência ao acima exposto.
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Entremos agora na segunda questão.
Conforme decorre da decisão proferida, o Tribunal Recorrido, invocando como fundamento a ideia de que os valores aqui peticionados pelo Autor ”… têm enquadramento nas custas de parte, previstas nos artigos 25º e 26º do Regulamento das Custas Processuais”, julgou, desde logo, improcedente esta parte do pedido formulado pelo Autor.
Importa dizer liminarmente que a decisão do Tribunal Recorrido deve manter-se
Na verdade, tem sido afirmado, de uma forma pacífica, na Jurisprudência que as quantias peticionadas pelo Autor, dizendo respeito despesas judiciais (honorários, custas e deslocações) não decorrem causalmente do alegado ilícito contratual que aqui constitui o fundamento da pretensão do Autor.
É que, conforme afirma o Prof. Almeida Costa, “não há que ressarcir todos e quaisquer danos que sobrevenham ao facto ilícito, mas tão-só os que ele tenha na realidade ocasionado, os que possam pelo mesmo ter sido produzidos (…)”(6).
Deste modo, e como bem intuiu a decisão aqui posta em crise, não se vislumbra que exista relação de causalidade entre o alegado incumprimento e os prejuízos alegados pelo Autor nos pedidos formulados sob os pontos 4 a 6 do petitório (7).
Na verdade, no que toca aos montantes despendidos pelo autor em taxa de justiça e encargos do processo, os mesmos integram o conceito das custas de parte, o qual por sua vez se mostra abrangido pelas custas processuais – vide arts. 529º, n.º 1, do CPC, 3º, n.º 1, do RCP.
Assim, estas quantias aqui peticionadas poderiam ser reclamadas no final do pleito e ser-lhe-iam restituídas na proporção em que tiver obtido ganho de causa.
Nesta medida, as partes, na exacta proporção do seu vencimento na acção, têm direito a ser compensadas pela outra parte das despesas suportadas (taxa de justiça e encargos) – art. 529º, n.º 4, do CPC e 26º, n.º 1, do RCP.
Deste modo, as custas de parte integram-se na condenação geral por custas.
Do mesmo modo se passam as coisas quanto aos honorários, os quais também integram as custas de parte – cfr. arts. 25º, n.ºs 1 e 2, al. d) do RCP e 533º, n.º 2 al. d) do CPC.
Aí se determina que a parte vencedora, na proporção em que o for, deverá, na nota discriminativa das custas de parte, indicar, em rubrica autónoma, as quantias pagas a título de honorários de mandatário, salvo quando as quantias em causa sejam superiores ao valor indicado na alínea c) do n.º 3 do artigo 26º, ou seja, 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários do mandatário judicial. Os valores em referência encontram-se, assim, dependentes da apresentação pelo autor da nota discriminativa.
De qualquer forma, mesmo“…na parte em que os honorários do ilustre mandatário do autor venham, eventualmente, a exceder aquele valor, não existe qualquer disposição legal que confira esse direito indemnizatório ao autor, sendo que de todo o sistema legal vigente deriva que é aquele montante que, desde sempre, tem vindo a ser entendida com a natureza de uma compensação devida pelo vencido ao vencedor, referente ao reembolso das despesas por aquele realizadas com o mandato judicial, sendo que quando o legislador pretendeu fazer incidir sobre qualquer das partes intervenientes na lide a obrigação referente à satisfação integral das despesas relativas a honorários indicou expressamente essas situações e a parte sobre a qual tal imposição impendia (arts. 457º, n.º 1 a) e 662º, n.º 3, do CPC – cfr. Ac. RP de 26-10-2004, in www.dgsi.pt...”(8).
Deste modo, não assiste ao Autor o direito a ser indemnizado pelas despesas por si invocadas fora do âmbito da condenação em custas.
Improcede esta parte do Recurso.
*
*
III-DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em:
I)- no que concerne ao Recurso interposto pelo A./Recorrente
a) julgar parcialmente procedente o Recurso apresentado, e, em consequência, revogar a decisão recorrida (na parte em que julgou improcedente os 3 (três) primeiros pedidos do Autor), decisão que deve ser substituída por outra que ordene, quanto àqueles pedidos, o prosseguimento dos ulteriores termos processuais, retomando a fase do saneamento do processo, completando-se o despacho destinado a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova de forma a que se dê obediência ao acima exposto.
No mais, decide-se manter integralmente a decisão recorrida.
*
II) no que concerne ao Recurso interposto pela Ré/Recorrente
a) julgar parcialmente procedente o Recurso apresentado, e, em consequência, revogar a decisão recorrida (na parte em que indeferiu o requerimento probatório de realização de prova pericial), decisão que deve ser substituída por outra que ordene, oportunamente, a notificação da parte contrária, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 578º, n.º 1 do Código de Processo Civil e o posterior normal prosseguimento do processo.
No mais, decide-se manter integralmente a decisão recorrida.
*
Custas pelo Recorrente/A. e pela Recorrente/Ré na proporção de metade (art. 527, nº 1 do CPC).
Notifique.
*
Guimarães, 16 de Fevereiro de 2017

(Dr. Pedro Alexandre Damião e Cunha)

(Dra. Maria João Marques Pinto de Matos)

(Dra. Elisabete de Jesus Santos de Oliveira Valente)




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1 Que como vimos, são os seguintes:” 2)- Saber se após a resposta dada pela Ré à sua interpelação de 22 de Maio de 2013, o Autor se afligiu, se sentiu angustiado, ansioso, profundamente chocado e se se viu obrigado a recorrer a ajuda médica; 3)- As perturbações causadas pela conduta da Ré na vida do Autor.”;
2 v., neste sentido, o ac. da RG de 20 de Outubro de 2011(relator: Carlos Guerra), in dgsi.pt;
3 Ac da Relação de Coimbra de 2-07-2013 publicado em www.dgsi.pt.
4 Paulo Pimenta, in “Processo civil declarativo”, págs. 256/7.
5 Paulo Pimenta, in “Processo civil declarativo”, págs. 257; cfr. Lebre de Freitas, in “A acção declarativa comum à luz do CPC de 2013”, pág. 186.
6 In «Direito das obrigações», 3ª ed., pág.399;
7 V. por ex. o ac da RP de 21.11.2002, in Dgsi.pt : “Os honorários de mandatário forense não podem qualificar-se como um prejuízo patrimonial, directa e necessariamente decorrente do facto ilícito praticado pelo lesante, não podendo enquadrar-se no âmbito da obrigação de indemnizar a cargo deste.”;
8 v. o ac. do Stj de 5 de Novembro de 2013 (Relator: Manuel Marques ), in dgsi.pt; É este, aliás, o entendimento que o STJ vem sustentando, nomeadamente nos Acs. de 15/03/2007 e 2/7/2009 (relator: João Bernardo) , in dgsi.pt, onde se refere que “o regime de pagamento das despesas com honorários a advogado que move e/ou acompanha uma acção judicial tem um regime específico bem afastado do geral da responsabilidade civil no que à parte contrária respeita.”