Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
850/16.6T8VCT.G1
Relator: JOSÉ FLORES
Descritores: INEPTIDÃO DA PETIÇÃO INICIAL
INSUFICIÊNCIA DA CAUSA DE PEDIR
CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
PRINCÍPIO DA AUTORRESPONSABILIZAÇÃO DAS PARTES
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/01/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Nas acções de reivindicação, temos de ter presente uma factualidade ou causa de pedir complexa, compreendendo, por um lado, o facto jurídico de onde nasce o direito de propriedade de que os Autores se arrogam titulares e, cumulativamente, a concreta ou histórica ofensa desse direito;

II - A petição inicial em que faltem, em absoluto, os factos nucleares que revelam esta ofensa é inepta, não havendo, nesse caso, lugar à prolação de despacho de aperfeiçoamento dessa falta fundamental para o mérito da causa de pedir invocada
Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUÍZES NA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:

I – Relatório
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Os aqui Recorrentes intentaram a presente acção contra a referida “herança”, formulando os seguintes pedidos:

- Condenação dos réus a reconhecerem que os Autores são donos e legítimos proprietários do prédio urbano composto por casa de primeiro andar e lojas, para habitação, sito na Estrada …, da freguesia de …, confrontando do norte com os Réus, do sul com José, do nascente com caminho e do poente com a Estrada …, e tem uma área total de 900,00 m2, com uma área de implantação do edifício de 260,40 m2, uma área bruta de construção de 353,40 m2, uma área bruta dependente de 205,20 m2 e uma área brita privativa de 148,00 m2, inscrito na matriz predial sob o artigo 281, mas agora correspondente ao artigo 1705, com a composição e limites de propriedade melhor descritos no doc. 6 junto com a petição inicial, ou seja, que o limite de propriedade que confronta com o prédio dos réus do lado norte tem início na parede última do anexo situado na parte norte da propriedade dos Autores e fim junto à eira situada no prédio dos réus;
- Condenação dos réus a reconhecerem que o muro edificado na propriedade dos Autores não lhes pertence e que não se trata de um limite de propriedade entre ambos os prédios;
- Condenação dos réus na demolição e remoção do muro que foi construído na propriedade dos Autores dado não ser o limite de propriedade dos prédios, à custa dos réus, num prazo razoável de 45 dias;
- Condenação dos réus a reconhecerem o direito dos Autores de construírem um muro no limite de propriedade entre os prédios, de acordo com o reconhecimento do direito pedido em a), no sentido nascente/poente, tendo início na parede última do anexo situado na parte norte da propriedade dos Autores e fim junto à eira situada no prédio dos réus, tudo conforme melhor identificado no doc. 6 junta com a petição inicial;
- Condenação dos réus a pagarem aos Autores uma prestação pecuniária compulsória no montante de € 50,00 por cada dia de atraso no cumprimento do prazo de demolição e remoção do muro.

As demandadas contestaram, invocando, além de mais, a ineptidão da petição inicial e o caso julgado.
Para tanto alegam que a acção não tem causa de pedir, porque os Autores reconhecem a existência dos dois prédios, separados por um muro cuja reposição foi ordenado àqueles pelo Tribunal, discutindo áreas, questão que apenas releva para os demandantes, pedindo a discussão do muro divisório e remoção de entulhos, em contradição com “a causa de pedir”, não se vislumbrando a violação do direito de propriedade que o exija, pelo que existe violação do dispositivo do art. 186º, do Código de Processo Civil.
No que diz respeito ao caso julgado, disseram que no processo 606/10.0TBVCT, envolvendo as mesmas partes, já foram discutidas as questões que aqui novamente se suscitam.

Em resposta, em audiência prévia (1), os Autores pedem a improcedência dessa excepção de ineptidão, dizendo que pretendem que se reconheça a área do seu prédio, tanto mais que a mesma não foi discutida entre as partes nas restantes acções judiciais envolvidas, adiantando que, sic, “a causa de pedir nos presentes autos assenta no facto de se reconhecer uma determinada área do prédio dos autores”, os Réus entenderam a sua demanda e não se ter verificado qualquer das circunstâncias previstas no art. 186º, do Código de Processo Civil.
Acrescentaram ainda que inexiste identidade de pedido na acção citada pelos Réus.

O Tribunal findou audiência determinando a exibição do processo 606/10 para decidir imediatamente do mérito da causa.
Foram juntos documentos pelas partes e certidão parcial desse processo.
Em cumprimento daquele propósito foi pelo Tribunal a quo proferida decisão com o seguinte dispositivo.
Atento o exposto, em face do preceituado nos artigos 186º, nº 1 e nº 2, alínea a), 278º, nº 1, alínea e), 576º, nº 1 e nº 2 e 577º, alínea a), do Código de Processo Civil, julga-se verificada a excepção dilatória de nulidade do processado por ineptidão da petição inicial, atenta a falta/insuficiência da causa de pedir e, consequentemente, absolvem-se os réus da instância.
Fixo o valor da acção em € 44.643,63 (atento o disposto no artigo 302º, do C.P.C. e o documento junto a fls. 36).
Custas pelos Autores.”
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Inconformado com tal decisão, dela interpuseram os Autores o presente recurso de apelação, em cujas alegações formulam as seguintes conclusões:

1. Os Autores Apelantes são donos e legítimos proprietários do prédio urbano, composto de casa primeiro andar e lojas, sito no Lugar …, da freguesia de ..., confronta do norte com os Recorridos, do sul com José, do nascente com caminho e do poente com estrada, e tem uma área total de 900,00 m2, com uma área de implantação do edifício de 260,40 m2, uma área bruta de construção de 353,40 m2, uma área bruta dependente de 205,20 m2 e uma área brita privativa de 148,00 m2, inscrito na matriz sob o artigo 281º2.
2. Os Autores Apelantes pretendem assim que se reconheça que estes são donos e legítimos proprietários do prédio urbano objecto do litígio, e que o seu limite de propriedade fosse reconhecido – estabelecendo que este limite entre o prédio dos Autores Apelantes e dos Recorridos, tem início na parede última do anexo situado na parte norte da propriedade dos Autores Apelantes e fim junto à eira situada no prédio dos Recorridos.
3. Mais acresce o reconhecimento de que, o muro edificado na propriedade dos Autores Apelantes não lhes pertence e, que não este não determina o limite de propriedade entre ambos os prédios.
4. E ainda que, se condene à demolição e remoção do muro que foi construído na propriedade dos Autores Apelantes pelos Recorridos.
5. E, por fim, que se reconheça o direito dos Autores Apelantes construírem um muro, no verdadeiro limite de propriedade entre ambos os prédios.
6. Para tanto, salvo o devido respeito, o Tribunal ao decidir vai ter de se basear, efectivamente, nos factos essenciais alegados que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à acção, e nos concretizadores que forem provados, porque também estes são essenciais.
7. Já que, os recorrentes não se podem conformar com a douta decisão proferida, porquanto, no seu modesto entender, nos termos dos artigos 5º, nº 1, e 552º, nº 1, al. d) do n. Código de Processo Civil, às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e as excepções, sendo, pois, na petição inicial que devem constar os concretos e reais factos que preenchem a previsão da norma jurídica na qual a parte funda o seu direito.
8. Estabelece o artigo 5º, nº 1 do Código de Processo Civil que “às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas.
9. O artigo 552º, nº 1, al. d) do mesmo Código, em consonância com a regra geral acima citada, estabelece que “na petição deve o Autor expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à acção.
10. Salvo o devido respeito, que muito é, entendemos que, nos termos do disposto no nº 3, do art. 186º do CPC, mesmo que o réu, na contestação, invoque a falta ou ininteligibilidade do pedido, tal invocação não é atendível se se concluir que ele, não obstante as deficiências invocadas, inteligiu o feito que o demandante introduziu em juízo e está cônscio das consequências que dele pretende retirar não sendo possível, nestas circunstâncias, absolver o réu da instância por ineptidão da petição inicial.
11. Relativamente à incompetência quer absoluta quer relativa do Tribunal entende-se que face ao supra alegado, e apear do previsto nos artigos 129º e 130º do CR Predial, o certo é que a matéria dos autos pode e deve ser decidida pelo Tribunal de Primeira Instância, apesar de quer AA. quer RR. terem registado as suas propriedades e indicados os seus limites, sendo que os AA. nesta acção pretendem ver reconhecido os limites que registaram.
12. Assim, em nenhum momento esta acção contradiz o previsto no CPC, cumprindo, aliás, todos os requisitos de uma petição inicial, ao abrigo do artigo 552º do CPC.
13. Assim, a douta sentença recorrida viola o disposto dos artigos 20º da C.R.P., o artigo 9º nº3 do C. Civil, e os artigos 186º e nº2 al a), 186º nº3, 552º, 577º, alínea a) e 590º, nº2 al a), b) nº4, 5 e 6, e ainda o artigo 615º al d), todos do Código do Processo Civil.

Nestes termos e nos melhores de direito deve o presente recurso ser admitido e, consequentemente ser a douta decisão recorrida revogada e substituída por outra que julgue todo o processado apto ao prosseguimento normal dos autos.

As Recorridas apresentaram contra-alegações, propugnando pela manutenção do decidido.

II – Delimitação do objeto do recurso e questões prévias a apreciar:

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos do artº 639º, do Código de Processo Civil (doravante C.P.C.).
As questões enunciadas pelos recorrentes podem ser sintetizadas da seguinte forma: aptidão da sua petição para sustentar o peticionado; alegada incompetência absoluta.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

III – Fundamentos

1. Factos (cf. art. 662º, do Código de Processo Civil)

São os que emergem do processo, nomeadamente do articulado inicial dos Autores, onde se deve encontrar o sustento factual da causa.
E estes dizem inicialmente e resulta das certidões do Processo 606/10.0TBVCT juntas, que…

1Os AA. e o falecido Manuel e esposa, M. J., foram interessados nos autos de inventário nº 3381/06.9TBVCT que correram termos pelo 1º Juízo Cível deste Tribunal Judicial de Viana do Castelo, por óbito de G. S., falecido em 18 de Outubro de 1990 e mulher R. F., falecida em 30 de Novembro de 1996.
2 – Posteriormente ao inventário faleceu o herdeiro Manuel, tendo-lhe sucedido como únicos herdeiros as aqui RR., em representação da herança, porquanto a mesma se encontra ilíquida e indivisa.
3 – De entre os bens que compunham a herança faziam parte os dois prédios a seguir indicados: Verba nº 3 – Prédio rústico, sito no Lugar de …, da freguesia de ..., confronta do norte com A. F., do sul com casa dos inventariados, do nascente com caminho e do poente com estrada nacional, com a área de 340 m2, descrito na conservatória do registo predial sob o nº …, do livro ..., a fls. 77 verso, inscrito na matriz sob o artigo 2.734º. Verba nº 10 - Prédio urbano, de casa primeiro andar e lojas, para habitação, sito no Lugar de …, da freguesia de ..., confronta do norte com os inventariados, do sul com José, do nascente com caminho e do poente com estrada, com a área de implantação do edifício de 96 m2 e terreno com a área de 720 m2, inscrito na matriz sob o artigo 281º (agora artigo urbano 1705º) (agora artigo urbano 1705º) (agora artigo urbano 1705º).
4 – Os prédios são contíguos um ao outro.
5 – No âmbito desse processo de inventário teve lugar no dia 11 de Novembro de 2008 a conferência de interessados, pela qual ficou acordado, por unanimidade que “se elimine a descrição dos prédios relacionados sob as verbas 3 e 10 as referências das áreas respectivas, por desconhecimento rigoroso das áreas actuais constantes dessas verbas.
6 – Na licitação a que se procedeu no inventário a verba nº 3 foi adjudicada ao falecido Manuel e esposa, agora aqui representado pelos RR. e a estes adjudicada.
7E a verba nº 10 foi licitado pelos AA. e a estes adjudicada.
8 - Entre os dois prédios existia um pequeno murete, e entre os mesmos a passagem fazia-se de um para o outro através de uma passagem, a qual foi removida pelos AA. e depois reposta no âmbito do processo nº 606/10.0TBVCT que correu termos no 4º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Viana do Castelo.
9 – Nessa sentença foi decidido, julgar a acção parcialmente procedente, reconhecendo-se aos RR. o direito de servidão de passagem, a pé e com máquinas agrícolas através do logradouro do prédio urbano - verba 10 – com entrada pelo portão de acesso ao logradouro desse prédio sito na estrada nacional, servidão essa no sentido poente/nascente, até à cancela que separa este prédio do prédio rústico propriedade dos RR – verba 3 – servidão essa constituída por destinação de pai de família; condenarem-se os Aa. a facultarem aos RR. uma chave do portão de acesso à estrada nacional, abstendo-se de dificultar ou impedir o exercício desta servidão com a extensão próprias das utilidades a retirar do prédio dominante, através do acesso pedonal e de alfaias agrícolas motorizadas ou não; - condenarem-se os AA a demolirem o muro que construíram e a removerem o entulho à sua custa, no prazo máximo de 45 dias a contar do trânsito em julgado da sentença (bem como a reporem o muro identificado em f) a ae) dos factos provados no local onde anteriormente existiu até ao ano de 2009, à sua custa, no (2) prazo máximo de 45 dias a contar do trânsito em julgado da sentença).
10 – Em recurso que correu termos no Tribunal da Relação de Guimarães o recurso foi julgado parcialmente procedente apenas na parte em que condenou os RR. a reconhecerem que os AA. são donos e legítimos proprietários do prédio urbano, da freguesia de ..., inscrito na matriz predial sob o artigo 281, agora com o artigo 1705.
11 – Os AA. cumpriram com a sentença mas os RR. nem antes nem depois do inventário nem depois desta sentença e até aos dias de hoje utilizam o prédio que lhes foi adjudicado.
12 – Contudo, nessa sentença e em consequência do inventário melhor identificado no artigo 1º desta p.i., em nenhum momento, ficou definido entre as partes ou por sentença judicial quais as áreas de cada prédio, apesar de constar no inventário e de acordo com a matriz predial que o prédio dos RR. tem a área de 340 m2 e que o prédio dos AA. tem a área de 96 m2 de implantação urbana e 720,00 m2 de logradouro.
13 – Ora, como se pode verificar no documento que se junta, o prédio dos AA. confronta do norte com o prédio dos RR. do sul com José, do nascente com caminho e do poente com a Estrada …, e tem uma área total de 900,00 m2, com uma área de implantação do edifício de 260,40 m2, área bruta de construção de 353,40 m2, uma área bruta dependente de 205,20 m2 e uma área brita privativa de 148,00 m2, tudo conforme certidão de teor da Repartição de Finanças que se junta.
14 – Bem como levantamento topográfico que se junta e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais. – ver doc. 6
15Esta foi sempre a área do prédio dos AA., desde que tomaram posse do mesmo quer aquando dos seus antecessores que vêm há mais de um, 10, 20 30 e mais de 50 anos pagando as suas contribuições e impostos relativos a este imóvel.
16 – Sempre com o conhecimento dos RR..
17 – É que os AA., tal como os seus antecessores, vêm praticando tais actos de forma continuada, ao longo daquele descrito período de tempo, sem oposição de quem quer que seja, nomeadamente dos RR. ou dos seus antecessores, na convicção de quem exerce um direito próprio tendo o prédio dos AA. sempre essa composição, a qual desde sempre teve essa descrição e áreas na Repartição de Finanças.
18 – Pelo que, a este propósito sempre se deixará aqui invocado o direito de aquisição derivada dos AA. nestes termos.
19 – Deste modo, e conforme se pode verificar pela descrição do prédio dos RR., o mesmo tem a área de 340 m2 e não tem no seu interior qualquer espaço destinado a área bruta dependente, vulgarmente designados como anexos ou casa de alfaias agrícolas.
20 – Apenas é composto por área descoberta e trata-se tão só de uma leira de cultivo.
21 – De referir que mesmo no processo de inventário melhor indicado no artigo 1º desta p.i., os RR. tomaram como certo que o seu prédio tinha cerca de 375 m2 e que a confrontação do lado sul com o prédio dos AA. terminava junto aos anexos, conforme doc 7 que se junta para os devidos efeitos legais.
22Por isso, a área do prédio do Aa. á aquela que corresponde ao levantamento topográfico aqui junto e reconhecido pela Repartição de Finanças e que, basicamente corresponde ao apresentado pelos RR. no processo de inventário.
23 – Deste modo, e porque não foi reconhecido pelas partes no processo de inventário, urge reconhecer por este Tribunal as áreas e os limites de propriedade do prédio pertencente aos AA. e a sua confrontação com o prédio dos RR.
24 – É que, os AA. são donos e legítimos proprietários do prédio urbano, de casa primeiro andar e lojas, sito no Lugar de ..., da freguesia de ..., confronta do norte com os inventariados, do sul com José, do nascente com caminho e do poente com estrada, e tem uma área total de 900,00 m2, com uma área de implantação do edifício de 260,40 m2, uma área bruta de construção de 353,40 m2, uma área bruta dependente de 205,20 m2 e uma área bruta privativa de 148,00 m2, inscrito na matriz sob o artigo 281º
25Tal prédio adveio à titularidade e dos seus antecessores através através da adjudicação em inventário judicial nº 3881/06.9TBVCt do 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Viana do Castelo.
26O prédio urbano dos AA., sempre teve a composição e áreas indicadas no artigo 23.
27São os AA. e os seus antecessores que vêm há mais de um, 10, 20 30 e mais de 50 anos pagando as suas contribuições e impostos relativos a este imóvel.
28 – Sempre com o conhecimento dos AA.
29 – É que os AA., tal como os seus antecessores, vêm praticando tais actos de forma continuada, ao longo daquele descrito período de tempo, sem oposição de quem quer que seja, nomeadamente dos RR. ou dos seus antecessores, na convicção de quem exerce um direito próprio.
30 – Assim, deixa-se aqui invocado o direito de aquisição derivada para os devidos efeitos legais.
No referido processo nº 606/10 foi julgado assente, além de mais, que (3): (f) Desde tempos imemoriais, há mais de 20 e 50 anos, e até ao ano de 2009, que o prédio rústico e o prédio urbano supra identificados se encontraram separados por um muro em pedra, fazendo-se a passagem de um para o outro através de uma cancela fixada em tranqueiros de pera, com cerca de 2 metros de largura.
(l) O referido prédio (rústico) é circundado por um muro em pedra, pelo lado norte, nascente e poente, sem qualquer abertura.
(t) Constataram (os Autores nessa acção) que os Réus (aqui recorrentes) tinham construído um muro em alvenaria, divisório entre os prédios rústicos e urbano identificados em b) (os mesmos que aqui discutem), o qual foi implantado cerca de 6 metros para lá do muro que anteriormente dividia ambos prédios.
(ae) Desde tempos imemoriais, há mais de 20 e 50 anos, em toda a vida dos anteriores proprietários e após o falecimento destes e até, pelo menos, ao ano de 2009, ininterruptamente, que o prédio adjudicado aos Autores e o prédio adjudicado aos Réus se encontravam divididos e separados um do outro por um muro em pedra, descontínuo para permitir a passagem de um lado para o outro mas ligados por uma cancela composta por duas folhas, cada uma com cerca de um metro de largura, para passagem de um prédio para o outro, muro esse orientado no sentido nascente/poente.

2. Direito

O Tribunal a quo decidiu, em suma, que nenhum dos pedidos formulados pelos Autores tinha sustento aparente, ou seja, causa de pedir, na factualidade invocada e, portanto, julgou estar perante a excepção prevista na al. a), do nº 2, do art. 186º do Código de Processo Civil.

Para tando concluiu o seu silogismo da seguinte forma: Em face do exposto, conclui-se que o primeiro pedido formulado carece de causa de pedir e, para além disso, os factos invocados não se coadunam com a dita pretensão. Quanto aos outros pedidos, também padecem do mesmo vício, uma vez que carecem, de igual modo, de causa de pedir. Por todos estes motivos, a narração dos Autores reconduz-se à falta de causa de pedir, pelo que se integra a mesma na alínea a) do nº 2 do artigo 186º do Código de Processo Civil.
Este art. 186º dita que (1) é nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial. 2 - Diz-se inepta a petição: a) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir; b) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir; c) Quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis. 3 - Se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial. 4 - No caso da alínea c) do n.º 2, a nulidade subsiste, ainda que um dos pedidos fique sem efeito por incompetência do tribunal ou por erro na forma do processo.
De acordo com o disposto no art. 581º, nº 4, do Código de Processo Civil, o legislador esclareceu que a causa de pedir constitui o facto do qual procederá o pedido ou a acção, precisando que nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.

Todavia, a fim de se aferir a factualidade pertinente é necessário previamente qualificar a acção a sustentar com esse facto.
É pelo pedido formulado pelos demandantes, neste caso os Autores, que se desenha aquela e, no caso, em face do que pretendem estes, julgamos estar perante uma acção de reivindicação, já que, partindo de uma certeza subjectiva repetida no seu articulado inicial e nas alegações que culminam com o recurso em apreço, o que os mesmos intentam alcançar é a condenação dos aqui Réus a reconhecerem todos os apontados aspectos da composição, extensão e confrontação que invocam e dão como adquiridos em resultado dos títulos invocados.
Na acção de reivindicação, assim como nesta particular demanda, os Autores/Recorrentes, seguros da configuração do seu direito de propriedade, pretendem pura e simplesmente confrontar os Réus com a sua titularidade, abundantemente sustentada na sua p.i., tanto na sucessão, como na usucapião, esta última uma das formas de aquisição originária da propriedade (e não derivada) previstas no art. 1316º, Código Civil (4).

Com efeito, embora com laivos de acção de demarcação, na parte em que pretende o reconhecimento de uma concreta linha de confrontação com o dito prédio dos Réus (5), a presente demanda não parte, quer no seu pedido, quer na sua motivação, de qualquer actual incerteza, controvérsia ou desconhecimento, que caracteriza a causa de pedir desse tipo de acção e/ou o seu pedido, que normalmente reproduz pura simplesmente a previsão do art. 1353º, do Código de Processo Civil.
Pelo contrário, os Autores são assertivos e seguros na mencionada definição do seu direito de propriedade, por referência à sucessão e usucapião que invocam.
Estamos assim, perante uma reivindicação (6), em que os Autores pretendem o reconhecimento de um direito de propriedade, concretizado na al. a) do seu petitório, cumulado com um pedido de declaração de facto negativo, inserto no seu item b), que é, em bom rigor, uma engenhosa repetição parcelar do já pedido em a), e com as faculdades da sequela que aquele permite – as desenhadas nos itens c) e d), dos quais é subsidiário o pedido da sua al. e).
Neste tipo de acções, como é abundantemente entendido, temos de ter presente, tal como na acção de demarcação, uma factualidade ou causa de pedir complexa, compreendendo, por um lado, o facto jurídico de onde nasce o direito de propriedade de que os Autores se arrogam titulares e, cumulativamente, a concreta ou histórica ofensa desse direito, por isso, é corrente estas acções importarem a dedução de dois pedidos, um de reconhecimento do direito, outro de reintegração ou reposição do mesmo, embora haja quem admita que o primeiro pode ser dispensável.
É o que decorre do disposto nos arts. 1311º e 1312º, do Código Civil.
O proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que lhe pertence.
Havendo reconhecimento do direito de propriedade, a restituição só pode ser recusada nos casos previstos na lei.
A restituição da coisa é feita à custa do esbulhador, se o houver, e no lugar do esbulho.

Vista esta configuração, estaremos face a uma petição inicial que não está apta a conduzir a acção a bom porto, tal como defendem os Réus/Recorridos e a decisão recorrida?

Começando pela argumentação dos Recorridos, na sua contestação, se há algo nesta matéria que é confuso é a sua enunciação, que tanto diz que não há causa de pedir, como diz que ela contradiz os pedidos formulados e, portanto, existirá (pelo menos na sua segunda versão), acertando apenas na alegada inexistência de qualquer alegação de violação do direito de propriedade dos Autores.
Por sua vez estes, reforçando a estranheza da sua demanda, acrescentam, na oposição que formulam a essa excepção, mais indefinição, ao dizerem que a causa de pedir é, em suma, o pedido de reconhecimento “de uma determinada área” do seu prédio!
Ora, na sua p.i., as causas de pedir invocadas, reconduzem-se apenas aos títulos de aquisição acima referidos, que segundo os Autores permitem definir o seu direito nos exactos termos formulados nos seus pedidos de reconhecimento, sic, porque não foi reconhecido pelas partes no processo de inventário, ou seja, porque, na versão destes, não foi formalmente reconhecido pelas partes e/ou pelos Réus a concreta definição do seu direito de propriedade, nos moldes agora propostos.
Em suma, o que os Autores dizem, de forma aliás capciosa porque procura esquecer a definição dos direitos aqui em conflito, que de alguma forma já resulta da citada acção judicial nº 606/10 (quer pelo caso julgado do seu dispositivo, quer pela autoridade do mesmo, que dela emerge) (7) e assim voltar a discutir matéria aí apreciada, é que são proprietários de um direito com aqueles contornos e, por isso, podem exigir aos Réus que o reconheçam e ajam nos termos pretendidos, só porque ele não foi formalmente definido, ainda que ambas as partes o aceitem (cf., v.g., itens 21. e 23.) e não haja qualquer alusão a alguma acção abusiva ou ofensiva do seu direito, já que a única coisa parecida com isso é a (re) edificação do muro em causa, todavia realizada pelos próprios (!) em cumprimento da indiscutível sentença proferida naquele outro processo judicial, onde de forma repetida se mencionou a clara pré-existência do muro divisório assim resposto pelos mesmos.
Entendemos, por isso, que a sua demanda está ancorada em premissas insuficientes para o que pretendem, segundo o que já acima fomos adiantando.
É certo, como alegam os Recorrentes, que no paradigma do actual Processo Civil os demandantes devem concentrar-se nos factos essenciais que constituem a causa de pedir interessante para a sua pretensão, a que deve acrescer a facultativa articulação dos respectivos factos concretizadores e complementares, nos termos previstos no art. 5º, do Código de Processo Civil, e que o Tribunal a quo tem, em tese, o poder-dever de corrigir as insuficiências de uma petição inicial, de acordo como estipulado pelo art. 590º, do mesmo Código.
Todavia, essas insuficiências não são confundíveis com a absoluta omissão de factos nucleares, cumulativamente exigidos para a apreciação do direito reclamado.
Como se sintetizou recentemente em Acórdão deste Tribunal, relatado pela Des. Eugénia Cunha, não cabe convite ao aperfeiçoamento (cfr. nºs 2, 3 e 4, do art. 590º, do CPC), quando, dos próprios factos alegados, decorra a ineptidão da petição inicial ou a manifesta improcedência do pedido formulado, atenta a inviabilidade da pretensão e o princípio da auto-responsabilização das partes (não podendo o tribunal, ex officio, convidando a parte a “fabricar” factos, transmutar um articulado inepto num articulado viável) (8).

“Assim, não é de convidar à correcção da petição inicial nos termos do art. 590º, nºs 2, 3 e 4 do CPC, quando a petição seja inepta nos termos do art. 186º do mesmo diploma, uma vez que só um articulado que não padeça dos vícios mencionados neste último preceito pode ser objecto desse convite à correcção e isto porque se a parte declinar tal convite tal comportamento de inércia não obsta a que a acção prossiga os seus termos, contrariamente à consequência para a ineptidão que é a de determinar a nulidade de todo o processo.

Para além disso, o convite ao aperfeiçoamento da petição inicial deve, apenas, ser feito com o fim de serem corrigidas deficiências processuais – insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada.
Em regra, o âmbito do aperfeiçoamento do articulado apenas pode ter por objecto o suprimento de pequenas omissões ou meras imprecisões ou insuficiências na alegação da matéria de facto, sob pena de completa subversão do princípio dispositivo, o que justifica as limitações impostas pelo n.º 5 do artigo 508.º do CPC – v. neste sentido Acórdão do STJ, de 3.02.2009 (Pº 08A3887), acessível na Internet, no sítio www.dgsi.pt. (9)
O poder de mandar aperfeiçoar os articulados para serem supridas insuficiências ou imprecisões na exposição e concretização da matéria de facto alegada (art. 590º, nº 4, do CPC) tem de ser entendido em rigorosos limites, e isto porque este convite se realiza apenas quando existam as apontadas insuficiências ou imprecisões que possam ser resolvidas com esclarecimentos, aditamentos ou correcções. Ou seja, anomalias que não ponham em causa, em absoluto, o conhecimento da questão jurídica e a decisão do seu mérito mas que possam facilitar que este conhecimento e decisão sejam realizados de forma mais eficaz (10).
Não há lugar à prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento quando o autor não substanciou em termos bastantes a causa de pedir, porquanto não se está perante situação de meras imprecisões ou lacunas de exposição dos factos integradores da mesma (11).
Apesar de o actual Código de Processo Civil, com o louvável objectivo de se alcançar a verdade material e se lograr obter a boa administração da justiça, a justa composição dos litígios e a ampla satisfação dos interesses de cada cidadão e do Estado, interessado em que tais resultados últimos se alcancem, ter dado passos consideráveis para ultrapassar entraves formais, designadamente conferindo ao juiz poderes de convidar as partes ao aperfeiçoamento dos articulados, há uma barreira que não pode ultrapassar: se, na configuração que as partes deram ao litígio, estas omitiram os factos essenciais à causa de pedir e ao pedido, seja da pretensão seja da defesa, não pode o tribunal ex officio tomar um articulado inepto num articulado viável, mediante um convite ao aperfeiçoamento. A tanto se opõe, além do mais, o princípio da auto-responsabilização das partes (12) (negrito e sublinhado nosso). E o mesmo se diga relativamente a uma pretensão manifestamente inviável. Não pode o tribunal convidar a alegar de outro modo ou a retirar, até ocultando, factos para que uma acção inviável passe a poder proceder.”

É o que sucede no presente caso: a acção de reivindicação proposta pelos Autores, não obstante os demais óbices que resultariam do seu confronto com o caso julgado da acção nº 606/10, padece de uma original e fundamental falha respeitante aos factos que, em tese, permitiram vislumbrar algum sucesso a final. Não estaremos perante uma falta absoluta, porque os Autores expuseram parte dessa causa de pedir ao articularem os enunciados títulos de aquisição mas falta-lhes a cumulativa alegação de factos que revelem alguma ofensa actual, que sustente a defesa prevista no citado art. 1311º, do Código Civil.
Nessa medida e nessa matéria, sufragamos o entendimento a final seguido pela decisão recorrida.
Sem prejuízo desse raciocínio, ainda que se entendesse que a demanda dos Autores tinha parcial viabilidade aparente (esquecendo a questão do caso julgado que aqui não decidimos), como acção de demarcação, na parte em que pede a definição de uma linha de confrontação com o prédio rústico dos Réus, julgamos que aqui também inexiste assertiva alegação de parte determinante da sua complexa e cumulativa causa de pedir: a existência de referida incerteza dessa linha divisória, que, como já se disse, e resulta dos próprios documentos juntos com a p.i. dos (13) (Cf. Ac. deste Tribunal da Relação de Guimarães, que apreciou e considerou a factualidade da sentença proferida no Proc. nº 606/10 que acima parcialmente reproduzimos), ficou, pelo, contrário definida no litígio que envolveu os aqui Autores como Réus/Reconvintes nessa outra demanda, o que conduziria aqui ao mesmo resultado, por falta de causa de pedir.

Posto isto, resta dizer que discordamos da invocação, aliás despicienda ou inútil para a economia da decisão, de uma alternativa processual e extrajudicial para os Autores, junto da competente Conservatória, efectivaram correcções registais, já que a previsão de tal processo não obstaria à instauração da presente demanda e, não gera, como pressupõem os Recorrentes e não disse o Tribunal a quo, a sua incompetência absoluta. Esta é, portanto, uma não questão, uma discussão estéril para a apreciação do que aqui realmente importa e acima se decidiu.

É com estas razões de facto e de direito que se julga improcedente a apelação em apreço.

IV. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente a apelação, mantendo a decisão recorrida.

Condenam-se nas custas da apelação os Recorrentes, em parte iguais (cf. art. 527º, do Código de Processo Civil).

Guimarães, 1.3.2018

Des. José Flores
Des. Sandra Melo
Des. Heitor Gonçalves


1. Cf. fls. 139 v.
2. Como em rigor resulta do certificado a fls. 167/169.
3. Cf. certidão acima referida
4. Cf. Ac. deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 1.6.2017, in (…) É o pedido formulado na petição inicial que define qual o tipo de acção em causa. Nem sempre é fácil distinguir a acção de reivindicação da acção de demarcação, porque, em qualquer dos casos, se discute uma questão de domínio, relativamente a uma faixa de terra. (quando este é o respectivo objecto). Porém, o que se pode dizer, “grosso modo”, é que, na primeira daquelas acções, está em causa o próprio título de aquisição; na outra, discute-se a extensão do prédio possuído. O disposto no próprio art.º 1354.° do Código Civil só funciona se o litígio se limitasse a um acerto de estremas, sem pôr em causa os títulos de aquisição dos prédios confinantes. No que se refere aos pedidos, a acção de reivindicação funda-se, como se sabe, na existência do direito de propriedade, tendo como finalidade a obtenção da coisa objecto desse direito (cfr. Rodrigues Bastos - in Direito das Coisas segundo o Código Civil de 1966, volume I, página 137) e, por isso, o pedido é o de reconhecimento do direito de propriedade e, por via do direito de sequela que lhe é inerente, a consequente restituição da coisa por quem a possua ou a detenha. Na acção de demarcação, o pedido é o de fixação das estremas porque a linha divisória entre os dois prédios confinantes é incerta ou se tornou duvidosa. Pires de Lima e Antunes Varela elegem como critério de distinção entre a acção de reivindicação e a acção de demarcação “a diferença entre um conflito acerca do título e um conflito de prédios. (…) https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:TRG:2017:841.13.9TJVNF.G1 -
5. Cf. Ac. T.R. de Coimbra, de 10.2.2009, in https://www.trc.pt/index.php/jurisprudencia-do-trc/direito-civil/143-ap554068tbandc1- 1- O direito à demarcação traduz-se num direito potestativo à colaboração dos donos dos prédios confinantes, com vista à rigorosa fixação dos limites físicos entre esses mesmos prédios. 2- Assim, na base do pedido de demarcação deve haver sempre uma causa de pedir complexa, integrada por factos tendentes a demonstrar: a) A existência de prédios confinantes; b) A pertença dos mesmos a donos diferentes; c) E, a incerteza, controvérsia, ou tão só desconhecimento sobre a localização da linha divisória entre eles. 3- Mas já não carecem de ser alegados quaisquer factos tendentes a comprovar a localização dessa linha. 4- Nesse aspeto, o juiz não está vinculado ao critério ou mesmo ao traçado da linha divisória indicada pelas partes, posto que, a esse respeito, a lei é imperativa: se essa linha não puder ser fixada a partir dos títulos de cada um dos proprietários, será sucessivamente estabelecida por recurso à posse ou outros meios de prova e, no limite, não podendo ser determinada por nenhum desses meios, será equitativamente dividida pelos proprietários confinantes. 5- Não integrando o traçado da linha divisória a causa de pedir da acção de demarcação, nunca os factos que o definem se podem ter como exclusivamente na disponibilidade de alegação e prova pelas partes. Ou dito por outras palavras, nunca se podem qualificar como factos essenciais, o que permite a aquisição oficiosa dos mesmos, desde que respeitados os demais condicionalismos legais, designadamente no plano do contraditório em relação à prova que a eles conduziu. 6- Por isso mesmo, o juiz pode também traçar uma linha divisória diversa da indicada pelas partes, sem que com isso ofenda o princípio do pedido.
6. Cf. Ac. T.R. de Coimbra, de 10.2.2009, in https://www.trc.pt/index.php/jurisprudencia-do-trc/direito-civil/143-ap554068tbandc1- A acção de demarcação tem como pressuposto o reconhecimento do direito de propriedade sobre o prédio cuja demarcação se pretende; No entanto, a finalidade específica da acção não é o reconhecimento desse direito, mas fazer funcionar o direito que o proprietário tem de obrigar os donos dos prédios confinantes a concorrerem para a demarcação das estremas entre os prédios (1353º, do Cód. Civil).Deduzido pedido de condenação dos réus no reconhecimento do direito de propriedade dos autores sobre um prédio, com uma determinada área, e a condenação dos réus na entrega aos autores da área ocupada e que estes invocam pertencer-lhe, estamos perante uma típica acção de reivindicação, tal como ela é configurada no art. 1311º do Cód. Civil. 3. Nada obsta a que se cumule esse pedido com pretensão deduzida com vista à demarcação, o que acontece quando o demandante peticiona ainda a condenação dos réus a “contribuírem para a demarcação dos dois prédios”.
7. Cf. Ac. Tribunal da Relação do Porto, de 9.4.2013, in http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/e85e1166d5c947c180257b6b0027ee9c?OpenDocument (…) III - Ainda que os autores tivessem movido uma primeira acção declarativa para reconhecimento da propriedade de certo prédio identificado por limites precisos, ficariam impedidos de, nesta acção, pretender a demarcação com outros limites, procurando alcançar a definição que, naquela, lhes foi recusada. IV - A extensão do caso julgado refere-se não apenas à indiscutibilidade da subsistência de certa afirmação, mas abrange também a sua extensão inversa, de modo a que, tendo a primeira sentença, transitada em julgado, deixado indiscutível que aos autores não assiste o direito a que se arrogam para a extensão do seu prédio e para a definição das suas estremas, é-lhes vedado reintroduzir a discussão dessa matéria com a adução de nuances que não alteram a essência da questão.
8. Cf. Ac. inédito, de 18.12.2017, no Proc. 3756/12.4TBGMR.G1
9. Ac. da Relação de Lisboa de 19/6/2014, 802/12.5TBLNH.L1-2, dgsi.net
10. Ac. da Relação de Coimbra de 18/10/2016:Processo 203848/14.2YIPRT.C1.dgsi.net
11. Ac.da Relação do Porto de 28/2/2008:CJ, 2008, 1º, 198
12. Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª Edição, 2017, pag 805
13. …e é, portanto, complemento da sua versão articulada