Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
532/17.1T8VCT.G1
Relator: PEDRO DAMIÃO E CUNHA
Descritores: ADIAMENTO DA AUDIÊNCIA
JUSTO IMPEDIMENTO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/15/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. Tendo a Exma. Mandatária da Ré comunicado ao Tribunal, previamente ao início da Audiência Final, o seu impedimento, por ocorrência de doença súbita e incapacitante (que apenas veio a comprovar no dia seguinte), impunha-se o adiamento da respectiva realização, de acordo com o disposto no artº 603º do Código de Processo Civil, por existir inequívoco motivo para se considerar existir um caso de justo impedimento (art. 140º do CPC) susceptível de funcionar como sua causa de adiamento, mesmo em caso de acordo prévio da data designada.

II. Nestas circunstâncias, a Exma. Mandatária, não estando ainda munida de documento comprovativo do impedimento legítimo alegado, deve convencer o Juiz da seriedade do motivo invocado com vista ao adiamento da diligência, sem prejuízo de posteriormente, no mais curto prazo ou logo que possível, remeter o documento justificativo da sua ausência, não lhe sendo exigível que o faça com aquela comunicação”.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

A. Fernandes instaurou acção de divórcio contra M. Fernandes pedindo a dissolução do casamento entre ambos celebrado.

Invoca, para tanto, haver emigrado para a Suíça "há mais de dez anos" e haver também a Ré emigrado para a Suíça "logo depois", passando, desde então, a viver em moradas separadas, e deixando de partilhar cama, mesa, projectos e economias.

E conclui pela verificação da separação de facto, para efeito do artigo 1781º, al. a) CC.
Não sendo sucedida a tentativa de conciliação, veio a Ré juntar douta contestação, concluindo pela improcedência do pedido.
Segundo ela, o A "há algum tempo emigrou para a Suíça" e ela mesma também "acabou por emigrar para a Suíça", consensualmente, para procurar vida mais desafogada.
O A. nesse país mora em Lausanne, Rue …, e ela, em Chemin …, lugares diferentes "apenas ... devido aos empregos que lá têm", continuando, todavia, a morada da família a ser na casa de Vila Mou, Viana.
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Organizada a matéria de relevo para instrução sem audiência prévia, veio esta a efectuar-se a requerimento da Ré, servindo apenas para agendamento da data para audiência final.
Na data que havia sido designada, por acordo, constatou-se a ausência das partes e das testemunhas, pelo que veio a Audiência a ser agendada, em conformidade com a disponibilidade dos Exmos. Mandatários, para o dia 2/11, atenta a expectativa de ultimação dos acordos para convolação do Divórcio.

Nesta data, não compareceu nem a Ré, nem nenhum dos seus Exmos. Mandatários.
No entanto, previamente ao início da Audiência final (pelas 10 h 55 m), a Exma. Mandatária da Ré veio:

“… requerer o adiamento da diligência nos termos do art. 603 do NCPC por justo impedimento… “, indicando os respectivos fundamentos que aqui se dão por reproduzidos.
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Tal requerimento foi desatendido, em sede de início da Audiência Final (2 de Novembro de 2017, pelas 11 h 15 m), tendo o Tribunal Recorrido proferido o seguinte despacho:

“…“A Il. Mandatária da R. veio, antes do início da audiência, requerer o adiamento da diligência, por justo impedimento, alegando para tanto que perdeu os sentidos no escritório, tendo sido levada ao hospital. Dos restantes il. mandatários, um estará em julgamento e outro estará fora de Viana. A R constituiu quatro il. Mandatários (fls. 42). A audiência esteve agendada para 13/10 e, na ocasião, visando desfecho consensual e necessitando as partes de tempo para ultimar os respectivos acordos, foi designada nova data para audiência, o presente dia, com o concurso dos Il. Mandatários das partes (fls. 82). Atento o assentimento para a nova data, a ausência de Il. Advogado não é fundamento para o pretendido adiamento (art. 603º, nº 1 CPC). A R tem vários mandatários constituídos e apenas a um deles é atribuída ocupação em diligência. O invocado desmaio não está localizado no tempo e não está identificada a eventual inaptidão subsequente. Para eventual aproveitamento de “justo impedimento”, teria ainda que ser logo trazida a prova respectiva (art. 140º nº 2 CPC) coisa que não sucedeu. Não atendemos ao que vem solicitado pela R.”
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Na sequência, realizou-se, então, a Audiência final, sem a presença da Exma. Mandatária da Ré (nem de qualquer outro Mandatário desta).
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Antes da sentença ser proferida, veio a Exma. Mandatária ainda apresentar os seguintes requerimentos:

- a fls. 96 a 100 (3.11.2017, pelas 9 h 03 m)– requerendo a junção da prova documental que havia protestado juntar ( 7 documentos- entre os quais os seguintes: a) Atestado médico a declarar a impossibilidade da presença da mandatária dia 02 de Novembro de 2017. b) Recibo e comprovativo de exames de cardiologia realizados na referida data; c) Declaração emitida pelos serviços administrativos do Hospital de Viana do Castelo)
Termina o requerimento, pedindo que:
“Deve ter-se por justificado o justo impedimento”.
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- a fls. 102 a 106 (7.11.2017, pela 14 h 12 m)- onde conclui da seguinte forma:
“Nestes termos e porque justificada a falta, sendo o motivo da falta atendível e comprovado documentalmente de modo tempestivo, invoca-se a nulidade do julgamento nos termos do art. 195º do CPC, ou, assim não se entendendo, pretende-se a repetição do acto de inquirição das testemunhas por cumprimento do disposto no art. 155º do CPC”
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Previamente à sentença (na mesma peça processual), veio, então, o Tribunal Recorrido pronunciar-se sobre o aludido requerimento:

“Fls.102:

A R. invoca a nulidade do julgamento - ou assim não se entendendo, pretende a repetição - da inquirição das testemunhas por cumprimento do artigo 155º do CPC.

Alega para tanto o impedimento da Il. Mandatária na data da audiência e o envio, logo no dia seguinte, de atestado médico. Entende que a audiência deveria ter sido adiada e que a realização daquela sem a sua presença gera nulidade.
A questão da ausência da Il. Mandatária foi apreciada logo após a chegada (10:55 horas do dia 2/11) do correio electrónico de fls. 9293 ao início da audiência agendada para 2/11 pelas 11:15 horas (fls. 94).

Foi considerado o agendamento consensual para 2 de Novembro pelas 11:15 horas (a 13/10, fls. 81) e a impossibilidade de se considerar eventual existência do justo impedimento, por não ser logo oferecida a prova respectiva (art. 140º, nº 2 CPC). O adiamento, face ao concurso das partes para a eleição da data, não era admissível e a causa teria que prosseguir a tramitação normal, mesmo na falta da Il. Mandatária (art, 603º, nº 1 CPC).

Não foi praticado acto não admitido por lei, nem foi omitida formalidade imposta por lei, pelo que não se pode atender à arguida nulidade (art. 195º, nº 1 CPC).
Não atendemos ao que vem requerido pela R. “
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Segue a sentença que, a final, veio a julgar “procedente o pedido e decretar o divórcio, declarando dissolvido o casamento celebrado entre António e Maria”.
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É justamente destas decisões que a Recorrente veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:

“CONCLUSÕES:

1. Vem o presente recurso interposto da decisão que determina que após não ter sido adiado julgamento, avisando a mandatária da falta e justificando no dia seguinte: “não foi praticado acto não admitido por lei nem foi omitida formalidade imposta por lei pelo que não se pode atender à arguida nulidade (art. 195º nº 1 CPC). Não atendemos ao que vem requerido pela R.”
2. Foi entre mandatários concertada a data para audiência de discussão contudo, na data designada, a mandatária perdeu os sentidos no escritório, tendo sido dirigida ao serviço de urgências do Hospital Particular V.
3. Não obstante, e de imediato, em cumprimento do número 5 do artigo 151º do CPC foi providenciado pelo escritório avisar o tribunal pelos meios mais expeditos da falta: a funcionária telefonou para o Tribunal, enviou correio electrónico para que a informação fosse recebida igualmente e de imediato por escrito, bem como enviou o requerimento pelo Citius de modo a instruir o processo correctamente.
4. Foi informado o Tribunal do impedimento da mandatária bem como dos demais advogados constantes da procuração: um por se encontrar em julgamento em Braga, outro por não contar com o impedimento da Colega se encontrar fora da Comarca, não conseguindo estar em Viana do Castelo antes das 15 horas, e outra por se tratar de advogada estagiária sem poderes para o acto.
5. No dia seguinte, dia 03 de Novembro de 2017 às 09:03, antes de ter a acta disponível no citius, e portanto sem saber que a audiência teria sido realizada, são enviados para o tribunal os documentos datados respeitantes à justificação da falta, bem como do justo impedimento.
6. Quando a mandatária teve acesso à acta de julgamento, e portanto, teve conhecimento que a diligência foi efectuada, enviou requerimento para o Tribunal alegando nulidade de julgamento nos termos do 195º do código de processo civil, requerendo a reinquirição das testemunhas e portanto a renovação da prova produzida.
7. A nulidade bem como a reinquirição das testemunhas foi indeferida.
8. Manteve-se a decisão em despacho proferido previamente à sentença, indeferindo-se a arguida nulidade e indeferindo-se a reinquirição das testemunhas.
9. Ora, salvo o devido e merecido respeito não concordamos nem podemos concordar com a posição seguida pelo Tribunal a quo. Tal decisão, no entender da recorrente viola o princípio constitucional de que todos têm direito ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade (artigo 20º).
10. Sendo obrigatória a presença de mandatário, estando o mandatário constituído INJUSTIFICADAMENTE ausente na audiência de discussão e julgamento, terá o tribunal que prover pela nomeação de patrono nomeado, conforme o número 3 do artigo 51º do CPC, caso não tenha comparecido justificadamente, deverá ser a audiência adiada nos termos do número 4 do artigo 151º do CPC. Nos presentes autos não se optou por nenhuma das soluções, tendo sido efectuado julgamento sem estar presente a parte ou qualquer advogado que a represente.
11. Assim, entende-se haver nulidade de julgamento nos termos do artigo 195º do CPC.
12. Cumpriu a mandatária escrupulosamente as exigências legais no que tange à comunicação da falta e justificação do impedimento (nº 5 do art.155º do CPC e bem ainda artigo 603º do CPC).
13. Assim, e por jurisprudência concertada dos Tribunais superiores “Ao ter-se realizado o julgamento sem a presença da mandatária dos recorrentes e porque essa falta influi na decisão da causa, o julgamento terá de ser considerado nulo.”– Vide Ac. do Tribunal da Relação de Évora de 05-05-2016, in www.dgsi.pt.
14. Mesmo assim não se concedendo, e conforme acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19-01-2012 “2. Os depoimentos são obrigatoriamente gravados e o ilustre advogado faltoso tem direito a nova inquirição, se alegar e provar que não compareceu por motivo justificado que o impediu de dar cumprimento ao disposto no n.º 5 do artigo 155.º do CPCivil.”, solução requerida pela recorrente e indeferida.
15. Ora, a falta de mandatário poderá influir na decisão da causa, e, como tal, deverá ter-se como nulo o julgamento nos termos do número 1 do artigo 195º do CPC, anulando-se também os termos subsequentes, ou assim não se entendendo deverá ser dada a oportunidade à mandatária para nova inquirição das testemunhas.”
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Foram apresentadas contra-alegações pelo Recorrido, onde pugna, sem novos argumentos, pela improcedência do Recurso.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação, a Recorrente coloca as seguintes questões que importa apreciar:

1. saber se a Audiência Final devia ter sido adiada, atendendo a que a Exma. Mandatária da Ré invocou justo impedimento;
2. ou se, mesmo no caso de não haver fundamento para o adiamento, tem a Ré direito a nova inquirição das testemunhas.
- tudo com a consequência de se dever ter como nulo o julgamento efectuado nos termos do nº 1 do art. 195º do CPC, anulando-se também os termos subsequentes (nomeadamente, a sentença).
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
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Os factos relevantes para a apreciação e decisão do presente recurso são os que constam do relatório elaborado.
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B)- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Já se referiu em cima quais são as questões que importa aqui decidir.

Comecemos pela questão do adiamento da Audiência Final.

Como decorre do disposto no art. 932º do CPC, nas acções de Divórcio sem o consentimento do outro cônjuge, decorrido o prazo para a apresentação da contestação, seguem-se os termos do processo comum.

Nesta sequência, é pacífico que são aqui aplicáveis, então, as regras processuais estabelecidas para as ditas acções de processo comum, nomeadamente, para o que nos interessa, as regras previstas no art. 603º do CPC para a realização da Audiência Final.

Vejamos então quais são as situações que o legislador aí previu como causa de adiamento (de não realização) da Audiência Final.

Façamos o enquadramento geral da questão.

De acordo com o art. 151º, nº 1, do CPC, “a fim de prevenir o risco de sobreposição de datas de diligências a que devam comparecer os mandatários judiciais, deve o juiz providenciar pela marcação do dia e hora da sua realização, mediante prévio acordo com aqueles, podendo encarregar a secretaria de realizar, por forma expedita, os contactos prévios necessários”.

Quando a marcação não possa ser feita nos termos do número anterior, devem os mandatários impedidos em consequência de outro serviço judicial já marcado comunicar ao Tribunal esse facto, no prazo de cinco dias, propondo datas alternativas, após contacto com os restantes mandatários interessados – nº 2.
O juiz ponderadas as razões aduzidas, poderá alterar a data inicialmente fixada – nº 3.
Os mandatários judiciais devem comunicar prontamente ao Tribunal quaisquer circunstâncias impeditivas da sua presença – nº 5
A primeira situação, prevista no nº 1 do art. 151º do CPC, ocorre quando a marcação da diligência se operou por acordo prévio entre o tribunal e os mandatários, seja em contacto directo, seja por contacto indirecto, isto é, com a intermediação de funcionário judicial.

Por sua vez, a segunda situação verifica-se quando não tenha havido contacto prévio do tribunal com os mandatários, caso em que a data de designação da diligência se configura como potencialmente provisória durante cinco dias.

Com efeito, durante esses cinco dias, contados da data da notificação dos mandatários das partes, o tribunal tem de ponderar que eles possam vir comunicar o seu impedimento em consequência de outro serviço judicial já marcado, e cada um, após contacto com o(s) outro(s), propor a realização da diligência em data ou datas alternativas
No caso de os mandatários, no prazo de cinco dias, declararem a sua disponibilidade para a data indicada pelo juiz para a diligência ou se nada declararem, deve entender-se, tendo em conta o seu dever de cooperação relativo à informação da existência de impedimento, tratar-se, no primeiro caso, de acordo expresso, e, no segundo, de acordo tácito.
No caso concreto, interessa-nos apenas o caso de a Audiência Final ter sido designada com o acordo prévio dos Exmos. Mandatários, já que se trata da situação dos autos.
Importa verificar as circunstâncias que permitem o adiamento da Audiência Final, cuja data foi designada por acordo prévio das partes.
Ora, tais circunstâncias mostram-se estabelecidas no citado art. 603º do CPC.

Segundo este preceito legal, mesmo quando a Audiência Final tenha sido designado por acordo, são duas as situações que permitem o seu adiamento:

Impedimento do Tribunal;
Ou ocorrência de motivo que constitua justo impedimento (1).

Ora, é justamente este segundo fundamento que a Exma. Mandatária da Ré expressamente invocou para requerer o Adiamento da Audiência Final (previamente ao seu início).
Vejamos, então, se o fez, dando cumprimento às respectivas exigências legais.
Ora, entende-se que, nestes casos, o adiamento com base na falta de Advogado só pode ocorrer se aquele comunicar prontamente ao Tribunal as circunstâncias impeditivas do seu comparecimento.
A simples comunicação do impedimento não constitui justificação bastante para o adiamento, e nem sequer a simples indicação de um motivo vago ou abstracto legitima o adiamento, antes se impondo a verificação de causa fortuita ou de força maior ou um qualquer motivo relevante.

Ora, no caso, tendo a Exma. Mandatária padecido de doença súbita (“perdeu os sentidos no escritório”, subentende-se que na própria manhã em que estava designado o julgamento, o que se pode retirar dos alegados contactos efectuados com os restantes Mandatários constituídos), logo comunicou ao processo o seu impedimento, a fim de a diligência poder ser adiada (2).
Intervém aqui, como é sabido, o conceito de “justo impedimento”, para o qual, aliás, o legislador, no citado art. 603º do CPC, remete.

Na verdade, conforme dispõe este preceito legal, verificada a presença das pessoas que tenham sido convocadas, realiza-se a audiência, salvo se houver impedimento do tribunal, faltar algum dos advogados sem que o juiz tenha providenciado pela marcação mediante acordo prévio ou ocorrer motivo que constitua justo impedimento.

Ora, como resulta do disposto no artigo 140º do CPC, considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários que obste à prática atempada do acto.

Uma das situações que pacificamente vem sendo admitida como fundamento para a existência de justo impedimento é justamente a doença súbita e incapacitante do Exmo. Mandatário de uma das partes (3).

No caso concreto, a Exma. Mandatária, antes mesmo do início da Audiência Final, comunicou a existência dessa situação de ocorrência de motivo que constitua justo impedimento, protestando juntar prova documental dos factos alegados, o que logo veio a efectuar no dia seguinte (3.11.2017).
Defende o Tribunal Recorrido que “para eventual aproveitamento de “justo impedimento”, teria que ser logo trazida a prova respectiva (art. 140º, nº 2 CPC), coisa que não sucedeu”.

Julga-se, no entanto, que não tem razão.

“Apesar do art. 140º, nº 2 do CPC impor que a parte que alegar o justo impedimento oferece logo a respectiva prova, deve entender-se que, sendo necessário que a comunicação seja logo efectuada, até à abertura da audiência, não é exigível que prontamente seja exibido atestado médico, pois, se o advogado comunicar prontamente ao tribunal as circunstâncias impeditivas do seu comparecimento e não estiver ainda munido de documento comprovativo do impedimento legítimo, deve convencer o juiz da seriedade do motivo invocado, sem prejuízo de, posteriormente e no mais curto prazo, remeter o documento justificativo da sua ausência (note-se que, não sendo tal documento enviado, o mesmo não evidencie uma causa de doença que impeça o advogado de comparecer ou o juiz duvide da genuinidade do documento, terá o mandatário de suportar as custas devidas pelo desenvolvimento processual anómalo a que deu causa) ” (4).
É essa também a opinião de J. H. Delgado de Carvalho (5) que refere que “tendo o Mandatário comunicado a impossibilidade de comparecimento até ao início da Audiência, e não estando ainda munido de documento comprovativo do impedimento legítimo, deve convencer o Juiz da seriedade do motivo invocado com vista ao adiamento da diligência, sem prejuízo de posteriormente e no mais curto prazo, remeter o documento justificativo da sua ausência”.
Ora, no caso dos autos, nenhum indício apontava para que não houvesse seriedade quer na comunicação efectuada, quer quanto às circunstâncias invocadas, pelo que, no nosso entender, a Audiência deveria ter sido adiada.
Com efeito, decorre dos autos que, logo no dia seguinte, a Exma. Mandatária faltosa enviou, entre outros documentos comprovativos da doença alegada, uma declaração médica, na qual se comprovava que a mesma não podia efectivamente comparecer na audiência final, por motivo de doença.

Importa, aliás, salientar que, tendo em conta as circunstâncias do caso concreto (doença súbita e incapacitante), não era exigível à Exma. Mandatária da Ré que, no momento em que invocou o motivo do adiamento, apresentasse, desde logo, prova dos factos por si alegados (6).

Nessa medida, tendo-o efectuado no dia seguinte, julga-se que cumpriu o seu ónus de provar os factos que havia alegado, e que constituíam inequívoco motivo para se considerar existir um caso de justo impedimento susceptível de funcionar como causa de adiamento da Audiência Final.

A estas considerações também nada acrescenta a argumentação retirada da existência de outros Mandatários constituídos pela Ré, pois que, dadas as circunstâncias de tempo e lugar, também se mostra plenamente justificado que a Exma. Mandatária não pudesse lograr a sua substituição por um daqueles Mandatários, tanto mais que estes não tinham conhecimento da data designada, por esta não lhes ter sido notificada (7).

Aqui chegados importa concluir que ao ter-se realizado o julgamento sem a presença da Exma. Mandatária da Recorrente, e porque essa falta influi na decisão da causa (art. 195º do CPC), o julgamento terá de ser considerado nulo.

Consequentemente, deve ser revogado o despacho recorrido, e, na sequência, serem anulados todos os actos que dele dependam (designadamente, a Audiência Final e a sentença entretanto proferida) - art. 195º, nº 2 do CPC- devendo, após, ser designado novo dia para a realização da Audiência Final.
Tanto basta para a procedência do presente Recurso, ficando prejudicada a apreciação dos demais fundamentos que tinham sido apresentados pela Recorrente, a título subsidiário (8).
*
III- DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar:

-o Recurso interposto pela Recorrente procedente, e, em consequência, decide-se revogar o despacho recorrido e, na sequência, determina-se que sejam anulados todos os actos que dele dependam (designadamente, a sentença entretanto proferida) - art. 195º, nº 2 do CPC- devendo, após, ser designado novo dia para a realização da Audiência Final.
*
Custas pelo Recorrido (art. 527º do CPC).
Notifique.
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Guimarães, 15 de Fevereiro de 2018


Dr. Pedro Alexandre Damião e Cunha
Dra. Maria João Marques Pinto de Matos
Dr. José Alberto Moreira Dias



1. Uma outra situação que poderá implicar o adiamento diz respeito à junção de prova documental –cfr. arts. 423º e 424º do CPC.
2. Paulo Pimenta, in “Processo Civil Declarativo”, págs. 303 e 304 distingue três situações, quanto ao momento em que o justo impedimento é conhecido e comunicado ao Tribunal: “Assim, importará considerar se a circunstância invocada como geradora do impedimento teve lugar antes da data fixada para a realização da Audiência Final e se foi possível a sua comunicação aos autos em devido tempo, caso em que, a ser assim reconhecido o justo impedimento, deverá ser dada sem efeito a própria audiência. Por outro lado, se não for possível comunicar tal circunstância em termos de permitir que seja dada sem efeito a Audiência, mas ainda a tempo de permitir a sua avaliação até ao momento em que a Audiência Final deveria ter início, caso seja reconhecido o justo impedimento, deverá ser adiada tal Audiência. Por fim, se a circunstância invocada… não for conhecida dos autos no momento em que a Audiência deveria ter início, a falta do Advogado não impedirá a realização da Audiência, mas se vier a ser invocado e reconhecido o justo impedimento, daí resultará a repetição dos actos praticados na ausência (justificada, afinal) do advogado”.
3. Neste sentido, v. Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, in “CPC anotado”, Vol. I, págs. 273 a 275 que referem que “as situações de doença súbita de parte ou Mandatário constituem justo impedimento quando configurem um obstáculo razoável e objectivo à prática do acto, tidas em conta as condições mínimas de garantia do exercício do direito em causa”; na Jurisprudência, v., entre outros, os acs. do STJ de 21.2.2001 (relator: Simões Redinha) onde se concluiu que: “I- Existe justo impedimento para a prática de um acto em tribunal por parte de um advogado que se encontra afectado de "síndroma febril grave e dispneia, proibido de sair do leito e de desenvolver o seu trabalho, sem consciência das diligências a tomar relativamente à sua profissão. II- Esse justo impedimento ocorre mesmo que a parte processual de que esse advogado é mandatário tenha constituído no processo outro mandatário forense, que contudo, não foi notificado relativamente ao acto processual a praticar”; e de 31.5.2005 (relator: Lucas Coelho) e da RE de 5.5.2016 (relator: Elisabete Valente), in dgsi.pt.
4. Como se refere no ac. da RE de 5.5.2016 (relator: Elisabete Valente), in dgsi.pt. Quanto a esta consequência (condenação em custas) v. também, J. H. Delgado de Carvalho, in “A fase da condensação no processo declarativo- os Temas da prova”, pág. 176.
5. In “A fase da condensação no processo declarativo- os Temas da prova”, pág. 176.
6. Segundo Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, in “CPC anotado”, Vol. II, pág. 686 “… o Advogado impossibilitado de comparecer por motivo imprevisto (art. 151º, nº 5) deve oferecer, logo que possível, prova da ocorrência do motivo invocado, quando a data da audiência tenha sido marcada nos termos do art. 151º, nº 1 a 3” (sublinhado nosso). V. também J. H. Delgado de Carvalho, na obra e locs. citados.
7. v. neste sentido, além do ac. do Stj de 21.1.2001 já citado e o ac. da RE de 20.12.2012 (relator: Eduardo Tenazinha), in Dgsi.pt.
8. A questão da repetição da inquirição das testemunhas só surgirá nos casos em que o justo impedimento for alegado depois de realizada a Audiência de Julgamento. Nestes casos é que, como se referiu, “reconhecido o justo impedimento, daí resultará a repetição dos actos praticados na ausência (justificada, afinal) do advogado”- Paulo Pimenta, in Processo Civil declarativo”, pág. 304.