Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
398/14.3T8VRL.G2
Relator: JOSÉ CRAVO
Descritores: CONTRATO DE SEGURO
PRÉMIO
EXCLUSÕES
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/14/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
No âmbito da liberdade contratual, os termos da abrangência e exclusões da cobertura do seguro serão mais extensos ou não, consoante o prémio que se esteja disposto a pagar.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

1 RELATÓRIO

Nos presentes autos (1), M. V., residente na Avenida … Vila Real, instaurou acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., com sede no Largo de … Lisboa e BANCO, com sede na Avenida … Lisboa, deduzindo a final os seguintes pedidos de condenação das rés:
- Declarar-se a nulidade das cláusulas apostas no contrato de seguro de vida do grupo Banco Geral Depósitos nulo e sem nenhum efeito por violação dos deveres de informação, explicação entrega da cópia do contrato, nos termos do DL das cláusulas contratuais gerais, no que concerne à exclusão da responsabilidade decorrente de invalidez resultante de doença e ou acidente.
- Declarar-se a activação do seguro de vida identificado nos presentes autos, com a apólice 50012020007...., com efeitos a partir de 9/12/2012, condenando-se as rés a reconhecê-lo.
- Condenar-se a Ré Companhia de Seguros a pagar à Ré Banco o capital seguro desde 09/12/2012, coincidente com o capital em divida do empréstimo hipotecário identificado nos presentes autos.
- Deve a Ré Banco ser condenada a restituir à autora o valor correspondente às prestações mensais do empréstimo (amortização de capital, juros spread e despesas de comissão de processamento e imposto de selo inerente), vencidas após 9/12/2012, ou no montante preciso que a Ré BANCO indique, e todas as demais que a autora pague durante o trânsito em julgado da sentença.
- Deve a Ré Companhia de Seguros ser condenada a restituir à autora quantia relativa aos prémios de seguro de vida e multirriscos após 09/12/2012 inclusivè, e todos os demais que a autora pague até trânsito em julgado da sentença”.
Para tanto, alegou, em súmula, que em 26-12-2006, outorgou uma escritura pública de mútuo com hipoteca e fiança, mediante a qual a ré BANCO lhe concedeu um financiamento no montante de € 30.000,00 e que, para garantia desse empréstimo, foi efectuado um contrato de seguro do ramo vida, no qual figurava como seguradora a ré Companhia de Seguros.
Posteriormente, em 26/11/2009 outorgou um contrato de mútuo com hipoteca e fiança, mediante a qual a ré BANCO lhe concedeu um financiamento no montante de € 45.000,00 e que, para garantia desse empréstimo, por imposição da ré BANCO, foi efectuado um novo contrato de seguro do ramo vida, no qual figurava como seguradora a ré Companhia de Seguros, sem que tivesse sido disponibilizada à autora uma cópia desse contrato, ou que lhe tivessem sido explicadas as cláusulas de exclusão da apólice.
Alega ainda que se encontra impossibilitada de exercer uma actividade profissional remunerada, necessitando da colaboração de uma terceira pessoa para a ajudar no seu dia-a-dia, mas a ré Companhia de Seguros declinou estar tal situação abrangida pela cobertura do contrato de seguro celebrado em 2009, o que não aceita, pelo que defende dever a ré Companhia de Seguros ser responsabilizada pela amortização do montante em dívida em 09-12-2012.

A ré Companhia de Seguros apresentou contestação (fls. 115-121 e 295-297), na qual reafirmou a exclusão da cobertura do contrato de seguro celebrado em 2009, face à idade da autora, para além de ter impugnado a propalada violação do dever de informação e esclarecimento e rejeitado que se mostre evidenciado que a autora se apresente numa situação de invalidez, tal como esta se encontra configurada no contrato de seguro.

A ré BANCO ofereceu contestação (fls. 151-154 e 291-292), na qual secundou a posição vertida pela ré Companhia de Seguros e reafirmou ter sido assegurado o cumprimento dos deveres de informação e de esclarecimento da autora.

No despacho saneador foi fixado o objecto do litígio e os temas de prova.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do pertinente formalismo legal.

No final, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo as RR. dos pedidos.
*

Inconformada com essa sentença, apresentou a A. recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões:

I - O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo proferiu nos presentes autos a sentença, nos termos da qual: “Em face do exposto, nos presentes autos de acção declarativa, sob a forma de processo comum, decide-se: a) Julgar totalmente improcedentes os pedidos formulados pela autora M. V., absolvendo-se em conformidade as Rés Banco, SA e Companhia de Seguros, SA de tais pretensões; b) Condenar a autora M. V. no pagamento das custas processuais, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia – Cfr. Artigos 527, nº.s 1 e 2 do CPC”.
II - Inconformada com a douta sentença, dela vem interpor recurso.
III - O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, para tanto, fundamentou a sua douta decisão referindo que a autora, a aqui recorrente, veio colocar em crise a validade do contrato de seguro de vida celebrado pela ré BANCO com a ré Companhia de Seguros a que aderiu em 03/11/2009, correspondente à apólice nº. 5 0001 XXX, aludindo que se trata de um contrato de natureza bilateral, e se apresenta como aleatório, de execução continuada e de adesão, regendo-se pelo princípio da liberdade contratual, devendo o segurador obrigar-se a formalizar a contrato num instrumento escrito, designado por apólice de seguro, onde constam as condições gerais, especiais e particulares e a entregá-lo ao tomador do seguro.
IV - Mais refere que: “…atendendo ao figurino da declaração de adesão e das condições particulares, verifica-se que a autora aderiu a um contrato de seguro de grupo celebrado entre a ré BANCO e a ré Companhia de Seguros, de cariz contributivo que se reporta a um seguro de vida, pelo que a seguradora cobre um risco relacionada com a morte ou sobrevivência da pessoa segura”.
E que,
V -Essa adesão, continua a referir o Meritíssimo Juiz, seguiu-se a uma primeira adesão em 20/11/2006 a um contrato de seguro de grupo celebrado entre a ré BANCO e a ré Companhia de Seguros, mas, como essas adesões visam a garantia de um dado financiamento, ou seja, são funcionalizadas, a primeira relação contratual de seguro de vida extinguiu-se com a liquidação do primitivo mútuo concedido à autora, operada pela concessão de um segundo financiamento em 26/11/2009, pelo que as suas condições contratuais não poderão ser repristinadas, embora, ainda que assim não fosse, também o primitivo seguro previa a cessação da garantia por invalidez total e permanente aos 65 anos”.
VI - A recorrente, após, notificada da sentença, viu o seu pedido rejeitado com a total improcedência dos pedidos.
Na verdade,
VII - Nada faltaria à decisão tomada pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal recorrido se o processo de adesão ao seguro de vida pela ora recorrente tivesse sido desencadeado de uma forma normal e comum às várias adesões de um qualquer outro contrato para empréstimo bancário.
Tal, porém, não aconteceu no caso em crise.
No entanto,
VIII - Como já mencionou no recurso em que reclamou do arquivamento dos presentes autos por extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a recorrente, apenas, se vinculou a um contrato de seguro de vida, correspondente à apólice de seguro nº. 5.0001.YYY, subscrito em 20/11/2006, pelo qual a BANCO lhe concedeu um financiamento do montante de € 30.000,00, titulado por escritura de Mútuo com Hipoteca e Fiança outorgada em 26/12/2006.
IX - A recorrente no ano de 2009, com vista a melhorar e reestruturar a sua vida, resolveu “pedir mais um bocadinho”, pelo que recorreu a um novo empréstimo no montante de € 45.000,00, junto daquela Instituição de crédito,
X - Foi informada que não era necessário efectuar um novo seguro, pois seria utilizado o Contrato de Seguro de Vida que serviu para outorgar a escritura de empréstimo celebrada em 26/12/2006, “ficando tudo na mesma, só era preciso um fiador”, não sendo, assim, necessário efectuar um novo seguro de vida.
XI - Nessa conformidade e para o efeito desse empréstimo, foi outorgado o Título de Mútuo com Hipoteca e Fiança e Renúncia em 26/11/2009.
XII - A recorrente, confiando na informação prestada pela Instituição de Crédito BANCO, assinou todos os “papéis sem ler”, “assinou, mas não sabe o que assinou”, “não lhe foi mostrado nenhum papel referente ao seguro”, “não lhe falou em novo seguro” e “não lhe falara na idade”.
XIII - Só, após o acidente de que foi vítima em 9 de Dezembro de 2012, a recorrente soube da existência de um novo seguro, que, como já referiu, ignorava totalmente, tendo, então, sido informada que assinara um novo seguro de vida grupo, Temporal Anual Renovável, correspondente à apólice nº. 5.0001.TTT, subordinado a condições particulares, que só em Outubro de 2014, a sua solicitação, lhe foi facultada cópia das informações contratuais.
Ora,
XIV - Dos contratos de seguro de vida grupo crédito à habitação, a recorrente não recebeu quaisquer cópias, não lhe foi explicado o conteúdo das cláusulas contratuais, nomeadamente a cláusula de extensão da responsabilidade decorrente da invalidez resultante de doença ou acidente e as suas consequências, nem tão-pouco foi informada de que as garantias cessam os seus efeitos verificadas que seja certas situações, nomeadamente a Garantia de Invalidez no termo da anuidade em que a pessoa segura completa 65 anos de idade.
XV - Quem recorre à utilização de cláusulas contratuais gerais encontra-se numa posição de superioridade relativamente aos aderentes que são privados de interferir na modelação das cláusulas e não tem mais liberdade do que a de assinar ou não o contrato, não gozando qualquer liberdade de fixação do seu conteúdo o que determina o dever daquele levar em consideração os interesses destes no que só assim encontra correspondência de uma conduta conforme à boa-fé.
Ora,
XVI - Decorre do artº. 5º do Decreto-Lei nº. 446/85 de 25/10 que:
1 - As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicados na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las.
2 - A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência.
Assim,
XVII - A omissão de informação que se impõe à Instituição de Crédito a realizar em obediência aos mais elementares princípios da boa-fé tornará a cláusula nula e de nenhum efeito, por absoluta desproporcionalidade e por contrariar os princípios que regem o instituto da resolução nos termos dos arts. 12º e 15º do DL 446/85, de 25 de Outubro e do artº. 294º do CC.
Por outro lado,
XVIII - Resulta do teor de todo o artº. 4º do DL nº. 222/2009, de 11 de Setembro que a empresa de seguros, nessa qualidade e a instituição de crédito, nessa qualidade, além dos deveres de informação a que está obrigada, acrescem os deveres de informação específicos, tais como, conforme consta do nº 2, cabe à instituição de crédito que se disponha a conceder o crédito à habitação prestar aos interessados, na fase pré-contratual, todos os esclarecimentos exigíveis e os por estes solicitados sobre o contrato de seguro de vida cuja celebração lhes proponha ou aconselhe, nomeadamente a informação relativa às exclusões do contrato de seguro, com relevo para as doenças e patologias pré-existentes (…) e à obrigatoriedade de vinculação contratual à anuidade do contrato.
Além disso,
XIX - Como é referido no nº. 3 do citado diploma, além das restantes alíneas, sempre que a celebração do contrato de crédito à habitação se encontre subordinado à condição de contratação de um seguro de grupo, a instituição de crédito deve, na fase pré contratual:
a) Declarar que a celebração do contrato de crédito à habitação se encontra subordinada à condição de contratação de um seguro de grupo;
b) Declarar que, em caso de sinistro que se encontre abrangido pela cobertura da apólice de seguro contratada, o capital seguro é pago à instituição de crédito para antecipação total ou parcial da amortização do empréstimo;
c) Fornecer uma descrição das coberturas e demais requisitos mínimos a que um seguro de vida deve obedecer, de modo a ser aceite pela instituição de crédito.
Assim,
XX - Com a omissão e o silêncio verificados a instituição de crédito não prestou à recorrente os esclarecimentos a que estava legalmente obrigada, pelo que, conforme estatui o artº. 9º do citado diploma, a instituição incorre em responsabilidade civil, nos termo gerais, sendo sancionadas, também, nos termos do nº. 11º do mesmo diploma.
Por outro lado,
XXI - Muito embora não tenha sido comunicado à recorrente a existência de um contrato de seguro de vida de grupo, pelo que a mesma o ignorava totalmente, o contrato que consta dos autos e que serviu para a concessão do empréstimo pela BANCO está, nos termos do nº. 1 do artº. 1º do DL 446/85, de 25 de Outubro, sujeito ao regime das Cláusulas Contratuais Gerais, porquanto foi elaborado sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar.
De facto,
XXII - A Recorrente não se apercebeu, nem, tão-pouco, foi informada da existência dum contrato, verificando, posteriormente, que o assinara sem se aperceber, estando previamente preenchido pela BANCO, não havendo lugar a qualquer negociação individual, servindo, certamente, de base para todos os contratos celebrados pela mesma instituição.
Deste modo,
XXIII - Por força do n.º 1, do artigo 5.º, do referido diploma, as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra ao aderente que se limite a subscreve-las ou aceitá-las, sendo que tal comunicação deve ser realizada de modo adequado, tornando possível o seu conhecimento completo e efectivo.
Para tanto,
XXIV - Não é suficiente a entrega por parte da BANCO à Recorrente duma cópia do contrato de onde constam as cláusulas aplicadas, tendo, antes, sim, de proceder à comunicação e explicação de cada uma das cláusulas para que o aderente, no caso sub judice, a Recorrente, possa tomar o seu conhecimento completo, como se refere no Acórdão do STJ, de 8 de Abril de 2010, «a entidade que pretenda inserir cláusulas contratuais gerais nos contractos singulares que celebra deve comunicá-las antes da conclusão do negócio, de modo a proporcionar à contraparte a indispensável reflexão e um conhecimento completo e efectivo do clausulado; e este dever de comunicação, situado na fase de negociação ou pré-contratual, destina-se a que o aderente possa conhecer, com a necessária antecipação relativamente ao momento da consumação do negócio, o respectivo conteúdo contratual, de modo a poder apreendê-lo, nas suas efectivas e reais consequências prático-jurídicas, outorgando-lhe, deste modo, um espaço de reflexão e ponderação sobre o âmbito e dimensão das vinculações que lhe irão resultar da celebração do negócio». In www.dgsi.pt.
Ora,
XXV - A BANCO não informou a Recorrente do conteúdo, alcance e significado das cláusulas do contrato, mas, mesmo que lhe tivesse fornecido uma cópia do mesmo, «A comunicação integral das cláusulas e a necessidade de proporcionar à contraparte a possibilidade de uma exigível tomada de conhecimento do respectivo conteúdo, não basta, para que esteja cumprido tal dever, a mera comunicação das cláusulas, sendo exigível, que a sua transmissão se concretize de tal modo e com tal antecedência que se verifique por parte do destinatário uma efectiva tomada de conhecimento do seu conteúdo, pois, só assim, poderá formar, adequadamente, a sua vontade e medir o alcance e as consequências das suas decisões». Almeno de Sá, Cláusulas Contratuais Gerais e Directiva sobre Cláusulas Abusivas, pág. 234
Assim,
XXVI - Por força do disposto na al. a) e b), do artigo 8.º das CCG, as cláusulas que não foram comunicadas e explicadas/informadas – todas, portanto – consideram-se excluídas. Como refere Ana Prata, «sempre que for incumprida a obrigação de comunicação ou a de informação, as cláusulas não comunicadas ou aclaradas consideram-se excluídas do contrato. Há, pois, uma redução ope legis do contrato, uma amputação deste das cláusulas, que não são consideradas nele integradas, por violação das obrigações pré-contratuais que a lei enuncia». Contratos de Adesão e Cláusulas Contratuais Gerais, pág. 266
Por sua vez,
XXVII - O artigo 9.º do mesmo diploma estabelece que:
1- Nos casos previstos no artigo anterior os contratos singulares mantêm-se, vigorando na parte afectada as normas supletivas aplicáveis, com recurso, se necessário, às regras de integração dos negócios jurídicos;
2- Os referidos contratos são, todavia, nulos quando, não obstante a utilização dos elementos indicados no número anterior, ocorra uma indeterminação insuprível de aspectos essenciais ou um desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa-fé e, mesmo com recurso aos critérios de integração mencionados no número 1 do citado preceito, não for possível preencher a lacuna resultante da exclusão de cláusulas, por aplicação do artigo 8º, todo o contrato será nulo.
Isto é,
XXVIII - «a redução determinada pelo nº 1 só vale até ao limite e ao momento em que os elementos que ficam omissos e que sejam essenciais puderem ser resolvidos por disposições supletivas ou pelas regras de integração de lacunas. Se se chegar a uma situação de indeterminabilidade, ou se a solução alcançada se traduzir num desequilíbrio das prestações que viole gravemente a boa fé, então a nulidade daquela(s) cláusula(s) arrasta consigo a nulidade de todo o contrato». Ana Prata, ob. cit., pág. 285.
XXIX - A nulidade de todo o contrato ocorre, se a aplicação das regras supletivas conduzir a um desequilíbrio atentatório da boa-fé ou se, não obstante o recurso ao direito dispositivo, ocorrer uma indeterminação insuprível de aspectos essenciais do negócio. Esta consequência da indeterminabilidade encontra-se, aliás, prevista no artigo 280º, nº 1, do C.C.
XXX - Como se referiu, a BANCO não disponibilizou, antes ou em momento contemporâneo à subscrição do contrato, as condições gerais e especiais, assim como, não as comunicou e explicou devidamente, sendo, assim, nulo.
Assim,
XXXI - São proibidas todas as cláusulas do contrato aqui em causa que não cumpram com o disposto no artº. 18º das CCG, sendo, nos termos do artigo 12.º do DL 446/85, de 25 de Outubro, nulas.
XXXII - O mesmo destino têm as cláusulas que não cumpram o disposto no artigo 19.º do citado diploma.
XXXIII - O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo fundamenta, ainda, a decisão tomada referindo que o contrato de seguro a que a aqui recorrente aderiu tem como garantia principal a morte por doença ou acidente, apresentando a garantia complementar de invalidez total e permanente por doença ou acidente, mas tal garantia cessa os seus efeitos “(…) no termo da anuidade em que a pessoa segura completa 65 anos de idade”.
Mais refere que, por esse motivo,
XXXIV - Como na adesão ao contrato de seguro a autora, a aqui recorrente, já tinha 66 anos de idade, o seguro já não assegurava a cobertura por invalidez total e permanente.
Na verdade,
XXXV - Nada haveria a opor, não fora o facto de a recorrente, tal como aconteceu com o contrato de adesão de seguro de vida de grupo, não ter sido, também aqui, devidamente informada e esclarecida.
XXXVI - A exigência e o dever de informação devem ser cumpridos na íntegra, devendo ser adequada e atempada, assumindo uma natureza personalizada e abrangendo a extensão da cobertura dos riscos e a medida exacta dos direitos e obrigações previstos no contrato.
XXXVII - O dever de informação não será cumprido pela entidade seguradora que não demonstre ter chamado a atenção do aderente, de uma forma especial, para uma cláusula prejudicial aos interesses deste.
XXXVIII - Pelo que se verifica que, tanto a BANCO, como a própria Companhia de Seguros, não cumpriram o dever de informação a que estavam obrigadas.
XXXIX - Face a tal comportamento, tal como o contrato de seguro de vida de grupo, a cláusula constante do artº. 3º nº. 2 al. ii) das condições particulares da apólice nº. 5.0001.XXX é nula e sem qualquer efeito.
XL - Como foi referido pelo Supremo Tribunal de Justiça na apreciação e decisão em caso idêntico ao dos presentes autos (www.homepagejuridica.net), em que a Seguradora foi condenada a pagar crédito à habitação a doente com idade superior ao limite estabelecido pelas Cláusulas Particulares da apólice do seguro, os Venerandos Juízes Conselheiros consideraram que o cliente da BANCO devia ter sido alertado pela seguradora para o fim da cobertura do risco de invalidez: “Num contexto económico-social em que a maior parte dos portugueses adquire habitação própria com empréstimo bancário e paga, durante uma parte substancial da sua vida, prémios às companhias de seguros para garantia do risco de vida ou invalidez, não pode afirmar-se ser um sacrifício excessivo onerá-las com o pagamento das dívidas, sobretudo se não esclarecerem devidamente o segurada acerca das cláusulas particulares de exclusão (da apólice)”.
XLI - Doutra forma, a obrigatoriedade de contratar um seguro de vida, quando se contrai um empréstimo à habitação mais não seria do que um “simples artifício destinado a obter mais uma prestação a favor da seguradora, muitas vezes ligada ao grupo de que o banco faz parte”.
XLII - Esta decisão pelo STJ foi tomada, porque a seguradora não conseguiu provar que cumpriu a sua obrigação de informar devidamente os clientes daquilo que estavam a assinar, nomeadamente das chamadas “cláusulas perigosas para os seus interesses”. “A haver má-fé, seria da seguradora e não do segurado”.
XLIII - A Seguradora deve ter alertado o segurado para o fim da cobertura de invalidez por doença, quando o segurado atingiu a idade limite, “para que o prémio fosse proporcionalmente reduzido, como seria justo e exigível”.
Por último,
XLIV - Acrescenta o referido acórdão que, Atendendo a que a lei deve proteger os particulares, enquanto parte mais débil deste tipo de contrato, os tribunais “não possam deixar de exercer um efectivo e rigoroso controlo sobre as empresas, dado o enorme poder de que estas dispõem”.
Pelo que,
XLV - A BANCO em todo o processo de empréstimo concedido à aqui recorrente não cumpriu o dever fundamental de informação a que estava obrigada, impondo-se, assim, a anulação da douta sentença recorrida.
Termos em que
E nos demais de direito e sempre com o mui douto suprimento de Vªs. Exªs. deve ser dado provimento ao presente recurso, devendo a douta sentença ser revogada e substituída por outra que condene as Rés BANCO e Companhia de Seguros, SA ao peticionado na Petição Inicial.
Pois,
Assim, se fará a acostumada JUSTIÇA
*

Notificada do recurso apresentado pela A., a R. COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. veio apresentar a sua resposta à motivação, que se encontra finalizada com a apresentação das seguintes conclusões:

1ª- A douta sentença recorrida não enferma dos erros que a recorrente lhe imputa, pelo que o presente recurso não reúne os pressupostos, quer de facto, quer de direito, para a sua procedência.
2ª- A recorrente restringe o objecto do seu recurso à aplicação do direito aos factos provados, contudo, salvo o devido respeito, a recorrente parte de pressupostos errados, pois fundamenta o seu recurso em factos que não constam como provados, sendo certo que a recorrente não coloca em crise a matéria de facto.
3ª- Desde logo, salvo o devido respeito, há manifesto lapso de escrita em parte do ponto 10 dos factos provados, pois no último ponto deste nº onde se lê:
seguro a contratar: valor do empréstimo no montante de € 30.000,00; duração do contrato 11 anos”,
deve ler-se, conforme consta do corpo deste nº do facto provado para onde remete e fundamenta (cfm art. 8º da p.i. e 1º a 4 da contestação de fls 115-121):
seguro a contratar: valor do empréstimo no montante de € 45.000,00; duração do contrato 13 anos”,
4ª- Pois, salvo melhor opinião, é o que foi alegado e resulta do documento junto ou seja do boletim de adesão, tratando-se de um lapso de escrita, pode e deve ser desde já rectificado ou corrigido.
5ª- Ao contrário do alegado pela recorrente, não resulta dos factos provados, nem de qualquer documento, que em 09.12.2012 sofreu qualquer sinistro, quando muito, como resulta do ponto 15 dos factos provados “foi assistida no serviço de urgência … tendo apresentado dores no ombro esquerdo”, nem resulta que padeça de “total invalidez”.
6ª- Também não resulta de qualquer facto provado, documento, ou sequer foi alegado, que para a recorrente obter a concessão de um segundo empréstimo no valor de 45.000,00 €, ter sido informada pela BANCO que tal só seria possível com a utilização do contrato de seguro de grupo celebrado em 20.11.2006, uma vez que tinha mais de 65 anos.
7ª- E tal nem sequer podia suceder porque qualquer seguro de vida é reportado a um determinado empréstimo e específico, e liquidando o empréstimo, como a recorrente liquidou, cessou o contrato, e celebrando novo empréstimo, teve de celebrar também um novo contrato de seguro, mais ainda se justifica quando o montante a garantir é diferente.
8ª- Acresce que, mesmo o contrato de seguro celebrado em 20.11.2006 relativamente à cobertura por invalidez caducava no ano em que completasse 65 anos, por isso não ia de igual modo garantir este novo empréstimo.
9ª- De igual modo, ao contrário do alegado pela Recorrente a decisão do Meritíssimo Juiz foi correcta porque efectivamente o processo de adesão ao seguro de vida pela ora recorrente foi desencadeado de uma forma normal e comum às várias adesões de um qualquer outro contrato para empréstimo bancário, como resulta dos factos provados.
10ª- Como também não é correcta a afirmação de que apenas se vinculou ao contrato de seguro celebrado em 20.11.2006, pois este foi para um empréstimo de 30.000,00 €, e mal se compreende que um seguro para um empréstimo possa servir para garantir um empréstimo de valor superior ou 45.000,00 €, tanto que a Autora passou a pagar um prémio superior.
11ª- Não resultou provada a alegação de que assinou sem ler, não lhe foi lido, que não lhe foi explicado, que não sabe o que assinou, que não recebeu cópias, que não foi informada, e tudo o mais, antes bem pelo contrário.
12ª- Como consta dos factos provados sob o ponto 29 da douta sentença, toda a informação foi prestada e todas as explicações foram dadas, designadamente que por à data do seguro ter já 66 anos já não se encontrava garantido o risco de invalidez total e permanente por doença ou acidente.
13ª- Também resulta do ponto 11 dos factos provados da douta sentença, que a autora subscreveu uma declaração Declarando que tomou conhecimento das informações pré-contratuais e que lhe foi entregue o respectivo documento pelo que não pode agora em sede de recurso alegar o seu desconhecimento.
14ª- Por isso, salvo o devido respeito, as considerações tecidas pela recorrente nas suas alegações e conclusões relativamente às cláusulas contratuais gerais, à lei do contrato de seguro e ao DL 222/09 de 11.09, não tem aplicação in casu, pois que a co-Ré BANCO cumpriu o seu dever de informação, como resulta do ponto 29 dos factos provados na douta sentença.
15ª- Também resulta dos factos provados sob o ponto 27 da douta sentença que a ora recorrida não aceitava em caso algum celebrar contratos de seguro com aquela cobertura a pessoas com mais de 65 anos.
16ª- Finalmente, mesmo por mera hipótese académica e de mero raciocínio, a considerar-se que tais cláusulas eram nulas, não podia a acção ser julgada procedente, pois que a Recorrente não reunia os requisitos para ser accionada a garantia de invalidez absoluta e permanente por doença ou acidente, nos termos das Condições Gerais da apólice.
17ª- Pois pressupõe a incapacidade para qualquer actividade e necessidade de assistência de terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária, e tal não resulta dos pontos 24 e 26 dos factos provados;
18ª- Antes pelo contrário, a autora reconheceu que no seu dia-a-dia é autónoma na limpeza de casa e na confecção das suas refeições.
Termos em que, e nos mais e melhores de direito que V. Exªs doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a douta decisão recorrida, e, assim, se fará inteira J U S T I Ç A.
*

O Exmº Juíz a quo proferiu despacho a admitir o recurso interposto, providenciando pela sua subida.
*
Facultados os vistos aos Exmºs Adjuntos e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
*
2QUESTÕES A DECIDIR

Como resulta do disposto no art. 608º/2, ex. vi dos arts. 663º/2; 635º/4; 639º/1 a 3; 641º/2, b), todos do CPC, sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objecto do recurso.
Consideradas as conclusões formuladas pela apelante, a mesma pretende que se reaprecie a decisão de mérito da acção.
*
3 – OS FACTOS

A) OS FACTOS PROVADOS
1. Em 26/12/2006, no Cartório Notarial de Maria (sito na Quinta … Vila Real), foi outorgada escritura pública denominada “mútuo com hipoteca e fiança”, na qual, no que ora releva, a ré BANCO (representada por F. T.) declarou conceder à autora um empréstimo do montante de € 30.000,00, tendo esta se confessado devedora de tal importância - cfr. art. 1.º da p.i.
2. Na escritura pública outorgada em 26/12/2006 a autora constituiu hipoteca sobre o prédio urbano sito na freguesia e concelho de Vila Real, inscrito na matriz predial da sob o artigo 2B3H.º (anteriormente inscrito na matriz predial urbana da extinta freguesia de S. Dinis sob o artigo 14BX.º) e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º BB8, em garantia do pagamento do capital emprestado, dos respectivos juros (até à taxa anual de 8,246 %, acrescida, em caso de mora, de uma sobretaxa até quatro por cento, ao ano, a título de cláusula penal) e das despesas extrajudiciais (fixadas para efeitos de registo no montante € 1.200,00) - cfr. art. 1.º da p.i.
3. O empréstimo concedido pela ré BANCO à autora em 26/12/2006 encontrava-se sujeito às cláusulas constantes do documento complementar de fls. 391-395 (cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido), de acordo com o qual, no que ora releva (cfr. art. 1.º da p.i.):
«(…) 3.ª (…) 1. O empréstimo vence juros à taxa correspondente à média aritmética simples das taxas Euribor a três meses, apurada com referência ao mês imediatamente anterior ao do início de cada período trimestral de vigência do presente contrato (média essa designada por indexante), arredondada para um oitavo por cento imediatamente superior, e acrescida de um spread de um vírgula nove cinco zero por cento, o que se traduz actualmente na taxa de juro nominal, para pagamentos mensais, de cinco vírgula cinco sete cinco por cento, a que corresponde a taxa efectiva de cinco vírgula sete dois zero por cento. 2. O referido spread foi atribuído tendo em conta a relação que a parte devedora vem mantendo com a credora e com empresas do Grupo Banco, relevando para o efeito a detenção dos seguintes produtos e serviços bancários ou financeiros: (…) b) seguro de vida em Seguradora do Grupo Banco (…) 6.ª (…) O prazo para amortização do empréstimo é de onze anos, a contar de hoje (…) 7.ª (…) 1. O empréstimo será amortizado em prestações mensais constantes, de capital e juros, vencendo-se a primeira no correspondente dia do mês seguinte ao da celebração deste contrato e as restantes em igual dia dos meses seguintes (…)”.
4. Em 20/11/2006 a autora subscreveu um boletim de adesão ao seguro de vida da ré Companhia de Seguros no qual consta, no que ora releva (cfr. art. 2.º da p.i.):
-» modalidade Banco Seguro Vida – Protecção Iad Apólice 5 0001 YYY (RVB);
-» empréstimo: PT 003509060011133PPPP;
-» pessoa a segurar: M. V.;
-» seguro a contratar: valor do empréstimo no montante de € 30.000,00; duração do empréstimo 11 anos.
5. No boletim de adesão subscrito em 20/11/2006 constam as seguintes declarações, com relevo para a boa decisão da causa (cfr. art. 2.º da p.i.):
“Declaro que tomei conhecimento das informações pré-contratuais que constam do documento que me foi entregue; Declaro ainda que respondi com verdade e completamente a todas as perguntas, consciente que quaisquer declarações incompletas, inexactas ou omissas, que possam induzir a Seguradora em erro, tornam este contrato nulo e de nenhum efeito, qualquer que seja a data em que a Seguradora deles tome conhecimento (…)”
6. A apólice de seguro n.º 5.0001.YYY encontrava-se subordinada às condições gerais e particulares constantes de fls. 412-415 (cujo teor se da aqui por integralmente reproduzido) - cfr. art. 2.º da p.i.
7. Em 26/11/2009, na Conservatória do Registo Predial de Vila Real, foi outorgado título de mútuo com hipoteca e fiança e renúncia, na qual, no que ora releva, a ré BANCO (representada por F. T.) declarou conceder à autora um empréstimo do montante de € 45.000,00, tendo esta se confessado devedora de tal importância - cfr. art. 7.º da p.i.
8. Na escritura pública outorgada em 26/11/2009 a autora constituiu hipoteca sobre o prédio urbano descrito sob o n.º BB8, em garantia do pagamento do capital emprestado, dos respectivos juros (até à taxa anual de 8,246 %, acrescida, em caso de mora, de uma sobretaxa até quatro por cento, ao ano, a título de cláusula penal) e das despesas extrajudiciais (fixadas para efeitos de registo no montante € 1.800,00) - cfr. art. 7.º e 10.º da p.i.
9. O empréstimo concedido pela ré BANCO à autora em 26/11/2009 encontrava-se sujeito às cláusulas constantes do anexo de fls. 53-58, 62-66 e 68 (cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido), de acordo com o qual, no que ora releva (cfr. art. 7.º e 10.º da p.i.):
«(…) 3.ª (…) 1. O empréstimo vence juros à taxa correspondente à média aritmética simples das taxas Euribor a três meses, apurada com referência ao mês imediatamente anterior ao do início de cada período trimestral de vigência do presente contrato (média essa designada por indexante), arredondada para a milésima de ponto percentual mais próxima, e acrescida de um spread de um vírgula novecentos por cento, o que se traduz actualmente na taxa de juro nominal, para pagamentos mensais, de dois vírgula seiscentos e trinta e oito por cento, a que corresponde a taxa efectiva de dois vírgula seiscentos e setenta por cento. 2. O referido spread foi atribuído tendo em conta a notação de risco da operação, o facto de o valor de financiamento ser de quarenta e cinco por cento do valor da garantia hipotecária constituída, bem como a relação que a parte devedora vem mantendo com a credora e com empresas do Grupo Banco, relevando para este efeito a adesão da parte devedora aos seguintes grupos de produtos “Packs”: (…) Pack Ligação – o qual integra os produtos seguintes: Seguro de vida da parte devedora em Seguradora do Grupo Banco, desde que subscrito na rede de Agências Banco ou na Rede de Mediadores Banco (…) 4. Se a parte devedora vier a anular, a revogar, a desistir ou, por qualquer forma, a extinguir o Pack Banco e/ou Pack Ligação, a credora poderá alterar o Spread atrás fixado, enquanto tal situação se mantiver, até ao limite máximo de cinco vírgula seiscentos por cento, mediante comunicação à outra parte, podendo esta, em tal caso resolver o contrato com fundamento na alteração (…) 6.ª (…) O prazo para amortização do empréstimo é de treze anos, a contar de hoje (…) 7.ª (…) 1. O empréstimo será amortizado em prestações mensais constantes, de capital e juros, vencendo-se a primeira no correspondente dia do mês seguinte ao da celebração deste contrato e as restantes em igual dia dos meses seguintes (…)”.
10. Em 03/11/2009 a autora subscreveu um boletim de adesão ao seguro de vida da ré Companhia de Seguros no qual consta, no que ora releva (cfr. art. 8.º da p.i. e 1.º a 4.º da cont. de fls. 115-121):
-» modalidade Banco Seguro Vida – Protecção ITP Modalidade 100 % Apólice 5 0001 XXX (RVB);
-» empréstimo: PT 003509060011133PPPP;
-» pessoa a segurar: M. V.;
-» seguro a contratar: valor do empréstimo no montante de € 45.000,00; duração do empréstimo 13 anos.
11. No boletim de adesão subscrito em 03/11/2009 constam as seguintes declarações, com relevo para a boa decisão da causa (cfr. art. 8.º da p.i. e 1.º a 4.º e 14.º da cont. de fls. 115-121):
“Declaro que tomei conhecimento das informações pré-contratuais que constam do documento que me foi entregue; Declaro ainda que respondi com verdade e completamente a todas as perguntas, consciente que quaisquer declarações incompletas, inexactas ou omissas, que possam induzir a Seguradora em erro, tornam este contrato nulo e de nenhum efeito, qualquer que seja a data em que a Seguradora deles tome conhecimento (…)”
12. A apólice de seguro n.º 5.0001.TTT encontrava-se subordinada às condições particulares constantes de fls. 415v-418 (cujo teor se da aqui por integralmente reproduzido) - cfr. art. 8.º da p.i. e e 1.º a 8.º da cont. de fls. 115-121
13. O boletim de adesão datado de 03/11/2009 foi subscrito na agência de Vila Real da ré BANCO - cfr. art. 15.º da cont. de fls. 115-121
14. Os boletins de adesão às apólices de seguro foram disponibilizados à autora com o respectivo clausulado já impresso - cfr. art. 12.º da p.i.
15. Em 09/12/2012 a autora foi assistida no Serviço de Urgência, tendo apresentado dores no ombro esquerdo, após uma queda ocorrida em Agosto de 2012, as quais se agravaram nos dias precedentes - cfr. art. 17.º da p.i.
16. Em 03/02/2013 a autora foi assistida no Serviço de Urgência, em virtude de manifestar dor no tórax e nos joelhos após queda no dia anterior - cfr. art. 18.º da p.i.
17. Em 24/04/2013 a autora foi assistida no Serviço de Urgência, devido a apresentar uma dor torácica - cfr. art. 19.º da p.i.
18. Em 28/04/2013 a autora foi assistida no Serviço de Urgência, por apresentar uma erupção cutânea - cfr. art. 43.º da p.i.
19. Em 12/08/2004, no Cartório Notarial de Vila Real, foi outorgada escritura pública denominada “compra e venda”, na qual, no que ora releva, A. V. (na qualidade de procuradora de I. N., J. E., C. N., A. N., J. N. e C. J.) declarou vender à autora, pelo preço de € 100.000,00, já recebido, o prédio descrito sob o n.º BB8, tendo esta declarado aceitar a compra nos termos exarados.
20. Em 20/05/2015, foi outorgado documento denominado “Compra e venda, e mútuo com hipoteca(cujas assinaturas dos outorgantes foram reconhecidas nessa data pela Srª. Drª. P. M., na qualidade de Advogada), no qual, no que ora releva, a autora declarou vender a S. R. e J. F., pelo preço de 105.000,00, já recebido, o prédio descrito sob o n.º BB8, tendo estes declarado aceitar a compra nos termos exarados.
21. Em 09/12/2012 encontrava-se em dívida, relativamente ao empréstimo concedido à autora em 26/11/2009, o montante global de € 36.108,02.
22. Após 09/12/2012 e até 20/05/2015 foram pagos, relativamente ao empréstimo concedido à autora em 26/11/2009, os montantes de € 7.410,79, € 1.700,60, € 45,50 e € 69,87, a título de capital, juros, comissões e impostos - cfr. art. 37.º da p.i.
23. Com a alienação pela autora do prédio descrito sob o n.º 688 a ré BANCO recebeu o montante de € 29.222,41.
24. A autora apresenta alterações cognitivas ligeiras, associadas a múltipla patologia osteoarticular, oftalmológica, vascular e pulmonar, o que a limita do ponto de vista funcional e a impede de exercer uma actividade profissional, tendo ainda frequentado sessões regulares de fisioterapia - cfr. art. 18.º, 40.º, 43.º e 44.º da p.i.
25. A autora nasceu em 28/03/1943 - cfr. art. 36.º da p.i. e 9.º da cont. de fls. 115-121
26. A autora encontra-se aposentada.
27. A ré Companhia de Seguros não aceita, nem aceitava celebrar contratos de seguro do ramo vida com a cobertura de invalidez resultante de doença ou acidente e suas consequências a pessoas com mais de 65 anos, não só pelo elevado risco que envolvem, mas também por imposição das resseguradoras - cfr. art. 10.º e 11.º da cont. de fls. 115-121.
28. A autora foi informada pelo colaborador da ré BANCO que se aderisse ao seguro na ré Companhia de Seguros beneficiaria de uma redução no spread da taxa de juro - cfr. art. 2.º da cont. de fls. 151-154.
29. Quando subscreveu o boletim de adesão à apólice n.º 5 0001 XXX foram prestadas as explicações solicitadas pela autora e foram-lhe disponibilizadas as informações pré-contratuais, designadamente que à data do seguro tinha 66 anos, pelo que não se encontrava garantido o risco de invalidez total e permanente por doença ou acidente - cfr. art. 5.º a 7.º da cont. de fls. 151-154.
30. O empréstimo de 26/11/2009 permitiu à autora liquidar o empréstimo de 26/12/2006 - cfr. art. 10.º da cont. de fls. 151-154.

B) FACTOS NÃO PROVADOS

1. A ré BANCO exigiu à autora, para a concessão do empréstimo de 26/11/2009, que aderisse ao seguro correspondente à apólice n.º 5 0001 XXX - cfr. art. 9.º, 11.º e 12.º da p.i.
2. A autora não recebeu cópia do contrato de seguro correspondente à apólice n.º 5 0001 XXX - cfr. art. 15.º e 16.º da p.i.
3. Não foi explicado à autora o conteúdo das cláusulas contratuais do seguro correspondente à apólice n.º 5 0001 XXX, nomeadamente a cláusula de extensão da responsabilidade decorrente da invalidez resultante de doença ou acidente e suas consequências - cfr. art. 26.º, 27.º e 33.º da p.i.
4. (…) caso soubesse dessa exclusão, a autora nunca teria assinado a subscrição do seguro correspondente à apólice n.º 5 0001 XXX - cfr. art. 29.º da p.i.
5. Quando aderiu à apólice n.º 5 0001 XXX, foi dito à autora que à data do seguro tinha 66 anos, pelo que não se encontrava garantido o risco de invalidez total e permanente por doença ou acidente - cfr. art. 7.º da cont. de fls. 151-154.
6. A autora encontra-se limitada na sua actividade diária, contando com a colaboração de uma terceira pessoa para a ajudar no seu dia-a-dia, mormente para prover a sua alimentação - cfr. art. 40.º, 41.º e 44.º da p.i.
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Ao nível da fixação da matéria de facto o Tribunal não se pronunciou sobre as demais afirmações contidas nos articulados por constituírem afirmações genéricas e conclusivas e/ou juízos de direito e que não podem ser objecto de uma pronúncia em termos de "provado" ou "não provado", ou por constituírem factos em oposição com os factos dados como provados ou serem logicamente dependentes dos factos dados como não provados.
Por outro lado, foi considerada a factualidade narrada nos factos provados n.ºs 19 a 21, 23 e 26, não obstante não ter sido alegada nos articulados, por possuir natureza instrumental e ter decorrido da instrução da causa (cfr. artigo 5.º, n.º 2, al. a), do C.P.C.).
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C) MOTIVAÇÃO

Relativamente aos factos considerados provados e não provados a convicção do Tribunal assentou nos seguintes meios de prova:
No que se refere aos factos provados n.ºs 1 a 3, 7 a 9, 19, 20 e 25, ponderou-se o conteúdo da escritura pública de 26/12/2006 e do respectivo documento complementar (fls. 25-29, 33-40 e 391-395), do título de transmissão de 26/11/2009 e do respectivo documento complementar (fls. 45-48, 53-58, 62-66, 68), da certidão predial relativa ao prédio descrito sob o n.º BB8 (fls. 49, 67, 304v-305), do print de fls. 429, do título de transmissão de 20/03/2015 e dos respectivos documento complementar e termo de autenticação (fls. 434-437, 438-448, 449-452, 465-468, 469-479 e 480-483) e da escritura pública de 12/08/2004 e da respectiva escritura pública de rectificação (fls. 488-490 e 491-492) - cfr. artigos 369.º, n.º 1, 371.º, n.º 1, do Código Civil e 607.º, n.ºs 4 e 5, do C.P.C.
No que tange aos factos provados n.ºs 4 a 6 e 10 a 12, considerou-se o teor das propostas de adesão às apólices n.ºs 5.0001.XXX (fls. 128-129 e 166-168) e 5.0001.YYY (fls. 400) e das condições particulares relativas às apólices n.º 5.0001.XXX (fls. 415v-417v) e 5.0001.YYY (fls. 412-415), cuja probidade não foi colocada em causa por nenhum meio de prova trazido ao processo - cfr. artigos 32.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de Abril e 607.º, n.ºs 4 e 5, do C.P.C.
No que concerne aos factos provados n.ºs 13, 14 e 21 a 23, atendeu-se ao consenso nos articulados a respeito dessa materialidade - cfr. artigos 352.º, 355.º, n.ºs 1 e 2 e 356.º, n.º 1, do Código Civil e 607.º, n.ºs 4 e 5, do C.P.C.
No que respeita aos factos provados n.ºs 15 a 18 e 24 e ao facto não provado n.º 5, tiveram-se em apreço as declarações da autora, a declaração médica de fls. 19, as declarações de fls. 20 e 21, os elementos clínicos de fls. 91-97 e 101-108 e o atestado médico de fls. 289.
Com efeito, decorre da ponderação dos elementos clínicos de fls. 91-97 e 101-108 que a autora foi assistida no Serviço de Urgência nas circunstâncias de tempo e de modo descritas nos factos provados n.ºs 15 a 18, sem que a probidade desses documentos tenha sido colocada em causa pelo restante acervo probatório carreado para os autos, pelo que se concluiu positivamente quanto a tal materialidade.
Posto isto, a declaração médica de fls. 19 permite enquadrar as patologias apresentadas pela autora, sendo coerente com o atestado médico de fls. 289, e os elementos clínicos de fls. 91-97 e 101-108. Por outro lado, as declarações de fls. 20 e 21 evidenciam que a autora esteve sujeita a fisioterapia, situação que já não ocorre, como a própria autora confirmou.
Nesta decorrência, à míngua de outros meios de prova que conduzissem a juízo diverso, concluiu-se pela verificação da factualidade relatada no facto provado n.º 24.
Pelo contrário, a autora reconheceu que no seu dia-a-dia é autónoma na limpeza de casa e na confecção das suas refeições, o que infirma a ocorrência da materialidade descrita no facto não provado n.º 5.
No que se refere aos factos provados n.ºs 26 a 30 e aos factos não provados n.ºs 1 a 4, atendeu-se às declarações de parte da autora, aos depoimentos das testemunhas M. P. (amigo da autora e fiador no contrato de 26/11/2009), N. S. (amiga e vizinha da autora), T. A. (amiga da autora), L. R. (amigo da autora e fiador no contrato de 28/12/2006), A. E. (amigo da autora), M. M. (Médica, prestadora de serviços da ré Companhia de Seguros), M. J. (gestor de sinistros da ré Companhia de Seguros), P. C. (colaborador da ré BANCO no balcão de Vila Real/Avenida …, tendo intervindo no processo de concessão de financiamento à autora em 26/11/2009) e M. T. (gerente do balcão de Vila Real/Avenida …) e a proposta de adesão à apólice n.ºs 5.0001.XXX (fls. 128-129 e 166-168).
Assim, nas suas declarações a autora reconheceu que se encontra aposentada (o que também foi referido pela testemunha M. T.) e que o empréstimo de 26/11/2009 permitiu uma reestruturação da dívida contraída em 28/12/2006 (o que foi confirmado pela testemunha P. C.), sem que tal narrativa tivesse sido contrariada pelos demais meios de prova trazidos ao processo, pelo que se concluiu positivamente quanto aos factos provados n.ºs 26 e 30.
Posto isto, a autora refutou que lhe tivessem sido explicadas as cláusulas do contrato de seguro, designadamente que estaria excluída a cobertura por invalidez total e permanente por ter mais de 65 anos de idade, ou que lhe tivessem sido disponibilizados quaisquer documentos relativos a esse contrato, tendo ainda manifestado que se lhe tivesse sido explicada a exclusão não aceitaria subscrever o contrato de seguro, o qual lhe foi imposto pela ré BANCO
Todavia, não podemos desconsiderar que o discurso da autora se revelou sincopado e confuso, o que dificultou a compreensão da sua narrativa, a qual também se revelou totalmente omissa quanto à descrição das circunstâncias de modo em que teria subscrito o contrato de seguro, escudando-se antes a autora numa ausência de recordação do sucedido que suscitou dúvidas, porquanto a pormenorização das indicações vertidas na proposta de adesão à apólice n.ºs 5.0001.XXX (fls. 128-129 e 166-168), indicia que a autora colaborou activamente no preenchimento dessa proposta.
Por seu turno, as testemunhas M. P., A. E., N. S., T. A. e L. R. revelaram desconhecer o que teria sido transmitido à autora pelo funcionário bancário que a atendeu aquando da adesão ao seguro, pois não estiveram presentes, ainda que os dois primeiros tenham revelado a convicção de que se tivesse sido explicado à autora a exclusão da cobertura da invalidez total e permanente esta teria recusado a celebração do contrato de seguro.
Ao invés, de um modo seguro e sereno a testemunha P. C. (cuja narrativa foi confirmada, nos seus termos essenciais pela testemunha M. T.) descreveu o procedimento habitualmente empregue para contextualizar a subscrição de seguros de saúde, incluindo a explicação as coberturas e as respectivas exclusões e acompanhando tal conversa com a entrega de informações pré-contratuais que o sistema informático disponibiliza automaticamente, tendo garantido a observância dessa metodologia com a autora. Por outro lado, explicou que a subscrição do seguro de grupo da ré Companhia de Seguros tem benefícios ao nível da taxa de juro, mas é possível que os clientes possam optar por outras seguradoras.
Ora, será crível que a ausência desses cuidados constitua a excepção numa entidade bancária reputada como a ré BANCO, a qual constitui o maior banco português, não apenas pela susceptibilidade de causar danos reputacionais, mas também pelas consequências nefastas que daí podem resultar em ulteriores litígios com os clientes.
De notar também que o documento complementar ao contrato de 26/11/2009 alude precisamente à bonificação da taxa de juro por ter ocorrido a subscrição do seguro da ré Companhia de Seguros (cfr. cláusula 3.ª, n.º 2).
Por outro lado, as testemunhas P. C. e M. T. descreveram a cadeia de procedimentos que o sistema informático obriga a seguir, reduzindo a margem de arbitrariedade ou de desleixo das concretas pessoas que são chamadas a intervir.
De igual modo, há que salientar que se tratando de alguém como a autora, já com mais de sessenta anos, será expectável que exista a preocupação do funcionário bancário em elucidar cláusulas que se revelem mais prementes para a sua faixa etária (v.g. a cessação da cobertura por invalidez permanente e total aos 65 anos de idade), ao contrário do que presumivelmente poderá suceder com candidatos a financiamento com menos de 35, 40 anos de idade.
Acresce que a autora subscreveu uma declaração aquando da subscrição da adesão ao seguro, contendo o seguinte teor: “declaro que tomei conhecimento das informações pré-contratuais que constam do documento que me foi entregue; Declaro ainda que respondi com verdade e completamente a todas as perguntas, consciente que quaisquer declarações incompletas, inexactas ou omissas, que possam induzir a Seguradora em erro, tornam este contrato nulo e de nenhum efeito, qualquer que seja a data em que a Seguradora deles tome conhecimento (…)”, sem que essa assinatura tenha sido reputada como falsa.
Importa ainda atender que, conforme explicaram as testemunhas P. C. e M .T., a ré BANCO não aceitaria conceder o financiamento à autora se esta não subscrevesse o contrato de seguro, quando as testemunhas M. M. e M. J. esclareceram que nenhuma companhia de seguros, e não apenas a ré Companhia de Seguros, aceitaria subscrever o contrato de seguro com cobertura de invalidez total e permanente para além dos 65 anos de idade, por os resseguradores não o permitirem, quando estes constituem uma fonte de financiamento da actividade das seguradoras, devido ao risco associado, para além de a generalidade das pessoas com essa idade já estar reformada, pelo que não apresentará perda de capacidade de ganho, por estar assegurado o recebimento da pensão de reforma. Mas se assim é, fica desprovida de compreensão a referência de que a autora não aceitaria a celebração do contrato de seguro se lhe tivesse sido explicada a indicada exclusão, pois esta não dispunha de suficiente margem decisória, como a própria reconheceu, quando reportou as dificuldades em suportar o pagamento das prestações convencionadas, motivo pelo qual careceu de encetar a reestruturação da dívida lograda com a concessão do financiamento realizado em 26/11/2009.
Finalmente, não podemos desconsiderar que o teor da proposta de adesão revela cuidado no seu preenchimento, ao contrário do que seria expectável numa situação em que o funcionário bancário teria ignorado os deveres funcionais a que estava adstrito.
Nesta decorrência, sopesando todos estes elementos probatórios e tendo presente o critério plasmado no artigo 414.º do C.P.C., concluiu-se pela verificação da materialidade dos factos provados n.ºs 27 a 29, bem como pela infirmação da factualidade contida nos factos não provados n.ºs 2 a 4.

[transcrição de fls. 502 a 514].
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4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Antes de mais uma nota quanto ao modo como se encontra formulado o recurso.
Nos termos do n.º 1 do artigo 639º do CPC, o recorrente deve terminar as alegações com as respectivas conclusões, que são a indicação de forma sintética dos fundamentos por que se pede a alteração ou anulação da decisão.
A formulação das conclusões do recurso tem como objectivo sintetizar os argumentos do recurso e precisar as questões a decidir e os motivos pelos quais as decisões devem ser no sentido pretendido. Com isso pretende-se alertar a parte contrária – com vista ao pleno exercício do contraditório – e o tribunal para as questões que devem ser decididas e os argumentos em que o recurso se baseia, evitando que alguma escape na leitura da voragem da alegação, necessariamente mais extensa, mais pormenorizada, mais dialéctica, mais rica em aspectos instrumentais, secundários, puramente acessórios ou complementares.
Esse objectivo da boa administração da justiça é, ou devia ser, um fim em si. O não cumprimento dessa exigência constitui não apenas uma violação da lei processual como um menosprezo pelo trabalho da parte contrária e do próprio tribunal. Daí que o artigo 641º/2 do CPC comine a falta de conclusões com a sanção da rejeição do requerimento de interposição de recurso, funcionando essa sanção de forma automática, sem qualquer convite prévio ao aperfeiçoamento, como sucede quando as conclusões sejam deficientes, obscuras ou complexas (art. 639º/3).
Ora, in casu, como infelizmente se vai tornando norma, verifica-se que a recorrente redigiu as suas alegações, dividindo-as em parágrafos sem numeração, depois escreveu a expressão “conclusões” e a seguir repetiu na quase totalidade as alegações, precedendo os parágrafos de números.
Do ponto de vista substancial, a recorrente não formulou conclusões do recurso como devia, limitou-se (no relevante) a repetir a alegação duas vezes seguidas, intitulando a “segunda alegação” como “conclusões”, o que manifestamente não constitui uma forma válida de cumprimento da exigência legal.
Por conseguinte do ponto de vista substancial, a consequência devia ser a pura e simples rejeição do recurso por falta de conclusões. Com efeito, se essa sanção se aplica mesmo nas situações em que a falta se deve a mera desatenção ou até lapso informático, deve aplicar-se por maioria de razão às situações em que consciente e deliberadamente o mandatário se limita a repetir o texto das alegações, não podendo deixar de saber que não está, como devia, a formular conclusões.
Com muito boa vontade e atendendo apenas ao aspecto formal, poder-se-ia convidar a recorrente a aperfeiçoar (melhor dizendo, a formular) as “conclusões”. Considerando, no entanto, a simplicidade do recurso em apreciação, decidimos prosseguir e apreciar a questão.
E fazendo-o, é o seguinte o entendimento que temos, começando pela averiguação do alegado lapso de escrita que a recorrida evidencia no início de fls. 540vº, que o constitui efectivamente, mas que não contende com o mérito da causa.
Lapso de escrita que poderia ter sido rectificado na 1ª instância, mas que não o tendo sido, passaremos a considerar como se não existisse (2) (cfr. art. 614º/2 do CPC).

Sem recorrer da matéria de facto, pretende a apelante a reapreciação da decisão de mérito da acção.
Todavia, todo o seu raciocínio assenta em factualidade que alegou na p.i. mas que não logrou provar. V.g., pretende ter sido informada pela BANCO quando recorreu a um novo empréstimo, de que ficava tudo na mesma, sendo utilizado o mesmo Contrato de Seguro de Vida (por alusão a um anterior empréstimo); confiando na informação prestada assinou todos os papéis sem ler, não sabendo o que assinou, ninguém lhe falou em novo seguro, nem na idade, não lhe tendo sido entregue quaisquer cópias dos contratos de seguro, nem lhe foi comunicado nem explicado o conteúdo das cláusulas contratuais. Ora, apesar de ter alegado na p.i. esta factualidade, verifica-se que a recorrente não logrou ver provada esta factualidade, que consta do elenco da matéria de facto não provada. Assim, torna-se incompreensível fazer assentar o recurso em matéria alegada mas não provada, sem pôr em causa a matéria de facto dada como provada e não provada na sentença, designadamente pedindo a sua alteração.
Logo, ainda que tenha razão nas considerações que em abstracto faz sobre as cláusulas contratuais gerais, as mesmas não têm aplicabilidade no caso ora em apreço, pressupondo factualidade diversa da apurada.
Ainda assim, sempre será de fazer as seguintes considerações.

O contrato de seguro é a convenção através da qual uma das partes (segurador) se obriga, mediante retribuição (prémio) paga pela outra parte (segurado) a assumir um risco e, caso a situação de risco se concretize, a satisfazer ao segurado ou a terceiro uma indemnização pelos prejuízos sofridos ou um determinado montante previamente estipulado (3).
É um contrato que tem natureza de contrato bilateral, de execução continuada, aleatório e de adesão (4).
Dado o momento em que os factos em causa tiveram lugar, na fixação do conteúdo do contrato de seguro em apreço atender-se-á ao disposto na respectiva apólice (art. 1º do DL 72/2008 de 16-04: Regime Jurídico do Contrato de Seguro) e na interpretação das cláusulas de limitação do risco assumido, à Lei das Cláusulas Contratuais Gerais/LCCG (cfr. art. 3º).
O contrato de seguro é um contrato formal porque a sua validade depende de o respectivo conteúdo ser consubstanciado num documento escrito, denominado apólice, de que devem constar o nome do segurador, do tomador e do beneficiário do seguro, o seu objecto, a natureza e o valor e os riscos cobertos, e de adesão, regulado pelas estipulações daquela apólice não proibidas por lei.
O contrato de seguro rege-se pelo princípio da liberdade contratual, tendo carácter supletivo as regras constantes do presente regime, com os limites indicados na presente secção e os decorrentes da lei geral (vd. art. 11º do referido DL 72/2008).
As condições da apólice do seguro podem e devem ser objecto de interpretação, como quaisquer outras declarações de vontade e, de resto, tratando-se (além do mais) de cláusulas contratuais gerais teriam sempre de ser interpretadas e integradas de harmonia com as regras relativas à interpretação e integração dos negócios jurídicos, mas sempre dentro do contexto de cada contrato singular em que se incluam (art. 10º do DL n.º 446/85, de 25-10).

Ao falar de cláusulas contratuais gerais têm-se em vista, em princípio, as cláusulas elaboradas, sem prévia negociação individual, como elemento de um projecto de contrato de adesão, destinadas a tornar-se vinculativas quando proponentes ou destinatários indeterminados se limitem a subscrever ou aceitar esse projecto (5).
As cláusulas contratuais gerais são um conjunto de proposições pré – elaboradas que proponentes ou destinatários indeterminados se limitam a propor ou aceitar (6)
“A noção básica pode ser decomposta em vários elementos esclarecedores. Assim, (i) as cláusulas contratuais gerais destinam-se ou a ser propostas a destinatários indeterminados ou a ser subscritas por proponentes indeterminados; no primeiro caso, certos utilizadores propõem a uma generalidade de pessoas certos negócios, mediante a simples adesão; no segundo, certos utilizadores declaram aceitar apenas propostas que lhes sejam dirigidas nos moldes das cláusulas contratuais pré – elaboradas; podem, naturalmente, todos os intervenientes ser indeterminados, sobretudo quando as cláusulas sejam recomendadas por terceiros (generalidade); (ii) – as cláusulas contratuais gerais devem ser recebidas em bloco por quem as subscreve ou aceite; os intervenientes não têm a possibilidade de modelar o seu conteúdo, introduzindo, nelas, alterações (rigidez) (7)”.
Deste modo, as cláusulas contratuais gerais, que se encontram submetidas ao regime fixado pelo DL nº 446/85, de 25/10 (diploma a que pertencerão os demais preceitos legais a citar nesta questão sem outra indicação de origem), na redacção introduzida pelos DL nº 220/95, de 31/01, nº 249/99, de 7/7, e nº 323/2001, de 17/12, “consistem em situações típicas do tráfego negocial de massas em que as declarações negociais de uma das partes se caracterizam pela pré – elaboração, generalidade e rigidez. Efectivamente, está-se nesses casos perante situações em que uma das partes elabora a sua declaração negocial previamente à entrada em negociações (pré – elaboração), a qual aplica genericamente a todos os seus contraentes (generalidade), sem que a estes seja concedida outra possibilidade que não seja a da sua aceitação ou rejeição, estando-lhes por isso vedada a possibilidade de discutir o conteúdo do contrato (rigidez) (8)”.
Para além disso, e como refere Menezes Cordeiro (9), as cláusulas contratuais gerais costumam caracterizar-se pela desigualdade entre as partes, pela complexidade e pela natureza formulária, ainda que estas características não sejam de verificação necessária.
“Efectivamente, costuma caracterizar as cláusulas contratuais gerais o facto de uma das partes ter uma posição social ou económica mais relevante, que lhe serve de justificação para impor a situação à outra parte. Para além disso, as cláusulas contratuais são normalmente completas e exaustivas, regulando todas as questões de verificação entre as partes, a um nível jurídico, não acessível a leigos.
Finalmente as cláusulas contratuais gerais constam normalmente de formulários, de letra reduzida e leitura difícil, que o aderente não examina detalhadamente, limitando-se a neles incluir os seus elementos de identificação (10).”.
Nas cláusulas contratuais gerais é manifesta a impossibilidade fáctica de uma das partes exercer a sua liberdade de estipulação, que fica assim apenas na mão da outra parte.
Porém, a limitação, jurídica ou meramente de facto, da liberdade do aderente não constitui óbice ao triunfo da tese contratual, pois não é a liberdade de estipulação que caracteriza o negócio jurídico e portanto o contrato, mas a autonomia de vontade, ou seja, a faculdade de regular por si os próprios interesses, ainda que dentro de esquemas legais preestabelecidos (11).
O conhecimento imperfeito do conteúdo do contrato, facto subjectivo de averiguação difícil, ocorrerá com mais frequência nos contratos deste tipo; mas não é fenómeno que só nelas ocorra. Por isso, também não deve aceitar-se a modalidade da tese contratualista que restringe o acordo às condições particulares, dando como não vinculativas para o aderente as condições gerais (12).
Ainda assim, a manifesta impossibilidade fáctica de uma das partes exercer a sua liberdade de estipulação, que assim fica apenas na mão da outra parte, pode conduzir a efeitos perversos. “Um deles é a circunstância de o contrato poder ser celebrado sem que uma das suas partes se possa aperceber do seu conteúdo, só sendo confrontada com o regime contratual que aceitou no momento em que surge um litígio, quando naturalmente é demasiado tarde para reagir. O outro é a possibilidade fáctica de serem introduzidas no contracto cláusulas iníquas ou abusivas, em benefício de um dos contraentes, que qualquer contraente normal tenderia a rejeitar, se pudesse discutir as condições do contrato” (13).
Para evitar estes efeitos perversos, que podem ocorrer em relação a uma generalidade de contraentes, a lei tem que intervir no sentido de restringir a liberdade de estipulação, procurando, por um lado, evitar a introdução no contrato de cláusulas de que o outro contraente se não apercebeu e visando, por outro, impedir o surgimento de cláusulas iníquas.
Relativamente ao primeiro vector, ele é concretizado pela referência de que as cláusulas contratuais gerais se incluem nos contratos mediante a sua aceitação (art. 4º da LCCG).
Esclarecida a necessidade de aceitação, ficam naturalmente excluídas do contrato as cláusulas contratuais gerais não aceites especificamente por um contraente, ainda que sejam habitualmente usadas pela outra parte relativamente a todos os seus contraentes. Por outro lado, a exigência de aceitação determina a aplicação às cláusulas contratuais gerais das regras sobre a perfeição da declaração negocial, designadamente em caso de falta de consciência da declaração, erro ou incapacidade.
Mas, para além disso, mesmo que ocorra a aceitação, a lei impõe o cumprimento de certas exigências específicas para permitir a inclusão das cláusulas contratuais gerais no contrato singular. Essas exigências constam dos arts. 5º a 7º da LCCG, reconduzindo-se à (i) comunicação das cláusulas contratuais gerais à outra parte (art. 5º); (ii) à prestação de informação sobre aspectos obscuros nelas compreendidos (art. 6º) e (iii) à inexistência de estipulações específicas de conteúdo distinto (art. 7º).
Como exemplos típicos de contratos, contendo cláusulas contratuais gerais, costumam apontar-se os contratos de adesão, aqueles em que um dos contraentes – o cliente, o consumidor – como sucede, por exemplo (…), na generalidade dos contratos bancários, não tendo a menor participação na preparação e redacção das respectivas cláusulas se limita a aceitar o texto que o outro contraente oferece, em massa, ao público interessado (14).
Contratos de adesão são, pois, aqueles cujas cláusulas são elaboradas sem prévia negociação individual e que proponentes ou destinatários indeterminados se limitam a subscrever ou aceitar.
Todavia, como resulta do nº 2 do art. 1º, o regime consagrado no DL nº 446/85 (redacção introduzida pelo DL nº 249/99), também se aplica às cláusulas inseridas em contractos individualizados, mas cujo conteúdo, previamente elaborado, os destinatários não podem influenciar.
Assim, relativamente à comunicação à outra parte, especifica a lei que a mesma deve ser integral (art. 5º/1) e ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária, para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento efectivo por quem use de comum diligência (art. 5º/2).
O grau de diligência postulado por parte do aderente, e que releva para efeitos de calcular o esforço posto na comunicação, é o comum (art. 5º/2, in fine). Deve ser apreciado in abstracto, mas de acordo com as circunstâncias típicas de cada caso, como é usual no Direito Civil.
O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe à parte que utilize as cláusulas contratuais gerais (art. 5º/3). Deste modo, o utilizador que alegue contratos celebrados na base de cláusulas contratuais gerais deve provar, para além da adesão em si, o efectivo cumprimento do dever de comunicar (cfr. art. 342º/1 do CC), sendo que, caso esta exigência de comunicação não seja cumprida, as cláusulas contratuais gerais consideram-se excluídas do contrato singular [art. 8º, a)], considerando ainda a lei não terem sido adequada e efectivamente comunicadas as cláusulas que, pelo contexto em que surjam, pela epígrafe que as precede ou pela apresentação gráfica, passem despercebidas a um contratante normal, colocado na posição do contratante real [art. 8º, c)] e as cláusulas inseridas em formulários, depois da assinatura de uma das partes [art. 8º, d)].
Para além da exigência de comunicação adequada e efectiva, surge ainda a exigência de informar a outra parte, de acordo com as circunstâncias, de todos os aspectos compreendidos nas cláusulas contratuais gerais cuja aclaração se justifique (art. 6º/1) e de prestar todos os esclarecimentos razoáveis solicitados (art. 6º/2).
Com efeito, “a conclusão esclarecida do contrato, base de uma efectiva autodeterminação, não se contenta com a comunicação das cláusulas. Estas devem ser efectivamente entendidas. Para o efeito, a LCCG prevê um dever de informação. O utilizador das cláusulas contratuais gerais deve conceder a informação necessária ao aderido, prestando-lhe todos os esclarecimentos solicitados, desde que razoáveis” (15).
Caso não tenha sido cumprida a exigência de informação, em termos de não ser de esperar o conhecimento efectivo pelo aderente, as cláusulas contratuais gerais consideram-se excluídas dos contratos singulares [art. 8º, b)].

No caso em apreço e como já supra referido, as considerações acabadas de fazer não têm qualquer aplicabilidade, improcedendo, pois, todas as questões que constam das conclusões do recurso da apelante.
Efectivamente, desde logo, não resultou dos factos provados, apesar do contrário ter sido alegado pela recorrente, que a mesma tenha em 9-12-2012 sofrido qualquer sinistro nem padeça de “total invalidez”. Igualmente não resultou provado que assinou sem ler, não lhe foi lido, que não lhe foi explicado, que não sabe o que assinou, que não recebeu cópias, que não foi informada, e tudo o mais, antes bem pelo contrário, como consta dos factos provados sob o ponto 29. Acresce que, também não resultou de qualquer facto provado ou sequer foi alegado, que para a recorrente obter a concessão de um segundo empréstimo no valor de € 45.000,00, tenha sido informada pela BANCO que tal só seria possível com a utilização do contrato de seguro de grupo celebrado em 20-11-2006, uma vez que tinha mais de 65 anos. Não se podendo ignorar que aquando da concessão do segundo empréstimo a recorrente tinha já 66 anos, sendo que o contrato de seguro celebrado em 20-11-2006 relativamente à cobertura por invalidez caducava no ano em que completasse 65 anos, pelo que resulta incompreensível o raciocínio desenvolvido quanto à garantia do novo empréstimo, mormente face ao facto provado sob o ponto 27.

Improcede, pois, o recurso, com custas a pagar pela recorrente (art. 527º do CPC).
*

5 – SÍNTESE CONCLUSIVA (art. 663º/7 CPC)

No âmbito da liberdade contratual, os termos da abrangência e exclusões da cobertura do seguro serão mais extensos ou não, consoante o prémio que se esteja disposto a pagar.
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6 – DISPOSITIVO

Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela recorrente e consequentemente manter a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Notifique.
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Guimarães, 14-09-2017


(José Cravo)
(António Figueiredo de Almeida)
(Raquel Baptista Tavares)


1. Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real – V.Real – JL Cível – Juiz 2
2. Já incorporado supra, nos factos provados.
3. Vide, entre outros, Pedro Romano Martinez, Contractos Comerciais, Principia, 2006, pág. 73 e José Vasques, Contrato de Seguro, Coimbra Editora, 1999, pág. 20, e os acórdãos do STJ de 02-10-1997 e 10-12-1997 in CJ-STJ, ano V, Tomo 3, págs. 45 e 158.
4. Cfr., designadamente, os acórdãos da RP de 15-03-1999 e da RL de 09-11-2010 - processo 1870/08.0TVLSB.L1-7, in CJ, XXIV, 2, 182 e “site” da dgsi, respectivamente.
5. Inocêncio Galvão Telles, Manual dos Contractos em Geral, Refundido e Actualizado, página 318.
6. Menezes Cordeiro, Manual de Direito Bancário, página 413.
7. António Menezes Cordeiro, Manual de Direito Bancário, páginas 413/414.
8. Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Volume I, 8ª edição, página 32.
9. Manual de Direito Bancário, página 414.
10. Menezes Leitão, Obra citada, página 33.
11. Inocêncio Galvão Telles, Manual dos Contractos em Geral, página 313.
12. Inocêncio Galvão Telles, Manual dos Contractos em Geral, página 313.
13. Menezes Leitão, Obra citada, página 33.
14. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Volume I, 1ª edição, página 252/253.
15. Menezes Cordeiro, Manual de Direito Bancário, página 429.