Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2878/18.2T8VNF.G1
Relator: JOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Descritores: ACÇÃO DE DESPEJO
ÓNUS DAS PARTES
EXCEPÇÃO DO PAGAMENTO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/23/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (do relator):

1- Nas ações de despejo com fundamento no não pagamento de rendas, incumbe ao senhorio o ónus da alegação e da prova dos factos integrativos da constituição da dívida dos demandados (arrendatários) perante si (ou seja, dos factos consubstanciadores do contrato de arrendamento e respetivas cláusulas) e, bem assim, o ónus da alegação das rendas vencidas e não pagas pelos demandados com fundamento no que pretende obter a resolução do contrato de arrendamento, incumbindo, por sua vez, ao arrendatário/demandado o ónus da alegação e da prova do pagamento dessas rendas.

2- Numa ação de despejo em que os Autores pedem a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no não pagamento pelos Réus de parte da renda do mês de fevereiro e, bem assim, da totalidade das rendas dos meses de março, abril e maio, confessando a Ré, na contestação, o não pagamento parcial da renda do mês de fevereiro que vem invocado pelos Autores, mas alegando “ser falso” que não tenham sido pagas àqueles as rendas dos meses de março, abril e maio, é de entender que embora de modo deficiente, mas suficiente, à luz do art. 5º, n.º 1 do CPC, a Ré alega os factos integrativos da exceção perentória do pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio, uma vez que em termos sociais e de normalidade, quando alguém acusa outrem que não pagou e este afirma que tal é falso, tal equivale à alegação pelo último que “pagou”, sendo esta igualmente a única ilação a extrair de semelhante defesa apresentada pela Ré à luz do critério interpretativo do art. 236º, n.º 1 do CC.

3- A exceção do pagamento é uma exceção em sentido impróprio, em que o conhecimento da mesma pelo tribunal não depende de manifestação de vontade do interessado a quem essa exceção aproveita para que aquele possa dela conhecer, impondo-se que o tribunal conheça dessa exceção logo que os factos integrativos desta constem dos autos, independentemente desses factos terem sido carreados (alegados) para os mesmos pelos Autores ou pelos Réus.

4- Na vigência do NRAU, na redacção da Lei n.º 31/2012, de 14/08, o não pagamento parcial de uma única renda é auto-suficiente para o preenchimento do exemplo padrão do n.º 3 do art. 1083º do CC, contanto que a mora no pagamento dessa parte da renda perdure no tempo durante dois ou mais meses, conferindo, por isso, ao senhorio o direito a resolver o contrato de arrendamento com esse fundamento.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

(…) e mulher, (…), residentes na Rua (…) B., instauraram a presente ação declarativa, com processo na forma comum, contra (..) residentes na Rua (…) ..., pedindo que:

a- se declare a resolução do contrato de arrendamento urbano celebrado entre Autores e Réus;
b- se condene os Réus a proceder à desocupação do imóvel locado, devendo o mesmo ser entregue aos Autores, livre de pessoas e bens, devendo apenas conter os bens que constam da listagem anexa ao contrato de arrendamento; e
c- se condene os Réus ao pagamento das rendas vencidas e vincendas até efetiva desocupação do locado, acrescidas de juros de mora até efetivo e integral pagamento.

Para tanto alegam, em síntese, serem donos e legítimos proprietários do prédio urbano denominado lote 29, destinado a habitação de rés-do-chão, primeiro e segundo andares, sendo o segundo recuado, com anexo de 7,50 m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 164/..., e inscrito na matriz sob o art. 298º;

Por contrato junto aos autos, celebrado em 05/04/2014, deram de arrendamento aquele prédio aos Réus, com o equipamento e mobiliário constante da lista anexa ao contrato, pelo prazo de cinco anos, com início em 01/05/2014, e mediante a renda mensal de 550,00 euros, vencendo-se cada uma delas até ao dia 8 do mês anterior a que dissesse respeito;

Acontece que os Réus não lhes fizeram o pagamento integral da renda de fevereiro, encontrando-se em dívida 450,00 euros, bem como as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, que se venceram, respetivamente, em 08/01, 08/02, 08/03 e 08/04/2018 (arts. 6º e 7º da p.i.).

Apenas a Ré C. C. contestou, aceitando ter sido celebrado o contrato de arrendamento nos moldes descritos pelos Autores e não terem sido pagos aos últimos os 450,00 euros relativos a parte da renda de fevereiro de 2018;
Alega “ser falso e por isso se impugna especificamente que as rendas relativas aos meses de março abril e maio de 2018 não se encontrem pagas” e que “…devam aos Autores os valores peticionados, com exceção dos 450,00 euros que os Autoras alegaram se encontrar em mora no art. 6º da p.i.”.
Sustenta que “para que fosse decretado o despejo por falta de pagamento de rendas, nos termos do art. 1083º do Código Civil, teria de ocorrer a falta de pagamento de 3 meses de renda, facto esse que não se verifica, nem sequer é alegado pelos Autores”.

Conclui pedindo que se absolva aquela do pedido e se condene os Autores como litigantes de má fé, no pagamento das despesas que tiver com o presente processo, a liquidar a final, sustentando que aqueles intentaram a presente ação cuja falta de fundamento não ignoravam, posto que: “sabiam e sabem que para resolver o contrato de arrendamento teria de ocorrer a falta de pagamento de 3 rendas à data da entrada da sua ação” (art. 9º da contestação); “sabiam que os Réus não lhes deviam 3 meses de renda, pois alegam que os Réus apenas deviam à data da entrada da ação o valor de 450,00 euros referente a parte de uma renda, ou seja, sabiam que os Réus apenas deviam parte de uma renda” (art. 10º da contestação); “no entanto, os Autores apesar de saberem que os Réus apenas deviam parte de uma renda e que a lei (art. 1083º do CC) determinava como fundamento do despejo a falta de pagamento de 3 rendas, deduziram a presente ação” (art. 11º da contestação).

Os Autores responderam mantendo a sua versão dos factos apresentada na p.i., sustentando que, contrariamente ao que alega a Ré na sua contestação, os mesmos alegaram que se encontravam em dívida 3 meses integrais de renda, a que acresce a falta de pagamento de parte de uma outra;

Alegaram que cabendo à Ré a prova do pagamento das rendas cuja falta de pagamento os mesmos acusaram em sede de petição inicial e não tendo aquela junto aos autos qualquer comprovativo do pagamento dessas mesmas rendas, sequer tendo arrolado qualquer testemunha que possa corroborar o pagamento, mas apenas pedindo que fossem recolhidas declarações de parte, concluem que, na sua perspetiva, estão reunidas condições para ser proferido saneador-sentença que conheça de imediato do pedido.

Impugnam que litiguem de má fé.

A Ré veio requerer o desentranhamento dos autos daquela resposta, com fundamento na respetiva inadmissibilidade legal.

Realizou-se audiência prévia, em que frustrada a tentativa de conciliação das partes, fixou-se o valor da ação em 18.600,00 euros, proferiu-se despacho saneador e comunicou-se às partes o propósito do tribunal de conhecer de mérito, pelo que se concedeu a palavra aos respetivos mandatários para se pronunciarem, querendo, sobre as vertentes de facto e de direito da causa, os quais reiteraram os fundamentos de facto e de direito constantes das respetivas peças processuais.

Após proferiu-se saneador-sentença julgando a ação integralmente procedente, que consta da seguinte parte dispositiva:

Pelo exposto, julgo a presente totalmente procedente e, consequentemente, decido:

A) Declarar resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre os autores H. P. e mulher I. M. e os réus J. C. e C. C., outorgado no dia 05 de Abril de 2014 e referente ao prédio urbano denominado de lote n.º 29, destinado a habitação descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 164/... e inscrito na respectiva matriz sob o artigo n.º 298.º;
B) Condenar os réus J. C. e C. C. a restituir aos autores H. P. e mulher I. M. o imóvel referido em A) deste dispositivo, devoluto de pessoas e bens e com os bens móveis referidos na lista anexa ao contrato de arrendamento;
C) Condenar os réus J. C. e C. C. a pagar aos autores H. P. e mulher I. M. a quantia de 2.100,00€ (dois mil e cem euros), referente a parte da renda de Fevereiro e à totalidade das rendas de Março, Abril e Maio de 2018, quantia essa acrescida dos respetivos juros moratórios, à taxa legal de 4%, devidos desde a data de vencimento de cada uma destas rendas até efetivo e integral pagamento;
D) Condenar os réus J. C. e C. C. a pagar aos autores H. P. e mulher I. M. as rendas vencidas e não pagas após a propositura da ação até efetiva entrega do arrendado, acrescidas de juros moratórios, à taxa legal de 4%, contados desde a data de vencimento de cada uma delas, até efetivo e integral pagamento;
E) Absolver os autores H. P. e mulher I. M. do pedido de condenação como litigantes de má-fé, e;
F) Condenar os réus J. C. e C. C. a suportar a totalidade das custas processuais da ação.

Inconformada com o assim decidido, veio a Ré mulher, C. C., apresentar o presente recurso de apelação, em que apresenta as seguintes conclusões:

I- Ocorre erro de julgamento e condenação extra vel ultra petitum quando o tribunal de que se recorre condena os Réus no pagamento de 2.100,00 euros referentes a rendas na quantia de 2.100,00 euros, referente a parte da renda de fevereiro e à totalidade das rendas de março, abril e maio de 2018, quando na verdade, nunca os Autores alegam nem peticionam que os Réus lhes devam as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018.
Sendo a sentença nula por violação do preceituado nos artigos 609º, n.º 1, do Código de Processo Civil e artigo 615º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Civil.
II- Ocorre omissão de pronúncia e falta de fundamentação de facto e de direito quando o tribunal não se pronuncia sobre todas as questões que lhe são dadas a conhecer, nomeadamente quando é alegado pela Ré que as rendas se encontram pagas e o tribunal não se pronuncia sobre esse facto, não ouvindo prova testemunhal nem pedindo a prova documental comprovativa do pagamento das referidas rendas.
Por não o ter feito, o tribunal violou o preceituado no artigo 615º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, devendo a sentença ser considerada nula nos termos das disposições enunciadas.
III- O tribunal quando não dá veracidade da alegação do pagamento do valor de rendas deixou de verificar elementos indispensáveis à apreciação do objeto do litígio, o que determina a nulidade da sentença artigo 636º, n.º 3 do Código de Processo Civil.
Sendo a sentença nula por violação do preceituado nos artigos 609º, n.º 1 do Código de Processo Civil e artigo 615º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Civil.
IV- Quando a sentença condena os Réus em objeto para além do peticionado pelos Autores ocorre uma condenação extra ultra petitum, o que torna também, a sentença nula nos termos dos artigos 609º, n.º 1 do Código de Processo Civil e art. 615º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Civil.
Tal que ocorre quando a sentença condena os Réus nas custas processuais da ação, em ação em que os Autores não peticionem tal pagamento.
Ora, tal condenação em objeto diverso do pedido viola o preceituado no artigo 615º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Civil, e torna também a sentença nula nos termos mencionados.
V- Ocorre omissão de pronúncia da litigância de má fé quando a Ré peticiona a condenação dos Autores como litigantes de má fé, alegando que os Autores sabiam que os Réus não deviam três meses de renda e o tribunal não verifica os elementos de facto indispensáveis à apreciação da alegada litigância de má fé, nomeadamente a prova por depoimento de parte pedida pela Ré.
Tal omissão de pronúncia determina a nulidade da sentença nos termos do preceituado no artigo 636º, n.º 3 do Código de Processo Civil.

Termos em que pelo que se alegou precedentemente e pelos mais que vossas Excelências doutamente suprirão, deve a aliás douta sentença de que se recorre ser declarada nula, por condenação em objeto diverso do pedido e falta de pronúncia sobre a matéria objeto da ação, nos termos do artigo 615º, n.º 1, als. b), d) e e) do Código de Processo Civil”.

Junta em anexo às suas alegações de recurso diversos documentos, mais concretamente, recibos de renda, extraídos do Portal das Finanças.

Os apelados contra-alegaram, pugnando pela improcedência da presente apelação, concluindo as suas contra-alegações nos seguintes termos:

I. A apresentação do presente recurso é apenas uma manobra dilatória que pretende atrasar a entrega do locado aos seus proprietários, bem sabendo a Recorrente que o contrato se encontra resolvido.
II. Invoca, a Recorrente, nulidades que a seu ver enfermam a decisão recorrida.
III. Todavia, tais nulidades não existem.
IV. Primeiro porque o Tribunal a quo decidiu com base nos factos dados por assentes, factos esses que estão devidamente motivados, e com base nesses mesmos factos toma uma posição sobre a matéria de direito aplicável, através de uma análise crítica e fundamentada em doutrina e jurisprudência.
V. Sustenta a Recorrente que existe uma condenação extra vel ultra petitum pois entende que os Autores/Recorridos não alegaram nem peticionaram o pagamento das rendas de março, abril e maio de 2018.
VI. O que bem sabe não ser verdade, tanto mais que impugnou expressamente o não pagamento dessas mesmas rendas.
VII. Rendas essas que estavam vencidas e não pagas, pelo que os Autores/Recorridos peticionaram, entre outros pedidos, o pagamento de todas as rendas vencidas e que se vencerem na pendência da ação.
VIII. E foi nisso mesmo que o Tribunal a quo condenou, entre outros, os Réus.
IX. Pelo que não existe qualquer condenação para além do pedido.
X. Peticiona igualmente outra nulidade de uma condenação extra vul ultra petitum, pois entende que o Tribunal a quo não podia ter condenado os Réus em custas, pelo mesmo não fazer parte do pedido dos Autores.
XI. Contudo, e como é por demais consabido, a condenação em custas resulta de uma imposição legal, pelo que carece de ser peticionada pelos Autores.
XII. Pretende a Ré/Recorrente juntar documentos após o encerramento da discussão em 1ª instância, alegando que os juntaria somente após prolação de despacho saneador ou até ao prazo de 20 dias antes da audiência de discussão e julgamento.
XIII. Sem justificar qual a razão para a sua apresentação só neste momento.
XIV. Documentos esses que estavam em posse do Réu, pelo menos desde o dia 21 de setembro de 2018.
XV. Pelo que esse seria o momento processual oportuno para a sua junção.
XVI. Ou até 20 dias antes da audiência prévia a qual foi agendada com mais de 20 dias de antecedência por despacho o qual indicou que o Tribunal a quo iria conhecer do mérito da questão.
XVII. Com tais documentos pretende, a nosso modesto ver, a Ré/Recorrente provar o pagamento tempestivo das rendas.
XVIII. Sucede, porém, em momento algum da contestação apresentada a Ré/Recorrente alegou que pagou as rendas em causa.
XIX. Antes pelo contrário, apenas impugnou genericamente a alegação dos Autores/Recorridos que essas mesmas rendas não se encontravam pagas.
XX. Ora, na ação de despejo incumbe aos Autores alegarem e provarem a outorga do contrato de arrendamento e as respetivas cláusulas – factos constitutivos do seu direito e invocarem que os inquilinos não procederam ao pagamento das rendas.
XXI. O que os Autores/Recorridos fizeram, com a junção do respetivo contrato de arrendamento (contrato esse que não foi impugnado pela Ré/Recorrente).
XXII. Tendo os Autores alegado que os Réus não pagaram integralmente a renda de fevereiro de 2018, vencida a 08 de janeiro de 2018, tendo apenas procedido ao pagamento de € 100,00 (cem euros) e encontrando-se em dívida o montante de € 450,00 (quatrocentos e cinquenta euros), facto esse que a Ré/Recorrente aceitou e confessou.
XXIII. Como igualmente alegaram que as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, vencidas, respetivamente, em 08 de fevereiro, 08 de março e 08 de abril, não se encontravam pagas.
XXIV. Por seu turno incumbe aos Réus, numa ação de despejo, alegar e provar que as rendas se encontram pagas – por ser um facto extintivo da obrigação e como tal ter o ónus de alegar e provar.
XXV. Sucede, porém, que a Ré/Recorrente, em momento algum alegou que as rendas estavam pagas, pelo que nunca poderia provar, salvo o devido respeito por melhor e mais esclarecida opinião, um facto que não alegou.
XXVI. Por fim, diga-se que os Réus poderiam fazer cessar a mora procedendo ao pagamento das rendas vencidas e não pagas acrescida de uma indemnização correspondente (à data) a 50% dos valores das rendas em dívida, até ao termo do prazo da contestação, o que não fizeram.
XXVII. Pelo que nunca operaram à cessação da mora.
XXVIII. A Ré/Recorrente vem invocar nulidade por falta de fundamento da decisão por não ter analisado os documentos que a Ré/Recorrente tinha (na sua própria cabeça) intenção de juntar aos autos, nem por não ter ouvido a prova testemunhal.
XXIX. Sucede, porém, que a Ré/Recorrente nem juntou documentos, nem indicou prova testemunhal.
XXX. Pelo que não se consegue alcançar qual a nulidade que a Ré/Recorrente vislumbra, muito menos a prevista no art.º 615º, n.º 1 alínea d), porquanto o Tribunal a quo pronunciou-se sobre todas as matérias que devia conhecer, e nada mais.
XXXI. Por fim, vem a Ré/Recorrente invocar que o Tribunal a quo não se pronunciou quanto à condenação dos Autores/Recorridos como litigantes de má-fé, o que faz apenas e só com desprezo sobre o que vem referido na sentença.
XXXII. Com efeito, a sentença prolatada pelo Tribunal a quo é esclarecedora quando sustenta que não existem fundamentos para a condenação como litigante de má fé.
XXXIII. Até porque a ação foi integralmente procedente.
XXXIV. Outrossim, litiga a Ré/Recorrente com má-fé porquanto vem apresentar um recurso que bem sabe não ter qualquer tipo de fundamento e com o intuito único de protelar o trânsito em julgado da decisão da primeira instância.
XXXV. Não se coibindo em sustentar tal recurso em falsidades, alterando a verdade dos factos de modo a tentar justificar o injustificável,
XXXVI. A mentir descaradamente ao invocar a junção de documentos – transferências bancárias – que nunca juntou.
XXXVII. e ao suscitar nulidades que não têm qualquer tipo de fundamento, nem legal nem factual.
XXXVIII. Procurando juntar agora documentos sustentando que apenas teve acesso a eles em momento posterior ao da decisão, mas dos mesmos resulta que estão na sua posse, pelo menos desde o dia 21 de setembro de 2018.
XXXIX. Pelo que se pugna pela condenação da Ré/Recorrente como litigante de má-fé, pois entendem os Autores/Recorrentes que se encontram preenchidos os pressupostos previstos no art.º 542º, devendo a mesma ser condenada como litigante de má-fé em multa e no reembolso das despesas que os Autores tiveram de suportar com honorários do seu mandatário em valor nunca inferior a € 1.500,00 (mil e quinhentos euros).

TERMOS EM QUE:

A. Deve o recurso interposto pela Ré C. C. ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida nos seus exatos termos;
B. Mais deve a Recorrente ser condenada como litigante de má-fé em multa e em indemnização a ser arbitrada a favor dos Autores/Recorridos em montante não inferior a € 1.500,00 (mil e quinhentos euros).

No despacho de admissão do recurso, o tribunal a quo pronunciou-se quanto às nulidades do saneador-sentença recorrido suscitadas pela apelante, concluindo pela respetiva não verificação, nos seguintes termos:

“- CONHECIMENTO DAS NULIDADES ARGUIDAS (art.º 641.º, n.º 1, do CPC)
Nas alegações apresentadas pelos recorrentes, vem invocada nulidade da sentença, referindo-se, em suma, que [a)] a sentença não especificou os fundamentos de facto e de direito em que se alicerçou [art.º 615.º, al. b), do CPC], [b)] a sentença deixou de conhecer de questões de que se devia ter ocupado [art.º 615.º, n.º 1, al. d)] e [c)] a sentença condenou em quantidade superior ao que havia sido pedido [art.º 609.º e 615.º, n.º 1, al. e), do CPC], pugnando os recorridos pela improcedência das nulidades arguidas.
*
Apreciando e decidindo:

1.ª Nulidade: Inexiste qualquer nulidade, uma vez que os fundamentos de facto e a motivação oferecida aos mesmos consta da sentença proferida, bastando ler a mesma para se aquilatar do inverso do arguido;
2.ª Nulidade: Inexiste qualquer nulidade, visto que os meios de prova oferecem-se para demonstração de factos que, oportunamente, foram alegados, o que não sucedeu no caso concreto, visto que os réus nunca alegaram o pagamento (ou outra causa extintiva da obrigação), como, por outro lado, pronunciou-se, ainda que negativamente, acerca da eventual litigância de má-fé dos autores.
3.ª Nulidade: Inexiste qualquer nulidade, visto que o regime inerente à obrigação legal do pagamento de custas processuais está, evidentemente, subtraído ao princípio do pedido no art.º 609.º, do CPC.
Pelo exposto, julgo improcedentes, por indemonstradas, as arguidas nulidades”.
*
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II- FUNDAMENTOS

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.

No seguimento desta orientação as questões submetidas à apreciação desta Relação resumem-se ao seguinte:

a- se a sentença recorrida é nula por condenação extra vel ultra petitum ou em objeto diverso do pedido;
b- se essa sentença é nula por omissão de pronúncia; e
c- se essa sentença é nula por falta de fundamentação.

A essas questões acresce a questão prévia da admissibilidade da junção aos autos dos documentos apresentados pela apelante em anexo às suas alegações de recurso e, bem assim, o da admissibilidade do pedido de condenação da apelante como litigante de má fé formulado pelos apelados.
*
A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A 1ª Instância julgou provados os seguintes factos, os quais não foram impugnados e daí que se tenham, em definitivo, por assentes:

1. Os autores H. P. e mulher I. M. são donos e legítimos possuidores de um prédio urbano denominado de lote n.º 29, destinado a habitação de rés-do-chão, primeiro e segundo andares sendo o segundo recuado, com anexo de 7,50m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 164/... e inscrito na respetiva matriz sob o artigo n.º 298.º;
2. Por acordo reduzido a escrito, datado de 05 de Abril de 2014, os autores proporcionaram aos réus o gozo do imóvel referido em 1), com inclusão do mobiliário e equipamento mencionados no anexo ao contrato;
3. Pelo prazo de 05 anos, renovável por períodos de 01 ano;
4. Contra o pagamento da quantia mensal de 550,00€;
5. A pagar até ao dia 08 do mês anterior àquele a que dissesse respeito;
6. Por conta da renda de Fevereiro de 2018, vencida a 08 de Janeiro de 2018, os réus pagaram a quantia de 100,00€.
*
B- FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

Enunciadas supra as questões que se encontram submetidas à apreciação desta Relação, tendo a apelante junto aos autos, em anexo às suas alegações de recurso, vários recibos, extraídos do Portal das Finanças, destinados a fazer prova do pagamento de rendas que os apelados alegaram, em sede de petição inicial, encontrarem-se em dívida e com base no que peticionam a resolução do contrato de arrendamento celebrado com a apelante e o Réu-marido (bem como, rendas entretanto vencidas), a primeira questão que cumpre apreciar é a da admissibilidade legal dessa junção.

B.1- Junção de documentos pela apelante em anexo às alegações de recurso.

Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 423º do CPC, os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.

A prova documental pode ainda ser junta aos autos até ao 20º dia anterior à da data em que se realize a audiência final, mas neste caso a parte apresentante fica sujeita a multa, exceto se provar que não pôde oferecer o documento com o articulado (n.º 2 do art. 423º do CPC).

Posteriormente ao vigésimo dia que antecede a realização efetiva da audiência final, ainda podem ser juntos aos autos documentos até ao encerramento da discussão em 1ª Instância (1), desde que se verifique alguma das seguintes circunstâncias: a) se a apresentação do documento não foi possível até àquela data-limite, caso em que a junção deve ter lugar logo que isso se torne possível, sem se aguardar qualquer dilação; ou b) se a junção se tiver tornado necessária em consequência de ocorrência posterior.

Precise-se que o enunciada regime, que vigora desde 01/09/2013 (art. 8º da Lei n.º 41/2013, de 26/06, que reviu o atual vigente CPC) é substancialmente distinto daquele que vigorava anteriormente, em que o limite temporal para a apresentação de documentos era o encerramento da discussão em 1ª instância (embora sujeito a multa, exceto se o apresentante provasse que não pôde juntar o documento com o articulado correspondente), o que tinha por efeitos provocar, frequentes vezes, o adiamento da audiência final ou a suspensão dos trabalhos, de modo a assegurar o exercício do contraditório, além de que essa junção em plena audiência final funcionava como elemento de pressão e de perturbação dos depoimentos em curso e fomentava a deslealdade processual, posto que as partes iam libertando documentos, ao longo da audiência final, à medida que a prova ia sendo produzida e das suas conveniências probatórias, com as inerentes perturbações dos depoimentos em curso, prejuízos para a celeridade processual e a deslealdade processual que estava imanente a semelhantes condutas.

Pondo termo a essas práticas, numa manifestação de efetividade do princípio da boa-fé processual e promovendo a celeridade processual, na sequência da revisão ao CPC operada pela Lei n.º 41/2013, de 26/6, estabeleceu-se, como regra, que a partir do vigésimo dia em que se venha a realizar a audiência final, não é admitida a junção aos autos de documentos, por forma a garantir o efetivo contraditório e que a audiência final se realize na data designada para o efeito, sem pressões e/ou incidentes.

Essa regra, como referido, apenas comporta duas exceções: 1º) a impossibilidade da parte de juntar aos autos o documento até ao vigésimo dia que antecede a realização da audiência final; ou 2º) a junção se ter tornado necessária em virtude de ocorrência posterior a esse prazo-limite.

Quanto à primeira exceção - impossibilidade da parte de juntar aos autos o documento até ao vigésimo dia que antecede a realização da audiência final -, essa impossibilidade pode ser:

a) objetiva, isto é, o documento só foi produzido após o decurso daquele prazo-limite e não podia ser antes por respeitar a factos ocorridos historicamente em data posterior a esse prazo-limite; ou
b) subjetiva, isto é, quando a parte só teve conhecimento da existência do documento ou dos factos a que se reporta após o decurso daquele prazo limite, apesar do documento respeitar a factos anteriores ao decurso desse prazo.

Na impossibilidade objetiva, naturalmente que a prova da impossibilidade da parte de juntar aos autos o documento até àquele prazo limite do vigésimo dia que antecede a realização da audiência final decorre da análise do próprio teor do documento – este reporta-se a factos ocorridos após o decurso daquele prazo limite, pelo que naturalmente que apenas podia ser emitido e junto aos autos após o decurso desse prazo.

Já na impossibilidade subjetiva não é assim, na medida em que o documento reporta-se a factos ocorridos anteriormente ao decurso do prazo limite do vigésimo dia que antecede a realização da audiência final, podendo, inclusivamente, o próprio documento ser anterior a esse prazo limite, só que a parte desconhecia a existência do mesmo ou os factos a que se reporta.

Compreende-se, assim, que quanto à impossibilidade subjetiva, à parte que pretenda juntar aos autos o documento após o decurso do prazo limite do vigésimo dia que antecede a realização da audiência legal e até ao encerramento da discussão em 1ª instância, não baste alegar que só teve conhecimento da existência desse documento após o decurso desse prazo, na medida em que essa impossibilidade pressupõe que o desconhecimento da existência do documento em causa ou dos factos a que se reporta não derive de culpa sua, pelo que o apresentante terá de necessariamente alegar e provar factos dos quais derivem que o seu desconhecimento em relação à existência do documento ou dos factos sobre que versa não se ficou a dever a negligência sua (2).

Acresce que, mais uma vez, impõe-se realçar que quer na impossibilidade objetiva, quer na subjetiva, a parte tem de requerer a junção aos autos do documento logo que isso se lhe torne possível, sem aguardar qualquer dilação (3).

Em relação à outra situação excecional em que é admitida a junção aos autos de documento após o decurso daquele prazo limite e até ao encerramento da discussão em 1ª Instância - a junção se ter tornado necessária em virtude de ocorrência posterior –, o elemento legitimador dessa junção tardia assenta na “ocorrência posterior” ao decurso desse prazo limite, isto é, o documento tem de se destinar à prova ou contraprova de factos ocorridos historicamente após o termo desse prazo limite (4).

Após o encerramento da discussão em 1ª Instância, não é admitida a junção aos autos de documentos exceto no caso de recurso.

Com efeito, havendo recurso, os arts. 425º e 651º, n.º 1 do CPC, consentem que sejam juntos aos autos, com as alegações de recurso, documentos em duas situações excecionais: a) a junção do documento não ter sido possível até àquele momento (encerramento da discussão em 1ª Instância), isto é, casos de impossibilidade objetiva ou subjectiva (5) de junção anterior do documento ao encerramento da discussão em 1ª Instância, com o sentido e o alcance acima referidos; ou b) a junção do documento se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido pela 1ª Instância.

A junção de documento em fase de recurso com fundamento em “a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento da 1ª instância” pressupõe que esse julgamento seja de todo surpreendente para as partes relativamente ao que seria expectável em face dos elementos do processo, ou seja, é necessário que a decisão da 1ª Instância se tenha baseado em meio de prova não esperado, designadamente, em meio probatório inesperadamente junto aos autos oficiosamente pelo tribunal ou em preceito jurídico ou interpretação com cuja apreciação as partes não tivessem justificadamente contado (6).

Dito por outras palavras, para que a junção do documento seja permitida na fase de recurso com fundamento no julgamento realizado pela 1ª Instância, não basta que essa junção seja necessária em face desse julgamento, sendo antes essencial que a junção apenas se tenha tornado necessária em virtude do mesmo, isto é, que a decisão proferida pela 1ª Instância se tenha ancorado num elemento de cariz “inovatório” para as partes.

Deste modo, se a junção do documento era necessária para fundamentar a ação ou a defesa antes de ser proferida a decisão da 1ª Instância, e se essa decisão se baseou em meios de prova com que as partes podiam razoavelmente contar, como sejam depoimentos testemunhais ou de parte, declarações de parte, documentos, prova pericial ou por inspeção judicial, respetivamente, arrolados e requeridos pelas partes ou oficiosamente determinadas pelo juiz, mas neste último caso, em momento processual em que ainda era possível às partes carrear para os autos o documento que se propõem juntar em sede de alegações de recurso, ou seja, até ao encerramento da discussão em 1ª Instância, então a junção aos autos do documento com as alegações não ocorre em virtude do julgamento realizado pela 1ª Instância, posto que as partes tiveram oportunidade de controlar a prova produzida em que assentou a decisão da 1ª instância e tiveram, inclusivamente, oportunidade de juntar aos autos o documento que se propõem juntar na fase de recurso.

No entanto, caso a decisão da 1ª Instância se tenha baseado em meio probatório não oferecido pelas partes, mas antes junto aos autos por iniciativa do tribunal, em momento processual em que já não era possível àquelas juntar aos autos o documento que agora se propõem juntar aos mesmos, ou quando essa decisão tenha assentado em regra de direito ou interpretação com cuja aplicação ou interpretação os litigantes justificadamente não podiam contar, então em obediência do princípio do contraditório e da proibição de prolação de decisões surpresa (art. 3º, n.º 3 do CPC), impõe-se admitir a junção aos autos do documento na fase das alegações de recurso, uma vez que, nesses casos, e exclusivamente neles, se pode, com propriedade, afirmar que essa junção se tornou efetivamente necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª Instância (7).

Assentes nestas premissas, no caso, os apelados instauraram a presente ação de despejo contra a apelante e o Réu marido com fundamento no não pagamento parcial da quantia de 450,00 euros relativa à renda do mês de fevereiro de 2018, vencida em 08/01/2018, e a totalidade das rendas dos meses de março, abril e maio do mesmo ano, vencidas, respetivamente, em 08/02, 08/03 e 08/04/2018 (cfr. arts. 6º e 7º da p.i.).

A apelada contestou, aceitando que aquela e o Réu-marido não pagaram a quantia alegada pelos apelantes respeitante à parte da renda do mês de fevereiro de 2018, vencida em 08/01/2018, mas reputou de falso que não lhes tivessem pago as rendas dos meses de março, abril e maio, sustentando expressamente na contestação “ser falso e por isso se impugna especificadamente que as rendas relativas aos esses de março, abril e maio de 2018 não se encontrem pagas” e que “devam aos Autores os valores peticionados, com exceção dos 450,00 euros que os Autores alegam se encontrar em mora no art. 6º da p.i.).

Logo, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 423º do CPC, os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da defesa (caso aquela alegação apresentada pela apelante corresponda à alegação pela mesma da exceção do pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 – matéria esta a tratar infra), deviam ter sido juntos aos autos com a contestação, esta entrada em juízo em 04/09/2018 (cfr. Citius).

Acontece que conforme resulta do teor dos recibos de renda que a apelante apresentou em anexo às suas alegações de recurso e que agora intenta juntar aos autos, os recibos relativos às rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 foram emitidos em 21/09/2018, ou seja, já depois da apresentação da contestação, pelo que ocorre uma situação de impossibilidade objetiva da apelante de juntar aos autos aqueles documentos com a contestação, a qual relembra-se, deu entrada em juízo em 04/09/2018, tratando-se, consequentemente, de recibos de renda que são historicamente posteriores à apresentação desse articulado.

Perante essa impossibilidade objetiva da apelante de juntar aos autos os identificados recibos relativos às rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 com a contestação, a mesma, conforme dito, encontrava-se obrigada a juntar os mesmos tais recibos logo que os obtivesse, sem aguardar qualquer dilação, isto é, no caso, em 21/09/2018, data da respetiva emissão, ou nos dias imediatamente subsequentes a esta data.

Acontece que a apelante não juntou aos autos esses documentos mal os obteve, sequer os juntou na audiência prévia, que teve lugar em 14/01/2019.

Nessa audiência prévia foi proferido o saneador-sentença recorrido, conhecendo do mérito da causa, julgando a ação totalmente procedente.

A procedência da presente ação de despejo, tal como decorre da mera leitura daquele saneador-sentença fundou-se no entendimento sufragado pela 1ª Instância segundo o qual nas ações de despejo com fundamento no não pagamento de rendas, apenas incumbe ao senhorio o ónus de alegar e provar a constituição da obrigação de pagamento, isto é, os termos do contrato de arrendamento celebrado, bem como o ónus de alegar as concretas rendas que se encontram em dívida e em cujo não pagamento aquele funda a sua pretensão de resolução do contrato de arrendamento, cumprindo, por sua vez, ao arrendatário o ónus da alegação e da prova do pagamento dessas rendas e, bem assim, na consideração que, no caso, a apelante (sequer o Réu-marido, que nem sequer contestou) não deu cumprimento a esse ónus alegatório, na medida em que após ter aceite não ter pago aos apelados 450,00 euros relativos a parte da renda do mês de feveriro de 2018, não alegou o pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 (e, consequentemente, jamais o poderá provar – art. 5º, n.º 1 do CPC), limitando-se a impugnar o não pagamento das mesmas rendas que vem alegado pelos apelados (Autores) na petição inicial.

Conforme resulta do que se vem dizendo, abstraindo, por ora, da circunstância de se saber se a defesa apresentada pela apelante, a qual, de facto, na contestação, não alega, pelo menos, de forma expressa, concreta e inequívoca, o pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, impõe-se concluir que a decisão recorrida não apresenta qualquer cariz inovatório para as partes, posto que quer se considere que a defesa apresentada pela apelante, em sede de contestação, tal como foi entendido pela 1ª Instância, tem de ser havida como de mera impugnação, na medida em que esta não alegou expressamente ter pago as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, mas limitou-se a reputar de falso o não pagamento das mesmas invocado pelos apelados na petição inicial, sem que em nenhum momento nesta afirmasse, expressa e inequivocamente, que as pagou àqueles, estando, por via disso, nos termos do disposto no art. 5º, n.º 1 do CPC, impedida de fazer prova do pagamento dessas rendas, por falta de pertinente alegação dos factos essenciais relativos à exceção do cumprimento/pagamento – hipótese esta em que a apelante nem sequer podia juntar aos autos os recibos de renda que agora intenta juntar aos mesmos com a contestação (sequer em qualquer outro momento processual quaisquer, por tais documentos não se destinarem a fazer prova dos fundamentos da defesa, conforme é exigido pelo art. 423º, n.º 1 do CPC) -, quer se considere que a alegação da apelante, na contestação, não se subsume a uma situação de mera impugnação dos factos alegados pelos apelados na petição inicial, mas comporta a alegação (implícita) da exceção do pagamento das rendas relativas aos meses de março, abril e maio de 2018, e se considere que essa alegação implícita da exceção do pagamento ainda cumpre o ónus alegatório do art. 5º, n.º 1 do CPC e que, consequentemente, não existe qualquer óbice processual que impeça que o juiz, na sentença, venha a julgar como facto provado esse pagamento (caso este pagamento se venha naturalmente a apurar, em face da prova que vier a ser produzida) – única hipótese em que, como referido, se pode admitir a junção aos autos dos documentos em causa, por os mesmos, nesta hipótese, se destinarem a fazer prova dos fundamentos da defesa apresentada pela apelante na contestação, mais concretamente, da exceção do cumrpimento -, sempre nestes autos esteve em causa, ab initio, o pagamento ou não pagamento das rendas pela apelante e Réu marido aos apelados (senhorios) dos meses de março, abril e maio de 2018.

Consequentemente, no saneador-sentença proferido pela 1ª Instância, ao considerar-se que era sobre a apelante e o Réu marido que impendia o ónus da alegação e da prova do pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 e que aquela não alegara, sequer a exceção do pagamento dessas rendas, bem como ao julgar-se procedente a ação de despejo com fundamento no não pagamento dessas rendas e, bem assim, dos 450,00 euros correspondente a parte da renda do mês de fevereiro (não pagamento parcial este que a apelante confessou efetivamente não ter pago), a decisão aí proferida não se baseou em qualquer meio de prova inesperado (situação que nem sequer se coloca nos presentes autos, porque a questão foi aí resolvida unicamente com base nas regras dos ónus alegatório e probatório), sequer em preceito jurídico ou interpretação deste com que a apelante não pudesse contar, até porque a interpretação de que nas ações de despejo com fundamento no não pagamento de rendas, ao senhorio apenas incumbe o ónus da alegação e da prova dos factos constitutivos da obrigação de pagamento (factos integrativos do contrato de arrendamento) e o ónus da alegação das rendas não pagas com fundamento no qual instaura a ação de despejo, cumprindo ao arrendatário o ónus da alegação e da prova do pagamento dessas rendas, corresponde àquele que é o entendimento jurisprudencial e doutrinal que julgamos ser maioritário e até consensual.

Resulta do que se vem dizendo que não se descortina fundamento legal para admitir a junção aos autos dos documentos (recibos de renda dos meses de março, abril e maio de 2018) que a apelante junta em anexo às suas alegações de recurso, com base na parte final do art. 651º, n.º 1 do CPC (essa junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª Instância).

A admitir-se que a Ré, na contestação, defendeu-se por exceção alegando, ainda que implicitamente, mas suficientemente à luz do disposto no art. 5º, n.º 1 do CPC, o pagamento aos apelados das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, resta verificar se havia uma situação de situação de impossibilidade objetiva ou subjetiva daquela de juntar aos autos aqueles recibos que agora pretende a eles juntar na audiência prévia em que foi proferido o saneador-sentença recorrido (as outras situações em que o art. 651º ex vi art. 425º do CPC, consentem, a título excecional, a junção de documentos com as alegações de recurso).

Como referido, a audiência prévia em que foi proferido o saneador-sentença recorrido teve lugar em 14/01/2019, enquanto os recibos de renda dos meses de março, abril e maio foram emitidos em 21/09/2018 e, consequentemente, historicamente muito antes da realização da audiência prévia em que foi proferida a decisão recorrida, pelo que inexiste impossibilidade objetiva da apelante de os juntar naquela, por forma que fossem considerados na decisão recorrida.

Igualmente verifica-se que a apelante não alegou, sequer provou, qualquer situação de impossibilidade subjetiva impeditiva de juntar aqueles documentos na audiência prévia.

Com efeito, os recibos de renda dos meses de março, abril e maio de 2018 foram emitidos em 21/09/2018 e, consequentemente, muito antes da realização da audiência prévia em que foi proferido o saneador-sentença recorrido e conforme resulta das alegações de recurso, nelas a apelante limita-se a acusar o tribunal a quo que “não ouviu prova testemunhal nem teve acesso a prova documental comprovativa do pagamento das referidas rendas”, desconsiderando, em absoluto, os fundamentos jurídicos em que assentou a decisão da 1ª Instância, em que considerou que, em sede de contestação, a apelante não alegara a exceção do pagamentos das identificadas rendas, não obstante sobre si impender o ónus da alegação e da prova do pagamento das mesmas, limitando-se a impugnar o não pagamento dessas rendas que vinha alegado pelos apelantes na petição inicial, o que evidentemente, dentro deste entendimento jurídico sufragado pelo tribunal a quo era desnecessária a produção de qualquer prova para que o tribunal pudesse conhecer de mérito, dado que a apelante jamais, por via do disposto no art. 5º, n.º 1 do CPC, podia fazer prova do pagamento das ditas rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 (por falta de alegação da exceção do pertinente pagamento), e desconsiderando, em absoluto, que mesmo que se considere que aquela, na contestação, alegou a exceção do pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, é sobre si que impende o ónus de carrear para os autos a prova desse pretenso pagamento, incluindo da pertinente prova documental (art. 342º, n.º 2 do CC) e não sobre o tribunal, isto sem prejuízo dos poderes de inquisitório que assistem ao último ao abrigo do princípio da verdade material (art. 411º do CPC), sem que esse princípio se destine a substituir os ónus probatórios que impendem sob as partes.

Alega ainda a apelante que aqueles recibos “não se encontravam na sua posse” e que “só posteriormente à data da sentença conseguiu” obtê-los “no wev site da administração tributária”, sem cuidar em alegar (e provar) das concretas razões porque não tinha esses recibos na sua posse e só os veio a obter posteriormente naquele sitio da Internet, quando os mesmos foram emitidos em 21/09/2018 e, consequentemente, a partir dessa data lhe eram acessíveis, podendo, em princípio, a apelante obtê-los, nomeadamente, no sitio da Internet do Portal das Finanças, por forma a juntá-los aos autos logo em 21/09/2018 ou nos dias subsequentes.

Resulta do que se vem dizendo que não ocorre qualquer impossibilidade objetiva impeditiva da apelante juntar aos autos os recibos de renda dos meses de março, abril e maio de 2018 que agora intenta juntar aos mesmos com as suas alegações de recurso em sede de audiência prévia em que a decisão recorrida foi proferida, sequer a mesma não alegou e provou qualquer situação de impossibilidade subjetiva impeditiva dessa junção naquela audiência.

Quanto aos restantes documentos, verifica-se que os mesmos reportam-se a rendas vencidas em fevereiro de 2018 e nos meses anteriores e, bem assim, a rendas relativas aos meses subsequentes a maio de 2018.

Em relação aos documentos da renda do mês de fevereiro de 2018, os apelados alegaram que a apelante e o Réu marido não lhe pagaram 450,00 euros da renda relativa a este mês, o que foi aceite pela apelante e não foi contestado pelo Réu marido (o qual, aliás, relembra-se, nem sequer contestou a presente ação), pelo que essa matéria se tem, em definitivo, como assente nos autos por confissão (da apelante) e admissão do Réu marido.

Consequentemente, os documentos atinentes à renda do mês de fevereiro de 2018 são irrelevantes para o objeto dos presentes autos, na medida em que o não pagamento dos 450,00 euros relativos a esta concreta renda está, em definitivo, assente nos autos.

Já em relação aos documentos atinentes às rendas dos meses anteriores a fevereiro de 2018 e dos meses posteriores a maio de 2018, esses documentos mostram-se irrelevantes para o objeto do litígio, posto que os apelados não peticionam a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no não pagamento das rendas desses meses, sendo que o pagamento das rendas que se venceram na pendência da presente causa (as relativas aos meses subsequentes a maio de 2018, trata-se de eventual pagamento que a apelante e o Réu marido terão de alegar e provar em sede de oposição à execução que os apelados lhe venham eventualmente a instaurar para obter deles o pagamento coercivo do valor dessas rendas).

Aqui chegados, verificando-se não estarem verificados os pressupostos enunciados nos arts. 651, n.º 1 e 425º do CPC, que permite à apelante excecionalmente juntar aos autos documentos com as alegações de recurso, não se admite a junção aos autos dos documentos por ela juntos em anexo às suas alegações de recurso.
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B.2- Da nulidade da sentença – causas de nulidade da sentença versus erro de julgamento.

Sustenta a apelante que o saneador-sentença recorrido é nulo com fundamento em condenação ultra petitum, condenação em objeto diverso do pedido, por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação, bastando, no entanto a mera leitura das suas alegações de recurso para se constatar que a mesma confunde causas de nulidade da sentença com erros de julgamento.

Vejamos.

Como é sabido, as decisões judiciais proferidas pelos tribunais no exercício da sua função jurisdicional podem ser viciadas por duas causa distintas, obstando qualquer delas à sua eficácia ou validade, a saber: a) por se ter errado no julgamento dos factos e do direito, sendo então a respetiva consequência a sua revogação; e b) como atos jurisdicionais que são, por se ter violado as regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou as que balizam o conteúdo e os limites do poder à sombra do qual são decretadas, sendo então passíveis de nulidade, nos termos do art. 615.º do CPC (8).

Os vícios determinativos de nulidade das decisões judiciais encontram-se taxativamente elencados no art. 615º do CPC, e reportam-se a vícios formais da sentença em si mesma considerada, decorrentes de na sua elaboração não terem sido respeitadas as normas processuais que regulam a sua estruturação ou as que balizam os limites da decisão nela proferida, isto é, o campo de cognição do tribunal fixado pelas partes não foi respeitado na sentença, porquanto ficou aquém ou foi além do thema decidendum por elas fixados nos autos ao tribunal.

Deste modo, os vícios determinativos de invalidade da sentença são defeitos de atividade ou de construção da própria sentença em si mesma considerada, isto é, trata-se de vícios formais que afetam a sentença em si, por nela não terem sido respeitadas as normas processuais que regulam a respetiva estruturação, como é o caso da falta de assinatura do juiz – al. a), do n.º 1 do art. 615º do CPC -, os fundamentos enunciados na sua alínea b) - falta de fundamentação - e c) - oposição entre os fundamentos e a decisão -, ou por padecer de vícios relativos aos limites à sombra do qual a sentença é proferida, a que se reportam as alíneas d) - omissão ou excesso de pronúncia – e e) - pronuncia ultra petitum.

Os vícios determinativos da nulidade da sentença são vícios que “afetam formalmente a sentença e provocam a dúvida sobre a sua autenticidade, como é o caso da falta de assinatura do juiz, ou a ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que se decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduzir logicamente a resultado oposto do adotado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de se pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões que deveria conhecer (omissão de pronúncia)” (9).

Diferentemente desses vícios são os erros de julgamento (error in iudicando), os quais contendem com vícios quanto ao julgamento da matéria de facto nela realizado ou do julgamento da decisão de mérito nela proferida, pelo que a sentença proferida padece de uma distorção da realidade factual, por os factos nela julgados como provados ou não provados não terem assento na prova produzida, que antes impunha decisão diversa quanto ao julgamento da matéria de facto nela explanado (error facti), e/ou por se assistir a uma distorção na aplicação do direito, de modo que a decisão de mérito proferida na sentença não está conforme ao direito efetivamente aplicável ao caso, assistindo-se a uma deficiente enunciação e/ou interpretação das normas e dos institutos jurídicos aplicados ao caso (error iuris).

Os erros de julgamento, por já não respeitarem a defeitos que afetam a própria estrutura da sentença ou os limites à sombra dos quais aquela é proferida, mas ao mérito da relação material controvertida nela apreciada, não a inquinam de invalidade, mas antes de error in iudicando, atacáveis em via de recurso (10).

B.2.1- Nulidade da sentença por condenação ultra petitum e por condenação em objeto diverso do pedido.

Como corolário do princípio do dispositivo, dispõe a al. e) do n.º 1 do art. 615º do CPC, que é nula a sentença quando o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

Este comando relaciona-se com o previsto no art. 619º, em que se dispõe que a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir (n.º 1) e que se tiver sido requerida a manutenção em lugar da restituição da posse, ou esta em vez daquela, o juiz conhece do pedido correspondente à situação realmente verificada.

Na verdade se por força do princípio do dispositivo, o processo tem de se iniciar por iniciativa insubstituível do autor, pois só a ele cabe solicitar a tutela jurisdicional, que não pode ser oficiosamente concedida (art. 3º, n.º 1 do CPC), e se o processo se inicia com a apresentação da petição inicial (art. 259º), em que o autor terá de alegar os factos constitutivos da situação que quer fazer valer ou negar, ou integrantes do facto ou cuja existência ou inexistência afirma, os quais constituem a causa de pedir, e onde terá de formular a pretensão de tutela judiciária (pedido) que pretende que o tribunal lhe reconheça com fundamento nessa causa de pedir que invoca, quer o pedido, quer a causa de pedir invocados pelo autor conformam necessariamente o objeto do processo e condicionam o âmbito de cognição dentro do qual o tribunal se pode mover e, consequentemente, a decisão de mérito a ser por ele proferida.

Deste modo, é que o juiz, na sentença, “deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceto aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”; não podendo “ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras” (art. 608º, n.º 2) e “não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir (art. 609º, n.º 3).

Sempre que o tribunal viole aqueles limites do seu poder cognitivo que lhe foram traçados pelas partes, condenando o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido, posterga os limites do poder jurisdicional que lhe está conferido, infringindo o princípio do dispositivo e, noutra vertente, o princípio do contraditório (art. 3º, n.º 3), na medida em que condena a parte contrária (o réu) em pedido em relação ao qual não teve oportunidade de se defender e de influir ativamente para a decisão que acabou por ser proferida, pelo que a sentença é nula (art. 615º, n.º 1, al. e)).

O excesso de condenação em que o tribunal pode incorrer pode ser quantitativa ou qualitativamente diferente daquilo que tinha sido pedido, sendo que, no primeiro caso, verifica-se o vício da condenação “em quantidade superior”, também designado de condenação “extra vel ultra petitum”, enquanto, no segundo, verifica-se o vício da condenação em objeto diverso do pedido.

Verifica-se um caso de condenação “ultra petitum” quando, por exemplo, o autor pede a condenação do réu nas rendas vencidas e o tribunal condena o réu a pagar as rendas vencidas e as vincendas na pendência da causa. Já será caso de condenação em objeto diverso do pedido quando o autor pede a demolição de uma obra e o tribunal decide condenar o réu a tapá-las, ou quando, por exemplo, numa ação o autor revindica a propriedade plena sobre um imóvel e o tribunal absolve o Réu quanto ao reconhecimento do autor como usufrutuário.

Precise-se que o vício da condenação ultra petitum e em objeto diverso do pedido não se confunde com o vício determinativo da nulidade da sentença por excesso de pronúncia a que alude o art. 615º, n.º1, d) do CPC, já que este reporta-se aos fundamentos em que assenta a decisão e não ao pedido.

Deste modo, “se o tribunal condena no pedido, mas utiliza um fundamento que excede os seus poderes de conhecimento, a hipótese cabe na nulidade prevista no art. 668º, n.º 1, al. d), 2ª parte (atual vigente art. 615º, n,º 1, al. d) do CPC); mas se o tribunal, mesmo utilizando os fundamentos admissíveis, condena em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido, o caso inclui-se na previsão do art. 668º, n.º 1, al. e)” - atual vigente art. 615º, n.º 1, al. e) do CPC (11).

No caso, a apelante alega que o saneador-sentença recorrido é nulo por condenação “ultra petitum” ou por condenação em objeto diverso do pedido, sustentando que o tribunal condenou os Réus no pagamento de 2.100,00 euros, referentes a parte da renda de fevereiro e à totalidade das rendas de março, abril e maio de 2018, quantia essa acrescida dos respetivos juros moratórios, à taxa legal de 4%, devidos desde a data de vencimento de cada uma destas rendas, até efetivo e integral pagamento, quando, na verdade, nunca os Autores alegam ou peticionam que os Réus lhes devam as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018.

Alega ainda que “em lado algum os Autores alegam ou dizem que os Réus lhes devam as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, sequer peticionam o pagamento das rendas desses meses, mas peticionam sim que os Réus sejam condenados ao pagamento das rendas vencidas e vincendas até efetiva desocupação do locado, acrescidas de juros de mora até efetivo e integral pagamento, pelo que não entendem como chegou o tribunal ao entendimento que as rendas dos meses de fevereiro, março, abril e maio de 2018 não se encontram pagas “até porque estavam, como se alcança das transferências bancárias que se juntam e pelos recibos de renda obtidos junto da autoridade tributária”.

Conclui que ao condenar os Réus no pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio, o tribunal condenou-os para além do pedido formulado, o que determina a nulidade da sentença nos termos do art. 615º, n.º 1, al. e) do CPC.

Mais sustenta que o tribunal incorreu igualmente no vício da condenação ultra petitum ao condenar os Réus nas custas processuais da ação quando os Autores não o peticionam.

A este propósito apenas nos apraz dizer que a apelante insiste na tese que já havia sufragado na contestação que apresentara, segundo a qual os apelados não teriam alegado, na petição inicial, que aquela e o Réu-marido não lhes teriam pago as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, não obstante essa alegação resultar, expressa e inequivocamente da petição inicial, e dos apelados, inclusivamente, na sequência dessa contestação, tenham respondido alertando-a para o equívoco em que se encontrava, pelo que bem faria a apelante, que se encontra patrocinada por advogado, em vez de insistir nessa sua alegação, em ter o cuidado de ler devidamente a petição inicial antes de suscitar nulidades que manifestamente não se verificam.

Com efeito, nos arts. 2º a 5º da petição inicial (p.i.), os apelados alegam expressamente que: “em 05 de abril de 2014 os Autores celebraram um contrato de arrendamento do imóvel supra identificado, em que figurava como arrendatários os Réus, com início no dia 01 de maio de 2014” (art. 2º da p.i.); que “Tal contrato de arrendamento incluía o equipamento e mobiliário descrito na lista anexa ao contrato e que dele faz parte integrante e que são propriedade dos Autores” (art. 3º da p.i.); “pelo prazo de cinco anos renovável por períodos de um ano” (art. 4º da p.i.); “e mediante a renda anual de 6.600,00 euros, a pagar em duodécimos de 550,00 euros, vencendo-se cada uma delas até ao dia 08 de mês anterior ao que disser respeito (art. 5º da p.i.).

Já no art. 6º do mesmo articulado, os apelados alegam expressamente o seguinte: “Sucede, porém, que os Réus não pagaram aos Autores integralmente a renda de fevereiro de 2018, encontrando-se em dívida o valor de 450,00 euros, as rendas relativas aos meses de março, abril e maio de 2018, que se venceram respetivamente nos dias 08 de janeiro, 08 de fevereiro, 08 de março e 08 de abril de 2018” (sublinhado e destacado nosso) e concluem, no art. 7º, sustentando: “Rendas essas em atraso que perfazem o montante de (450 euros + 550 euros x 3 meses) 2.100 euros”.

Ainda no art. 9º da p.i., os apelados continuam a sua alegação nos seguintes moldes: “Por diversas vezes os Autores solicitaram aos Réus o pagamento das rendas em atraso, mas sem êxito”.

E nos arts. 14º e 15º do mesmo articulado, continuam: “A situação atrás descrita é, por si só, fundamento para a resolução do contrato de arrendamento outorgado com os Réus porquanto os requeridos não pagaram as referidas três rendas, acrescidas dos 450,00 euros referentes o mês de fevereiro de 2018, já vencidas e em atraso, nem efetuaram depósito liberatório, esta situação é por si causa para que aos Autores caiba o direito de resolução do contrato de arrendamento outorgado com os Réus” (destacado e sublinhado nosso).

Na al. C) do pedido, os apelados pedem: “Serem os Réus condenados ao pagamento das rendas vencidas e vincendas até efetiva desocupação do locado, acrescidas de juros de mora até efetivo e integral pagamento”.

Deste modo, é claro, manifesto e indiscutível não só que os apelados alegam que a apelante e o Réu marido não lhe pagaram 450,00 euros correspondente a parte da renda do mês de fevereiro de 2018, como alegam que aqueles não lhe pagaram a totalidade da renda, no montante mensal de 550,00 euros cada, dos meses de março, abril e maio de 2018, o que perfaz um total de 2.100,00 euros, como de resto alegam aqueles no art. 7º da p.i., como pedem expressamente a condenação dos Réus a pagar-lhes as rendas vencidas (isto é, 2100,00 euros, sendo 450,00 euros da renda do mês de fevereiro, vencida em 08/01; 550,00 euros da renda de março, vencida em 08/02; 550,00 euros da renda de abril, vencida em 08/03; e 550,00 euros da renda de maio de 2018, vencida em 08/04, tudo conforme vem por eles alegado na p.i.), e as vincendas até à efetiva desocupação do locado, acrescidas de juros de mora até efetivo e integral pagamento.

Por conseguinte, é indiscutível que a sentença recorrida ao decidir: “C) Condenar os réus J. C. e C. C. a pagar aos autores H. P. e mulher I. M. a quantia de 2.100,00€ (dois mil e cem euros), referente a parte da renda de Fevereiro e à totalidade das rendas de Março, Abril e Maio de 2018, quantia essa acrescida dos respetivos juros moratórios, à taxa legal de 4%, devidos desde a data de vencimento de cada uma destas rendas até efetivo e integral pagamento”, não incorreu em qualquer vício de condenação ultra petitum, sequer em vício de condenação em objeto diverso do pedido, mas antes se ateve àquilo que foi estritamente pedido pelos apelados.
Também não ocorre semelhante vício quando condena os Réus nas custas, não obstante os apelados não terem formulado efetivamente esse pedido.

Na verdade, a condenação em custas decorre dos comandos legais enunciados nos arts. 527º, n.º 1 e 607º, n.º 1 do CPC, que impõem ao juiz, na decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos, a condenação em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito, indicando a proporção da respetiva responsabilidade, não estando, por isso, a condenação em custas sujeita ao princípio do pedido, como bem realçou a 1ª Instância no despacho em que admitiu a presente apelação.

A condenação em custas é uma imposição que decorre da própria lei, não estando, por isso, dependente de qualquer pedido das partes nesse sentido.

Decorre do exposto improceder a pretensa nulidade do saneador-sentença recorrido, por alegada condenação em quantidade ou em objeto diverso do pedido.

Nesta conformidade, sem maiores, por desnecessárias, delongas, julga-se improcedente a pretensa nulidade da sentença recorrida, com fundamento em condenação extra vel ultra petitum e em condenação em objeto diverso do pedido.

B.2.2- Nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

O art. 615º, n.º 1, al. d) do CPC, inquina de nulidade a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que deve apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, referindo-se a primeira parte dessa previsão legal à nulidade por omissão de pronúncia e a segunda à nulidade por excesso de pronúncia.

O vício da nulidade de decisão judicial por omissão ou excesso de pronúncia relaciona-se com o disposto no art. 608º, n.º 2 do CPC, que impõe ao juiz a obrigação de resolver na sentença todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e que lhe veda a possibilidade de conhecer questões não suscitadas pelas partes, salvo se a lei permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

Com efeito, devendo o tribunal conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todas as questões fáctico-jurídicas estruturantes dos pedidos deduzidos pelas partes, de todas as causas de pedir por elas invocadas para ancorar esses pedidos e de todas as exceções invocadas pelas mesmas com vista a impedir, modificar ou extinguir o direito invocado pela sua contraparte e, bem assim, de todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer, o não conhecimento de pontos fáctico-jurídicos estruturante de pedido, causa de pedir ou exceção que lhe tenham sido suscitados pelos pleiteantes e cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão, constitui nulidade por omissão de pronúncia (12), já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica diferentes da sentença, que as partes tenham invocado, uma vez que o juiz não se encontra sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5º, n.º 3 do CPC) (13).

Inversamente, o conhecimento de pedido, causa de pedir ou de exceção não arguidos pelas partes e que não era lícito ao tribunal conhecer oficiosamente, configura nulidade por excesso de pronúncia.

Acresce precisar que como já referia Alberto dos Reis (14), impõe-se distinguir, por um lado, entre “questões” e, por outro, “razões ou argumentos”. “…Uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, outra invocar razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção (…). São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer a questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar as suas pretensões”. Apenas a não pronúncia pelo tribunal quanto a questões que lhe são submetidas determina a nulidade da sentença, mas já não a falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (15).

Deste modo, o julgador não tem que analisar e apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as razões jurídicas invocados pelas partes em defesa das suas posições, mas apenas lhe cabe resolver as questões que por aquelas lhe foram postas. É assim que não se pode falar em omissão de pronúncia quando o tribunal, ao apreciar as questões que lhe foram colocadas não toma em consideração um qualquer argumento alegado pelas partes no sentido da procedência ou improcedência da sua pretensão (pedido) (16).

“Questões”, são os pontos fáctico-jurídicos estruturantes das posições dos pleiteantes atento os pedidos, as causas de pedir e as exceções que deduzem (17), não se confundindo, por isso, com “razões” ou “argumentos”.

Acresce precisar que a jurisprudência é uniforme no sentido de que a nulidade por omissão de pronúncia supõe o silenciar, em absoluto, por parte do tribunal sobre qualquer questão de cognição obrigatória, isto é, que a questão tenha passado totalmente despercebida ao tribunal, já não preenchendo essa concreta nulidade a decisão sintética e escassamente fundamentada a propósito da mesma (18).

Significa isto, que caso o tribunal se pronuncie quanto a todas as questões que lhe foram submetidas pelas partes, isto é, reafirma-se, sobre todas os pontos fáctico-jurídicos estruturantes de todos os pedidos, todas as causas de pedir e todas as exceções que foram por elas suscitadas, ainda que o faça de forma genérica e sintética, não ocorre o vício da nulidade do despacho/sentença ou acórdão por omissão de pronúncia, mas o que poderá existir é um mero erro de julgamento, por o tribunal ter incorrido numa errada enunciação e/ou interpretação dos institutos jurídicos aplicáveis ao caso concreto, erro de julgamento esse atacável em via de recurso, onde, caso assista razão ao recorrente, se impõe alterar o decidido, tornando-o conforme aos factos provados e não provados e/ou ao direito aplicável.

Acresce precisar que igualmente não ocorre o vício da nulidade por omissão de pronúncia quando o tribunal deixe de apreciar determinada “questão”, nomeadamente, determinada exceção, não suscitada pelas partes, mas que era do conhecimento oficioso do tribunal e que este, por sua iniciativa, não apreciou.

Neste caso, a questão não foi submetida pelas partes à apreciação do tribunal, pelo que não ocorre qualquer omissão de pronúncia.

No entanto, sendo essa questão de conhecimento oficioso do tribunal e não tendo este conhecido da mesma, como era seu poder-dever fazer, o que existe é erro de julgamento (19).

Assentes nestas premissas, sustenta a apelante que a sentença é nula por omissão de pronúncia alegando que: “no caso em apreço a Ré C. C. veio alegar que as rendas referentes aos meses de fevereiro, março e abril de 2018 se encontravam pagas. No entanto, o tribunal não ouviu prova testemunhal nem teve acesso a prova documental comprovativa do pagamento das referidas rendas. Na verdade, a Ré não se encontrava na posse dos recibos de renda, mas tais recibos devem ser passados pelos Autores. Na verdade, a Ré apenas tinha em sua posse documentos comprovativos das transferências bancárias efetuadas para a conta dos Autores, documentos esses que poderia e iria juntar aos autos até à data de julgamento, ou após o despacho saneador; documentos esses que se juntam para comprovar o alegado. Mas só posteriormente à data da sentença conseguiu a Ré obter no web site da administração tributária comprovativo dos recibos de pagamento, ou seja a declaração dos Autores como as rendas relativas aos meses de março, abril e maio de 2018 estavam pagas pelos Réus. Ora, o tribunal deveria ter tido o conhecimento de facto de as rendas se encontrava pagas ou não pelos Réus, o que não fez (nenhuma prova se encontra nos autos suficiente para dar como provado ou não provados os factos alegados pelos Autores e Ré) pelo que o tribunal ficou por averiguar o mérito da ação. Por não ter o ter feito o tribunal violou o preceituado no art. 615º, n.º 1, al. d) do CPC, devendo a sentença ser considerada nula”.

Ao assim alegar, é indiscutível que a apelante incorre numa série de faltas de rigor e de equívocos, alguns dos quais já se elucidaram supra e outros que ainda importa esclarecer, designadamente, confundindo fundamentos de nulidade da sentença recorrida por alegada omissão de pronúncia, com questões de direito.

Na verdade, a apelante manifesta falta de rigor quando sustenta que tinha alegado, na contestação, que tinha pago a renda do mês de fevereiro de 2018, quando nela antes aceitou expressamente a alegação dos apelados de que não teria pago 450,00 euros referente a essa renda do mês de fevereiro de 2018.

Depois, a apelante é pouco rigorosa quando afirma que, na contestação, teria alegado expressamente que teria pago as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, quando, como já referido, essa alegação expressa, frontal e inequívoca não ocorre, restando verificar se essa alegação da exceção do pagamento daquelas rendas se encontra aí alegada em termos implícitos e em termos ainda admitidos pelo art. 5º, n.º 1 do CPC quanto ao ónus alegatório que sobre ela impende a propósito dos factos essenciais integrativos dessa exceção.

A apelante incorre numa série de equívocos quanto ao momento processual em que lhe é consentido juntar aos autos documentos, matéria esta que cremos já termos amplamente esclarecido supra.

Aquela apelante incorre numa série de equívocos quando sobre quem impende o ónus de carrear para os autos a prova, designadamente, a documental, a propósito do que também já nos pronunciamos.

Finalmente, a apelante confunde vício determinativo da nulidade do saneador-sentença de que recorre com erros de direito de que eventualmente possa enfermar.

Na verdade, como também já se teve ensejo de explanar, os apelantes instauraram a presente ação, pretendendo que o tribunal declarasse a resolução do contrato de arrendamento celebrado com a apelante e o Réu marido, com fundamento na circunstância destes não lhe terem pago 450,00 euros da renda do mês de fevereiro de 2018, vencida em 08/01/2018, e a totalidade das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, vencidas, respetivamente, em 08/02, 08/03 e 08/04/2018, no montante de 550,00 euros cada uma, e pedindo que, consequentemente, se condenasse os mesmos a despejar o arrendado e a pagar-lhe as rendas vencidas e vincendas até à efetiva desocupação deste, acrescidas de juros de mora, até efetivo e integral pagamento.

Conforme decorre da mera leitura do saneador-sentença recorrido, nele a 1ª Instância pronunciou-se sobre todos os pedidos e sobre todas as questões fáctico-jurídicas estruturantes da causa de pedir alegada pelos apelados para suportarem esses seus pedidos e sobre toda a defesa apresentada pela apelante em sede de contestação.

Considerou a 1ª Instância que, na contestação, a apelante apenas se tinha defendido por impugnação quanto às rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, que os apelados alegavam estarem em dívida e que aceitara que não pagara 450,00 euros, relativos à renda do mês de fevereiro de 2018.

Mais considerou que nas ações de despejo com fundamento no não pagamento de rendas incumbe ao senhorio (apelados) o ónus da alegação e da prova dos factos integrativos da dívida, ou seja, dos factos integrativos do contrato de arrendamento que fora celebrado entre eles, e que a apelante não impugnou a matéria que a este propósito foi alegada pelos apelados na petição inicial (conforme, diga-se, efetivamente, não impugnou) e que, consequentemente, essa matéria, nos termos do disposto no art. 574º, n.º 2 do CPC, se tinha de dar como assente por admissão, o que aqui se subscreve, o que, aliás, a apelante não coloca em crise.

Também se considerou que nas ações de despejo com fundamento no não pagamento de rendas, sobre o senhorio (apelados) apenas impende o ónus da alegação em relação às rendas não pagas e com fundamento nas quais pretende obter a resolução do contrato de arrendamento, cabendo, por sua vez, ao arrendatário (apelante e Réu-marido) o ónus da alegação e da prova do pagamento dessas rendas, o que aqui também se subscreve e perfilha.

Na verdade, constituindo a alegação do pagamento na invocação pelo arrendatário da exceção do cumprimento, os factos essenciais integrativos dessa exceção, nos termos do disposto no art. 5º, n.º 1, do CPC, têm de ser alegados pelo arrendatário na contestação, dado que se destinam a impedir o direito potestativo que o senhorio pretende fazer valer na ação de despejo de obter a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no não pagamento de rendas que alega não terem sido pagas pelos arrendatários que demanda, tratando-se de matéria de exceção, mais concretamente, de uma exceção perentória (art. 576º, n.º 3 do CPC).

Por conseguinte, não só impende sobre a apelante e Réu marido, na qualidade de arrendatários, o ónus de alegação dos factos essenciais integrativos dessa exceção do pagamento/cumprimento na contestação (arts. 5º, n.º 1, 572º, al. c) e 573º do CPC), sob de, posteriormente, não a poder alegar e de o tribunal também não a poder dar como provada, sob pena de incorrer em nulidade por violação dos princípios do dispositivo e do contraditório (arts. 5º, n.º 1, 607º, n.ºs 3 e 4, 608º, n.º 3 e 615º, n.º 1, al. d) do CPC), como esses factos, nos termos do disposto no art. 342º, n.º 2 do CC, têm de ser por eles provados.

Enuncie-se que apesar de algumas hesitações que se fizeram sentir na doutrina e na jurisprudência, sob a questão em análise, há muito que se sedimentou como posição maioritária, quiçá, consensual, aquela que se acaba de explanar e que foi a sufragada (bem) pela 1ª Instância na decisão recorrida.

Na verdade, nas ações de despejo intentadas pelo senhorio com fundamento no não pagamento de rendas, incumbe ao credor, ou seja, ao senhorio, o ónus da alegação e prova da celebração do contrato de arrendamento e respetivas cláusulas – facto constitutivo do seu direito -, a par da invocação (alegação) de que o arrendatário não procedeu ao pagamento da renda e dos valores respetivos, ou que procedeu ao pagamentos parciais, incumbindo, por sua vez, ao último (arrendatário), o ónus da alegação e da prova em como procedeu ao pagamento integral e tempestivo dessas mesmas rendas – facto impeditivo do direito à resolução exercido pelo senhorio -, sob pena de ação de despejo ter de proceder, sem prejuízo do seu direito de purgar a mora em que incorreu nos termos do n.º 3 do art. 1084º do CC (20).

Neste sentido se pronunciam Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, escrevendo que: “relativamente à falta de cumprimento, reconhece-se que, numa aplicação rigorosa dos critérios estabelecidos no art. 342º do Cód. Civil, caberia ao credor provar somente os factos constitutivos do seu direito e ao réu (devedor) provar a realização da prestação, ou seja, o cumprimento da obrigação como facto extintivo do crédito, sempre que o autor, no exercício da ação creditória, se limitasse a requerer (apenas) a realização coativa da prestação. Quando, porém, o credor viesse a requerer, não a realização coativa da prestação debitória, mas a indemnização correspondente ao não cumprimento definitivo da obrigação … ou a resolução do contrato, competir-lhe-ia a ele provar a falta de cumprimento, como elemento constitutivo do direito que se arroga. Mas esta diversidade de soluções soa a falso, na medida em que, numa e noutra das situações, o facto que está em foco, como causa da prestação deduzida pelo autor, é o mesmo: o não cumprimento (presuntivamente culposo) da obrigação. A circunstância de o não cumprimento ser ou não superável pela ação creditória não tira que tão razoável seja, num caso como no outro, impor ao devedor o ónus da prova do cumprimento”, concluindo que “sendo o despejo a pretensão que corresponde à resolução, caducidade ou denúncia do contrato de arrendamento (…), cabe naturalmente ao autor a prova dos factos determinantes de qualquer desses modos de extinção da relação locatícia. Trata-se de factos constitutivos do direito que ele se arroga, quer sejam positivos, quer sejam negativos. E assim sucederia de igual modo com o despejo fundado na falta de pagamento da renda, se outra não fosse, como de facto é, a solução especial resultante da lei… na ação de despejo fundada na falta de pagamento de renda, o réu terá de provar, para obstar ao despejo, quer no caso de arrendamento rural quer no do arrendamento urbano, o pagamento, ou o depósito da renda, em termos variáveis consoante as circunstâncias, mas pressupondo sempre que é ao réu (locatário), que incumbe o ónus da prova do pagamento (ou do depósito) – destaque nosso. (21)

Logo, em ação de despejo com fundamento no não pagamento de rendas, impende sobre o arrendatário, isto é, no caso, sobre a apelante e o Réu-marido (o qual nem sequer contestou), o ónus da alegação e da prova do pagamento das rendas cuja omissão de pagamento vem acusada pelo senhorio (os apelados), sob pena de proceder o direito potestativo à resolução do contrato de arrendamento que por estes vem exercido nos autos, conclusão jurídica esta que também não é contestada pela apelante no presente recurso de apelação.

No saneador-sentença recorrido considerou-se que a apelante, em sede de contestação, não teria invocado os factos integrativos da exceção do pagamento, conforme era seu ónus fazer, sob pena de não poder fazer prova dessa matéria, conclusão jurídica esta que não se pode deixar de subscrever, caso efetivamente se entenda que, naquele articulado, a apelante apenas se limitou, efetivamente, a impugnar o não pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, posição esta que não é aceite pela apelante e, na nossa perspetiva, antecipe-se desde já, com razão.

No entanto, essa razão que se reconhece assistir à apelante em nada contende com a nulidade da sentença recorrida com fundamento em pretensa omissão de pronúncia, mas antes com mero erro de direito, decorrente do facto de terem sido alegados pela apelante, na contestação, factos integrativos da exceção de pagamento, os quais permanecem controvertidos (o pretenso pagamento das rendas pela apelante e/ou pelo Réu marido das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018) por não ter sido produzida prova quanto a esta concreta materialidade fáctica.

Esse erro de julgamento atinente à matéria de facto tem de ser solucionado por recurso ao mecanismo da al. c), do n.º 1 do art. 662º do CPC, que determinará inapelavelmente a anulação, ainda que parcial, do saneador-sentença recorrido com vista a apurar aquela matéria fáctica.

Note-se no entanto, que na perspetiva jurídica do tribunal a quo, a apelante, em sede de contestação, apenas se limitara a impugnar o não pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, pelo que é indiscutível que, nesta perspetiva jurídica, porque aquela não tinha alegado os factos essenciais integrativos da exceção do pagamento dessas rendas, estava impedida de fazer prova desse alegado pagamento por via do disposto no art. 5º, n.º 1, do CPC, pelo que é indiscutível que a sentença recorrida, ao assim entender e ao proferir a sentença recorrida, não incorreu em qualquer vício determinativo da nulidade do saneador-sentença recorrido, posto que conheceu de todos os pedidos e de todas as questões que lhe foram submetidas pelas partes, mas em mero erro de direito ao considerar que, na contestação, a apelante se limitara a impugnar o não pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, quando, em nossa modesto entendimento, aquela alegou, ainda que de forma implícita, a exceção do pagamento dessas rendas, cumprindo de forma deficiente, mas ainda suficiente, o ónus alegatório dos factos essenciais dessa exceção previsto no art. 5º, n.º 1 do CPC.

Vejamos:

Não se coloca em dúvida que nos termos do disposto no art. 5º, n.º 1 do CPC, é sobre a apelante que impende o ónus da alegação dos factos essenciais da exceção do cumprimento/pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 (22).

Também não se questiona que a apelante, na contestação, não alega de forma expressa, clara e inequívoca o pagamento daquelas rendas.

No entanto, a apelante, na contestação, é expressa em alegar “ser falso e por isso se impugna especificadamente que as rendas relativas ao mês de março, abril e maio de 2018 não se encontrem pagas” e sustenta, inclusivamente, que “não devem aos Autores os valores peticionados, com exceção dos 450,00 euros que os Autores alegam se encontrarem em mora no art. 6º da p.i.”.

Mais. A apelante pede a condenação dos apelados como litigantes de má fé e nesse âmbito alega que “para que fosse decretado o despejo por falta de pagamento de rendas, nos termos do art. 1083º do Código Civil, teria de ocorrer a falta de pagamento de 3 meses de renda, facto que não se verifica (…)” e continua essa sua alegação, sustentando que “sabiam os Réus não lhes deviam 3 meses de renda (…), ou seja, sabiam que os Réus apenas deviam parte de uma renda”.

Ora, ao assim alegarem, temos para nós como facto indiscutível que a apelante alegou, pelo menos, de forma implícita, mas suficiente, à luz do art. 5º, n.º 1 do CPC, o pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, tanto assim que alega, por diversas vezes, que das rendas que os apelados acusam, na petição inicial, estarem em dívida – 450,00 euros da renda do mês de fevereiro e a totalidade das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 – apenas está em dívida os 450,00 euros relativos à parte da renda de fevereiro, o que não pode ter outro sentido interpretativo que não seja o de que aquela e o Réu marido pagaram aos apelados as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018.

Note-se que as alegações vertidas nos articulados das partes, assim como as decisões judiciais, designadamente, as sentenças, carecem de ser interpretadas de acordo com o critério interpretativo enunciado no n.º 1 do art. 236º do CC, onde se consagra a denominada teoria da impressão do declaratário, de cariz objetivista, de acordo com a qual, em homenagem aos princípios da proteção da confiança e da segurança do tráfico jurídico, se dá prioridade, em tese geral, ao ponto de vista do declaratário; não ao seu ponto de vista subjetivo, isto é, aquilo que o concreto declaratário realmente compreendeu em face de declaração negocial de que foi destinatário, mas na sua dimensão objetiva, ou seja, aquilo que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, depreenderia ou poderia depreender da declaração.

Dito por outras palavras, o princípio regra vigente em sede de “interpretação das declarações de vontade é este: o sentido decisivo da declaração negocial é aquele que será apreendido por um declaratário normal, ou seja, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratório, em face do comportamento do declarante” (23).

Deste modo, como refere Mota Pinto, (24)” (…) a declaração deve valer com o sentido que um destinatário razoável, colocado na posição concreta do real declaratário lhe atribuiria; considera-se o real declaratário nas condições concretas em que se encontra e tomam-se em conta os elementos que ele conhece efetivamente mais os que uma pessoa razoável, quer dizer, normalmente esclarecida, zelosa e sagaz, teria conhecido e figura-se que ele racionou sobre essas circunstâncias como o teria feito um declaratário razoável”.

Ora, como referido, atendendo ao enunciado critério interpretativo, a alegação da apelante vertida na contestação não pode ter outro sentido interpretativo que não seja o de que esta e/ou o Réu marido pagaram aos apelados as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018.

Acresce precisar que alegando os apelados, na petição inicial, que os Réus não lhe pagaram as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 (para além dos 450,00 euros relativos a parte da renda do mês de fevereiro) e sendo a apelante, na contestação, expressa e frontal em sustentar que tal “é falso”, aceitando apenas como verdadeiro o não pagamento dos 450,00 euros relativos a parte da renda do mês de fevereiro, semelhante alegação não pode ter outro sentido interpretativo que não seja o que pagou as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, até porque, em termos de regras sociais e de normalidade, quando alguém acusa outrem que não pagou e obtém dele por resposta que tal alegação é falsa, tal significa que, segundo a alegação deste, o mesmo pagou.

Acresce ainda salientar que a exceção do pagamento constitui uma exceção em sentido impróprio, pelo que o conhecimento da mesma pelo tribunal não depende da manifestação de vontade do interessado a quem essa exceção aproveita (a apelante e o Réu-marido) para que o tribunal possa e deva dela conhecer, logo que os factos integrativos da mesma constem dos autos, independentemente desses factos terem sido carreados pelos Autores ou pelos Réus (25).

Ora alegando os apelados (Autores), em sede de petição inicial, que os Réus não lhes pagaram as rendas dos meses de março, abril e maio de 2016” e alegando a apelante (Ré-mulher), em sede de contestação, que “tal é falso”, automaticamente, está introduzida nos autos, mediante a alegação dos primeiros, conjugada com a da última, a alegação da matéria fáctica relativa à exceção do pagamento das rendas referentes aos meses de março, abril e maio de 2016.

No entanto, como dito, tudo o quanto se acaba de referir contende única e exclusivamente com o mérito da causa e não com qualquer vício determinativo da nulidade do saneador-sentença recorrido, designadamente, por pretensa omissão de pronúncia, vício esse que indiscutivelmente se não verifica, conforme decorre de tudo o quanto já se explanou.

Termos em que na improcedência deste fundamento de recurso, julga-se improcedente a pretensa nulidade da decisão recorrida por alegada omissão de pronúncia.

B.2.3- Nulidade da sentença por falta de fundamentação.

Sustenta a apelante que a decisão recorrida é nula uma vez que nela o tribunal a quo não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, alegando para tanto basicamente os mesmos argumentos que já se expandira em relação à pretensa nulidade por omissão de pronúncia que também assaca (improcedentemente) à decisão recorrida.

Mais alega que o tribunal não especificou os fundamentos de facto e de direito pelos quais julgou improcedente o pedido de condenação dos apelados como litigantes de má fé.

Preceitua o art. 615º, n.º 1, al. b) do CPC, que a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, ou seja, quando aquela não se encontra fundamentada.

O dever de fundamentação das decisões judiciais é uma decorrência do art. 205º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP).
Densificando esse comando constitucional os arts. 154º, n.º 1 e 615º, n.º 1, al. b) do CPC impõem ao juiz o dever de especificar os fundamentos de facto e de direito em que alicerça a decisão.

Nos termos destes normativos, a fundamentação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade (n.º 2 do art. 154º do CPC).

O dever de fundamentação tem como fundamento teleológico a circunstância de destinando-se a decisão judicial a resolver um conflito de interesses (art. 3º, n.º 1 do CPC), esse conflito só logrará efetiva resolução e alcançar a restauração da paz social se o juiz “passar de convencido a convincente”, o que apenas se conseguirá se aquele, através da fundamentação, convencer “os terceiros da correção da sua decisão” (26).

O dever de fundamentação é ainda fator de legitimação do poder soberano constitucionalmente atribuído aos tribunais para em nome do povo, administrarem a justiça, assegurarem a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos pelos cidadãos, reprimirem a violação da legalidade democrática e dirimirem os conflitos públicos e privados (art. 202º, n.º 1 da CRP), posto que não possuindo os tribunais uma legitimidade direta, mas antes indireta, que lhes advém da constituição, essa legitimidade apenas será assegurada se, através da fundamentação, os tribunais lograrem demonstrar e convencer que as decisões que proferem não são meros atos arbitrários, mas antes a concretização da vontade abstrata da lei aplicada ao caso concreto, contendo-se dentro dos limites constitucionalmente fixados para a atuação do poder judicial e que legitima o poder soberano que lhe é concedido.

A fundamentação é igualmente requisito de salvaguarda dos direitos de ação e de defesa das partes, posto que é através dela que se assegura aos litigantes o conhecimento da razão ou razões do decaimento das suas pretensões, designadamente, a fim de ajuizarem da viabilidade de utilizarem os meios legalmente previstos para sindicar e impugnar essas decisões.

Finalmente, a fundamentação é requisito para que os tribunais superiores possam controlar as decisões dos tribunais inferiores. É que à semelhança do que acontece com as partes, as instâncias superiores carecem de conhecer os concretos fundamentos de facto e de direito em que o tribunal que proferiu a decisão que está a ser sindicada ancorou a mesma a fim de poderem cabalmente reapreciar esses fundamentos e ajuizar do bom ou mau fundamento da decisão recorrida (27).

Deste modo, é que em termos de matéria de facto, se impõe ao juiz a obrigação de, na sentença, discriminar os factos que considera provados e não provados, devendo, de forma clara e especificada, analisar criticamente as provas e expor os fundamentos que foram decisivos para a formação da sua convicção em relação a cada facto (art. 607º, n.ºs 3, 4 e 5 do CPC.), explicitando desse modo, não só a respetiva decisão como, também, quais os motivos que a determinaram.

Em sede de fundamentação da matéria de direito, a lei faz impender sobre o juiz iguais obrigações, impondo-lhe o ónus de, na decisão, identificar as normas e os institutos jurídicos de que se socorreu e a interpretação que deles fez em sede de subsunção jurídica ao caso concreto (n.º 3 daquele art. 607º).

Não obstante a importância angular da fundamentação, de acordo com a doutrina e a jurisprudência, só a falta, em absoluto, de fundamentação determina a nulidade da decisão a que se reporta a al. b) do n.º 1 do art. 615º do CPC, designadamente, a falta de discriminação dos factos provados, ou a genérica referência a toda a prova produzida na fundamentação da decisão de facto, ou conclusivos juízos de direito, e não apenas a mera deficiência da mesma (28).

Deste modo, importa distinguir entre erros de atividade ou de construção da sentença, geradores de nulidade a que se reporta aquele art. 615º, n.º 1, dos erros de julgamento, atacáveis em vias de recurso e não determinativos daquela invalidade.

Como referido, o vício determinativo da nulidade da decisão proferida com fundamento em ausência de fundamentação apenas ocorrerá quando se esteja perante uma absoluta e total ausência de fundamentação. A deficiente fundamentação apenas consubstanciará erro de julgamento de facto e/ou de direito, em que apenas se assiste a uma deficiente análise crítica das provas produzidas ou a uma deficiente enunciação e interpretação dos institutos jurídicos aplicados ao caso concreto.

A deficiente análise crítica da prova ou a deficiente enunciação das normas aplicáveis ou de interpretação daquelas ou saber-se se as mesmas são ou não aplicáveis ao caso concreto ou se a interpretação delas feita está ou não correta, não constitui omissão de fundamentação, determinativa de nulidade da sentença, mas mero erro de julgamento, atacável e sindicável em via de recurso (29).

Acresce que nos casos em que o vício da deficiente fundamentação se coloque ao nível da decisão sobre a matéria de facto, esse vício carece de ser solucionado mediante as regras próprias enunciadas nos n.ºs 1 e 2 do art. 662º do CPC.

Posto isto, como referido, a apelante sustenta que a decisão recorrida é nula porque nela o tribunal a quo não específica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão basicamente com os mesmos argumentos que já supra se expandiram a propósito da pretensa nulidade por omissão de pronúncia, incorrendo novamente em equívoco entre erro de direito e nulidade do saneador-sentença recorrido, agora na vertente da falta de fundamentação.

Ora, a decisão recorrida não padece manifestamente do vício da falta de fundamentação, posto que o saneador-sentença recorrido encontra-se bem estruturado e fundamentado, quer do ponto de vista fáctico, quer do ponto de vista jurídico, estando nele explanados os concretos fundamentos fácticos e jurídicos em que se alicerçou a decisão de mérito nele proferido.

Nesse saneador-sentença, o tribunal a quo, partindo do pressuposto de que a apelante, na contestação, apenas teria deduzido defesa por impugnação, posição esta que, conforme já demonstrado não colhe à luz desta Relação, considerou estarem recolhidos todos os pressupostos que lhe permitiam conhecer de mérito em sede de audiência prévia, posição esta que não se pode deixar de subscrever, caso, em sede de contestação, a apelante se tivesse efetivamente, limitado a impugnar o não pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, o que não é o caso.

No entanto, ao considerar que a apelante, na contestação, apenas se limitara a impugnar o não pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio, quanto esta invocou, ainda que deficientemente, a exceção do pagamento dessas rendas, a 1ª Instância limitou-se a incorrer num mero error in iudicando e não em qualquer causa determinativa da nulidade da sentença recorrida, designadamente, por falta de fundamentação.

Sustenta ainda a apelante que aquela decisão é nula por falta de fundamentação quanto à parte em que se absolve os apelados como litigantes de má fé, posto que nela não se especificam os fundamentos fácticos e jurídicos em que se funda essa improcedência.

Dir-se-á que caso a decisão que se debruça sobre o aspeto específico do pedido de condenação dos apelados como litigantes de má fé pudesse ser vista isoladamente dos restantes fundamentos fácticos e jurídicos explanados e apreciados no saneador-sentença recorrido, poderia existir algum fundamento para a apelante ter invocado esta concreta nulidade, na medida em que o tribunal a quo, nesse saneador-sentença, se limitou a enunciar que “inexistem motivos para condenar os autores como litigantes de má-fé, nos termos dos artigos 542.º e ss, do CPC”.

Acontece que essa decisão não pode ser vista de forma desgarrada dos restantes fundamentos de facto e de direito explanados no saneador-sentença recorrido, em que o tribunal enuncia, de forma cabal, as normas jurídicas aplicáveis ao caso, os ónus alegatórios e probatórios que incumbe a cada parte, a leitura que faz da contestação apresentada pela apelante – mera defesa por impugnação – e conclui pela total procedência da ação e das razões de facto e de direito que suportam essa sua decisão.

Neste contexto, é indesmentível que face aos fundamentos de facto e de direito explanados no saneador-sentença recorrido, não podia a 1ª Instância extrair outra conclusão se não a de que inexistem motivos para se condenar os autores como litigantes de má fé, nos termos do disposto no art. 542º e ss. do CPC, sendo um contra-senso estar-se a obrigar que o tribunal explicitasse, mais uma vez, quais as concretas razões de facto e de direito que suportam essa ilação, quando as mesmas já constam da antecedente motivação que exarou naquela peça.

Deste modo, sem prejuízo de se ir anular a parte desta sentença que conheceu do pedido de condenação dos apelados como litigantes de má fé, em face da necessidade de se produzir prova sobre a exceção do pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, que vem invocada pela apelante na contestação, porquanto, em função da prova que a esse propósito vier a ser produzida e a matéria que, nessa sequência, vier a quedar-se como provada e não provada, daí poderá decorrer terem os apelados (ou a apelante) litigado efetivamente de má fé, improcede a invocada pretensa nulidade da sentença recorrida com este concreto fundamento.

Termos em que se julga improcedente a exceção da nulidade da decisão recorrida por pretensa falta de fundamentação.

B.3- Pedido de condenação da apelante como litigante de má fé.

Os apelados pedem a condenação da apelante como litigante de má fé, sustentando que esta apresenta um recurso que bem sabe não ter qualquer tipo de fundamento e com o intuito único de protelar o trânsito em julgado da decisão da primeira instância, onde não se coíbe em sustentar esse recurso em falsidades, alterando a verdade dos factos de modo a tentar justificar o injustificável, mentindo descaradamente ao invocar a junção de documentos – transferências bancárias – que nunca juntou – e ao suscitar nulidades que não têm qualquer tipo de fundamento, nem legal nem factual, procurando juntar agora documentos, sustentando que apenas teve acesso a eles em momento posterior ao da decisão, mas dos mesmos resulta que estão na sua posse, pelo menos desde o dia 21 de setembro de 2018.

A este propósito diremos que o presente tribunal é de recurso pelo que nele apenas é possível conhecer de questões suscitadas junto da 1ª Instância e sobre o qual esta se debruçou e decidiu, visando o recurso o reexame da matéria apreciada pela 1ª Instância na decisão recorrida.

Logo, os recursos são os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, através dos quais se visa modificar as decisões recorridas e não criar decisões sobre matéria nova (30).

Do que se acaba de dizer deriva que o pedido de condenação da apelante como litigante da má fé deduzido pelos apelados em sede de alegações de recurso, apenas pode assentar no comportamento processual da apelante decorrente desta ter interposto recurso e do comportamento que assumiu na fase de recurso.

Ora, o direito ao recurso é um direito constitucionalmente e processualmente assegurado à apelante, pelo que não é pelo facto desta ter recorrido que se pode concluir que esteja a litigar de má fé.
Quanto à conduta processual adotada pela apelante em sede de recurso, não se nega que esta, em sede de alegações de recurso, incorreu em várias imprecisões (supra já identificadas), suscetíveis de apontarem para uma situação de negligência grosseira.

No entanto, os requisitos da litigância de má fé carecem, em sede de recurso, de ser apreciados com cautelas reforçadas, sob pena de se poder postergar o direito constitucional e processual civil das partes ao recurso.

Assim, sem prejuízo do tribunal a quo, dever apreciar a eventual litigância de má fé que agora os apelados imputam à apelante (a qual é de conhecimento oficioso do tribunal) na sentença final que vai proferir na sequência da anulação que infra se determinará do saneador-sentença recorrido, improcede a pretensão dos apelados.

B.4- Das consequências jurídicas decorrentes do art. 662º, n.º 2, al. a) do CPC.

Contrariamente àquela que foi a posição jurídica assumida pela 1ª Instância, na perspetiva desta Relação, a apelante, em sede de contestação, alegou, ainda que de forma deficiente, ainda assim suficiente, à luz do disposto no art. 5º, n.º 1 do CPC, os factos essenciais integrativos da exceção do pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018.

Neste conspeto, ao abrigo da al. c), n.º 2 do art. 662º do CPC, impõe-se anular o saneador-sentença na parte afetada por aquela matéria (pagamento das rendas pela apelante e/ou pelo réu-marido aos apelados dos meses de março, abril e maio de 2018), que permanece controvertida, por sobre a mesma não ter sido produzida qualquer prova, seguindo-se após realização de audiência de partes, em que se fixe o objeto do litígio e os temas da prova (pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018) e a realização de audiência final tendo em vista a produção de prova a propósito dessa concreta matéria, com a prolação de nova sentença, a qual incidirá, única e exclusivamente, sobre as questões que se impõe agora anular, por estarem dependentes do apuramento daquela concreta matéria fáctica.

Deste modo, urge analisar quais os segmentos decisórios constantes do saneador-sentença recorrido que terão de ser anulados por estarem dependentes dos factos que se vierem a apurar quanto ao pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018.

Neste âmbito, é indiscutível que se impõe anular o segmento do saneador-sentença recorrido constante da alínea E, em que se decidiu “Absolver os autores H. P. e mulher I. M. do pedido de condenação como litigantes de má-fé”, já que em função da prova que vier a ser proferida quanto ao eventual pagamento ou não pagamento pelos Réus das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, caso se venha a apurar que os Réus pagaram àqueles Autores essas rendas, naturalmente que se imporá concluir que estes litigaram de má fé.

Por sua vez, caso se venha a apurar que os Réus não pagaram aos Autores as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, terá de que se concluir que a Ré, ao alegar o pagamento das mesmas, em sede de contestação, litigou de má fé (já se não se provar esse não pagamento, não obstante se imponha condenar os Réus a pagá-las aos Autores, por não prova da pertinente exceção do cumprimento/pagamento, não estarão naturalmente recolhidos os pertinentes factos que permitam concluir pela litigância de má fé da Ré).

Também é indiscutível que se impõe anular parcialmente o segmento decisória da alínea D) do saneador-sentença recorrido, em que se decidiu “D) Condenar os réus J. C. e C. C. a pagar aos autores H. P. e mulher I. M. as rendas vencidas e não pagas após a propositura da ação até efetiva entrega do arrendado, acrescidas de juros moratórios, à taxa legal de 4%, contados desde a data de vencimento de cada uma delas, até efetivo e integral pagamento”, quanto à condenação das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 (matéria esta que permanece controvertida), mantendo-se, no entanto, a condenação dos Réus a pagarem aos Autores, a quantia de 450,00 euros, referente à parte da renda do mês de fevereiro de 2018, vencida em 08/01/2018, acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, a contar a partir de 08/01/2018, até integral e efetivo pagamento.

Na verdade, sendo o contrato de locação aquele pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa, mediante retribuição (art. 1022º do CC.) e sendo o contrato de arrendamento uma das modalidades do contrato de locação, na medida em que se diz “arrendamento” a locação quando versa sobre coisa imóvel (art. 1023º do CC.), resulta desta definição legal que do contrato de arrendamento celebrado em 05/04/2014 entre os Autores e Réus (ponto 2º da matéria apurada), em plena vigência do NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27/02, ao qual é aplicável a sua 6ª versão, introduzida pela Lei n.º 43/2017, de 14/06, por ser a vigente à data em que se venceu, em 01/01/2018, a renda do mês de fevereiro de 2018, que os Réus confessadamente (pela Ré-mulher) não lhe pagaram, decorre a obrigação do senhorio de proporcionar a outrem (o arrendatário), a título temporário, o gozo de um coisa imóvel, mais concretamente, de um prédio urbano, mediante a obrigação deste de lhe pagar uma retribuição – a renda – como contrapartida dessa cedência.

Compreende-se assim que nos termos do disposto no art. 1031º do CC. sejam obrigações principais do senhorio a obrigação de: a) entregar ao arrendatário a coisa arrendada; e b) assegurar-lhe o gozo desta para os fins a que a coisa se destina.

Por sua vez, a primeira e mais elementar obrigação principal do arrendatário consiste na obrigação de pagar a renda ao senhorio (art. 1038º, al. a) do CC).

Resulta do que se vem dizendo que o contrato de arrendamento urbano configura um contrato oneroso, na medida que dele decorrem obrigações para ambas as partes contratantes: o senhorio obriga-se a abdicar do gozo da coisa, enquanto o arrendatário se obriga a pagar a renda, assumindo, consequentemente, ambas as partes sacrifícios económicos equivalentes.

Além de oneroso, o contrato de arrendamento afirma-se, também, como um contrato sinalagmático, posto que a obrigação do senhorio de proporcionar ao arrendatário o gozo da coisa arrendada, tem como correspetivo a obrigação deste de lhe pagar a renda, intercedendo entre ambas essas obrigações um nexo sinalagmático, isto é, de interdependência e correspetividade (31).

Ora, estando apurado nos autos que por via do contrato de arrendamento celebrado entre Autores e Réus estes obrigaram-se a pagar aos primeiros a renda mensal de 550,00 euros, mas que por conta da renda do mês de fevereiro de 2018, vencida a 08/01/2018, os Réus apenas pagaram a quantia de 100,00 euros (cfr. pontos 2 a 6 dos factos apurados), é indiscutível que os Réus incumpriram, em 08/01/2018, o contrato de arrendamento, incumprindo a sua obrigação primeira para com os senhorios (os Autores), que era o de lhes pagaram a renda de 550,00 euros na data do respetivo vencimento.

Destarte, em 08/01/2018, os Réus constituíram-se em mora para com os Autores em relação à quantia de 450,00 euros, relativa à parte da renda não paga do mês de fevereiro de 2018 (arts. 406º, n.º 1, 1022º, 1038º, al. a), 1039º, n.º 1, 804º e 805º, n.º 2, al. a) do CC).
A mora em que os Réus incorreram em relação àquela parte da renda do mês de fevereiro de 2018, no montante de 450,00 euros, confere os Autores, enquanto senhorios, o direito a obterem a condenação judicial dos Réus a pagar-lhes a quantia de 450,00 euros, acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, a partir de 08/01/2018 (data de vencimento desta renda, não integralmente paga), até integral e efetivo pagamento (art. 804º, n.º 1, 806º, n.ºs 1 e 2 e 559º do CC).

É assi, que como dito, se impõe manter a parte decisória da alínea E) do saneador-sentença recorrido, em que o tribunal a quo condenou os réus J. C. e C. C. a pagar aos autores H. P. e mulher I. M., a quantia de 450,00 euros, referente a parte da renda de fevereiro de 2018, acrescida de juros de moratórios, à taxa legal de 4%, devidos desde a data de vencimento (a partir de 08/1/2018) até efetivo e integral pagamento.

Quanto às rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, e ao pedido da apelante de condenação dos Autores/apelados como litigantes de má fé, o conhecimento destes concretos pedidos está dependente da circunstância de se saber se os Réus pagaram ou não essas rendas aos Autores, cujo pagamento foi alegado pela apelante na contestação.

Resta apreciar se os restantes segmentos decisórios do saneador-sentença recorrido vertidos nas alíneas A), B) e D) se podem manter, por não estarem dependentes do apuramento sobre se os Réus pagaram ou não aos Autores as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, dispondo-se já de todos os elementos fácticos que permite ao tribunal, em sede de audiência prévia, conhecer desses concretos pedidos, à luz das várias soluções jurídicas possíveis.

Conforme supra se deixou enunciado, o contrato de arrendamento é um contrato oneroso e sinalagmático em que a obrigação do senhorio de proporcionar ao arrendatário o gozo temporária da coisa, entregando-a e assegurando-lhe o gozo desta para os fins a que se destina (arts. 1022º e 1031º do CC), tem como contrapartida a obrigação do arrendatário de lhe pagar a renda acordada, na data do respetivo vencimento e no local convencionado, sem prejuízo dos critérios supletivos fixados no art. 1039º (arts. 1022º, 1038º e 1039º, n.º 1 do CC).

Como consequência do caráter sinalagmático do contrato de arrendamento decorre, além do mais, que o incumprimento daquelas obrigações principais e, inclusivamente, das acessórias, verificados que sejam os requisitos legalmente estabelecidos para o efeito, conferem o direito à contraparte a resolver o contrato de arrendamento com fundamento em incumprimento.

Assim é que nos termos do n.º 1 do art. 1083º do CC., na redação dada pela Lei n.º 31/2012, de 14/08, ao NRAU, que vigorava em 08/01/2018, data de vencimento da renda de fevereiro de 2018, qualquer das partes pode resolver o contrato, nos termos gerais de direito, com base no incumprimento pela outra parte, acrescentando o seu n.º 2 que “é fundamento de resolução o incumprimento que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, designadamente, quanto à resolução pelo senhorio: a) a violação de regras de higiene, de sossego, de boa vizinhança ou de normas constantes do regulamento do condomínio; b) a utilização do prédio contrária à lei, aos bons costumes ou à ordem pública; c) o uso do prédio para fim diverso daquele a que se destina, ainda que a alteração do uso não implique maior desgaste ou desvalorização do prédio; d) o não uso do locado por mais de um ano, salvo nos casos previstos no n.º 2 do art. 1072; e) a cessão, total ou parcial, temporária ou permanentemente e onerosa ou gratuita, do gozo do prédio, quando ilícita, inválida ou ineficaz perante o senhorio.

Em sede de rendas, o n.º 3 daquele art. 1038º do CC. estatui que “é inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento em caso de mora igual ou superior a dois meses no pagamento da renda” e o n.º 4 que “é ainda inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento no caso de o arrendatário se constituir em mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, num período de 12 meses, com referência a cada contrato”.

Resulta do regime legal acabado de transcrever, que com a entrada em vigor do NRAU, as causas de resolução do contrato de arrendamento deixaram de estar taxativamente enunciadas na lei, como acontecia no regime legal precedente, tendo o legislador optado por consagrar no n.º 2 daquele art. 1083º, um fundamento genérico de resolução do contrato, assente no conceito indeterminado de “justa causa”, entendida esta como “o incumprimento que, pela sua gravidade ou consequência, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento” aplicável a ambos os contraentes (senhorio e arrendatário).

Nas alíneas dos n.ºs 2, 3 e 4 do referido art. 1083º do CC., o legislador recorre à técnica legislativa dos exemplos padrão, que consiste em preencher uma cláusula geral através de uma enumeração de situações que o legislador considera integrarem-se no respectivo núcleo concetual (32), isto é, preenchido o exemplo padrão, verifica-se o incumprimento por parte do arrendatário que, pela sua gravidade e consequências, torna inexigível ao senhorio a manutenção da relação contratual.

No que respeita ao não pagamento de rendas, conforme resulta do n.º 3 do art. 1083º do CC, à data do vencimento da renda devida pelos Réus aos Autores relativa ao mês de fevereiro de 2018, em 08/01/2018, encontrava-se em vigor o NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, que desde a redação da Lei n.º 31/2012, de 14/08, confere ao senhorio o poder potestativo de pedir a resolução do contrato de arrendamento em caso de mora superior a dois meses no pagamento das rendas.

O senhorio pode também pedir a resolução do contrato de arrendamento, nos termos do n.º 4 daquele art. 1083º do CC, nos casos em que o arrendatário se constitua em mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, num período de doze meses.

Em ambos os casos a que aludem os enunciados n.ºs 3 e 4 daquele art. 1083º do CC., fica automaticamente conferido ao senhorio o direito a obter a resolução do contrato de arrendamento, ficando aquele dispensado, com vista a obter essa resolução do contrato de arrendamento, do ónus da alegação e da prova de factualidade demonstrativa em como os incumprimentos em que incorreu o arrendatário, pela sua gravidade ou consequências, torna inexigível a manutenção do contrato de arrendamento, uma vez que a lei presume iuris et de iure (não admitindo, a nosso ver, essa presunção legal prova em contrário), que a mora superior a dois meses no pagamento das rendas ou a mora superior a oito dias, no pagamento de rendas, por mais de quatro vezes, seguida ou interpoladas, num período de doze meses, torna inexigível ao senhorio a manutenção do contrato de arrendamento.

É claro que do regime legal que se acaba de transcrever não emerge que o senhorio tenha que aguardar que se verifique as situações de mora a que aludem aqueles n.ºs 3 e 4 do art. 1083º do CC., com vista a ficar-lhe conferido o direito potestativo a obter a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no não pagamento de rendas.

Com efeito, o não pagamento de uma única renda ou de parte desta pode conferir ao senhorio o direito potestativo à resolução do contrato de arrendamento.

O que acontece é que nas situações de resolução do contrato de arrendamento em que não se verifique a situação de mora a que aludem os enunciados n.ºs 3 ou 4 do art. 1083º, o senhorio, com vista a resolver o contrato de arrendamento com êxito, terá de alegar e provar que fruto do não pagamento da renda, atenta a gravidade ou consequências decorrentes desse inadimplemento em que incorreu o arrendatário, lhe é inexigível a manutenção do contrato de arrendamento, além de que terá de intentar a ação de despejo.

Já verificando-se uma das situações de mora previstas nos n.ºs 3 ou 4 do art. 1083º do CC., a prova por parte do senhorio de uma dessas situações de mora a que aludem estes preceitos legais, dispensa-o da prova dos factos que preencham o conceito da inexigibilidade, considerando a lei que é sempre inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento, além de que embora aquela possa instaurar ação de despejo, não é obrigado a fazê-lo, na medida em que poderá operar a resolução do contrato de arrendamento por simples comunicação dirigida ao arrendatário inadimplente (art. 1084º, n.º 2 do CC) (33).

Precise-se que tal como acontecia no regime legal anterior à entrada em vigor do NRAU, na vigência deste, instaurada ação de despejo por parte do senhorio por falta de pagamento de rendas, o arrendatário pode, nos termos dos n.º 1 do art. 1048º do CC., operar a caducidade do direito potestativo deste a obter a resolução do contrato de arrendamento, pagando ou depositando, até ao termo do prazo de contestação da ação de despejo, as rendas em dívida, acrescidas de 50%, a título de indemnização e, bem assim do valor das rendas que se venceram desde a propositura da ação de despejo até ao termo do prazo de contestação (34), faculdade estas de que a apelante e o Réu-marido não usaram.

No entanto, na vigência do NRAU, o arrendatário apenas pode usar desta faculdade de fazer caducar o direito do senhorio a resolver o contrato de arrendamento mediante o pagamento daquelas rendas e indemnização por uma única vez, com referência a cada contrato de arrendamento (n.º 2 do art. 1048º do CC.), enquanto no regime legal precedente podia fazer sempre uso dessa faculdade sem qualquer limite.

Note-se que contrariamente ao que é alegado pela apelante na sua contestação, o n.º 3 do art. 1083º do CC, não exige como fundamento para o preenchimento do exemplo padrão que estatui, que o arrendatário não pague ao senhorio dois meses de renda, mas o que exige é que o arrendatário se encontre em mora no pagamento da renda, encargos ou.s despesas, por um período igual ou superior a dois meses.

Deste modo, a simples falta de pagamento, ainda que meramente parcial, de uma única renda em que a mora perdure no tempo por dois ou mais meses, será fundamento de resolução do contrato de arrendamento (35), preenchendo o exemplo padrão do n.º 3 do art. 1083º do CC.

Revertendo ao caso presente, os apelados intentaram a presente ação de despejo com fundamento no não pagamento pelos Réus de 450,00 euros relativos à renda do mês de fevereiro de 2018, vencida em 08/01/2018, bem como das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, vencidas, respetivamente, em 08/02, 08/03 e 08/04 do CC.

Quanto ao alegado não pagamento das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018, esta matéria permanece controvertida, isto porque a apelante (Ré-mulher) alegou o pagamento dessas rendas.
No entanto, quanto aos 450,00 euros da renda do mês de favereiro de 2018, vencida em 08/01/2018, provou-se que os Réus não pagaram aqueles 450,00 euros relativos a esta renda (cfr. pontos 4 a 6 dos factos apurados), facto este que é confessado pela própria apelante na sua contestação.

A mora em relação a esta parte da renda do mês de fevereiro de 2018, vencida em 08/01/2018, perdurava, à data da instauração da presente ação, há mais de dois meses, mais concretamente perdurava há já quase cinco meses.

A falta de pagamento da renda é um facto continuado, pelo que enquanto a parte daquela renda do mês de fevereiro de 2018, não for paga pelos Réus aos Autores (apelados), não pagamento parcial de renda esse que, como se referiu, nos termos do disposto no n.º 3 do art. 1083º do CC, confere aos últimos o direito a resolver o contrato de arrendamento celebrado, mantém-se o seu direito a peticionarem a resolução do contrato de arrendamento com fundamento na falta de pagamento parcial da renda desse mês de fevereiro de 2018 (36).

Significa isto, que a anulação da sentença recorrida, tendo em vista o apuramento sobre se a apelante (e/ou o Réu marido) pagaram as rendas aos apelados dos meses de março, abril e maio de 2018, em nada afeta o segmento da parte decisória do saneador-sentença recorrido vertido nas alíneas A), B) e D), em que se decidiu:

A) Declarar resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre os autores H. P. e mulher I. M. e os réus J. C. e C. C., outorgado no dia 05 de Abril de 2014 e referente ao prédio urbano denominado de lote n.º 29, destinado a habitação descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 164/... e inscrito na respectiva matriz sob o artigo n.º 298.º;
B) Condenar os réus J. C. e C. C. a restituir aos autores H. P. e mulher I. M. o imóvel referido em A) deste dispositivo, devoluto de pessoas e bens e com os bens móveis referidos na lista anexa ao contrato de arrendamento;
D) Condenar os réus J. C. e C. C. a pagar aos autores H. P. e mulher I. M. as rendas vencidas e não pagas após a propositura da ação até efetiva entrega do arrendado, acrescidas de juros moratórios, à taxa legal de 4%, contados desde a data de vencimento de cada uma delas, até efetivo e integral pagamento;

Sequer, reafirma-se, a parte decisória da decisão recorrida da alínea C), na parte em que se condena os Réus a pagar aos Autores a quantia de 450,00 euros, referente a parte da renda do mês de fevereiro de 2018, acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde 08/01/2018, até efetivo e integral pagamento.
Quanto a estes segmentos decisórios, improcede a apelação, impondo-se confirmar o saneador-sentença recorrido, conforme resulta do que se vem explanando.
Aqui chegados, impõe-se concluir pela parcial procedência da presente apelação nos termos acima enunciados.
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Decisão:

Nesta conformidade, os juízes desembargadores desta 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, acordam em julgar parcialmente procedente a presente apelação e, em consequência:

I- anulam o saneador-sentença recorrido, única e exclusivamente, quanto aos seguintes segmentos decisórios desse saneador-sentença:

a- alínea E), em que se decidiu “Absolver os autores H. P. e mulher I. M. do pedido de condenação como litigantes de má-fé”;
b- alínea C), na parte em que se decidiu “Condenar os réus J. C. e C. C. a pagar aos autores H. P. e mulher I. M. a quantia de 2.100,00€ (dois mil e cem euros), referente a parte da renda de Fevereiro e à totalidade das rendas de Março, Abril e Maio de 2018, quantia essa acrescida dos respetivos juros moratórios, à taxa legal de 4%, devidos desde a data de vencimento de cada uma destas rendas até efetivo e integral pagamento”, à exceção do segmento constante desta concreta decisão, em que se condena os réus J. C. e C. C. a pagar aos autores H. P. e mulher I. M. a quantia de 450,00€ (quatrocentos e cinquenta euros), referente a parte da renda de fevereiro de 2018, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, a partir de 08/01/2018 até efetivo e integral pagamento, mantendo-se, consequentemente, a condenação dos réus a pagar aos autores os referidos quatrocentos e cinquenta euros, acrescido de juros, à taxa de 4% ao ano, a partir de 08/01/2018 até efetivo e integral pagamento;
c- Em relação aos segmentos do saneador-sentença recorrido ora anulados (alínea E e parte da C) nos termos atrás referidos), ordena-se a convocação pelo tribunal a quo de data para a continuação de audiência prévia, tendo em vista a fixação do objeto do litígio (o qual incidirá, única e exclusivamente, sobre o direito dos Autores a obterem a condenação judicial dos Réus a pagar-lhes as rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 e, bem assim, sobre a litigância de má fé de Autores e Ré-mulher) e os temas da prova (o qual versará única e exclusivamente sobre o pagamento ou não das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018) e tendo em vista as demais finalidades enunciadas no art. 591º, n.º 1, als. f) e g) do CPC, podendo a apelante, querendo, em sede dessa audiência prévia, nos termos do disposto no art. 598º do CPC, juntar aos autos os documentos que juntou em anexo à suas alegações de recurso (cuja junção aqui não foi admitida), sujeitando-se, no entanto, às eventuais sanções a que alude o n.º 2 do art. 423º do CPC, seguindo-se, após realização de audiência final, que incidirá, única e exclusivamente sobre aquele tema de prova (art. 662º, n.ºs 2, als. c) e 3 do CPC), com a prolação de nova sentença final, que terá por objeto, única e exclusivamente, os segmentos do saneador-sentença agora anulados (ou seja, apenas se debruçará sobre o direito dos Autores/apelados a obter a condenação judicial dos Réus a pagar-lhes o montante das rendas dos meses de março, abril e maio de 2018 e a eventual litigância de má fé com que litigam os Autores e a Ré/apelante);
d- no mais, confirma-se o saneador-sentença recorrido.
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Custas por apelante e apelados na proporção do respectivo decaimento, que se fixa em 80% para a apelante e em 20% para os apelados (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC)
Notifique.
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Guimarães, 23 de maio de 2019

Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores:

Dr. José Alberto Moreira Dias (relator)
Dr. António José Saúde Barroca Penha (1º Adjunto)
Dra. Eugénia Maria Marinho da Cunha (2ª Adjunta)


1. Paula Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, vol. I, 2013, Almedina, págs. 340 e 341. No mesmo sentido de que o encerramento da discussão em 1ª Instância é o limite máximo até ao qual o art. 423º, n.º 3 do CPC, consente a junção aos autos de documentos, verificados que estejam os requisitos legais que enuncia, vide Paulo Pimenta, “Processo Civil Declarativo”, 2014, Almedina, pág. 352, nota 829. Ainda Pais de Amaral, “Direito Processual Civil”, 2106, 12ª ed., pág. 320.
2. Acs. STJ. de 13/02/2007, Proc. 06A4496 e RC. de 20/01/2015, Proc. 2996/12.0TBFIG-G1, in base de dados da DGSI.
3. Abílio Neto, “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed., janeiro de 2014, Ediforum, pág. 515.
4. Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, ob. cit., pág. 341.
5. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª ed., Almedina, pág. 229.
6. Acs. STJ., de 18/01/2005, Rec. N.º 3689/04-4ª, Sumários, Jan./2005; 18/04/2006, Proc. 06A844
7. Neste sentido vide Ac. RG.de 19/06/2014, Proc. 36/12.9TBEPS-A.G1, in base de dados da DGSI, onde se lê: “A junção de documentos apenas tornada necessária em virtude do julgamento proferido no tribunal da primeira instância, só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes de proferida a decisão na 1ª instância, por esta se ter baseado em meio probatório não oferecido pelas partes ou em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação os litigantes justificadamente não contavam”. Ainda Ac. STJ. de 26/09/2012, Proc. 174/08.TTVFX.L1.S1: “A possibilidade de junção de documentos com a alegação de recurso de apelação, não se tratando de documento ou facto superveniente, só existe para aqueles casos em que a necessidade de tal junção foi criada, pela primeira vez, pela sentença da primeira instância. A decisão de 1ª instância pode criar, pela primeira vez, tal necessidade quando se tenha baseado em meios probatórios não oferecidos pelas partes, ou quando se tenha fundado em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação os litigantes, justificadamente, não contavam”. Fazendo uma síntese do regime, Ac. RC. de 18/11/2014, Proc. 628/13.9TBGRD.C1, na mesma base de dados, onde se refere: “I- Da articulação lógica entre o art. 651º, n.º 1 do CPC e os arts. 425º e 423º do mesmo Código resulta que a junção de documento na fase de recurso, sendo admitida a título excecional, depende da alegação e prova pelo interessado nessa junção de uma de duas situações: (1) a impossibilidade de apresentação do documento anteriormente ao recurso; (2) ter o julgamento de primeira instância introduzido na ação um elemento de novidade que torne necessária a consideração de prova documental adicional. II. Quanto ao primeiro elemento, a impossibilidade refere-se à superveniência do documento, referida ao momento do julgamento em primeira instância, e pode ser caracterizada como superveniência objetiva ou superveniência subjetiva. III. Objetivamente, só é superveniente o que historicamente ocorreu depois do momento considerado, não abrangendo incidências situadas, relativamente a esse momento, no passado. Subjetivamente, é superveniente o que só foi conhecido posteriormente ao mesmo momento considerado. IV. Neste caso (superveniência subjetiva) é necessário, como requisito de admissão do documento, a justificação de que o conhecimento da situação documentada, ou do documento em si, não obstante o caráter pretérito da situação quanto ao momento considerado, só ocorreu posteriormente a este e por razões que se prefigurem como atendíveis. V. Só são atendíveis razões das quais resulte a impossibilidade daquela pessoa, num quadro de normal diligência referida aos seus interesses, ter tido conhecimento anterior da situação ou ter tido anteriormente conhecimento da existência do documento. VI. Quanto ao segundo elemento referido em I deste sumário, o caso indicado no trecho final do art. 651º, n.º 1 do CPC (a junção do documento ter-se tornado necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância), pressupõe a novidade da questão decisória justificativa da junção do documento com o recurso, como questão operante (apta a modificar o julgamento) só revelada pela decisão recorrida, o que exclui que essa decisão se tenha limitado a considerar o que o processo já desde o início revelava ser o thema decidendum”.
8. Ac. STA. de 09/07/2014, Proc.00858/14, in base de dados da DGSI.
9. Abílio Neto, in “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed., janeiro/2014, pág. 734.
10. Ac. STJ. 08/03/2001, Proc. 00A3277, in base de dados da DGSI.
11. Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, pág. 223.
12. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2º, 3ª ed., Almedina, pág.737.
13. Neste sentido Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado, 5º vol., págs. 142 e 143, onde pondera: “Esta nulidade está em correspondência direta com o 1º período da 2ª alínea do art. 660º. Impõe-se aí ao juiz o dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras” e onde aponta como exemplo de nulidade por omissão de pronúncia, o seguinte caso retirado da prática judiciária: “Deduzidos embargos a posse judicial com o fundamente de posse baseada em usufruto, se o embargado alegar que este não podia produzir efeitos em relação a ele por não estar registado à data em que adquiriu o prédio e a sentença ou acórdão deixar de conhecer desta questão, verifica-se a nulidade (…). O embargado baseara a sua defesa na falta de registo do usufruto; pusera, portanto, ao tribunal esta questão de direito: se a falta de registo do usufruto tinha como consequência a ineficácia, quanto a ele, da posse do usufrutuário, o tribunal estava obrigado, pelo art. 660º, a apreciar e decidir esta questão; desde que a não decidiu, a sentença era nula”. Ac. RC. de 22/07/2010, Proc. 202/08.1TBACN-B.C1, in base de dados da DGSI: “…O juiz deve, antes de tudo, tomar em consideração as conclusões expressas nos articulados, já que a função específica destes é a de fornecer a delimitação nítida da controvérsia. Mas não só; é necessário atender, também aos fundamentos em que essas conclusões assentam, ou, dito de outro modo, às razões e causas de pedir invocadas (…). Em última análise, questão será, pois, tudo o que respeite ao litígio existente entre as partes, no quadro, tanto do pedido e da causa de pedir, como no da defesa por exceção”.
14. Alberto dos Reis, in ob. cit., 5º vol., págs. 55 e 143.
15. No mesmo sentido Ferreira de Almeida, “Direito de Processo Civil”, vol. II, Almedina, 2015, pág. 371, em que reafirma que “questões” são todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas, integrando “esta causa de nulidade a omissão do conhecimento (total ou parcial) do pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão (não a fundamentação jurídica adrede invocada por qualquer das partes). Não confundir, porém, questões com razões, argumentos ou motivos invocados pelas partes para sustentarem e fazerem vigar as suas posições (jurídico processuais); sí a omissão da abordagem de um qualquer questão temática central integra vício invalidante da sentença, que não a falta de consideração de qualquer elemento de retórica argumentativa produzida pelas partes”.
16. Ac. STJ. de 16/02/2005, Proc. 05S2137, base de dados da DGSI.
17. Acs. STJ. de 21/12/2005, Proc. 05B2287, in base de dados da DGSI.
18. Acs. STJ. de 01/03/2007. Proc. 07A091; 14/11/2006, Proc. 06A1986; 20/06/2006, Proc. 06A1443,in base de dados da DGSI. Em sentido contrário, Teixeira de Sousa, ob. cit., pág. 220, onde escreve que “Também a falta de apreciação de matéria de conhecimento oficioso constitui uma omissão de pronúncia”.
19. Ac. STJ. de 20/03/2014, Proc. 1052/08.0TVPRT.P1.S1, in base de dados da DGSI, onde se lê: “Não se verifica a nulidade de uma decisão judicial – que se afere pelo disposto no art. 615º (sentença) e 666º (acórdão) – quando esta não aprecia uma questão de conhecimento oficioso que lhe não foi colocada e que o tribunal, por sua iniciativa, não suscitou”. No mesmo sentido Ac. TCAS de 28/09/2017, Proc. 1418/17.5TBELRS, na mesma base de dados, que consta do seguinte: “Também não constitui nulidade da sentença, a não apreciação de questões não suscitadas pelas partes, mas sim erro de julgamento.
20. Acs. STJ. de 08/05/2008, Proc. 08B1182; RL. de 13/07/2016, Proc. 12390/15.0T8LSB.L1-2; 24/06/2014, Proc. 2218/09.1TCLRS.L1-1; 29/11/2012, Proc. 2136/09.3TBPDL.L1-2; 12/07/2011, Proc. 1806/04.7TBPBL.C1; RL. de 04/10/2007, Proc. 5406/2007.8; R.C. de 12/0772011, Proc. 1806.4TBPL.C1, todos in base de dados da DGSI.
21. “Manual de Processo Civil”, 2º ed., págs.462 a 464.
22. ão “essenciais” aqueles que integram, a causa de pedir ou o fundamento da exceção e cuja falta determina a inviabilidade da ação ou da exceção – Teixeira de Sousa, pág. 70.
23. Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, vol. I, 3ª ed., Coimbra Editora, pág. 223.
24. Carlos Mota Pinto, in “Teoria Geral Do Direito Civil”, 3ª ed., Coimbra Editora, pág. 447.
25. Neste sentido, Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., Coimbra Editora,1985, págs. 293 a 296, onde se lê que são “exceções em sentido próprio aquelas cuja relevância jurídica depende da vontade do demandado. São factos que só relevam, como no caso da prescrição (art. 303º do CC) ou na generalidade dos casos de incompetência relativa, ope excetionis, ou seja, por vontade do excipiens”. Já “as exceções em sentido impróprio são factos cuja eficácia opera ipso iure. O juiz pode e deve conhecer delas ex officio, independentemente da vontade da parte a quem aproveitam, sem prejuízo do disposto no art. 664º” (atual art. 5º, n.º 1 do CPC), esclarecendo que nas exceções impróprio “como o pagamento, a perda da coisa devida, a remissão, a simulação, bem como a generalidade das exceções processuais, das quais o juiz conhece ex officio (…) desde que os factos que lhe servem de base constem dos autos, ainda que não seja por iniciativa do réu (mas por declaração do autor ou dos co-réus), o juiz não pode deixar de as tomar em conta (sob pena de, conscientemente, ou inadvertida mas culposamente, proferir sentença injusta)”. No mesmo sentido José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, 3ª ed., Almedina, págs.587 e 588.
26. Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, 1997, pág. 348.
27. Lebre de Freitas, “A Ação Declarativa Comum à Luz do Código de Processo Civil de 2013”, 3ª ed., Coimbra Editora, pág. 332.
28. Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, Almedina, pág. 370; Lebre de Freitas, in ob. cit., pág. 332; Abílio Neto, in “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed., Janeiro de 2014; pág. 736; e a título exemplificativo, Acs. STJ. de 14/11/2006, Proc.06A1986; de 17/04/2017, Proc. 07B418; R.C. de 16/10/2012, Proc. 127963/11.1YIPRT.C1; RE. de 03/07/2014, Proc. 569/13.0TTFAR.E1; RG. de 14/05/2015, Proc. 853/13.2TBGMR.G1, todos in base de dados da DGSI.
29. Ac. STJ. 08/03/2001, Proc. 00A3277, in base de dados da DGSI.
30. Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. III, 2015, Almedina, pág. 395.
31. Menezes Leitão, in “Arrendamento Urbano”, 2014, 7ª ed., pág. 48.
32. Menezes Leitão, ob. cit., págs. 118 e 119.
33. Neste sentido vide Ac. STJ. de 17/02/2011, Proc. 522/08.57TVRT.S1, in base de dados da DGSI, onde se lê: “… a resolução do arrendamento é ainda admissível para falta de pagamento de uma ou mais rendas em que não se verifique o tempo de mora previsto naquele n.º 3, forçoso é que resulte provada factualidade integradora do conceito indeterminado da inexigibilidade previsto no n.º 2 do mencionado preceito. Ou seja, enquanto a mora prevista no n.º 3 dispensa a prova de factos que preencham o conceito de inexigibilidade, a falta de pagamento de renda em que se não se verifique aquele incumprimento pela sua gravidade ou consequências torne inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento”. No mesmo sentido, vide Januário da Costa Gomes e Cláudia Madaleno, in “Leis do Arrendamento Urbano Anotada”, Coordenação de António Menezes Cordeiro, 2014, Almedina, pág. 240 – “A mora de dois meses, na renda, é auto-suficiente, enquanto fundamento de despejo. A lei proclama, perante a sua eventualidade, inexigível a manutenção do arrendamento. Não há lugar a uma autónoma ponderação sobre a sua gravidade ou as suas consequências. Em situações limite apenas é possível o controlo do abuso do direito”.
34. Ac. R.P. de 08/05/2017, Proc. 3542/15.0T8GDM.P1, in base de dados da DGSI.
35. Pinto Furtado, “Manuel do Arrendamento Urbano”, vol. II, 5ª ed., Almedina, pág.1064. Acs. RP. de 18/02/2019, Proc. 1668/17.4T8PVZ.P1; RL.11/12/2018, Proc. 15197/15.7T8LSB-8; 13/07/2018, Proc. 12399/15.0T8LSB.L1-2, todos in base de dados da DGSI.
36. Menezes Leitão, “Arrendamento Urbano”, 2014, 7ª ed., Almedina, pág. 131.