Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2535/17.7T9GMR-A.G1
Relator: FÁTIMA FURTADO
Descritores: CONTRAORDENAÇÃO DE NATUREZA ESTRADAL
ESTACIONAMENTO EM ZONA DE PARCÓMETROS
DECISÃO ADMINISTRATIVA
NOTIFICAÇÃO
REGIME LEGAL APLICÁVEL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/10/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I) A contraordenação prevista no artigo 22.º do Regulamento das Zonas de Estacionamento de Duração Limitada Controlada por Parcómetros, da Câmara Municipal X, de natureza estradal, cai no âmbito de aplicação do Código da Estrada e por ele é regulada em tudo que não estiver expressamente previsto no DL n.º 81/2006, de 20 de abril e no respetivo Regulamento Municipal.

II) A norma do artigo 176.º do Código da Estrada, relativamente às notificações efetuadas no âmbito do respetivo procedimento, por ser norma especial relativamente ao regime das notificações previsto no RGCO é a aplicável - lex specialis derogat legi generali.
Decisão Texto Integral:
Acórdão em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães.
(Secção penal)

Relatora: Fátima Furtado; adjunta Laura Maurício.

I. RELATÓRIO

No processo apenso à execução comum nº 2535/17.7T9GMR-A, do juízo local criminal de Guimarães, juiz 2, da comarca de Braga, foram liminarmente indeferidos os embargos do executado Joaquim, com os demais sinais dos autos, por decisão datada de 20 de fevereiro de 2018.
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Inconformado, o embargante Joaquim interpôs recurso, apresentando a competente motivação que remata com as seguintes conclusões:

«1 – Admissibilidade do recurso –
No presente caso, a sentença de que se recorre, indefere liminarmente os embargos de executado nos termos do artigo 732º n.º 1 al. b) do CPC, considerando que os seus fundamentos não se ajustam ao disposto nos artigos 729º a 731º do CPC.

No entanto, a petição de embargos de executado, teve por fundamento a violação do preceituado nas al. a) e d) do artigo 729º do CPC, com a invocação da nulidade da notificação da decisão administrativa.

Pelo que, indeferindo-se liminarmente os presentes embargos de executado, deverá o presente recurso ser admitido nos termos do disposto no artigo 629º n.º 3 al. c) do CPC, que determina que independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso para a relação das decisões de indeferimento liminar da petição de ação.

2 - Do recurso –
Entende o recorrente que a questão central a apreciar no presente recurso, se reduz a determinar qual a lei aplicável à notificação das decisões administrativas em sede de processos de contraordenação.
Sendo a forma de recurso da decisão administrativa competência dos tribunais e regulada pelo Regime Jurídico das Contraordenações, também a forma de notificação dessas decisões administrativas equiparadas a sentença, se devem reger pelo Regime Jurídico das Contraordenações.
A notificação da decisão administrativa por força da remissão prevista no artigo 41º do RGCO é feita de acordo com o regime previsto no artigo 113º do CPP, donde resultará que a notificação da decisão administrativa apenas poderá processar-se pelas formas previstas nas alíneas a) ou b), do nº 1, por contacto pessoal com o notificando e no lugar em que este for encontrado, ou por via postal registada, por meio de carta ou aviso registados, desde que o aviso de receção se mostre assinado pelo destinatário/notificando.

Conclui-se, que o ora executado/oponente/embargante não se pode considerar regularmente notificado e consequentemente, a decisão administrativa não se tornou definitiva, não sendo, por isso exequível.
Devendo a invocada nulidade da decisão administrativa ser declarada por falta de notificação e, consequentemente, declarada extinta a execução por falta manifesta de título executivo, nos termos dos artigos 726º, nº 2, a) do CPC., ordenando-se o levantamento da penhora, nos termos do artigo 734º, nºs 2 do CPC.»
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O recurso foi admitido para este Tribunal da Relação de Guimarães, por despacho datado 18 de abril de 2018.
Respondeu o Ministério Público (exequente) clamando pela rejeição do recurso ou, se assim não se entender, pela sua improcedência.
Nesta Relação, o Ex.mo Senhor Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual conclui dever ser negado provimento ao recurso
Foi cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, sem resposta.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

Conforme é jurisprudência assente, o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respetiva motivação, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer (1).

1. Questão a decidir

Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, a questão a decidir circunscreve-se a determinar a lei aplicável à notificação da decisão administrativa que aplicou uma coima pela prática da contraordenação prevista no artigo 22.º do Regulamento das Zonas de Estacionamento de Duração Limitada Controlada por Parcómetros.
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2. É o seguinte o teor da decisão recorrida:

«Por apenso à execução comum, que lhe move o Ministério Público, veio Joaquim, deduzir oposição à execução, nos termos dos art.ºs 731.º e 729.º alíneas a) e d) do CPC.
Para tanto, alega, entre o mais e em síntese, que: o executado não teve conhecimento da existência de um processo de contra-ordenação contra si elaborado; o executado/oponente nunca foi notificado pessoalmente da decisão administrativa nem foi notificado para exercer o seu direito de defesa, invocando-se a nulidade da decisão administrativa por falta de notificação pessoal para o exercício do direito de defesa e falta de notificação da decisão administrativa, constituindo uma nulidade insanável por violação do art.º 50.º do RGCO; a Camara Municipal X fundamenta a aplicação da coima num regulamento da autarquia não identificando ao abrigo de que disposição lhe foram atribuídas competências para processar contra-ordenações, o que configura clara violação da lei e donde decorre a sua ilegitimidade que desde já se invoca; do auto de notícia constata-se que a infracção nele descrita se encontra descrito sumariamente de forma conclusiva, vaga e abstracta com a simples indicação de estacionamento na Rua …, de viatura marca Citroen com a matrícula JZ, no dia 15 de Janeiro de 2016, às 17:42h; o auto em referência, carece de elementos essenciais à produção dos seus efeitos, devendo o presente auto, após a devida e necessária averiguação e apreciação, ser declarado nulo e sem qualquer efeito, daí decorrendo as suas legais consequências, quer por ser elaborado/levantado ao arrepio do disposto no artigo 170º do C.E. e do Código do Procedimento Administrativo, quer pela violação dos princípios constitucionais da legalidade do estado de direito.
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De acordo com o disposto no art.º 732.º, n.º 1, do C.P.C., “Os embargos que devem ser autuados por apenso, são liminarmente indeferidos quando: a) tiverem sido deduzidos fora do prazo; b) o fundamento não se ajustar ao disposto nos artigos 729.º a 731.º; c) forem manifestamente improcedentes.

A presente oposição foi apresentada em tempo e fundada nos termos do artigo 731.º do CPC.

Já existem nos autos elementos suficientes de forma a permitir uma decisão imediata sobre a questão, cumpre decidir.

Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva – cf. art.º 10.º, n.º 5, do CPC.

O título executivo em que se funda a presente acção executiva é uma decisão administrativa referente à prática de uma contra-ordenação, a qual foi notificada à executada - cfr. fls. 5 e 6 dos autos apensos.

A resolução da questão “sub judice” implica necessariamente a análise do título executivo que se nos apresenta. Nomeadamente, importa desde logo descortinar se a decisão proferida em sede de recurso de contra-ordenação equivale, enquanto título executivo, à “sentença” referida no art.º 729º do CPC ou se, pelo contrário, se insere no conceito de “outro título” plasmado no art.º 731.º do mesmo diploma.

Tal verificação reveste importância acrescida, uma vez que os fundamentos invocáveis em sede de oposição à execução são mais restritos no primeiro caso do que no segundo.

Vejamos.

Proferida a decisão pela entidade administrativa, ao opoente assistia a faculdade de a impugnar judicialmente, alegando, em via de recurso, todas as razões da sua discordância (art.º 59.º do DL n.º 433/82, de 27/10) - vide a notificação de fls. 11/13 dos autos apensos.

Não o tendo feito, a decisão administrativa tornou-se definitiva e, desse modo, podia ser executada (art.ºs 88º e 89º do referido diploma).

Na verdade, nos termos do art.º 79º, nº 1, “O carácter definitivo da decisão da autoridade administrativa ou o trânsito em julgado da decisão judicial que aprecie o facto como contra-ordenação ou como crime precludem a possibilidade de reapreciação de tal facto como contra-ordenação”.

Ora, assim sendo, cumpre concluir que o último preceito referido confere à decisão administrativa um valor em tudo igual ao caso julgado de uma decisão judicial. Com efeito, embora a decisão da entidade administrativa em causa não tenha a natureza e a dignidade de uma sentença proferida por um órgão jurisdicional, o certo é que a lei lhe atribui efeitos análogos.

Nesta medida, a oposição a execução fundada em decisão administrativa definitiva só pode ter os fundamentos previstos no art.º 729.º do CPC, encontrando-se-lhe vedado o recurso aos fundamentos de âmbito mais alargado previstos no art.º 731.º - cfr. Acórdão da Relação de Coimbra, de 04-03-2008, publicado em www.dgsi.pt.

Ora, de acordo com o disposto no aludido preceito (art.º 729.º CPC), fundando-se a execução em sentença, a oposição só pode ter algum dos fundamentos seguintes:

a) Inexistência ou inexequibilidade do título;
b) Falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da execução;
c) Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento; d) Falta ou nulidade da citação para a acção declarativa quando o réu não tenha intervindo no processo;
e) Incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, não supridas na fase introdutória da execução;
f) Caso julgado anterior à sentença que se executa;
g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento; a prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio;
h) Contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos;
i) Tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transacção, qualquer causa de nulidade ou anulabilidade desses actos.

Dos fundamentos invocados pelo opoente na sua oposição à execução apresentada apenas o previsto na alínea d) do art.º 729.º CPC pode merecer apreciação, já que todos os outros fundamentos invocados não têm qualquer cabimento legal, atento o preceito em referência.

Assim, o opoente alega que nunca foi notificado pessoalmente da decisão administrativa nem foi notificado para exercer o seu direito de defesa, o que acarreta uma nulidade insanável por violação do art.º 50.º do RGCO.

Dispõe o art.º 70.º n.º 2 do Código da Estrada que “Os parques e zonas de estacionamento podem ser afectos a veículos de certas categorias, podendo a sua utilização ser limitada no tempo ou sujeita ao pagamento de uma taxa, nos termos fixados em regulamento.”. E o art.º 71.º n.º 1 alínea d) do mesmo diploma legal refere que “nos parques e zonas de estacionamento é proibido estacionar por tempo superior ao estabelecido ou sem o pagamento da taxa fixada nos termos do n.º 2 do artigo anterior.”.

Por seu turno, de acordo com o n.º 7 do art.º 169.º do Código da Estrada, a competência para o processamento das contra-ordenações previstas no artigo 71.º e a competência para aplicação das respectivas coimas e sanções acessórias podem ser atribuídas à câmara municipal competente para aprovar a localização do parque ou zona de estacionamento, por designação do membro do Governo responsável pela área da administração interna, mediante proposta da câmara municipal, com parecer favorável da ANSR, desde que reunidas as condições definidas por portaria do membro do Governo responsável pela área da administração interna.
O DL n.º 81/2006, de 20 de Abril aprovou o regime relativo às condições de utilização dos parques e zonas de estacionamento, sendo que de acordo com o seu art.º 2.º, as câmaras municipais aprovam a localização de parques ou zonas de estacionamento; as condições de utilização e taxas devidas pelo estacionamento são aprovadas por regulamento municipal.

De harmonia com o que se dispõe no art.º 2.º n.º 2 deste Decreto-Lei nº 81/2006, de 20 de Abril, a Assembleia Municipal, sob proposta da Câmara Municipal X, aprovou, no uso dos poderes conferidos pelo artigo 25.º nº 1, alínea g) da Lei nº 75/2013, de 12 de Setembro, o Regulamento das Zonas de Estacionamento de duração limitada, controladas por parcómetros.

De acordo com o seu art.º 22.º do Regulamento, é considerada contra-ordenação parar ou estacionar nas zonas de estacionamento de duração limitada sem cumprir o presente Regulamento, nomeadamente sem o pagamento das taxas devidas. As infracções ao presente regulamento são puníveis com a coima, de harmonia com os números seguintes, entre o mínimo de € 30,00 e o máximo de € 150,00. – cfr. n.º 1 do art.º 23.º do regulamento.

Do exposto, necessariamente se impõe concluir que se aplicam as regras previstas no Código da Estrada em tudo quanto não venha regulado no aludido DL n.º 81/2006, de 20 de Abril e no referido Regulamento Municipal.

Das regras previstas no Código da Estrada quanto à notificação do arguido, cumpre referir o seguinte:

Dispõe o art.º 176.º n.º 1 do Código da Estrada que:

1 - As notificações efectuam-se:
a) Por contacto pessoal com o notificando no lugar em que for encontrado;
b) Mediante carta registada com aviso de recepção expedida para o domicílio ou sede do notificando;
c) Mediante carta simples expedida para o domicílio ou sede do notificando.”.
Se não for possível, no acto de autuação, proceder à notificação por contacto pessoal ou se estiver em causa qualquer outro ato, a notificação pode ser efectuada através de carta registada com aviso de recepção, expedida para o domicílio ou sede do notificando. – cfr. n.º 4 do art.º 176.º do Código da Estrada. O que sucedeu nos presentes autos, ou seja, o aqui opoente não foi notificado por contacto pessoal no acto de autuação e daí que lhe foi dirigida notificação, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 50.º do DL n.º 433/82 de 27 de Outubro (RGCO) através de carta registada com aviso de recepção (cfr. fls. 7 dos autos principais).
Se, por qualquer motivo, a carta registada com aviso de recepção for devolvida à entidade remetente, a notificação é reenviada ao notificando, para o seu domicílio ou sede, através de carta simples. – cfr. n.º 5 do art.º 176.º do Código da Estrada. O que igualmente veio a suceder nos autos, ou seja, o aqui opoente foi notificado da decisão proferida a fls. 9 e 10 dos autos principais, através de carta registada com aviso de recepção, sendo que esta veio a ser devolvida (cfr. fls. 12) e daí que depois foi notificado através de carta simples, conforme decorre de fls. 15 dos autos principais.

Mais se refira que, para efeitos destas mencionadas notificações, nas infracções relativas ao exercício da condução ou às disposições que condicionem a admissão do veículo ao trânsito nas vias públicas, considera-se domicílio do notificando o que consta na base de dados da AT como domicílio fiscal. No caso dos autos o que resulta das bases de dados é o que consta de fls. 3, domicilio esse para o qual foram sempre dirigidas todas as notificações supra mencionadas e descritas.

Pelo exposto, ponderando, cumpre sublinhar que, conforme decorre dos autos, o opoente foi devidamente notificado para exercer o seu direito de defesa e, bem assim, da decisão administrativa, pelo que não ocorre qualquer nulidade.

A decisão proferida no âmbito do processo de contra-ordenação supra mencionado foi notificada ao opoente, dela ressaltando expressamente que “a condenação transita em julgado e torna-se exequível se não for judicialmente impugnada nos termos do art.º 59.º do DL 433/82.” - cfr. fls. 10 dos autos principais.

Não obstante tal notificação e advertência, o opoente não interpôs recurso de tal decisão, conformando-se com ela.

Como tal, tal decisão tornou-se definitiva, encontrando-se precludida a possibilidade de reapreciação de tal facto como contra-ordenação, nos termos do já referido art.º 79.º n.º 1.

Como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 08-03-2005, in www.dgsi.pt "Em caso de execução por coima, o trânsito em julgado da decisão da autoridade administrativa preclude a possibilidade de novo conhecimento do facto como contra-ordenação e impede nova discussão em tribunal daquele facto.".

Acresce que tudo quanto o opoente alega não constitui, de modo algum, factos posteriores à decisão administrativa que tenham a virtualidade de extinguir ou modificar a obrigação – artigo 729.º alínea g) do CPC.
Destarte e nos termos do disposto no art.º 732.º, n.º 1, al. b) e c), indefiro liminarmente os presentes embargos de executado.
Custas pelo opoente.
Notifique e registe.»
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3. APRECIAÇÃO DO RECURSO

O recorrente – que viu liminarmente indeferidos os embargos de executado que deduziu – contesta a decisão recorrida que, aplicando as regras do Código da Estrada, considerou que a decisão administrativa que constitui o título executivo lhe foi validamente notificada, tendo transitado em julgado e se tornado exequível por não ter sido impugnada dentro do respetivo prazo legal.
Argumenta que a notificação da decisão administrativa, por força da remissão feita no artigo 41.º do Regime Geral das Contraordenações e Coimas (2) terá de ser feita de acordo com o regime previsto no artigo 113.º do Código de Processo Penal, o que não aconteceu no caso e, como tal, a decisão administrativa não se tornou definitiva, não sendo por isso exequível, o que implica a falta manifesta de título executivo, nos termos do artigo 726.º, n.º 2, al. a) do Código de Processo Civil.

Vejamos.

O título executivo em causa nos autos é uma decisão administrativa que aplicou ao recorrente uma coima pela prática da contraordenação prevista no artigo 22.º do Regulamento das Zonas de Estacionamento de Duração Limitada Controlada por Parcómetros, da Câmara Municipal X.

Sobre as zonas de estacionamento com utilização limitada no tempo ou sujeitas ao pagamento de uma taxa e previsão como contraordenação das respetivas violações, as normas de referência são indubitavelmente os artigos 70.º, n.º 2 e 71.º, n.º 1, al. d) e nº 2 do Código da Estrada, que estabelecem:

(art. 70.º, n.º 2) «Os parques e zonas de estacionamento podem ser afetos a veículos de certas categorias, podendo a sua utilização ser limitada no tempo ou sujeita ao pagamento de uma taxa, nos termos fixados em regulamento.»
(Art. 71, n.º 1, al. d) e nº 2) - Nos parques e zonas de estacionamento é proibido estacionar:

al. d) Por tempo superior ao estabelecido ou sem o pagamento da taxa fixada nos termos do n.º 2 do artigo anterior.
n.º2- Quem infringir o disposto no número anterior é sancionado com coima de:
a) (euro) 30 a (euro) 150, se se tratar do disposto nas alíneas b) e d);»


A competência para o processamento das contraordenações previstas neste artigo 71.º e aplicação das respetivas coimas e sanções acessórias, é atribuída pelo artigo 169.º, nº 7, também do Código da Estrada, «à câmara municipal competente para aprovar a localização do parque ou zona de estacionamento, por designação do membro do Governo responsável pela área da administração interna, mediante proposta da câmara municipal, com parecer favorável da ANSR, desde que reunidas as condições definidas por portaria do membro do Governo responsável pela área da administração interna.» 7º

Por sua vez, concretizando a parte final do disposto no transcrito artigo 70.º, nº 2 do Código da Estrada, encontra-se atualmente em vigor o D.L. n.º 81/2006, de 20 de abril, que aprovou o regime relativo às condições de utilização dos parques e zonas de estacionamento, o qual, no artigo 2º, nº 2 do Anexo a que se refere o seu artigo 1.º, estabelece expressamente que «As condições de utilização e taxas devidas pelo estacionamento são aprovadas por regulamento municipal»

Neste contexto legal, a Assembleia Municipal, sob proposta da Câmara Municipal X, aprovou, no uso dos poderes conferidos pelo artigo 25.º nº 1, alínea g) da Lei nº 75/2013, de 12 de setembro, o Regulamento das Zonas de Estacionamento de Duração Limitada, controladas por parcómetros.

Sendo que, no caso em apreço nos autos, foi apresentado como título executivo precisamente uma decisão administrativa que aplicou ao recorrente uma coima pela prática da contraordenação prevista no artigo 22.º do Regulamento das Zonas de Estacionamento de Duração Limitada Controlada por Parcómetros, da Câmara Municipal X.

Regulamento este que, como decorre da exposição feita, mais não é do que uma concretização sobre as zonas de estacionamento com utilização limitada no tempo ou sujeitas ao pagamento de uma taxa e previsão como contraordenação das respetivas violações, previstas no Código da Estrada.
A contraordenação a que se reporta a decisão administrativa apresentada como título executivo, de natureza estradal, cai assim no âmbito de aplicação do Código da Estrada e por ele é regulada em tudo que não estiver expressamente previsto no aludido DL n.º 81/2006, de 20 de abril e no referido Regulamento Municipal.

O Código da Estrada, no seu Título VIII, dedicado ao Processo, Capítulo I (Competência e forma dos atos) regula expressamente as notificações, prevendo no artigo 176.º, n.º 1 al. b) e n.º 5 a possibilidade de notificação através de carta registada com aviso de receção para o domicílio ou sede do notificando e permitindo, no caso de a carta, por qualquer motivo, ser devolvida à entidade remetente, que a notificação seja reenviada ao notificando através de carta simples.

Ora, emana dos autos e não é sequer impugnado pelo recorrente que, tal como consta da decisão recorrida, «ele foi notificado da decisão proferida a fls. 9 e 10 dos autos principais através de carta registada com aviso de receção, sendo que esta veio a ser devolvida (cfr. fls. 12) e daí que depois foi notificado através de carta simples, conforme decorre de fls. 15 dos autos principais.» Cartas essas sempre remetidas para aquele que comprovadamente consta ser o domicílio fiscal do recorrente, nos termos da al. a) do n.º 6, al. a do mesmo artigo 176.º.

De tudo assim decorrendo que a decisão recorrida, na análise da questão da notificação da decisão administrativa que constituí o título executivo, fez a correta interpretação do regime legal concernente ao caso, aplicando adequadamente a norma do artigo 176.º do Código da Estrada, relativamente às notificações efectuadas no âmbito do respetivo procedimento, que por ser norma especial relativamente ao regime das notificações previsto no RGCO é a aplicável - lex specialis derogat legi generali.

Nenhuma censura nos merecendo pois a decisão recorrida, improcedendo consequentemente o recurso.
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III. DECISÃO

Pelo exposto, acordam as juízas desta secção do Tribunal da Relação de Guimarães, em negar provimento ao recurso.
Vai o recorrente condenado em custas, fixando-se em 4 (quatro) Ucs a taxa de justiça.
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Guimarães, 10 de julho de 2018
(Elaborado e revisto pela relatora)
1. Cfr. artigo 412º, nº 1 do Código de Processo Penal e Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição revista e atualizada, Editorial Verbo, 2000, pág. 335, V.
2. Decreto-Lei nº 433/82, de 27.10, alterado pelos Decretos-Lei nº 244/95, de 14.09 e nº 323/2001, de 17.12, doravante apenas designado por RGCO.