Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
286/12.8TCGMR.S1.G1
Relator: ANTÓNIO FIGUEIREDO DE ALMEIDA
Descritores: CONTESTAÇÃO
INTEMPESTIVIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/09/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1) Os juros remuneratórios representam uma contraprestação onerosa pela disponibilidade do capital, enquanto os moratórios são devidos pela não restituição do capital no momento próprio;
2) Não se tendo contestado um requerimento inicial de liquidação, em que se consideraram confessados os factos alegados, não é lícito à parte vir apresentar contestação a um requerimento apresentado na sequência de um convite a completar o pedido de liquidação em quantia certa, dessa forma pretendendo impugnar factos já dados como confessados, sem prejuízo de poder contraditar a matéria apresentada, objeto do convite, isto é, a concretização do pedido.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I. RELATÓRIO
A) Laura F veio intentar ação com processo comum na forma ordinária contra Domingos F, onde conclui entendendo dever a mesma ser julgada procedente e provada, e consequentemente:
a) Ser o réu condenado a reconhecer que as aplicações, referidas no artigo 13º da petição, e respetivos juros, faziam parte do património do dissolvido casal;
b) Julgar-se que o réu se apoderou, em seu exclusivo proveito e em prejuízo da autora, da quantia de €278.785,38, e dos respetivos juros;
c) Ser o réu condenado a pagar à autora a quantia de €139.392,69, e dos respetivos juros, correspondente a metade dos montantes das aplicações, acrescida de juros à taxa legal, desde 1/10/2002, até integral e efetivo pagamento;
d) Pagar as custas, despesas judiciais e procuradoria.
O réu Domingos F apresentou contestação onde conclui entendendo dever a ação ser julgada não provada e improcedente.
A autora Laura F apresentou réplica onde conclui entendendo dever ser julgada improcedente a alegada exceção da prescrição, concluindo-se como na petição inicial, ou então, deverá o réu ser condenado com base no instituto do enriquecimento sem causa, com todas as consequências legais.
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Foi elaborado despacho saneador, onde foi julgada improcedente a invocada exceção de prescrição, organizados os factos assentes e a base instrutória.
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Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença onde se decidiu condenar Domingos F a pagar a Laura F:
1. A quantia de €139.392,69 inerentes ao capital;
2. Acrescida do valor dos respetivos juros remuneratórios – a liquidar posteriormente - desde 1.10.2002 até efetiva e integral entrega do capital; e
3. Os juros moratórios incidentes sobre o capital, às taxas, entretanto em vigor, desde 1.10.2002 até efetivo e integral pagamento.
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B) Inconformado com a decisão, veio o réu Domingos F interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo (fls. 304), tendo sido proferido Acórdão nesta Relação que julgou a apelação improcedente, mantendo-se a sentença apelada (fls. 311-348).
Novamente inconformado veio o réu Domingos Freitas de Sousa interpor recurso de Revista Excecional (fls. 354 e seguintes).
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Os autos foram à Conferência, nesta Relação e foi elaborado o Acórdão que consta de fls. 422 e seguintes, na sequência da arguição de nulidade do anterior acórdão, que decidiu inexistir qualquer nulidade, mas apenas um erro material, que foi retificado.
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Remetidos os autos ao STJ, foi proferido Douto Acórdão que decidiu não admitir a Revista Excecional (fls. 471-483).
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Entretanto foi deduzido pela autora Laura F incidente de Liquidação, tendo apresentado o seu requerimento de fls. 502 e seguintes, onde conclui pedindo que o requerido Domingos F seja condenado a pagar à requerente os juros remuneratórios, sobre o capital de €139.392,69, à taxa de 6,49%, no ano de 2002; de 5,33%, no ano de 2003; de 5,27%, no ano de 2004; de 5,33%, no ano de 2005: de 5,44%, no ano de 2006; de 7,44%, no ano de 2007; de 7,82%, no ano de 2008; de 4,61%, no ano de 2009; de 4,35%, no ano de 2010; de 5,00%, no ano de 2011; de 4,10%, no ano de 2012; de 3,53%, no ano de 2013; e de 3,47%, no ano de 2014, e nas taxas anuais da Euribor, que se forem vencendo, acrescidas de 3%, desde 1.10.2002 até efetivo e integral pagamento.
O réu Domingos F não apresentou contestação, pelo que foi proferido o despacho de fls. 512, que considerou confessados os factos alegados pela autora.
No mesmo despacho considerou-se que a autora não deu integral cumprimento ao disposto no artigo 359º/1 do C. P. Civil.
Com efeito, segundo este normativo, a liquidação é deduzida mediante requerimento oferecido em duplicado, no qual o autor, conforme os casos, relaciona os objetos compreendidos na universalidade, com as indicações necessárias para se identificarem, ou especifica os danos derivados do facto ilícito e conclui pedindo quantia certa.
Compulsado o requerimento inicial de liquidação, constata-se que o mesmo omite qualquer pedido de quantia certa, o que inviabiliza a pretendida liquidação.
Assim e nos termos do disposto no artigo 6º/2 do C. P. Civil, deverá a autora, em dez dias, completar tal requerimento indicando quantia certa no pedido de liquidação, nomeadamente, a que resulte da aplicação das taxas de juro alegadas, sob pena de o mesmo ser julgado nulo, por ineptidão (cfr. artigos 186º/2 b). e 359º/1, in fine, do C. P. Civil).
A autora veio apresentar o articulado de fls. 515-517, onde termina entendendo dever o requerido, Domingos F, ser condenado a pagar à requerente os juros remuneratórios, sobre o capital de €139.392,69, num montante global de €88.252,95, correspondente à taxa de 6,49%, no ano de 2002, no valor de €2.261,64; de 5,33%, no ano de 2003, no valor de €7.429,63; de 5,27%, no ano de 2004, no valor de €7.345,99; de 5,33%, no ano de 2005, no valor de €7.429,63; de 5,44%, no ano de 2006, no valor de €7.582,96; de 7,44%, no ano de 2007, no valor de €10.370,81; de 7,82%, no ano de 2008, no valor de €10.900,50; de 4,61%, no ano de 2009, no valor de € 6.426,00; de 4,35%, no ano de 2010, no valor de €6.063,58; de 5,00%, no ano de 2011, no valor de €6.969,63; de 4,10%, no ano de 2012, no valor de €5.715,10; de 3,53%, no ano de 2013, no valor de €4.920,56; e de 3,47%, no ano de 2014, no valor de €4.836,92, e nas taxas anuais da Euribor, que se forem vencendo, acrescidas de 3%, desde 1.01.2015 até efetivo e integral pagamento.
O réu Domingos F apresentou contestação onde entende dever a liquidação ser julgada improcedente, com as legais consequências.
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Foi proferida a sentença (fls. 534-537) onde se refere, nomeadamente, que a fls.519 e seguintes dos autos, veio o réu apresentar contestação à liquidação requerida pela autora.
A apresentação de tal articulado em 16 de março de 2015 é totalmente extemporânea.
Com efeito, o réu foi notificado para deduzir oposição em 12 de janeiro de 2015, pelo que o respetivo prazo há muito decorreu.
Como é sobejamente sabido e decorre do disposto no artigo 139º/3 do C. P. Civil, o decurso de um prazo perentório, como é o caso do prazo de oposição, extingue o direito a praticar o ato.
É certo que, por se considerar a douta petição de liquidação deficiente e incompleta, se convidou a autora a corrigi-la unicamente no respeitante ao pedido, tendo-se, logo nesse despacho, julgado provados os respetivos factos.
O dito despacho de 2 de março de 2015 (a fls.512) transitou em julgado, pois que dele não foi interposto recurso.
Nessa medida, o réu, em sede de contraditório, apenas se poderia pronunciar sobre o concreto pedido de quantia certa acrescentado pelo autor na petição corrigida – cfr. artigo 590º/5 do C. P. Civil – ou seja, e especificamente, sobre o concreto total indicado e já não sobre os factos que o sustentam, em suma, sobre a própria operação aritmética de cálculo do valor total, com base nos indicadores previamente alegados.
A contestação apresentada nada diz sobre tal matéria, limitando-se a aduzir matéria defesa que deveria ter sido alegada no momento próprio e que não foi, do que decorre a manifesta inadmissibilidade da mesma.
Termos em que se julga extemporânea a apresentação da contestação de fls.519 e seguintes dos autos e se determina o seu desentranhamento e a sua restituição ao apresentante.
Na mesma sentença foi decidido julgar o incidente provado e procedente e, em consequência:
a) fixar e liquidar em €88.252,95 (oitenta e oito mil, duzentos e cinquenta e dois euros e noventa e cinco cêntimos) a quantia devida à autora a título de juros remuneratórios sobre o capital de €139.392,69 e desde 1 de outubro de 2002 até 31 de dezembro de 2014; e
b) condenar o réu Domingos Freitas de Sousa a pagar à autora a referida quantia de €88.252,95 (oitenta e oito mil, duzentos e cinquenta e dois euros e noventa e cinco cêntimos), acrescida das quantias que se forem vencendo, calculadas às taxas anuais da Euribor, acrescidas de 3%, sobre o capital de €139.392,69 e até integral e efetivo pagamento deste.
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C) Novamente inconformado com a decisão, veio o réu Domingos Freitas de Sousa interpor recurso per saltum para o STJ, o qual foi admitido como sendo de revista, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo (fls. 583).
Remetidos os autos para o STJ, aí foi proferido douta decisão a fls. 587-588, onde se indeferiu o requerimento de subida do recurso per saltum e foi determinada a remessa dos autos para este Tribunal da Relação de Guimarães, a fim de aqui ser processado.
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Nas alegações de recurso do apelante Domingos Freitas de Sousa, são formuladas as seguintes conclusões:
1. Por douta sentença de 01 de julho de 2013, foi o recorrente condenado, para além do mais que ora não está em causa, a satisfazer à recorrida a quantia de €139.392,69 e juros remuneratórios, efetivamente obtidos pelo recorrente através dessa quantia, desde o dia 01 de outubro de 2002.
2. Nessa mesma douta Sentença decidiu-se que a condenação teve por fundamento de direito o disposto no artigo 1271º do CCiv, mas apenas no seu primeiro segmento, ou seja, satisfação dos juros efetivamente produzidos, o que foi expressamente dito e reafirmado, assim tendo ficado inequivocamente excluída a condenação ao abrigo do segundo segmento do aludido preceito, ou seja, nos juros que um proprietário diligente poderia ter obtido.
3. Ainda na mesma Sentença foi considerado que a matéria provada não permitiu proceder desde logo ao cálculo de tais juros, e, por isso, decidido que seriam eles a liquidar posteriormente.
4. Com vista a tal liquidação, deduziu a recorrida correspondente Incidente Autónomo, em que alegou factos tendentes à liquidação, não dos juros remuneratórios efetivamente produzidos, mas sim daqueles que um proprietário diligente obteria.
5. Além disso esse requerimento não continha, como conclusão, o pedido de quantia certa.
6. Notificado do douto Requerimento Inicial o recorrente, verificando não só pedir a recorrida coisa a que não tinha direito, como omitir tal requerimento o pedido, não contestou, por ter tido como evidente, tanto a falta de fundamento jurídico para a sua pretensão, como a ineptidão do mesmo requerimento.
7. Face ao Requerimento Inicial e à falta de contestação, decidiu o Digno Tribunal dar como provados os factos alegados pela recorrida, mas, simultaneamente, verificou que aquele requerimento omitia pedido de quantia certa e afirmou que isso inviabilizaria a liquidação, pelo que convidou a recorrida a sanar a omissão, o que foi feito com expressa invocação do artigo 6º nº 2 do CPCiv, que ordena que o tribunal oficiosamente promova o suprimento da falta de pressupostos processuais ou, “quando a sanação dependa de ato a praticar pelas partes convidando estas a praticá-lo”.
8. Tendo a recorrida produzido requerimento pelo qual sanou a vício, dentro dos 10 dias subsequentes à sua notificação desse requerimento, o recorrente deu entrada da sua contestação, na qual alegou a ineptidão do Requerimento Inicial, com a consequente nulidade do processado até à sanação do vício causador da ineptidão, alegou a consequente tempestividade da contestação e, além disso, alegou a inexistência do direito cuja liquidação a recorrida pretendia e, cautelarmente, impugnou o artigo da nova peça elaborado na sequência do convite à sanação do vício, impugnação esta com a expressa invocação do disposto no artigo 580º nº 5 do CPCiv.
9. A recorrida veio aos autos pugnar pela extemporaneidade da contestação, ao que o recorrente respondeu mantendo ser ela tempestiva e renovando a alegação de ineptidão do RI e a inexistência do direito à pretendida liquidação, diferente da que foi julgado que fosse feita, circunstâncias estas que, sendo de conhecimento oficioso, poderiam ser alegadas até à decisão final, então ainda não prolatada.
10. Consoante alegado foi na parte expositiva destas alegações, a petição de liquidação em que omitido o pedido de liquidação em quantia certa é inepta, ineptidão que foi alegada e, além disso, é de conhecimento oficioso – artigos 359º nº 1, 186º nº 2, a) e 200º nº 2, todos do CPCiv,
11. ineptidão acarretadora da nulidade de todo o processado até que fosse suprido o vício dela gerador – artigo 186º nº 1 do CPCiv.
12. Face a essa ineptidão e suprimento da correspondente nulidade, que se considera notificada ao recorrente aos 06 de março de 2015, a contestação dentro dos dez dias subsequentes à notificação é admissível e tempestiva.
13. Ao decidir de modo contrário, a douta Decisão recorrida violou os preceitos mencionados nas conclusões 10. e 11. supra
14. Ainda que se entendesse que não ocorria a ineptidão, sempre haveria que julgar-se admitida a impugnação que foi efetuada aos artigos do requerimento de aperfeiçoamento do RI, pois que tal é admitido pelo disposto no artigo 590º nº 5 e foi tempestivamente feito pelo recorrente.
15. Assim, haveria que ter-se por impugnado o constante nos artigos 2º e 3º, e nomeadamente neste artigo 3º, do douto requerimento de aperfeiçoamento, e julgada controvertida a respetiva matéria, sujeita, consequentemente, a prova.
16. Decidindo de modo diferente, dando como provado factos tempestivamente impugnados nos termos do citado artigo 590º nº 5, do CPCivil, a douta Decisão recorrida violou este preceito, assim como violou o disposto no artigo 596º nº 1 do mesmo Código, ao não proferir o despacho previsto neste preceito, e, por isso, ao não enunciar, como tema de prova, os factos constantes do requerimento de aperfeiçoamento que foram impugnados.
SEM PRESCINDIR, POR FIM E SEM QUE SEJA O MENOS IMPORTANTE (the last but not the least)
17. Radica na douta Sentença de 01 de julho de 2013, proferida nos autos principais, o direito a que, neste processo de liquidação, a recorrida se arroga.
18. Tal Sentença, no que a liquidação de direitos concerne, confere à recorrida o de liquidar “os frutos civis produzidos pelo capital de €133.392,69, a contar de 01.10.2002, e não os possíveis para um diligente proprietário; ou seja, os juros “que foram” e não os que “podiam ter sido”.
19. O assim julgado e decidido impõe-se dentro e fora do processo – artigo 619º nº 1 do CPCiv.
20. Não pode, por isso, a recorrida, através da liquidação, pretender o cálculo do juro possível, em vez do cálculo do juro realmente obtido, pois que isso é pretender algo cujo direito lhe não foi reconhecido, antes expressamente afastado.
21. Se não pode pretender tal, também tal lhe não pode ser concedido, sob pena de violação do disposto naquele nº 1 do artigo 619º do CPCiv.
22. Concedendo-o, ou seja, julgando o douto Despacho recorrido que a quantia a liquidar ao abrigo da douta Sentença é a dos juros possíveis, e não os efetivamente produzidos pelo capital de €139.392,69, saiu violada a disposição citada na conclusão anterior.
23. Deve, pois, salvo o devido respeito, ser conhecida e julgada a nulidade do douto Despacho recorrido e, quando assim se não entenda, julgado verificada a nulidade do processo, por ineptidão do douto Requerimento Inicial, apenas sanada com o seu aperfeiçoamento, e, consequentemente julgada tempestiva a contestação oferecida pelo recorrente, julgando-se também, por isso, impugnada a liquidação alegada pela recorrida e, de qualquer modo, improcedente o pedido de liquidação, por inexistência do concreto direito a que, através dela, a recorrida se arrogou e pediu lhe fosse reconhecido.
Termina entendendo dever ser dado provimento, ao recurso.
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Pela apelada Laura de Freitas Vieira foi apresentada resposta onde entende dever ser confirmada, na íntegra a douta sentença recorrida.
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C) Foram colhidos os vistos legais.
D) As questões a decidir neste recurso são as de saber:
1) Quais os juros que estão em causa na liquidação;
2) Se era lícito ao apelante, na liquidação, beneficiar da possibilidade de apresentação de contestação que não deduziu tempestivamente;
3) Se deverá ser alterada a decisão jurídica da causa.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
A) Considera-se apurada a seguinte matéria de facto:
I. Factos Provados
1. Nos presentes autos, por sentença proferida em 1 de julho de 2013 e já transitada em julgado, foi o requerido, Domingos Freitas de Sousa, condenado a pagar à requerente, Laura de Freitas Vieira: 1. A quantia de € 139.392,69 inerente ao capital; 2. Acrescida do valor dos respetivos juros remuneratórios - a liquidar posteriormente - desde 1.10.2002 até efetiva e integral entrega do capital; 3. E os juros moratórios incidentes sobre o capital, às taxas entretanto em vigor, desde 1.10.2002 até efetivo e integral pagamento.
2. Tal decisão já transitou em julgado.
3. Atento o valor do capital, a requerente poderia facilmente conseguir junto da banca as taxas anuais da Euribor, desde o ano de 2002 e seguintes, e somar uma taxa de 3%, obtendo:
4. Ano de 2002: 3,49% + 3% = 6,49% x 139.392,69 = € 2.261,64 (de 1.10.2002 até 31.12.2002);
5. Ano de 2003: 2,33% + 3% = 5,33% x 139.392,69 = € 7.429,63 (de 1.01.2003 até 31.12.2003);
6. Ano de 2004: 2,27% + 3% = 5,27% x 139.392,69 = € 7.345,99 (de 1.01.2004 até 31.12.2004);
7. Ano de 2005: 2,33% + 3% = 5,33% x 139.392,69 = € 7.429,63 (de 1.01.2005 até 31.12.2005);
8. Ano de 2006: 3,44% + 3% = 5,44% x 139.392,69 = € 7.582,96 (de 1.01.2006 até 31.12.2006);
9. Ano de 2007: 4,44% + 3% = 7,44% x 139.392,69 = € 10.370,81 (de 1.01.2007 até 31.12.2007);
10. Ano de 2008: 4,82% + 3% = 7,82% x 139.392,69 = € 10.900,50 (de 1.01.2008 até 31.12.2008);
11. no de 2009: 1,61% + 3% = 4,61% x 139.392,69 = € 6.426,00 (de 1.01.2009 até 31.12.2009);
12. Ano de 2010: 1,35% + 3% = 4,35% x 139.392,69 = € 6.063,58 (de 1.01.2010 até 31.12.2010);
13. Ano de 2011: 2.00% + 3% = 5,00% x 139.392,69 = € 6.969,63 (de 1.01.2011 até 31.12.2011);
14. Ano de 2012: 1,10% + 3% = 4,10% x 139.392,69 = € 5.715,10 (de 1.01.2012 até 31.12.2012);
15. Ano de 2013: 0,53% + 3% = 3,53% x 139.392,69 = € 4.920,56 (de 1.01.2013 até 31.12.2013);
16. Ano de 2014: 0,47% + 3% = 3,47% x 139.392,69 = € 4.836,92 (de 1.01.2014 até 31.12.2014.
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B) O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, não podendo o tribunal conhecer de outras questões, que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras (artigos 608º nº 2, 635º nº 2 e 3 e 639º nº 1 e 2, todos do NCPC).
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C) Refere o apelante que a liquidação só poderia ter por objeto o cálculo dos juros concretamente produzidos pelo capital, e não aqueles que dele um diligente proprietário poderia ter obtido, pois que esta hipótese foi expressamente excluída pela douta Sentença, cálculo aquele que, como se tem por evidente, teria de resultar da prova que fosse feita quanto a esses juros concretamente obtidos através do capital.
Mas não tem razão.
Desde logo terá de se ter em conta que que aquilo que consta da sentença proferida sobre o fundo da questão refere, a fls. 133, que, “sendo o réu considerado possuidor de má-fé deve restituir os frutos que a coisa produziu até ao termo da posse e responde, além disso, pelo valor daqueles que um proprietário diligente poderia ter obtido…”.
E continua afirmando que o réu tem de restituir os frutos civis produzidos até efetiva e integral entrega do capital devido à autora e, para além disso, são devidos os juros moratórios incidentes sobre €139.392,69, desde 01/10/2002.
E a conclusão lógica resulta da parte decisória da sentença, acima transcrita onde se determinou a condenação do réu a pagar à autora:
1. A quantia de €139.392,69 inerentes ao capital;
2. Acrescida do valor dos respetivos juros remuneratórios – a liquidar posteriormente - desde 1.10.2002 até efetiva e integral entrega do capital; e
3. Os juros moratórios incidentes sobre o capital, às taxas entretanto em vigor, desde 1.10.2002 até efetivo e integral pagamento.
Os juros remuneratórios representam uma contraprestação onerosa pela disponibilidade do capital, enquanto os moratórios são devidos pela não restituição do capital no momento próprio – cfr Manual dos Juros, F. Correia das Neves, 3ª Edição, páginas 28-29 – pelo que se trata de duas realidades distintas que foram apreciadas na sentença em questão.
Refere depois o apelante que “face ao ocorrido na tramitação da liquidação, com o requerimento inicial e a falta de contestação, o tribunal “deu como provados” os factos alegados pela recorrida mas simultaneamente verificou que aquele requerimento omitia pedido de quantia certa e afirmou que isso inviabilizaria a liquidação, pelo que convidou a recorrida a sanar a omissão, o que foi feito com expressa invocação do artigo 6º nº 2 do CPCiv, que ordena que o tribunal oficiosamente promova o suprimento da falta de pressupostos processuais ou, “quando a sanação dependa de ato a praticar pelas partes convidando estas a praticá-lo”.
E, continua o apelante, “tendo a recorrida produzido requerimento pelo qual sanou a vício, dentro dos 10 dias subsequentes à sua notificação desse requerimento, o recorrente deu entrada da sua contestação, na qual alegou a ineptidão do requerimento Inicial, com a consequente nulidade do processado até à sanação do vício causador da ineptidão, alegou a consequente tempestividade da contestação e, além disso, alegou a inexistência do direito cuja liquidação a recorrida pretendia e, cautelarmente, impugnou o artigo da nova peça elaborado na sequência do convite à sanação do vício, impugnação esta com a expressa invocação do disposto no artigo 580º nº 5 do CPCiv.”
Vejamos.
Efetivamente, na sequência da apresentação do requerimento inicial de liquidação, o réu não apresentou contestação, pelo que foi proferido despacho que considerou confessados os factos alegados pela autora, despacho esse que, aliás, transitou em julgado e, só na sequência da prolação do despacho de fls. 512 foi a autora convidada a completar tal requerimento indicando quantia certa no pedido de liquidação, nomeadamente, a que resulte da aplicação das taxas de juro alegadas, sob pena de o mesmo ser julgado nulo, por ineptidão.
A autora, aceitando o convite, apresentou o articulado de fls. 515-517, onde concretizou no pedido de liquidação a quantia certa, conforme resulta do referido articulado.
O que era permitido em face deste novo articulado ao réu era apenas e tão-só pronunciar-se sobre a parte completada do novo requerimento, do pedido e não aproveitar para apresentar uma contestação sobre todo o requerimento inicial (retificado), uma vez que por decisão transitada em julgado, foram considerados provados os factos constantes do 1º requerimento inicial.
Se o réu e ora apelante pretendia apresentar contestação, deveria tê-lo feito tempestivamente relativamente ao 1º requerimento apresentado, não o tendo feito, perdeu o direito de se pronunciar sobre aquela peça processual, só lhe sendo lícito, quanto ao segundo, pronunciar-se sobre a matéria relativamente à qual a autora foi convidada a alterar, isto é sobre o pedido, não havendo lugar a qualquer repristinação do direito a pronunciar-se sobre a matéria de facto considerada como provada, por falta de contestação daquele articulado.
E nem se venha argumentar que sendo a 1ª petição inepta (artigo 186º nº 1 alínea a) Código de Processo Civil) é nulo tudo quanto tiver sido processado a partir do requerimento inicial da liquidação.
Não que a conclusão esteja errada (artigo 186º nº 1 NCPC), mas a premissa é que não se verifica, uma vez que o 1º requerimento inicial não era inepto, ao contrário do referido no despacho de fls. 512, nem por força do artigo 186º nº 2 alínea b) do NCPC, como entendeu o tribunal a quo, nem por efeito da alínea a) do nº 2 do mesmo artigo e diploma, como entendeu o apelante e réu, uma vez que, verdadeiramente, estava em causa apenas e tão só a finalização de um cálculo aritmético, em que todos os elementos constavam já do articulado, do pedido.
E se é certo que tal omissão deveria ser corrigida pela autora, não se pode pretender que o requerimento fosse inepto.
Pelo exposto, não colhe o raciocínio do apelante.
E menos ainda poderia colher uma invocação de uma ineptidão na contestação ao 2º requerimento que veio corrigir o anterior, quando, no prazo em que este poderia ser impugnado, nada se fez ou se disse, pelo que sibi imputet.
Não colhe, por isso a pretensão do apelante, não lhe sendo lícito vir agora discutir questões, cuja oportunidade se mostra ultrapassada.
Por todo o exposto e sem necessidade de ulteriores considerações, tanto basta para que se confirme a douta sentença recorrida e se julgue improcedente a apelação.
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D) Em conclusão:
1) Os juros remuneratórios representam uma contraprestação onerosa pela disponibilidade do capital, enquanto os moratórios são devidos pela não restituição do capital no momento próprio;
2) Não se tendo contestado um requerimento inicial de liquidação, em que se consideraram confessados os factos alegados, não é lícito à parte vir apresentar contestação a um requerimento apresentado na sequência de um convite a completar o pedido de liquidação em quantia certa, dessa forma pretendendo impugnar factos já dados como confessados, sem prejuízo de poder contraditar a matéria apresentada, objeto do convite, isto é, a concretização do pedido.
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III. DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e confirmar a douta sentença recorrida.
Custas pelo apelante.
Notifique.
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Guimarães, 09/06/2016