Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
447/13.2TAPTL-A .G1
Relator: TERESA BALTAZAR
Descritores: DEFENSOR
FALTA DE ADVOGADO
AUSÊNCIA
PROCEDIMENTO
INTERRUPÇÃO
ADIAMENTO
JULGAMENTO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/11/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: JULGADO IMPROCEDENTE
Sumário: I) Da conjugação dos artºs 330º e 67º, ambos do CPP, resulta que na situação de não comparência do defensor à audiência de julgamento o procedimento regra consiste na imediata substituição do faltoso por defensor nomeado para o acto, com vista a assegurar de forma pronta e eficaz a salvaguarda das garantias de defesa do arguido.
II)
II) Só assim se não deverá proceder quando a substituição imediata não se revele possível ou seja inconveniente para o adequado exercício da defesa ou para o interesse do processo, admitindo a lei excepcionalmente, nessas cirrcunstâncias, a interrupção ou, quando se revele absolutamente necessário, o adiamento da audiência.
Decisão Texto Integral: - Tribunal recorrido:
Comarca de Viana do Castelo, Ponte de Lima – Inst. Local – Sec. Comp. Gen. – J1.
- Recorrente:
O arguido Simplício D..
- Objecto do recurso:
No processo comum com intervenção de tribunal singular n.º 447/13.2TA PTL, Comarca de Viana do Castelo, Ponte de Lima – Inst. Local – Sec. Comp. Gen. – J1, foi proferido despacho, nos presentes autos a fls. 21 e 22 - na primeira sessão da audiência de julgamento, ocorrida no dia 8 de Maio de 2014 - no qual se decidiu:
- por falta de fundamento legal, atento o disposto no art. 330°, n.º 1, do CPP, indeferir o adiamento da audiência requerido a fls. 182/ 183 dos autos principais, pelo advogado constituído do arguido (req. enviado a 29-04-2014 / nos presentes autos a fls. 39 e 40).
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Inconformado com a supra referida decisão o arguido Simplício D., dele interpôs recurso - cfr. fls. 02 a 10, terminando a sua motivação com as conclusões constantes de fls. 07 a 10, o que aqui se dá integralmente como reproduzido, no qual no essencial:
- Solicita que seja revogado o mencionado despacho, sendo declarado nulo, invocando que requereu o adiamento da audiência (por impossibilidade de comparência do seu advogado), - marcada para 08-05-2014 - no entanto tal foi indeferido, tendo-lhe sido nomeado um defensor oficioso, sendo que entende que devia ter sido assistido pelo advogado que constituiu.
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O recurso foi admitido por despacho constante a fls. 11.
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O M. P. respondeu, concluindo que o recurso não merece provimento (cfr. fls. 12.
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A Ex.mª Sr.ª Procuradora Geral Adjunta, nesta Relação no seu parecer (constante de fls. 57 a 59) conclui também que o recurso não merece provimento.

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Cumprido o disposto no artigo 417º, n.º 2, do C. P. Penal, não veio a ser apresentada qualquer resposta.

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Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos, prosseguiram os autos para conferência, na qual foi observado todo o formalismo legal.

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- Cumpre apreciar e decidir:
- A - É de começar por salientar que, para além das questões de conhecimento oficioso, são as conclusões do recurso que definem o seu objecto, nos termos do disposto no art. 412º, n.º 1, do C. P. Penal.
- B - No essencial, no seu recurso o arguido suscita a questão seguinte:
- Solicita que seja revogado o despacho em causa, sendo declarado nulo, invocando que requereu o adiamento da audiência (por impossibilidade de comparência do seu advogado) - marcada para 08-05-2014 - no entanto tal foi indeferido, tendo-lhe sido nomeado um defensor oficioso, sendo que entende que devia ter sido assistido pelo advogado que constituiu.
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- C - Teor do despacho recorrido (fls. 21 e 22):
“Fls. 182-183:
Indefere-se o requerido adiamento, por falta de fundamento legal, nos termos do artigo 330.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
Providencie pela indicação, através do SINOA, de defensor oficioso ao arguido, que desde já se nomeia.”.
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- Questões suscitadas no recurso:
- Solicita o arguido que seja revogado o despacho em causa, sendo declarado nulo, invocando que requereu o adiamento da audiência (por impossibilidade de comparência do seu advogado) - marcada para 08-05-2014 - no entanto tal foi indeferido, tendo-lhe sido nomeado um defensor oficioso, sendo que entende que devia ter sido assistido pelo advogado que constituiu.

Face aos elementos dos autos as audiências de julgamento ocorreram no dia 08-05-2014 - fls. 21 a 26 dos presentes autos - e 15-05-2014 – fls. 45 a 50 - (1ª e 2ª data que se encontravam agendadas), tendo sido marcado para leitura de sentença o dia 22-05-2014.

Verifica-se das actas de audiência de julgamento que o mandatário constituído do arguido esteve presente na 2ª data designada (15-05-2014).

A questão coloca-se relativamente á audiência de julgamento ocorrida em 08-05-2014, na qual invocando-se falta de fundamento legal, em face do estipulado no art. 330.º, n.º 1 do C. P. Penal, se decidiu indeferir o requerimento de fls. 182 / 183, em que era solicitado pelo advogado constituído pelo arguido o adiamento dessa audiência por impossibilidade (do próprio advogado) de poder estar presente na mesma.

Diz o arguido no seu recurso que, tendo o seu mandatário, por requerimento remetido ao processo em 29 - 04 - 2014, informado da impossibilidade de comparecer à audiência de julgamento designada para o dia 8 de Maio de 2014, assim como dos outros dois advogados que constam da procuração junta aos autos, e requerido o seu adiamento, a realização da audiência de julgamento sem a presença do defensor constituído, uma vez que este justificou a falta de comparência, constitui a nulidade insanável prevista na alínea c) do art. 119° do Código de Processo Penal.
Solicita, assim, que o despacho em causa seja declarado nulo e, em consequência, a audiência de julgamento declarada inválida, nos termos do disposto no art. 122°, n.ºs 1 e 2, do CPP, determinando-se a repetição da mesma.

No entanto, desde já se refere que entendemos não assistir razão ao arguido.

Vejamos.

Refere-se o art. 330.º do C.P.P., á falta do Ministério Público, do defensor e do representante do assistente ou das partes civis.

Dispondo o seu n.º 1 o seguinte:

“1 - Se, no início da audiência, não estiver presente o Ministério Público ou o defensor, o presidente procede, sob pena de nulidade insanável, à substituição do Ministério Público pelo substituto legal e do defensor por outro advogado ou advogado estagiário, aos quais pode conceder, se assim o requererem, algum tempo para examinarem o processo e prepararem a intervenção.” (o sublinhado é nosso).

Sendo que quanto á substituição do defensor estipula o art. 67.º do C. P. Penal o seguinte:

“1 - Se o defensor, relativamente a um acto em que a assistência for necessária, não comparecer, se ausentar antes de terminado ou recusar ou abandonar a defesa, é imediatamente nomeado outro defensor; mas pode também, quando a nomeação imediata se revelar impossível ou inconveniente, ser decidido interromper a realização do acto.

2 - Se o defensor for substituído durante o debate instrutório ou a audiência, pode o tribunal, oficiosamente ou a requerimento do novo defensor, conceder uma interrupção, para que aquele possa conferenciar com o arguido e examinar os autos.

3 - Em vez da interrupção a que se referem os números anteriores, pode o tribunal decidir-se, se isso for absolutamente necessário, por um adiamento do acto ou da audiência, que não pode, porém, ser superior a cinco dias.”.

Em face do teor destas disposições legais concorda-se com a Digna PGA, quando a fls. 58 refere que “Da conjugação dos referidos preceitos legais resulta assim que, constatada a falta do defensor à audiência de julgamento, a regra é a sua substituição por outro advogado ou advogado estagiário, ao qual será concedido, se assim o requerer, algum tempo para examinar o processo e preparar a intervenção, só sendo a audiência adiada se isso for absolutamente necessário.
No caso em apreço, resulta do requerimento apresentado pelo defensor constituído, Dr. Eduardo M. (fls. 39 e 40), que os outros dois advogados constituídos se encontravam impossibilitados de assegurar a defesa do arguido e que aquele tinha marcada outra diligência de julgamento para o dia 8 de Maio, às 09:30 horas, no Tribunal Judicial de Ponte de Lima, estando assim impedido de proceder à defesa deste na audiência de julgamento marcada nos presentes autos para as 10:00 horas do mesmo dia.” (o sublinhado é nosso).

Sendo, ainda, de mencionar que a fim de prevenir o risco de sobreposição de datas de diligências a que devam comparecer os advogados ou defensores, dispõe o art. 312.º, n.º 4, do C. P. Penal que “4 - O tribunal deve marcar a data da audiência de modo a evitar a sobreposição com outros actos judiciais a que os advogados ou defensores tenham a obrigação de comparecer, aplicando-se o disposto no artigo 155.º do Código de Processo Civil.”.

Dispondo actualmente a correspondente disposição legal - Artigo 151.º do C. P. Civil (art.º 155.º do CPC de 1961) – sob a epigrafe “Marcação e início pontual das diligências”, o seguinte :

“1 - A fim de prevenir o risco de sobreposição de datas de diligências a que devam comparecer os mandatários judiciais, deve o juiz providenciar pela marcação do dia e hora da sua realização mediante prévio acordo com aqueles, podendo encarregar a secretaria de realizar, por forma expedita, os contactos prévios necessários.

2 - Quando a marcação não possa ser feita nos termos do número anterior, devem os mandatários impedidos em consequência de outro serviço judicial já marcado comunicar o facto ao tribunal e identificar expressamente a diligência e o processo a que respeita, no prazo de cinco dias, propondo datas alternativas, após contacto com os restantes mandatários interessados.

3 - O juiz, ponderadas as razões aduzidas, pode alterar a data inicialmente fixada, apenas se procedendo à notificação dos demais intervenientes no ato após o decurso do prazo a que alude o número anterior.”.

Sendo que também aqui se concorda com o referido pela Digna PGA a fls. 59, quando refere que “Face a tais preceitos legais não nos parece, pois, legítima a pretensão do advogado constituído pelo arguido, que, em devido tempo, não informou o Tribunal do seu impedimento de comparecer à audiência de julgamento, em virtude de ter outra diligência já marcada, nem propôs datas alternativas, após contacto com a mandatária do assistente, de requerer ao Tribunal, dez dias antes da audiência de julgamento, o seu adiamento com tal fundamento.
Conforme se refere no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20-06-2012, Proc. n.º 1237/06.4JAPRT.P1, in www.dgsi.pt. «a lei não só permite como impõe a substituição do Defensor, que faltou, por um outro. Salvo se a substituição se revelar "impossível ou inconveniente". O que sucederá quando a substituição imediata represente "um forte gravame para o arguido". O que terá de ser alegado e demonstrado
Ora, no caso em apreço, o defensor, no requerimento que apresentou a solicitar o adiamento da audiência de julgamento, com fundamento no seu impedimento de comparecer nesta, não invocou quaisquer factos donde resultasse que a defesa do arguido só poderia ser assegurada por si, sob pena de restrição inadmissível das garantias de defesa do mesmo.
Nesta conformidade, salvo melhor opinião, o Tribunal, ao realizar a sessão do dia 8 de Maio de 2014 da audiência de julgamento na ausência do advogado constituído pelo arguido, tendo este sido assistido por defensor nomeado para aquele acto, não cometeu a nulidade insanável prevista no art. 119.º, al. c), do CPP invocada pelo recorrente.”.
Conclui-se, pois, que o tribunal a quo obedeceu ao procedimento legal previsto expressamente para a falta do defensor à audiência de julgamento, no artigo 330.º n.º 1, em consonância com o disposto no artigo 67.º n.º 1, ambos do Código Processo Penal, uma vez que, constatada a falta do defensor, procedeu à sua substituição por defensora nomeada (fls. 22), tenho-lhe sido concedida a possibilidade de, caso o entendesse e se revelasse necessário, ter prazo para examinar o processo e preparar a intervenção.
Tal como já se referiu e resulta das normas legais mencionadas, sobretudo da conjugação dos artigos 330.º e artigo 67.º, ambos do Código Processo Penal, na situação de não comparência do defensor à audiência de julgamento o procedimento regra consiste na imediata substituição do faltoso por defensor nomeado para o acto, com vista a assegurar de forma pronta e eficaz a salvaguarda das garantias de defesa do arguido. Só assim se não deverá proceder quando a substituição imediata não se revele possível ou seja inconveniente para o adequado exercício da defesa ou para o interesse do processo, admitindo a lei excepcionalmente, nessas circunstâncias, a interrupção ou, quando se revele absolutamente necessário, o adiamento da audiência.
De assinalar, ainda, que as regras da substituição se aplicam tanto ao defensor constituído pelo arguido, como ao defensor nomeado, assim como não distingue a lei as situações em que a falta de comparência do defensor deva ou não ser considerada justificada, nos termos do artigo 117.º, n.ºs 1, 2 e 8 do Código Processo Penal. Portanto, não temos o entendimento de que o defensor que justifica a falta, nos termos do artigo 117.º do Código Processo Penal, não pode ser substituído por outro defensor nomeado para o acto, posto que tal interpretação não tem qualquer apoio no texto legal, tão pouco é possível afirmar a priori que essa substituição implica necessariamente uma limitação das garantias de defesa do arguido, mormente do direito de escolha de defensor, porquanto somente caso a caso deverá ser apreciado se a substituição resulta ou não inconveniente à defesa, sendo, para esse efeito, atendível a vontade manifestada pelo arguido.
Assim, nas concretas circunstâncias do caso não se justificava a ponderação sobre se seria ou não absolutamente necessário proceder ao adiamento da audiência, posto que se obteve atempada nomeação de defensor e nada permitia concluir pela inconveniência da substituição.
Pelo que, não existindo fundamento legal para o adiamento da audiência, nenhuma censura merece o procedimento seguido pelo tribunal a quo.
Mais se assinala que a audiência de julgamento decorreu com integral respeito pelo direito de defesa do arguido, consagrado constitucionalmente no artigo 32.°, n.ºs 1 e 3, da Constituição da República Portuguesa.
Pelo que não assiste razão á pretensa equiparação da realização da audiência nos moldes em que ocorreu nestes autos com aquela outra situação em que a realização da audiência decorre sem a assistência de defensor.
Assim sendo, não foi cometida a nulidade insanável prevista no artigo 119.º, alínea c) do Código Processo Penal, porquanto a audiência decorreu com a assistência de defensora, a quem foi conferida a legal possibilidade de se inteirar do processo e de preparar a sua intervenção.
Em face do que ficou devidamente assegurada a defesa do arguido de forma eficaz e sem diminuição de garantias legais e constitucionais, nomeadamente o direito a um processo equitativo e o direito a escolher defensor, constitucionalmente consagrados nos artigos 20.º n.º 4 e 32.º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.
A interpretação que se faz do artigo 330.º do Código Processo Penal não afronta as normas e preceitos legais invocados pelo recorrente, e designadamente nos artigos 20.º n.º 2, 32.º n.ºs 1 e 3, da C.R.P..
Neste sentido se decidiu, nomeadamente, em Ac. do T R Lisboa, com o sumário seguinte:
“I - Embora na audiência de julgamento (…) seja obrigatória a assistência do arguido por defensor, daqui não resulta que esta exigência legal só obtenha satisfação, no caso de o arguido ter constituído advogado, com a assistência pelo advogado constituído.
II - O direito de o arguido escolher defensor e o de ser assistido por ele em todos os actos do processo criminal não são direitos absolutos, direitos que possam ser exercidos de forma irrestrita.
III - A nulidade prevista na alínea c), do artigo 119º, do Código de Processo Penal, por ausência do defensor do arguido, só se verifica quando se praticar algum dos actos previstos no artigo 64º, do Código de Processo Penal, sem a presença de qualquer defensor.” (Ac. do TRL, Proc. n.º 816/2007-5, Relator: Emílio Santos, de 02-10-2007 / o sublinhado é nosso).

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Deve, pois, o recurso ser julgado como improcedente.
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- Decisão:

Pelo exposto, decide-se nesta Relação em julgar o recurso como improcedente, mantendo-se o despacho recorrido.


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Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.
Notifique / D. N.
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(Texto processado em computador e revisto pela primeira signatária – artº 94º, nº 2 do CPP – Proc n.º 447/13.2TA PTL-A.G1).
Guimarães, 11 de Maio de 2015