Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
271/15.8T8BRG-C.G1
Relator: MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Descritores: ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES
MEDIDA DOS ALIMENTOS
POSSIBILIDADES DO DEVEDOR DOS ALIMENTOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/11/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I- A correspondente medida dos alimentos devidos ao menor, deve ser adequada aos meios de quem houver de prestá-los, devendo o tribunal valorar, de forma global e abrangente, a sua condição social, a sua capacidade laboral, bem como todo o acervo de bens patrimoniais de que seja detentor, nunca deixando de ter em conta o superior interesse do menor.
Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES DA 2.ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES



I. Relatório
T, na qualidade de progenitora do menor P, nascido em 4.5.2014, instaurou acção de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais contra o progenitor deste, P, pedindo, para o efeito, a regulação das responsabilidades parentais, no que respeita ao regime de visitas e alimentos, visando, quanto a estes, a sua fixação nos seguintes termos:
- A título de pensão de alimentos o pai pagará à mãe-guardiã a quantia de 975,00€ (novecentos e setenta e cinco euros) mensais, até ao dia 8 de cada mês, por transferência bancária.
- A aludida pensão será actualizada, a partir de Janeiro de 2016, à taxa de inflação publicada pelo I.N.E, não inferior a 5%.
- As despesas de saúde devidamente comprovadas e não comparticipadas e as despesas escolares (manuais e material escolar do inicio do ano escolar) serão pagos na proporção de 50% por ambos os progenitores.
- As despesas médicas, medicamentosas e escolares do menor, devidamente comprovadas pelo correio ou e-mail, através de factura/recibo, serão pagas até ao dia 8 dia do mês subsequente à recepção dos documentos, juntamente com a pensão de alimentos.
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Citado, o réu veio pedir a improcedência liminar do articulado inicial e sempre o pedido de alteração.
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Em conferência de pais, os mesmos chegaram consenso sobre a alteração do regime de visitas/convívios, homologado a fls. 40.
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O processo prosseguiu, por falta de acordo, para julgamento da questão relativa ao montante dos alimentos devidos à criança.
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Em sede de alegações, a demandante reformulou o seu pedido, tendo o requerido apresentado as suas alegações no sentido de concluir pela improcedência do pedido, vindo, perante a invocação de uma nova alteração factual, a ser formulado novo pedido, nos seguintes termos:
1. A título de pensão de alimentos o pai pagará à mãe-guardiã a quantia de 400,00€ (quatrocentos euros) mensais, até ao dia 8 de cada mês, por transferência bancária;
2. A aludida pensão será actualizada, no mês de Janeiro de cada ano, à taxa de inflação publicada pelo I.N.E, não inferior a 5%;
3. As despesas com colégio e/ou ama serão pagas na proporção de 2/3 para o pai e 1/3 para a mãe;
4. As despesas de saúde devidamente comprovadas e não comparticipadas e as despesas escolares (manuais e material escolar do inicio do ano escolar) serão pagos na proporção de 1/3 para mãe e 2/3 para o pai;
5. As despesas médicas, medicamentosas e escolares do menor, devidamente comprovadas pelo correio ou e-mail, através de factura/recibo, serão pagas até ao dia 8 dia do mês subsequente à recepção dos documentos, juntamente com a pensão de alimentos.
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Instruída a causa com a prova considerada pertinente, foi proferida decisão que alterou o exercício das responsabilidades parentais do Pedro Maria S. Emauz, do seguinte modo:
A. A título de pensão de alimentos o pai pagará ao Pedro, entregando à progenitora, a quantia de 370€ mensais, até ao dia 8 de cada mês, por transferência bancária;
B. A aludida pensão será actualizada, no mês de Janeiro de cada ano, à taxa de inflação publicada pelo I.N.E, não inferior a 3% (a próxima em Janeiro de 2018);
C. As despesas com colégio e/ou ama serão pagas na proporção de 2/3 para o pai e 1/3 para a mãe;
D. As despesas de saúde e educação devidamente comprovadas e não comparticipadas, serão pagos na proporção de 1/3 para mãe e 2/3 para o pai;
E. As despesas de saúde e educação do menor, devidamente comprovadas pelo correio ou Correio electrónico, através de factura/recibo, serão pagas até ao dia 8 do mês subsequente à recepção dos documentos, juntamente com a pensão de alimentos, no caso do pai, e no prazo máximo de 30 dias, no caso da mãe.
F. Estes alimentos são devidos desde a data da propositura desta acção (25.2.2016).
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II-Objecto do recurso

Não se conformando com o decidido veio o progenitor do menor, P, instaurar o presente recurso, nele formulando as seguintes conclusões:

A) A douta sentença, como critério para a fixação da obrigação alimentícia parte de um acordo que tinha por base determinadas premissas.

B) Alterando-se o regime em vigor, haverá que reequacioná-lo no seu todo e a douta sentença que regula a obrigação alimentícia não pode ser um mero exercício de acrescer.

C) Analisando os factos dados como provados temos que a douta sentença dá como assente que a Progenitora pagaria de amas a quantia de 778,00 Euros - pontos 5 e 6 - quando auferia somente a quantia de 534,00 Euros.

D) Aferindo-se pelas despesas juntas e constantes dos factos dados como provados a Progenitora gastaria, consigo e menor, a quantia de 1.126,20 Euros e especificamente com o menor 127,87 Euros.

E) Com um rendimento mensal de 834,85 Euros assume custos que ascendem a 1.254,07 Euros, sendo a comparticipação do Progenitor de 408,00 Euros, pelo que apresentaria um deficit mensal de 11,22 Euros.

F) Não podia a douta sentença concluir e dar como provado os pontos 11, 12, 15 a 20, como sendo os custos que a Progenitora tem, habitualmente, atenta a disparidade entre estes e o rendimento daquela.

G) Conclui a douta sentença que as despesas mensais com o menor rondarão os 500 Euros mensais, mas uma coisa são as facturas juntas pela progenitora, o que a mesma decide gastar e outra, que importaria determinar, são as reais necessidades do menor.

H) Os alimentos abrangem tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário enquanto o alimentando seja criança, a instrução e educação (art. 2003.º /1 e 2 do Cód. Civil).

I) Da prova produzida poderia a douta sentença considerar provadas as despesas fixas da progenitora, naquilo que se pôde apurar, nada mais.

J) As reais necessidades do menor não podem ser aferidas pelo critério da progenitora, que decide gastar o que entender e, de seguida enviar a conta para o Progenitor, antes sim com recurso às regras da experiência e apelando ao senso comum.

K) O menor em causa não tem necessidades especiais, sendo as normais, tendo em conta a idade do mesmo, 2 anos e meio, as necessidades de alimentação, vestuário, calçado, uso de produtos higiénicos e limpeza, tecto para dormir, limpeza da casa e tratamento de roupas, não superando as mesmas um valor superior a 300,00 Euros/mês.

L) Errou, pois, a douta sentença ao fixar as necessidades do menor em 500,00 Euros, 66,00 Euros do colégio, 250,00 Euros da ama, ou seja, 800,00 Euros mensais fixos, a que acrescem as despesas de saúde, comuns e extraordinárias, de educação, correntes ou não.

M) Ensino particular, todas as actividades extracurriculares e ama particular não são necessidades básicas dos menores.

N) Deixar ao livre critério da Progenitora definir quais as despesas com saúde e educação, determinar a frequência de colégio e o acompanhamento por ama em valores indeterminados excede o indispensável à promoção adequada do desenvolvimento físico, intelectual e moral daqueles.

O) Tal critério representa, afinal passar um cheque em branco à Progenitora e onerar sem critério, o Progenitor com o encargo de acudir a quaisquer outras despesas, de natureza variável e incerta.

P) Os alimentos devem ser fixados em prestações pecuniárias mensais (art.° 2005.°, n.º 1 do CC), sendo que a fixação de encargos de natureza variável e incerta constitui fonte de muitos conflitos geradores de incidente de incumprimento que cabe ao julgador sempre evitar.

Q) Ao fixar a pensão alimentícia a cargo do Progenitor no pagamento de 2/3 das despesas de educação e saúde, violou a douta sentença o disposto no n.º 1 do artigo 2005.°, 2004.°, n.º 1 e 1874.°, n.º 2 todos do Código Civil.

R) As responsabilidades parentais cabem a ambos os progenitores, em condições de plena igualdade (art. 36.°, n.° 3 da C.R.P.).

S) O que releva não é apurar se o Requerido tem capacidade económica para suportar integralmente ou em grande parte o sustento e manutenção do menor, mas antes apreciar se a apelada tem capacidade para prestar alimentos ao seu filho, pois que se assim for de concluir, deve a prestação ser estabelecida igualitariamente.

T) Resultando provado que a Progenitora aufere, no mínimo, 834,85 Euros mensais, inexiste fundamento para onerar o progenitor com o grosso dos custos com o menor, devendo os mesmos ser repartidos equitativamente.

U) Ao onerar o Progenitor com 2/3 de todas as despesas com educação e saúde do menor, para além da contribuição mensal fixa, também essa na proporção de 2/3 do valor que o Tribunal entendeu como correspondente às necessidades do menor, violou a douta decisão a quo o disposto nos artigos 13.°, 36.°, n.º 3 da CRP, 2003.°, 2004.°, n.º 1, 1874.°, n.º 2, 1878.°, 1885.°, todos do Código Civil, 27.°, n.º 3 da Convenção dos Direitos da Criança.

Termos em que, revogando-se a douta sentença e fixando-se uma prestação alimentícia a cargo do progenitor em montante não superior a 300,00 Euros/mês far-se-á inteira e sã JUSTIÇA!


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A requerente/recorrida veio apresentar as suas contra-alegações, concluindo que:
A) A douta sentença recorrida não enferma de qualquer um dos vícios apontados pelo recorrente.
B) O seu recurso, na linha do que nos vem habituando, diz muito do entendimento distorcido e completamente errado que o Recorrente tem das responsabilidades parentais.
C) Além de quanto à matéria de facto dada como provada nenhuma censura a douta sentença poderia ser aproveitada pelo recorrente para aprender de uma vez por todas o que é prestar alimentos a um filho.
D) Contudo, o recorrente brinda-nos com afirmações, contraditórias, ridículas e chocantes.
E) Vir agora dizer que ter ama particular um capricho, depois de ter sido por decisão conjunta do recorrente e da mãe, que, por razões de saúde, nos dois primeiros ano de vida do menor se optou por contratar amas (uma para o período da manha e outra para o período da tarde) para cuidarem do menor durante o período laboral da mãe, revela uma chocante desfaçatez.
F) Insistir nessa afirmação depois de ter acordado nestes autos que o menor frequentaria a creche da parte da manhã e ficariam em casa no período da tarde, com ama, situação, aliás, que ainda não se verifica, pois ainda não se conseguiu contratar tal ama, é, além do mais, desonesto e contraditório com a posição que assumiu nestes mesmo autos, muito recentemente.
G) É ridícula afirmação de que a repartição das despesas de 2/3 para o pai e 1/3 para mãe constitui um cheque em branco passado à mãe.
H) Esquece-se o recorrente que os rendimentos da mãe nunca lhe permitiriam ir além das suas possibilidades e que 1/3 dessas despesas são por si suportadas e têm um peso proporcionalmente superior ao do recorrente nos seus rendimentos
I) O art. 36.º, n.º 3, da C.R.P. estabelece o princípio de igualdade de deveres de ambos os progenitores na manutenção dos filhos.
J) Contudo, como expendido pelo Ex.mo Senhor Juiz Desembargador MadeiraPinto/inwww.trp.ptlfícheiros/estudos/madeirapínto_pensaoalimentosmenores tal não significa que a lei pretenda que cada progenitor contribua com metade do necessário á manutenção dos filhos, antes se visa que sobre cada um deles impenda a responsabilidade de assegurar, na medida das suas possibilidades, o que for necessário ao sustento, habitação e vestuário (alimentos naturais), bem como à instrução e educação do menor (alimentos civis). Como se vê, o conceito de sustento ultrapassa a simples necessidade de alimentação, abrangendo a satisfação de todas as necessidades vitais de quem carece de alimentos, nomeadamente as relacionadas com a saúde, os transportes, a segurança, a educação e instrução (art. 2003.º do CC)".
K) O cálculo da pensão de alimentos (por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação, educação, vestuário) é feito consoante os rendimentos dos pais, e as despesas que o progenitor que detém os menores a seu cargo suporta.
L) Ora a repartição dos encargos deve espelhar também diferença de disponibilidades de cada um dos progenitores, o que no caso, não se verificava, e por isso, a douta sentença recorrida tentou corrigir.
M) E mesmo assim não pode afirma-se que o contributo de ambos os pais espelha totalmente a diferença de disponibilidades de cada um.
N) A pensão de alimentos de 370,00€ mensais representa para o pai recorrente o equivalente a 12% dos seu rendimento nos meses em que recebe da sua entidade patronal a retribuição mais baixa que é de 2942,00€ líquidos ou 9,1 % quando a retribuição global liquida é de 4026,00€.
O) Já parte dos alimentos da mãe representam 32% do seu vencimento enquanto trabalhadora por conta de outrem ou 21% se àquele se somar os rendimentos que aufere pelos serviços de psicologia.
P) Na prática, quem continuará, apesar da alteração, sacrificar-se mais para a manutenção do menor será mãe, sacrifício, aliás, que continuará fazer com todo gosto e com todo o amor pelo seu filho.
Q) Contudo é o pai, cego pela sua sovinice, quem não concorda com a douta sentença recorrida, revelando uma completa insensibilidade e ignorância sobre o que é e em que consiste o superior interesse da criança. e satisfação das suas necessidades materiais e espirituais.
Termos em que, indeferindo-se o recurso e mantendo-se a douta sentença recorrida, se fará justiça.
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O Ministério Público também apresentou as suas contra-alegações, concluindo, a final, afigurar-se perfeitamente adequada, proporcionada e ajustada a decisão fixada quanto a alimentos, pelo que não se divisa qualquer razão ao apelante/recorrente, por inexistir fundamento legal para o presente recurso não tendo a decisão sob censura violado qualquer norma legal, adjectiva ou substantiva, a impor a sua alteração ou revogação.
Termos em que o presente recurso deverá ser julgado improcedente mantendo-se, na íntegra a douta decisão recorrida, com o que se fará inteira JUSTIÇA
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O recurso foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.

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Foram colhidos os vistos legais.

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III - Fundamentação
Factos Provados
Da mãe
1. O regime vigente, fixado por acordo de 20.4.2015, é o seguinte:
A título de pensão de alimentos o pai pagará à mãe-guardiã a quantia de 250,00 (duzentos e cinquenta euros) mensais, até ao dia 8 de cada mês, por transferência Bancária.
A aludida pensão será actualizada, a partir de Janeiro de 2016, à taxa de inflação publicada pelo I. N. E, não inferior a 5%.
As despesas de saúde devidamente comprovadas e não comparticipadas e as despesas escolares ou ama (manuais e material escolar do inicio do ano escolar) serão pagos na proporção de 50% por ambos os progenitores.
As despesas médicas, medicamentosas e escolares do menor, devidamente comprovadas pelo correio ou e-mail, através de factura/recibo, serão pagas até ao dia 8 dia do mês subsequente à recepção dos documentos, juntamente com a pensão de alimentos - Cf. acta respectiva do processo principal
2. Na altura em que foi acordado o regime vigente, a mãe e o Pedro viviam na casa dos pais daquela e, em face disso não obstante o regime fixado, o pai exigiu pagar 1/3 do vencimento de uma das amas, pois os pais da requerente e avós do menor também beneficiavam do respectivo serviço.
3. Entretanto, em Julho de 2015 mudou-se com o menor para uma residência própria, deixando ambos, portanto, de viver na casa dos seus pais e avós.
4. E o serviço das amas passou a ser prestado em casa da requerente.
5. A ama da manhã, M, que prestava serviço entre as 09 horas e as 13 horas, auferia o vencimento mensal de cerca de 528,00€, mas entretanto só prestava algumas horas incertas quando era chamada.
6. E a ama da parte de tarde, MA, que presta serviço entre 15 horas às 18.30 horas, auferiu um vencimento mensal de 250,00€, até Agosto de 2016, data em que cessou funções.
7. Por acordo dos progenitores, a partir do corrente mês de Setembro, o menor passou a frequentar a creche (Colégio de S. Lázaro, IPSS) da parte da manhã, ficando apenas aos cuidados da ama, da parte da tarde.
8. Por causa dos parcos rendimentos da mãe, a mensalidade da creche é subsidiada pela Segurança Social, fixando-se, em função dos rendimentos da mãe, em 66,00€ mensais.
9. Assim, além dos encargos com a creche, teremos que contar com o vencimento da ama que no período da tarde cuidará do menor em casa, em montante ainda por definir.
10. Contudo, esse vencimento não andará longe dos 250,00€ que pagava antes.
11. Em alimentação, no que se refere a mercearias, faz compras duas vezes por mês, gastando em média, 150,00€.
12.Carne, peixe e fruta, que compra semanalmente, gastando em média, por semana, cerca de 55,00€, que dá um gasto mensal de cerca de 220,00€.
13. Habitação: Renda de casa, 280,00€, mensais; Energia eléctrica, em média, gasta 30,00€; Gás (uma botija por mês), 23,60€; Água: 15,00€.
14. O agregado da requerente é composto por ela e pelo menor.
15. Além destes, há a considerar despesas que são exclusivas do menor, como sejam as fraldas, produtos e de higiene (sabonete, gel de banho, champô, cremes, hidratantes, etc) no que gasta em média cerca 50,00€ euros/mês.
16. Em vestuário, calçado e enxoval próprio, a despesa é de cerca 1100,00€/ano.
17. Iniciado o Outono, a requerente, comprou roupa, tendo gasto em calçado e vestuário, 417,24€.
18. Situação que se repetirá, com outros valores, quando vierem os rigores do Inverno, para o que terá que adquirir roupa e calçado mais quentes ou outro mais adaptado ao seu crescimento. Na estação primavera/verão verifica-se situação idêntica.
19. Acrescem ainda outras despesas ocasionais, mas necessárias, como por exemplo um carrinho de bebé, mais adaptado ao tamanho do menor, como aconteceu recentemente, tendo a mãe gasto 89,99€ na sua aquisição.
20. Finalmente há ainda a considerar jogos e material didáctico (que o pai nunca lhe ofereceu) 100,00€ por ano.
21. O pai é piloto da aviação comercial, ao serviço da TAP, e auferiu em 2015 um rendimento global no montante de 99651 euros/brutos (um média de cerca de 8304 mês, se dividirmos tal montante por 12), auferindo actualmente um vencimento mensal que oscila, em função de vários componentes (a crédito (v.g., ajudas de custo) e a débito (v.g., viagens), entre os (cerca de) 2942€ e os 4026€.
22. A mãe, aufere um vencimento líquido de 565,64€, enquanto trabalhadora por conta de outrem e um rendimento variável e incerto que anda entre os 150,00€ e os 300,00€ pela prestação de serviços de consultas de psicologia.
23. Os rendimentos auferidos em 2015 foram de 3535 de trabalho dependente (reportado apenas a 6 meses, uma vez por ter ido viver para Lisboa com o requerido havia suspendido o contrato de trabalho, só o retomando em Junho de 2015) e 2808,00€, no total, bruto, de 7641€.
24. Na altura em que foram acordados os alimentos, a mãe residia na casa dos seus pais e avós do menor, que proporcionavam a ambos habitação e alimentação, o que, muito embora à custa dos avós paternos, disfarçava a desproporção da contribuição de cada um dos progenitores para os alimentos.
25. A requerente e o menor mudaram-se para uma casa arrendada, pela qual paga uma renda de 280,00€ mensais, além das despesas com a energia e água, bem como com a alimentação.
26. Como acordado na conferência de pais do dia 14 de Setembro, ficou estipulado que o menor ficaria a frequentar o Colégio de S. Lazaro, na parte da manhã, e, de tarde, com a ama, sendo as despesas suportadas em partes iguais por ambos os pais.
27. A mãe ainda não conseguiu contratar a ama que ficará com o menor da parte da tarde.
28. A mãe tem uma retaguarda familiar solidária que a ajuda a suprir ou remediar a actual falta da ama da tarde, seja para ficar com ele, seja para o ir buscar ao colégio quando a mãe não pode.
29. É que, para evitar que o menor fique no colégio a tarde toda, sem qualquer tipo de actividade pedagógica, e, assim, esteja no aconchego da sua casa, a falta da ama da tarde tem sido suprida ou remediada pela requerente, que o vai buscar por volta das 16 horas (após a sesta), ficando assim com a mãe ou com a avó materna, quando a mãe está impedida em consultas.
30. Quando o menino está doente, como tem acontecido com alguma frequência nos últimos dois meses (com otites e varicela), da parte da manhã, o menor fica em casa, com a empregada dos avós maternos e, de tarde, com avó materna ou com a mãe.
Do pai
31. Na altura do acordo em crise, a Progenitora estava a iniciar a sua actividade profissional e, actualmente, aufere mais de 534,85 Euros fixos mensais e um rendimento variável que pode atingir os 300,00 Euros.
Factos não provados
Da mãe
1. Na altura (a),2.) supra), a referida ama cuidava exclusivamente do menor e não lhes prestava qualquer tipo de serviço.
2. Quando da mudança para a actual casa da Autora, o pai continuou a pagar apenas um terço do vencimento de uma das amas, concretamente a da manhã.
3. Acresce que quando o menor está em Cascais com o pai, este não paga à ama que presta serviço da parte da manhã, sendo a mãe obrigada a suportar esse custo.
4. Mas já não faz esse desconto à ama da parte de tarde.
5. Há ainda a considerar outros encargos que importa tomar em consideração, designadamente os descontos para segurança social, de seguro de acidentes de trabalho, férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.
6. Além da mensalidade, a partir de Outubro próximo, o menor frequentará aulas de música e psicomotricidade, actividades pelas quais pagará mais 15,00€ mensais.
7. A Autora paga a empregada de limpeza doméstica: 24,00€ por semana, o que dá 96,00€, por mês.
8. Iniciado o Outono, a requerente, teve de comprar roupa adaptada à estação no valor de 417,24€.
9. O pai é piloto da aviação comercial, ao serviço da TAP, e aufere um vencimento líquido mensal superior a 5000,00€ mensais, a que acrescem ajudas de custo, diuturnidade, subsídios e outras regalias.
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IV-O Direito

Como resulta do disposto nos arts.º 608.º, n.º 2, ex vi do art.º 663.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, 639.º, n.os 1 a 3, 641.º, n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem das conclusões que definem, assim, o âmbito e objecto do recurso.

Deste modo, e tendo em consideração as conclusões acima transcritas cumpre apurar se a pensão de alimentos fixada pelo tribunal a quo deve ser objecto de redução para o valor apontado pelo recorrente tendo em conta as razões por si aduzidas.


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Fundamentos de Direito
A primazia dos princípios constitucionais consagrados nos artigos 36.º, n.º 5 e 69.º da CRP, impõe o dever dos pais de sustentar os seus filhos, pelo direito das crianças ao seu desenvolvimento, configurando o dever de alimentos aos filhos menores como um verdadeiro dever fundamental dos respectivos progenitores, directamente fundado nos referidos preceitos.
A correspondente medida dos alimentos devidos ao menor, deve, no entanto, ser adequada aos meios de quem houver de prestá-los, devendo o tribunal valorar, de forma global e abrangente, a sua condição social, a sua capacidade laboral, bem como todo o acervo de bens patrimoniais de que seja detentor, nunca deixando de ter em conta o superior interesse do menor, consignado, de igual modo, na nossa lei ordinária, concretamente no art.º 1878.º, do CC, onde se lê: “compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens”.
E a nossa lei acautelou de tal modo este direito dos filhos e dever dos pais, que os mesmos só ficam desobrigados de prover ao sustento dos filhos e de assumir as despesas relativas à sua segurança, saúde e educação na medida em que os filhos estejam em condições de suportar aqueles encargos - cfr. art.º 1879.º, do CC.
Por sua vez, a noção de alimentos é estabelecida no art.º 2003.º, do CC, abrangendo tudo o que for indispensável ao desenvolvimento físico, social e psíquico do menor.
Assim, conforme resulta das disposições conjugadas dos arts. 2003.º, 2004.º do Código Civil, “por alimentos entende-se tudo que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário, compreendendo também a instrução e educação; os alimentos serão proporcionais aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los”.
Daqui decorre que a medida dos alimentos depende, pois, da verificação das seguintes condições: possibilidade do alimentante, necessidade do alimentado e possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência.
Por outro lado, os alimentos devem ser fixados em prestações pecuniárias mensais, salvo se houver acordo ou disposição legal em contrário, ou se ocorrerem motivos que justifiquem medidas de excepção (art. 2005.º do Código Civil).
Impera, assim, o princípio/regra de que tal prestação deverá ser traduzida numa quantia pecuniária fixa mensal (correspondente a um cálculo médio anual das despesas com o sustento daquele concreto menor, tendo em conta as suas necessidades), ressalvando-se apenas as situações em que os progenitores possam fixar tal obrigação em espécie, caso estejam de acordo.
Por sua vez, a quantia pecuniária é determinada em concreto, efectuando-se uma correlação de equidade entre as necessidades do menor e as capacidades económicas de cada progenitor.
Por outro lado, e a acrescer a tal determinação dum montante fixo de alimentos, poderá ser fixada uma contribuição variável, considerando-se aquelas despesas do menor que embora previsíveis e necessárias, fogem à lógica da satisfação das necessidades básicas de sustento e que se relacionam habitualmente com a saúde (médicas e medicamentosas) escolares (livros e material escolar e/ou eventuais mensalidades de colégios privados ou outras estruturas de ensino) com actividades lúdicas e desportivas, etc.
Preside também à fixação da prestação de alimentos o objectivo de, dentro do possível, se preservar o nível de vida do menor, bem como a ideia de que o sacrifício que deverá ser exigido aos progenitores deve ter por base um critério mínimo de razoabilidade, visando proporcionar o maior bem-estar possível aos seus filhos.
A modificação de circunstâncias pode condicionar a alteração dos alimentos - cfr. art.º 2012.º, do Código Civil -, significando isto que, só se justificará a alteração se, face ao apurado, as circunstâncias actuais, forem de tal modo diferentes das existentes à data em que foi fixada a pensão.
Devem, pois, ser excepcionais a fim de não ser prejudicada a necessidade da criança relativamente à estabilidade do ambiente em que vive e à continuidade nas suas relações pessoais.
Ora, perante os factos apurados, dúvidas não existem que as circunstâncias, à data em que o acordo foi estabelecido entre os progenitores do menor, se alteraram, dado que a mãe residia, nessa altura, na casa dos seus pais e avós do menor, que lhes proporcionavam habitação e alimentação e, agora, é a recorrida quem tem de fazer face a todas essas despesas.
Conforme apurado, muito embora à custa dos avós maternos, a desproporção da contribuição de cada um dos progenitores para os alimentos era atenuada pela situação anterior.
Tendo ocorrido uma mudança, devido ao facto da requerente e do menor terem passado a residir numa casa arrendada, pela qual é paga uma renda de 280,00€ mensais, a que acresce as despesas com a energia e água, bem como com a alimentação, importa agora ponderar o valor a fixar em função dessa nova realidade.
Para o efeito, importa, em primeiro lugar, considerar que não é o facto, como o recorrente aduz, do valor das despesas totais elencadas nos factos provados ultrapassarem o vencimento auferido pela requerida/recorrida que invalida essa factualidade atinente aos valores apurados a título de despesas, na medida em que tal é absolutamente independente do montante auferido, ou não, pela recorrida.
É que as necessidades de habitação, alimentação, escolaridade, higiene, saúde, médicas, medicamentosas, escolaridade e outras mais, existem independentemente das possibilidades de um ou outro dos progenitores.
A assim não se entender, no caso do progenitor que tem a guarda do menor não auferir um rendimento que lhe permita satisfazer, por si só, a totalidade de tais necessidades, impedido estaria de demonstrar e provar os respectivos custos que a sua satisfação importam, quando, como se sabe, muitas vezes, tal só é possível por via de ajudas familiares, de terceiros ou outras.
Por isso é que o outro progenitor deve comparticipar nessas despesas na devida proporção das suas reais e concretas possibilidades, por forma a colmatar a diferença de rendimento do outro progenitor para suportar tais custos.
Pois, a equidade de que o recorrente fala destina-se exactamente a encontrar a solução mais justa para o caso concreto.
A este respeito, como refere o Prof. José Tavares, a equidade é "a expressão da justiça num dado caso concreto". (in "Princípios Fundamentais do Direito Civil", I, 50). É uma justiça de proporção, ou de equilíbrio, fora das regras rígidas da norma..(…)», cfr Ac STJ de 11 de Julho de 2006, in www.dgsi.pt.
O termo «equidade», é usado como sinónimo de «igualdade» e de «Justiça», permitindo que o julgador, aquando da sentença adapte a justiça às circunstâncias da situação concreta, («(…) a equidade é, portanto, um recurso que, superando a estrita legalidade positiva e apoiando-se no espírito da lei e na justiça natural, possibilita a consecução mais cabal e perfeita do justo nas variáveis e contingentes situações da vida.(…) Trata-se, em suma, de deixar à prudência do julgador adoptar a solução que entenda mais conveniente e oportuna para cada situação. Há quem fale, em tal hipótese, de «equidade-substitutiva», precisamente pelo facto de o juízo de equidade se substituir às normas jurídicas positivas. (…) A melhor doutrina procura conjugar equilibradamente as exigências da norma (justo legal) e do caso (justo concreto) e encontrar, enfim, a justa via média entre o normativismo abstracto e o decisionismo casuístico. (…)»), cfr Mário Bigotte Chorão, Introdução ao Direito, 1989, volume I, pag 97, 102, 105 e 106.
Posto isto, sempre se dirá, de qualquer das formas, que o valor fixo mensal correspondente ao salário da recorrida, acrescido do montante máximo variável que aufere, sempre seria suficiente para fazer face às despesas médias mensais actuais, sem contabilizar o valor de 250.00€ de uma ama, dado que, neste momento não a tem.
A tudo isto acresce o facto das despesas do menor não serem um encargo só da mãe, daí a necessidade de se fixar tal valor.
Assim, no caso em apreço, no acordo homologado por sentença o recorrente acordou pagar uma mensalidade de 250,00€, actualizada anualmente pelo valor correspondente a, pelo menos, 5%, bem como as despesas de saúde comprovadas e não comparticipadas e 50% do valor correspondente a despesas escolares ou ama.
Ora, considerando este acordo e o montante de menor valor devido a uma das amas, na proporção de metade, sempre o requerido/recorrente pagaria, a título de despesas fixas, a importância de 375,00€, a que acresceriam depois as despesas de saúde em conformidade com o acordado.
Perante a alteração das circunstâncias, atenta a factualidade apurada, conclui-se que os gastos presentes e actuais com o menor rondam o valor de 224,00€, e que contabilizados, pela metade, os demais gastos com alimentação, renda, água, luz e gás, de cerca de 359€, se obtém um total de 583,00€, pelo que, se se atentar na proporção fixada na sentença de 2/3 a pagar pelo pai, que até lhe é favorável tendo em conta que aufere um rendimento cinco vezes superior ao da mãe do menor, chega-se à importância de cerca de 388€.
Como tal, julgamos que o valor de 370,00€ mensais fixado na decisão recorrida, a pagar pelo recorrente, nos parece equilibrada, sendo, assim, de manter, tal como a proporção fixada quanto ao que cada progenitor deve contribuir para fazer face a tais despesas, bem como a percentagem de actualização atribuída, dado que agora o valor a pagar é superior ao anteriormente acordado.
Por outro lado, tendo em conta que, quer por via de acordo, quer da decisão proferida ora em apreço, se estabeleceu, de forma acrescida, o pagamento de outras despesas que já existiam, não ocorrendo qualquer alteração das circunstâncias, a esse título, entendemos que, nessa parte, deve ser mantido o acordo fixado anteriormente entre as partes, a não ser no tocante à proporção estabelecida de 2/3, para o recorrente, e 1/3, para a recorrida, devido ao facto de, agora, a recorrida já não viver em casa dos seus pais o que lhe retira a sua maior disponibilidade para suportar metade dessas despesas.
Caí, assim, por terra a demais argumentação aduzida pelo recorrente no seu recurso, dado que para a fixação do regime de alimentos, nessa parte e no essencial se mantem o anteriormente acordado.
Já quanto à ama, o seu valor só será pago pelo recorrente, na proporção de 2/3, a partir da data da sua comprovada contratação e respectivo pagamento mensal de valor nunca superior a 250,00€.
Por último, sempre se dirá que, por esta via, se visa evitar no futuro maiores conflitos entre os progenitores, ao estabelecer-se, na medida do possível, um valor fixo que abranja todas as despesas médias mensais possíveis já de atender e outro só variável para despesas excepcionais.
Em síntese, face ao exposto, no essencial, mantêm-se a decisão proferida.
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V – Decisão
Pelo exposto, nos termos supra referidos, os juízes da 2ª secção cível, deste Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar, no essencial, a apelação interposta improcedente, fixando o exercício das responsabilidades parentais do menor P nos seguintes termos:
A. A título de pensão de alimentos o pai pagará ao menor P, entregando à progenitora, a quantia de 370€ mensais, até ao dia 8 de cada mês, por transferência bancária;
B. A aludida pensão será actualizada, no mês de Janeiro de cada ano, à taxa de inflação publicada pelo I.N.E, não inferior a 3% (a próxima em Janeiro de 2018);
C. As despesas com ama serão pagas na proporção de 2/3 para o pai e 1/3 para a mãe, até ao dia 8 de cada mês, por transferência bancária, a realizar após a devida comprovação da sua contratação e por um valor nunca superior a 250,00€ para efeitos de cálculo da referida proporção;
D. As despesas de saúde e as demais com a educação do menor, referentes a manuais e material escolar do início do ano escolar, devidamente comprovadas e não comparticipadas, serão pagas na proporção de 1/3 para mãe e 2/3 para o pai;
E. Tais despesas, devidamente comprovadas pelo correio ou Correio electrónico, através de factura/recibo, serão pagas pelo pai até ao dia 8 do mês subsequente à recepção dos documentos, juntamente com a pensão de alimentos.
F. Estes alimentos são devidos desde a data da propositura desta acção (25.2.2016).
Custas pelo recorrente.
Notifique.
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TRG, 11.05.2017

(O presente acórdão foi elaborado em processador de texto pela primeira signatária)

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Maria dos Anjos S. Melo Nogueira

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Desembargador José Carlos Dias Cravo

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Desembargador António Manuel A. Figueiredo de Almeida