Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
84/14.4TBBCL-C.G1
Relator: PEDRO ALEXANDRE DAMIÃO E CUNHA
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
TAXA DE JUSTIÇA
FALTA DE PAGAMENTO DA TAXA DE JUSTIÇA
DESENTRANHAMENTO DO REQUERIMENTO INICIAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/20/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: “I. Para efeitos de pagamento de taxa de justiça, os Embargos de executado não são equiparáveis à petição inicial em acção declarativa, mas sim à contestação, donde resulta que lhe deverá ser aplicável o regime do art. 570º do CPC.
II- Não pode, por isso, o Tribunal ordenar o desentranhamento do requerimento de Embargos de executado sem dar ao Executado/Embargante a possibilidade de proceder ao pagamento da quantia em falta, a título de taxa de justiça, nos termos do nº 3 do art. 570º do CPC.”
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

Recorrente(s): -AA;

Recorrido(a)(s): BB

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AA veio deduzir Embargos de executado contra os autos de execução especial de alimentos que lhe foram movidos por BB, sendo título executivo a sentença homologatória do acordo de regulação das responsabilidades parentais (acompanhada dos recibos das despesas alegadamente não pagas pelo Recorrente).
Resulta dos autos que o Embargante/Recorrente, com o requerimento inicial dos Embargos deduzidos, juntou apenas Requerimento de protecção jurídica na modalidade de dispensa total de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de atribuição de agente de execução.
O Tribunal Recorrido em face desse Requerimento proferiu o seguinte despacho liminar:
“Antes do mais, notifique o oponente/embargante para, em 10 dias, juntar aos autos documento comprovativo do benefício de apoio judiciário por si solicitado junto da SS.”
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Na sequência, apresentou o Embargante o seguinte Requerimento:
“AA, embargante, notificado, informa que foi junto aos autos em 18.09.2015 comprovativo de pedido de apoio judiciário enviado via fax à Segurança Social em 16.09.2015. No mais invoca nos autos deferimento tácito nos termos do art. 25, n.º 2 da Lei 34/2004 de 29 de Julho na versão dada pela Lei 47/2007 de 28 de Agosto.”
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De seguida, o Tribunal proferiu o seguinte despacho:
“Notifique o embargado para, em 10 dias, pronunciar-se sobre o requerido no que concerne à suspensão do prosseguimento da execução, nos termos previstos no art.º 733.º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Civil (CPC), bem como quanto à requerida condenação como litigante de má-fé.
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Oficie à S.S. solicitando que informe qual a decisão que recaiu sobre o pedido de apoio judiciário formulado pelo embargante.”
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Apresentou a Embargada a resposta que consta de fls. 19 e ss. (no que concerne aos Embargos- apesar de ainda não ter sido citada para o efeito)
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Após diversas insistências junto da Segurança Social, veio esta entidade informar que o Requerimento de protecção jurídica foi indeferido, por decisão que foi notificada ao Embargante por carta registada em 18.11.2015- conforme prova documental junta aos autos.
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Obtida esta informação, o Tribunal Recorrido proferiu então a decisão que aqui constitui o objecto do recurso, onde referiu o seguinte:
“(…)
Os embarg(ad)os ainda não foram recebidos e a embargada não foi citada para contestar.
No caso em apreço, o embargante foi notificado por carta registada em 18/11/2015 da proposta de decisão de indeferimento do pedido de apoio judiciário e para se pronunciar no prazo de 10 dias úteis, sob pena de indeferimento do pedido de apoio judiciário por falta de resposta.
O embargante não respondeu à notificação e a proposta da decisão de indeferimento converteu-se em decisão definitiva de indeferimento ao fim de 10 dias úteis, por falta de resposta àquela notificação.
O pedido de apoio judiciário foi indeferido definitivamente e até hoje não juntou aos autos o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça. Ou seja, o pedido de apoio judiciário foi indeferido definitivamente por conversão da proposta de decisão de indeferimento, notificada ao embargante, por carta registada em 18/11/2015, em decisão definitiva por falta de resposta ao exercício do direito de audição e não foi paga a taxa de justiça nos 10 dias subsequentes à data da notificação definitiva da decisão de indeferimento (art. 552.º, n.º 6, do CPC).
Como a embargada não foi citada para contestar, a petição inicial tem de ser desentranhada.
Decisão.
Pelo exposto, atento o disposto nos artºs 552.º, n.º 6 do Código de Processo Civil (CPC) e 23.º da LAJ, decido determinar o desentranhamento da petição inicial dos embargos e consequente restituição ao apresentante e extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide – art.º 277.º, al e) do Código de Processo Civil (CPC).
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É justamente desta decisão que o Recorrente veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“CONCLUSÕES
Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Guimarães; vem o presente recurso interposto de sentença proferida no presente apenso de embargos de executado, não se podendo concordar com a decisão e fundamentos para o desentranhamento dos embargos apresentados e que determinou a extinção da instância;
Por um lado por nulidade/irregularidade grave de omissão de notificação e possibilidade de contraditório quanto a documentos em que se baseou a sentença; de outra banda porque a consequência de uma pretensa falta de pagamento de taxa de justiça em sede de oposição à execução por meio de embargos de executado não é o imediato desentranhamento dos embargos e a determinação da extinção da instância, mas antes a aplicabilidade do art. 570 do C.P.C.
1- No âmbito do presente apenso C - Embargos de executado – foi proferida sentença na qual se encontra vertido “Pelo exposto, atento o disposto nos art. 552, n.º6 do Código de Processo Civil (C.P.C.) e art. 23 da LAJ, decido determinar o desentranhamento da petição inicial dos embargos e consequente restituição ao apresentante e extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide - art. 277, al e) do Código de Processo Civil (C.P.C.). Condena-se o embargante nas custas por ter dado causa à impossibilidade - art. 536, n.º 3 do CPC. (...)".
2- A sentença assim proferida radicará no facto de o embargante não ter pago nos autos a taxa de justiça devida.
3- Todavia, não é esse o caso dos autos.
4- Na verdade, tendo o embargante peticionado apoio judiciário e nada mais lhe havendo sido notificado invocou deferimento tácito nos autos.
5- Eis que tendo o douto tribunal peticionado confirmação de acto tácito junto da Segurança Social, a mesma informou e posteriormente confirmou pretensa notificação ao embargante de proposta de indeferimento;
6- A qual, por via da inexistência de qualquer resposta de banda do embargante, havia convertido em indeferimento definitivo, sem necessidade de qualquer outra notificação.
7- Assim, imediatamente o tribunal, sem notificar o embargante dos documentos juntos pela Segurança Social, proferiu a sentença em crise, determinando a extinção da instância por falta de pagamento da taxa de justiça.
8- A falta de notificação ao embargante dos documentos juntos aos autos pela Segurança Social e nos quais a sentença alicerçou os seus fundamentos, constituiu nulidade/irregularidade grave, coarctando a possibilidade de contraditório sobre os mesmos.
9- Tanto mais que embargante nunca foi notificado de qualquer proposta de indeferimento nos termos que a Segurança Social juntou aos autos, nunca levantou, nem nunca lhe foi entregue qualquer notificação da Segurança Social com referência ao apoio judiciário solicitado em 16.09.2015.
10- Tendo na prática o douto tribunal proferido decisão com base em documentos que o embargante nunca viu, nunca dos mesmos foi notificado e nunca dos mesmos lhe foi dado conhecimento; senão pelo confronto que sentença e a presente interposição de recurso impôs.
11- Assim, compulsados os autos foi perceptível que nos documentos juntos pela Segurança Social, mormente de fls. 38, 39 e 40 que, o documento de registo junto tem a colagem de um selo sobre o n.º de registo então existente.
12- O duplicado desse selo obrigaria a colagem do duplicado do selo sobre a notificação alegadamente enviada, o que não sucede.
13 - No mais, o referido registo terá sido alegadamente entregue/levantado em Vila Nova de Famalicão.
14- Ora a morada constante do registo, diz respeito à freguesia de Negreiros, pertencente ao concelho de Barcelos.
15- Sendo certo que dos documentos juntos aos autos tão pouco resulta a inserção por parte da Segurança Social do concelho a que pertence a freguesia de Negreiros.
16- De qualquer forma o embargante nunca levantou, nem nunca lhe foi entregue qualquer notificação da Segurança Social com referência ao apoio judiciário solicitado em 16.09.2015.
17- Até hoje o recorrente embargante foi apenas notificado em 25.01.2016 de proposta de indeferimento do APJ 12574/2016, que aparentemente nada tem que ver com os presentes autos por ser outro número de APJ.
18- Sendo certo que o recorrente embargante não efectuou qualquer pedido de apoio judiciário em 2016 e nunca foi notificado do seguimento dos apoios judiciários peticionados em 16.09.2015.
19- O que motivou os esclarecimentos peticionados à segurança social em 01.02.2016. DOC.1
20- O documento junto é pertinente à apreciação da causa nos termos do art. 651, n.º1 do CPC e a sua presente junção apenas se tornou necessária em virtude das vicissitudes que ora se verificaram e que motivaram a invocação da presente nulidade/irregularidade.
21- Termos em que perante o invocado, dever-se-á julgar procedente a nulidade/irregularidade invocada, no mais se revogando a sentença proferida.
22 - Salvo o devido e merecido respeito a decisão proferida é violadora art. 188, n.º,1, e), 191, n.º1 e n.º4, art. 3, n.º3, art. 6, n.º2 do C.P.C., 615,n.º1 d) e bem assim do art. 20 da CRP entre outros.
23- No mais a oposição à execução, presentemente por meio de embargos de executado, não é aplicável, em sede de pagamento de taxa de justiça, o regime previsto para a petição inicial mas antes o previsto para a contestação.
24- Sentido que, cremos, é o perfilhado no Acordão deste Tribunal da Relação de Guimarães de 06.10.2011:
"Para efeito do pagamento da taxa de justiça inicial a oposição à execução não é equiparável à petição inicial em acção declarativa, mas sim à contestação, pelo que é aplicável na espécie o disposto no art. 486.º-A do Código de Processo Civil."
25- A decisão proferida e sob recurso contende claramente com os princípios da igualdade e do contraditório e de uma tutela jurisdicional efectiva.
Nestes termos e noutros que os Venerandos Desembargadores julguem mais pertinentes, deverão Vossas Excelências revogar a sentença proferida, substituindo-a por outra que ordene a nulidade da sentença e caso se conclua pela inexistência deferimento (expresso ou tácito) se notifique o embargante para proceder ao pagamento da taxa de justiça devida, ainda que se for caso disso com os acréscimos devidos. “
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Foram apresentadas contra-alegações, onde a Embargada/Recorrida pugna pela improcedência do Recurso.
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Sustentou, finalmente, o Tribunal Recorrido a sua decisão no que concerne à invocada nulidade/irregularidade da sentença proferida, considerando que a mesma não tem fundamento legal.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação, o Recorrente, CC, coloca as seguintes questões que importa apreciar:
1. saber se se verifica a nulidade/irregularidade arguida pelo Recorrente consubstanciada na omissão de notificação e possibilidade de contraditório quanto aos documentos juntos aos autos, contendo informações solicitadas pelo Tribunal Recorrido à Segurança Social sobre a decisão proferida quanto ao pedido de apoio judiciário;
2. saber se a consequência da falta de pagamento de taxa de justiça, em sede de oposição à execução, por meio de embargos de executado, não é o imediato desentranhamento dos embargos e a determinação da extinção da instância, mas antes a aplicabilidade do art. 570º do C.P.C ;
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
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Os factos relevantes para a apreciação e decisão do presente recurso são os que constam do relatório elaborado.
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B)- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Como supra se referiu a primeira questão que importa apreciar e decidir consiste em:
1. saber se se verifica a nulidade/irregularidade arguida pelo Recorrente consubstanciada na omissão de notificação e possibilidade de contraditório quanto aos documentos juntos aos autos contendo informações solicitadas pelo Tribunal Recorrido à Segurança Social sobre a decisão proferida quanto ao pedido de apoio judiciário;
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Vejamos, então, se o Recorrente tem razão na argumentação que apresenta.
Ora, salvo o devido respeito pela argumentação apresentada pelo Recorrente, é patente que este não tem razão.
Na verdade, no âmbito do presente processo, as informações recolhidas pelo Tribunal junto da Segurança Social tinham por escopo único confirmar a decisão que tinha sido proferida em sede de procedimento de protecção jurídica que correu seus termos junto dos serviços competentes da Segurança Social (cfr. arts. 19º e ss da Lei do Apoio Judiciário- Lei 34/2004 de 29.7).
Ora, esta decisão- e todos os procedimentos que conduziram à mesma- eram já do conhecimento do Recorrente, por lhe terem sido notificados no aludido procedimento- como aliás decorre dos requerimentos, a esse propósito, apresentados pelo Embargante no presente processo.
Nessa medida, o Tribunal Recorrido não tinha que notificar o Recorrente dos elementos recolhidos junto da Segurança Social (que eram constituídos pela decisão proferida), já que se trataria de um acto inútil (art. 130º do CPC), desde logo, porque, sendo esses elementos já do conhecimento do Embargante/Recorrente, tal acto de notificação traduzir-se-ia na simples duplicação do cumprimento do princípio do contraditório.
Além disso, importa dizer que o cumprimento do princípio do contraditório, neste âmbito, também não teria qualquer efeito útil, já que qualquer uma das questões processuais que o Recorrente pretenderia levantar, se tivesse tido sido notificado da junção aos presentes autos da decisão proferida, só poderiam ser apreciadas em sede do respectivo procedimento administrativo e, eventualmente, no Recurso de Impugnação Judicial que aí poderia ser deduzido (arts. 27º e ss da referia Lei), já que este seria o meio processualmente próprio para invocar os vícios daquele procedimento a que o Recorrente faz alusão nas suas alegações.
Nesta conformidade, conclui-se, sem necessidade de mais alongadas considerações, que não tinha o Tribunal Recorrido de notificar o Embargante da junção aos autos dos elementos recolhidos junto da Segurança Social (da decisão), não se mostrando, assim, violado o princípio do contraditório (arts. 3º, nº 3 e 6º, nº 2 do C.P.C).
De igual modo, também se considera que não se mostra violado o preceituado nos arts. 188, n.º 1, al. e), 191, n.º 1 e nº 4, do CPC cuja pertinência da sua invocação não se atinge, já que dizem respeito a vícios da citação (que nos presentes autos não foi efectuada no que concerne à exequente – notificação dos Embargos- art. 732º, nº 2 do CPC).
Ao que se percebe pretenderia o Recorrente invocar a nulidade da citação/notificação que foi efectuada no procedimento administrativo que correu termos na Segurança Social.
Ora, quanto a essa matéria, remete-se o Recorrente para o que já ficou dito quanto ao meio processualmente próprio para invocar essas nulidades.
Pelas mesmas razões, julga-se também que a invocação do art. 20º do CRP não tem qualquer pertinência para o que aqui pode ser discutido, sendo certo que o Recorrente se limita a invocar o preceito legal constitucional, sem concretizar o fundamento que subjaz a essa invocação.
Finalmente, importa referir que, conforme decorre do exposto, não se constata existir qualquer nulidade processual, nomeadamente, não se mostra preenchida a al. d) do nº 1 do art. 615º do CPC, não só porque, mais uma vez, o Recorrente não fundamenta, na sua alegação, a invocação deste preceito processual, mas também porque não se considera que o Tribunal Recorrido se tenha deixado de pronunciar sobre todas as questões que devia ter apreciado na decisão aqui Recorrida
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Aqui chegados, importa que o presente Tribunal se pronuncie sobre a segunda questão colocada pelo Recorrente:
2. saber se a consequência da falta de pagamento de taxa de justiça, em sede de oposição à execução, por meio de embargos de executado, não é o imediato desentranhamento dos embargos e a determinação da extinção da instância, mas antes a aplicabilidade do art. 570º do C.P.C ;
Entendeu, efectivamente, o Tribunal Recorrido que, neste âmbito, eram aplicáveis as regras processuais atinentes à petição inicial (art. 552º do CPC), e ordenou o desentranhamento da petição inicial de Embargos e a consequente extinção de instância.
Sucede que, conforme se irá expor, a decisão recorrida não ponderou devidamente os preceitos processuais que seriam aplicáveis ao caso concreto.
Vejamos as razões da nossa discordância.
No art. 145º, nº 1 do CPC estabelece-se o seguinte: “Quando a prática de um acto processual exija o pagamento de taxa de justiça, nos termos fixados pelo Regulamento das Custas Judiciais, deve ser junto o documento comprovativo do seu prévio pagamento ou da concessão do benefício do apoio judiciário, salvo se neste último caso aquele documento já se encontrar junto aos autos.”
Depois, no nº 3 deste preceito diz-se que “…sem prejuízo das disposições relativas à petição inicial, a falta de junção do documento referido no nº 1 não implica a recusa da peça processual, devendo a parte proceder à sua junção nos 10 dias subsequentes à prática do acto processual, sob pena de aplicação das cominações previstas nos arts. 570º e 642º”.
Constata-se, deste modo, que, excluindo-se as disposições relativas à petição inicial, a não apresentação do documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça, não é, desde logo, cominada com o desentranhamento da peça processual respectiva, isto porque se possibilita à parte a apresentação desse documento no prazo de 10 dias subsequente à prática do acto processual.
Só se não o fizer é que serão então aplicadas as sanções a que se reportam os artigos acima referidos.
No tocante à petição inicial regulam os arts. 552º, nºs 3, 4 e 5, 558º, al. f) e 560º do CPC.
O Tribunal Recorrido, no entendimento que seguiu na decisão aqui posta em crise, fez corresponder a dedução de Embargos de executado à petição inicial em acção declarativa, pelo que considerou aplicáveis os citados preceitos legais.
Ora, não se pode dizer que tal correspondência seja propriamente incorrecta, atendendo a que, do ponto de vista da sua tramitação, o processo de Embargos de executado configura-se, como pacificamente vem sendo entendido, como uma verdadeira acção declarativa enxertada na acção executiva- e assim inicia-se com a dedução de uma petição inicial de Embargos.
Todavia, quanto ao pagamento da taxa de justiça, que é a questão que aqui é colocada, tal correspondência não deve ser feita.
Com efeito, conforme decorre do já citado art. 145º do Cód. do Proc. Civil, existem regras próprias para a petição inicial, mas a verdade é que estas não são de aplicar aos Embargos de executado (nomeadamente, quanto à questão que aqui é colocada).
É que embora a dedução de Embargos de executado se inicie com uma petição inicial, a verdade é que se se considerassem aplicáveis as regras gerais processuais atinentes a essa peça processual, a solução que se encontraria seria bem diferente, atenta a inexistência de identidade de situações que aqui sempre seria de exigir.
Na verdade, se é compreensível que nas acções declarativas em geral se ordene o desentranhamento da petição inicial, quando a parte não junte o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça ou do pedido de apoio judiciário, porque o autor sempre terá possibilidade de apresentar nova petição, podendo, inclusive, valer-se do benefício que lhe é facultado pelo art. 560º do CPC, de modo a que a acção se possa considerar proposta na data em que a primeira petição foi apresentada em juízo, já o mesmo não sucede no que concerne aos Embargos de executado.
Com efeito, fácil é de ver que não se pode transpor este regime da petição inicial para o campo dos Embargos de executado (da sua petição inicial), pois que, conforme decorre do exposto, tal solução colidiria, de forma manifesta, com o prazo peremptório de 20 dias previsto no art. 728º do CPC para a sua dedução.
É que o caso da petição inicial das acções declarativas em geral, sendo o primeiro articulado, com o qual se inicia a instância, justifica-se que mereça um tratamento diferenciado, o que já não ocorre com a petição inicial dos Embargos de executado, que deverá, para a questão que é aqui colocada, ser encarada antes como uma contestação em acção declarativa, e isto porque tanto uma como outra estão sujeitas a prazos peremptórios para a sua dedução.
Tal decorre também do facto de “…no plano material do conteúdo funcional, a oposição à execução é, ainda e sempre, o acto, por excelência de reacção a uma causa para o qual se é citado, i. e., um acto de resposta a uma pretensão processual.
Por isso, apesar de alguma jurisprudência – que mais à frente referiremos neste Acórdão- afirmar que o requerimento inicial de Embargos se apresenta como uma petição, pelo contrário deve entender-se que essa petição por se configurar como um articulado de contestação do pedido executivo segue o regime e princípios daquela…”(1).
E uma das consequências desse conteúdo funcional é justamente “ …a de que, quanto ao regime de custas e seu comprovativo, a petição de oposição à execução para efeitos tributários deve ser equiparada à contestação e por aí, regida, nomeadamente pelo art. 486º-A= art. 570º nCPC”(2).
Nesse sentido poderia também argumentar-se com o facto de no art. 728º do CPC (oposição mediante Embargos) se referir expressamente que “… não é aplicável à oposição o disposto no nº 2 do art. 569º (regra processual da contestação) ”, o que poderia também conduzir à conclusão a que aqui chegamos(3).
Como tal, tem razão o Recorrente quando defende que, aos Embargos de executado, e no que concerne à taxa de justiça, deverão ser aplicadas as regras que se acham consagradas no art. 570º do CPC para a contestação.
Ora, neste preceito, estabelece-se que:
1- se na data da apresentação da contestação (leia-se, da petição inicial de Embargos de executado), o Réu (leia-se, o Embargante/executado) “… estiver a aguardar decisão sobre a concessão do benefício de apoio judiciário…” pode “comprovar apenas a apresentação do respectivo requerimento” (nº1)- como o aqui Embargante efectuou;
2- Neste caso “… o Réu (leia-se, Embargante/ executado) deve comprovar o prévio pagamento da taxa de justiça ou juntar ao processo respectivo documento comprovativo no prazo de dez dias a contar da notificação da decisão que indefira o pedido de apoio judiciário…” (nº 2)- o que o aqui Embargante não efectuou;
3.. “Na falta da junção do documento… a secretaria notifica o interessado para, em dez dias, efectuar o pagamento omitido, com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC.”- o que o Tribunal Recorrido não efectuou.
Assim, no caso concreto, em vez de se ter determinado o desentranhamento da petição inicial, o Tribunal Recorrido deveria ter antes ordenado a notificação do Embargante para, no prazo de dez dias, efectuar o pagamento da taxa de justiça omitido, com o acréscimo de multa legalmente previsto, já que este, notificado do indeferimento do requerimento de concessão de benefício de apoio judiciário, não comprovou o pagamento da taxa de justiça no prazo de dez dias a contar da notificação da decisão que indeferiu o pedido de apoio judiciário.
Assim, não tendo o Executado/Embargante procedido à junção aos autos do aludido documento, a solução que deveria ter sido dada não era o desentranhamento do seu requerimento de Embargos de executado, mas sim a sua notificação para em 10 dias efectuar o pagamento em falta, com acréscimo de multa aplicável.
Refira-se, aliás, que mesmo que o Embargante não viesse a efectuar esse pagamento nesta fase, ainda poderia vir a fazê-lo, com cominação acrescida, findos os articulados, nos termos do nº 5 do art. 570º do CPC.
depois, persistindo a omissão, se justificaria o desentranhamento da oposição (art. 572º, nº 6 do CPC).
Aqui chegados, e pelas razões expostas, importa, então, concluir que, contrariamente ao decidido, não deveria ter sido ordenado o desentranhamento do requerimento de Embargos de executado, mas sim devia antes ter sido cumprido o disposto no art. 572º, nº 3 do CPC- o que aqui se determina.
Tem sido este, aliás, o entendimento que tem prevalecido em termos jurisprudenciais(4) e doutrinais(5).
Aqui chegados, e nos termos expostos, conclui-se, pois, pela procedência do Recurso interposto, com este fundamento,
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III-DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar:
-o Recurso interposto pelo Recorrente procedente, e, em consequência, revogando-se a decisão recorrida, determina-se que seja o Recorrente/Embargante notificado nos termos e para os efeitos do art. 570º, nº 3 do CPC, ou seja, para em 10 dias efectuar o pagamento em falta, com acréscimo de multa aplicável.
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Custas pela Recorrida.
Notifique.
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Guimarães, 20 de Abril de 2017


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(Dr. Pedro Alexandre Damião e Cunha)

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(Dra. Maria João Marques Pinto de Matos)

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(Dra. Elisabete de Jesus Santos de Oliveira Valente)



1. V. Rui Pinto, in “Manual da Execução e despejo”“, pág. 427.
2. V. Rui Pinto, in “Manual da Execução e despejo”“, pág. 428.
3. V. neste sentido, o ac. do Stj de 11.11.2010 (relator: Serra Baptista) que refere que: “O próprio regime da oposição prevê expressamente (art. 813.º, nº 4) que lhe não é aplicável o disposto no art. 486.º, nº 2, que, preceituando sobre o prazo para a contestação, diz que o mesmo se lhe não aplica. Produzindo-se, assim, limitadamente o efeito suspensivo da oposição (art. 818.º), apenas em relação ao executado que dele beneficie. E, assim, neste específico caso é o próprio regime da oposição que, sem mais, remete para o da contestação. Sendo também certo que na oposição não é atribuído efeito cominatório à falta de contestação (art. 817.º, nº 3).”. No entanto, Lebre de Freitas, in “ A Acção executiva à luz do CPC de 2013”, pág. 224 assinala uma outra interpretação para este preceito legal: “a dedução de Embargos de executado não constitui uma contestação e a norma do art. 569, nº2 é excepcional em face da norma geral do art. 139º, nº 3…”.
4. V., no mesmo sentido ou seja de que, em sede de pagamento da taxa de justiça, a oposição à execução não é equiparável à petição inicial em acção declarativa, mas sim à contestação, os Acs. do STJ de 11.11.2010 (relator: Serra Baptista), e de 3.11.2011 e de 12.6.2012 (relator: Maria Pizarro Beleza), da RG de 6.10.2011 (relator: Manuel Bargado), da RP de 1.7.2008 (relator: Rodrigues Pires), 22.1.2008 (relator: Rodrigues Pires) e de 3.12.2007 (relator: Anabela Luna de Carvalho) e de 17.5.2012 (relator: Freitas Vieira – quanto à oposição à penhora), da RC 18.3.2014 (relator: Catarina Gonçalves) e da RL de 12.7.2007 (relator: Pimentel Marcos), de 22.1.2008 (relator: Rui Vouga) de 14.09.2010, (relator: Folque de Magalhães), de 07.05.2009 (relator: Sousa Pinto) e de 26.03.2009 (relator: Carlos Valverde), todos disponíveis in dgsi.pt. Em sentido contrário, v. Acs. da RL de 29.11.2007, (relator: Fernanda Isabel Pereira) e da RP de 25.03.2010, (relator: Sousa Lameira), in Dgsi.pt.
5. V. Rui Pinto, in “Manual da Execução e despejo”“, págs. 427 a 429 e Salvador da Costa, in “Regulamento das Custas Processuais anotado e comentado”, pág. 510 que em anotação ao art. 150-A do anterior CPC refere expressamente que “…temos pois que a lei exclui, nos casos de contestação ou oposição e de interposição de recurso que a omissão de apresentação do documento comprovativo da taxa de justiça ou da concessão de apoio judiciário na aludida modalidade, implique a recusa do seu recebimento.”