Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2692/12/9TJVNF.G1
Relator: ANTÓNIO SOBRINHO
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
ACIDENTE DE TRABALHO
INDEMNIZAÇÃO
ACÇÃO DE REGRESSO
SEGURADORA CIVIL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/12/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I – Assiste à seguradora do acidente de trabalho, que suportou indemnização pelo acidente que é também acidente de viação, o direito de acção de regresso contra a seguradora do responsável civil, em substituição do lesado que, no prazo de 1 ano, a contar do acidente, não exigiu judicialmente a indemnização global a que teria direito, tanto mais que não ficou demonstrado que houve duplicação ou acumulação material de indemnizações.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:


I – Relatório;

Recorrente: AA – Companhia de Seguros, S.A. (autora);
Recorrida: Companhia de Seguros BB, S.A. (ré);

*****

Pedido:
Nesta acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, a seguradora AA. demandou a seguradora BB., pedindo que:
a) Seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 358.467,31, acrescida dos juros de mora vincendos contados desde a data da citação da Ré e até integral e efectivo pagamento, calculados dia a dia, às taxas de juros comercial, sobre o capital em dívida.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença em que se julgou a acção improcedente e se absolveram os réus do pedido.

Inconformada com tal decisão, dela interpôs recurso a autora, de cujas alegações se extraem as seguintes prolixas conclusões:
1. Com fundamento, basicamente, no testemunho pessoal, e presencial aliás, prestado pelo condutor do automóvel garantido na ora apelante, deve o facto constante do item 10º da fundamentação factual desta sentença ser alterado, ou melhor, eliminado.
2. É quanto se pode com mediana clareza vir a extrair da audição das passagens consignadas no texto desta minuta de alegações, cumprindo o requisito legal, e transcritas da gravação respectiva, sob o índice de duração 00:31:19 e com respeito ao depoimento de Virgílio.
3. Tal consideração ou decisão de facto não sofre afectação, bem pelo contrário, da audição do depoimento da outra única testemunha que veio a presenciar também o sinistro ou a depor acerca dele, a saber de Alda sob o índice de gravação 00:34:58 – v. índice de gravação em anexo.
4. Eliminado que seja tal ponto de facto, contido sob o dito item 10º da fundamentação factual da sentença, a decisão de direito, na estrita medida da ocorrência rodoviária ajuizanda, deve(rá) recair no disposto pelo art.506º CCivil, repartindo-se a responsabilidade em medida igual para ambos os veículos.
5. De todo o modo, e dado que o sinistro rodoviário foi igualmente um acidente de trabalho, com diversas trabalhadoras e/ou operárias fabris nele lesadas por atropelamento, nunca nenhuma indemnização pode vir a ser conferida à congénere laboral, ou por ela recebida, em função dum alegado direito de regresso que é em absoluto inexistente, in casu.
6. Com efeito, do que se trata, aqui, entre ambas as partes e/ou as duas seguradoras ora em lide, seja por acidente automóvel rodoviário e laboral, não é dum direito de regresso, mas sim duma sub-rogação legal em que a ora Autora e aqui apelada actua em representação/substituição do credor primitivo, ou trabalhadora lesada originária, que são três – v. as três diversas indemnizações, independentes entre si, contidas na decisão recorrida, perfazendo um total (global) condenatório a final.
7. Ora, atentos não só toda a jurisprudência citada no texto (e aliás também logo no articulado de contestação da acção, de resto, o que se deve sublinhar por ser contrário ao que se diz na sentença recorrida…) ou aqui em anexo, como o regime previsto nos arts. 589º segs. CCivil, são oponíveis à seguradora laboral, que actua só em função do direito sub-rogado, i.e. do direito que assistia ao credor originário, todas as excepções que se poderiam opor a este, e nos seus precisos termos – v., outra vez, o teor do articulado de contestação, que o Tribunal a quo desconsidera na sua decisão (v. expressão de que a impossibilidade de serem cumuladas indemnizações «não está aqui em causa, ou não foi devidamente sustentada pela mesma» - cf. pág. 18 da sentença).
8. É quanto pode e deve extrair-se duma interpretação actualizante e mais abalizada do disposto no art. 31º da Lei 100/97, que não dispõe a favor da seguradora laboral que ressarciu o trabalhador em acidente de trabalho dum direito de regresso contra a seguradora da pessoa que é tida como responsável pelo acidente de viação, mas sim dum direito de sub-rogação legal que é definido pelo disposto no art.592º CCivil e pelo qual adquire, tão somente, os poderes que ao credor original competiam e na medida da satisfação já dada ao direito respectivo.
9. E se não podiam, pois, as trabalhadoras lesadas vir a repetir uma acção indemnizatória (contra a mesma Ré seguradora do responsável pelo mesmo acidente de viação e de trabalho), uma indemnização já recebida, e da qual deram total quitação, seja extrajudicial seja judicialmente, pois também não pode, por maioria de razão e atento tal regime legal e sua mais acostumada interpretação jurisprudencial, supra citados, vir a seguradora laboral demandar a sua congénere por acidente de viação, dado estar meramente sub-rogada nos mesmos direitos das trabalhadoras em questão, ou credores primitivos.
10. As verbas incluídas na sentença, e formando um só todo global, no seu dispositivo condenatório a final, não poderiam vir a ser repetidas por tais credores depois de formuladas ou integradas que foram já nas acções judiciais e/ou na composição extrajudicial respectivas, dando-se ou retirando-se dali a existência de quitação total, como os autos dão já a devida notícia.
Pede que a Ré e ora apelante seja absolvida do pedido ou pedidos deduzidos na acção.

Houve contra-alegações, defendendo-se a confirmação do julgado.

II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar;

O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos do artº 639º, do Código de Processo Civil (doravante CPC).

As questões suscitadas pela Recorrente radicam no seguinte:
1. Alteração da matéria de facto;
2. Não reembolso da ré, seguradora do acidente de viação, à seguradora laboral;

Colhidos os vistos, cumpre decidir.


III – Fundamentos;


1. De facto;

A factualidade dada como assente na sentença recorrida é a seguinte:

Factos julgados assentes no saneador (art. 659º, nº 3, do C.P.C., redação anterior)
A. A sociedade …Seguros, S.A.", …foi incorporada, por fusão, na "AA - Companhia de Seguros, S.A.", por escritura pública de fusão, aumento de capital e alteração parcial do contrato de sociedade outorgada no dia 31 de Dezembro de 2009, lavrada de fls. 50 a fls. 58 do Livro de Notas para Escrituras Diversas n.° 80-B do Cartório Notarial de Carlos Manuel da Silva Almeida.
B. A Autora é uma Sociedade que se dedica à atividade seguradora.
C. No exercício da sua atividade, a, à data, "… Seguros, S.A." celebrou com a sociedade "… Industrial Produção de Vestuário, S.A.", o contrato de seguro titulado pela apólice n.° 10/071356, nos termos do qual assegurou a cobertura do risco completo dos danos traumatológicos causados aos trabalhadores daquela indicados nas respectivas folhas de salários.
D. Em Dezembro de 2008, a referida Sociedade participou à Autora um sinistro ocorrido às 12.50h do dia 29 de Dezembro de 2008 com as trabalhadoras ao seu serviço, Mónica, Maria, Lucinda, Maria Silva e Maria Veloso.
E. O acidente de trabalho deu-se quando, na data e horas mencionadas, as referidas trabalhadoras regressavam às instalações da Segurada da Autora, após a pausa do almoço, para retomarem a sua atividade.
F. O percurso efetuado pelas trabalhadoras sinistradas era o percurso habitual a ligar os dois referidos pontos.
G. A Autora verificou que as aludidas sinistradas constavam das folhas de salários que a sua Segurada lhe havia apresentado.
H. Na mencionada oportunidade, cerca das 12.50h no dia 29 de Dezembro de 2008, ocorreu um acidente de viação na Rua da Fábrica, em Ribeirão, Vila Nova de Famalicão, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 44-31-…, à data conduzido por Virgílio, o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 70-54-…, à data conduzido por Alda e as trabalhadoras supra identificadas.
I. No local do sinistro, a estrada configura uma reta, com boa visibilidade.
J. No referido local, existe um parque de estacionamento em terra, do lado direito da via, atento o sentido de marcha Fradelos-E.N. 14, junto à entrada para as instalações da fábrica da Segurada da Autora.
K. O referido parque de estacionamento tem uma largura de cerca de 5 metros.
L. Ainda no local do sinistro, junto à entrada para as instalações da "Ricon" e imediatamente antes do parque de estacionamento existe um ilhéu em terra.
M. A estrada tem dois sentidos de trânsito, encontrando-se dividida em duas hemifaixas de rodagem em cada um dos sentidos, separadas entre si por linha longitudinal descontínua.
N. O piso é asfaltado e, na referida data, encontrava-se em bom estado de conservação e molhado uma vez que se encontrava a chover.
O. A via tem uma largura de cerca de 7 metros,
P. Sendo ladeada por bermas.
Q. O veículo PJ, conduzido por Virgílio …, seguia na Rua da Fábrica, no sentido Fradelos-E.N. 14.
R. Ao acercar-se do local onde veio a ocorrer o acidente, ao aperceber-se da presença do QF, o condutor do veículo PJ tentou contorná-lo.
S. O veículo PJ foi projetado para uma ribanceira aí existente, onde se veio a imobilizar.
T. O embate nas trabalhadoras ocorreu a cerca de 9 metros do local em que o veículo PJ embateu no veículo XV.
U. Em consequência do sinistro, a trabalhadora sinistrada Lucindasofreu diversos ferimentos, designadamente fratura do colo do úmero direito, fratura da tíbia direita e contusão da mão esquerda.
V. Que lhe provocaram Incapacidade Temporária Absoluta para o Trabalho desde 30.12.2008 a 02.05.2010, data em que lhe foi atribuída alta médica com uma Incapacidade Permanente Parcial de 16,18%.
W. A trabalhadora sinistrada foi assistido em diversas instituições, públicas e privadas, destacando-se o Hospital de Famalicão, Hospital da Trofa e Serviços Clínicos da Autora (Hospital de Santa Maria e Casa de Saúde da Boavista).
X. E durante todo o tempo em que se manteve em recuperação necessitou de medicamentos e produtos farmacêuticos.
Y. Dada a natureza do acidente em apreço, correu termos pelos Serviços do Ministério Público do Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Famalicão, o respectivo processo de acidente laboral, no qual a ora Autora foi Ré.
Z. Estando a cobertura do risco completo dos danos traumatológicos causados aos trabalhadores da sociedade "… Industrial Produção Vestuário, S.A." transferida para a ora Autora, por conciliação homologada por sentença, as partes acordaram no pagamento pela Autora: Da quantia de € 13.491,99, a título de capital de remição; Da quantia de € 17,50, a título de despesas com transportes.
AA. Com fundamento na aludida sentença, a Autora procedeu ao pagamento à trabalhadora sinistrada da quantia de € 13.491,99 a título de capital de remição.
BB. Verificado o enquadramento do sinistro nas garantias da apólice 10/104751, a Autora, honrando os compromissos assumidos e em consequência do acidente de trabalho em apreço, despendeu, até à presente data, a quantia global de € 47.746,31, correspondente às seguintes importâncias parcelares: € 7.469,66, a título de indemnização pela Incapacidade Temporária Absoluta para o Trabalho entre 30.12.2008 a 02.05.2010; € 13.491,99, a título de capital de remição; €3.000,00, a título de despesas com assistência de 3.§ pessoa; €8.693,69, a título de honorários com intervenções cirúrgicas; €10.401,43, a título de despesas com assistência médica; € 17,66, a título de despesas com medicamentos; € 4.545,78, a título de despesas com transportes; € 11,00, a título de despesas com alimentação; e € 132,60, a título de despesas judiciais.
CC. Em consequência do sinistro, a trabalhadora sinistrada Mónicasofreu graves e diversos ferimentos, designadamente traumatismo cervical e da hemi-face direita, designadamente fratura do colo do úmero esquerdo, fratura do fémur direito, fratura da grade costal com perfuração pulmonar e fratura da bacia.
DD. Que lhe provocaram Incapacidade Temporária Absoluta para o Trabalho desde 30.12.2008 a 28.02.2010, data em que lhe foi atribuída alta médica com uma Incapacidade Permanente Parcial de 62,13% com IPATH.
EE. A trabalhadora sinistrada foi assistida em diversas instituições, públicas e privadas, destacando-se o Hospital de Braga, Centro Hospitalar do Médio Ave, Hospital Privado da Trofa e Serviços Clínicos da Autora.
FF. E durante todo o tempo em que se manteve em recuperação necessitou de medicamentos e produtos farmacêuticos.
GG. Dada a natureza do acidente em apreço, correu termos pelo Tribunal do Trabalho de Santo Tirso, o respectivo processo de acidente laboral, sob o n.° 831/09.6TTVNF, no qual a ora Autora foi Ré.
HH. Estando a cobertura do risco completo dos danos traumatológicos causados aos trabalhadores da sociedade "… Industrial Produção Vestuário, S.A." transferida para a ora Autora, por sentença transitada em julgado foi a Autora condenada a pagar: uma pensão, anual e vitalícia, de € 4.967,86; subsídio por elevada incapacidade no montante de € 5.112,00; a quantia de € 100,00 a título de despesas com transportes; e Juros.
II. Verificado o enquadramento do sinistro nas garantias da apólice 10/104751, a Autora, honrando os compromissos assumidos e em consequência do acidente de trabalho em apreço, despendeu, até à presente data, a quantia global de € 65.197,64, correspondente às seguintes importâncias parcelares:- € 6.365,97, a título de indemnização pela Incapacidade Temporária Absoluta para o Trabalho entre 30.12.2008 a 28.02.2010; € 12.633,94, a título de pensão; € 92,43, a título de acertos de indemnizações; € 5.112,00, a título de subsídio de elevada incapacidade; € 11.932,35, a título de honorários com intervenções cirúrgicas; € 250,00, a título de despesas de médicos e enfermeiros; € 148,57, a título de subsídios; € 16.741,89, a título de despesas com assistência médica; € 331,63, a título de despesas com medicamentos;€ 7.913,07, a título de despesas com transportes; € 82,60, a título de despesas com alimentação e alojamento; € 112,04, a título de despesas diversas; €180,00, a título de despesas com juntas médicas; € 994,05, a título de juros; e € 2.307,10, a título de despesas judiciais.
JJ. A Autora constituiu provisões matemáticas para garantia do pagamento dessas pensões, ascendendo, atualmente, a provisão matemática destinada a assegurar o pagamento da pensão a € 80.270,68.
KK. Em consequência do sinistro, a trabalhadora sinistrada sofreu graves e extensos ferimentos, Maria… designadamente traumatismo na coluna, fratura de D6 e D7 e consequente paraplegia, fratura no ombro esquerdo, traumatismo nas regiões torácica e abdominal.
LL. Que lhe provocaram Incapacidade Permanente Absoluta de 100%.
MM. A trabalhadora sinistrada foi assistida em diversas instituições, públicas e privadas, destacando-se o Hospital de Braga, Hospital de Póvoa de Varzim, Hospital de Santo António, Hospital de São Martinho e Serviços Clínicos da Autora (Hospital de Santa Maria e Casa de Saúde da Boavista).
NN. E durante todo o tempo em que se manteve em recuperação necessitou de medicamentos e produtos farmacêuticos.
OO. Dada a natureza do acidente em apreço, correu termos pelos Serviços do Ministério Público do Tribunal do Trabalho de Matosinhos, o respectivo processo de acidente laboral, sob o n.° 422/10.9TUMTS, no qual a ora Autora foi Ré.
PP. Estando a cobertura do risco completo dos danos traumatológicos causados aos trabalhadores da sociedade "… Industrial Produção Vestuário, S.A." transferida para a ora Autora, por conciliação homologada por sentença, as partes acordaram no pagamento pela Autora: Da pensão anual atualizável de € 6.364,20, acrescida da pensão anual de € 795,53, para a filha Juliana Pontes; Do subsídio de elevada incapacidade no valor de € 5.112,00; Do subsídio de assistência de 3.§ pessoa, no montante de € 6.790,00; Do valor para obras de readaptação de € 5.112,00; Dos valores devidos pelas ajudas técnicas; Das despesas de transporte, do valor de € 40,00.
QQ. Verificado o enquadramento do sinistro nas garantias da apólice 10/104751, a Autora, honrando os compromissos assumidos e em consequência do acidente de trabalho em apreço, despendeu, até à presente data, a quantia global de € 245.523,36, correspondente às seguintes importâncias parcelares: € 11.529,70, a título de indemnização pela Incapacidade Temporária Absoluta para o Trabalho entre 30.12.2008 a 20.03.2011; € 20.459,15, a título de pensões; € 809,08, a título de subsídios; € 5.112,00, a título de subsídio por elevado grau de incapacidade; € 21.263,19, a título de honorários com intervenções cirúrgicas; € 60.632,27, a título de despesas com assistência médica; € 40,00, a título de despesas com honorários de médicos e enfermeiros; € 200,00, a título de assistência vitalícia com honorários médicos e enfermeiros; € 117.207,46, a título de despesas de assistência vitalícia com despesas de assistência médica; € 371,64, a título de despesas com assistência vitalícia com próteses e ortóteses; € 4.664,20, a título de despesas com transportes; € 1.403,45, a título de despesas com assistência vitalícia de transportes; € 1.587,52, a título de despesas diversas; e € 244,80, a título de despesas judiciais.
RR. A Autora constituiu provisões matemáticas para garantia do pagamento dessas pensões, ascendendo, atualmente, a provisão matemática destinada a assegurar o pagamento da pensão a € 115.529,32
SS. O proprietário do veículo ligeiro de passageiros de matrícula 44-31-… havia transferido o risco emergente da circulação do mesmo para a ora Ré "Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A.", através do contrato de seguro do ramo automóvel titulado pela apólice 5070/…
2.2. Factos da Base Instrutória e articulados submetidos a julgamento
1. O local caracteriza-se como uma localidade, sendo a estrada ladeada por edificações com acesso à estrada.
2. Encontrando-se a velocidade máxima instantânea limitada a 50 kms/h.
3. Junto à entrada para as instalações da "Ricon" existe uma passagem destinada à circulação de peões.
4. Nas circunstâncias descritas, momentos antes da ocorrência do acidente, o veículo QF, conduzido por Alda …, seguia na Rua da Fábrica, no sentido Fradelos-E.N. 14.
5. Ao acercar-se do local onde veio a ocorrer o sinistro, e pretendendo estacionar o referido veículo no parque de estacionamento supra referido a condutora do veículo QF acionou a luz indicadora de mudança de direção à direita ("pisca").
6. Reduziu a velocidade que lhe imprimia.
7. Imobilizando o veículo QF próximo à entrada para as instalações da "Ricon", junto à berma de terra, em parte em cima da mesma (tal com se configura no croquis de fls. 567/veículo 2).
8. E manteve-se nesse local a aguardar a passagem de peões que passavam na referida berma.
9. A condutora do veículo QF sinalizou a presença daquele.
10. Face à velocidade imprimida ao veículo PJ e a desatenção da distância deste em relação ao QF o condutor do veículo PJ permitiu (na manobra referida supra em 2.1.R.) que este embatesse naquele e perdeu o seu controlo.
11. Nesse momento embateu com a sua frente e lateral esquerda na lateral (espelho retrovisor esquerdo) e frente lateral esquerda, mais precisamente na roda esquerda da frente, do veículo QF.
12. Ato contínuo entrou em despiste, para a direita, atento o seu sentido de marcha, e embateu num veículo automóvel que se encontrava estacionado no parque de estacionamento (…-04-22).
13. Face à violência do embate o veículo XV rodopiou sobre si mesmo.
14. O veículo PJ prosseguiu a sua marcha desgovernada, "colhendo" 5 trabalhadoras que circulavam na berma direita da faixa de rodagem, atento o sentido de marcha Fradelos-E.N. 14.
15. A ré já pagou, por acordo extrajudicial, uma indemnização por danos sofridos pela sinistrada Mónica Cristina Santos Vilaça.
16. O veículo seguro na Ré seguia a uns 70-80 kms/hora.
17. O QF tinha a roda dianteira esquerda saída para fora da cava do guarda-lamas respectivo.
18. O QF foi embatido nesse pneu.
19. E, pela torção do pneu, deslocando-o do seu eixo, ocorreu a quebra e arrancamento da suspensão dianteira e do para-choques, num movimento de trás para diante do seu canto ou aba imediatamente adjacentes ao pneu.
20. Com esse impacto na roda dianteira esquerda do QF, o segurado na Ré torceu à direita e foi, já desgovernado, invadir a berma respetiva, atropelando aí os peões, nos termos acima expostos.
21. Lucinda … intentou contra a Ré ação emergente de acidente de viação acima descrito, em 9.5.2011.
22. Maria … intentou o mesmo tipo de ação, por causa do mesmo acidente, contra a Ré, em 4.11.2011.

2.3. Factos Não Provados
1. No local as edificações têm acesso direto à estrada.
2. No local, a velocidade máxima instantânea limitada a 50 kms/h está sinalizada por sinais verticais colocados em toda a extensão da Rua da Fábrica.
3. A condutora do QF seguia a uma velocidade não superior a 40 Kms.
4. A condutora do QF aguardava a passagem de peões que estavam a atravessar a via no local.
5. A paragem do QF não constituía obstáculo para o trânsito no local, designadamente para quem circulava no sentido Fradelos-E.N. 14.
6. O Virgílio … imprimia ao PJ velocidade superior a 100 Kms/hora.
7. Que foi somente face à velocidade imprimida ao veículo PJ (superior a 100 kms) o condutor do veículo PJ perdeu o seu controlo.
8. Que o PJ embateu na frente do veículo QF.
9. Que o PJ embateu com a sua frente lateral direita no ,,,-04-22.
10. Que quando ia adiantar-se ao QF, passando ao lado do mesmo, o GOLF iniciou de súbito uma manobra de estacionamento em marcha atrás.
11. Saindo da sua posição paralela à via e nela torcendo em direção ao estacionamento em espinha que era efetuado na berma térrea, adiante da entrada do estabelecimento fabril da "RINCÓN".
12. O GOLF rodou à direita, rodopiando sobre a via em marcha atrás e foi nela ocupar uma dada porção de espaço que antes estava vago.
13. (…) E com o seu canto dianteiro esquerdo a aproximar-se progressivamente do eixo da via, para dela depois sair na perpendicular da mesma e assim ocupar a berma direita respectiva.
14. O QF apenas foi embatido no lado traseiro e lateral desse pneu, quando o canto do veículo rodopiou na via.
15. Que ocorreu a quebra do semieixo do QF.
16. Nenhuma outra parte da carroçaria do QF foi embatida, destruída ou danificada por choque ou colisão.
17. Ao mesmo tempo que, do lado contrário, um terceiro veículo se aproximava na hemifaixa de rodagem contrária para com eles se cruzar e assim mais diminuindo o espaço de cruzamento ou ultrapassagem entre veículos.
*****

2. De direito;

a) Se se verifica a pretendia alteração da matéria de facto quanto ao ponto 10 dos factos provados;

Pretende a recorrente que se proceda à reapreciação e alteração da matéria de facto fixada na sentença recorrida, nos termos do artº 662º do CPC, defendendo que o ponto 10 dos factos assentes deve ser alterado, eliminado, com base no depoimento da testemunha Virgílio …, condutor do veículo de matrícula 70-54-…, no confronto com o depoimento da testemunha Alda …, condutora do veículo de matrícula 44-31-PJ.
O aludido factualismo daquele ponto 10 tem a seguinte redacção:
«10. Face à velocidade imprimida ao veículo PJ e a desatenção da distância deste em relação ao QF o condutor do veículo PJ permitiu (na manobra referida supra em 2.1.R.) que este embatesse naquele e perdeu o seu controlo».
A recorrente baseia, assim, a alteração de tal matéria de facto, esgrimindo que o relato do aludido condutor sobre a dinâmica do acidente é o objectivo, o coerente e o verosímil.
Porém, ouvido e examinado o relato desta testemunha sobre tal factualidade, desde logo no confronto com o depoimento da outra condutora, Alda …, temos que o aludido Virgílio …, além de prestar um depoimento genérico, titubeante e sem espontaneidade, limitou-se frequentemente a responder no sentido de perguntas sugestivas na versão do acidente que lhe era favorável, com expressões como “Se o carro se movimentou (…)”;” se há uma hora trabalhasse, estava a estacionar” (resposta à pergunta se a condutora do QF estava a sair ou entrar); “o carro, depois do embate no QF, despistou-se e foi directo para o campo” (depois, a instâncias do Exmº mandatário da A., já admite que o seu carro, depois do embate, ‘bateu’ em 5 pessoas, que estavam a atravessar na berma do seu lado direito, colide com outro veículo estacionado, e só depois é que foi para o campo).
Na sua narração do acidente sobressai apenas a sua preocupação em imputar o acidente à manobra da outra condutora, afirmando que a mesma estava parada, com o veículo inclinado em relação ao eixo da via e que terá invadido a sua metade da faixa de rodagem, quando transitava junto ao outro veículo, batendo-lhe na roda, mas sendo incapaz de referir, de modo natural e espontâneo, que o embate nesse veículo QF se dá em primeiro lugar no espelho retrovisor. Fá-lo só depois a pergunta sugerida.
Aliás, embora seja afirmativo em declarar que o veículo QF estava inclinado, o testemunho do referido do condutor Virgílio Cruz não é assertivo e concludente, em relação à referida imputação de culpa à outra condutora, limitando-se, enfim, a concluir condicionalmente que, se colidiu com o mesmo, foi porque a dita condutora invadiu a sua metade da faixa de rodagem. Mas não o afirmou categoricamente.
Ao invés, no cotejo com o depoimento da outra condutora interveniente, Alda …, conclui-se que o relato desta, além de mais objectivo, preciso e consistente, revela-se mais credível, sendo peremptório na afirmação de que estava parada, a deixar passar os peões e que não tinha encetado qualquer manobra de marcha atrás, quando foi embatida: “Não, eu não estava com a marcha atrás metida”; “Mas eu não estava a começar o movimento de marcha atrás”; estava (ainda parada), sim senhor”.
Neste contexto, importa ainda não descurar o que, em sede de motivação da matéria de facto, o tribunal recorrido relevou – por tal sufragarmos - quanto à contraditoriedade e inconsistência das diversas declarações emitidas pelo condutor do PJ sobre o modo de ocorrência do acidente: «Nos itens 2.2.4. a 2.2.9., temos em consideração o depoimento da testemunha Alda Santos, condutora do QF, que nos mereceu crédito nessa descrição dos factos, inabalada por qualquer outra prova produzida e em parte sustentada na experiência comum. Note-se que a única testemunha que tentou contrariar parte dessa versão dos acontecimentos, o condutor do PJ, que estranhamente abandonou o local do acidente, tem depoimentos bastante contraditórios com o que ficou escritos em diversos registos documentais da sua versão do acidente, desde a participação da G.N.R. (fls. 566/549), passando pelas documentas investigações das seguradoras envolvidas e pela declaração amigável que subscreveu em 31.12.2008 e foi junta a fls. pela própria Ré (nestas a testemunha Virgílio não é tão assertiva sobre a alegada manobra inusitada do QF que teria contribuído para o choque, dá a entender que não viu, apenas a “supõe”, depois de dizer, como repetiu em todas as suas declarações, que o mesmo estava “parado”. De resto, essa versão não é consentânea com os dados objetivos do acidente: caso o veículo tivesse enviesado, com a sua frente próxima do eixo da via, na altura do choque, de certeza que os danos que apresentaria não seriam os que revelam as imagens juntas aos autos (v.g. fls. 533 e ss.), teriam certamente esmagado a sua lateral, frente, direita (!) e não, somente, partido o retrovisor e a suspensão da roda esquerda da frente do mesmo QF, danos que denunciam uma passagem do PJ de raspão pelo QF, embatendo primeiro no espelho retrovisor esquerdo e depois no pneu, sobressaído.
No item 2.2.10., temos em conta o que demais ficou assente como sobre a forma como o acidente ocorreu para concluir que a velocidade e desatenção do condutor do PJ, perante um QF que nos convencemos estar imobilizado nos termos apurados, terão sido a causa da perigosa proximidade entre as viaturas nessa ultrapassagem e posterior choque e despiste (cf. art. 349º, do Código Civil)».

Assim, face ao expendido, ante os meios de prova recolhidos nos autos e a sua livre apreciação – artº 607º, nº 5, do CPC, mostrando-se adequada a sua valoração, decide-se manter a sentença quanto à decisão de facto, nomeadamente o assinalado ponto de facto nº 10.

Consequência do exposto, a pretendida repartição, em partes iguais, de responsabilidades pelos danos causados, nos termos do artº 506º, do Código Civil (CC) não procede.

b) Não reembolso da ré, seguradora do acidente de viação, à seguradora laboral;

Esgrime a apelante, seguradora do terceiro responsável pelo acidente de viação, que, sendo o sinistro rodoviário igualmente um acidente de trabalho, com diversas trabalhadoras e/ou operárias fabris nele lesadas por atropelamento, nenhuma indemnização pode vir a ser atribuída à congénere laboral, ou por ela recebida, em função dum alegado direito de regresso, apenas podendo a autora, seguradora laboral, que pagou, ter direito a ser reembolsada só daquelas lesadas.
Mais argumenta de que não se trata dum direito de regresso, mas sim duma sub-rogação legal, em que a aqui autora/apelada actua em representação/substituição do credor primitivo, ou trabalhadora lesada originária, que são três, independentes entre si, contidas na decisão recorrida.
Não se discutindo a caracterização do acidente em causa como sendo também de trabalho, preceitua o art. 31.º, n.º 1, da Lei n.º 100/97, de 13.09 [Lei de Acidentes de Trabalho (LAT) aplicável, por ser a vigente à data do sinistro – cfr. ainda “a contrario” os artºs 187º e 188º da Lei nº 98/2009, de 04.09]: que “quando o acidente for causado por outros trabalhadores ou terceiros, o direito à reparação não prejudica o direito de acção contra aqueles, nos termos da lei geral”.
O seu nº 4 estabelece que “a entidade empregadora ou a seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente tem o direito de regresso contra os responsáveis referidos no nº 1, se o sinistrado não lhes houver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano a contar da data do acidente” – o que se verificou, em relação às sinistradas Lucinda Crespo e Maria de Lurdes Pontes, atenta a factualidade provada nos pontos 2.2.20 e 2.2.21 supra.
Ou seja, as respectivas acções emergentes de acidente de viação foram intentadas em 09.05.2011 e 04.11.2011, tendo o acidente ocorrido em 29.12.2008.
Já no que concerne à sinistrada Mónica …, sufragamos a posição perfilhada pelo tribunal recorrido de que in casu é irrelevante o factualismo apurado no ponto 2.2.15 supra (a ré pagou, por acordo extrajudicial, uma indemnização por danos sofridos pela sinistrada Mónica …).
Cremos ser pacífico a nível jurisprudencial que não pode haver uma cumulação de indemnizações por acidente de viação e por acidente laboral, emergentes do mesmo tipo de danos.
Também é uniforme o entendimento, desde logo do STJ, de que, no caso de concorrência de responsabilidades por acidente de viação e de trabalho, predomina a responsabilidade subjectiva do terceiro sobre a responsabilidade objectiva da entidade patronal, tendo esta última carácter subsidiário ou residual.
No caso em análise, como decorre da sentença recorrida, não está em causa em bom rigor uma cumulação de compensações, na medida em que a autora/apelada, seguradora laboral, pagou a indemnização pelo acidente, exercendo agora o direito de regresso sobre o terceiro responsável, mais propriamente a seguradora deste, aqui recorrente, não logrando esta demonstrar que suportou esses mesmos danos, nomeadamente de natureza patrimonial, no tocante às aludidas sinistradas.
Em suma, é o que resulta da previsão normativa contemplada no citado artº 31º, nº 4, da Lei nº 100/97.

Sobre esta temática, é elucidativo o douto Acórdão do STJ de 11-12-2012, proc.40/08.1TBMMV.C1.S1, in dgsi.pt, cujo sumário, dada a sua clareza, se transcreve:
«1. As indemnizações consequentes ao acidente de viação e ao sinistro laboral – assentes em critérios distintos e cada uma delas com a sua funcionalidade própria – não são cumuláveis, mas antes complementares até ao ressarcimento total do prejuízo causado, pelo que não deverá tal concurso de responsabilidades conduzir a que o lesado/sinistrado possa acumular no seu património um duplo ressarcimento pelo mesmo dano concreto.
2. A responsabilidade primacial e definitiva pelo ressarcimento dos danos decorrentes de acidente de viação que igualmente se perspectiva como acidente de trabalho é a que incide sobre o responsável civil, quer com fundamento na culpa, quer com base no risco, podendo sempre a entidade patronal ou respectiva seguradora repercutir aquilo que, a título de responsável objectivo pelo acidente laboral, tenha pago ao sinistrado – pelo que esta fisionomia essencial do concurso ou concorrência de responsabilidades (que não envolve um concurso ou acumulação real de indemnizações pelos mesmos danos concretos) preenche, no essencial, a figura da solidariedade imprópria ou imperfeita.
3. O interesse protegido através da consagração da regra da proibição de duplicação ou acumulação material de indemnizações é, não o do lesante, responsável primacial pelos danos causados, mas o da entidade patronal (ou respectiva seguradora) que, em termos de responsabilidade meramente objectiva, garantem ao sinistrado o recebimento das prestações que lhe são reconhecidas pela legislação laboral – pelo que não assiste ao lesante o direito de, no seu próprio interesse, se desvincular unilateralmente de uma parcela da indemnização decorrente do facto ilícito com o mero argumento de que um outro responsável já assegurou, em termos transitórios, o ressarcimento de alguns dos danos causados ao lesado – sendo antes indispensável a iniciativa do verdadeiro titular do interesse protegido (traduzida, ou na dedução de oportuna intervenção principal na causa, ou no exercício do direito ao reembolso contra o próprio lesado que obteve indemnização pela totalidade do dano ou na propositura de acção de regresso em substituição do lesado que, no prazo de 1 ano, não mostrou interesse no exercício do seu direito à indemnização global a que teria direito).
4. Aliás, o reconhecimento ao lesante da faculdade de opor ao lesado a excepção peremptória de recebimento da indemnização laboral - alegando na contestação e provando cabalmente que os danos peticionados abrangiam prestações decorrentes da legislação laboral, já integralmente satisfeitas pela entidade patronal ou respectiva seguradora - sempre teria de depender de uma condição fundamental: ser permitido ao titular do direito de regresso ou reembolso efectivá-lo no confronto do lesante ou respectiva seguradora; é que, a não se entender assim, o regime legal conduziria a um resultado anómalo e materialmente inadmissível, traduzido em o abate da indemnização laboral no quantitativo global peticionado pelo lesado acabar por reverter em benefício do próprio lesante, autor do facto ilícito.
5. São factos impeditivos da procedência total da pretensão do lesado, profundamente diferentes no seu significado jurídico, a mera invocação do recebimento pelo lesado de indemnização laboral que se pretende abater ao valor global da indemnização civil peticionada e a invocação do efectivo reembolso ao responsável pelo acidente de trabalho das quantias que este pagou adiantadamente ao sinistrado, já que, nesta situação, está obviamente excluída a possibilidade de a entidade patronal vir ulteriormente pedir qualquer reembolso ao lesado, nos termos do art. 31º do Lei n.º 100/97, pelo que a desconsideração deste facto – extintivo do direito ao reembolso concedido à entidade patronal – conduziria inelutavelmente a efeito manifestamente incompatível com o princípio fundamental, vigente nesta sede, da não duplicação ou acumulação material de indemnizações.
6. São de considerar como danos diferentes o que decorre da perda de rendimentos salariais, associado ao grau de incapacidade laboral fixado no processo de acidente de trabalho e compensado pela atribuição de certo capital de remição, e o dano biológico decorrente das sequelas incapacitantes do lesado que – embora não determinem perda de rendimento laboral - envolvem restrições acentuadas à capacidade do sinistrado, implicando esforços acrescidos, quer para a realização das tarefas profissionais, quer para as actividades da vida pessoal e corrente».

No mesmo sentido, vide também o douto Acórdão do STJ de 23.02.2012, proc.31/05.4TAALQ.L2,S1, in dgsi.pt.

Assim, ao invés do ora expendido, o douto Acórdão do STJ de 05.05.2005, Recurso nº 1186/05, invocado pela recorrente em defesa da sua alegação, assenta, desde logo, noutra premissa, já que parte do pressuposto de que a vítima instaurou acção cível dentro do prazo de um ano a contar do acidente contra o responsável civil (ou a sua seguradora).

Ademais, falece a argumentação da recorrente (de que a recorrida deve ser reembolsada pelas lesadas), na medida em que, não só não está demonstrado que estamos perante um pedido de reembolso de danos da mesma natureza, como também não se provou que a seguradora do responsável pelo acidente de viação ressarciu as lesadas de tais danos.

Há, assim, um direito de reembolso (seja ele um direito de regresso ou mais propriamente um direito de sub-rogação) por parte da seguradora da entidade patronal das sinistradas, em relação à seguradora do terceiro lesante, aqui apelante/ré.


Porquanto se deixa exposto, não procede a apelação.

Sintetizando:

I – Assiste à seguradora do acidente de trabalho, que suportou indemnização pelo acidente que é também acidente de viação, o direito de acção de regresso contra a seguradora do responsável civil, em substituição do lesado que, no prazo de 1 ano, a contar do acidente, não exigiu judicialmente a indemnização global a que teria direito, tanto mais que não ficou demonstrado que houve duplicação ou acumulação material de indemnizações.
*****

IV – Decisão;

Em face do exposto, na improcedência da apelação, acordam os Juízes desta 1ª secção cível em confirmar a sentença recorrida.

Custas pela apelante.

Guimarães, 12.02.2015
António Sobrinho
Isabel Rocha
Jorge Teixeira