Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6095/15T8BRG.G1
Relator: PEDRO DAMIÃO E CUNHA
Descritores: RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO
PRINCÍPIO DA IMEDIAÇÃO
PODERES DA RELAÇÃO
ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/14/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. Mantendo-se em vigor, em sede de Recurso, os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta, o uso, pelo Tribunal da Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser efectuado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados.
II: Assim, a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação, quando este Tribunal, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência final, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa, e delimitaram uma conclusão diferente daquela que vingou na primeira Instância.
Decisão Texto Integral:

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

Recorrente(s):- António Augusto Ferreira;
Recorrido(a)(s): - Deolinda Rosa Peixoto Monteiro;

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O Autor AA veio intentar a presente acção declarativa, em processo comum, contra BB, pedindo que seja declarada a anulação do casamento civil celebrado entre A. e R., a 31-12-2013, com fundamento no erro que viciou a vontade do Autor.
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A Ré foi citada pessoalmente e contestou pedindo a improcedência da acção.
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O Autor foi convidado a aperfeiçoar a sua p.i., o que fez em articulado em relação ao qual a Ré nada disse.
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Prosseguiram os autos, com a fase de saneamento do processo, onde foi dispensada a realização da Audiência prévia e se definiu o objecto do litígio e bem assim os temas de prova.
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Realizou-se, de seguida, a Audiência Final, com obediência aos trâmites processuais.
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Na sequência, foi proferida a seguinte sentença:
3 – DECISÃO
Por estas razões de facto e de direito, decide-se julgar a acção improcedente e em conformidade:
A - Absolve-se a Ré do pedido;”
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É justamente desta decisão que o Autor/Recorrente veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“CONCLUSÕES:
A - Por sentença proferida pelo Tribunal recorrido foi decidido o seguinte: “A- Absolve-se a Ré do pedido; B- Condena-se o Autor no pagamento das custas devidas pela acção (cf. Artigo 527º, do Código de Processo Civil);
B - O recorrente não se conforma com tal decisão entendendo que os factos considerados não provados foram mal julgados face à prova produzida, e que ditaria decisão contrária.
C - Além disso, e antes de mais, a douta sentença padece de nulidade, que expressamente se invoca para todos os efeitos legais, por várias razões: de na fundamentação da sentença, o juiz deve declarar quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e, entre o mais, especificando os fundamentos, decisivos, para a sua convicção - art. 607.º, n.º 4, do CPC.
D - A decisão sobre a matéria de facto é um elemento integrante da sentença e o dever de fundamentação das decisões judiciais está consagrado no art. 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, e ainda no art. 154.º, n.º 1, do CPC.
E - No caso da douta sentença recorrida verifica-se que a decisão sobre a matéria de facto, compreendida na sentença recorrida, limitou-se a enumerar os factos provados e não provados sem fazer referência a que concreta prova lançou mão para considerar cada facto como provado ou não, fazendo apenas uma enunciação genérica.
F - Todavia, este modo de proceder não corresponde à satisfação da exigência estabelecida na lei para efeitos de segurança jurídica, nomeadamente, para os efeitos previstos no art. 662.º, n.º 2, alínea c), do CPC.
G - A pouca fundamentação da decisão é genérica, sem especificação da prova documental e testemunhal concreta para a decisão de cada facto provado ou não provado.
H - A fundamentação da matéria de facto deve indicar, de forma clara, os concretos meios de prova que determinaram a decisão, positiva ou negativa, para, assim, dar adequado cumprimento à formalidade legal consagrada no art. 607.º, n.º 4, do CPC, sob pena de nulidade e cometeu-se uma nulidade processual prevista no art. 195.º, n.º 1, do CPC. Veja-se a este propósito o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa datado de 29-10-2015, disponível em dgsi.pt
I - Além do supra exposto entende o recorrente a douta sentença recorrida é nula porque – artigo 615 n.º1 b) e d) do CPC porque não especificou os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão e conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento.
J - A decisão em crise ao referir “Absolve-se a Ré do pedido” está a ir mais além do que aquilo que na realidade o recorrente peticionou que foi “ser declarada a anulação do casamento…”.
K - Veja-se a este propósito o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa datado de 09-07-2014, disponível em dgsi.pt onde se pode ler “A nulidade referida no artº 615º nº 1, al. d) do Código de Processo Civil ocorre quando o Juiz, na Sentença, não resolve todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Além disso, o Juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.”
L - Além disso a douta decisão carece de explicação sobre os factos, nomeadamente, sobre a prova concreta na qual a decisão foi sustentada e ainda carece de fundamentação de direito, a qual é praticamente inexistente violando os artigos 205º, n.º1 da CRP, artigo 158º e 607º, n.º 3 do C.P.C.
M - Por tudo supra exposto se conclui, também quanto a isto, pela nulidade da douta sentença recorrida e que expressamente se invoca para todos os efeitos legais.
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ERRO NA APRECIAÇÃO DA PROVA E NA FIXAÇÃO DOS FACTOS
N - O tribunal deu como não provado os factos de 1 a 85 constantes da douta sentença e que aqui se dão por integralmente reproduzidos por uma questão de economia processual, e que o recorrente entende que foram incorrectamente julgados atenta a prova produzida.
O - Dos depoimentos das testemunhas Margarida, Manuel, José e Queiroz deveria ter dado como provado que “Fruto do choque emocional que sofrera, o A. após a viuvez, começou a padecer de distúrbios comportamentais e emocionais, manifestados, por exemplo, em crises de choro constantes e súbitas.” Pois todas elas referiram o estado frágil e débil emocionalmente em que ficou o recorrente após ficar viúvo do primeiro casamento, como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso.
P - Além disso, do depoimento da testemunha Queiroz, na passagem da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso, que referiu a forma como antes do casamento a recorrida fazia tudo para agradar e iludir o recorrente para casar, deveriam ter sido dados como provados os seguintes factos:
“8. A R., aproveitando da fragilidade psicológica e bem assim emocional do Autor, inicia manobras de ilusão, iludiu-o com falsas expectativas.
9. Ora, em virtude dessas manobras, o A. aceitou casar com a R.
Q - Quanto à parte mais emotiva e à relação propriamente dita enquanto marido e mulher ficou provado, pelo depoimento das testemunhas Manuel, Queiroz, Margarida, José, Maria como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso, que entre o recorrente e a recorrida nunca se consomou qualquer acto sexual nem tão – pouco qualquer acto de manifestação de carinho, muito pelo contrário.
R - Estas testemunhas relataram sem qualquer margem de dúvida a falta de afectos entre o casal e até a forma como o recorrente era maltratado pela recorrida, afirmando sem qualquer margem para dúvidas que entre ambos não houve qualquer acto sexual nem sequer beijo.
S - Daí que deveriam ter sido dado como provados os seguintes factos:
10. Sucede que, logo no primeiro dia de casamento, sem que nada o fizesse prever, a R. negou beijar o A.
(…)
12. Ademais, nessa mesma noite, 31 de dezembro, a R., já em casa do A., negou-se a pernoitar no mesmo leito conjugal, dormindo em outro quarto.
(…)
14. A R., logo após a celebração do casamento, em virtude das suas acções – ou recusas – começou a mostrar-se fria e distante para com o A., negando-lhe qualquer demonstração de afecto e intimidade.
15. Já no segundo dia de casamento, 1 de janeiro de 2014, a saiu de casa do A., logo pela manhã.
(…)
20. Ora, depois de o A. ter revelado tal facto, contou também que, depois da celebração do casamento, a R. se mostraria fria e distante e nem sequer havia dormido com ele.
(…)
24. Como tal, até à presente data, nunca se consumou qualquer acto sexual entre A. e R..
(…)
28. No quotidiano, a R. saía de casa do A. logo pela manhã, e raramente voltava para lá pernoitar.
29. A R., nas raras vezes que pernoitava em casa do A., dormia em quarto separado.
(…)
34. No entanto, a R. continuava a não pernoitar em casa do Autor.
35. Não tendo sido consumado qualquer ato sexual entre A. e R..
36. A R. mostrava-se sempre fria e distante do A.
(…)
59. Soube o A. e os seus familiares, que esse suposto “primo” era na verdade amante da ora R., mantendo com ela uma relação, enquanto esta era casada com o A.
(…)
66. O A., durante o tempo que ali permaneceu, contra a sua vontade, ouvia durante a noite gemidos e ruídos da R. em actos sexuais com o suposto “primo”, nada podendo o A. fazer.
(…)
76. A. e R. dormiam separados, não se tendo, a esta altura, consumado qualquer acto sexual entre eles.
77. Note-se que a R. coabitava, neste apartamento, com o seu suposto “primo”, que era na verdade seu amante.”
(…)
T - sendo os concretos pontos da matéria de facto que levam a que sejam eles dados como provados os depoimentos das testemunhas Manuel, Queiroz, Margarida, José, Maria como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso.
U - Pelo depoimento das testemunhas Queiroz e José ficou provado também que o autor casou em segredo e que depois de vários episódios os filhos e nora se aperceberam que o recorrente havia sido enganado, sendo que quando se deram conta já o dinheiro existente em contas bancárias e em casa havia desaparecido sem ter sido o autor a usá-lo.
V - Alem disso, o tribunal a quo deveria ter dado como provado que:
(…)
18. O A., em completo desespero, dirigiu-se a casa do seu filho, José e da sua nora, Queiroz, pedindo ajuda.
(…)
21. Face a isto, o filho e nora do A. rapidamente concluíram que este havia sido enganado R., tendo, de imediato, alertado o A. para esse facto.
(…)
37. Ademais, o A. descobriu que a R. havia levantado quantias monetárias deste, quantias essas que representam as economias de vida.
38. Após esta descoberta, e depois de alertado pelos filhos, o A. dirigiu à sua instituição bancária, Millenium BCP, com vista a consultar todos os movimentos desta conta, de forma detalhada.
(…)
40. Ora, o A. ficou em choque
(…)
43. O A. não fez este movimento bancário, não tinha também dele conhecimento, nem o autorizou.
(…)
47. A R. levantava o dinheiro da reforma do A., usando-o em exclusivo para si.
48. A R. levantou todo o dinheiro da conta do A. da Caixa Geral de Depósitos.
49. Bem como a totalidade do valor que o A. detinha na conta bancária do Millenium BCP.
50. Ora, o A. tinha cerca de 65000,00 e a Ré apropriou-se de todo este montante.
(…)
53. O A. não sabe, nem nunca soube, como é que a R. usou este dinheiro de que se apropriou indevidamente,…”
W - sendo os concretos pontos da matéria de facto que levam a que sejam eles dados como provados os depoimentos das testemunhas Manuel, Queiroz, Margarida, José, Maria como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso.
X - Mais se provou que a recorrida maltratava o recorrente que apenas se foi mantendo com ela pelo medo que lhe tinha, pois estava emocionalmente debilitado e sem força, sendo que ela o mantinha no quarto fechado, chegou a colocá-lo num lar e até a deixá-lo numa igreja – veja-se o depoimento de Queiroz, José, Manuel e Manuel.
Y- Assim, deveriam ter sido dado como provados os seguintes factos:
(…)
60. Naquele dia de Páscoa, a nora do A., Queiroz, revoltada e angustiada face às atitudes da R., desentende-se com ela.
61. Não obstante todo o enunciado, a R. endrominou o A. e conseguiu assim levá-lo consigo para o apartamento que detinha em Braga.
62. O A. … que se encontrava fraco e desidratado.
63. A R. manteve-o A. ali colocando-o num quarto fechado, durante uma semana.
64. O A. não conseguia dali sair pois as portas estavam trancadas e ninguém lhe ligava
(…)
69. O A. estava fraco e física e emocionalmente debilitado
(…)
73. A R. colocou o A. num lar de dia.
74.Onde o A. passava os seus dias,
75. Regressando ao apartamento da R. à noite.
(…)
78. Neste período, houve dias em que a R. colocava o A. numa igreja, deixando abandonando durante todo o dia.
79. O A. estava completamente enfraquecido, chegando ao ponto de nem conseguir andar.
(…)
Z - sendo os concretos pontos da matéria de facto que levam a que sejam eles dados como provados estes pontos, os excertos dos depoimentos das testemunhas Manuel, Queiroz, José e Maria como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso.
AA - Além destes, deveriam ter sido dado como provados os seguintes factos, tendo em conta os depoimentos das testemunhas Manuel, Queiroz, Margarida, José, como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso- que relataram a forma como o recorrente chegou, fraco, com fome, maltratado, mal vestido, fugido da casa da recorrida:
(…)
80. Sucede que, no dia 14-06-2014, o A. apareceu na residência do seu filho José e da sua nora, a chorar compulsivamente.
81. Para ali chegar, o A. veio, desde Braga, num táxi.
82. O A. dizia, naquele momento, que não tinha dinheiro e que queria a ajuda do filho e da nora.
83. E não fosse a ajuda dos filhos, o A. teria caído na desgraça e miséria, dado a R. se ter apoderado indevidamente de todo o dinheiro do A.
84. O A., nunca teria casado com a R., se soubesse que, na verdade, nunca haveria entre eles verdadeiro casamento
85. O A. casou com a Ré porque esta lhe prometera ser uma pessoa livre e descomprometida, moralmente correta, além de lhe prometer amor, carinho, intimidade, companhia e solidariedade.”
BB - Veja-se, Exmos Srs Juízes Desembargadores, no DEPOIMENTO do recorrente é de sublinhar que o mesmo referiu de forma peremptória e esclarecedora que “NÃO QUERIA CASAR”, só o tendo feito com a vontade viciada.
CC - A este propósito veja-se o seu depoimento, nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso, mas que aqui se dão por reproduzidas, em que o A AA de 16:20:41 a 16:27:39 do dia 12- 10-2016, instado pelo Sr Juiz refere: Juiz: pergunta o nome completo dele? A: António Augusto Ferreira Juiz: jura dizer a verdade às perguntas que lhe vão ser feitas? A: juro Juiz: pergunta se recorda quando ele decidiu casar com esta senhora? A: não sei. Juiz: não sabe o quê? Pergunta se percebeu o que lhe perguntei? A: percebi; Juiz: quando decidiu casar? A: eu não sei a quanto tempo vai; Juiz: eu queria saber quando é que decidiu casar com ela? A: não sei; Juiz: quando quis casar? A: É falso; Juiz: porque é que ele casou? A: é falso não sei estou confuso. Juiz: pergunta a quanto tempo está assim confuso? A: agora não sei responder não me queria casar
DD - Aliás, veja-se do depoimento da testemunha da própria Ré, a Sra. Ré BB de 16:58:41 a 17:14:40 do dia 29-09-2016, amiga chegada da Ré que, quando instada a propósito do casamento entre o Autor e a Ré refere: Mandatário A: pode se dizer que a senhora é chegada a dona Deolinda? T: sim Mandatário A: foi certamente convidada para este segundo casamento? T: não. Mandatário A: porque não? T: nem sabia quando era a senhora foi morar para a casa do senhor António.
EE - Veja-se a propósito Ex. Mos Srs. Juízes Desembargadores o testemunho do filho do Autor, o Sr. José, nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso, mas que aqui se dão por reproduzidas, de 16:09:17 a 16:41:11 do dia 29-09-2016, que quando instado a propósito da vinda do Táxi para sua casa o seguinte: Mandatário A: o que o senhor disse antes tentou junto da GNR perceber se podia fazer alguma coisa que o seu pai estava a ser enganado o que a GNR disse? T: que não tinha hipótese que eram casados não interferiram e nunca mostraram abertura para resolver isso Mandatário A: e depois voltou para si? T: pediu comida e dormida e até tinha medo de sair de casa que numa altura ele andava nem de casa queria sair para fora Mandatário A: nesse episódio da chegada falou com ele? T: eu não falei nada a minha esposa é que viu o táxi e disse olha está ali o teu pai e a primeira coisa que disse é se emprestava dinheiro para pagar o táxi e custa a dizer isso que o meu pai não tinha necessidade dessas coisas vinha cheio de fome fazia parecer aqueles pretos de Africa a comer com os dedos e podia dizer comeis que o meu pai era esquisito ao comer era uma pessoa que gostava de comer bem e bom; Mandatário A: como é que ele estava fisicamente? T: só trazia os ossos e chegou a ser fechado num quarto.
FF - A sentença recorrida referiu que as testemunhas do autor, no seu geral, não demonstraram credibilidade e houve contradição e incoerências nos depoimentos prestados, sem no entanto, apontar de forma concreta quais as contradições e incoerências existentes.
GG - Além disso entendeu o regresso do recorrente como tendo sido premeditado., sem sustentar tal afirmação, que na realidade é contrariada pelo depoimento das testemunhas que dizem que o recorrente fugiu de casa da recorrida tendo ido para casa do filho num táxi não tendo sequer dinheiro para pagar a prestação desse serviço, sendo certo que nem o filho sabia.
HH - Veja-se que quanto a este concreto facto que deveria ser dado como provado temos a testemunha nora do autor a Sra. Queiroz, nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso, mas que aqui se dão por reproduzidas, de15:22:20 a 15:55:58 do dia 29-09-2016 a mesma refere: T: sim até telefonámos para a polícia e ele disse que estava casado e que não tinha nada a que meter nariz Mandatário A: e depois o que aconteceu: apareceu lá em casa a chorar que lhe batia e lhe prendia num quarto e que no dia em que ele pôde fugir disse que ia a casa da filha e conseguiu fugir; Mandatário A: disse lhe a si pessoalmente que tinha conseguido fugir? T: sim (…) Mandatário R: quando chegou no táxi foi que dia? T: foi 12 e 14 foi no sábado; Mandatário R: pode nos descrever o dia? T: estava a chorar e perguntou pelo filho que não tinha dinheiro para pagar o táxi; Mandatário R: ele pagou o táxi e quem estava mais? T: e depois ligámos ao senhor doutor e depois chamamos as testemunhas e estava outro senhor que chegou depois 8…)
II - No que ao erro de vontade diz respeito ficou provado que antes do casamento a recorrida era amável, fazia as tarefas domésticas e era afável para o recorrido sendo que quando os filhos se aperceberam que ela apenas estava interessada no dinheiro do recorrente, ela iludiu-o e casaram em segredo.
JJ - Após o casamento passou a trata-lo mal, não houve a consumação de qualquer acto de carinho e sexual, sendo certo que a recorrida tinha um amante e o recorrente tinha medo dela e para que ela não o castigasse mais e/ou batesse ele escondia a realidade em que vivia.
KK - Quando já não mais aguentou fugiu e pediu auxílio ao filho e à nora sendo que sentença recorrida acaba por se referir que aquando do depoimento do recorrente se denotou a sua incapacidade física e mental, apesar de não comprovada medicamente.
LL - Assim sendo, o tribunal deveria ter dado como provado os factos que deu como não provado, mormente os factos descritos em 10;12;15;18;20:21;24;28;29;34;35;36;37;40;43º;47;48;49;50;53;59; 61º, 62º, 64º68º, 66; 73; 74; 75; 76;77; 80 a 85º; dos factos não provados, dando-os como provados, e, em consonância condenar a Ré nos seus precisos termos.
MM - O tribunal recorrido ao ter dado como não provados os factos vertidos em em10;12;15;18;20:21;24;28;29;34;35;36;37;40;43º;47;48;49;50;53;59; 61º, 62º, 64º68º, 66; 73; 74; 75; 76;77; 80 a 85º incorreu num erro de julgamento sobre os aludidos concretos pontos de facto, os quais poderão ser alterados por este Tribunal Superior (cfr. artigo 640,n.° 1 als. a) e b) e 662°, n.°s 1 e 2 do C.P.Civil), pois as aludidas provas testemunhal e documental necessariamente imponham uma decisão diversa.
NN - Por isso, de acordo com o depoimento das testemunhas supra aludidas, com os documentos junto aos autos, e com o recurso às regras de experiência comum, o Tribunal a quo deveria ter dado como provados os factos que deu como não provados, mormente em 10;12;15;18;20:21;24;28;29;34;35;36;37;40;43º;47;48;49;50;53;59; 61º, 62º, 64º68º, 66; 73; 74; 75; 76;77; 80 a 85º.
OO - Pelo que, assim sendo, o tribunal recorrido incorreu num erro de julgamento na forma como valorou os factos que deu como não provados, o qual deve ser alterado por este Tribunal Superior ( cfr. artigo 640, n.° 1 als. a) e b) e 662°, n.°s 1 e 2 do C.P.Civil artigo), pois a aludida prova testemunhal e documental junta impunha que o tivesse dado como provado na sua totalidade.
PP - Como é sabido, mesmo que as partes não reclamem em sede de 1.ª instância contra decisão proferida acerca da matéria de facto, não se sana o vício da decisão, pois a Relação, em recurso, pode oficiosamente ou a requerimento da parte recorrente reapreciar, anular e alterar a decisão proferida.
QQ - O recurso que venha a ser interposto da sentença abrange, obviamente, a decisão sobre a matéria de facto ( cfr. artigo 662.º do C.P.Civil), quer haja ou não reclamação, não ficando precludido esse mesmo legítimo direito;
RR - Pelo que, o recorrente pretende a alteração da matéria de facto, ao abrigo do disposto no artigo 662º, n.º1 do C.P.Civil ou seja, “ A relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
SS - Ora, tendo havido gravação da prova, o que é o caso, o Tribunal da Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em conta o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido dc fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados (cfr. artigo 662°, n.° 2 do C.P.Civil)
TT - Pelo exposto, após analisada somente a matéria de facto que a nossa modesta opinião, foi incorrectamente julgada, concretamente, os factos dados como não provados em 10;12;15;18;20:21;24;28;29;34;35;36;37;40;43º;47;48;49;50;53;59; 61º, 62º, 64º68º, 66; 73; 74; 75; 76;77; 80 a 85º que devem ser dados como provados na sua totalidade ou parcialmente.
UU - Por tudo acima exposto, a decisão recorrida deverá ser revogada e substituída por outra que absolva o Réu recorrente e condene a Autora nos pedidos por si formulados.
VV - Dispõe o artigo 1631.º do CC que é anulável o casamento celebrado com a vontade viciada por erro ou coacção de um dos cônjuges.
WW - A vontade do recorrente tal como supra demonstrado estava viciada por erro, tanto mais que o mesmo no seu depoimento ainda disse que não queria casar e apenas casou porque esta antes de casar o iludiu prometendo e demonstrando ser uma pessoa moralmente correta, além de lhe prometer amor, carinho, companhia e solidariedade, fazendo-lhe todas as tarefas domésticas e cuidando dele sendo que após o casamento se mostrou completamente diferente.
XX - E, de acordo com o disposto no artigo 1636.º do CC o erro que vicia a vontade só é relevante para efeitos de anulação se recair sobre qualidades essenciais da pessoa do outro cônjuge, se for desculpável, e se mostre que, sem ele, o casamento não teria sido celebrado.
YY - Ora, o erro que viciou a vontade do recorrente recaiu sobre qualidades essenciais da recorrida, porquanto eram essas características, essas qualidades da recorrente que se espelham no livre estado civil, no amor, no carinho, na solidariedade, na amizade, na companhia, que fizeram que ele quisesse com ela casar.
ZZ - Veja-se que são essenciais as qualidades particularmente significativas, que em abstracto sejam idóneas para determinar o consentimento, como por exemplo, no caso em concreto, o estado civil, vida e costumes desonrosos da recorrida (Pereira Coelho, Família, 1977, 179).
AAA - In casu, o erro da vontade recaiu sobre qualidades morais e de carácter da ora recorrida, qualidades essas essenciais para a realização de um casamento (A. Varela, Família, 2.ª, 260.).
BBB - Ora, demonstrada a essência das qualidades sobre as quais recaiu o erro que viciou a vontade do recorrente é de notar que este erro é desculpável, sendo legítimo e razoável em face às circunstâncias do caso e segundo concepções gerais.
CCC - E o erro é essencial, porquanto o recorrente não teria casado se dele não fosse vítima, sendo que a atitude de engano mostrou-se razoável, sendo justificada, compreensível, humana e não puramente excêntrica.
DDD- Preenchidos que estão os pressupostos do erro susceptível de viciar a vontade, a vontade do recorrente em contrair matrimónio com a recorrida estava viciada por erro, o que desde logo constitui causa de anulabilidade do casamento entre eles celebrado.
EEE - Não podia por isso ter sido outra a decisão do douto tribunal e que agora se pugna por ela devendo esse venerando tribunal decretar a anulação do casamento civil do recorrente e recorrida, celebrado a 31-12-2013, com fundamento no erro que viciou a vontade do recorrente com todas as legais consequências.
NESTES TERMOS, E NOS MELHORES DE DIREITO, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO TOTALMENTE PROCEDENTE E A SENTENÇA RECORRIDA SER REVOGADA E SUBSTITUIDA POR OUTRA QUE DECLARE A ANULAÇÃO DO CASAMENTO CIVIL CELEBRADO ENTRE RECORRENTE E RECORRIDA A 31-12-2013, COM FUNDAMENTO NO ERRO QUE VICIOU A VONTADE DO A...”.
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A Ré/Recorrida apresentou contra-alegações, concluindo as mesmas da forma seguinte:
“…Conclusões:
A. Por sentença proferida pelo Tribunal recorrido foi decidido o seguinte: “A- Absolve-se a Ré do pedido; B- Condena-se o Autor no pagamento das custas devidas pela acção (cf. Artigo 527º do Código de Processo Civil);
B. O ora recorrente pugnou pela procedência da acção “e em consequência ser declarada a anulação do casamento civil celebrado entre A. e R., a 31-12-2013, com fundamento no erro que viciou a vontade do A.”
C. De harmonia com o disposto no art. 607.º, n.º 4, do CPC, na fundamentação da sentença, o juiz deve declarar quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e, entre o mais, especificando os fundamentos decisivos para a sua convicção.
D. No caso da douta sentença recorrida verifica-se que a decisão sobre a matéria de facto, compreendida na sentença recorrida, não se limitou a enumerar os factos provados e não provados, o tribunal a quo fez referência a que concreta prova lançou mão para considerar cada facto como provado ou não, não tendo sido feita nenhuma omissão nem referência genérica, o que corresponde à satisfação da exigência estabelecida na lei.
E. A fundamentação da decisão da matéria de facto foi clara e especificou os meios de prova que foram decisivos para a formação da convicção do Juiz, sendo eles a prova documental e prova testemunhal apresentada, satisfazendo portanto a exigência legal estabelecida no art. 607.º, n.º 4, do CPC e não tendo sido cometida nenhuma nulidade processual de qualquer espécie, prevista no art. 195.º, n.º1, do CPC.
F. O recorrente à douta sentença recorrida entende que esta padece ainda de nulidade devido ao “Absolve-se a Ré do pedido”, considerando que o tribunal a quo está a ir mais além do que aquilo que na realidade o recorrente peticionou que foi “ser declarada a anulação do casamento…”, pronunciando-se quanto a um pedido que na realidade não foi feito.
G. No entanto o próprio enunciado do artº 615º nº1 cita que a sentença é nula quando: (…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; (…) d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (…)”. Pela leitura atenta da douta sentença podemos claramente verificar que não houve excesso de pronúncia em qualquer parte, nem falta de fundamentação de facto e de direito, sendo esta o bastante, nem falta de enunciação fundamentada dos factos dado como provados e como não provados, como o recorrente alega. Daí não resultando qualquer tipo de nulidade da sentença nem violação do artigo 205º, n.º1 da CRP, e artigos 158º, 607º n.º 3, 615 n.º 1 e 154º n.º 1 do C.P.C.
H. Na decisão recorrida, o tribunal deu como não provado os factos de 1 a 85 constantes da douta sentença. Sendo certo que em despacho datado de 09-05-2016 o tribunal fixou que: “São tema de prova: os factos que consubstanciam o alegado erro que viciou a vontade matrimonial declarada pelo Autor.”. Ora, o recorrente considera que tais factos foram incorrectamente julgados e que, na sua maioria, devia tê-los dado como provados.
I. Sendo certo que, o tribunal recorrido para dar como não provados tais factos apresentou a seguinte fundamentação, sendo esta clara, inequívoca e plenamente fundamentada: “Nos factos não provados, temos em conta a falta de prova dos mesmos ou a dúvida que a prova produzida, por quem tinha o ónus de os demonstrar, gerou, pelas razões já acima enunciadas. Repete-se: o Autor suportou a sua demanda em depoimentos de pessoas que alegadamente assistiram a um episódio isolado da vivência do Autor, que não deixou de ter contradições, e de outras, familiares do mesmo, que têm uma relação notoriamente adversa com a Ré, com contradições e incoerências que nos levaram a descredibilizar o pouco que conheciam directamente dos cerca de 100 articulados do Autor. Em especial quanto ao elemento subjectivo subjacente à declaração de casamento, tal prova é claramente insuficiente para afectar o declarado e firmado em documento autêntico e presumida nos termos do art. 1634º, do Código Civil.”
J. A douta sentença recorrida faz referência às várias contradições e incoerências presentes nos depoimentos das testemunhas do recorrente. Essa falta de clarividência, quanto ao tipo de relacionamento mantido entre A. e R. tanto antes do casamento como depois do mesmo, fica explícita após leitura dos ditos depoimentos. Para além de que ninguém fora do casal tem legitimidade para arguir ou provar a existência de relação íntima entre eles, ou a falta dela.
K. Ficou provado que antes do casamento a recorrida era amável, fazia as tarefas domésticas e era afável para o recorrido. Sendo que o mesmo continuou a acontecer após a celebração do casamento, R. mantinha gestos de carinho para com A, tendo sempre em consideração a sua saúde, higiene e o seu bem-estar em geral, provendo-lhe sempre de tudo quanto ele necessitasse, consequentemente mantendo uma verdadeira vida de casal. Porquanto não se verifica neste caso nenhum tipo de erro ou vício da vontade quanto à recorrida, que pudesse iludir tão peremptoriamente o A. a casar com esta e a coabitar com ela pacificamente durante aproximadamente 3 anos.
L. Sendo que não ficou como provado que alguma vez a recorrida tenha sido desrespeitosa ou violenta para com A. Nunca o deixou num lar ou igreja, ou a dormir em condições precárias, nem nunca o agrediu ou o fez passar fome. Como também não ficou provado que alguma vez R. tenha roubado qualquer tipo de quantia de A. Tendo ficado também por provar que R. mantenha ou alguma vez tenha mantido uma relação imprópria com o seu primo, porque R. nunca cometeu adultério.
M. Dispõe o artigo 1631.º nº1 alínea b) do CC que “é anulável o casamento: celebrado, por parte de um ou de ambos os nubentes, com falta de vontade ou com a vontade viciada por erro ou coacção;”.
N. Dispõe o artigo 1636.º do CC que o erro que vicia a vontade só é relevante para efeitos de anulação quando recaia sobre qualidades essenciais da pessoa do outro cônjuge, seja desculpável e se mostre que sem ele, razoavelmente, o casamento não teria sido celebrado.
O. Dispõe o artigo 1634º do CC que a declaração de vontade no acto da celebração, como aquela que foi apurada no ponto 2.1.6 da douta sentença recorrida, faz presumir que a sua vontade não estava viciada por erro ou coacção. Sendo certo que o recorrente no decorrer de todo o processo nunca conseguiu elidir esta presunção.
P. Pode-se então concluir que não existe nenhum aspecto susceptível de nulidade processual neste caso, nem existe qualquer tipo de vício da vontade de A. Por conseguinte, e não tendo havido qualquer violação de nenhum preceito jurídico deve portanto a douta sentença recorrida ser confirmada.
Nestes termos e nos mais de direito, por tudo o exposto, e sem necessidade de mais amplas considerações, deverá improcedente, por não provada, e, consequentemente, confirmar a decisão proferida pelo tribunal a quo com todos efeitos legais, justamente porque não violou quaisquer preceitos legais, "maxime" os mencionados pelo recorrente.”
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Proferiu o Tribunal Recorrido, despacho de sustentação, defendendo, de uma forma fundamentada, que as nulidades arguidas devem ser indeferidas.
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Corridos os vistos legais, cumpre proferir decisão.
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II - FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação, o Recorrente coloca as seguintes questões que importa apreciar:
1. Determinar se se verifica alguma das nulidades invocadas pelo Recorrente:
1.1. Nulidade da sentença decorrente da falta de indicação concreta da prova que lançou mão para considerar cada facto como provado ou não, fazendo apenas uma enunciação genérica dos meios de prova- violação do disposto nos arts. 662.º, n.º 2, alínea c), 607.º, n.º 4 e 195.º, n.º 1, do CPC.
1.2. Nulidade da sentença decorrente da não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão - violação do art. 615º, n.º 1, al. b) do CPC;
1.3. Nulidade da sentença decorrente do conhecimento de questões de que não podia tomar conhecimento- violação do art. 615º, n.º1, al. d) do CPC; porque a decisão em crise ao referir “Absolve-se a Ré do pedido” está a ir mais além do que aquilo que na realidade o recorrente peticionou que foi “ser declarada a anulação do casamento…”.
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2. - Determinar se o tribunal a quo incorreu num erro de julgamento, e, consequentemente, se, reponderado esse julgamento, devem considerar-se provados (ou parcialmente provados) os factos que a sentença de primeira Instância considerou como não provados:
-pontos 1 a 85 da matéria de facto não provada;
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3. Saber se, sendo modificada a matéria de facto no sentido propugnado pela Recorrente, a presente acção tem de proceder.
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A) - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença proferida em 1ª instância julgou provados os seguintes factos:
2 – Fundamentação
2.1 – Os Factos provados relevantes
Instruída e discutida a causa, resultaram provados, com interesse para a decisão, os seguintes factos:
1. O A. nasceu a 10 de maio de 1931 - 1 Cf. assento de nascimento e respectivos averbamentos, a fls. 6 e ss..
2. O A., a 14 de Fevereiro de 2009, ficou viúvo, por óbito da sua então cônjuge, , com quem fora casado desde 20.7.1957- Cf. assento de nascimento e respectivos averbamentos, a fls. 6 e ss..
3. Certo dia, em data indeterminada anterior à do casamento infra referido, o A. conheceu a Ré porque a contratou como sua empregada doméstica.
4. A ora R. é pessoa de discurso apelativo e tinha à data do casamento em apreço 47 anos.
5. O A. aceitou casar com a R., civilmente, e em segredo dos familiares.
6. Assim, a 31 de Dezembro de 2013, na Conservatória do registo Civil de Vila Verde, perante a segunda ajudante Exma. Senhora Maria, em substituição legal da Exma. Senhora Conservadora, o A. casou civilmente com a R.- Cf. Assento de casamento, a fls. 7 v.
7. A R., de imediato, manifestou vontade em residir com o A., na casa deste, sita em Marrancos, Vila Verde.
8. Na Páscoa de 2014, como habitual, os filhos do A. foram a sua casa.
9. A data altura, na Páscoa de 2014, apareceu em Marrancos com um indivíduo que dizia ser seu primo e com o seu ex-marido.
10. A dada altura a Ré levou o Autor consigo para o apartamento que detinha em Braga.
11. Mais tarde, em dada indeterminada, o A. sofreu um acidente de carro.
12. Na sequência deste acidente o A. ficou ferido.
13. Tendo sido internado no Hospital de Braga durante alguns dias.
14. Após, o A. voltou a residir com a Ré no seu apartamento em Braga.
15. Entretanto, por forma não apurada, o Autor decidiu voltar a Marrancos, deixando o apartamento em que vivia com a Ré em Braga.
16. O A. é dependente de insulina, não podendo, sem mais, ser privado de cuidados de saúde.
*
2.2. Factos Não Provados - (O nosso sublinhado pretende evidenciar o sentido da decisão negativa) – menção constante da sentença de primeira instância
1. Fruto do choque emocional que sofrera, o A. após a viuvez, começou a padecer de distúrbios comportamentais e emocionais, manifestados, por exemplo, em crises de choro constantes e súbitas.
2. Em meados do ano de 2013, o A. não tinha já um discurso coerente e articulado, mostrando-se desconcertante e sem qualquer nexo.
3. O A., nesse período, começou a manifestar comportamentos anormais para a sua pessoa, como sendo importunar senhoras suas conhecidas na rua, pedindo.
4. Aliás, o A. convidada, na Pastelaria X, várias senhoras respeitáveis suas conhecidas para sair com ele, por exemplo.
5. O A., todos os dias, convidava várias pessoas, aleatoriamente, para almoçarem consigo, pagando-lhes o almoço.
6. Perante toda esta factualidade, os filhos do A. tentaram perceber o que se passaria com o seu pai, tentando ajudar das mais variadas formas possíveis, sem que, no entanto, o A. se deixasse ser ajudado.
7. Certo dia, em meados de 2013, o A. conheceu a Ré.
8. A R., aproveitando da fragilidade psicológica e bem assim emocional do Autor, inicia manobras de ilusão, iludiu-o com falsas expectativas.
9. Ora, em virtude dessas manobras, o A. aceitou casar com a R..
10. Sucede que, logo no primeiro dia de casamento, sem que nada o fizesse prever, a R. negou beijar o A.
11. Note-se que antes da celebração do casamento, a R. beijava o Autor a todo do tempo.
12. Ademais, nessa mesma noite, 31 de Dezembro, a R., já em casa do A., negou-se a pernoitar no mesmo leito conjugal, dormindo em outro quarto.
13. A R., perante a sua recusa, justificou-se ao A. alegando que não conseguia dormir acompanhada.
14. A R., logo após a celebração do casamento, em virtude das suas acções – ou recusas – começou a mostrar-se fria e distante para com o A., negando-lhe qualquer demonstração de afecto e intimidade.
15. Já no segundo dia de casamento, 1 de Janeiro de 2014, a saiu de casa do A., logo pela manhã.
16. A partir desse momento, a R. não mais voltou à casa do A., durante 2 dias.
17. Perante esta situação, o A. ficou completamente desesperado e desnorteado, dado não saber o paradeiro da sua cônjuge.
18. O A., em completo desespero, dirigiu-se a casa do seu filho, José Ferreira e da sua nora, Quitéria Queiroz, pedindo ajuda.
19. Só nesse momento, o A. revelou que se teria casado em segredo com a ora R..
20. Ora, depois de o A. ter revelado tal facto, contou também que, depois da celebração do casamento, a R. se mostraria fria e distante e nem sequer havia dormido com ele.
21. Face a isto, o filho e nora do A. rapidamente concluíram que este havia sido enganado R., tendo, de imediato, alertado o A. para esse facto.
22. Sucede que, ao terceiro dia, a R. apareceu, finalmente na casa do A..
23. A R., nesse momento, fez falsas promessas ao A., prometendo que dormiria com ele, mas se seria necessário aguardar o momento certo, pois, alegadamente, andava com um grave problema nas costas, o que a obrigava a dormir sozinha.
24. Como tal, até à presente data, nunca se consumou qualquer acto sexual entre A. e R..
25. Passados alguns dias sobre este reaparecimento da R., esta entrou em casa do A., sita em Marrancos, abraçada a um indivíduo,
26. Indivíduo esse que apresentou ao A. como sendo seu primo.
27. Nesse momento, a R. apresentou ao A. três das suas filhas.
28. No quotidiano, a R. saía de casa do A. logo pela manhã, e raramente voltava para lá pernoitar.
29. A R., nas raras vezes que pernoitava em casa do A., dormia em quarto separado.
30. A R. nunca confeccionou refeições ou auxiliou o A., já idoso e cada vez mais debilitado, no que quer que fosse.
31. Face a todo o circunstancialismo, ainda assim, o A. continuava iludido pelas falsas promessas da R., acreditando que tudo pudesse melhorar com o passar do tempo.
32. A R. conseguiu endrominar o A., pedindo a este para figurar como titular das contas bancárias.
33. A R. justificou este pedido alegando que desta forma conseguiria gerir as despesas da economia doméstica, bem como a reforma do A., em montante superior a 1200,00€.
34. No entanto, a R. continuava a não pernoitar em casa do Autor.
35. Não tendo sido consumado qualquer ato sexual entre A. e R..
36. A R. mostrava-se sempre fria e distante do A.
37. Ademais, o A. descobriu que a R. havia levantado quantias monetárias deste, quantias essas que representam as economias de vida.
38. Após esta descoberta, e depois de alertado pelos filhos, o A. dirigiu à sua instituição bancária, Millenium BCP, com vista a consultar todos os movimentos desta conta, de forma detalhada.
39. Consultado o extracto detalhadamente, o A. é informado que teria sido levantada a quantia de 10.000,00 € (dez mil euros) para um indivíduo de nome João Paulo.
40. Ora, o A. ficou em choque.
41. O A. não conhecendo ninguém com tal nome, não fez, nem nada sabia, acerca deste movimento de tão avultada quantia.
42. Para além deste montante, em momento posterior, foram transferidos da conta do A., 20.000,00 € (vinte mil euros).
43. O A. não fez este movimento bancário, não tinha também dele conhecimento, nem o autorizou.
44. Para além destes movimentos bancários realizados pela R., sem conhecimento e autorização do A., esta ainda se apoderou do livro de cheques daquele, passando diversos cheques, também sem autorização do mesmo.
45. Ademais, a Ré apoderou-se de 15.000 euros que o Autor mantinha guardados na sua residência para as necessidades mais prementes.
46. Esta quantia pertencente ao A. e provinha de uma venda de pinheiros e eucaliptos, bem como da venda de um lote que vendera à filha.
47. A R. levantava o dinheiro da reforma do A., usando-o em exclusivo para si.
48. A R. levantou todo o dinheiro da conta do A. da Caixa Geral de Depósitos.
49. Bem como a totalidade do valor que o A. detinha na conta bancária do Millenium BCP.
50. Ora, o A. tinha cerca de 65.000,00 e a Ré apropriou-se de todo este montante.
51. A R. chegou ao ponto de enganar o A., pondo-lhe nas mãos notas antigas já fora de circulação, dizendo-lhe que era dinheiro da sua reforma.
52. A R. assim agia pois apoderava-se e gastava todo o dinheiro da reforma do Autor.
53. O A. não sabe, nem nunca soube, como é que a R. usou este dinheiro de que se apropriou indevidamente, uma vez que,
54. A R. não fazia qualquer compra para a residência do A., enfim, para a economia doméstica, não pagava a conta da electricidade, do gás, ou qualquer outra.
55. A R., sabe-se lá de que forma, ludibriava o A. de tal ordem que este estava embrenhado de uma passividade absoluta.
56. A R. acabava por deixar o A., já idoso e sem forças, em casa à deriva.
57. A R. deixava o A., dias e dias a fio, sozinho, sem nada lhe dizer do seu paradeiro.
58. Nem aos fins-de-semana a R. aparecia em casa do A.
59. Soube o A. e os seus familiares, que esse suposto “primo” era na verdade amante da ora R., mantendo com ela uma relação, enquanto esta era casada com o A.
60. Naquele dia de Páscoa, a nora do A., Quitéria Queiroz, revoltada e angustiada face às atitudes da R., desentende-se com ela, desavença essa que deu origem a um processo-crime.
61. Não obstante todo o enunciado, a R. endrominou o A. e conseguiu assim levá-lo consigo para o apartamento que detinha em Braga.
62. O A. … que se encontrava fraco e desidratado.
63. A R. manteve-o A. ali colocando-o num quarto fechado, durante uma semana.
64. O A. não conseguia dali sair pois as portas estavam trancadas e ninguém lhe ligava.
65. A R., ainda assim, ainda que raras vezes, ia falar com o A, conseguindo dar a volta.
66. O A., durante o tempo que ali permaneceu, contra a sua vontade, ouvia durante a noite gemidos e ruídos da R. em actos sexuais com o suposto “primo”, nada podendo o A. fazer.
67. Uma semana depois de ter levado o A. para o seu apartamento em Braga, a R. levou volta para a residência deste, em Marrancos, aí o deixando sozinho.
68. O A., face à ausência e atitude da R., num acto de desespero, pegou no carro para ir procurar esta.
69. O A. estava fraco e física e emocionalmente debilitado.
70. Em virtude disso, sofreu nesse dia um grave acidente de carro.
71. Após o A. ter regressado à sua residência, ainda debilitado do sinistro, a R. conseguiu novamente iludir o A. com falsas promessas e assim o levou, outra vez para o seu apartamento em Braga.
72. A R. chamava o A. de velho, pés a rasto, em frente de qualquer pessoa.
73. A R. colocou o A. num lar de dia.
74. Onde o A. passava os seus dias,
75. Regressando ao apartamento da R. à noite.
76. A. e R. dormiam separados, não se tendo, a esta altura, consumado qualquer ato sexual entre eles.
77. Note-se que a R. coabitava, neste apartamento, com o seu suposto “primo”, que era na verdade seu amante.
78. Neste período, houve dias em que a R. colocava o A. numa igreja, deixando abandonando durante todo o dia.
79. O A. estava completamente enfraquecido, chegando ao ponto de nem conseguir andar.
80. Sucede que, no dia 14-06-2014, o A. apareceu na residência do seu filho José e da sua nora, a chorar compulsivamente.
81. Para ali chegar, o A. veio, desde Braga, num táxi da companhia Táxis, conduzido pelo motorista Sr.º X.
82. O A. dizia, naquele momento, que não tinha dinheiro e que queria a ajuda do filho e da nora.
83. E, não fosse a ajuda dos filhos, o A. teria caído na desgraça e miséria, dado a R. se ter apoderado indevidamente de todo o dinheiro do A.
84. O A., nunca teria casado com a R., se soubesse que, na verdade, nunca haveria entre eles verdadeiro casamento
85. O A. casou com a Ré porque esta lhe prometera ser uma pessoa livre e descomprometida, moralmente correta, além de lhe prometer amor, carinho, intimidade, companhia e solidariedade.
*
B) - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Já se referiram em cima as questões que importa apreciar e decidir.
Comecemos pela análise das alegadas nulidades.
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão são as que vêm taxativamente enumeradas no nº 1 do artigo 615º do CPC.
Nos termos daquele preceito, é nula a sentença quando: a) não contenha a assinatura do juiz; b) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justifiquem a decisão; c) os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.
Os vícios determinantes da nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade, como é a falta de assinatura do juiz, ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender conhecer questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia). São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afectada(1).
Neste sentido, o Prof. Antunes Varela (2) salienta que “…não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário … e apenas se curou das causas de nulidade da sentença, deixando de lado os casos a que a doutrina tem chamado de inexistência da sentença”.
Já o Prof. Lebre de Freitas (3) considera que apenas a “falta de assinatura do juiz” constitui fundamento de nulidade, pois trata-se de “um requisito de forma essencial. O acto nem sequer tem a aparência de sentença, tal como não tem a respectiva aparência o documento autêntico e o documento particular não assinados”. A respeito das demais situações previstas na norma, considera o mesmo autor tratar-se de “anulabilidade” da sentença e respeitam “à estrutura ou aos limites da sentença”.
Estas distinções são importantes porque, no caso concreto, o Recorrente invoca os dois tipos de situações, nem sempre com pertinência, pelo que as diversas questões que levantam terão que ser apreciadas, tendo em conta a exposição que antecede.
*
Aqui chegados, analisemos, então, cada uma das invocadas nulidades.
*
Comecemos por apreciar a primeira questão atrás enunciada:
1.1. Nulidade da sentença decorrente da falta de indicação concreta da prova que lançou mão para considerar cada facto como provado ou não, fazendo apenas uma enunciação genérica dos meios de prova- violação do disposto nos arts. 662.º, n.º 2, alínea c), 607.º, n.º 4 e 195.º, n.º 1, do CPC.

Nesta situação, o vício que o Recorrente aponta à decisão, não é a nulidade a que alude a al. b) do art. 615º do CPC, mas contende, sim, com a invocação da nulidade da decisão proferida por falta de fundamentação de determinados pontos da matéria de facto.
Como é sabido, e decorre do exposto, uma coisa é a falta de fundamentação da decisão da matéria de facto, outra coisa é nulidade da sentença quando não especifique os fundamentos, de facto e de direito que justificam a decisão (al. b) do citado artigo 615.º nº 1 do CPC) - vicio também invocado pelo Recorrente, e sobre o qual nos pronunciaremos mais à frente.
A nulidade decorrente da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando do artigo 607.º, nº 3 do CPC, que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.
Como é entendimento pacífico da doutrina, nestes casos só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do citado artigo 615.º. A fundamentação deficiente, medíocre ou errada afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade (4).
Portanto, para que haja falta de fundamentação, como causa de nulidade da sentença, torna-se necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e os não coloque na base da decisão (5).
Nessa medida, trata-se de uma situação que não se verifica, como iremos ver, no caso concreto.
Já se a questão colocada é a da falta de motivação da decisão sobre a matéria de facto, não estamos perante uma nulidade da sentença, mas sim de uma patologia ou vício da decisão da matéria de facto (que não corresponde também a erro de julgamento).
Vejamos, então, em que termos se deve entender como cumprido este dever de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto que inclusivamente tem assento constitucional- art. 205º da CRP.
Como é sabido, o tribunal aprecia as provas sujeitas à livre apreciação do julgador, decidindo segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
A decisão sobre a matéria de facto controvertida deve reflectir o resultado da conjugação dos vários elementos de prova produzidos na audiência ou em momento anterior.
A decisão da matéria de facto compõe-se de duas partes: na primeira, declaram-se quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados; na segunda, faz-se a análise crítica das provas e especificam-se os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (607º, nº 3 e 4 do CPC).
Por força desta segunda parte, o juiz tem, assim, o dever de indicar, de modo objectivo, as razões que o levaram a dar como provados determinados factos e como não provados outros. Ou seja, tem de analisar criticamente a prova, explicando por que motivo deu mais valor ao depoimento de certa testemunha, por que motivo considerou relevantes ou irrelevantes certas conclusões dos peritos, por que motivo achou satisfatória, ou não, a prova resultante de documentos (6).
Segundo Teixeira de Sousa (7), “… o Tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência de motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente…”.
Destas considerações resulta, assim, que o tribunal não tem que ser exaustivo na indicação dos fundamentos que o levaram a decidir a matéria de facto em certo sentido.
Na verdade, “… não se trata de catalogar as razões que se foram revelando no decurso da Audiência e que determinaram, uma a uma, que se formasse a convicção do Tribunal, mas apontar selectivamente, entre as razões que “decidiram”, aquela ou aquelas que tiveram a maior força persuasiva…” (8).
Decorre, pois, do que se acaba de expor que a fundamentação não tem de ser exaustiva.
“Basta que nela se externem, de forma clara e suficiente, os motivos que levaram o julgador a decidir em determinado sentido e não noutro.” (9).
E por assim ser é que se entende que o n.º 4 do art. 607º do CPC não exige que a fundamentação das respostas aos quesitos tenha de ser indicada separadamente em relação a cada um deles, podendo essa fundamentação ser realizada de uma forma genérica (10).
Por outro lado, se um facto, dado, sem fundamentação, como provado ou não provado, não se revelar concretamente essencial para a decisão da causa, a exigência “a posteriori” da fundamentação, em via de recurso, é inútil (11).
Como é sabido, no domínio do anterior CPC havia uma cisão entre o julgamento de facto e o julgamento de Direito.
E na fase do julgamento de facto, depois de o juiz proferir a decisão sobre a matéria de facto, as partes podiam reclamar contra ela por deficiência, obscuridade ou contradição da decisão ou, ainda, contra a falta da sua motivação (art. 653º, n.º 4 do anterior CPC).
Entendia-se que:
- existia deficiência quando determinado ponto da matéria de facto ou algum segmento não tinha sido objecto de resposta positiva ou negativa (12).
- que havia obscuridade quando as respostas dadas eram ininteligíveis, equívocas ou imprecisas.
- que ocorria o vício da contradição quando se verificava oposição entre respostas dadas a pontos de facto controvertidos ou entre tais respostas e a plataforma da factualidade dada como assente- como já se referiu em cima.
- Finalmente, entendia-se que a falta de fundamentação dava-se quando o tribunal não especificava as razões em que fundara as respostas, podendo dirigir-se à completa omissão de motivação da decisão sobre a matéria de facto, como à falta de motivação quanto a determinados pontos concretos da mesma.
A mera discordância quanto aos argumentos invocados para a formação da convicção não constituía motivo de reclamação (13).
Ora, embora no Novo CPC aqui aplicável, esta fase da reclamação tenha desaparecido, estas considerações não deixam de continuar a ser pertinentes para o que aqui se discute.
Aqui chegados, importa, então, verificar se, efectivamente, pode imputar-se este vício ou patologia à decisão aqui posta em crise- sendo certo que se assim for a consequência será “ (se se tratar de um facto essencial para a decisão da causa) determinar a remessa dos autos ao Tribunal de Primeira Instância, a fim de preencher essa falha com base nas gravações efectuadas, ou através de repetição da produção da prova, para efeitos de inserção da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto…” (14) - art. 662º, nº 2, al. d) do CPC.
Ora, compulsada a decisão sobre a matéria de facto proferida, e a respectiva motivação, pode-se concluir que inexiste o vício apontado pelo Recorrente.
Na verdade, quanto aos concretos factos considerados como não provados, o Tribunal Recorrido apresentou, de modo objectivo, as razões que o levaram a dar como não provados esses factos, tendo apresentado selectivamente os meios de prova que o levaram a decidir nesse sentido.
Na verdade, quanto a esta factualidade o Tribunal fundou a sua convicção nos depoimentos das testemunhas ouvidas em sede de Audiência Final e na análise crítica que efectuou dos mesmos, invocando, de uma forma concreta e lógica, as razões da sua convicção (no essencial, a ausência de prova ou de prova credível e o não cumprimento do ónus de prova que recaía sobre o Autor- art. 342º, nº1 do CC; cfr. ainda arts. 1364º e 344º e 350º, nº 2 do CC).
Nesta medida, fácil será de concluir que não se verifica o vício apontado.
Com efeito, não temos dúvidas em afirmar que a fundamentação apresentada pelo Tribunal Recorrido, podendo ser genérica, satisfaz integralmente os requisitos do citado dispositivo legal, na medida em que indica, embora de forma sintética, não só os concretos meios probatórios, como ainda as razões ou motivos por que eles se tornaram credíveis e decisivos para a formação da convicção do julgador (veja-se que na motivação apresentada na decisão, o Tribunal Recorrido esclarece, em termos conclusivos, que “… o Autor suportou a sua demanda em depoimentos de pessoas que alegadamente assistiram a um episódio isolado da vivência do Autor, que não deixou de ter contradições, e de outras, familiares do mesmo, que têm uma relação notoriamente adversa com a Ré, com contradições e incoerências que nos levaram a descredibilizar o pouco que conheciam directamente dos cerca de 100 articulados do Autor. Em especial quanto ao elemento subjectivo subjacente à declaração de casamento, tal prova é claramente insuficiente para afectar o declarado e firmado em documento autêntico e presumida nos termos do art. 1634º, do Código Civil…”).
Por outro lado, quanto ao depoimento das testemunhas arroladas pela Ré, refere que: “…Das testemunhas Maria e Maria, conhecidas da Ré, retemos uma versão que contradiz a do Autor em alguns aspectos e é, por outro lado, coerente, com a insistência do mesmo em voltar à residência da mulher com quem escolheu casar…”.
Nesta conformidade, considerando-se cumpridas as exigências de motivação dos factos não provados, tem que se concluir necessariamente pela improcedência do Recurso nesta parte.
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Entremos agora na segunda nulidade invocada pelo Autor.
1.2. Nulidade da sentença decorrente da não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão - violação do art. 615º, n.º 1, al. b) do CPC;

Já fizemos referência a este vício no ponto anterior.
Ora, de uma forma sintética, pode-se afirmar, de uma forma inequívoca, que a decisão recorrida não se encontra viciada por falta de fundamentação no sentido aqui exigido, pois que este vício, como já se referiu, só se verifica quando se constata existir total ausência de fundamentação- o que não é seguramente o caso concreto da decisão aqui questionada.
Na verdade, quanto à arguição deste vício de nulidade, importa dizer que à excepção dos actos meramente ordenadores do processo e dos despachos de mero expediente, compete ao juiz fundamentar todas as decisões tomadas: art. 154º nº 1 do CPC (“As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre justificadas”).
A relevância de tal fundamentação fica demonstrada com o facto de a lei cominar com a nulidade a sentença que não obedeça a tal comando: art. 615º nº 1 al. b) do CPC.
Mesmo que o CPC não o referisse, essa necessidade de fundamentação resultaria por imposição directa do art. 205º nº 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP): “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.
Será esta fundamentação que assegura ao cidadão o controlo da decisão e permitirá ao Tribunal de recurso a sindicância do bem ou mal julgado.
Essa fundamentação deve ser expressa e, ainda que sucinta, deve ser suficiente para permitir o controlo do acto.
Ora, no caso concreto, o Tribunal de Primeira Instância, tendo sido preciso e sintético na fundamentação que apresentou, produziu, como se disse, fundamentação suficiente a permitir que as partes controlassem a decisão proferida, e consequentemente, que o presente Tribunal se pronunciasse sobre essa fundamentação.
Na verdade, e conforme resulta da decisão proferida, na parte aqui posta em crise, o Tribunal recorrido entendeu que, não tendo o Autor cumprido o ónus -que sobre ele recaía (art. 342º, nº 1 do CC; cfr. ainda arts. 1364º e 344º e 350º, nº 2 do CC) - de demonstrar o preenchimento dos requisitos legais do invocado erro no casamento celebrado (art. 1631º do CC), a pretensão de anulação do casamento teria que ser considerada necessariamente improcedente.
Não há, assim, dúvidas que o Tribunal fundamenta a sua decisão, não se verificando o vício de falta de fundamentação que o Recorrente invoca.
Não pode, pois, o presente Tribunal reconhecer o vício imputado à decisão pelo Recorrente.
Improcede, pois, a nulidade invocada.
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A última questão que se coloca é a de saber se existe nulidade da decisão proferida quanto à absolvição do pedido por se ter pronunciado sobre questão de que o Tribunal Recorrido não podia ter tomado conhecimento- al. d), 2ª parte, do n° 1 do art. 615.° CPC.
Vejamos se assim é.
Segundo o disposto no art. 615º, n.º 1, al. d) (2ª parte) do CPC é nula a sentença “…quando o juiz … conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
A previsão deste art. 615º, n.º 1 al. d)- está em consonância com o comando do n.º 2 do art. 608.º do mesmo Código, em que se prescreve que «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras».
Do mesmo modo, estabelece o art. 609º, nº 1 que “… a sentença não pode condenar… em objecto diverso do que se pedir…”.
Como refere Lebre de Freitas (15), este preceito legal “fala apenas em condenação, mas o preceito que consagra vale também para a absolvição: o Réu não pode ser absolvido dum pedido que o autor contra ele não deduziu, o que teria a consequência, por via da formação do caso julgado (art. 619º, nº1) de impedir o autor de, em nova acção pedir aquilo que o Réu fosse absolvido de reconhecer ou prestar (art. 580º, nº1 e 2) embora não tivesse constituído objecto da primeira acção…”.
A questão que se coloca é, pois, a de saber se a decisão aqui posta em crise se pronunciou sobre questão que não havia sido colocada pelo Autor no pedido que formulava na petição inicial.
Ou dito de outra maneira, a questão se coloca é a de saber se o Tribunal Recorrido ao absolver do pedido a Ré ultrapassou o objecto do processo (do litigio) proposto pelas partes.
Ora, é patente que tal não ocorre no presente caso.
Na verdade, julgando improcedente o pedido formulado pelo Autor a consequência jurídica a retirar é justamente a absolvição do pedido (!).
Nesta medida, não se consegue perceber porque é que o Recorrente entende que a decisão sob recurso se pronunciou sobre questão que o Tribunal não podia ter conhecido.
Assim, nesta sequência, cabe referir que a decisão proferida, e ora sob censura, não padece, manifestamente, do aludido vício, na estrita medida em que conheceu de questão que se mostrava colocada pelo Autor no pedido que formulou na petição inicial.
Nessa medida, conclui-se, sem necessidade de mais alongadas considerações, que não existe o vício de nulidade que o Recorrente aponta à decisão proferida.
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Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto:

Nesta sede, e antes do próprio objecto da impugnação de facto, cumpre tecer algumas considerações prévias, em ordem a evitar quaisquer equívocos quanto à impugnação da decisão de facto em sede de recurso e quanto à actividade jurisdicional que é suposto ser levada a cabo por este tribunal superior.
Explicitando.
Nesta matéria, consigna, como é consabido, o art. 640º, n.º 1 do CPC que, «quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) - os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) - os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) - a decisão que, no seu entender, dever ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.»
Por outro lado, ainda, dispõe o n.º 2 do mesmo art. 640º que :
a) - quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
À luz do regime exposto, e seguindo a lição de Abrantes Geraldes (16), “quando o recurso verse a impugnação da decisão da matéria de facto deve o recorrente observar as seguintes regras:
-em quaisquer circunstâncias, o recorrente tem de indicar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
-quando a impugnação se fundar em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, o recorrente deve especificar aqueles meios de prova que, em seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos impugnados;
-relativamente a pontos da decisão da matéria de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;
- O recorrente deve ainda deixar expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos;
Com efeito, tendo por referência a comparação entre a primitiva redacção do art. 712º do anterior CPC e o actual art. 662º, a possibilidade de alteração da matéria de facto, que era antes excepcional, acabou por ser assumida, como função normal da Relação, verificados os requisitos que a lei consagra.
Todavia, ao impor ao recorrente o cumprimento dos aludidos ónus, nesta sede, visou o legislador afastar «soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição do julgamento, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por abrir apenas a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências pelo recorrente.»
Destarte, importa referir que em sede de impugnação da decisão da matéria de facto pelo tribunal superior, não está (nem pode estar) em causa a repetição do julgamento e a reapreciação de todos os pontos de facto (e a respectiva motivação), mas apenas e só a reapreciação pelo tribunal superior (e a formação da sua própria convicção - à luz das mesmas regras de direito probatório a que está sujeito o tribunal recorrido) dos concretos pontos de facto julgados provados e/ou não provados pelo tribunal recorrido.
De facto, a possibilidade de reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida, impondo-se, por isso, ao impugnante, no respeito dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa-fé processuais, a observância dos citados ónus.
Concluindo, deve, assim, o recorrente, sob cominação de rejeição do recurso, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, deixar expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, sendo que, como refere Abrantes Geraldes (17), esta última exigência (plasmada na transcrita alínea c) do nº 1 do art. 640º) “ … vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente ”, devendo ser apreciada à luz de um critério de rigor enquanto decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo.»
Mais, ainda, é também relevante salientar que quanto ao recurso da decisão da matéria de facto não existe a possibilidade de despacho de convite ao seu esclarecimento ou aperfeiçoamento, sendo este tipo de despacho reservado apenas e só para os recursos em matéria de direito (18).
*
Aqui chegados, pode-se concluir que, como resulta do corpo das alegações apresentadas e das respectivas conclusões, o Autor/ Recorrente impugnou a decisão da matéria de facto, tendo dado cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1 als. a), b) e c) do CPCivil, pois que, faz referência aos concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados (os pontos 1 a 85 da matéria de facto não provada), indica os elementos probatórios que conduziriam à alteração daqueles pontos nos termos por ela propugnados, a decisão que no seu entender deveria sobre eles ter sido proferida (aqui, com algumas deficiências, pois que não concretiza as respostas a dar a cada um dos pontos da matéria de facto (v. os não mencionados na listagem repetida em várias conclusões) - se totalmente provado e/ou parcialmente provado e neste caso, em que medida- entendendo-se aqui que a resposta pretendida era: Provado), e ainda as passagens da gravação em que se funda o recurso (nº 2 al. a) do citado normativo).
Sem prejuízo do que ficou dito, e podendo considerar-se cumpridos aqueles ónus e, portanto, nada obstando ao conhecimento do objecto de recurso nesse segmento, o Autor/ apelante não concorda com a decisão sobre a fundamentação factual relativa aos factos dados como não provados pelo Tribunal de Primeira Instância constantes do ponto 1 a 85 da matéria de facto considerada não provada pelo Tribunal de Primeira Instância (entendendo que os mesmos deviam ser considerados todos provados, ou parcialmente provados).
Quid iuris?
Importa, antes de entrar directamente na apreciação das discordâncias alegadas pelo Recorrente, reforçar o que ficou dito quanto ao âmbito de apreciação da matéria de facto que incumbe ao Tribunal da Relação em sede de Recurso.
Como se referiu, o âmbito dessa apreciação não contende com a ideia de que o Tribunal da Relação deve realizar, em sede de recurso, um novo julgamento na 2ª Instância, prescrevendo-se tão só “ … a reapreciação dos concretos meios probatórios relativamente a determinados pontos de facto impugnados… “ (19).
Assim, o legislador, no art. 662º, nº1 do CPC, “ … ao afirmar que a Relação aprecia as provas, atendendo a quaisquer elementos probatórios… pretende que a Relação faça novo julgamento da matéria de facto impugnada, vá à procura da sua própria convicção, assim se assegurando o duplo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto em crise… “ (20).
Destas considerações, resulta, de uma forma clara, que o âmbito da apreciação do Tribunal da Relação, em sede de impugnação da matéria de facto, estabelece-se de acordo com os seguintes parâmetros:
a) O Tribunal da Relação só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pelo Recorrente;
b) Sobre essa matéria de facto impugnada, o Tribunal da Relação tem que realizar um novo julgamento;
c) Nesse novo julgamento o Tribunal da Relação forma a sua convicção de uma forma autónoma, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não só os indicados pelas partes) (21).
Dentro destes parâmetros, o Tribunal da Relação, assumindo-se como um verdadeiro Tribunal de Substituição (22), está em posição de proceder à reavaliação da matéria de facto especificamente impugnada pelo Recorrente, pelo que neste âmbito a sua actuação é praticamente idêntica à do Tribunal de primeira Instância, apenas cedendo nos factores da imediação e da oralidade.
Na verdade, este controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Efectivamente, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova (consagrado no artigo 607.º, nº 5 do CPC) que está deferido ao tribunal da 1ª instância, sendo que, na formação da convicção do julgador não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação/transcrição (23).
Ora, contrariamente ao que sucede no sistema da prova legal, em que a conclusão probatória é prefixada legalmente, no sistema da livre apreciação da prova, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto do julgamento, com base apenas no juízo que fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.
“O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela sobre o julgamento do facto como provado ou não provado” (24).
De facto, a lei determina expressamente a exigência de objectivação, através da imposição da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (artigo 607.º, nº 4 do CPC).
Todavia, na reapreciação dos meios de prova, a Relação procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, desta forma assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria, com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância (25).
Impõe-se-lhe, assim, que “analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, quer a testemunhal, quer a documental, conjugando-as entre si, contextualizando-se, se necessário, no âmbito da demais prova disponível, de modo a formar a sua própria e autónoma convicção, que deve ser fundamentada” (26).
Importa, porém, não esquecer porque, como atrás se referiu, se mantêm vigorantes os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta, o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados.
Assim, a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando este Tribunal, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança (27), no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa, e delimitaram uma conclusão diferente daquela que vingou na primeira Instância.
*
Tendo presentes estes princípios orientadores, vejamos agora se assiste razão ao Autor apelante neste segmento de recurso que tem por objecto a impugnação da matéria de facto nos termos por ele pretendidos.
Conforme já se referiu, importa que o Tribunal se pronuncie sobre a impugnação da matéria de facto, fundada no alegado erro na apreciação da prova, entendendo o Recorrente/ Autor que, em face da prova produzida, e no que concerne aos factos constantes do ponto 1 a 85 da matéria de facto não provada, devem esses factos considerar-se integral (ou parcialmente) provados (nos termos que enuncia).
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A Recorrente não concorda com o julgamento destes pontos da matéria de facto, alegando o seguinte:
“…N - O tribunal deu como não provado os factos de 1 a 85 constantes da douta sentença e que aqui se dão por integralmente reproduzidos por uma questão de economia processual, e que o recorrente entende que foram incorrectamente julgados atenta a prova produzida.
O - Dos depoimentos das testemunhas Margarida, Manuel, José e Queiroz deveria ter dado como provado que “Fruto do choque emocional que sofrera, o A. após a viuvez, começou a padecer de distúrbios comportamentais e emocionais, manifestados, por exemplo, em crises de choro constantes e súbitas.” (ponto 1 da matéria de facto não provada, acrescentamos nós) pois todas elas referiram o estado frágil e débil emocionalmente em que ficou o recorrente após ficar viúvo do primeiro casamento, como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso.
P - Além disso, do depoimento da testemunha Queiroz, na passagem da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso, que referiu a forma como antes do casamento a recorrida fazia tudo para agradar e iludir o recorrente para casar, deveriam ter sido dados como provados os seguintes factos:
8. A R., aproveitando da fragilidade psicológica e bem assim emocional do Autor, inicia manobras de ilusão, iludiu-o com falsas expectativas.
9. Ora, em virtude dessas manobras, o A. aceitou casar com a R.
Q - Quanto à parte mais emotiva e à relação propriamente dita enquanto marido e mulher ficou provado, pelo depoimento das testemunhas Manuel, Queiroz, Margarida, José, Maria como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso, que entre o recorrente e a recorrida nunca se consomou qualquer acto sexual nem tão – pouco qualquer acto de manifestação de carinho, muito pelo contrário.
R - Estas testemunhas relataram sem qualquer margem de dúvida a falta de afectos entre o casal e até a forma como o recorrente era maltratado pela recorrida, afirmando sem qualquer margem para dúvidas que entre ambos não houve qualquer acto sexual nem sequer beijo.
S- Daí que deveriam ter sido dado como provados os seguintes factos:
10. Sucede que, logo no primeiro dia de casamento, sem que nada o fizesse prever, a R. negou beijar o A.
(…)
12. Ademais, nessa mesma noite, 31 de Dezembro, a R., já em casa do A., negou-se a pernoitar no mesmo leito conjugal, dormindo em outro quarto.
(…)
14. A R., logo após a celebração do casamento, em virtude das suas acções – ou recusas – começou a mostrar-se fria e distante para com o A., negando-lhe qualquer demonstração de afecto e intimidade.
15. Já no segundo dia de casamento, 1 de Janeiro de 2014, a saiu de casa do A., logo pela manhã.
(…)
20. Ora, depois de o A. ter revelado tal facto, contou também que, depois da celebração do casamento, a R. se mostraria fria e distante e nem sequer havia dormido com ele.
(…)
24. Como tal, até à presente data, nunca se consumou qualquer acto sexual entre A. e R..
(…)
28. No quotidiano, a R. saía de casa do A. logo pela manhã, e raramente voltava para lá pernoitar.
29. A R., nas raras vezes que pernoitava em casa do A., dormia em quarto separado.
(…)
34. No entanto, a R. continuava a não pernoitar em casa do Autor.
35. Não tendo sido consumado qualquer ato sexual entre A. e R..
36. A R. mostrava-se sempre fria e distante do A.
(…)
59. Soube o A. e os seus familiares, que esse suposto “primo” era na verdade amante da ora R., mantendo com ela uma relação, enquanto esta era casada com o A.
(…)
66. O A., durante o tempo que ali permaneceu, contra a sua vontade, ouvia durante a noite gemidos e ruídos da R. em actos sexuais com o suposto “primo”, nada podendo o A. fazer.
(…)
76. A. e R. dormiam separados, não se tendo, a esta altura, consumado qualquer acto sexual entre eles.
77. Note-se que a R. coabitava, neste apartamento, com o seu suposto “primo”, que era na verdade seu amante.”
(…)
T - sendo os concretos pontos da matéria de facto que levam a que sejam eles dados como provados os depoimentos das testemunhas Manuel, Queiroz, Margarida, José, Maria como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso.
U - Pelo depoimento das testemunhas Queiroz e José Ficou provado também que o autor casou em segredo e que depois de vários episódios os filhos e nora se aperceberam que o recorrente havia sido enganado, sendo que quando se deram conta já o dinheiro existente em contas bancárias e em casa havia desaparecido sem ter sido o autor a usá-lo.
V - Alem disso, o tribunal a quo deveria ter dado como provado que:
(…)
18. O A., em completo desespero, dirigiu-se a casa do seu filho, José e da sua nora, Quitéria Queiroz, pedindo ajuda.
(…)
21. Face a isto, o filho e nora do A. rapidamente concluíram que este havia sido enganado R., tendo, de imediato, alertado o A. para esse facto.
(…)
37. Ademais, o A. descobriu que a R. havia levantado quantias monetárias deste, quantias essas que representam as economias de vida.
38. Após esta descoberta, e depois de alertado pelos filhos, o A. dirigiu à sua instituição bancária, Millenium BCP, com vista a consultar todos os movimentos desta conta, de forma detalhada.
(…)
40. Ora, o A. ficou em choque
(…)
43. O A. não fez este movimento bancário, não tinha também dele conhecimento, nem o autorizou.
(…)
47. A R. levantava o dinheiro da reforma do A., usando-o em exclusivo para si.
48. A R. levantou todo o dinheiro da conta do A. da Caixa Geral de Depósitos.
49. Bem como a totalidade do valor que o A. detinha na conta bancária do Millenium BCP.
50. Ora, o A. tinha cerca de 65000,00 e a Ré apropriou-se de todo este montante.
(…)
53.. O A. não sabe, nem nunca soube, como é que a R. usou este dinheiro de que se apropriou indevidamente,…”
W - Sendo os concretos pontos da matéria de facto que levam a que sejam eles dados como provados os depoimentos das testemunhas Manuel, Queiroz, Margarida, José, Maria como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso.
X - Mais se provou que a recorrida maltratava o recorrente que apenas se foi mantendo com ela pelo medo que lhe tinha, pois estava emocionalmente debilitado e sem força, sendo que ela o mantinha no quarto fechado, chegou a coloca-lo num lar e até a deixá-lo numa igreja – veja-se o depoimento de Queiroz, José, Manuel e Manuel.
Y - Assim, deveriam ter sido dado como provados os seguintes factos:
(…)
60. Naquele dia de Páscoa, a nora do A., Queiroz, revoltada e angustiada face às atitudes da R., desentende-se com ela.
61. Não obstante todo o enunciado, a R. endrominou o A. e conseguiu assim levá-lo consigo para o apartamento que detinha em Braga.
62. O A. … que se encontrava fraco e desidratado.
63. A R. manteve-o A. ali colocando-o num quarto fechado, durante uma semana.
64. O A. não conseguia dali sair pois as portas estavam trancadas e ninguém lhe ligava
(…)
69. O A. estava fraco e física e emocionalmente debilitado
(…)
73. A R. colocou o A. num lar de dia.
74.Onde o A. passava os seus dias,
75. Regressando ao apartamento da R. à noite.
(…)
78. Neste período, houve dias em que a R. colocava o A. numa igreja, deixando abandonando durante todo o dia.
79. O A. estava completamente enfraquecido, chegando ao ponto de nem conseguir andar.
(…)
Z - sendo os concretos pontos da matéria de facto que levam a que sejam eles dados como provados estes pontos, os excertos dos depoimentos das testemunhas Manuel, Queiroz, José e Maria como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso.
AA - Além destes, deveriam ter sido dado como provados os seguintes factos, tendo em conta os depoimentos das testemunhas Manuel, Queiroz, Margarida, José, como concretamente se afere nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso - que relataram a forma como o recorrente chegou, fraco, com fome, maltratado, mal vestido, fugido da casa da recorrida:
(…)
80. Sucede que, no dia 14-06-2014, o A. apareceu na residência do seu filho José e da sua nora, a chorar compulsivamente.
81. Para ali chegar, o A. veio, desde Braga, num táxi.
82. O A. dizia, naquele momento, que não tinha dinheiro e que queria a ajuda do filho e da nora.
83. E, não fosse a ajuda dos filhos, o A. teria caído na desgraça e miséria, dado a R. se ter apoderado indevidamente de todo o dinheiro do A.
84. O A., nunca teria casado com a R., se soubesse que, na verdade, nunca haveria entre eles verdadeiro casamento
85.O A. casou com a Ré porque esta lhe prometera ser uma pessoa livre e descomprometida, moralmente correta, além de lhe prometer amor, carinho, intimidade, companhia e solidariedade.”
BB - Veja-se, Exmos. Srs Juízes Desembargadores, no DEPOIMENTO do recorrente é de sublinhar que o mesmo referiu de forma peremptória e esclarecedora que “NÃO QUERIA CASAR”, só o tendo feito com a vontade viciada.
CC - A este propósito veja-se o seu depoimento, nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso, mas que aqui se dão por reproduzidas, em que o Autor AA de 16:20:41 a 16:27:39 do dia 12- 10-2016, instado pelo Sr Juiz refere: Juiz: pergunta o nome completo dele? A: António Augusto Ferreira Juiz: jura dizer a verdade as perguntas que lhe vão ser feitas? A: juro Juiz: pergunta se recorda quando ele decidiu casar com esta senhora? A: não sei. Juiz: não sabe o quê? Pergunta se percebeu o que lhe perguntei? A: percebi; Juiz: quando decidiu casar? A: eu não sei a quanto tempo vai; Juiz: eu queria saber quando é que decidiu casar com ela? A: não sei; Juiz: quando quis casar? A: É falso; Juiz: porque é que ele casou? A: é falso não sei estou confuso. Juiz: pergunta a quanto tempo está assim confuso? A: agora não sei responder não me queria casar
DD - Aliás, veja-se do depoimento da testemunha da própria Ré, a Sra. Maria de 16:58:41 a 17:14:40 do dia 29-09-2016, amiga chegada da Ré que, quando instada a propósito do casamento entre o Autor e a Ré refere: Mandatário A: pode se dizer que a senhora é chegada a dona Deolinda? T: sim Mandatário A: foi certamente convidada para este segundo casamento? T: não. Mandatário A: porque não? T: nem sabia quando era a senhora foi morar para a casa do senhor António.
EE - Veja-se a propósito Exmos. Srs. Juízes Desembargadores o testemunho do filho do Autor, o Sr José, nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso, mas que aqui se dão por reproduzidas, de 16:09:17 a 16:41:11 do dia 29-09-2016, que quando instado a propósito da vinda do Táxi para sua casa o seguinte: Mandatário A: o que o senhor disse antes tentou junto da GNR perceber se podia fazer alguma coisa que o seu pai estava a ser enganado o que a GNR disse? T: que não tinha hipótese que eram casados não interferiram e nunca mostraram abertura para resolver isso Mandatário A: e depois voltou para si? T: pediu comida e dormida e até tinha medo de sair de casa que numa altura ele andava nem de casa queria sair para fora Mandatário A: nesse episódio da chegada falou com ele? T: eu não falei nada a minha esposa é que viu o táxi e disse olha está ali o teu pai e a primeira coisa que disse é se emprestava dinheiro para pagar o táxi e custa a dizer isso que o meu pai não tinha necessidade dessas coisas vinha cheio de fome fazia parecer aqueles pretos de Africa a comer com os dedos e podia dizer comeis que o meu pai era esquisito ao comer era uma pessoa que gostava de comer bem e bom; Mandatário A: como é que ele estava fisicamente? T: só trazia os ossos e chegou a ser fechado num quarto.
FF - A sentença recorrida referiu que as testemunhas do autor, no seu geral, não demonstraram credibilidade e houve contradição e incoerências nos depoimentos prestados, sem, no entanto, apontar de forma concreta quais as contradições e incoerências existentes.
GG - Além disso entendeu o regresso do recorrente como tendo sido premeditado, sem sustentar tal afirmação, que na realidade é contrariada pelo depoimento das testemunhas que dizem que o recorrente fugiu de casa da recorrida tendo ido para casa do filho num táxi não tendo sequer dinheiro para pagar a prestação desse serviço, sendo certo que nem o filho sabia.
HH - Veja-se que quanto a este concreto facto que deveria ser dado como provado temos a testemunha nora do autor a Sra Queiroz, nas passagens da gravação da prova supra devidamente transcritas na motivação do presente recurso, mas que aqui se dão por reproduzidas, de15:22:20 a 15:55:58 do dia 29-09-2016 a mesma refere: T: sim até telefonamos para a polícia e ele disse que estava casado e que não tinha nada a que meter nariz Mandatário A: e depois o que aconteceu: apareceu lá em casa a chorar que lhe batia e lhe prendia num quarto e que no dia em que ele pôde fugir disse que ia a casa da filha e conseguiu fugir; Mandatário A: disse lhe a si pessoalmente que tinha conseguido fugir? T: sim (…) Mandatário R: quando chegou no táxi foi que dia? T: foi 12 e 14 foi no sábado; Mandatário R: pode nos descrever o dia? T: estava a chorar e perguntou pelo filho que não tinha dinheiro para pagar o táxi; Mandatário R: ele pagou o táxi e quem estava mais? T: e depois ligámos ao senhor doutor e depois chamamos as testemunhas e estava outro senhor que chegou depois)
II - No que ao erro de vontade diz respeito ficou provado que antes do casamento a recorrida era amável, fazia as tarefas domésticas e era afável para o recorrido sendo que quando os filhos se aperceberam que ela apenas estava interessada no dinheiro do recorrente, ela iludiu-o e casaram em segredo.
JJ - Após o casamento passou a tratá-lo mal, não houve a consumação de qualquer acto de carinho e sexual, sendo certo que a recorrida tinha um amante e o recorrente tinha medo dela e para que ela não o castigasse mais e/ou batesse ele escondia a realidade em que vivia.
KK - Quando já não mais aguentou, fugiu e pediu auxílio ao filho e à nora sendo que sentença recorrida acaba por se referir que aquando do depoimento do recorrente se denotou a sua incapacidade física e mental, apesar de não comprovada medicamente.
LL - Assim sendo, o tribunal deveria ter dado como provado os factos que deu como não provado, mormente os factos descritos em 10;12;15;18;20:21;24;28;29;34;35;36;37;40;43º;47;48;49;50;53;59; 61º, 62º, 64º68º, 66; 73; 74; 75; 76;77; 80 a 85º; dos factos não provados, dando-os como provados, e, em consonância condenar a Ré nos seus precisos termos.
MM - O tribunal recorrido ao ter dado como não provados os factos vertidos em em10;12;15;18;20:21;24;28;29;34;35;36;37;40;43º;47;48;49;50;53;59; 61º, 62º, 64º68º, 66; 73; 74; 75; 76;77; 80 a 85º incorreu num erro de julgamento sobre os aludidos concretos pontos de facto, os quais poderão ser alterados por este Tribunal Superior (cfr. artigo 640,n.° 1 als. a) e b) e 662°, n.°s 1 e 2 do C.P.Civil), pois as aludidas provas testemunhal e documental necessariamente imponham uma decisão diversa.”
*
Quanto a esta matéria de facto considerada como não provada, o Tribunal fundamentou a sua decisão da seguinte forma:
(incluindo-se a fundamentação geral que também tem pertinência para a matéria de facto aqui em discussão)
2.3. FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
O Tribunal fundou a sua convicção nos elementos probatórios infra e supra citados, apreciados globalmente, à luz das regras da experiência comum e dos arts. 342º, do Código Civil, e 414º do Código de Processo Civil.
Desde logo, tivemos em conta os documentos autênticos anotados.
No restante, considerámos o que resulta ser minimamente coerente e seguro do depoimento das testemunhas ouvidas, atendendo à análise crítica infra enunciada.
A primeira testemunha ouvida, Manuel, não tem para nós qualquer credibilidade. Apresenta um discurso essencialmente indirecto, pobre razão de ciência ou conhecimento do Autor e suas circunstâncias e contradição com os demais, alegados, presentes (v.g., o vizinho Manuel) no “importante” momento em que, como confessou a nora do Autor, terão arrolado testemunhas para alegadamente presenciarem o suposto retorno do mesmo a Marrancos no remate final da relação conjugal em causa.
Já a testemunha Manuel, vizinho do Autor e do seu filho, pareceu-nos ter algum conhecimento do que aconteceu sumariamente entre aquele e a Ré, afirma que se conheceram como empregada e patrão e fala, com alguma imprecisão, sobre a sua presença por lá, com omissão, pareceu-nos interessada ou conveniente, em grandes pormenores sobre tal relacionamento. Diz essa testemunha que assistiu ao referido retorno enfraquecido do Autor a casa, mas aquilo que diz ter presenciado é para nós pouco para confirmar tal episódio que teria começado com uma alegada fuga do mesmo de Braga, que a final não nos convenceu, até pela forma como esta e outras pessoas terão sido expressamente convocadas para assistirem a esse suposto episódio com premeditada intenção, como revelou a nora do Autor.
Igual tipo de crítica nos merece o depoimento da testemunha Margarida, outra vizinha chamada para assistir ao referido retorno, que pouco mais acrescentou de relevante.
No que diz respeito às testemunhas Queiroz, nora do Autor, e José, filho do mesmo, temos um depoimento mais completo, que no entanto, não deixa de ser essencialmente indirecto em todos os aspectos que dizem respeito à alguma vivência privada do casal, que reproduziram em audiência (nota-se que tiveram pouco contacto com o casal para o conhecerem directamente), apresentam em geral uma posição inflamada e natural ou convenientemente interessada, incoerente com a que ficou articulado na p.i., v.g., quanto ao momento e forma como é conhecido o casamento do Autor, em alguns aspectos contrariado pelo depoimento das testemunhas arroladas pela Ré, à cronologia do conhecimento do suposto embuste e às capacidades mentais e físicas do Autor (considerado apto, autónomo e respeitado como tal, pela versão que estas testemunhas revelam!) na altura do casamento e durante o mesmo. É aliás, ainda hoje estranha para nós, a versão dos mesmos, que aponta para um reincidente retorno do Autor à casa da Ré, sempre avisado pelos mesmos, sem qualquer reacção assertiva do próprio ou destes familiares o que gera grandes dúvidas sobre a coerência da sua versão! Acresce, nomeadamente quanto à suposta actividade financeira da Ré junto do património do Autor, que, à boa maneira portuguesa, o Autor não suportou alguma das afirmações feitas em qualquer prova documental que nos levasse a conferir os factos graves que foram imputados à Ré, nesse contexto de íntima relação dos mesmos com o Autor.
Das testemunhas Maria e Maria, conhecidas da Ré, retemos uma versão que contradiz a do Autor em alguns aspectos e é, por outro lado, coerente, com a insistência do mesmo em voltar à residência da mulher com quem escolheu casar.
Das declarações do Autor, recordamos a aparência de incapacidade física e mental que não foi comprovada medicamente e que temos sérias dúvidas que corresponda ao seu estado actual, sendo certo que o que veio fazer a Tribunal e à audiência de julgamento em nada contribuiu, por isso, para esclarecer alguma coisa, como era sua obrigação!
Nos factos não provados, temos em conta a falta de prova dos mesmos ou a dúvida que a prova produzida, por quem tinha o ónus de os demonstrar, gerou, pelas razões já acima enunciadas. Repete-se: o Autor suportou a sua demanda em depoimentos de pessoas que alegadamente assistiram a um episódio isolado da vivência do Autor, que não deixou de ter contradições, e de outras, familiares do mesmo, que têm uma relação notoriamente adversa com a Ré, com contradições e incoerências que nos levaram a descredibilizar o pouco que conheciam directamente dos cerca de 100 articulados do Autor.
Em especial quanto ao elemento subjectivo subjacente à declaração de casamento, tal prova é claramente insuficiente para afectar o declarado e firmado em documento autêntico e presumida nos termos do art. 1634º, do Código Civil.”
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Cumpre decidir.
Conforme se referiu, em sede de Impugnação da matéria de facto, importa reapreciar os meios de prova produzidos na presente acção quanto aos concretos pontos da matéria de facto questionados pelo Recorrente.
Vejamos, então, se da prova produzida se pode, ou não, concluir de forma diferente daquela que foi a conclusão do Tribunal Recorrido.
Ora, adianta-se já que tendo-se procedido à ponderação dos elementos probatórios pertinentes à averiguação da matéria de facto aqui questionada, ou seja, tendo-se procedido audição da prova produzida, nomeadamente dos depoimentos do próprio Autor e da prova testemunhal produzida e pertinente à factualidade aqui em apreciação, e tendo em consideração a prova documental junta aos autos (mencionada na matéria de facto), da conjugação de todos estes elementos probatórios, a conclusão a que se tem chegar é justamente aquela a que chegou o Tribunal de Primeira Instância.
Na verdade, fazendo a análise crítica e conjugada dos aludidos elementos probatórios, não pode o presente Tribunal divergir do juízo probatório efectuado pelo Tribunal de Primeira Instância.
Senão vejamos.
Tendo-se procedido à audição da prova produzida, e ponderando, nomeadamente, os depoimentos das testemunhas Manuel, amigo do filho do Autor, Manuel, vizinho do Autor e do seu filho, Margarida, vizinha, Queiroz, nora do Autor, e José, filho do Autor- testemunhas em cujo depoimento o Recorrente funda a sua divergência- verifica-se que, como muito bem evidenciou o Tribunal Recorrido, se tratam de testemunhas que não denotaram ter conhecimento directo e pessoal da maior parte dos factos aqui questionados (os que contendiam com o relacionamento que se estabeleceu entre o Autor e a Ré, antes e durante o casamento).
Por outro lado, importa ainda dizer que essas testemunhas, quanto a essa matéria de facto e à restante factualidade dada como não provada aqui questionada, prestaram depoimentos claramente interessados e parciais- o que permite concluir também que os depoimentos prestados não merecem credibilidade.
Assim, por exemplo:
- As testemunhas Manuel e Manuel referiram, desde logo, que não conheciam a Ré, nem acompanharam a vida do casal …;
- A testemunha Queiroz, casada com o filho do Autor, esclareceu que (antes do casamento) o sogro estava “fino”, fazia a vida dele e as contas, e só depois do acidente é que “nunca mais ficou bem”; por outro lado, esclareceu que, apesar de alegadamente saber que o sogro estaria a ser maltratado e terem ido à polícia, esta “nunca escreveu” (sendo que, segundo afirma, só efectuaram a queixa depois de o Autor ter ido lá para casa) - o que, obviamente, não é credível; finalmente, o seu depoimento é também esclarecedor quanto às circunstâncias em que ocorreu o episódio do táxi (Pergunta do Exmo. Mandatário do Réu: “Ele pagou o táxi e quem estava mais? Resposta da testemunha: depois ligámos ao Sr. Doutor e depois chamámos as testemunhas e estava outro senhor que chegou depois…”
- A testemunha Margarida referiu: perguntada sobre a conduta do Autor enquanto casado com a primeira mulher: “Enquanto foi casado nunca ouvi coisa mal dele; Depois do período de viúvo? Isso não sei…”; e mais à frente: “A senhora alguma vez falou com o senhor Ferreira sobre o casamento dele? Eu não falei disso a ninguém e depois nunca conversei com ele… eu nunca mais o vi desde que ele foi, nunca mais os vi em Marrancos”;
- A testemunha José, filho do Autor, é também esclarecedora quanto à sua motivação: “foi o dinheiro todo mas eu estou aqui mas eu quero que essa senhora seja punida e que anule o casamento; eu não quero dinheiro nenhum porque não é só dinheiro; é ouro alianças que eu paguei e a minha irmã dos 50 anos de casado e o património da minha mãe”…;
*
Pode-se ver, assim, com estes exemplos que, de facto, a prova produzida pelo Autor, nomeadamente, as testemunhas em que funda a sua divergência, além de não denotarem ter conhecimento dos factos aqui questionados (em particular, as testemunhas não familiares do Autor), prestaram depoimentos que não podem merecer qualquer credibilidade (no caso das testemunhas familiares pelas motivações subjacentes às declarações que prestaram que patenteiam a sua falta de isenção)
Nessa medida, e pelas exactas mesmas razões que já tinham sido invocadas pelo Tribunal Recorrido, pode o presente Tribunal concluir que o juízo fáctico efectuado na Primeira Instância mostra-se conforme com a prova produzida, nomeadamente porque o Autor não logrou demonstrar com a prova testemunhal, por si carreada para o processo, nem com as declarações do próprio Autor, os factos que se propunha provar, sendo certo que tal prova lhe incumbia nos termos do art. 342º, nº 1 do CC (cfr. ainda arts. 1364º e 344º e 350º, nº 2 do CC).
Nesse sentido, aponta, aliás, também a prova testemunhal arrolada pela Ré – depoimento das testemunhas Maria e Maria - de onde decorre uma versão dos factos precisamente contrária àquela que foi apresentada pelas testemunhas arroladas pelo Autor (no que concerne ao tratamento que a Ré dava ao Autor).
Por exemplo, a testemunha Maria - vizinha do apartamento onde residiu o Autor e que aí conheceram a Ré- referiu:” Acha que o Sr. estava angustiado”; resposta da testemunha: “Não; ele estava feliz porque ele dizia abençoada a hora (em que) encontrei a Rosinha; acho que foi na segurança social; acho que ela tratava dele e depois eu gostei muito dela e pediu-lhe em casamento…” e mais à frente: “não ele sabia o que estava a dizer e ele dizia isto é para a minha rosinha e o senhor estava muito bem tratado”.
E a testemunha Maria que também se pronunciou no mesmo sentido.
Neste ponto, importa acrescentar que estes últimos depoimentos merecem também credibilidade porque se mostram corroboradas pela factualidade apurada que contende com o facto de o Autor ter regressado à residência da Ré em diversas ocasiões.
Por outro lado, também não se pode deixar de relevar o facto de não ter sido junto aos autos qualquer prova documental atinente à alegada “apropriação” por parte da Ré de quantias significativas que pertenceriam ao Autor, nem quanto às alegadas participações policiais de alegados maus tratos infligidos pela Ré ao Autor (o que, como se disse, não é minimamente credível atenta a natureza dos alegados crimes que poderiam ser imputados à Ré).
Assim, da conjugação desses depoimentos e dos demais elementos probatórios, e da sua análise crítica resulta que, contrariamente ao que pretende o Autor, este não logrou minimamente provar que a sua vontade de celebrar o contrato de casamento estivesse viciada por erro.
E esta conclusão do Tribunal Recorrido, como já se disse, não pode ser posta em causa pela prova apresentada pelo Autor, nomeadamente, pelos depoimentos prestados pelas testemunhas Queiroz e José, já que estas testemunhas prestaram depoimentos interessados (e não isentos), e é assim, mesmo que estes depoimentos sejam conjugados com os depoimentos das testemunhas Manuel, Manuel, e Margarida, pois que estas últimas revelaram, também elas, nas declarações que prestaram um conhecimento indirecto e muito limitado da factualidade aqui em discussão.
A tudo isto acresce o facto de estes depoimentos testemunhais terem sido contraditados pelas testemunhas acima referidas, arroladas pela Ré, que prestaram depoimentos com maior credibilidade, atenta a sua maior isenção e o maior conhecimento que denotaram ter dos factos aqui em discussão.
De todas estas considerações resulta, assim, que, como concluiu o Tribunal de Primeira Instância, o Autor não logrou efectuar prova dos factos que consubstanciavam a sua pretensão, no que concerne ao alegado erro, sob o qual teria celebrado o casamento com a Ré, e nomeadamente, não logrou provar, com a prova que produziu (que não produziu), qualquer um dos factos 1 a 85 considerados como não provados pelo Tribunal Recorrido, os quais se devem manter, assim, na matéria de facto considerada como não provada.
De referir que, em face do soçobrar da prova por parte do Autor, quanto aos factos aqui questionados, nem sequer se torna necessário invocar aqui as considerações, atrás já evidenciadas, que propendem para concluir que “ … em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte… “(28).
Aqui chegados, pode-se, assim, concluir quanto à presente Impugnação da matéria de facto que, à luz do antes exposto, e com base nos meios de prova antes citados, a convicção (autónoma) deste tribunal, em sede de reapreciação da matéria de facto é, em absoluto, coincidente com a que formou o tribunal recorrido, não se vislumbrando qualquer razão para proceder à alteração do ali decidido, que se mantém na íntegra.
Na verdade, e não obstante as críticas que lhe são dirigidas pelo ora Recorrente, não se vislumbra, à luz dos meios de prova invocados, um qualquer erro ao nível da apreciação ou valoração da prova produzida – sujeita à livre convicção do julgador –, à luz das regras da experiência, da lógica ou da ciência.
Ao invés, a convicção do julgador colhe, a nosso ver, completo apoio nos ditos meios de prova produzidos, sendo, portanto, de manter a factualidade não provada, tal como decidido pelo tribunal recorrido.
Conclui-se, pois, que compulsada a prova produzida, tendo em conta as regras do ónus da prova, e conjugando os depoimentos das testemunhas atrás mencionadas com os demais elementos probatórios atrás referidos não podem restar dúvidas que os factos constantes do ponto 1 a 85 da matéria de facto não provada devem manter-se inalterados, confirmando-se a análise crítica efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância quanto a essa factualidade
Em consequência, improcede a apelação nesta parte.
*
Aqui chegados, importa verificar se, independentemente de não se ter procedido à alteração da matéria de facto no sentido propugnado pelo Recorrente deve manter-se a apreciação de mérito efectuada pela Decisão Recorrida, em face da matéria de facto dada como provada.
Ora, ponderando essa questão, é evidente que, não existindo qualquer modificação na matéria de facto considerada provada (porque se manteve inalterada a matéria de facto não provada), nenhuma crítica pode ser apontada à decisão de mérito proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, já que aí bem se ponderou o ónus de prova que recaía sobre o Autor e que o mesmo manifestamente não logrou cumprir (art. 342º, nº 1 do CC; cfr. ainda arts. 1364º e 344º e 350º, nº 2 do CC).
Na verdade, pode-se aqui manter na íntegra a fundamentação de direito que o Tribunal de Primeira Instância desenvolveu na sentença que proferiu.
Para tanto, basta atentar que a matéria de facto julgada como não provada consubstanciava a factualidade que se encontrava subjacente à pretensão do Autor para considerar que a sua vontade de celebrar o casamento com a Ré se mostrava viciada por erro (art. 1631º do CC).
Mas a isto acresce ainda que:
“… De acordo o citado art. 1634º, do Código Civil, a declaração de vontade no acto da celebração, como aquela que foi apurada supra em 2.1.6., faz presumir que a sua vontade não está viciada por erro ou coacção.
Tinha, por isso, o Autor que elidir esta presunção no seu esforço argumentativo e probatório (cf. arts. 344º e 350º, nº 2, do Código Civil) e julgamos que não o conseguiu, em face da factualidade que ficou apurada supra.
De resto, é preciso notar, que mesmo na sua versão dos acontecimentos, a demonstrar-se, ou na que as testemunhas, diversamente, apresentaram em audiência (maxime o seu filho e nora), haveria que atender ao prazo de caducidade previsto no art. 1645º, do Código Civil: recorda-se que de acordo com a mesma, em cerca de 3 anos de casamento, o Autor insistiu em conviver maritalmente com a Ré, apesar de todas adversidades e falsidades, que invocou, que teriam começado no dia a seguir ao casamento, e dos avisos que se esqueceu de referir mas foram lembrados por essas testemunhas, anteriores e posteriores ao casamento.
Deste modo, por não ter cumprido o ónus previsto no art. 342º, do Código Civil, deve improceder o seu pedido de anulação”.
*
Nesta conformidade, e sem necessidade de mais alongadas considerações, porque se concorda com a fundamentação de direito aduzida pelo Tribunal de Primeira Instância decide-se manter a decisão proferida no que concerne à improcedência do pedido formulado pelo Autor.
Improcede, também, nesta parte o Recurso interposto.
*
III – DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar:
-o Recurso interposto pelo Autor/Recorrente totalmente improcedente;
*
Custas pelo Recorrente (artigo 527.º nº 1 do CPC);
Notifique.
*
Guimarães, 14 de Junho de 2017


(Dr. Pedro Alexandre Damião e Cunha)
(Dra. Maria João Marques Pinto de Matos)
(Dra. Rita Maria Pereira Romeira)


1.V. ac. da RP 19.5.2014 (relator: Manuel Fernandes), in dgsi.pt.
2.In “Manual de Processo Civil”, pg. 686;
3.In “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. II, págs. 668 e 669.
4.Neste sentido, v. Alberto dos Reis, in “CPC Anotado”, vol. V, pág. 140 e Antunes Varela, in, “Manual de Processo Civil”, pág. 669.
5.Cfr. Antunes Varela, obra citada pág. 670.
6.Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo CPC”, pág. 265;
7.In “Estudos de processo civil”, pág. 348.
8.Azevedo Brito citado por A. Geraldes, in “Temas da reforma do processo civil”, Vol. II, pág. 242.
9.Henrique Araújo, in “A matéria de facto no processo civil (da petição ao julgamento”.
10.V., por exemplo, Ac. do STJ de 25.03.2004 (relator: Santos Bernardino) in dgsi.pt
11.V. por ex. Ac. do STJ de 14.06.1972, in BMJ 218, pág. 208
12. Abrantes Geraldes, ob. cit., II Volume, pág. 263.
13. Abrantes Geraldes, ob. cit., II Volume, pág. 264.
14. Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo CPC”, pág. 266;
15. In “A acção declarativa comum”, pág. 321, nota 13;
16. In “Recursos no Novo Código de Processo Civil“, pág. 139-140;
17. In “Recursos no Novo Código de Processo Civil“, pág. 133;
18.Vide, neste sentido, por todos, A. Geraldes, págs. 141.
19.Abrantes Geraldes, In “Recursos no Novo Código de Processo Civil“, pág. 133;
20.V. Ac. do Stj de 24.9.2013 (relator: Azevedo Ramos) publicado na DGSI e comentado por Teixeira de Sousa, in “Cadernos de Direito Privado”, nº 44, págs. 29 e ss.;
21.Pode inclusivamente, verificados determinados requisitos, ordenar a renovação da prova (art. 662º, nº2, al a) do CPC) e ordenar a produção de novos meios de prova (al b));
22.Abrantes Geraldes, In “Recursos no Novo Código de Processo Civil“, pág. 266 “ A Relação actua como Tribunal de substituição quando o recurso se funda na errada apreciação dos meios de prova produzidos, caso em que se substitui ao tribunal de primeira Instância e procede à valoração autónoma dos meios de prova. Confrontada com os mesmos elementos com que o Tribunal a quo se defrontou, ainda que em circunstâncias não totalmente coincidentes, está em posição de formular sobre os mesmos um juízo valorativo de confirmação ou alteração da decisão recorrida… “;
23.De facto, “é sabido que, frequentemente, tanto ou mais importantes que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, etc.”- Abrantes Geraldes in “Temas de Processo Civil”, II Vol. cit., p. 201) “E a verdade é que a mera gravação sonora dos depoimentos desacompanhada de outros sistemas de gravação audiovisuais, ainda que seguida de transcrição, não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que, porventura, influenciaram o juiz da primeira instância” (ibidem). “Existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores” (Abrantes Geraldes in “Temas…” cit., II Vol. cit., p. 273).
24.Miguel Teixeira de Sousa in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 348.
25.Cfr. acórdãos do STJ de 19/10/2004, CJ, STJ, Ano XII, tomo III, pág. 72; de 22/2/2011, CJ, STJ, Ano XIX, tomo I, pág. 76; e de 24/9/2013, disponível em www.dgsi.pt.
26.Cfr. Ac. do S.T.J. de 3/11/2009, disponível em www.dgsi.pt.
27.Segundo Ana Luísa Geraldes, in “ Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto” (nos Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas) Vol. I, pág. 609 “ Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte… “; no mesmo sentido, v. Miguel Teixeira de Sousa, in “Blog IPPC” (jurisprudência 623- anotação ao ac. da RC de 7/2/2017) onde refere: “É verdade que os elementos de que a Relação dispõe não coincidem -- nomeadamente, em termos de imediação -- com aqueles que a 1.ª instância tinha ao dispor para formar a convicção sobre a prova do facto. No entanto, isso não significa que, como, aliás, o STJ tem unanimemente entendido, nem que a Relação esteja dispensada de formar uma convicção própria sobre a prova do facto, nem que funcione uma presunção de correcção da decisão recorrida. Importa, pois, verificar quais os elementos que devem ser considerados pela Relação para a formação da sua convicção sobre a prova produzida. Quanto a estes elementos, há uma diferença entre a 1.ª instância e a Relação: a 1.ª instância apenas dispõe dos meios de prova; a Relação dispõe daqueles meios e ainda da decisão da 1.ª instância. Como é claro, esta decisão, cuja correcção incumbe à Relação controlar, não pode ser ignorada por esta 2.ª instância. É neste sentido que se pode afirmar que, no juízo sobre a confirmação ou a revogação da decisão da 1.ª instância, a Relação pode utilizar um critério de razoabilidade ou de aceitabilidade dessa decisão. Este critério conduz a confirmar a decisão recorrida, não apenas quando for indiscutível que a mesma é correcta, mas também quando aquela se situar numa margem de razoabilidade ou de aceitabilidade reconhecida pela Relação. Correspondentemente, a decisão deve ser revogada se a mesma se situar fora desta margem.”;
28.Ana Luísa Geraldes, in “ Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto” (nos Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas) Vol. I, pág. 609;