Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2030/17.4T8VRL.G1
Relator: VERA SOTTOMAYOR
Descritores: NULIDADE DA SENTENÇA
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/19/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
Sumário da Relatora:

I –Não podem agora arguir-se os vícios da sentença já apreciados ou outros que poderia ter sido suscitados aquando da impugnação da primeira, quer porque já recaiu decisão sobre os mesmos, quer porque deveriam ter sido suscitados anteriormente considerando-se por isso precludido o direito à sua arguição.

II – O Tribunal só pode e deve considerar como provado em resultado da prova produzida “os factos” e não as conclusões ou juízos de valor a extrair dos mesmos à luz das normas jurídicas aplicáveis. Assim, são de afastar as expressões de conteúdo puramente valorativo ou conclusivo, destituídas de qualquer suporte factual, que sejam susceptíveis de influenciar o sentido da solução do litígio.

III – Quando o direito ao gozo de férias e vence por força da cessação do contrato, tal não dá direito à atribuição de indemnização respeitante à violação culposa do gozo de férias pela Ré, pela simples razão de que essa violação não se verifica.

IV – Para que se verifique a litigância de má-fé é necessário que a parte, ao deduzir a sua pretensão ou oposição infundamentada ou ao afirmar factos não ocorridos, tenha atuado com dolo ou com negligência grave, ou seja, sabe da falta de fundamento da sua pretensão ou oposição, ou encontra-se numa situação em que se lhe impunha que tivesse esse conhecimento.

V – Litiga de má-fé, a Ré que fez uso indevido do processo ao alterar e distorcer a verdade dos factos, estando perfeitamente ciente que a Autora se encontrava a trabalhar por sua conta e no seu interesse, e, ainda provocou o chamamento de terceiro à acção ciente de que o mesmo não teria qualquer interesse no desfecho da causa, fazendo assim uso indevido dos meios processuais.
Decisão Texto Integral:
APELANTE: M. C.
APELADA: M. J.

Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, Juízo do Trabalho - J1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO

M. J., residente na Rua …, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum contra M. C., residente na Rua …, Vila Real, pedindo que seja declarada lícita e com justa causa a resolução do contrato de trabalho por si formulada. E, em qualquer circunstância que seja a Ré condenada a pagar-lhe a quantia de €10.574,44, a título de diferenças salariais não pagas nos anos de 2015, 2016 e 2017, bem como a título de duodécimos de subsídio de férias e subsídio de Natal não pagos referentes aos meses de trabalho efectivamente prestado à Ré nos anos de 2015 e 2017, e a título de subsídio de férias e de subsídio de Natal do ano de 2016, bem como a título de trabalho suplementar em dia de descanso semanal obrigatório e feriados e a título de trabalho suplementar prestado em dia de descanso semanal complementar nos anos de 2016 e 2017, bem como a título de férias não gozadas, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal, contados desde a data da constituição em mora, ou, caso assim justificadamente não se entenda, desde a data da sua citação.

Mais peticiona que seja a Ré condenada a proceder aos respectivos descontos junto da Segurança Social, durante o período de tempo que a A. foi sua trabalhadora, pelo salário mínimo nacional, valor acordado como sendo o salário da A. tudo com custas a seu cargo.

Os autos prosseguiram os seus trâmites normais, a Ré contestou, impugnando os factos alegados pela Autora e alegando além do mais que carece de legitimidade para a acção, uma vez que o contrato de trabalho em causa terá sido celebrado não consigo, mas com a firma Casa de Repouso ..., Lda.
Conclui pela sua absolvição da instância, por ser parte ilegítima ou pela improcedência da acção com a sua consequente absolvição dos respectivos pedidos.
A Autora respondeu à excepção deduzida concluindo pela sua improcedência e pediu a condenação da Ré como litigante de má-fé.
Foi determinada a intervenção da “Casa de Repouso ..., Lda”, que tendo sido citada para contestar a presente acção, nada veio dizer.
Os autos foram saneados, procedeu-se à fixação do objecto do litígio e foram identificados os temas de prova.

Os autos prosseguiram a sua normal tramitação e por fim foi proferida sentença pela Mma. Juiz, que terminou com o seguinte dispositivo:

“Tudo visto e nos termos expostos, julga-se a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência declara-se que entre A. e R. M. C. vigorou um contrato de trabalho que cessou em Março de 2017 por denúncia apresentada pela A. para este efeito e em consequência condena-se a R. a pagar à A. a quantia de €8.518,70 (oito mil quinhentos e dezoito euros e setenta cêntimos) a título de créditos laborais vencidos e não liquidados, acrescidos dos respectivos juros de mora, vencidos desde a citação à respectiva taxa legal.
Mais se julga procedente o pedido de condenação da R. por litigância de má-fé em multa equivalente a 6 Uc e em indemnização à A. em quantia equivalente a 5 Uc, ao abrigo do disposto nos artigos 542º e 543º ambos do C.P.C.
No mais, absolve-se a R. pessoa colectiva Casa de Repouso ..., Lda. de todos os pedidos formulado pela A. e a R. pessoa singular do demais peticionado.
Custas por ambas as partes na proporção do respectivo decaimento, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido à A.
Registe e notifique.“

Inconformada com esta sentença, dela veio a Ré interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães e arguir a nulidade da sentença, de harmonia com o disposto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPC.
A recorrida apresentou contra alegação pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção da decisão recorrida.
Os autos foram remetidos a este Tribunal, tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido douto parecer de fls.235 a 238, no sentido da improcedência do recurso interposto da decisão final.
Foi proferido acórdão por este Tribunal que além do mais julgou procedente a apelação declarando nula a sentença por ambiguidade e obscuridade e consequentemente determinou que o tribunal a quo proferisse nova sentença, que suprisse os vícios referentes à falta de discriminação das parcelas, quer dos critérios que tiveram na origem do cálculo, quer das quantias globais devidas a título de trabalho prestado em dia de descanso complementar, quer a quantia devida a título de indemnização pela violação do dever ao gozo de férias que impediam e prejudicavam a viabilidade da impugnação, bem como da apreciação fundamentada de decisão.
Foi proferida nova sentença, na qual se deu cabal cumprimento ao determinado, mas cujo dispositivo se manteve igual àquele que constava da primeira decisão, o qual se dá aqui por reproduzido.

Inconformada de nova com a sentença proferida pelo Tribunal a quo, veio a Ré M. C. recorrer para este Tribunal, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões:

“A- Enferma a sentença recorrida de uma clara contradição quando dá como assente que a A. folgava uma vez por semana (art. 7º factos assentes) e simultaneâmente dá também como assente (art. 12º) e condena a Ré a indemnizá-la pelo trabalho desenvolvido em 13 dias feriados no ano de 2016, quando 5 desses dias (1 de Janeiro; 25 de Março; 25 de Abril; 10 de Junho; 15 de Agosto) coincidem precisamente com o seu dia de folga, que gozou.
B- Depois, apresenta-se a sentença ainda ininteligível ao dar como assente que a A. passou a trabalhar para a Ré em dia impreciso de Novembro de 2015 -Desde esse dia - (art. 7º dos factos assentes) e não obstante isso considerou que trabalhou todo esse mês de Novembro para efeitos da indemnização que lhe arbitrou.
C- Vícios estes que acarretam a nulidade da sentença, pelo menos neste segmento decisório, em conformidade com o disposto no art. 615º, nº 1, al. c) C.Pr.Civil.
D- Para além disso, foram incorrectamente julgados os pontos nºs 1 a 5 da resposta à matéria de facto.
E- Dir-se-á que, se é certo que os depoimentos de familiares não são ab initio menos fiáveis que os depoimentos de outras testemunhas, impor-se-á todavia analisar as características dessa prova para se poder concluir com razoabilidade se tal meio de prova é ou não credível.
F- Acontece que a Mmª Juíza desconsiderou o depoimento das testemunhas arroladas pela ré por considerar que todas elas revelaram algum tipo de ligação com a mesma, ainda que não de parentesco e os seus depoimentos traduziram uma intenção de defenderem os seus interesses, ainda que não concretizando em que consistiu essa parcialidade.
G- Enquanto relativamente às testemunhas arroladas pela autora, concretamente P. A., seu filho, e M. F., sua irmã, já valorizou os seus depoimentos por os considerar objectivos, isentos e demonstrarem que sabiam as horas de entrada e saída do serviço, valores que auferia, que não gozou férias e quantos dias trabalhava e quantas folgas gozava por semana, apesar dos respectivos depoimentos não confirmarem tais conhecimentos.
H- E dar grande relevo ao depoimento de uma testemunha (N. F.) quando no processo inspectivo que correu termos perante a Segurança Social afirmou o contrário do afirmado em julgamento.
I- Por outro lado, foram valorizadas parcialmente as declarações de parte da autora, mas já injustificadamente as da ré foram completamente omitidas pela Mmª Juíza, não as considerando de todo no fundamento da fixação da matéria de facto, pura e simplesmente ignorando-as, não se lhe fazendo a mínima referência.
J- Da factualidade dada como provada sob os n.ºs 1º a 5º decorre que a autora exercia a sua actividade para a ré, a tempo inteiro, sob as suas ordens e fiscalização, ou seja, mediante contrato de trabalho.
L- Sucede, porém, que da prova produzida, concretamente, do depoimento das testemunhas N. D. (passagens do seu depoimento de 2:23 a 3:19; 3:30 a 3:56; e 6:29 a 6:56); P. M. (passagens do seu depoimento de 2:52 a 3:11; 3:15 a 3:26; 3:59 a 4:20; 4:37 a 5:02; 5:07 a 5:20; 5:24 a 5:36; S. M. (passagens do seu depoimento de 1:10 a 1:30; 2:40 a 2:47; 3:25 a 3:47; e 4:15 a 5:04); e das próprias testemunhas arroladas pela autora P. A. (passagens do seu depoimento de 3:15 a 3:23; 6:29 a 6:56; e 11:00 a 11:171:50); M. F. (passagens do seu depoimento de 5:04 a 5:40; 15:57 a 16:29); bem como do depoimento prestado por N. F. (constante de fls. 8 do aludido relatório incorporado no processo), assim como das declarações de parte da ré (passagens de suas declarações de 1:42 a 1:56), resulta o contrário, ou seja, que a autora exercia tarefas domésticas em casas particulares e apenas trabalhava uma a duas horas, em dois ou três dias por semana, no Lar de idosos.
M- Assim, atenta a prova produzida, designadamente com base nos depoimentos supra transcritos e no depoimento vertido no relatório da SS a fls.8 pela testemunha N. F. deve alterar-se a factualidade provada sob os n.ºs 1º a 5º, pelo que aos mesmos deve ser dada a resposta de não provado.
N- Em contrapartida, e com base nos mesmos depoimentos deve ser dada a resposta de provado aos pontos nºs 12º, 13º e 14º.
O- E, consequentemente, os pontos nºs 7º a 11º têm de se considerar não provados ou, mais apropriadamente, tem de se considerar prejudicada a resposta à factualidade neles vertida.
P- Mesmo que se considerasse que era mediante contrato de trabalho que a autora desempenhava funções laborais para a ré, o que se não concede, também nunca os pontos da matéria de facto vertida sob os nºs 4º, 5º, 8º, 9º e 10º poderiam merecer a resposta que lhes foi dada.
Q- E isto pela simples razão de que nenhuma testemunha, nem mesmo a própria autora em suas declarações concretizam as horas de trabalho que ela prestava no lar, nem o vencimento contratado, nem quantos domingos e feriados trabalhou, nem quantos dias de descanso suplementar igualmente trabalhou, nem se gozou férias e folgas nem quantos dias isso terá acontecido.
R- basta atentar no depoimento das testemunhas: P. A. (passagem da gravação de seu depoimento de 1:50 a 3:02; 6:29 a 6:56; 9:08 a 10:01; 11:00 a 11:17); M. F. (passagem da gravação de seu depoimento de 5:04 a 5:40; 8:51 a 9:18; 12:12 a 13:05; 13:20 a 13:50; e 15:57 a 16:29); da própria N. F. (passagem da gravação de seu depoimento de 3:09 a 3:20; 7:52 a 8:05; e 9:03 a 9:14): e nas declarações da própria autora (passagem da gravação de suas declarações de 5:05 a 5:30; e 7:29 a 7:42), conjugados com os depoimentos das testemunhas arroladas pela ré e mencionados na al. L) destas conclusões para se concluir que a autora gozava habitualmente as suas folgas – aliás, deu-se como assente que a autora no seu dia de folga executava tarefas domésticas em casas particulares – gozou algumas férias – pelo menos cinco dias foi a Fátima, declarou ela – e não está apurado em que horário desenvolveria as suas actividades.
S- Foram, por isso, incorrectamente julgados os pontos nºs 4º, 5º e 7º a 10º da fixação da matéria de facto, pelo que aos mesmos, e isto subsidiariamente, sempre deveria ser dada a seguinte resposta:
4º - a autora trabalhava algumas horas, sem horário fixo, no lar;
5º- a ré pagava à autora quantias variáveis conforme as horas que trabalhava;
7º- a ré não pagou à A. a quantia referente aos duodécimos dos subsídios de férias e de Natal dos anos de 2015 e 2017 e aos subsídios de férias e Natal do ano de 2016;
8º- no ano de 2016 e 2017 a A. trabalhou alguns domingos e em alguns dias feriados;
9º- no ano de 2016 e 2017 a A. trabalhou alguns dias de descanso suplementar;
10º- a A. durante o período em que o seu contrato de trabalho esteve em vigor não gozou alguns dos dias de férias a que tinha direito.
T- Para além disso, e ainda subsidiariamente, sempre a sentença recorrida incorreu em claro erro de apreciação jurídica ao arbitrar as indemnizações que efectivamente concedeu à autora desde logo, e em primeiro lugar, as correspondentes aos subsídios de férias e Natal, bem como as diferenças salariais, referentes ao mês de Novembro de 2015.
U- É que não se sabendo em que dia de Novembro começou a prestar serviço esse dia tanto poderia ser o 1º (dia 1) como o último (dia 30) e porque a factualidade provada não permite resolver esta imprecisão/incongruência, deve então e de acordo com o disposto no art. 237º C.Civil considerar-se que terá sido no fim desse mês de Novembro que a A. começou a trabalhar.
V- Não são assim devidas as compensações arbitradas à A. a título de subsídios de férias e Natal, bem como as diferenças salariais, referentes ao mês de Novembro de 2015.
X- Igualmente não pode a Ré ser condenada a indemnizar a A. relativamente às férias de 2017 porquanto foi ela que resolveu o contrato sem qualquer fundamento e sem observância do legal formalismo, tal como se reconhece na sentença recorrida (pág. 3 e 3/v), resolução por isso ilícita, não sendo por isso de assacar Ré a violação culposa do gozo dessas férias, faltando o necessário pressuposto legal para que essa compensação pudesse ser arbitrada.
Z- Depois, cinco dos dias feriados do ano de 2016 (1 de Janeiro; 25 de Março; 25 de Abril; 10 de Junho; 15 de Agosto) coincidiram com o dia de folga da A., dias em que não trabalhou, pelo que não lhe pode ser atribuída qualquer indemnização por esses cinco dias.
AA- Quanto ao trabalho efectuado em dias feriados não coincidentes com o dia de folga, dirse-á que, além de não ter ficado provado que a A. tenha trabalhado nesses dias nem, a tal se ter verificado, quantos dias, sendo certo que em 2016 até houve três feriados (27 de Março; 1 de Maio; 25 de Dezembro) coincidentes com domingo, a verdade é que o trabalhador pelo trabalho desenvolvido nesses dias e em empresa não obrigada a suspender o seu funcionamento, tal como disposto no art. 269º, nº 2 C.Trabalho, tem direito a descanso compensatório com duração de metade do número de horas prestadas ou a acréscimo de 50% da retribuição correspondente, cabendo a escolha ao empregador.
BB- Quando muito e neste momento que cessou o vínculo contratual apenas assistiria à autora a retribuição correspondente àquele acréscimo de 50% da retribuição correspondente, caso não tivesse gozado o descanso compensatório, o que não alegou e nem se provou que não tenha acontecido ou que lhe tenha sido recusado esse gozo.
CC- Logo, não lhe pode ser atribuída qualquer indemnização quer por aqueles cinco dias quer por estes três dias.
DD- Apesar da ré ter sido condenada a pagar à autora a retribuição correspondente ao trabalho desenvolvido nos dias de descanso complementar que não gozou, em número de 53 no ano de 2016 e de 10 no ano de 2017, tal compensação não lhe era devida.
EE- O facto do trabalho da A. ser prestado num lar de idosos por força do estipulado no art. 233º, nºs 1 e 3, als. b) e c), com referência ao art. 207º, nº 2. al. e), do ponto i), ambos C.Trabalho, nestas condições, e contrariamente ao defendido na sentença recorrida (fls. 4/v, 1º §), o dia de descanso complementar não tem de ser gozado em continuidade ao dia de descanso obrigatório.
FF- Quanto a esta peticionada indemnização apenas e tão só se deu como provado, em consonância, aliás, com o alegado pela A. em sua petição, que no ano de 2016 a A. trabalhou em dias de descanso suplementar 53 dias e em 2017, 10 dias valores não liquidados pela R. –nº 13 dos factos dados como assentes.
GG- Mas o pedido de pagamento correspondente ao descanso compensatório não gozado é uma decorrência da prestação de trabalho suplementar, sendo requisito constitutivo desse direito a não concessão da possibilidade de usufruir desse descanso compensatório.
HH- É esse o entendimento pacífico da jurisprudência dos nossos tribunais superiores (cfr. entre outros, acs. STJ, in procs. nºs 532/12.8TTVNG.P1.S1 e 314/08.1TTVFX.L1.S1 e ac. RG, in proc. nº 2755/16.1T8VNF.P1.G1) defendendo que, peticionando o Autor o pagamento do descanso compensatório, cabe-lhe a alegação e a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga, isto é, a alegação e a prova não apenas da prestação do trabalho suplementar mas também que, na sua decorrência, não lhe foram dados a gozar o(s) descanso(s) compensatório(s) devidos. Uma vez provados estes factos – que são constitutivos do direito que o A. se arroga – é que, então, caberia à Ré a prova do respectivo pagamento, tudo em conformidade com as regras da distribuição do ónus da prova, previstas no art. 342.º, ns. 1 e 2, do Código Civil.
II- Uma vez que a A. se limitou a afirmar que trabalhou em dias de descanso complementar, 53 dias em 2016 e 10 em 2017, que não lhes foram pagos, factos esses que integralmente foram dados como provados, mas já nada alegando, e como tal se não provou, nem se poderia provar, que não lhe foram dados a gozar os descansos compensatórios devidos, a esta sua pretensão indemnizatória falece um dos pressupostos no qual assenta o reclamado direito ao pagamento do descanso complementar e, como tal, tem essa pretensão que soçobrar.
JJ- Ainda subsidiariamente a condenação por litigância de má-fé só deverá ocorrer quando se demonstre, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu dolosamente ou com grave negligência, com o fito de impedir ou a entorpecer a acção da justiça.
LL- Essa actuação dolosa ou gravemente negligente não se surpreende na actuação da ré, porque conscientemente convencida de que a autora não desenvolvia qualquer actividade laboral para si a tempo inteiro, mas apenas tarefas ocasionais, pelo que não se justifica a condenação da ré a este título.
MM- De qualquer modo sempre se afiguraria extremamente penalizador e desproporcionado o montante quer da multa quer da indemnização arbitrada, não devendo quer a multa quer a indemnização ultrapassar 1 Uc.
NN- A dar-se como provada a existência de uma relação laboral entre A.e Ré, então também tem de se concluir que aquela agiu processualmente em clara má-fé quando afirma que, a partir de Janeiro de 2016, passou a trabalhar todos os dias, sem dia de descanso semanal (art. 6º da petição), ou seja, que nunca gozou, por não lhe ter sido concedida, a folga semanal a que legalmente tinha direito quando foi dado como assente que a A. trabalhava todos os dias, excepto um dia por semana que era à sexta-feira e depois passou a ser à segunda-feira, cumprindo um horário de oito horas –nºs 7 e 8 dos factos provados.
OO- Uma vez ado que a A. sempre gozou a sua folga semanal e mesmo assim não se coibiu de negar essa realidade só para obter da Ré mais uma indemnização, isto é, conscientemente deduziu pretensão cuja falta de fundamento não ignorava, pelo que agiu claramente com dolo, impondo-se a sua condenação como litigância de má-fé, de acordo com o disposto no no art. 542º, nº 2 C.Pr.Civil, em multa e indemnização não inferior esta a 5 Uc.
PP- A sentença recorrida fez uma incorrecta interpretação e aplicação, eventualmente além de outros, dos princípios ínsitos nos arts. 542º e 543º C.Pr.Civil, 342º C.Civil e 229º, 230º, 232º e 233º C.Trabalho.
QQ- Incorrendo ainda nos vícios espelhados na al. c) do nº 1 do art. 615º C.Pr.Civil.

Termos em que se deve ser julgado procedente o presente recurso e, consequentemente:

- ser decretada a nulidade da sentença com base na sua ininteligibilidade por os fundamentos estarem em oposição com a decisão, e sua ambiguidade, com todas as legais consequências; a tal não se verificar, então:
- alterar-se a matéria de facto nos termos que se deixaram expostos e declarar-se que a autora apenas trabalhava esporadicamente no Lar, sem que houvesse qualquer vínculo laboral entre ela e a ré;
- e a ré absolvida dos pedidos formulados.

subsidiariamente:

- que foram incorrectamente julgados os pontos nºs 4º, 5º e 7º a 10º da fixação da matéria de facto;
- e que a A. nunca teria direito à retribuição correspondente ao trabalho desenvolvido nos dias feriados, nem ao pretensamente prestado em dias de descanso complementar;
- nem aos subsídios de férias e de Natal, às diferenças salariais e o correspondente às férias, nos termos em que se mostra exarado na sentença;
- e sempre revogada a condenação da ré como litigante de má-fé ou então fixado o montante quer da multa quer da indemnização em quantia não superior a 1 Uc;
- e condenada a A. como litigante de má-fé em multa e indemnização, sendo esta no valor de 5 Uc.
Assim se fazendo a costumada Justiça”

A recorrida respondeu ao recurso concluindo pela sua improcedência e consequente manutenção da decisão recorrida.
Foi proferido despacho que admitiu o recurso e foram os autos remetidos a esta 2ª instância.
Foi determinado que se desse cumprimento ao disposto no artigo 87.º n.º 3 do C.P.T., tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido douto parecer de fls.333 a 335v., no sentido da improcedência do recurso.
A recorrente e a Recorrida vieram responder ao parecer, manifestando Recorrente a sua discordância com o parecer emitido pelo Ministério Público e concluindo como nas alegações de recurso e a Recorrida veio acolher na íntegra o parecer do Ministério Público e volta a concluir pela improcedência do recurso.

II – OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objeto dos recursos pelas suas conclusões e não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, coloca-se à apreciação deste Tribunal da Relação as seguintes questões:

a) - Da nulidade da sentença por oposição entre a fundamentação e a decisão e por obscuridade e ambiguidade que a torna ininteligível;
b) - Da impugnação da matéria de facto;
c) - Do erro de julgamento quanto à subsunção jurídica dos factos ao direito;
d) - Da condenação como litigante de má-fé.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos provados são os seguintes:

1. A R. M. C. exerce a actividade de acolhimento e cuidado de idosos em regime de permanência na sua residência sita em Vila Real.
2. Em 12/04/2017 a R. constituiu a sociedade Casa de Repouso …, Lda., Unipessoal, Lda. da qual é a única sócia e gerente - cfr. certidão de fls. 74 e 75.
3. A relação profissional que vigorou entre A. e R. cessou por iniciativa da A.
4. A A. remeteu à R. em 27/03/2017 a carta que consta do doc. junto a fls. 16, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido - que a R. recebeu.
5. Em finais de Junho de 2015, a A. começou a trabalhar para a R. algumas horas por dia, na casa desta.
6. Em Novembro de 2015, mediante contrato de trabalho verbal a A. começou a prestar serviço para a R. sob as ordens, instruções e fiscalização da mesma, no cuidado de nove idosos, residentes na casa da R.
7. Desde esse dia a A. apresentou-se no domicílio da R. e aí executou todos os trabalhos que a mesma lhe ordenava e passou a trabalhar todos os dias, excepto um dia por semana que era à sexta-feira, mas passado algum tempo esse dia passou a ser à segunda-feira.
8. A A. cumpria um horário de trabalho das 08h30 às 11h30 horas e das 16h00 às 19h30 horas (alterado em conformidade com o decidido no ponto 2)
9. A A. auferiu sempre, ao longo da vigência do contrato de trabalho supra referido, a retribuição mensal de €400,00, sendo que quando permanecia para além das 20h00 horas era remunerada com a quantia de €10,00 ou de €20,00 conforme as horas que cumpria (parte ou toda a noite).
10. A A. deixou de trabalhar por conta da R. em finais de Março de 2017.
11. A R. não pagou à A. a quantia referente aos duodécimos dos subsídios de férias e de Natal dos anos de 2015 e 2017 e aos subsídios de férias e de Natal do ano de 2016 (alterado em conformidade com o decidido no ponto 2)
12. No ano de 2016 a A. trabalhou um total 48 dias (domingos) e no ano de 2017, 9 dias (domingos), tendo ainda trabalhado um total de 9 dias feriados no ano de 2016 (alterado em conformidade com o decidido no ponto 2)
13. No ano de 2016 a A. trabalhou em dias de descanso suplementar 52 dias e em 2107, 10 dias (alterado em conformidade com o decidido no ponto 2)
14. A A. durante o período em que o seu contrato de trabalho esteve em vigor também nunca gozou férias, pois a R. não lhas concedeu nem lhe permitiu o seu gozo alterado em conformidade com o decidido no ponto 2)
15. A R. não liquidou todas as contribuições devidas à Segurança Social correspondentes ao período de vigência do contrato de trabalho relativo à A.
16. No seu dia de folga a A. executava tarefas domésticas em casa de particulares.

IV - APRECIAÇÃO DO RECURSO

1. Da nulidade da sentença por oposição entre a fundamentação e a decisão e por obscuridade e ambiguidade que a torna ininteligível

Refere a Recorrente que a sentença é nula, quer por oposição entre os seus fundamentos e a decisão (por se ter arbitrado à Autora o pagamento de dias considerados como tendo sido trabalhados dando-se igualmente como provado que nesses dias esteve de folga), quer por ininteligibilidade quanto ao dia em que começou a trabalhar por conta da Ré, já que apenas resultou provado que tal ocorreu em Novembro de 2015.

Vejamos:
A sentença de que agora se recorre resultou do cumprimento do acórdão por nós relatado que declarou parcialmente nula a sentença proferida nos autos, não tendo sequer dado origem a novo julgamento, pelo que a decisão respeitante à matéria de facto é a mesma.
A sentença recorrida deu cabal cumprimento ao acórdão deste Tribunal, eliminando assim as ambiguidades e obscuridades assinaladas.
Por outro lado, a recorrente só pode impugnar de novo a sentença com base em novos vícios que pudessem ter surgido na nova decisão e com base nas questões por si suscitadas e que ficaram por apreciar por força da declaração de nulidade.
No que respeita aos vícios da sentença já apreciados ou a outros que poderia ter suscitado aquando da impugnação da primeira sentença, não podem agora ser arguidos, quer porque já recaiu decisão sobre os mesmos, quer porque deveriam ter sido suscitados anteriormente considerando-se por isso precludido o direito à sua arguição, já que as nulidades que ora se pretende arguir já constavam da 1ª decisão.
Em face do exposto, entendemos não ser de conhecer as nulidades da sentença agora suscitadas, porque não resultam da prolação da nova decisão, mas sim da anterior decisão as quais não foram tempestivamente arguidas.
Contudo, ainda que assim não se entendesse deixo consignado que a decisão recorrida não padece de qualquer um dos vícios apontados.
No que respeita ao trabalho prestado em dia feriado não se vislumbra qualquer contradição entre os fundamentos de facto e a decisão, pois resultando da factualidade apurada que a autora trabalhou em 13 feriados no ano de 2016, sendo certo que alguns desses feriados coincidiram com o dia de folga da autora, tal a verificar-se constitui ambiguidade no que respeita à factualidade apurada, que será apreciada em sede de impugnação da matéria de facto. Quanto à obscuridade da sentença por não ter sido possível apurar o exacto dia em que a autora celebrou o contrato verbal com a Ré, apenas se nos afigura dizer que tal não constitui qualquer obscuridade ou inteligibilidade, simplesmente não se tendo provado o exacto dia em que o contrato de trabalho verbal se iniciou, se terá de fazer um exercício interpretativo para apurar o que se deverá relevar para o efeito, o princípio ou o final do mês, tal como o fez a sentença recorrida.

2 . Da impugnação da matéria de facto

A Recorrente/Apelante impugna a decisão da matéria de facto proferida pelo tribunal recorrido no que respeita à resposta dada aos artigos 1.º a 5.º dos temas de prova, que deverão se dados como não provados e no que respeita à resposta dada aos artigos 12.º a 14.º dos temas de prova, que deverão se dados como provados, com base na reapreciação da prova gravada, defendendo que devem ser valorizados os depoimentos das testemunhas por si arroladas, bem como as declarações de parte por si prestadas em audiência de julgamento, em detrimento quer da valorização das declarações de parte prestadas pela autora, quer dos depoimentos das testemunhas por si arroladas.

Dispõe o artigo 662.º n.º 1 do C.P.C. aplicável por força do disposto no n.º 1 do artigo 87.º do C.P.T. e no que aqui nos interessa, que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

Por seu turno, o art.º 640º do C.P.C. que tem como epígrafe o “ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, dispõe que:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”

E o seu n.º 2 estipula que «No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

«a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.»

Do citado preceito resulta que quando se impugne a decisão proferida quanto à matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa, bem como, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Importa salientar que o segundo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto não implica a repetição do julgamento pelo tribunal de 2.ª instância, já que apenas se impõe verificar, mediante a análise da prova produzida, designadamente a que foi objecto de gravação, se a factualidade apurada pelo tribunal recorrido têm nas provas suporte razoável, ou se, pelo contrário, a convicção do tribunal de 1.ª instância assentou em erro tão flagrante que o mero exame das provas gravadas revela que a decisão não pode subsistir. Tal deverá ser feito com o cuidado e a ponderação necessárias, face aos princípios da oralidade, imediação e livre apreciação da prova.
Na verdade, existem diversos factores relevantes na apreciação e credibilidade do teor de um depoimento que só são apreensíveis pelo julgador mediante o contacto directo com os depoentes em audiência e isto sem prejuízo, no que respeita ao Tribunal da Relação, estar igualmente subordinado ao princípio da livre apreciação da prova e sem limitação (à excepção da prova vinculada) no processo de formação da sua convicção. A apreciação a realizar em 2ª instância não pode deixar de ter em atenção os mencionados princípios, pois deles decorrem aspectos de determinante relevância na valoração dos depoimentos, tais como as reacções do próprio depoente ou de outros, hesitações, pausas, gestos, expressões que apenas são perceptíveis pela 1ª instância.
Em suma, à Relação caberá analisar o processo de formação da convicção do julgador, apreciando, com base na prova gravada e demais elementos de prova constantes dos autos, se as respostas dadas apresentam erro evidenciável e/ou se têm suporte razoável nas provas e nas regras da lógica, experiência e conhecimento comuns, para que ponderando, e sem esquecer as mencionadas limitações, formar a sua convicção.

Observado pela Recorrente o ónus de impugnação, incumbe apreciar:

A Recorrente pretende que sejam dados como não provados os factos que correspondem às respostas positivas aos artigos 1.º a 5.º dos temas de prova e dos quais constam o seguinte:

“5. Em finais de Junho de 2015, a A. começou a trabalhar para a R. algumas horas por dia, na casa desta.
6. Em Novembro de 2015, mediante contrato de trabalho verbal a A. começou a prestar serviço para a R. sob as ordens, instruções e fiscalização da mesma, no cuidado de nove idosos, residentes na casa da R.
7. Desde esse dia a A. apresentou-se no domicílio da R. e aí executou todos os trabalhos que a mesma lhe ordenava e passou a trabalhar todos os dias, excepto um dia por semana que era à sexta-feira, mas passado algum tempo esse dia passou a ser à segunda-feira.
8. A A. cumpria um horário de trabalho das 07h30 às 11h30 horas e das 16h00 às 20h00 horas, perfazendo oito horas diárias.
9. A A. auferiu sempre, ao longo da vigência do contrato de trabalho supra referido, a retribuição mensal de €400,00, sendo que quando permanecia para além das 20h00 horas era remunerada com a quantia de €10,00 ou de €20,00 conforme as horas que cumpria (parte ou toda a noite).

E pretende ainda que sejam dados como provados os artigos 12.º a 14.º dos temas de prova, dos quais constam o seguinte:

“12.º - A A. desempenhou esporadicamente algumas tarefas na casa de acolhimento de idosos da R. a partir de Novembro de 2016, o que fez até Fevereiro de 2017, data em que deixou de comparecer?
13.º - A A. trabalhava 1 ou 2 horas por dia e 2 a 3 vezes por semana auferindo €4,00/hora?
14.º - A A. trabalhava em simultâneo como empregada doméstica em residências de particulares?”

O Tribunal a quo respondeu de forma negativa aos artigos 12.º e 13.º e no que respeita ao artigo 14.º deu como provado o seguinte: “Provado que no seu dia de folga a A. executava tarefas domésticas em casas de particulares.”

Insurge-se a Recorrente/Apelante quanto ao facto do tribunal a quo ter desconsiderado o depoimento das testemunhas da Ré, pelo facto de terem algum tipo de ligação com a Ré e por os seus depoimentos traduzirem uma intenção de defenderem os interesses da Ré e ter valorizado os depoimentos do filho e da irmã da autora, por os ter considerado de objectivos e isentos. E para o efeito transcreve nas suas alegações excertos truncados dos depoimentos das testemunhas arroladas por ambas as partes, concluindo pela credibilidade do depoimento das testemunhas por si arroladas e pelo descrédito dos depoimentos das testemunhas arroladas pela autora.

Como refere o Sr. Procurador Geral-Adjunto no douto parecer junto aos autos “… a ré limita-se a manifestar a sua própria convicção sobre a prova produzida com base nos depoimentos que no seu entendimento foram credíveis. Ou seja pretende contrapor a sua convicção à convicção formada pelo tribunal que proferiu a sentença.”
Tal como acima já deixámos expresso o julgador aprecia livremente as provas decidindo sobre a matéria de facto segundo a sua íntima convicção, formada através do confronto de todos os meios de prova e daí retira as suas conclusões em conformidade com as impressões retiradas do julgamento e com a convicção que se foi gerando no seu espirito, tendo em atenção as regras da experiência que forem aplicáveis.

Vejamos:

O Tribunal a quo para dar tais factos como provados e não provados no que respeita aos artigos 12.º e 13.º dos temas de prova motivou a sua convicção da seguinte forma:

“O Tribunal baseou a sua convicção no documento de fls. 16, não impugnado pela R., no que se refere à data da cessação do contrato de trabalho existente entre as partes, por denúncia apresentada pela A. Considerou-se igualmente o documento de fls. 48 a 51 (extracto das remunerações relativo à A.) quanto ao pagamento parcial das contribuições devidas à Segurança Social por parte da R. e no relatório de acção inspectiva da Segurança Social de fls. 86 a 93, quanto às funções exercidas pela demandante, de “auxiliar nas tarefas de apoio a idosos” ou “ajudante familiar”. Mais. De acordo com as declarações remetidas, através da resposta enviada pela R. aos serviços sociais competentes em 08/05/2017 – cfr. fls. 90 do relatório de acção inspectiva “O trabalho desenvolvido pela D. M. J. sempre consistiu na ajuda ás demais funcionárias na higiene aos idosos, nunca tendo efectuado esse trabalho sozinha por incapacidade para o fazer.”. Daqui decorre que a própria demandada não atribuiu tarefas à A. consistentes com o exercício de funções como empregada doméstica, já que estas limpam as instalações, mas não lidam com os próprios utentes da residência, o que não era o caso da demandante.
No mais consideraram-se os depoimentos das testemunhas P. A., N. F. e M. F.. Apesar das primeira e terceira testemunha serem, respectivamente, filho e irmã da aqui demandante, os seus depoimentos foram objectivos, isentos e demonstraram que apesar de não terem ambos conhecimento directo do que se passava dentro da residência para idosos da R., sabiam a que horas a A. entrava e saía do seu posto de trabalho, quando começou ali a trabalhar, que valor auferia de vencimento e ainda que nunca gozou férias enquanto trabalhou por conta da demandada, bem como quantos dias trabalhava e quantas folga gozava por semana.
Já quanto ao depoimento prestado por N. F., apesar da mesma ter declarado expressamente, logo no início do seu depoimento que havia mentido quando foi ouvida como testemunha no âmbito da acção inspectiva levada a cabo pelo Segurança Social, esta circunstância apenas contribuiu para que o Tribunal pudesse dar maior crédito às declarações que prestou nestes autos. Na verdade, a testemunha admitiu que estando então também a trabalhar por conta da R., com a qual mantinha, aliás, uma relação de amizade, as suas declarações foram no sentido de a ajudar isentando-a de qualquer responsabilidade no que se refere ao contrato de trabalho celebrado com a A. Mas, actualmente, tendo cessado este vínculo laboral e não dependendo economicamente da R. pôde depor de forma livre e conforme a sua consciência, vindo o seu depoimento revelar um conhecimento directo e absolutamente isento de qualquer intenção quer de beneficiar a A., quer de prejudicar a R., pessoas com quem actualmente não mantém contacto. Esta testemunha corroborou, assim, as declarações de parte prestadas pela A. e pelas testemunhas acima indicadas.
As declarações de parte da A. foram também esclarecedoras já que revelaram ao Tribunal os motivos pelos quais a demandante aceitou este contrato de trabalho, nestas condições, a sua falta de formação profissional e académica e a espontaneidade e sinceridade que revelou no seu depoimento.
Já no que se refere ao depoimento das testemunhas B. M., declarou que foi namorado da filha da R. e que trabalha num talho que fornece a R. pelo que se desloca esporadicamente à residência desta última e que não passa da cozinha, o que de todo permite conhecer quem lá trabalha ou quais os seus horários de trabalho; N. M. declarou ser genro do companheiro da R. tendo confirmado que a A. também trabalhava em sua casa uma vez por semana; P. M., declarou ser irmã do companheiro da R. e confirmou que a A. desempenhava em sua casa funções como empregada doméstica uma vez por semana e S. M. declarou que conhece a residência para idosos da R. onde reside a sua sogra e que viu lá esporadicamente a A.
Assim, considerou-se que todas as testemunhas da R. revelaram algum tipo de ligação pessoal com a mesma, anda que não de parentesco e os seus depoimentos traduziram uma intenção de defenderem os seus interesses, ainda que quanto às testemunhas N. M. e P. M. apenas demonstraram que a A. trabalhava também nas suas residências, uma vez por semana em simultâneo com as funções desempenhadas por conta da R. o que se compreende quando se analisa o valor do vencimento mensal que esta lhe liquidava a título de retribuição.”
Após a audição de toda a prova testemunhal, das declarações de parte prestadas por Autora e Ré, da análise da documentação junta aos autos e relevando sobretudo o depoimento das testemunhas que depuseram sobre os artigos 1.º a 5.º dos temas de prova, designadamente as testemunhas P. A., N. F. e M. F., esta última de forma indirecta, revelaram ter conhecimento destes factos conjugados ainda com as declarações prestadas pela Autora, teremos de dizer que não detectamos qualquer erro na apreciação da prova. Ao invés a apreciação da prova, afigura-se-nos de rigorosa, concisa, clara e escorreita, compreendendo-se a logicidade da formação do processo que conduziu à decisão da matéria de facto controvertida, não se vislumbrando qualquer contradição que resulte das regras da experiencia comum, que imponha que se proceda à alteração da decisão.
Assim, em face dos elementos de prova indicados pela recorrente, não merecem qualquer reparo os pontos de facto impugnados, já que condizem com a prova produzida, sendo a sua fundamentação congruente e indo de encontro com as regras da experiência.
Na verdade, os depoimentos das testemunhas arroladas pela Ré revelaram ser imprecisos, inconsistente, pouco ou nada sabendo relativamente à relação contratual existente entre Autora e Ré, limitando-se a afirmar por um lado, que frequentando de alguma forma a casa da Ré, poucas vezes se cruzaram com a autora, e por outro, dizendo que a autora trabalhou em período em causa, como empregada doméstica em casa de duas destas testemunhas, fazendo umas horas um dia por semana, de manhã ou de tarde. Tais afirmações, só por si não põem em causa, nem nos permitem concluir que a Autora apenas esporadicamente trabalhou por conta da Ré. Ao invés, como ficou provado apenas permitem que se conclua que no dia de folga semanal da autora, que nem sempre foi o mesmo, mas que nunca coincidiu com o domingo, esta trabalhava como empregada doméstica em casas particulares.
Por outro lado, no que respeita ao testemunho da N. F., teremos de dizer que a valorização do mesmo não é merecedora de qualquer reparo, já que ao contrário do afirmado pela recorrente, e como bem assinala a Juiz a quo na sua motivação, o facto desta testemunha no inicio do seu depoimento ter tido a preocupação de declarar que mentiu quando prestou declarações na segurança social, já que na altura se encontrava na dependência económica da Ré e ter medo do que esta pudesse fazer contra si se relatasse a verdade, apenas contribuiu para que o Tribunal pudesse dar maior crédito às declarações que prestou nestes autos, pois resulta das regras da experiência que a situação de dependência económica do trabalhador ao empregador muitas vezes condiciona os comportamentos, as atitudes e as declarações dos trabalhadores. A justificação que esta testemunha dá para o facto de ter mentido ao prestar declarações na Segurança Social não respeita apenas ao facto de não ter prestado juramento, mas sim e em primeira linha ao facto de ter medo da sua entidade empregadora, para quem atualmente já não trabalha.
Não vislumbramos assim qualquer razão objectiva para não valorizar o depoimento da referida testemunha, que por ter trabalhado juntamente com a autora ao serviço da Ré revelou ter conhecimento directo e desinteressado dos factos.
Ainda no que respeita ao depoimento das testemunhas arroladas pela Ré e não esquecendo que os seus depoimentos não se revelaram de isentos, afigura-se-nos dizer que nenhuma destas testemunhas conseguiu com rigor situar o período de tempo que a autora trabalhou por conta da Ré, revelando total desconhecimento sobre o horário a que a autora estava sujeita. Nem as testemunhas para as quais a autora prestou funções de empregada doméstica, conseguiram com rigor indicar quer o período de tempo em que a autora exerceu funções por conta destas, nem o dia, ou dias em que o trabalho lhes foi prestado.
Por fim, no que respeita às declarações de parte prestadas pela Ré, é certo que o tribunal a quo não se pronunciou sobre a sua valorização, mas tal não implica que tais declarações tivessem de ser valorizadas, pois atento o teor das mesmas, confrontado com a factualidade apurada tem necessariamente de se concluir que tais declarações não ofereceram ao tribunal a quo qualquer credibilidade sendo contraditórias com os factos apurados. O fio condutor que conduziu à matéria de facto provada não permite outra qualquer conclusão.
Em suma, não se vê motivo para alterar a decisão de facto, já que não foi cometido qualquer erro que impusesse qualquer alteração, quer no que respeita aos pontos de facto dados como provados, quer no que respeita aos pontos de facto dados como não provados e que agora se pretendiam que fossem provados.
Improcede assim a impugnação da matéria de facto, designadamente as conclusões D) a O) da alegação de recurso.

Pretende ainda a recorrente e a título subsidiário que se proceda à alteração da redacção da resposta dada aos artigos 4.º, 5.º, 7.º a 10.º dos temas da prova, dizendo que nenhuma das testemunhas, nem a própria autora concretizou as horas de trabalho que prestava no lar, quer o vencimento contratado, o número de domingos, feriados e descansos complementares trabalhados, se gozou férias e folgas

Nos referidos artigos dos temas de prova questionava-se o seguinte:

Artigo 4º) – A partir de Janeiro de 2016, a A. passou a trabalhar, todos os dias, sem dia de descanso semanal, com o seguinte horário:
Iniciava às 7h30m e terminava às 11h30, seguindo-se uma pausa, regressava às 16h00 e terminava às 20h00, perfazendo assim oito horas diárias?
Artigo 5º) - A remuneração base da A. enquanto trabalhadora da R. foi acordada no salário mínimo, contudo, a R. nunca pagou à A. esse valor, pagando-lhe apenas quatrocentos euros (400€) por mês?
Artigo 7º) – A R. não pagou à A. a quantia referente aos duodécimos dos subsídios de férias e de Natal dos anos de 2015 e 2017 e aos subsídios de férias e de Natal do ano de 2016?, os quais não recebeu, num total de € 3.547,76 ?
Artigo 8º) - No ano de 2016 a A. trabalhou um total 48 dias (domingos) e no ano de 2017 a 9 dias (domingos), tendo ainda trabalhado um total de 13 dias feriados no ano de 2016 e 1 dia no ano de 2017, pelo que a R. lhe deveria ter liquidado o valor de € 2.563,28?
Artigo 9º) – No ano de 2016 a A. trabalhou em dias de descanso suplementar 53 dias e em 2107, 10 dias o que totaliza um valor de € 2.294,16 não liquidado pela R.?
Artigo 10º) - A A. durante o período em que o seu contrato de trabalho esteve em vigor também nunca gozou férias, pois a R. não lhas concedeu nem lhe permitiu o seu gozo, pelo que a esse título deverá receber a quantia de €2.169,24?

O tribunal a quo respondeu a estes factos da seguinte forma:

Artigo 4º) – Provado apenas que a A. cumpria um horário de trabalho das 07h30 às 11h30 horas e das 16h00 às 20h00 horas, perfazendo oito horas diárias.
Artigo 5º) – Provado apenas que a A. auferiu sempre, ao longo da vigência do contrato de trabalho referido no art. 2º supra, a retribuição mensal de € 400,00, sendo que quando permanecia para além das 20h00 horas era remunerada com a quantia de € 10,00 ou de € 20,00 conforme as horas que cumpria (parte ou toda a noite).
Artigos 7º a 10.º - Provados”

A recorrente pretende que se dê como provado o seguinte:

“4º - a autora trabalhava algumas horas, sem horário fixo, no lar;
5º- a ré pagava à autora quantias variáveis conforme as horas que trabalhava;
7º- a ré não pagou à A. a quantia referente aos duodécimos dos subsídios de férias e de Natal dos anos de 2015 e 2017 e aos subsídios de férias e Natal do ano de 2016;
8º- no ano de 2016 e 2017 a A. trabalhou alguns domingos e em alguns dias feriados;
9º- no ano de 2016 e 2017 a A. trabalhou alguns dias de descanso suplementar;
10º- a A. durante o período em que o seu contrato de trabalho esteve em vigor não gozou alguns dos dias de férias a que tinha direito.”

Procedemos de novo a análise de toda a prova daí resultando, ao contrário do afirmado pela recorrente que, quer a testemunha N. F., quer a Autora, de forma clara e precisa concretizaram o horário de trabalho que esta cumpria diariamente, e que era o seguinte: das 8.30h às 11.30h com uma pausa de depois retomava às 16.00h e terminava pelas 19.30h.
Importa assim proceder à alteração da resposta à matéria de facto dando como provado o horário que a autora efectivamente desempenhava enquanto esteve ao serviço da Ré em conformidade com a prova produzida.

Assim o ponto de facto provado sob o n.º 8 passa a ter a seguinte redacção que ficará a constar no local próprio:

“A A. cumpria um horário de trabalho das 08h30 às 11h30 horas e das 16h00 às 19h30 horas”

Quanto à factualidade dada como provada na resposta positiva ao artigo 5º dos temas da prova teremos de dizer que quer o filho da autora, quer a sua irmã revelaram ter algum conhecimento ainda que indirecto sobre os valores liquidados pela Ré relativamente ao trabalho prestado para além do seu horário normal, sendo certo quanto ao vencimento contratado, tal apenas resulta das declarações da autora ao afirmar que auferia mensalmente €400,00, em dinheiro, sendo ameaçada pela Ré de que não poderia dizer a ninguém ser esse o seu vencimento.
Atenta a espontaneidade e sinceridade das suas declarações, tal como refere a juiz a quo na sua motivação e com o se concorda, entendemos que em face de todo o quadro factual vivenciado pela autora no que respeita a esta precária relação laboral e tendo presente que a autora trabalhava por conta da Ré a tempo inteiro, conjugadas com o depoimento das testemunhas por si arroladas, que se nos afiguram de credíveis, é de manter a redacção da resposta positiva ao art.º 5 dos temas da prova, improcedendo nesta parte a impugnação.
Quanto à factualidade dada como provada na resposta positiva aos artigos 7º a 10.º dos temas da prova e que respeita à falta de pagamento dos subsídios de férias e de natal, ao trabalho prestado em domingos, feriados e dia de descanso complementar, bem como à falta de gozo do período de férias, teremos de dizer que a prova produzida foi suficiente para dar estes factos como provados, ainda que se imponha alteração na sua redacção, atenta a matéria conclusiva que consta de tais respostas, ao mencionarem as quantias monetárias a que a autora tem direito a título de créditos laborais.
O Tribunal só pode e deve considerar como provado em resultado da prova produzida “os factos” e não as conclusões ou juízos de valor a extrair dos mesmos à luz das normas jurídicas aplicáveis, o que é uma operação intelectual bem distinta. Salientamos assim, que são de afastar as expressões de conteúdo puramente valorativo ou conclusivo, destituídas de qualquer suporte factual, que sejam susceptíveis de influenciar o sentido da solução do litígio.

Em suma, os juízos conclusivos têm necessariamente de ser considerados como asserções não escritas e ser por isso excluídos do acervo factual relevante.
Quanto à restante factualidade dada como provada na resposta positiva aos artigos 8.º a 10.º dos temas de prova não se impõe a sua alteração, designadamente nos termos pretendidos pela recorrente, no que respeita ao artigo 10. Contudo impõem-se algumas alterações/precisões no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso complementar e em dia feriado.
Na verdade, tendo resultado da prova produzida que a autora desde Novembro de 2015 que trabalhou todos os dias excepto um dia por semana que era aquele em que folgava (ponto de facto 7 dos factos provados), o que sucedia à sexta ou à segunda-feira, facilmente se conclui, tal como foi alegado, que a Autora trabalhou todos os domingos e feriados e todos os dias de descanso semanal complementar, uma vez que a Ré nunca lhe proporcionou o gozo destes. Ainda que nenhuma prova tivesse sido realizada no que respeita aos concretos dias em que a autora prestou trabalho em domingos, feriados e dia de descanso semanal complementar, o certo é que tendo prestado trabalho em todos os dias enquanto esteve ao serviço da Ré com excepção do dia de folga, que não era coincidente com estes, teremos de concluir que tais factos teriam de ser dados como provados.
Contudo, no que respeita ao número de feriados trabalhados nos anos de 2016 e 2017, bem como ao número de dias de descanso semanal complementar trabalhado impõe-se a sua alteração, pois no que respeita aos feriados do ano de 2016, aqueles que coincidiram com o dia de folga da autora, inicialmente à sexta-feira e posteriormente à segunda-feira não devem, nem podem entrar no computo dos dias trabalhados.
Assim, são apenas de considerar como feriados trabalhados no ano de 2016, um total de 9 dias, visto que os restantes dias feriados coincidiram com o dia de folga da Autora (inicialmente sexta e posteriormente segunda-feira). No que respeita ao ano de 2017 o feriado dado como provado como tendo sido trabalhado coincidia com o dia de folga (dia 1 de Janeiro de 2017, foi uma segunda-feira), pelo que não podia ter sido considerado como dia trabalhado.
No que refere aos dias de descanso semanal complementar trabalhados, diremos que tendo o ano de 2016 tido cinquenta e duas semanas, os dias de descanso semanal complementar trabalhados têm de ser considerados de 52 e não de 53 dias.
Procede assim nesta parte a impugnação da matéria de facto.
Por último, que respeito à falta de gozo de férias teremos de dizer que efectivamente a autora não gozou qualquer período de férias, porque tal não lhe foi permitido pela Ré, pois a ausência por 4 ou 5 dias que a Autora refere ter tido para ir com o filho a Fátima, não foi tal período considerado pela Ré como sendo período de férias, pois não lhe foi liquidada qualquer importância, designadamente a título de férias gozadas, razão pela qual urge concluir que enquanto esteve ao serviço da Ré não lhe foi permitido gozar qualquer período de férias.

Resumindo os pontos de facto dados como provados sob os n.ºs 11 a 14, passam a ter a seguinte redacção, que passará a constar do local próprio:

11. A R. não pagou à A. a quantia referente aos duodécimos dos subsídios de férias e de Natal dos anos de 2015 e 2017 e aos subsídios de férias e de Natal do ano de 2016.
12. No ano de 2016 a A. trabalhou um total 48 dias (domingos) e no ano de 2017, 9 dias (domingos), tendo ainda trabalhado um total de 9 dias feriados no ano de 2016.
13. No ano de 2016 a A. trabalhou em dias de descanso suplementar 52 dias e em 2107, 10 dias.
14. A A. durante o período em que o seu contrato de trabalho esteve em vigor também nunca gozou férias, pois a R. não lhas concedeu nem lhe permitiu o seu gozo.
Procede assim nesta medida a impugnação da matéria de facto.

3. Do erro de julgamento quanto à subsunção jurídica dos factos ao direito

A relação entre as partes subjacente ao litígio dos autos teve o seu início em Novembro de 2015, data em que Autora e Ré celebraram um contrato de trabalho verbal, sendo por isso aplicável a esta relação contratual, o Código do Trabalho de 2009, aprovada pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro (doravante CT.).
Defende a recorrente que a decisão recorrida padece de erro na fixação da indemnização que concedeu à autora a título de diferenças salariais referente ao mês de Novembro de 2015, bem como aos proporcionais de subsídio de férias e de natal referente a esse mesmo mês, isto porque não tendo sido possível apurar o dia exacto do mês em que a autora iniciou a sua prestação, deveria ter-se considerado que tal ocorreu no último dia desse mês e não no primeiro, como foi considerado pelo Tribunal a quo, devendo assim a indemnização ser reduzida nessa conformidade.

O Tribunal a quo considerou que a partir de Novembro de 2015, se alteraram as funções, bem como as condições em que a autora vinha prestando trabalho para a Ré e procedeu aos cálculos partindo do princípio que a A. começou a trabalhar no dia 1 de Novembro.

Da factualidade apurada apenas resulta que o contrato de trabalho celebrado teve início em Novembro de 2015, pelo que importa socorrermos das normas referentes à interpretação da declaração negocial previstas nos artigos 236.º a 238.º do Código Civil.

Estipula o artigo 236º, sob a epígrafe “Sentido normal da declaração”, o seguinte:

«1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.»

Por sua vez, o artigo 237.º sob a epígrafe “Casos duvidosos” estipula o seguinte:

«Em caso de dúvida sobre o sentido da declaração, prevalece, nos negócios gratuitos, o menos gravoso para o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das prestações.»

Conforme se refere no sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06/12/2012, P. 14/06.7TBCMG.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt, “II- As regras constantes dos arts. 236º a 238º do CC constituem diretrizes que visam vincular o intérprete a um dos sentidos propiciados pela atividade interpretativa, e o que basicamente se retira do art. 236º é que, em homenagem aos princípios da proteção da confiança e da segurança do tráfico jurídico, dá-se prioridade, em tese geral, ao ponto de vista do declaratário (recetor). No entanto, a lei não se basta com o sentido realmente compreendido pelo declaratário (entendimento subjetivo deste) e, por isso, concede primazia àquele que um declaratário normal, típico, colocado na posição real do declaratário, depreenderia (sentido objetivo para o declaratário). III- Em termos práticos, o intérprete deve, relativamente a ambos os contraentes, tentar definir a posição em que se encontram perante a declaração da contraparte, e colocar um declaratário ideal (normal) na posição do declaratário real”.
Sobre o declaratário normal, escreve o Prof. Paulo Mota Pinto, in “Declaração Tácita e Comportamento Concludente no Negócio Jurídico”, página 208: “uma pessoa com razoabilidade, sagacidade, conhecimento e inteligência medianos, considerando as circunstâncias que ela teria conhecido e o modo como teria raciocinado a partir delas, mas figurando-a na posição do real declaratário (…) e o modo como aquele concreto declaratário poderia a partir delas ter depreendido um sentido declarativo”
Tendo presentes os critérios interpretativos legalmente previstos diremos que sob o ponto de vista de um declaratário normal, colocado na posição real do declaratário, para se aferir o “sentido normal da declaração”, designadamente, o sentido que atribuiria a esta declaração um “bónus pater famílias” equilibrado e de bom senso, com inteligência, conhecimentos e diligência medianos (declaratário normal), na posição do real declaratário seria deque a expressão “Novembro de 2015… a A.começou a prestar serviço para a Ré”, tem de ser interpretada no sentido de abarcar/incluir o grosso ou a totalidade dos dias do mês de Novembro, por ser esta interpretação que conduz ao maior equilíbrio das prestações e não no sentido pretendido pela recorrente de se dever considerar o final do mês de Novembro, designadamente no último dia.
Assim sendo, bem andou o tribunal a quo ao considerar que o mês de Novembro foi o primeiro mês em que a autora trabalhou sob as ordens direcção e fiscalização da Ré, sendo-lhe por isso devidas as prestações pecuniárias correspondentes ao trabalho prestado nesse mês.

Improcede assim as conclusões T), U) e V) das alegações de recurso.

Defende a recorrente que também não podia ter sido condenada a indemnizar a A. por violação culposa do gozo das férias relativamente ao ano de 2017, porquanto foi ela que resolveu o contrato sem qualquer fundamento.

A propósito da violação do gozo de férias refere o Tribunal a quo o seguinte:

“Por fim, quanto à violação do gozo de férias, verifica-se que a demandada nunca permitiu o gozo de férias à A., que trabalhou ininterruptamente de Junho de 2015 a Março de 2017 nestas condições, pelo que de acordo com o disposto no art. 246º do Cód. do Trabalho a mesma tem direito a uma indemnização no valor que peticionou de € 2.169,24 (dois mil cento e sessenta e nove euros e vinte e quatro cêntimos) = 4 dias de 2016 (22,95€ dia x 4 x 3) + 1 mês de 2016 (530€ x 3) + 4 dias de 2017 (25,32€ dia x 4 x 3).”

Prescreve o art.º 245.º n.º 1 do CT, sob a epigrafe “Efeitos da cessação do contrato de trabalho no direito a férias” o seguinte:

«Cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição de férias e respectivo subsídio:

a) Correspondentes a férias vencidas e não gozadas;
b) Proporcionais ao tempo de serviço prestado no ano da cessação.”

Da conjugação do citado preceito com o disposto no n.º 1 do art.º 237.º do CT. (do qual resulta que o trabalhador tem, direito em cada ano civil, a um período de férias retribuídas, que se vence em 1 de Janeiro) temos por certo que os 4 dias de férias correspondentes ao trabalho prestado no ano de 2017, apenas são devidos porque o contrato cessou, pois caso contrário apenas se venceria o direito a férias pelo trabalho prestado no ano de 2017, no dia 1 de Janeiro de 2018.
Assim sendo e porque o direito em questão apenas se venceu com a cessação do contrato, assiste inteira razão à recorrente ao afirmar que a autora não tem direito à indemnização atribuída respeitante à violação culposa do gozo de férias pela Ré, uma vez que tal violação não se verifica.
A ré só podia ter impedido o gozo das férias vencidas e não das que por força da cessação do contrato de trabalho se venceram.
Importa assim proceder à reformulação do cálculo deixando consignado que pela violação do gozo de férias é devido à autora o montante global de €1.865,40 (€2.169,24- 303,84 (25,32 dia x 4 x 3) = €1.865,40. E pelo tempo proporcional ao serviço prestado no ano de 2017, corresponde a 4 dias de férias é lhe devida a quantia de €101,28 (€25,32 dia x 4), em cujo pagamento se condena a Ré.
Procede nesta parte o recurso, bem como a conclusão X das alegações de recurso.
No que respeita ao trabalho prestado em dia feriado insurge-se também a recorrente pelo facto da indemnização arbitrada a este título ter incluído o pagamento de dias feriados em que a autora esteve de folga.
Atenta a alteração da matéria de facto, designadamente tendo presente a nova redacção dada ao ponto 12 dos pontos de facto provados, apenas daí resulta que a autora trabalhou em 9 feriados no ano de 2016, sendo irrelevante que os mesmos tenham ou não coincidido com domingos, visto que no caso este não era o dia de descanso obrigatório.
Assim sendo, incumbe proceder aos novos cálculos, uma vez que apenas é devido à autora o pagamento correspondente a trabalho prestado em 9 feriados, no ano de 2016, sendo certo que resultando da factualidade provada que a autora no ano de 2016 trabalhou todos os dias excepto no dia em que folgava (ponto 7. dos pontos de facto provados), é evidente que a Ré não lhe proporcionou qualquer descanso compensatório pelo que tem direito à retribuição correspondente ao feriado, com o acréscimo de 50% - cfr. art.º 269.º do CT.
Procedendo aos cálculos é-lhe devido pelo trabalho prestado em 9 dias feriados no ano de 2016 a importância global de €325,08, assim calculada €24,08 dia x 9 feriados = €216,72 + (216,72 x 50% = €108,36).
Revoga-se nesta parte a sentença recorrida, procedem parcialmente as conclusões Z a CC das alegações de recurso.
Por fim, insurge-se a recorrente quanto à indemnização fixada pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal complementar defendendo que a autora não tem direito a tal indemnização porque não logrou provar que a Ré não lhe permitiu que gozasse quaisquer dias de descansos compensatórios.
Salvo o devido respeito por opinião em contrário, teremos de dizer que à recorrente não assiste razão, pois a autora logrou provar factualidade bastante que nos permite concluir que os descansos compensatórios pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal complementar não lhe foram, nem lhe podiam ter sido dados a gozar, pois resultando da factualidade provada que desde o inicio do contrato de trabalho trabalhou todos os dias, excepto no dia de folga, não tendo sio permitido sequer gozar férias, não se vislumbra como possa a Ré ter-lhe dado a gozar os descansos compensatórios.
Em suma, ainda que da factualidade provada não resulte expressamente provado que na decorrência do trabalho prestado em dia de descanso semanal complementar não foram dados a gozar à Autora, o certo é que tendo trabalhado todos os dias da semana com excepção do dia de folga, facilmente se conclui que a Ré não lhe proporcionou o dia de descanso compensatório.
Improcedem as conclusões de recurso DD a II, porém terá de se proceder à reformulação dos cálculos uma vez que em face da alteração à matéria de facto apenas resultou provado que no ano de 2016 a A. trabalhou 52 dias em dias de descanso semanal complementar e não 53.

Assim é devido à Autora a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal complementar a importância global de €2.258,04 assim calculada:

Ano 2016 = €24,08 x 52 dias = €1.252,16 + (€1252,16x 50% ) = €1.878,24;
Ano 2017 = €25,32 dia x 10 dias = €253,20 + (€253,20 x 50%) = 126,60 = €379,80;
Total €1.878,24 + €379,80= € 2.258,04
Procede o recurso nesta medida e a sentença recorrida será revogada em conformidade com os novos valores apurados.

4 . Da litigância de má-fé.

Insurge-se a Recorrente quanto ao facto de ter sido condenada como litigante de má-fé na multa no valor equivalente a 6 UC`s, bem como a pagar de indemnização à Autora a quantia equivalente a 5UC`s, dizendo em resumo que a sua actuação dolosa ou gravemente negligente se ficou a dever ao facto de estar convencida que a autora não desenvolvia para si qualquer actividade laboral, mas apenas tarefas ocasionais, não se justificando assim a condenação a este título. Acrescentando que caso assim não se entenda quer a multa quer a indemnização não devem ultrapassar a 1 UC.
Analisemos os fundamentos que levaram à condenação da Ré como litigante de má-fé, antes porém impõe-se fazer algumas considerações.

A condenação de qualquer parte como litigante de má-fé tem um forte cariz punitivo do seu comportamento processual, por ter como requisito um comportamento eivado de dolo ou de negligência grave, ficando tal actuação abrangida pela previsão do art.º 542º do Código de Processo Civil, o qual dispõe o seguinte:

Este normativo estatui:

“1 – Tendo litigado de má-fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir.
2 – Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
3 – Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má-fé.”

As partes, em juízo, estão sujeitas aos deveres de cooperação, probidade e boa fé consagrados nos artigos 7º, 8º e 9º do CPC quer na relação que entre elas se estabelece, quer em relação ao Tribunal, já que a lide visa a obtenção de decisão justa, a qual deve ser encontrada mediante a verdade e a aplicação do direito, sob pena da protecção jurídica que reclamam não ser alcançada, com desprestígio para si mesmas e para a Justiça.
Uma das condutas em que se exprime a litigância de má-fé consiste na alegação, voluntária e consciente, de factos que seriam relevantes para a decisão da causa, mas que a parte sabe que, ao alegar como alega, desvirtua a realidade por si conhecida, visando, por isso, intencionalmente um objectivo censurável.
Também actua de má-fé, a parte que litiga com propósitos dilatórios, obstando pela sua conduta temerária, que o Tribunal almeje uma rápida decisão, pondo assim em causa o objectivo de realização de uma justiça pronta, que, decidindo o litígio com rapidez, reponha a certeza, a paz social e a segurança jurídica, afrontadas pelo litígio.
Quando assim procede, o pleiteante litiga com má-fé material e instrumental, não só porque sabe que não lhe assiste o direito que ajuizou como faz mau uso dos meios processuais.
A parte tem o dever de não deduzir pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; de não alterar a verdade dos factos ou de não omitir factos relevantes para a decisão da causa; de não fazer do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão; de não praticar omissão grave do dever de cooperação, tal como ele resulta do disposto nos arts. 7º e 8º do CPC.
Se intencionalmente, ou por falta da diligência exigível a qualquer litigante, a parte violar qualquer desses deveres, a sua conduta fá-la incorrer em multa, ficando ainda sujeito a uma pretensão indemnizatória destinada a ressarcir a parte contrária dos danos resultantes da má-fé.
A doutrina tem classificado a má-fé de que trata o preceito em duas variantes: a má-fé material e a má-fé instrumental, abrangendo a primeira os casos das alíneas a) e b) do nº 2, e a segunda, os das alíneas c) e d) do mesmo número.
A litigância de má-fé exige a consciência de que quem pleiteia de certa forma, tem a consciência de não ter razão, litiga-se afirmando factos que mais do que ninguém sabe serem falsos.
A defesa convicta de uma perspectiva jurídica dos factos, diversa daquela que a decisão judicial acolhe, não implica, por si só, litigância censurável a impor a aplicação do art.º 521º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, contudo se não forem observados os deveres de probidade, de cooperação e de boa-fé, patenteia-se litigância de má-fé.
Não basta, assim, para que se conclua pela litigância de má-fé por alguma das partes no processo, a dedução de pretensão ou oposição sem fundamento, ou a afirmação de factos não verificados ou verificados de forma distinta: tal pode ter ocorrido por a parte se encontrar, embora incorretamente, convencida da sua razão ou de que os factos se verificaram da forma que os descreve, hipótese em que inexistirá má-fé.
Impõe-se, pois, para que haja litigância de má-fé, que a parte, ao deduzir a sua pretensão ou oposição infundamentada ou ao afirmar factos não ocorridos, tenha atuado com dolo ou com negligência grave, ou seja, sabendo da falta de fundamento da sua pretensão ou oposição, ou encontrando-se numa situação em que se lhe impunha que tivesse esse conhecimento.
Na decisão recorrida o Tribunal a quo considerou que a Ré fez um uso manifestamente reprovável com a contestação apresentada, distorcendo a verdade dos factos relevantes para a decisão da causa nomeadamente, ao ter apresentado uma versão baseada numa suposta prestação de trabalho doméstico a tempo parcial por parte da demandante, a que acresce que a inveracidade se tornou também patente quando chama uma pessoa colectiva a intervir, ciente de que a mesma só foi constituída em momento posterior ao termo do contrato de trabalho.
Não podemos deixar de concordar com o tribunal recorrido, aliás até a própria Ré reconhece que actuou de forma dolosa ou gravemente negligente justificando o seu comportamento com o facto de estar convencida que a Autora não desenvolvia qualquer actividade laboral.
Ora, a Ré não só desvirtua a realidade por si conhecida, trazendo para os autos factos que sabia não serem verdadeiros, visando, por isso, intencionalmente um objectivo censurável, ao pretender fazer crer que a autora apenas tinha prestado trabalho doméstico a tempo parcial, como também usou os meios processuais de forma manifestamente reprovável com o fim de conseguir de impedir a descoberta da verdade e entorpecer a acção da justiça ao deduzir a excepção da sua ilegitimidade, provocando a intervenção de terceiro no processo (sociedade unipessoal – cfr. fls. 70 e 71 dos autos), ciente de que o chamado não havia estabelecido qualquer relação contratual com a autora, não tendo por isso qualquer interesse em contradizer a acção.
Por um lado, a Ré fez uso indevido do processo ao alterar e distorcer a verdade dos factos, estando perfeitamente ciente que a Autora se encontrava a trabalhar por sua conta e no seu interesse. Por outro lado, ainda provocou o chamamento de terceiro à acção ciente de que o mesmo não teria qualquer interesse no desfecho da causa, fazendo assim uso indevido dos meios processuais, em nada relevando a justificação agora por si apresentada pela Ré. Teremos assim de concluir que a Ré excedeu de forma relevante os limites da prudência normal da lide, agindo com culpa grave, pelo que litigou de má-fé.
No que respeita ao valor quer da multa, quer da indemnização arbitrada pelo tribunal a quo, não são merecedores de qualquer reparo, já que se nos afiguram ser proporcionais e adequados à gravidade da situação e à condição económica da Ré (sócia-gerente de estabelecimento que se dedica ao apoio social de pessoas idosas com alojamento).
Por último, uma breve nota sobre o pedido de condenação como litigante de má-fé da autora para dizer que o facto de não se ter provado a versão integral dos factos alegados pela autora, tal não significa que esta agiu processualmente em clara má-fé.
Na verdade, não resulta dos autos que a autora tivesse de forma voluntária e consciente, desvirtuado a realidade por si conhecida, alegando factos que seriam relevantes para a decisão da causa, visando com tal conduta alcançar um objectivo censurável.
Improcede assim o pedido de condenação da autora como litigante de má-fé, sendo de manter a decisão recorrida no que respeita à condenação da Ré como litigante de má-fé.
Improcedem as conclusões JJ a QQ das alegações de recurso.

V – DECISÃO

Pelo exposto, e ao abrigo do disposto nos artigos 87º do C.P.T. e 663.º do C.P.C., acorda-se, neste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar:

a) parcialmente procedente a impugnação da matéria de facto e em consequência alteram-se os pontos 8; 11 a 14 da matéria de facto nos termos sobreditos;
b) revoga-se parcialmente a sentença recorrida e nessa medida condena-se a e Ré M. C. a pagar à Autora M. J. a quantia de €7.772,48 a título de créditos laborais vencidos e não liquidados, acrescidos dos respectivos juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a citação e vincendos até integral pagamento;
c) Quanto ao mais mantêm-se a decisão recorrida;
Custas por ambas as partes na proporção do decaimento, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido à Autora.
Guimarães, 19 de Novembro de 2019

Vera Sottomayor (relatora)
Maria Leonor Barroso
Antero Veiga