Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
205/07.3GAPTL-A.G1
Relator: NAZARÉ SARAIVA
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
PROCESSO PENAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/16/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO
Sumário: I - Actualmente, em processo penal, o pedido de apoio judiciário pode ser requerido até ao termo do prazo de recurso da decisão em primeira instância.
II – Se deferido, o apoio judiciário abrange as custas de todo o processo e não apenas as devidas após o requerimento.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência os Juízes da Relação de Guimarães.
No processo comum nº 205/07.3GAPTL, do 1º Juízo, do Tribunal Judicial de Ponte de Lima, os arguidos Carlos F..., Luzia B... e Natália S..., foram condenados, por sentença proferida em 11/07/08, além da pena, nas custas do processo.
O arguido Carlos F..., em 14/07/08, e as arguidas Luzia e Natália, em 11/07/08, requereram nos Serviços da Segurança Social a concessão do benefício do apoio judiciário, tendo sido concedido, ao primeiro, na modalidade de pagamento faseado de taxa de justiça e demais encargos do processo e pagamento faseado da compensação de defensor oficioso, e, à segunda e à terceira, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e pagamento da compensação de defensor oficioso.
Tendo sido juntas aos autos cópias das decisões que concederam o apoio judiciário, o Exmº Sr. Juiz a quo proferiu o despacho de fls 36, com o seguinte teor:
Declara-se a ineficácia do apoio judiciário concedido aos arguidos relativamente às quantias já liquidadas, atentas as razões invocadas na promoção antecedente, as quais se reproduzem aqui para todos os legais efeitos – neste sentido Salvador da Costa, O Apoio Judiciário, 5ª ed. pgs. 248/249”.
Por sua vez, a promoção para a qual remete o despacho tem o seguinte teor:
Promovo que se declare a ineficácia do apoio judiciário concedido relativamente às quantias liquidadas nos autos, considerando que a decisão que as motiva é anterior ou contemporânea dos pedidos do apoio judiciário, apoio este que, por conseguinte, valerá apenas para as condenações em custas posteriores aos requerimentos de apoio”.
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Os arguidos interpuseram recurso da aludida decisão.
A única questão suscitada é a de saber se a concessão de apoio judiciário requerido pelo arguido no decurso do prazo de recurso da decisão em primeira instância abrange ou não as custas em que o mesmo foi condenado na sentença.
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Respondeu o Ministério Público opinando no sentido da improcedência do recurso.
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Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que os recursos merecem obter provimento.
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Foi cumprido o artigo 417º, nº 2, do CPP, não tendo sido apresentada resposta.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
A única questão suscitada é a de saber se a concessão de apoio judiciário requerido pelo arguido no decurso do prazo de recurso da decisão em primeira instância abrange ou não as custas em que o mesmo foi condenado na sentença.
Ora, esta questão já foi objecto de apreciação no ac. desta Relação, de 31/10/05, proferido no Procº nº 1783/05, e relatado pelo Exmº Desembargador Fernando Monterroso, sendo que a ora relatora também o subscreveu na qualidade de adjunta.
Assim, uma vez que se continua a perfilhar o entendimento expresso em tal acórdão, que continua válido à luz do actual artº 44º da Lei 34/04, na redacção dada pela Lei nº 47/2007, de 28/08, limitamo-nos a trazer à colação o seu conteúdo:
“ Na vigência da Lei 30-E/90 de 20-12, tal como já acontecia no regime do anterior Dec.-Lei 387/87 de 29-12, o apoio judiciário poda ser requerido “ em qualquer estado da causa” – art. 17 nº 2.
Tal possibilidade suscitou a questão de saber que actos deviam ser abrangidos pelo apoio judiciário quando era requerido em fases já adiantadas do processo. A jurisprudência veio a fixar-se no entendimento de que o apoio judiciário só operava para o futuro, isto é a partir do momento em que tinha sido requerido.
Destinando-se o sistema de acesso ao direito e aos tribunais a promover que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, de conhecer, fazer valer ou defender os seus direitos, verdadeiramente, o requerente do apoio judiciário só necessitava dele para o que ainda tivesse de litigar. Fazer retroagir os seus efeitos ao início do processo equivaleria a uma isenção do pagamento das quantias já em dívida, o que nada tinha a ver com a possibilidade de defesa, dali para a frente, dos seus direito – por todos, v. ac. Rel. Porto de 4-10-00, CJ IV, pag 230. (…)
A Lei 34/04 de 29-7 estabeleceu um regime diferente: o apoio judiciário “ deve ser requerido antes da primeira intervenção processual” (art.18 nº 2), salvo se ocorrer facto superveniente. Mesmo neste caso, “ o apoio judiciário deve ser requerido antes da primeira intervenção processual que ocorra após o conhecimento da respectiva situação” (art. 18 nº 3).
Mas alguma excepção tinha de ser prevista para o processo penal, sob pena de existirem situações em que, simplesmente, seria negada a possibilidade de apoio judiciário a quem dele estivesse carente. Sendo actualmente, o apoio judiciário sempre decidido pelos serviços de segurança social (art. 20), casos haveria em que o arguido, na prática, estaria impedido de se dirigir àqueles serviços antes da primeira intervenção no processo. Seria assim, por exemplo, quando fosse detido em flagrante delito e apresentado nessa situação para primeiro interrogatório ou para julgamento em processo sumário (…). Esta questão nunca se pôs na Lei 30-E/90, porque durante a vigência da mesma os pedidos de apoio judiciário formulados pelos arguidos sempre foram “ apresentados, instruídos, apreciados e decididos perante a autoridade judiciária” (art. 57 nº 3). Isso permitia que o arguido, no próprio interrogatório ou do julgamento, requeresse ao juiz a concessão do apoio judiciário.
Essa a razão da norma do art. 44 nº 1 da nova Lei, que dispõe que se aplicam “ ao processo penal, com as necessárias adaptações, as disposições do capítulo anterior, com excepção do disposto nos nºs 2 e 3 do art. 18, devendo o apoio ser requerido até ao trânsito em julgado da decisão final”. Actualmente é a seguinte a redacção do art. 44º, nº 1 (redacção dada pela Lei nº 47/2007, de 28/08):Em tudo o que não esteja especialmente regulado no presente capítulo relativamente à concessão de protecção jurídica ao arguido em processo penal aplicam-se, com as necessárias adaptações, as disposições do capítulo anterior, com excepção do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 18º, devendo o apoio judiciário ser requerido até ao termo do prazo de recurso da decisão em primeira instância”.
Temos, pois que actualmente, ao contrário do que acontecia anteriormente, a lei fixa o momento até ao qual tem de ser requerido o apoio judiciário: na generalidade dos processos, até à primeira intervenção; no processo penal, até ao transito em julgado da sentença.
Actualmente, nos termos do art. 44º, nº 1 da Lei nº 34/2004, na redacção introduzida pela Lei nº 47/2007, de 28/08, «até ao termo do prazo de recurso da decisão em primeira instância».
Posto isto, não deve o aplicador da lei distinguir onde o legislador nenhuma razão viu para diferenciar. Fixando a lei um prazo final para a formulação do pedido do apoio judiciário, se o mesmo for respeitado, o deferimento abrangerá naturalmente todo o processo».
Ora, como no caso vertente o apoio judiciário foi requerido por todos os recorrentes no decurso do prazo do recurso da sentença, impõe-se concluir que tem de ser concedido provimento aos recursos.
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Decisão:
Pelo exposto, os Juízes deste Tribunal da Relação, concedendo provimento aos recursos, decidem que o apoio judiciário concedido aos arguidos/recorrentes abrange as custas em que foram condenados.
Não são devidas custas.