Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4101/18.0T8VNF-A.G1
Relator: FERNANDA PROENÇA
Descritores: SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE PARTILHA
TÍTULO EXECUTIVO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/23/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1 – A sentença homologatória de partilha pode constituir título executivo, com vista à efectivação dos direitos dos respectivos intervenientes, dentro dos limites do que tenha sido discutido e decidido no inventário.

2 – Não emergindo do título dado à execução que determinada questão tenha sido debatida e decidida no inventário, daí resulta a inexequibilidade da correspondente pretensão.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório.

R. F. e M. J., executados, vieram intentar embargos de executado contra M. F., I. R. e O. R., exequentes, no Juízo de Execuções de Vila Nova de Famalicão, Juiz 3, invocando a inexequibilidade do título executivo, o erro na forma de processo, o caso julgado e a má-fé dos embargados/exequentes.
Regularmente notificados os embargados/exequentes contestaram, reiterando o já afirmado no requerimento executivo, e invocando a má-fé dos embargantes/executados.
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Frustrada a conciliação das partes, foi proferido despacho saneador – sentença, com o seguinte dispositivo:

“8. – Decisão:
Pelo exposto, decido:
8.1.- julgar improcedentes os embargos à execução e, em consequência, determino o prosseguimento da execução quanto aos ora embargantes.
8.2.- julgar improcedentes os pedido de condenação das partes como litigantes de má-fé.
8.3.- Custas pela executados /embargantes.
8.4.- Notifique.
8.5- Informe a AE do teor da presente sentença.”
*
Inconformados com esta decisão, dela interpuseram recurso os embargantes (executados).

A embargante R. F., a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem):

“Conclusões
I A Douta Sentença recorrida não se encontra devidamente fundamentada;
II Violando, deste modo, a lei.
III Existe no Banco ... a conta nº 0003....... titulada por P. T., falecida em 12/05/2009 e pelos filhos desta, R. F., M. J. e I. R..
IV Não constando como titular desta conta, a exequente M. F., filha daquela P. T..
V Correu o respectivo processo de inventário pelo Tribunal de Barcelos com o nº 537/14.4T8BCL por morte de P. T. que cumulou o processo de inventário nº 472/2000 do 4º Juízo cível do Tribunal Judicial de Barcelos, por morte de A. F., marido de P. T. e pai de exequente e executados e cumulou também o processo de inventário 3079/10.3TBBCL do 4º Juízo Cível extinto do Tribunal Judicial de Barcelos.
VI Quando faleceu a P. T., aquela conta nº 0003....... do Banco ..., tinha um saldo total de 33.771,00 €.
VII Assim, foi relacionado naqueles autos de inventário por morte de P. T., a quantia de 6.754,20 €.
VIII Tal montante foi assim relacionado sob a verba nº 48, após diversas reclamações, porque assim foi decidido, conforme consta a fls. 10vº do documento nº 1 (certidão judicial) que aqui se dá por integralmente reproduzido.
IX Tal montante de 6.754,20€ foi adjudicado a todos os interessados na proporção dos respetivos quinhões, conforme consta do respectivo mapa de partilha a fls. 18 que aqui se dá por integralmente reproduzido.
X A interessada e aqui exequente M. F., pretende que todo o dinheiro existente naquela conta também lhe seja adjudicado, quando na verdade ela apenas e só tem direito a uma quinta parte de 6.754,20 €, uma vez que os herdeiros são cinco.
XI Isto é o que resulta do decidido a fls. 10 vº dos autos de inventário junto como documento nº 1.
XII A aqui Recorrente, após ter recebido uma notificação dos exequentes, compareceu no dia 16 de Agosto de 2017, no Banco ..., a fim de proceder ao levantamento do dinheiro existente na conta supra referida com os demais interessados.
XIII Só que, a exequente M. F., pôs como condição receber um quinto do dinheiro todo existente, quando na verdade ela apenas e só tem direito a um quinto daquele montante de 6.754,20€, valor este correspondente ao dinheiro da sua mãe.
XIV Deste modo, o dinheiro não foi levantado porque a exequente M. F. exigia mais que o que lhe é devido.
XV Por isso, não é a aqui Recorrente responsável pelo não levantamento do respetivo dinheiro existente na conta do Banco ... mas a exequente M. F..
XVI Assim, não têm os exequentes direito a serem indemnizados pela Recorrente, que, aliás, até se prontificou a assinar tal levantamento desde que seja feito conforme o determinado.
XVII Uma vez que a Recorrente não é devedora aos Recorridos de qualquer importância monetária;
XVIII E, uma vez que, a Sentença dos autos que homologa a partilha por morte da sua mãe P. T., não condena a Recorrente a pagar seja o que for aos Recorridos, não têm estes motivo para intentar a presente execução.
XIX Pelo que não é este o processo próprio para os Recorridos obterem aquilo que pretendem.

Nestes termos e noutros melhores de direito que V. Exas. Mui doutamente suprirão, deverá a Douta Sentença Recorrida ser substituída por uma outra que julgue os embargos procedentes por provados extinguindo a respetiva execução, como é de Inteira Justiça.”
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O embargante M. J., a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que também se transcrevem):

“Em Conclusão:
1- Todas as execuções devem ter por base um título executivo e um pedido correspondente ao título.
2-Os títulos executivos invocados pelos exequentes são duas sentenças homologatórias proferidas em processos de inventário judicial.
3-Os pedidos executivos são:
i) Reconhecerem que o saldo atual da conta nº ...... do Banco ..., pertence a todos os herdeiros (exequentes e executados) em partes iguais, nos termos das sentenças proferidas e que ora servem de título executivo;
ii) Incluírem, no prazo de vinte dias, como co titular da conta bancária nº 0003....... do Banco ..., a exequente M. F. nos termos fixados na ata de conferência de interessados datada de 19/09/2002, devendo para o efeito os executados apor as suas assinaturas em toda a documentação bancária necessária para o efeito;
iii) Ser autorizado o levantamento por cada um dos herdeiros individualmente e sem necessidade de quaisquer assinaturas obrigatórias de quaisquer outro titular em particular, do valor correspondente a cada um, nomeadamente de uma quinta parte, do saldo atual existente na conta bancária nº 0003. ...... do Banco ...;
iv) Ser a instituição de crédito banco … – filial ..., em Barcelos, onde se encontra sedeada a conta bancária supra referenciada, notificada a fim de dar cumprimento ao teor da sentença a proferir nos presentes autos.
Não obstante e sem prescindir, caso os executados incorram em mora no cumprimento da prestação de facto em falta, requerem os exequentes que nos termos do artº 868, por remissão do artº 874º, ambos do Cod. Proc. Civil, seja fixada uma sanção pecuniária compulsória de valor não inferior a €60,00 por cada dia de atraso no cumprimento da referida prestação de facto;
a)Mais requerem os exequentes que os executados sejam condenados solidariamente no pagamento aos exequentes em indemnização não inferior a € 2.000,00 pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelos exequentes e decorrentes da privação do uso e acesso aos valores que lhes são devidos por direito, em virtude de os executados se recusarem a apor as suas assinaturas na documentação bancária necessária ao levantamento do valor constante na conta identificada supra e bem assim não aceitarem dividir tal valor em partes iguais com os exequentes e nesta medida não cumprirem as sentenças homologadas e já transitadas em julgado;
b)Requerem ainda que sejam os executados condenados no pagamento de juros de mora vencidos e vincendos até efectivo e integral cumprimento;
c)Não obstante, caso não seja cumprida a obrigação de facto devida pelos executado, deverá a presente ação executiva ser convertida em execução para pagamento de quantia certa, nos termos dos artºs 869º e 867º ambos do CPC, com as devidas consequências legais.
d)Deverão ainda acrescer às quantias peticionada, as quantias relativas a custas, procuradoria e agente de execução.”
3-O tribunal recorrido deu como provados factos que não podia, fosse porque não consubstanciam “factos”, mas meras conclusões de direito ou meras ilações e afirmações dos exequentes e que foram impugnadas.
4- O tribunal não podia aderir, simplesmente, às alegações (nem sempre factuais) vertidas no requerimento executivo apresentado. A fundamentação para a matéria de facto provada não pode resultar apenas dos documentos juntos e do teor da petição de embargos.
5- A matéria descrita nos pontos 5, 6, 9, 10, 11, 12, 13, 14 e 17 dos “factos provados”, deve ser considerada não provada, seja por não ser passível de prova, seja por nenhuma prova existir que fundamente tal prova.
6-Não existe título executivo para os pedidos efectuados pelos exequentes, ocorrendo, assim, a inexistência ou inexequibilidade do título executivo.
7-Nenhuma das sentenças invocadas como títulos executivos pode sustentar os pedidos efectuados pelos exequentes.
8-Se o que se pede na execução não resulta, clara e individualmente, das sentenças proferidas nos autos de inventário, ou mesmo nem resulta das sentenças, só podemos concluir que não existe sentença como título executivo (daí falar-se em inexistência).
9-Os títulos juntos são inexequíveis para os pedidos efectuados, não existindo uma obrigação certa, líquida e exigível, nos termos do artº 713º do CPC.
10-As sentenças dadas à execução existem fisicamente, mas nenhuma dessas sentenças condena o executado no que é pedido do requerimento executivo: seja no reconhecimento de direitos, seja no pagamento de qualquer quantia ou juros.
11-Cremos existir um erro na forma de processo.
12-Resulta até do requerimento executivo e da forma como os exequentes alegam e, bem assim, do pedido de condenação que afinal fazem (nomeadamente o reconhecimento de direitos e de condenação em danos patrimoniais e morais) que a presente execução consubstancia não uma acção executiva, mas sim uma verdadeira acção declarativa de condenação.
13-A forma do processo adequada aos pedidos efectuados pelos exequentes é a forma declarativa de condenação e não a forma executiva.

Aliás,

14-É, de todo, inviável, peticionar-se numa acção executiva a condenação dos executados em danos patrimoniais e não patrimoniais, como será inviável pedir-se o reconhecimento de direitos e que entidades terceiras (vg. o Banco ...) sejam notificadas para dar cumprimento à sentença.
15-Os exequentes não possuem títulos (sentenças) que sustentem os pedidos que formulam e, das duas uma: ou inexiste título ou o título é inexequível.
Finalmente,
16-A questão da propriedade do dinheiro ora reclamada pela exequente M. F., já foi decidida, por decisão transitada em julgado e proferida no âmbito do processo 537/14.4T8BCL, onde foram efectuadas as partilhas dos bens deixados pelo decesso do pai e mãe de exequentes e executados.
17-Aí se decidiu que o único valor a partilhar entre exequentes e executados era o valor relacionado pela C.C., isto é:
“A quantia de seis mil seiscentos e cinquenta e quatro euros e vinte cêntimos, depositada na conta nº 0003....... do Banco ..., correspondente a uma quinta parte do total depositado nessa conta, pois que da mesma fazem parte a inventariada e mais quatro titulares.”.
18-Foi esta a quantia relacionada e foi esta a quantia partilhada, ficando a pertencer a todos os herdeiros na proporção do respectivo quinhão (1/5 para cada um da verba 48).
19-Tal decisão impede que sobre tal questão seja proferida nova sentença, sob pena de ofendermos a autoridade de caso julgado.
20-O embargante invocou a excepção de caso julgado que o tribunal “a quo” nem sequer apreciou.
21-A sentença recorrida não apreciou os argumentos aduzidos em sede de embargos pecando por clara omissão de pronúncia.
22-A sentença recorrida manda prosseguir a execução, nos termos do pedido exequendo efectuado, sem que para tal exista título executivo.
23-O embargante, apesar de saber que os embargos não tinham efeito suspensivo, nem sequer compreende porque lhe foi penhorado o saldo da conta bancária (no valor de € 4.500,00, tendo já o Sr. A.E. na sua conta 3/5 do valor que estava depositado na conta cujo saldo foi partilhado).
24-A sentença recorrida é nula, seja por falta de fundamentação de facto e de direito, seja porque o Juiz não se pronunciou sobre questões que devia apreciar, violando assim o vertido no artº 615º nº1 al. b) e d) do C.P.C.
25-A sentença recorrida, ao negar provimento aos embargos, violou, além do mais, o disposto no artº 713º e 729º al. a), e), f) do CPC.
26-Não estando, pois, certificada a obrigação exequenda no título dado à execução, conclui-se pela sua inexequibilidade, sendo este vício insuprível e determinando a extinção da execução nos termos dos arts. 726º, nº 2, alínea a), e 734º, nº 1, do CPC.
27-Deverá ser revogada a sentença proferida e substituída por outra que julgue os embargos procedentes e determine a extinção da execução.

Termos em que, deverá a sentença proferida ser revogada e substituída por outra que julgue os embargos procedentes e ordena a extinção da execução, só assim de fazendo justiça.
*
Os recorridos contra-alegaram, terminando quanto ao recurso interposto pela embargante R. F., com as seguintes conclusões:
“Conclusões

I. O presente recurso não cumpre dos requisitos previstos no art. 640º do CPC.
II. A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que a recorrente especifique os concretos meios probatórios, constantes do processo que impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados, exige que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, documental, o que a recorrente não fez, limitando a tecer considerações, algumas delas infames e sem qualquer suporte fáctico ou legal.
III. Pelo que deverá o presente recurso ser rejeitado.
IV. A douta sentença está devidamente fundamentada e não incorre em qualquer erro na apreciação da matéria de facto nem na aplicação do direito.
V. A sentença ora recorrida, faz expressa menção quer à causa de pedir da recorrente como dos demais intervenientes processuais.
VI. Fazendo-o de forma clara, expressa e taxativa.
VII. O tribunal a quo baseou a sua convicção relativamente aos factos dados como provados, no teor dos documentos juntos aos autos de execução e de embargos e ainda na inexistência de qualquer prova quanto aos demais factos, dados como não provados.
VIII. Documentos esses cuja veracidade e validade jamais foi colocada em causa pela recorrente.
IX. Nas sentenças ora executadas, o que pretenderam os exequentes foi uma prestação de facto para cumprimento de uma obrigação infungível.
X. Prestação essa cuja interpelação para cumprimento foi efetuada por notificação judicial avulsa junta à execução, e que até á data não se encontra cumprida por única e exclusiva responsabilidade dos recorrentes R. F. e M. J..
XI. Foram dadas à execução duas sentenças homologatórias de partilha, não cumpridas (em parte) e já transitadas em julgado.
XII. Em face do incumprimento da prestação de facto a execução para prestação de facto converteu-se em execução para pagamento de quantia certa, nos termos previstos e permitidos por lei.
XIII. A recorrente pretende única e exclusivamente voltar a discutir em sede executiva o já decidido e por esta concordado em sede de anteriores processos, já transitados em julgado e no âmbito dos quais teve esta completa e plena intervenção.
XIV. Simplesmente e como bem refere a douta sentença ora recorrida, “…é indiscutível que a ainda não repartição do dinheiro e a ainda não inclusão da exequente/recorrida M. F. na titularidade da conta bancaria é algo que ainda importará, na perspetiva dos embargantes, relegar para momento futuro incerto”.
XV. Foi nítido para o tribunal a quo, como o é para qualquer pessoa capaz, que os recorrentes o que pretendem é infinitamente não cumprir as sentenças dadas à execução, como forma de alimentarem um conflito pessoal/familiar para o qual legal e moralmente não têm qualquer fundamento.
XVI. A recorrente, do que decorre das suas alegações, pretende continuar a impedir que os recorridos tomem posse de algo que também lhes pertente por direito e na mesma medida, já que todos são filhos do mesmo pai e da mesma mãe.
XVII. Nos termos do decidido em conferencia preparatória no âmbito do processo nº 472/2000 todos os bens contantes da relação de bens daqueles autos, com exceção da verba nº 8 que foi eliminada por acordo de todos, ficariam em comum e na proporção dos respetivos quinhões pelos preços constantes da relação de bens,
XVIII. Sendo que, o dinheiro das verbas nº 1 a 7 daquela mesma relação, deveria ter sido depositado em contas tituladas por TODOS os filhos do de cujus.
XIX. Conta essa que a recorrente e os recorridos acordaram deveria ser movimentada com a assinatura obrigatória da aqui recorrida I. R., acompanhada de outros titulares.
XX. Tal decisão NUNCA foi integralmente cumprida.
XXI. Pois que, efetivamente foi aberta uma conta onde foram depositados dinheiros derivados do processo nº 472/2000, mas nunca titularam a mesma TODOS os filhos do de cujus.
XXII. Ou seja, a recorrida M. F. nunca titulou aquela ou qualquer outra conta conjuntamente com os demais irmãos.
XXIII. Nem tão pouco até esta data, os recorridos receberam quaisquer valores monetários de qualquer uma das partilhas por morte de seus pais.
XXIV. No âmbito do processo nº 537/14.4T8BCL foram entregues aos herdeiros e na proporção dos respetivos quinhões, os bens imóveis e móveis, com exceção do valor existente na conta nº 0003....... do Banco ....
XXV. Tal não ocorreu até à data, uma vez que os recorrentes R. F. e M. J. se recusam a entregar aos recorridos tais valores em igual proporção e enquanto filhos dos mesmos pai e mãe.
XXVI. Alegam para o efeito que, pelo facto da recorrida M. F. não constar da conta bancaria onde se encontra depositado o dinheiro do processo nº 472/2000, esta apenas tem “direito” a receber o que se partilhou no processo 537/14.4T8BCL.
XXVII. Recusando-se em consequência, a entregar à recorrida M. F. o valor a que esta tem direito por morte de A. F., seu pai.
XXVIII. E faz-lo com o argumento falso de que esta não sendo titular da respetiva conta bancaria não tem de receber o mesmo que os demais.
XXIX. Tal situação apenas aos executados se deve, ou pelo menos á cabeça de casal no processo 537/14.4T9BCL, a aqui recorrente, que deveria ter pelo menos procedido em conformidade com o que anteriormente já estava decidido em sede de processo nº 472/2000.
XXX. Todavia, além de não o ter feito no âmbito dos poderes que na qualidade de cabeça de casal se impunha, ainda se recusa a sanar tal falha alegando que a sua irmã, aqui recorrida M. F., não tem os mesmos direitos que os demais no que aos valores contantes da conta bancaria supra referida se impõe.
XXXI. Se a recorrida M. F. não é titular daquela conta tal deve-se a razões que esta desconhece e/ou por culpa da cabeça de casal, aqui recorrida, que como tal deveria ter procedido a essa devida inclusão.
XXXII. O que não fez e manifestamente se recusa a fazer.
XXXIII. E em face do exposto, todos os exequentes/recorridos, encontram-se ainda hoje sem tomar posse dos valores constantes da conta bancaria sedeada no Banco ..., e que lhes são devidos.

Pelo exposto, deve a douta decisão do Tribunal a quo ser mantida por não padecer de qualquer vÍcio ou falta de fundamentação e, consequentemente, deve ser negado provimento ao recurso apresentado pela embargante/Recorrente R. F..
Decidindo o Venerando Tribunal nestes termos estará a fazer a habitual Justiça!
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Já quanto ao recurso interposto pelo embargante M. J., terminaram com as seguintes conclusões:
“Conclusões

I. O presente recurso não cumpre dos requisitos previstos no art. 640º do CPC.
II. O recorrente em sede de alegações limita-se a tecer considerações a respeito não só as intenções dos exequentes/recorridos, como do próprio juiz à quo.
III. A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique os concretos meios probatórios, constantes do processo que impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados, exige que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, documental e/ou testemunhal, o que o recorrente não fez, limitando a tecer considerações, algumas delas lamentáveis e sem qualquer suporte fáctico ou legal.
IV. Não cumpre aquele ónus o recorrente que, nas alegações e nas conclusões, divide a matéria de facto impugnada em vários blocos de factos e não indica sequer os meios de prova relativamente a cada um deles, antes omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna.
V. Pelo que deverá o presente recurso ser rejeitado.
VI. Não obstante, a douta sentença ora recorrida está devidamente fundamentada e não incorre em qualquer erro na apreciação da matéria de facto nem na aplicação do direito.
VII. A sentença ora recorrida, faz expressa menção quer à causa de pedir do recorrente como dos demais intervenientes processuais.
VIII. Fazendo-o de forma clara, expressa e taxativa e em perfeita consonância com o constante de toda a prova documental junta aos autos e incerta em duas sentenças judiciais.
IX. Sentenças essas exequíveis e que valem como título executivo nos termos da lei estando tal decisão devidamente fundamentada em sede de sentença recorrida.
X. O tribunal a quo baseou a sua convicção relativamente aos factos dados como provados, no teor dos documentos juntos aos autos de execução e de embargos e ainda na inexistência de qualquer outra prova quanto aos demais factos, dados como não provados.
XI. Documentos esses cuja veracidade e validade jamais foi colocada em causa pelo recorrente.
XII. Nas sentenças ora executadas, o que pretenderam os exequentes foi a prestação de facto de uma obrigação infungível.
XIII. Prestação essa cuja interpelação para cumprimento foi efetuada por notificação judicial avulsa junta à execução, e que até á data não se encontra cumprida por única e exclusiva responsabilidade dos recorrentes R. F. e M. J..
XIV. Foram dadas à execução duas sentenças homologatórias de partilha, não cumpridas (em parte) e já transitadas em julgado.
XV. Em face do incumprimento da prestação de facto requerida a execução converteu-se em execução para pagamento de quantia certa, nos termos previstos e permitidos por lei.
XVI. O recorrente pretende única e exclusivamente voltar a discutir em sede executiva o já decidido e por este concordado em sede de anteriores processos, já transitados em julgado e no âmbito dos quais teve este completa e plena intervenção.
XVII. Simplesmente e como bem refere a douta sentença ora recorrida, “…é indiscutível que a ainda não repartição do dinheiro e a ainda não inclusão da exequente/recorrida M. F. na titularidade da conta bancaria é algo que ainda importará, na perspetiva dos embargantes, relegar para momento futuro incerto”.
XVIII. Foi nítido para o tribunal a quo, como o é para qualquer pessoa capaz, que o recorrente o que pretende é infinitamente não cumprir as sentenças dadas à execução, como forma de alimentar um conflito pessoal/familiar para o qual legal e moralmente não têm qualquer fundamento.
XIX. O recorrente, como decorre das suas alegações, pretende continuar a impedir que os recorridos tomem posse de algo que também lhes pertence por direito e na mesma medida, já que todos são filhos do mesmo pai e da mesma mãe.
XX. Nos termos do decidido em conferencia preparatória no âmbito do processo nº 472/2000 todos os bens contantes da relação de bens daqueles autos, com exceção da verba nº 8 que foi eliminada por acordo de todos, ficariam em comum e na proporção dos respetivos quinhões pelos preços constantes da relação de bens (Cfr. Doc. 22 e 23 junto com o RE),
XXI. Sendo que, o dinheiro das verbas nº 1 a 7 daquela mesma relação, deveria ter sido depositado em contas tituladas por TODOS os filhos do de cujus. (Cfr. Doc. 22 e 23 junto com o RE)
XXII. Conta essa que o recorrente e os recorridos acordaram deveria ser movimentada com a assinatura obrigatória da aqui recorrida I. R., acompanhada de outros titulares. (Cfr. Doc. 22 e 23 junto com o RE)
XXIII. Tal decisão NUNCA foi integralmente cumprida.
XXIV. Pois que, efetivamente foi aberta uma conta onde foram depositados dinheiros derivados do processo nº 472/2000, mas nunca titularam a mesma TODOS os filhos do de cujus.
XXV. Ou seja, a recorrida M. F. nunca titulou aquela ou qualquer outra conta conjuntamente com os demais irmãos/herdeiros.
XXVI. Nem tão pouco até esta data, os recorridos ou recorrentes receberam quaisquer valores monetários de qualquer uma das partilhas por morte de seus pais.
XXVII. No âmbito do processo nº 537/14.4T8BCL foram entregues aos herdeiros e na proporção dos respetivos quinhões, os bens imóveis e móveis, com exceção do valor existente na conta nº 0003....... do Banco ....
XXVIII. Tal não ocorreu até à data, uma vez que os recorrentes R. F. e M. J. se recusam apor as suas assinaturas em documentos bancários e bem assim a entregar aos recorridos tais valores em igual proporção, enquanto filhos dos mesmos pai e mãe.
XXIX. Alegam para o efeito que, pelo facto da recorrida M. F. não constar da conta bancaria onde se encontra depositado o dinheiro do processo nº 472/2000, esta apenas tem “direito” a receber o que se partilhou no processo 537/14.4T8BCL.
XXX. Recusando-se assim a entregar à recorrida M. F. o valor a que esta também tem direito por morte de A. F., seu pai e que até á data nunca recebeu.
XXXI. E faz-lo com o argumento falso de que esta não sendo titular da respetiva conta bancaria não tem de receber o mesmo que os demais.
XXXII. Tal situação apenas aos executados/recorrentes se deve, pois, que continuam a recusar-se a inserir a recorrida M. F. na conta bancaria suprarreferida e bem assim a cumprir o decidido em sede de processo nº 472/2000.
XXXIII. Se a recorrida M. F. não é titular daquela conta tal deve-se a razões que esta desconhece e por culpa dos recorrentes, que há muito e apesar de solicitado já deveriam ter procedido a essa devida inclusão.
XXXIV. O que o recorrente também não fez e manifestamente se recusa a fazer.
XXXV. E em face do exposto, todos os exequentes/recorridos, encontram-se ainda hoje sem tomar posse dos valores constantes da conta bancaria sedeada no Banco ..., e que lhes são devidos.
XXXVI. No que se refere ao ponto 23. das conclusões apresentadas pelo recorrente dizer apenas que este foi devidamente notificado pelo Sr. Agente de Execução da conta de custas e da penhora efetuada no saldo da conta bancaria do recorrente, não tendo até esta data reclamado ou se pronunciado a respeito e nos termos legais.
Pelo exposto, deve a douta decisão do Tribunal a quo ser mantida por não padecer de qualquer vicio ou falta de fundamentação e, consequentemente, deve ser negado provimento ao recurso apresentado pelo embargante/Recorrente M. J..
Decidindo o Venerando Tribunal nestes termos estará a fazer a habitual Justiça!
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Os recursos foram admitidos como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Questões a decidir.

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal, por ordem de precedência lógica e eventual prejudicialidade, consistem em saber:

1. Da inexistência ou inexequibilidade do título executivo.

Em caso de resposta negativa à questão anterior, então:

2. Das invocadas nulidades da sentença.
3. Da rejeição ou não da impugnação da matéria de facto, e em caso negativo, do seu conhecimento.
4. Do erro na forma de processo.
5. Do caso julgado.
*
III. Fundamentação de facto.

Na decisão sob recurso foram dados como provados os seguintes factos:

1.- Na sequência do processo nº 472/2000 que correu termos no antigo 4º juízo cível do tribunal judicial de Barcelos foi efetuada a partilha dos bens por morte do pai dos Exequentes e dos Executados – A. F.- ocorrida a 05/02/2000, conforme documentos juntos com o requerimento executivo como documentos n.ºs 1 a 22 e 29, cujos dizeres se são aqui por integralmente reproduzidos.
2.- Por sua vez, no processo nº 537/14.4T8BCL que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Barcelos – Inst. Local – Secção Cível – J3, e que juntou os anteriores processos nº 472/2000 e 3079/10.3TBBCL ambos do 4º juízo cível – extinto, foram efetuadas as partilhas dos bens indivisos por decesso do pai e da mãe dos Exequentes e Executados - P. T. e A. F., conforme documentos juntos com o requerimento executivo como documentos n.ºs 1 a 22 e 29, cujos dizeres se são aqui por integralmente reproduzidos
3.- Em 09/12/2002 transitou em julgado a sentença datada de 06/11/2002, que homologou a partilha por morte de A. F., conforme documento junto com o requerimento executivo como documento n.º 29, cujos dizeres se dão aqui por integralmente reproduzidos.
4.- Em 07/09/2015 transitou em julgado a sentença datada de 17/06/2015, que homologou a partilha por morte de P. T..
5.- De entre os bens partilhados em ambos os processos supra referenciados e já transitados em julgado, resulta que ainda se encontra por dividir o saldo bancário da conta nº0003....... onde deveriam ser depositados os valores constantes das verbas 1 a 7 da relação de bens do processo 472/2000 e da verba nº 48 da relação de bens do processo 537/14.4T8BCL.
6.- Em abono da verdade se diga que, por altura do processo de inventario identificado em 1. supra foi decidido e acordado entre todos os interessados/herdeiros que o dinheiro constantes das verbas nºs 1 a 7 da relação de bens apresentada naquele inventario (processo nº 472/2000), deveria ser depositado em contas tituladas por todos os filhos do decujus, mais tendo sido definido que essa conta seria movimentada com a assinatura obrigatória da interessada, ora Exequente, I. R., acompanhada de mais outros titulares, conforme documentos juntos com o requerimento executivo como documentos n.ºs 1 a 22 e 23, cujos dizeres se são aqui por integralmente reproduzidos.
7.- Assim, foi aberta na instituição bancaria BANCO ..., agência de ..., concelho de Barcelos a conta a prazo nº 0003....... com um saldo, à data de 19/03/2009, de € 33.401,95.
8.- Conta esta que ficou apenas titulada por P. T. (mãe dos Exequentes e Executados), por I. R., O. R., aqui Exequentes e por R. F. e M. J. aqui executados, conforme documento junto com o requerimento executivo como documentos n.º 30, cujos dizeres se são aqui por integralmente reproduzidos.
9.- A exequente M. F., nunca titulou aquela conta ou qualquer outra onde fossem depositados valores da herança, tal como ficou definido e se expôs em 4. supra.
10.- Todavia, tal como os demais filhos dos inventariados, a exequente M. F. é herdeira dos valores existentes naquela conta referida em 5. supra.
11.- Apesar disso, até esta data nunca foi distribuído qualquer valor, a qualquer um dos herdeiros e/ou titulares daquela conta bancaria aqui Exequentes e Executados.
12.- A aqui Exequente M. F., nunca recebeu qualquer quantia relativa às partilhas efetuadas por morte de seus pais e nem tão pouco recebeu quaisquer valores que constavam das verbas 1 a 7 da relação de bens do processo nº 472/2000 ou da verba nº 48 da relação de bens do processo 537/14.4T8BCL.
13.- Os embargantes recusam a divisão do dinheiro nos termos fixados pela douta sentença.
14.- Além disso, igualmente se recusam os Executados a incluir a exequente M. F. como titular daquela conta tal como sempre deveria ter acontecido.
15.- Em 27/07/2017 foi efetuada pelos Exequentes a notificação Judicial Avulsa dos Executados para os fins supra expostos, conforme documento junto com o requerimento executivo como documento n.º 31, cujos dizeres se são aqui por integralmente reproduzidos.
16.- Notificação essa que foi efetivada, tendo os Exequentes e executados no dia 16/08/2017 se deslocado ao Banco ... em ..., Barcelos.
17.- Todavia, os embargantes ainda não cumpriram o ordenado na respetiva sentença.
18.- Por decisão judicial datada de 05/01/2015, já transitada em julgado, proferida no âmbito do processo de inventário da falecida mãe dos exequentes e executados, e no que concerne ao saldo da conta bancária com o nº 0003....... do Banco ..., foi decidido o seguinte na sequência de uma reclamação apresentada pela exequente M. F.: … “Ora, não se abalançado tendo a interessada em causa a demonstrar que, a par da inventariada e seus irmãos, a mesma era também proprietária de 1/6 da quantia monetária que se achava depositada na identificada conta, mantém-se a presunção prevista no artigo 516º, do CC e, como tal, deverá a verba nº 47 manter-se relacionada nos seus precisos termos, o que se decide.”
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Mais se afirmou na decisão que não se provaram os demais factos alegados pelas partes que não estejam mencionados nos factos provados ou estejam em contradição com estes.
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Da prova documental dos autos resulta ainda com relevo para a decisão, que:

- no processo de inventário nº 472/2000, instaurado por óbito de A. F., na Conferência de interessados, foi por todos os presentes dito estarem de acordo quanto à adjudicação dos bens e composição dos respectivos quinhões pela seguinte forma:
“ – todos os bens constantes da relação de bens de fls. 158 e 159 dos presentes autos, com excepção do dinheiro da verba nº 8 (oito) agora eliminada, ficarão em comum e na proporção dos respectivos quinhões pelos preços constantes daquela relação, sendo que o dinheiro das verbas nºs 1 a 7 (um a sete) serão depositadas em contas tituladas por todos os filhos do decujus, conta essa que desde já acordam seja movimentada com a assinatura obrigatória da interessada I. R., acompanhada de mais outros titulares”.
- Do mapa de partilha realizado nesse processo de inventário nº 472/2000, e que veio a ser homologado pela sentença já transitada em julgado, e que é agora um dos títulos executivos, resulta que a cada um dos filhos do inventariado (agora exequentes e executados) fica a caber 3/40 avos do dinheiro das verbas 1 a 7, que correspondem a € 5.054,07.
- Nesse processo foi cabeça de casal P. T., entretanto falecida a -/05/2009.
- Do documento junto com o requerimento executivo, como nº 30, resulta que, a conta nº 0003......., do Banco ..., foi aberta no dia 19 de Março de 2009.
- No processo de inventário nº 3079/10.3TBBCL, que passou a 537/14.4T8BCL, foi cabeça de casal R. F..
- Nesse processo foi relacionada como verba nº 48 “a quantia de seis mil setecentos e cinquenta e quatro euros e vinte cêntimos depositada na conta nº 0003....... do Banco ..., correspondente a uma quinta parte do total depositado nesta conta, pois que da mesma fazem parte a inventariada e mais quatro titulares ------ € 6.754,20”.
- Resulta da acta de conferência de interessados desse processo, que essa verba nº 48 (a quantia monetária de € 6.754,20) foi adjudicada a todos os interessados na proporção dos respectivos quinhões.
- Do mapa da partilha realizado nesse processo de inventário nº 537/14.4T8BCL e que veio a ser homologado pela sentença já transitada em julgado, e que é agora um dos títulos executivos, resulta que a cada um dos filhos do inventariado fica a caber 1/5 da verba nº 48, que corresponde a € 1.350,84.
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IV. Fundamentação de direito.

Delimitadas que estão, sob o n.º II, as questões essenciais a decidir, é o momento de as apreciar.
Comecemos então pela primeira.
Pela acção executiva pretende o credor obter a realização coactiva de prestação não cumprida.
A finalidade da acção executiva consiste na satisfação do interesse patrimonial contido na prestação não cumprida (art. 4º, nº 3 do C.P.C., na sua anterior redacção, a que corresponde hoje o art. 10º), sendo o seu objecto, sempre (e apenas) um direito a uma prestação – nesse objecto contém-se somente a faculdade de exigir o cumprimento da prestação e o correlativo poder de aquisição dessa prestação, poder que corresponde à causa debendi e, portanto, funciona como causa de pedir da acção executiva (os factos dos quais decorre esse poder são os mesmos que justificam a faculdade de exigir a prestação) (Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2ª edição, p. 606.).
A faculdade de exigir a prestação, correlativa do poder de aquisição dessa prestação, designa-se por pretensão e apenas uma pretensão exequível pode constituir objecto de uma acção executiva – exequibilidade intrínseca, respeitante à inexistência de vícios materiais ou excepções peremptórias que impeçam a realização coactiva da prestação, e exequibilidade extrínseca, traduzida na incorporação da pretensão num título executivo, ou seja, num documento que formaliza, por disposição da lei, a faculdade de realização coactiva da prestação não cumprida (art. 45º, nº 1 do C.P.C. na sua anterior redacção, a que corresponde hoje o art. 10º) (Autor e obra citados, pp. 606 a 608).
Do título executivo – que determina o fim e os limites da execução, sendo a base desta (art. 45º, nº 1 do C.P.C. na sua anterior redacção, a que corresponde hoje o art. 10º nº 5) – resulta a exequibilidade da pretensão executanda, pois incorpora o direito de execução, isto é, o direito do credor a executar o património do devedor ou de terceiro para obter a satisfação efectiva do seu direito (Ferreira de Almeida, Algumas considerações sobre o problema da natureza e função do título executivo, RFD, 19 (1965), p. 317).
O título executivo, condiciona a exequibilidade extrínseca da pretensão, é como o invólucro onde a lei presume se contem o direito violado (neste sentido, Castro Mendes, apud, Acção Executiva, página 8) a certeza e a exigibilidade condicionam a exequibilidade intrínseca da pretensão, pois que a sua não verificação impede que, apesar de se reconhecer o direito do exequente à reparação efectiva, o devedor seja executado quanto a essa mesma prestação, neste sentido, (Teixeira de Sousa, A exequibilidade, página 17).
Os títulos executivos incorporam-se em documentos, que constituem, certificam ou provam, com base na aparência ou probabilidade, a existência da obrigação exequível, que a lei permite que sirva de base à execução, por lhe reconhecer um certo grau de certeza e de idoneidade da pretensão.
A execução de que os presentes embargos são apenso, tem por título executivo as sentenças de 06/11/2002 (transitada em julgado em 09/12/2002) que homologou a partilha por morte de A. F., e de 17/06/2015 (transitada em julgado em 07/09/2015), que homologou a partilha por morte de P. T..
Resulta da Conferência de interessados realizada no processo de inventário nº 472/2000, instaurado por óbito de A. F., que a quantias depositadas em dinheiro, foram adjudicadas a todos os interessados, na proporção dos respectivos quinhões, cabendo a cada um dos interessados 3/40 avos (que correspondem a € 5.054,07 a cada).
Mais resulta da acta de conferência de interessados realizado no processo de inventário nº 537/14.4T8BCL, que a verba nº 48 (a quantia monetária de € 6.754,20) foi adjudicada a todos os interessados na proporção dos respectivos quinhões ficando a caber a cada 1/5 da verba nº 48, que corresponde a € 1.350,84.
Vejamos agora então, da exequibilidade destas sentenças homologatórias da partilha.
Por se concordar integralmente com o aí afirmado, seguiremos muito de perto o Ac. desta Relação de Guimarães, de 28 de Fevereiro de 2019, relator Joaquim Boavida, disponível in www.dgsi.pt., com meras adaptações de redacção para o caso concreto.
Diz-nos J. A. Lopes Cardoso (Partilhas Judiciais, vol. II, 4ª edição, Almedina, pág. 534.) que “Com o trânsito em julgado da sentença que homologou as partilhas fica definitivamente fixado o direito dos intervenientes no processo de inventário. (…) Se os bens atribuídos aos interessados são entregues (…), não é necessário provocar de novo a actividade judiciária. Mas se o cabeça-de-casal ou o detentor se recusam a fazer a aludida entrega (…) podem os prejudicados forçá-los a cumprir as suas obrigações, a realizar o direito que a sentença de partilhas definiu. Daí a execução da sentença».
Por isso se afirma que a sentença homologatória da partilha define os direitos de cada um dos herdeiros e constitui título bastante para que cada um deles possa exigir a entrega dos bens que lhe foram adjudicados.
Tanto o Código de Processo Civil de 1961, no seu artigo 46º, al. a), como o actual CPC de 2013, no artigo 703º, nº 1, al. a), atribuem exequibilidade às sentenças condenatórias.
Já Alberto dos Reis (in Processo de Execução, vol. I, Coimbra Editora, reimpressão de 1985, pág. 127) referia que “ao atribuir eficácia executiva às sentenças de condenação, o Código quis abranger nesta designação todas as sentenças em que o juiz, expressa ou tacitamente, impõe a alguém determinada responsabilidade”. Considerava-se então que, para que a sentença possa servir de base à acção executiva, não é necessário que condene no cumprimento de uma obrigação, bastando que esta obrigação fique declarada ou constituída por aquela.
Hodiernamente considera-se que na expressão “sentenças condenatórias” estão integradas todas as decisões de tribunais que imponham uma ordem de prestação ou comando de actuação ao demandado de maneira incondicional (Rui Pinto, A Acção Executiva, AAFDL, pág. 150).
Como se afirma no acórdão da Relação do Porto de 22.05.2017 (relator Carlos Gil), disponível in www.dgsi.pt “a sentença que põe termo ao processo de inventário é uma sentença homologatória e, como tal, condena ou absolve nos precisos termos dos actos homologados (artigo 290º, nº 3, do CPC). Porque assim é, a sentença homologatória da partilha proferida em processo de inventário sempre deveria, no que respeita à sua exequibilidade, ser equiparada a uma decisão condenatória proferida em processo comum (alínea a), do nº 1, do artigo 703º do CPC)”.
A sentença homologatória de partilha em processo de inventário produz efeitos reais de constituição ou reconhecimento de certa propriedade singular ou outro determinado direito real.
Também da mesma pode derivar a constituição/reconhecimento de concretas obrigações de diferente natureza.
Tudo depende do que tiver sido debatido e decidido no inventário e do respectivo âmbito objectivo e subjectivo. No inventário podem ser discutidas várias questões e as decisões proferidas relativamente às mesmas estão cobertas pelo caso julgado, “não só para os interessados na herança como também para os intervenientes na solução (…), entendendo-se que intervieram na solução de uma questão as pessoas que a suscitaram ou sobre ela se pronunciaram, e ainda as que foram ouvidas, embora não tenham dado resposta (Cód. Proc. Civil, art. 1397º-2). Daqui resulta a subsistência de caso julgado no tocante a todas as questões assim discutidas, com os efeitos atribuídos por lei, desde que procurem suscitar-se de novo entre tais intervenientes” (Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais, vol. II, 4ª edição, Almedina, pág. 530).
Na execução para pagamento de quantia certa como na execução para entrega de coisa certa em consequência do inventário, o seu fundamento há-de ser encontrado naquele processo e no caso julgado formado no mesmo relativamente ao direito de crédito ou ao direito à obtenção da entrega de determinados bens.
Regra geral, os bens, em sentido amplo, estarão na posse e administração do cabeça-de-casal. Assim o estipula o artigo 2079º do Código Civil: «A administração da herança, até à sua liquidação e partilha, pertence ao cabeça-de-casal».
E a lei confere ao cabeça-de-casal poderes para tornar efectiva a administração. Por exemplo, no artigo 2088º, nº 1, do Código Civil estabelece-se expressamente que «o cabeça-de-casal pode pedir aos herdeiros ou a terceiro a entrega dos bens que deva administrar e que estes tenham em seu poder, e usar contra eles de acções possessórias a fim de ser mantido na posse das coisas sujeitas à sua gestão ou a ela restituído». No anterior CPC também se facultava ao cabeça-de-casal a possibilidade de declarar que estava impossibilitado de relacionar alguns bens em poder de outra pessoa, caso em que esta era notificada para facultar o acesso a tais bens e fornecer os elementos necessários à respectiva inclusão na relação de bens, podendo o notificado alegar que os bens não existiam ou que não tinham de ser relacionados; se o notificado não cumprisse o dever de colaboração, podia o juiz ordenar as diligências necessárias, incluindo a apreensão dos bens (artigo 1347º).
Em todos estes casos a situação acaba por ficar coberta pelo caso julgado, pelo que a subsequente execução, após o trânsito em julgado da sentença homologatória da partilha, não oferece dúvidas sobre contra quem deve ser instaurada: ou contra o cabeça-de-casal, por os bens estarem em seu poder, ou contra o terceiro, na situação inversa. Repare-se que, nos termos do artigo 2119º do Código Civil, «feita a partilha, cada um dos herdeiros é considerado, desde a abertura da herança, sucessor único dos bens que lhe foram atribuídos, sem prejuízo do disposto quanto a frutos». Com a partilha, os herdeiros adquirem a plenitude e exclusividade dos direitos sobre os bens. Como os bens deveriam estar na posse do cabeça-de-casal, a partir da partilha, os herdeiros podem exigir deste a entrega dos bens que lhes couberam.
Contudo, sucede com frequência, sobretudo no que respeita aos depósitos bancários, que as quantias depositadas são levantadas, por interessados no inventário ou terceiros, após o decesso do inventariado e as mesmas não são entregues ao cabeça-de-casal. Não é invulgar tais quantias serem relacionadas no inventário sem que se discuta e decida no mesmo quem está na posse das mesmas ou, pelo menos, quem procedeu ao seu levantamento. Quando assim sucede, a sentença que homologa a partilha não constitui título executivo, pois na mesma não está determinada a pessoa do devedor.

A acção executiva identifica-se por ser aquela em que o credor requer as providências adequadas à realização coactiva de uma obrigação que lhe é devida – artigo 10º, nº 4, do novo CPC. Em consonância com o disposto no artigo 817º do CPC, é parte activa na execução o “credor”, ou seja, aquele que tem o direito de exigir judicialmente o cumprimento da obrigação, enquanto na parte passiva figura o titular do património responsável pela dívida (v. ainda art. 818º do CC).
Como, nos termos do artigo 10º, nº 5, do CPC, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites, da acção executiva, será pelo exame de tal título que se apreciará se o exequente pode promover a execução contra certa pessoa. É isso mesmo que resulta do artigo 53º, nº 1, do CPC, ao dispor que a execução «deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor».
Portanto, numa sentença de homologação da partilha, a questão da determinação da pessoa contra quem pode ser instaurada a execução é, em princípio, aferida pela literalidade do título executivo.

Ora, no caso dos autos os executados/embargantes não desempenharam funções de cabeça-de-casal no inventário que sob o nº 472/2000, correu termos e cuja partilha veio a ser homologado por sentença já transitada em julgado, e que é agora um dos títulos executivos, e o executado/embargante também não desempenhou tais funções no outro inventário, pelo que não está em causa a administração de bens da herança e a consequente demanda do cabeça-de-casal para entrega de bens que administrava.

Por outro lado, na certidão que acompanhou o requerimento executivo, destinada a comprovar os títulos executivos, nada consta sobre quem tinha na sua posse os valores que foram partilhados. Também os mapas da partilha são absolutamente inócuos quanto à determinação da pessoa do(s) devedor(es) no que concerne à prestação exigida pelos exequentes.
Em lado algum dos aludidos mapas se refere que os executados receberam a mais determinada quantia e que devem o excesso dos seus quinhões a outro interessado, em especial aos exequentes.
Aliás, em termos de vinculação, o único elemento objectivo que resulta da certidão que acompanhou o requerimento executivo é a adjudicação das verbas.
Por outro lado, a conta bancária que veio a ser aberta no Banco ..., foi-o vários anos depois do trânsito em julgado da sentença que homologou a primeira partilha, não identificando o documento junto com o requerimento executivo, a proveniência desse dinheiro.
Em conclusão, face aos títulos, não está demonstrado que os executados sejam os devedores da obrigação que os exequentes pretendem executar.
A alegada situação de incumprimento da obrigação exequenda não se encontra abrangida pelo caso julgado das sentenças homologatórias das partilhas dadas à execução, o que impede que se possa extrair dessa sentença uma condenação implícita dos aqui executados e embargantes.
Não estando, pois, nos títulos dados à execução certificado que os executados sejam os devedores relativamente à obrigação exequenda, conclui-se pela sua inexequibilidade, sendo este vício insuprível e determinando a extinção da execução nos termos dos artigos 726º, nº 2, alínea a), e 734º, nº 1, do CPC.
Acresce que afirmar a condenação implícita dos executados na obrigação de restituir é presumir que estes se apropriaram das quantias em causa, sem que, face à certidão junta, se saiba por quem, pois que desde logo, nunca resultou dos processos de inventário onde essas quantias se encontravam.
Os credores estariam a executar uma obrigação cujos devedores não foram determinados no inventário.
Na acção executiva, pelo título tem que ser possível identificar quem é o devedor, ou seja, o executado.
Se o executado não corresponder, face ao título, ao devedor, não pode ser demandado enquanto tal.
Não fica na plena disponibilidade do credor instaurar a execução contra quem entende ser o devedor (ou contra quem responde com o seu património pela obrigação exequenda), mas apenas contra a pessoa que se encontra vinculada pelo título a cumprir a prestação.
Sendo inequívoco que os exequentes são titulares de um crédito, já a determinação de quem seja o devedor deveria emergir claramente do título dado à execução, o que não sucede no caso vertente.
Procede, pois, a apelação, ficando desde logo prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas.
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V. Decisão.

Perante o exposto, acordam as Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação procedente, revogando-se a sentença recorrida e determinando-se a extinção da execução, com o consequente levantamento das penhoras.
Custas pelos apelados.
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Guimarães, 23 de Abril de 2020

Assinado electronicamente por:
Fernanda Proença Fernandes
Alexandra Viana Lopes
Anizabel Pereira

(O presente acórdão não segue na sua redacção as regras do novo acordo ortográfico, com excepção das “citações” efectuadas que o sigam)