Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
317/16.2T8VRL.G1
Relator: EDUARDO AZEVEDO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
RECURSO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
MEIOS DE PROVA
ÓNUS DE PROVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/31/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
1- As provas que serviram de fundamento à decisão sobre um determinado facto devem ser analisadas e examinadas em conjunto.

2- No julgamento da matéria de facto os poderes da 2ª instância estão delimitados pelo nº 1 do artº 662º do CPC (artº 640º, nº 1, alª b) do CPC), pelo que a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser alterada se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

3- Por isso devem ser especificados não meios de prova que admitam, permitam ou consintam decisão diversa da recorrida mas que imponham antes decisão diversa da impugnada.

4- Inexistindo no regime processual civil norma idêntica à do artº 646º, nº 4 do CPC anterior, deve manter-se o mesmo desiderato através do disposto no artº 607º, nº 4 do CPC interpretado ‘a contrario sensu’.

5- “Para efeitos de aplicação dos artigos 18.º, n.º 1, e 79.º, n.º 3, da Lei n.º LAT em vigor, cabe ao beneficiário do direito à reparação por acidente de trabalho, bem como às instituições seguradoras que pretendam ver desonerada a sua responsabilidade infortunística, o ónus de alegar e provar os factos que revelem que o acidente ocorreu por culpa da entidade empregadora ou, que o mesmo, resultou da inobservância por parte daquela de regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho”.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães

Neste processo especial emergente de acidente de trabalho é sinistrado João e seguradora X – Sucursal em Portugal.

Foi realizado exame médico e realizada tentativa de conciliação que se frustrou uma vez que a seguradora declarou, nomeadamente: “Não aceita, porém:

i) A sua tipificação nos termos da LAT;
ii) O nexo de causalidade entre as lesões e o acidente;
iii) A responsabilidade pela indemnização, pensão ou outras, porquanto o acidente foi recusado por infracção das normas de segurança, por parte do sinistrado, conforme disposto no art.º 14º da LAT”.

O sinistrado requereu contra a seguradora a abertura da fase contenciosa do processo, pretendendo:

“Nestes termos, e nos melhores de direito, deve a presente ação ser julgada procedente, por provada, e, em consequência, condenada a Ré a pagar ao Autor:

A) – A pensão anual que vier a ser fixada com base no salário reclamado e na IPP atribuída, que é de a pensão anual de 1.062,91 € (9.561,60 € x 70%=6.693,12 € x IPP de 15,8807%), nos termos da lei, desde a data da consolidação das lesões fixada em 1/07/2016;
B) – A quantia de 100,00 € de deslocações obrigatórias aos Serviços do Ministério Público e ao Tribunal;
C) – A quantia de 4.254,26 € por Incapacidade Temporária Absoluta Profissional;
D) – A quantia de 753,07 € a título de despesas que o sinistrado despendeu para tratamentos;
E) – Juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, sobre todas as prestações e até integral pagamento;
(…)”.

Para tanto alegou, em súmula: em 14.10.2015 sofreu acidente de trabalho, quando prestava a sua actividade de pedreiro a mando, sob a orientação e fiscalização da sua entidade empregadora Granitos R., Lda; sofreu lesões que lhe determinaram, após a consolidação, incapacidade parcial permanente (IPP) para o trabalho; e, na sequência das lesões sofridas teve incapacidades temporárias para o trabalho, tendo efectuado a expensas suas consultas e tratamentos, que a seguradora se recusou a pagar-lhe.

A seguradora contestou alegando, em síntese: a admissão da celebração do contrato de seguro com a empregadora; o acidente deve considerar-se descaracterizado por inobservância e violação dos preceitos legais de segurança do trabalho, sem causa justificativa, por parte do sinistrado, com influência directa na ocorrência do acidente; e o sinistro se deveu, porventura, à violação das condições de segurança e saúde no trabalho por parte da entidade empregadora, por incumprimento das suas obrigações.

O sinistrado respondeu refutando a matéria de excepção e, assim, mantendo a sua posição inicial.

Foi proferido despacho:

“(…)
Assim sendo, fazendo uso da faculdade conferida pelo disposto no art. 127º, nº.1, do Código do Processo de Trabalho, determina-se fazer intervir na acção a entidade empregadora do sinistrado, “GRANITOS R., Lda.”, pessoa colectiva com o NIPC ..., com sede na Av. …, Pedras Salgadas.

Em conformidade, cite-se a referida entidade empregadora “GRANITOS R., Lda” para, no prazo de 15 dias, contestar, querendo a presente acção, entregando-se-lhe cópias”; e, “(…) b) a citação da Segurança Social para, em 15 dias – cfr. art. 129º do Cod. Proc. Trabalho – deduzir, querendo, pedido de reembolso dos montantes que tenha pago em consequência do evento nos autos.”.

A empregadora contestou alegando, em suma, no sentido de refutar a violação/incumprimento de quaisquer condições de segurança e saúde no trabalho.

O sinistrado respondeu reiterando a sua anterior resposta.

Elaborou-se despacho saneador, altura em que se fixaram os factos assentes e a base instrutória bem como se determinou que em apenso se fixasse a incapacidade.

Neste, realizado exame por junta médica, foi decidido fixar uma incapacidade parcial permanente (IPP) de 13,22%.

Realizou-se audiência de julgamento altura em que se ordenou o aditamento da base instrutória e as partes acordaram que ficava assente matéria de facto:

“Seguidamente pelos ilustres mandatários das partes foi dito que atentas as respostas e o relatório da junta médica constante do Apenso - A, consideram como assente a factualidade constante dos pontos 5º, 6º, 7º e 8º da Base Instrutória e a IPP fixada pelos peritos médicos no âmbito da junta médica.
Consideram ainda, por acordo, dar como assente a factualidade vertida no ponto 4º da Base Instrutória”.

Proferiu-se sentença decidindo-se:
Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a presente acção, declarando-se que o autor JOÃO sofreu um acidente um acidente de trabalho, por via do qual ficou afectado de uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 13,22% e, em consequência:

1.Condena-se a co-ré X PLC – SUCURSAL EM PORTUGAL, a pagar ao autor:

a)- o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de €884,82 (oitocentos e oitenta e quatro euros e oitenta e dois cêntimos), a partir de 02/07/2016, inclusive – cfr. art. 48º, nº.3, alínea c) e art. 75º, nº.1, ambos da Lei nº 98/2009, de 04/09 -, acrescido de juros, à taxa legal, desde essa data e até integral pagamento;
b)- o montante global de €4.254,26 (quatro mil duzentos e cinquenta e quatro euros e vinte e seis cêntimos), a título de indemnização/diferença por IT´s., acrescido de juros, à taxa legal, desde do dia seguinte ao do acidente e até integral pagamento;
c)- a quantia de €100,00 (cem euros), a título de despesas com transportes obrigatórios - art. 39º, nº.1, da Lei nº. 98/2009, de 04/09 -, acrescida de juros, á taxa legal, desde a data seguinte à realização da tentativa de conciliação (01/04/2017 – cfr. fls. 103) e até integral pagamento; e
d)- a quantia de €753,07 (setecentos e cinquenta e três euros e sete cêntimos) a título de despesas com consultas e tratamentos, acrescida de juros, á taxa legal, desde a data da citação da ré/seguradora para a acção (fase contenciosa) e até integral pagamento.
*
2. Absolver a entidade empregadora “GRANITOS R., Lda.”, do que contra si foi peticionado.
*
3. Declarar a pensão supra referida obrigatoriamente remível – cfr. art. 75º, nº. 1 da Lei nº. 98/2009, de 04/09.”
A seguradora recorreu.

Conclusões:

– O presente recurso incide, prima facie, sobre a impugnação da matéria de facto.
– Impugna-se, em primeiro lugar, o teor dos pontos 30, 33 e 39 dos factos dados como provados na douta sentença de fls. , que devem passar a “não provados”, por se tratar de matéria incorrectamente julgada, atenta a prova produzida.
- Os factos en cause devem passar a “não provados” uma vez que foi produzida prova credível em contrário, que impõe uma decisão diversa da recorrida.
- A resposta à matéria de facto em questão deverá ser modificada com base nos depoimentos das testemunhas A. V., L. M. e António (testemunhas presenciais), e ainda com base nas declarações de parte do A. João (cfr. exactas passagens supra transcritas).
- Dos referidos depoimentos resulta que a frente de desmonte onde o Autor se encontrava a laborar apresentava, previamente ao sinistro, evidentes sinais de risco de ruina ou derrocada, sendo visível uma fissura na mesma.
- Desses depoimentos resulta ainda que não foi realizada qualquer inspecção prévia à frente de desmonte por pessoal especializado, com vista à detecção de fissuras.
- Além da ausência de prova que permita dar como provados tais factos, os depoimentos das referidas testemunhas e as declarações de parte do A. impõem a requerida modificação - os factos 30, 33, e 39 devem passar a “não provados”.
- Estas testemunhas, no relato dos factos, foram credíveis, sendo certo que não possuem qualquer interesse na causa, ao contrário do que sucede com as restantes testemunhas, que possuem um vínculo contratual com a co-Ré Empregadora.
– Por outro lado, os pontos 35 e 36 dos factos dados como provados devem ser eliminados, uma vez que não são factos, mas sim conclusões ou juízos conclusivos.
10ª - A matéria em causa é conclusiva, contém juízos de valor, e por isso não pode ser considerada matéria de facto. Deve ser eliminada da matéria de facto.
11ª - Se o uso de arnês ou outros equipamentos de protecção era necessário para a execução dos trabalhos, é uma conclusão que se alcança, ou não, pela prova de determinados factos, conjugados com a interpretação jurídica das normas aplicáveis.
12ª - A Recorrente impugna ainda o julgamento da matéria de facto dada como não provada designadamente a resposta dada aos factos constantes das al. a), b), e), f), g) e h) dos factos “não provados”, que devem passar a “provados” (art.º 640.º n.º 1 do C.P.C.).
13ª - A resposta a essa matéria de facto deverá ser modificada com base nos depoimento das testemunhas A. V., L. M., A. S. e António, e ainda nas declarações de parte do Autor 4. 4 (conforme concretas passagens acima transcritas).
14ª -Relativamente à queda do bloco de pedra se dever ao embate da máquina giratória nesse mesmo bloco (alíneas a) e b)), as testemunhas referiram que foi o embate do balde ou ripper da giratória na pedra onde se encontrava o A. que provocou a sua queda.
15ª - No que respeita à questão da existência de trabalhos de desmonte em blocos graníticos confinantes (alíneas e) e f)), resulta dos citados depoimentos que os trabalhos de desmonte nos dois blocos graníticos eram executados simultaneamente, com a giratória de rastos a trabalhar muito próximo do local onde se encontrava o Autor.
16ª - Em terceiro lugar, e quanto ao uso do arnês de segurança (alínea g) dos factos dados), as mencionadas testemunhas referiram que o seu uso era possível e adequado.
17ª - Por último, e quanto à questão da inspecção prévia da frente de desmonte, por parte de pessoal competente, (alínea h) dos factos não provados), resulta dos referidos depoimentos que não foi realizada qualquer inspecção prévia à frente de desmonte.
18ª - Os depoimentos das testemunhas A. V., L. M., A. S. e António, conjugados entre si, com as declarações de parte do Autor e com a prova documental produzida e ainda com a restante factualidade provada, devem ser reapreciados em toda a sua extensão, pois impõem uma decisão diversa da recorrida - artigo 662º nºs 1 a 3 do C.P.C..
19ª - Atenta a prova produzida, em especial a supra referida, os factos constantes das alíneas a), b), e), f), g) e h) dos factos não provados deverão passar a “provados”.
20ª - O novo rol de factos provados não autoriza, modo de dizer, as conclusões do Tribunal a quo, no que respeita à responsabilidade pela reparação do sinistro.
21ª - Tendo-se provado que ocorreu um embate do balde ou ripper da máquina giratória na bancada granítica onde se encontrava o A., o que provocou a sua queda, que decorriam trabalhos de desmonte em blocos graníticos confinantes, com recurso a uma máquina giratória de rastos, que o uso do arnês de segurança era possível e aconselhável, mas que a empregadora considerou que o mesmo não devia ser utilizado e que não foi realizada qualquer inspecção prévia, por pessoal competente, à frente de desmonte, terá forçosamente que se concluir que o sinistro se deveu à actuação culposa da co-Ré Empregadora.
22ª - A violação das regras de segurança por parte da Empregadora é causal do sinistro e constitui o cerne da questão, o que se mostra de uma evidência cristalina.
23ª – Com a sua conduta, a Empregadora violou as medidas de segurança legalmente previstas e adequadas a evitar o sinistro.
24ª - Ao ordenar a execução de trabalhos de desmonte em blocos confinantes, a co-Ré violou o disposto no art.º 126.º n.º 3 do DL n.º 162/90, elevando o risco de sinistro.
25ª - O uso de arnês de segurança ligado a uma linha de vida era apto a evitar o sinistro em discussão nos presentes autos.
26ª – A co-Ré deveria ter ordenado ao A. o uso do arnês de segurança ligado a uma linha de vida, o que não fez, violando assim o disposto no art.º 131.º n.º 1 do DL n.º 162/90.
27ª - Ao não ordenar a inspecção prévia à frente de desmonte, fosse por quem fosse, a Empregadora violou o disposto nos n.ºs 1 e 2 do art.º 130.º do DL n.º 162/90.
28ª – Ao não advertir todos os trabalhadores que se encontravam nas imediações do local para se retirarem para local seguro (ponto 29 dos factos provados), a Empregadora violou o disposto no art.º 137.º do DL n.º 162/90.
29ª - Caso a Empregadora tivesse cumprido as prescrições tipificadas nas mencionadas normas legais, o sinistro não teria ocorrido e o A. não teria sofrido as lesões que sofreu.
30ª - A co-Ré Empregadora é responsável pelas consequências do evento, nos termos do disposto no art.º 18º nº 1 da Lei n.º 98/2009, uma vez que não foram observadas as regras sobre segurança e saúde no trabalho legalmente exigidas.
31ª - A douta sentença recorrida deve ser revogada, por violação, nomeadamente, do disposto nos art.ºs 126.º n.º 3, 130.º n.ºs 1 e 2, 131.º n.º 1, 137.º do Decreto-Lei n.º 162/90, 18º nº 1 da Lei n.º 98/2009, 71º e 72º do Código de Processo do Trabalho e 607.º do Código de Processo Civil que deveriam ter sido aplicados em conformidade com o alegado nas conclusões supra.”

Termina em síntese conclusiva: “Nestes termos, e nos melhores de direito aplicáveis, que … suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência, revogada a … sentença recorrida, devendo, em sua substituição, ser lavrado … Acórdão que julgue procedentes as conclusões do presente Recurso, com as legais consequências”.

A empregadora contra-alegou.

Conclusões:

1- Nada há a apontar à Douta Sentença, estando a mesma irrepreensivelmente fundamentada de facto e de Direito.
2- Não se justifica a alteração da resposta à matéria de facto solicitada pela Recorrente.
3- As testemunhas J. D., encarregado da obra, J. P., manobrador da máquina, A. S. (que manobrava outra máquina) e António, e o próprio gerente da empresa, depuseram, em Tribunal com isenção, de forma credível e, afirmaram que a máquina se encontrava a vários metros de distância, e que a queda do bloco se deveu a uma fissura não detetável no início dos trabalhos.
4- Com base no depoimento destas testemunhas as respostas dadas à matéria de facto devem manter-se inalteradas;
5- Desses depoimentos resulta que a frente de desmonte, antes do sinistro não apresentava qualquer sinal de risco de queda ou de existência de fissuras.
6- Desses depoimentos resulta claro que antes dos trabalhos foi verificada a não existência de fissuras pelo encarregado responsável dos trabalhos e, nos termos usuais
7- Na execução daquele trabalho não era necessário utilizar arnês de segurança ou a chamada linha de vida;
8- Tais medidas de segurança não eram aplicáveis ao trabalho em causa e, a existirem não teriam evitado o acidente, podendo até agravar as suas consequências;
9- O trabalhador tinha ao seu dispor arnês de segurança que, não usava porque não era necessário;
10- As testemunhas, J. D., J. P., A. S., António, e o próprio gerente da empresa, nos seus depoimentos não revelaram qualquer interesse na causa e depuseram de forma isenta;
11- Dos seus depoimentos resulta que o acidente não se deveu à violação de qualquer medida de segurança aplicável ao trabalho em causa;
12- Mantendo-se as respostas à matéria de facto, é de concluir que o ónus que se impunha à Recorrente, de provar a responsabilidade da entidade patronal, previsto nos artigos 18.º n.º 1 e 79.º n.º 3 da LAT, não logrou vencimento.
13- A Recorrente é, por isso, integral e exclusivamente responsável pelo ressarcimento, com base no contrato de seguro titulado pela apólice 101388006.”.

Termina, em síntese conclusiva: “Termos em que a … Sentença recorrida deverá ser integralmente mantida negando-se provimento ao recurso com legais consequências.”.
Nesta instância a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido do recurso não ser provido.

Efectuado o exame preliminar cumpre decidir.

Indagar-se-á sucessivamente, sem prejuízo das questões que se decidam antes que prejudiquem o seu conhecimento da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, da violação das condições de segurança e saúde no trabalho por parte da entidade empregadora e da obrigação e seus responsáveis pelo pagamento das prestações a que tem direito o sinistrado.

Na sentença considerou-se provado:

1. A sociedade “Granitos R., Lda.”, tem como actividade e objecto a extracção, transformação e comercialização de granitos.
2. No âmbito da sua actividade comercial, a sociedade “Granitos R., Lda.” contratou o autor para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização exercer funções inerentes à categoria de pedreiro, mediante a retribuição mensal de €600,00, acrescida da quantia mensal de €105,60, a título subsídio de alimentação.
3. No dia 14 de Outubro de 2015, entre as 8H00 e as 8H30, o autor encontrava-se a trabalhar na pedreira de “F.”, freguesia do ..., concelho de Vila Pouca de Aguiar, cumprindo ordens e instruções da sociedade “Granitos R., Lda.”, sua entidade empregadora.
4. Nas referidas circunstâncias de tempo e de lugar, o autor quando se encontrava em cima dum bloco de pedra, a furar o mesmo com um martelo pneumático, caiu de uma altura de alguns metros.
5. Como consequência directa e necessária dessa queda, o autor sofreu as lesões descritas e examinadas no relatório do GML de fls. 94 a 97 verso, que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
6. À data do acidente o autor auferia a remuneração mensal de €600,00x14 meses+105,60x11 meses a título de subsídio de alimentação, perfazendo um rendimento anual de €9.561,60.
7. A entidade empregadora, sociedade “Granitos R., Lda.”, tinha transferida a sua responsabilidade infortunística decorrente de acidentes de trabalho para a ré Companhia de Seguros X Plc – Sucursal em Portugal, por contrato de seguro titulado pela apólice 101388006, com base no salário de €600,00x14 meses+€105,00€x11 meses a título de subsídio de alimentação.
8. A ré X Plc – Sucursal em Portugal pagou ao autor e este recebeu a quantia de €531,78, a título de indemnização por incapacidades temporárias (IT,s).
9. Nas circunstâncias referidas em 3. e 4. o autor não estava a utilizar cinco ou arnês de segurança.
10. O autor nasceu em 30 de Junho de 1960.
11. Nas circunstâncias de tempo e de lugar referidas em 3. e 4. o autor encontrava-se em cima de um bloco de pedra, que estava a ser extraído de uma bancada de pedra, com outros quatro colegas.
12. Na sequência dessa queda, o autor foi transportado para o Hospital de Vila Real.
13. Em consequência dessa queda o sofreu fractura da extremidade distal de rádio esquerdo e fractura dos corpos vertebrais de L1, L2 e L3.
14. Como resultado das lesões sofridas, o autor esteve com incapacidade temporária absoluta (ITA) para o trabalho no período de 15/10/2015 a 01/07/2016.
15. A consolidação médico-legal das sofridas lesões (alta clínica) ocorreu a 01/07/2016.
16. Após a consolidação das sofridas lesões, o autor ficou com sequelas que lhe conferem uma incapacidade parcial permanente (IPP) para o trabalho de 13,22%.
17. O autor despendeu a quantia de €100,00 em alimentação e deslocações obrigatórias ao GML e aos Serviços do Ministério Público.
18. O Autor, no período da incapacidade temporária absoluta ITA foi consultado pelo médico ortopedista em 12-01-2016; 11-02-2016; 19-04-2016; 15-05-2016 e 16-06-2016.
19. Por essas consultas o autor pagou a quantia total de €350,00.
20. O autor foi consultado no Centro de Saúde de Vila Pouca de Aguiar e fez um RX à coluna, tendo pago a quantia de €12,20.
21. O Autor, foi consultado em fisiatria, tendo feito 34 sessões de fisioterapia, tendo pago a quantia total de € 360,00.
22. O Autor, em Maio de 2016, fez hidroterapia na piscina municipal de Vila Pouca de Aguiar, tendo para o efeito se feito sócio, tendo pago o total de €30, 87.
23. Nas circunstâncias referidas em 3. e 4., o autor laborava numa zona de desmonte de pedra, em cima de um bloco de granito situado a cerca de 3 a 4 metros de altura do solo.
24. O autor pretendia deslocar esse bloco de granito e, para o efeito, fazia uso de um martelo pneumático.
25. Existia no local uma plataforma ou bancada, junto ao bloco em granito, que se encontrava estabilizada e onde se encontravam colegas de trabalho do autor.
26. O autor encontrava-se sobre o bloco de granito que pretendia deslocar.
27. O referido bloco granítico tinha sido alvo de rebentamentos com explosivos no dia anterior, em tarefa efectuada pelo autor.
28. Na execução dessa tarefa o autor não fazia uso de arnês de segurança.
29. Os trabalhadores que se encontravam nas imediações onde decorriam os trabalhos e onde a “giratória de rastos” se encontrava a manobrar cargas, não foram advertidos pela interveniente/empregadora de para se retirarem para lugar seguro.
30. A zona onde o autor se encontrava a trabalhar não aparentava qualquer sinal de que se encontrasse em risco de separação, ruína ou derrocada.
31. O autor e outros quatro colegas encontravam-se numa plataforma sem inclinação e que seria objecto de trabalhos de separação com recurso a martelo pneumático e colocação de explosivos.
32. O autor executava o trabalho deslocando-se sobre a bancada onde colocava o material, afastado cerca de 2 a 3 metros da extremidade do bloco de granito (“borda”).
33. O acidente consistiu na queda de uma parte rochosa, por existência de fissura que não havia sido detectada.
34. Na altura do sinistro, o autor usava botas, capacete, luvas e auriculares.
35. Na execução dessa tarefa, o autor não se aproximava da ponta ou do final da bancada, não se mostrando necessário nem aconselhável o uso do arnês de segurança.
36. …nem de resguardos especiais, a chamada linha de vida, porque o trabalhador na execução daquele trabalho não se aproxima sequer da ponta da bancada.
37. A sociedade empregadora ministra formação profissional a todos os trabalhadores da pedreira, no âmbito da qual os trabalhadores são alertados de que é obrigatório o uso de equipamento específico, como botas de biqueira de aço, capacete, luvas, auriculares, máscaras, colete reflector, arnês e a linha de vida, quando necessário.
38. De acordo com a formação ministrada, são também os próprios trabalhadores que averiguam da necessidade do equipamento que têm de usar, em cada tipo de trabalho que executam.
39. A detecção de fracturas/fissuras foi verificada e foram adoptadas as medidas necessárias a prevenir a sua existência e o desprendimento de partes da rocha.
40. A existência de guarda corpos na bancada não seria suficiente ou adequada a evitar a queda do autor.
41. O desprendimento do maciço, como ocorreu, arrastaria consigo quaisquer protecções colectivas.
42. A entidade empregadora havia colocado ao dispor do autor, para este usar quando necessário, o arnês de segurança.
43. O representante legal da interveniente/empregadora encontrava-se no local do acidente a dar ordens desde o solo.
44. O autor e os colegas de trabalho encontravam-se em cima daquele bloco granítico a mando do gerente da sociedade empregadora e do seu encarregado de obra.
45. O gerente da entidade empregadora havia ordenado que a máquina fosse retirando as pedras cortadas que se encontram do lado esquerdo da bancada.
46. O trabalhador/manobrador da máquina giratória, à data do acidente, tinha a CAP (Aptidão Profissional) caducada.
47. O referido manobrador da máquina giratória tinha anos de experiência nesse tipo de função e trabalhos.”.

Posto isto.

Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto

A recorrente dissente quanto à matéria dos nºs 30, 33 e 39 que na sentença decidiu-se assente (a zona onde o autor se encontrava a trabalhar não aparentava qualquer sinal de que se encontrasse em risco de separação, ruína ou derrocada; o acidente consistiu na queda de uma parte rochosa, por existência de fissura que não havia sido detectada; a detecção de fracturas/fissuras foi verificada e foram adoptadas as medidas necessárias a prevenir a sua existência e o desprendimento de partes da rocha).

Entende não ter ficada provada esta matéria devido aos depoimentos das testemunhas A. V. (foi colega do A na empregadora, de quem já não é empregado), L. M. e António (foram colegas do A na empregadora, sendo ainda desta seus empregados) e às declarações do A.

De forma marginal, sem concretizar, refere que a “alteração propugnada tem por fundamento os referidos depoimentos e declarações, devidamente conjugados com a restante prova produzida”, bem como existe “ausência de prova que permita dar como provados os factos em questão”.
Relembre-se como o tribunal a quo criou a respectiva convicção sobre o essencial da matéria em discussão:

“Considerou, ainda, o tribunal em relação à restante matéria factual:

- O depoimento de parte do autor, relativamente às circunstâncias em que estava a prestar serviço, aquando da ocorrência do sinistro, tendo este confirmado que na altura do acidente estava a usar botas, capacete, luvas e auriculares, como sempre o fazia, confirmando também que na altura não estava a usar arnês.
- O depoimento da testemunha A. V., pedreiro, colega do autor e que trabalhava para a empresa à data da ocorrência do acidente (tendo deixado de trabalhar para esta há cerca de 1 ano). Referiu que estava com o autor na bancada onde ocorreu o acidente, mas um pouco mais atrás. Que numa bancada ao lado estavam os colegas L. M. e António, que se preparavam para iniciar o trabalho naquela bancada.

Que entre uma e outra bancada havia uma linha de corte de 2 a 3 cm. Que o autor estava a furar o bloco com um martelo (pneumático) para depois nele introduzir pólvora, cumprindo ordens do encarregado da empresa, Sr. J. D.. Que o depoente estava a ajudar o autor, colocando e retirando pesos no martelo pneumático. Que havia uma máquina giratória a retirar blocos desprendidos a cerca de 2 a 3 metros. Que na altura em que o bloco de granito resvalou, o depoente sentiu um barulho e saltou para a bancada do lado. O Sr. J. D. ficou agarrado na parte de cima do bloco que caiu e o autor caiu com o bloco que se desprendeu porque não se teria apercebido por estar a utilizar o martelo pneumático, com cerca de 30 kg e uma altura de 1 a 1,5 metros, de costas para a parte que caiu. Que o bloco se deslocou e caiu porque a giratória lhe tocou com o “riper”. Que a altura do solo era de 3,5 a 4 metros.

Que a dimensão do bloco era de 5 metros de comprimento e tinha uma largura de cerca de 4 metros. Que o autor, o depoente e o Sr. J. D. estavam a trabalhar distanciados cerca de 2 metros da extremidade do bloco que caiu. Que não era possível proceder a esse trabalho da outra bancada. Que não estavam a utilizar arnês. Que o patrão estava na obra, desviado cerca de 20 a 30 metros do local onde se deu o acidente. Que o patrão dava ordens ao Sr. J. D., encarregado e este, por sua vez transmitia-as aos trabalhadores. Que a giratória estava a retirar pedras que tinham sido soltas no dia anterior. Que o trabalho daquele dia estava a ser realizado como o era todos os dias. Usavam botas, mascara, auscultadores e capacete. O local da bancada era plano. Se a pedra (bloco) não tivesse caído, o autor também não teria caído.

A pedra caiu porque a máquina lhe bateu. Se o autor estivesse a usar arnês teria eventualmente ficado pendurado. Não viu fissuras. Que os trabalhadores faziam uma vistoria aos blocos e quando havia dúvidas ia lá o encarregado. Que quando foram trabalhar para o bloco este parecia seguro.

- O depoimento da testemunha L. M., pedreiro, colega de trabalho do autor na Granitos R., Lda. à data do acidente. Referiu que na altura em que ocorreu o acidente estava em cima de uma bancada com cerca de 4 a 5 metros de altura. Que o autor, o J. D. e o A. V. estavam numa outra bancada a fazer um furo com um martelo pneumático, sendo que o Sr. J. D. era o encarregado e quem estava a orientar esses trabalhos. Que uma máquina giratória estava a tirar uma pedra na esquina esquerda da bancada. Que o furo que o autor estava a fazer se situava a cerca do meio do bloco de granito. Que o autor caiu juntamente com um bloco de cerca de 3 metros, com formato em cunha (tipo prancha). Que o Sr. J. D. se agarrou à bancada do lado e o A. V. saltou para a bancada onde estavam outros colegas. Que o autor tinha os auscultadores colocados e o martelo pneumático a trabalhar. Que a parte do bloco que caiu devia ter alguma fissura, possivelmente devido ao rebentamento feito no dia anterior. Que o local onde o autor se encontrava a trabalhar distava cerca de 2 metros da extremidade do bloco/bancada. A plataforma onde o autor estava a trabalhar estava estável. Que no dia anterior foram rebentados explosivos naquele bloco. Que não usavam arnês de segurança. Que o autor estivesse a usar arnês teria caído na mesma, mas poderia ter ficado pendurado. Que o “ripper” utilizado pela máquina giratória estava a cerca de 1 a 2 metros do local. Que quem deve inspeccionar o trabalho e eventuais fissuras nos blocos é o patrão e o encarregado. Que no dia anterior abordaram a questão da fissura com o encarregado, Sr. J. D.. Como era uma pequena fissura, concluíram que não havia risco. Que a fissura, com o rebentamento de explosivos no dia anterior, manteve-se igual. Que a bancada tinha 6 a 7 metros de comprimento e uma largura de cerca de 6 metros e totalmente plana.
- O depoimento da testemunha J. D., trabalhador desde 2007 da Granitos R.,Lda.,exercendo funções de encarregado. Referiu que iniciaram o trabalho às 7H30. Que o autor, o depoente e trabalhador A. V. quando estavam a perfurar o bloco granítico com o martelo pneumático, a pedra fugiu-lhes dos pés. Que o depoente foi quem determinou esse trabalho (tem autonomia para dar essas ordens). Na outra bancada estavam outros trabalhadores. Que o autor e o trabalhador A. V. estavam a controlar o martelo pneumático, com um peso de 15 a 20 kg, que utiliza brocas de 80, 160 e 180 cm. Que a máquina giratória estava a fazer trabalho de limpeza, por ordens suas, a cerca de 8 a 9 metros do local onde ocorreu o acidente. Que a parte do bloco que caiu, com cerca de 3 metros e em cunha, arrastou consigo o autor. Que essa fissura começava a meio da bancada e terminava a zero (cunha). Que o depoente estava junto ao autor e estavam distanciados da extremidade da bancada de bloco cerca de 2 a 3 metros. Que não foi detectada qualquer fissura no início dos trabalhos. Que apenas teve conhecimento da fissura quando o bloco se desprendeu e caiu. Que se fosse detectada a fissura não teriam ido (autor, depoente e trabalhador A. V.) trabalhar para cima da bancada. Que o bloco se deslocou no sítio dessa fissura. Confrontado com a fotografia de fls. 180, referiu não reconhecer nela a bancada onde ocorreu o acidente. Que a empresa tinha equipamento de arnês de seguração que era utilizado sempre que se justificasse. Que a bancada onde ocorreu o acidente tinha 3 a 3,5 metros de altura. Que a máquina giratória estava a fazer a limpeza da frente das bancadas.

Que o acidente se deu à direita da bancada e a máquina na altura estava à esquerda (virada para o monte) a cerca de 10 metros do local. Que a bancada rochosa onde estavam a trabalhar tinha uma largura idêntica à sala de audiência de julgamento (sala de audiência esta que terá entre 10/ metros de comprimento por 6 metros de largura). Que o bloco de granito caiu porque estava estalado e até poderia ter caído com a trepidação do martelo pneumático. Que a vistoria do bloco é feita por si diariamente e, na bancada em questão não detectou nesse dia qualquer fissura. Que o maquinista, à data do acidente, não teria habilitação legal, mas que também não é necessária.

Que o maquinista tinha tido formação anterior, mas na data, estaria caducada, mas que esse maquinista tem, pelo menos, 20 anos de experiência no manuseamento desse tipo de máquinas. Que o bloco granítico não apresentava perigo de decorada à vista desarmada e era totalmente plano. Que o uso do martelo pneumático era para perfurar o bloco e introduzir nesse furo pólvora, não havendo outro meio de efectuar esse trabalho. Que o local onde estavam a fazer esse furo estava a cerca de 3 metros da extremidade (a largura da bancada era, sublinhou, superior à da sala de audiências). Que o acidente se deveu à existência de uma fissura que não fora detectada. O equipamento utilizado nesse tipo de trabalho era o capacete, botas, luvas e auriculares, equipamentos estes que o autor estava a utilizar aquando do acidente. Que o arnês não se justificava neste tipo de trabalho. Que se o depoente e o trabalhador A. V. estivessem a usar esse equipamento (arnês) não poderiam ter fugido.

Que o autor não caiu, mas sim, foi projectado. Também não se justificava, no trabalho em questão, colocar equipamento de resguardos (guarda-corpos). Que a empresa dá formação e obriga os trabalhadores a usar o equipamento adequando aos trabalhos a efectuar, nomeadamente, botas, luvas, capacete e auriculares. Que o arnês está disponível na empresa para ser usado quando necessário me que, naquelas circunstâncias e trabalho, que não exigiu que o autor utilizasse esse equipamento, por não se justificar. Que o deslocamento do bloco poderia ter ocorrido por causa da trepidação do martelo pneumático, já que não existiu qualquer toque nele por parte do “ripper” ou da “pá” da máquina giratória.

(…)
O depoimento da testemunha J. P., trabalhador há cerca de 19 anos da Granitos R., Lda., com a categoria profissional de manobrador de máquinas. Referiu que no dia do acidente se encontrava a manobrar uma máquina giratória. Que à data do acidente tinha caducada a CAP (Aptidão Profissional) de manobrador de máquinas, mas que tem experiência desse tipo de funções há mais de 19 anos. Que é a empresa quem ordena essa formação, mas que a CAP de que era possuidor estava caducada. Que actualmente a CAP (aptidão profissional) é vitalícia. Que na altura do acidente estava a desviar pedras soltas para um outro colega carregar noutra máquina a cerca de 7 a 8 metros do local onde ocorreu o acidente com o autor. Que o braço giratório da máquina tem cerca de 6 metros de comprimento. Que não tocou na rocha que se desprendeu. Que a rocha que se desprendeu tinha uma fissura em cunha. Não é verdade que tenha tocado com a “pá” ou com o “ripper” na rocha que se veio a deslocar. Que o autor na altura do acidente estava a furar a rocha e não havia no local pedras a retirar com a giratória.
Que estava a limpar terra e pedras da explosão provocada no dia anterior mais à esquerda do local onde ocorreu o acidente. Que nunca teve ou provocou qualquer acidente com o manuseamento de máquinas.
- O depoimento da testemunha A. S., trabalhador há cerca de 9 anos da Granitos R., Lda., como a categoria profissional de manobrador de máquinas.

Referiu que estava dentro de uma máquina a carregar entulho e o autor estava com dois colegas em cima do bloco de granito a utilizar o martelo pneumático. Que a bancada onde se encontrava o autor tinha entre 7 a 10 metros de comprimento e 5 a 6 metros de largura e toda ela era plana. Que o autor estava a trabalhar (perfurar a rocha) com o martelo pneumático a cerca de 2 a 3 metros da extremidade da bancada. Que a dada altura a pedra resvalou e o autor caiu. Devia ter uma fissura que ninguém viu. Que a máquina giratória estava a trabalhar ali perto e não tocou na bancada. Que se a pedra não tivesse fissura a bancada não se mexia. O autor usava botas, luvas, capacete e auscultadores no momento do acidente. Que o autor estava agarrado ao martelo pneumático e a 2 a 3 metros da extremidade do bloco. Que a empresa tem arnês, em número de quatro, para serem utilizados pelos trabalhadores, mas que naquela situação não se justificava o seu uso, porque a bancada era plana. Que o arnês apenas é utilizado em locais com inclinação. Que a superfície plana era do tamanho da sala desta sala de audiência. Que os trabalhadores da empresa têm formação e sabem qual o equipamento que devem usar em casa situação e são obrigados pela empresa a usar o equipamento adequado a cada uma dessas situações. Que o manobrador de máquinas é titular de CAP (formação profissional). Neste momento o CAP do depoente é vitalício, o que não acontecei à data do acidente. Que o maquinista João é manobrador de máquinas há mais de 19 anos, com muita experiência, desconhecendo se o CAP dele estava ou não caducado. Que a bancada onde ocorreu o acidente estava direitinha e à vista parecia estar em condições. No dia anterior a bancada tinha sido intervencionada com pólvora. Que o bloco de rocha caiu quando o autor estava ainda a utilizar o martelo pneumático. Que a giratória estava a puxar pedras soltas perto do local. O bloco de pedra que se descolocou tinha a forma de cunha, com uma superfície liza.

- O depoimento da testemunha António, trabalhador da Granitos R.,Lda. Referiu que no dia do acidente estava no local, a cerca de 4 metros onde o mesmo correu. Que estava à espera que a máquina giratória, que se encontrava a 7 a 8 metros do local onde se encontrava o autor, retirasse umas pedras. Que o local onde o autor estava a trabalhar era uma bancada plana e não foi falado que a mesma tinha qualquer fissura. Que tinha 7 a 8 metros de comprimento e uma altura de 3 a 3,5 metros. Que não havia outro modo do autor executar o trabalho que estava a fazer, não o podendo fazer da bancada ao lado. Que a pedra que se deslocou tinha a forma de cunha com cerca de um metro na parte superior e zero metros na parte inferior. Que antes do início de qualquer trabalho é certificada a segurança do trabalho a realizar. Que quando é detectada qualquer fissura no bloco, vai lá a máquina abanar para provocar a queda. Naquele dia não foi detectada qualquer fissura. O autor utilizava botas, luvas, capacete e auriculares. Que não utilizava arnês porque tal não se mostrava necessário, até porque o autor estava a trabalhar a 3 a 4 metros da extremidade da bancada. Que a protecção lateral apenas é utilizada quando trabalham em bancadas altas e na extremidade das mesmas. No caso não se justificava porque o trabalho estava a ser efectuado numa bancada baixa, plana e não executado na sua extremidade. Na eventualidade de ser utilizado esse equipamento, tal não iria evitar a queda do autor. A fissura não foi detectada. O maquinista da giratória era um profissional experiente. Que a giratória estava a fazer limpeza do outro lado da bancada. Que a bancada é sempre lavada com água antes de ser intervencionada e é verificada pelo encarregado da obra.

- O depoimento da testemunha M. G., mediador de seguros. Referiu que esteve no local quando o autor estava a ser socorrido. Que verificou que houve um deslocamento de massa granítica. Que nas circunstâncias se na obra estivessem colocados guarda-corpos poderia sido pior e esse equipamento não evitaria a queda do autor.

Que tem conhecimento que o sócio gerente da empresa é muito rigoroso e tem disponíveis todos os equipamento necessários à actividade que desenvolve. Que quando se deslocou ao local, na altura do acidente, viu lá 3 ou 4 pares de arnês.

Nas declarações de parte do autor, João, que nelas referiu, no essencial, que tinha sido detectada uma brecha no bloco granítico e que lhe foi dito que não havia perigo algum. Que no dia anterior a bancada onde ocorreu o acidente tinha sido intervencionada com explosivos. Que a máquina giratória estava a trabalhar a cerca de 3 a 4 metros do local. Que a máquina foi lá buscar uma pedra solta e que esta se escapou e ao ir busca-la de novo, bateu na bancada onde o autor se encontrava. Que a pedra caiu porque o balde da giratória bateu nela. Confirmou também as consultas e tratamentos a que se sujeitou em virtude do acidente e as despesas que teve com essas consultas e tratamentos. Esclareceu que sentiu a máquina a bater na rocha.

- Nas declarações de parte do sócio gerente há cerca de 23 anos da empresa, Fernando. Referiu que chegou ao local cerca das 8H00. Que os trabalhadores já estavam nas bancadas graníticas e a máquina giratória estava a limpar o terreno a cerca de 10 a 15 metros da pedra que caiu, pois que se estivesse perto a 1 ou 2 metros, teria ficado esmagada com a queda do bloco. Que o autor estava a perfurar a bancada. Que quem fazia a inspecção à bancada onde iam trabalhar era o seu encarregado e também os próprios trabalhadores. Que os trabalhos a efectuar pelo autor e demais trabalhadores que com eles estavam a ser realizados a cerca de 2 a 3 metros da extremidade da bancada. Que a fissura é um lizo e que o bloco que se deslocou tinha uma rachadela, que pode ter sido provocada pelo fio que faz a separação da bancada. Que na altura não foi detectada qualquer fissura ou rachadela, porque se tal acontecesse os trabalhadores não iriam para lá trabalhar. Confirmou que o autor usava botas, capacete e luvas. Que não se justificava qualquer resguardos especiais, nem o uso de arnês, porque a bancada não era alta, nem tinha qualquer inclinação. Que a empresa ministra formação por empresas externas e existe uma engenheira da empresa que também o faz. Que os trabalhadores também têm formação e conhecimento do tipo de equipamento que devem usar em cada situação. Que todos os trabalhadores da empresa estão aptos a verificar da existência ou não de fissuras na rocha.

Que a existência de guarda-corpos não era adequada e poderia ter provocado consequência mais graves. O equipamento arnês encontrava-se disponível na empresa para ser usado se necessário. Que a máquina giratória estava a cerca de 7 a 15 metros e havia trabalhadores que ainda não estavam a trabalhar porque primeiro era preciso fazer que a máquina giratória fizesse a limpeza. Que a bancada tinha cerca de 20 metros e uma largura de mais de 10 metros. Que não havia duas bancadas, mas apenas uma, mas separadas pelo corte do fio que fora efectuado na rocha.

Análise crítica da prova.

Os depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência de julgamento, mostram-se coincidentes quanto às circunstâncias em que ocorreu o acidente, sendo unânimes quanto ao facto da queda do autor ter sido originada pela deslocação de uma parte da bancada de granito onde o autor se encontrava a trabalhar, mormente na abertura de uma furo com a ajuda de um martelo pneumático. Coincidentes também foram esses depoimentos, relativamente ao uso por parte do autor de botas, luvas, capacete e auriculares e na ausência do uso de arnês e de outro equipamento protecção colectiva, nomeadamente guarda-corpos.

Essa coincidência e unanimidade também se verifica nos depoimentos das testemunhas, todas elas presenciais – à excepção da testemunha M. G. -, no que respeita ao facto das características da bancada granítica (ou bloco de granito, como também a ela se referiram), nomeadamente quanto à sua altura, comprimento largura, bem como ao facto do autor não se encontrar, na altura em que o acidente ocorreu, junto à extremidade, mas sim a 2 a 3 metros desta, sem perigo de queda, sendo também unânimes na afirmação de que a queda do autor não ocorreria nessas circunstâncias, não fosse o deslocamento do bloco de granito, que de desprendeu em forma de cunha e arrastou consigo o autor. Também manifestaram as testemunhas ouvidas, que o uso de arnês e guarda-corpos não se justificavam naqueles trabalhos, nem teriam, na sua opinião, evitado que o autor tivesse sido arrastado com o deslocamento do bloco de granito. As únicas divergências existentes nos depoimentos das testemunhas ouvidas respeitam à factualidade quanto ao motivo do deslocamento do bloco de granito. No dizer do autor e das testemunhas A. V. e L. M., tal deslocação deveu-se ao facto da máquina giratória se ter embatido com o “ripper” ou “pá” na bancada onde o autor se encontrava a trabalhar. No dizer das testemunhas J. D., encarregado da obra, J. P., manobrar da referida máquina, A. S. e António e do gerente da empresa, a máquina giratória não teria embatido com o “ripper” ou “pá” na bancada granítica, até porque se encontrava a trabalhar a alguns metros do local no lado esquerdo do local onde o autor se encontrava a trabalhar quando foi vítima do acidente. Que o deslocamento do bloco granítico se deveu a uma fissura, não detectável no momento do início dos trabalhos. O tribunal, face a essa contradição, ainda levou a efeito uma acareação entre as testemunhas A. V. e L. M., por um lado, e J. D., tendo as testemunhas em causa mantido essa sua versão e depoimento. O certo é que, no decurso da audiência de julgamento, a versão das testemunhas J. D. veio a ser corroborada pelas testemunhas J. P., manobrador da referida máquina giratória e pelas testemunhas A. S., que manobrava uma outra máquina para onde eram carregados os detritos apanhados pela máquina giratória e António, que sem demonstrarem qualquer interesse e de forma coerente, referiram que a máquina giratória não tocou no bloco de granito que se desprendeu e que o deslocamento do mesmo se deveu a uma fissura existente na mesma. O tribunal, perante essa contradição, considerou essa versão como credível, tanto mais que as testemunhas (todas elas) se referiram às características do bloco granítico que se deslocou como sendo no formato de cunha (com cerca 2 metros na parte superior e zero metros na parte inferior), com um corte lizo na parte do deslocamento, características estas que apontam claramente para a existência da dita fissura no bloco granítico, sendo também referido, que esse deslocamento poderia ter acontecido com a trepidação do martelo pneumático utilizado pelo autor para fazer o furo que estava a executar, o que, também, é de aceitar. Finalmente, o tribunal, em relação ao facto de tal fissura não ter sido detectada aquando do início dos trabalhos, considerou os depoimentos que apontam nesse sentido, considerando que no local quer o gerente da empresa, quer o seu encarregado, quer os trabalhadores, como resultou da audiência, estariam na posse de conhecimentos e alertados para a eventual existência dessas fissuras e para o facto de, sendo detectadas, não procederem a trabalhos sem que antes recorressem à sua remoção, nomeadamente com recurso à máquina giratória, como também foi referido por algumas testemunhas. Note-se que é a própria seguradora que em sede de contestação põe em causa a versão do autor e a sua não coerência (cfr. artigos 10º a 12º), sendo que a primeira das versões (artigo 10º e 11º) não parece fazer qualquer sentido – subir e perfurar a pedra enquanto a máquina da empresa encostava a pá para a abalar, com a intenção que esta deslocasse -, já que para além do autor, também se encontravam no local, e com o autor, o encarregado da obra e outro trabalhador, nem tal versão foi aqui trazida por qualquer das testemunhas ouvidas e, a segunda das versões, embora reafirmadas pelo autor e pelas testemunhas A. V. e L. M., não foi, na convicção do tribunal, credível, tal como resulta da análise supra deixada expressa.
(…)
Relativamente às respostas negativas à matéria das alíneas a) a h), tais respostadas resultaram em contraponto com a matéria alegada e dada como provada e que aponta, com toda a probabilidade, pela sua não verificação.
Teve o tribunal em consideração nas respostas que deu quanto aos factos provados e aos factos não provados, o ónus da prova que impendia sobre cada uma das partes.”.
Não se duvida no caso que o modo expositivo usado na fundamentação não compromete a compreensão dos meios de prova conforme o julgador os apreendeu e da matéria analisada em cada proposição sua.
Não se fazem afirmações inconciliáveis entre si. Sem premissas incompatíveis, cada uma delas subsiste utilmente por si.
Como foi concebida, de forma evidente ressaltam os concretos meios de prova que determinaram a sua decisão sobre a realidade controvertida num sentido ou noutro.
Formalmente, pois, é feita análise crítica da prova e são assegurados os raciocínios e seus percursos que presidiram à opção sobre a matéria de facto perante si discutida, sendo admitida ou repudiada.
Ressalta formalmente também que a convicção é adquirida de forma justificada, coerente e admissível, ou seja, sem ser em detrimento das regras de experiência comum.
O processo lógico subjacente à formação da convicção do juiz ou a exteriorização da formação dessa convicção através do exame crítico da prova é, por isso, de molde a permitir aos destinatários da decisão conhecer o motivo pelo qual o tribunal a quo decidiu os factos como provados ou não provados.

Tudo, nesta perspectiva, insusceptível de afectar a transparência da decisão.

Não será necessário exercício de exegese exigente para se concluir deste modo.
De resto, na impugnação da decisão da matéria de facto a recorrente não censura o processo imanente à lógica do julgador exteriorizado na fundamentação.

Como refere Abrantes Geraldes (Temas da Reforma do Processo Civil, II, 249) a exigência legal da fundamentação “impõe que, de acordo com as circunstâncias do caso concreto, se estabeleça o fio condutor entre a decisão da matéria de facto (resultado) e os meios de prova que foram usados na aquisição da convicção (fundamentos) fazendo a respectiva apreciação crítica, nos seus aspectos mais relevantes.”.
Ora, o que se constata imediatamente destes fundamentos é que a fonte probatória do tribunal a quo respeitante à sua convicção sobre matéria fulcral para a decisão de mérito foi vasta.
A recorrente não rebate directamente a fundamentação quando procede à síntese analítica daquilo que substantivamente foi pronunciado ao longo da produção da diversa prova oral e tal significa que deve aceitar-se que a prova decorreu como o tribunal a quo mencionou com excepção daquilo que possa colidir com os trechos dessa prova que a recorrente transcreve.
Procede à análise dos meios que fica objectivamente aquém da efectuada pelo tribunal a quo. A reponderação da prova que incidiu sobre a mesma matéria pretendida pela recorrente tem uma fonte probatória diversa daquela que o tribunal a quo analisou.
Não atende por isso à unidade da prova como foi concebida por este, para tudo isso servindo a obrigação da fundamentação: as provas que serviram de fundamento à decisão sobre um determinado facto têm que ser analisadas e examinadas em conjunto e não isoladamente.
Nesta sequência, ao alhear-se da fundamentação da convicção que esteve na base dessa decisão, igualmente a recorrente não depreciou a decisão do tribunal a quo sobre a matéria que impugna face ao juízo crítico e lógico por ele formulado.

Conforme salienta o douto Acórdão do Tribunal Constitucional nº 198/04, publicado no DR, II Série, de 02.06.2004, a impugnação da decisão em matéria de facto “(...) terá de assentar na violação dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na convicção ou porque se violaram os princípios para aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma, seria a inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão (...)”.

Assim sendo de forma irremediável é inconsistente por inconclusiva a censura da recorrente ao juízo desse tribunal para se alterar nesta parte a decisão da matéria de facto.

Acontece ainda, a recorrente ao ignorar o mais que possa ter sido mencionado por outra prova, assenta também a impugnação exclusivamente em curtas afirmações sincopadas e relativizáveis em que existe imprecisão de denominações (ora fissuras, ora brechas, ora estaladelas) de três intervenientes (testemunhas L. M., António e A) e são carenciadas de explicações consistentes sobre motivos ou contextos prévios que justifiquem cabalmente a existência da causa última do acidente segundo a sua tese, ou seja, a evidência da fissura a anunciar o inevitável acidente.

Deste modo, ao concluir, por exemplo “que a frente de desmonte onde o Autor se encontrava a laborar apresentava, previamente ao sinistro, evidentes sinais de risco de ruina ou derrocada, uma vez que era visível uma fissura na mesma”, não deixa de partir de uma mera petição de princípio em circunstâncias processuais nas quais segundo a dita fundamentação não se pode excluir que a fissura poderia ser muito pouco aparente e se pode ainda falar da “trepidação do martelo pneumático utilizado pelo autor para fazer o furo que estava a executar”. Tanto mais que a testemunha António explicando como se exibia a “rachadela” respondeu que foi em forma de cunha e perguntado se não se via antes da quebra chegou a responder negativamente, bem como o sinistrado chegou a referir no seu depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 23.11.2017, por nós também auditadas, que ninguém se apercebeu da fissura.

Sem se olvidar os trechos dos depoimentos das testemunhas J. D. e A. S. (este manobrador de máquinas no local igualmente então colega de trabalho do sinistrado que é ainda a trabalhador na empregadora, aquele então encarregado da empregadora) citados por pela empregadora nas contra-alegações, onde se nega ter-se visto qualquer fractura ou fissura na rocha, tendo o primeiro afirmado a actividade inspectiva. Ou ainda do citado António cujo depoimento vai no mesmo sentido negando ainda que no dia anterior alguém tivesse alertado para a evidência de uma fissura no bloco.

Por tudo isto não colhe a favor da recorrente a invocação da prova acerca desta matéria.

Por maioria de razão o mesmo se pode dizer da verificabilidade prévia das “fracturas/fissuras”, sendo que só disto, independentemente de quem a fez, respeita a matéria do citado nº 39 onde foi dada como assente irrestritamente a do ponto 32 da base instrutória, porquanto, igualmente a prova oral invocada pela recorrente através dos respectivos pequenos trechos ou é dubitativa ou ambivalente por si ou em face do que consta na fundamentação.

Nesta, a título do depoimento da testemunha A. V. consta que “não viu fissuras. Que os trabalhadores faziam uma vistoria aos blocos e quando havia dúvidas ia lá o encarregado. Que quando foram trabalhar para o bloco este parecia seguro”, o que não chega a ser contrariada pelo enxerto do depoimento desta testemunha citado pela recorrente.

Ocorre dizer que a título do depoimento da testemunha L. M. ainda que fosse verdade que no dia anterior tivesse sido abordado a questão da fissura como se extrai do excerto trazido pela recorrente, tal não deixa de indiciar a constatação in loco a sugerir conduta consentânea com a análise referida nesse ponto dos factos assentes, nestes termos devendo serem vistas as declarações do sinistrado.

Quanto ao depoimento da testemunha António que segundo a fundamentação mencionou “o local onde o autor estava a trabalhar era uma bancada plana e não foi falado que a mesma tinha qualquer fissura.(…) antes do início de qualquer trabalho é certificada a segurança do trabalho a realizar. Que quando é detectada qualquer fissura no bloco, vai lá a máquina abanar para provocar a queda. Naquele dia não foi detectada qualquer fissura”, uma vez mais o excerto relativo a essa testemunha trazido à colação no recurso não serve para a desmentir.

Seguindo ainda o que se mencionou na fundamentação sobre o depoimento da testemunha J. D., o encarregado, e as declarações do gerente da empregadora, atribuindo-se-lhes conduta consentânea com efectiva verificação do estado da frente de trabalho, como antevisto, a recorrente tão pouco nega validamente as respectivas afirmações pela indicação dos respectivos trechos segundo os ónus impostos pelo artº 640º do CPC.

De qualquer modo essa verificação é mencionada efectivamente em excertos desta prova e do depoimento de A. S. referenciados nas contra-alegações.
O sinistrado também referiu no seu depoimento prestado na sessão de julgamento do dia 23.11.2017, por nós também auditado, que a inspecção era feita pelos trabalhadores e pelo encarregado.

Por isso na fundamentação bem se referiu ainda que “Finalmente, o tribunal, em relação ao facto de tal fissura não ter sido detectada aquando do início dos trabalhos, considerou os depoimentos que apontam nesse sentido, considerando que no local quer o gerente da empresa, quer o seu encarregado, quer os trabalhadores, como resultou da audiência, estariam na posse de conhecimentos e alertados para a eventual existência dessas fissuras e para o facto de, sendo detectadas, não procederem a trabalhos sem que antes recorressem à sua remoção, nomeadamente com recurso à máquina giratória, como também foi referido por algumas testemunhas.”.

Releva ainda negativamente para a sorte desta parte da impugnação que a recorrente nem sequer tomou posição acerca do resultado da acareação em audiência entre as testemunhas L. M. e J. D. sobre contradição “da detecção da fissura na parte da bancada que se desprendeu e que teria provocado o acidente aqui em causa”.

Ainda assim não se pode descartar que dados os termos em que fixou o percurso da fundamentação da convicção para de decidir a matéria de facto, a matéria desse ponto poderia ter sido firmada em presunção natural baseada nomeadamente em circunstâncias aludidas na prova oral (artºs 349º e 351º do CC) mas que o alegado nesta impugnação não é susceptível de a infirmar.

Assim sendo improcede esta parte da impugnação.

A recorrente, opõem-se a que a matéria dos pontos 35 e 36 da sentença seja considerada assente (na execução dessa tarefa, o autor não se aproximava da ponta ou do final da bancada, não se mostrando necessário nem aconselhável o uso do arnês de segurança; …nem de resguardos especiais, a chamada linha de vida, porque o trabalhador na execução daquele trabalho não se aproxima sequer da ponta da bancada) ficando a mesma como não provada.

Segundo ela “A matéria em causa, …, é conclusiva, contém juízos de valor, e por isso não pode ser considerada matéria de facto. Deve ser eliminada da matéria de facto, dando-se como não escrita.”

Discorda-se.

É certo que inexistindo no regime processual civil norma idêntica à do artº 646º, nº 4 do CPC anterior (têm-se por não escritas as respostas do tribunal sobre questões de direito, assim como as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes), deve manter-se o mesmo desiderato através do disposto no artº 607º, nº 4 do CPC interpretado a contrario sensu.

Mas, desde logo, a recorrente nem se detém perante matéria de indiscutível índole material, objectiva e concreta desses pontos, razão pela qual seria pelo menos de manter os respectivos segmentos: “na execução dessa tarefa, o autor não se aproximava da ponta ou do final da bancada,…” ou “… o trabalhador na execução daquele trabalho não se aproxima sequer da ponta da bancada.”

E no mais não se pode dizer que as expressões “não se mostrando necessário nem aconselhável o uso do arnês de segurança” e nesta sequência “nem de resguardos especiais, a chamada linha de vida” representem meras conclusões, juízos de valor, juízos jurídicos-conclusivos ou conceitos de direito, por essa desnecessidade ou não recomendação serem de “extrair de determinados factos provados e da legislação aplicável”.

Na verdade, essas expressões, de utilização comum como não podia deixar de ser, não têm conteúdo puramente valorativo ou conclusivo, destituídas de qualquer suporte factual susceptível de influenciar o sentido da solução do litígio na medida em que encerram situações objectiváveis em circunstâncias materiais que directamente as consubstanciam, permitindo ou não a sua confirmação. Ademais, permitem o exercício do contraditório com a alegação e prova de outras condições objectivadas que impedissem de serem dadas por adquiridas.

E tanto assim é que a recorrente chegou alegar que “o uso de arnês ou cinto de segurança teria impedido a queda do autor” conforme consta na base 17 e no nº 36 da contestação que veio a dar lugar ao teor da alínea g) da matéria não provada da sentença, decisão que vem também impugnada por se pretender como assente essa matéria, já para não falarmos da matéria da alª h) dos factos não assentes que também se impugna e em que está em questão se houve prévia inspecção “por pessoal competente”.

Mais uma vez, pois, improcede esta parte da impugnação.

Depois ainda, a recorrente insurge-se contra o tribunal a quo por ter decidido que a matéria das alªs a), b), e), f), g) e h) da sentença (a máquina giratória manuseada por um dos seus trabalhadores, embateu com a pá no bloco onde se encontravam o autor e seus colegas de trabalho; o autor caiu juntamente com o bloco de pedra de uma altura de vários metros, na sequência do embate da pá da máquina giratória no bloco onde se encontrava a laborar; nas circunstâncias de tempo e lugar referidos em 3. e 4., decorriam, ao mesmo tempo, trabalhos de desmonte em dois blocos graníticos que se encontravam muito próximos, sendo que num desses blocos se encontravam diversos trabalhadores já a laborar; o desmonte nesse outro bloco de granito estava a ser realizado com recurso a maquinaria pesada, nomeadamente uma “giratória de rastos”; o uso de arnês ou cinto de segurança teria impedido a queda do autor; a frente de desmonte onde decorriam os trabalhos não foi previamente inspeccionada por pessoal competente) não se encontrava assente.

Entende que deve dar-se como provada irrestritamente.

A primeira e a segunda em razão de prova oral que referiu anteriormente (A. V., L. M. e sinistrado) e referindo apenas que estamos perante prova clara e que a versão do evento dessa matéria é que “se mostra plausível e conforme aos juízos de experiência. Na verdade, se nada de anormal tivesse acontecido, inexistia causa para a queda do bloco granítico, como é manifesto.”.
A terceira e quarta em razão também da mesma prova oral dando por adquirido o ocorrido conforme esses intervenientes declaram.
A quinta, sem mais, em razão dos depoimentos dos citados L. M. e A. S..
A última, sem mais também, em razão dos depoimentos das testemunhas inicialmente por si citadas (A. V., L. M. e António).

Constatamos que continuou a utilizar o mesmo método impugnatório acima analisado e convenientemente avaliado em relação à fundamentação do tribunal a quo para decidir a matéria de facto, também ponderada segundo o processo lógico que lhe está subjacente, constatando-se, além do mais: não ser a fonte probatória desse tribunal rebatida directamente quando aí se procede à síntese analítica do que substantivamente resultou pronunciado da produção da prova oral; ter ficado a apreciação crítica dos meios de prova da recorrente objectivamente aquém da apreciação crítica da prova do tribunal, não atendendo obviamente a unidade da prova como foi concebida pelo mesmo; ser por isso inconclusiva a censura que a recorrente exerce sobre o juízo desse tribunal para se alterar nesta parte a decisão da matéria de facto, pelo que de forma irremediável queda-se no sentido da inconsistência e improcedência; e, para além disto, não foi depreciada a decisão do tribunal a quo sobre a matéria que impugna segundo juízo crítico e lógico alheando-se da fundamentação da convicção que esteve na base dessa decisão.
A recorrente, pois, ignorou o mais que possa ter sido extraído de outra prova e assenta mais uma vez o seu raciocínio, tal como anteriormente comentou-se, exclusivamente em curtas afirmações sincopadas e relativizáveis de trechos de prova oral, alguns deles renovados para este efeito.

Quanto à primeira e a segunda matéria

O excerto do depoimento da testemunha A. V. inclusivamente até parece ir no sentido de ter sido um acto intencional (tocou ao puxar … e ao vir com a lança puxou lá no coiso e ela deslocou), mas sendo certo o que quer que fosse o “coiso”, os depoimentos das citadas testemunhas J. D., A. S., António, J. P., manobrador da máquina giratória no local e que é ainda a trabalhador na empregadora, e as declarações de Fernando, segundo a fundamentação, são em sentido diametralmente oposto, inclusivamente alguns com a justificação do acidente com o uso do martelo pneumático sobre o bloco de granito.

Tal, de resto, pode ser constatado directamente dos excertos dos depoimentos de J. D. e António transcritos na citada contra-alegação.

O mesmo acontece com o depoimento da testemunha L. M.. Para além da argumentação expendida antecedentemente que aqui vale temos inclusivamente que a mesma chega a admitir que “já tinham feito, começado, feito furo. Já iam com a segunda broca”.
Por maioria de razão quanto às declarações do sinistrado.

Quanto à terceira e quarta matéria

Os dois excertos (o segundo é uma repetição) do depoimento da testemunha A. V. devem ser vistos com cepticismo já que deles não é evidente que estejamos perante o desmonte simultâneo de dois blocos graníticos que se encontrassem muito próximos como consta nas respectivas alíneas com recurso à máquina giratória, o cerne das questões trazidas pelas alªs e) e f). Refere-se naqueles que “andava a tentar tirar a pedra solta” ou “Havia outros. Dos colegas. Tirava da nossa, tirava dos colegas” e, segundo a fundamentação, a testemunha J. D. mencionou que havia uma máquina a fazer limpeza da frente das bancadas, as testemunhas J. P., A. S. e António referiram que a máquina estava a puxar ou desviar pedras soltas ou ainda a fazer limpeza do outro lado da bancada, reiterado pelo Fernando (estava a limpar terreno).

O mesmo pode constatar-se nos excertos de depoimentos dessas testemunhas transcritos na citada contra-alegação.

Com as mesmas reservas deve ser visto os excertos do depoimento da testemunha L. M. (Nessa manhã, onde eles estavam a fazer o furo estava lá uma máquina, na esquina da bancada, estava a tombar uma pedra que já estava solta).

Igualmente o excerto das declarações do sinistrado ainda que aí se aluda a um outro bloco contudo, imediatamente, sem consistência bastante para se contextualizar nos termos sugeridos nas ditas alíneas.

Quanto à quinta matéria

É manifesto que o excerto do depoimento da testemunha L. M. escolhido para este efeito não servirá os intentos da recorrente pois é este que desde logo afirma: “É assim, o tombo que ele deu, podia não dar, mas ainda sofria lá também umas lesões”.
O enxerto do depoimento A. S. é unicamente uma constatação da possibilidade de colocação do arnês.

E, segundo a fundamentação, a testemunha A. V. alude a uma possibilidade de ficar dependurado com o uso do arnês mas de qualquer forma estaremos sempre perante uma queda podendo trazer consigo o efeito de arrastamento do próprio ou de outros, quiçá não evitando o esmagamento, tudo dependendo também onde poderia ser fixo o ponto de vida e o cumprimento das linhas de vida matéria que as partes não trataram de alegar. Do que resulta também da fundamentação é a ideia de outros impedimentos pelo uso de arnês trazida pelos depoimentos das testemunhas J. D., A. S., António e das declarações Fernando, tese adoptada pelo sinistrado alegada amplamente na resposta (nºs 29 a 33, 40 e 41).

Quanto à sexta matéria

É o reverso da matéria do ponto 39 da factualidade assente pelo que desde logo se pode dizer que se encontra prejudicado o seu conhecimento.
De qualquer modo, é aqui inteiramente válida a argumentação aí expendida para não a darmos como assente já que também, obviamente, os excertos ora trazidos à colação são repetições daqueles que foram analisados para a tal anterior apreciação.

É improcedente mais esta parte da impugnação e não terminaremos sem dizer que exige-se para a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, que os elementos de prova que se invoquem tenham a virtualidade de imporem a modificação da decisão de facto como se reclama nos artºs 640º, nº 1, alª b), e 662º, nº 1, do CPC (“…que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida” ou “… impuserem decisão diversa”).

Efectivamente, é apodíctico, para estes normativos convém especificar não meios de prova que admitam, permitam ou consintam decisão diversa da recorrida mas, antes, que imponham decisão diversa da impugnada.

E toda a apreciação da prova pelo tribunal a quo tem ainda a seu favor o importante princípio da imediação que não pode ser descurado no convencimento da veracidade ou probabilidade dos factos sobre que recaiu a mesma, segundo o princípio da liberdade de julgamento.

Devendo-se concluir assim que a factualidade posta em crise pela recorrente não se revelando grosseiramente apreciada pela primeira instância é de confirmar.

Mantendo-se incólume a matéria de facto temos que o recurso não é interposto em matéria de direito em virtude da descaracterização do acidente nos termos do artº 14º da Lei 98/2009 de 04.09.

Pugna-se apenas pela responsabilização da empregadora pelo acidente por actuação culposa, nos termos conjugados dos artºs 18º e 79º, nº 3 do mesmo diploma.

Todavia, a recorrente faz depender essa responsabilidade na medida da alteração da matéria de facto em resultado da impugnação acabada de decidir e, certo é, concorda-se com o expendido na sentença no que tange à desresponsabilização da empregadora que foi mais extenso e incisivo quanto a normas e regras de segurança que no caso poderiam ser equacionáveis:

“Cumpre, agora, decidir se o acidente de trabalho em causa nos presentes autos resultou da inobservância, por parte da entidade empregadora, de regras de segurança na execução do trabalho, como alega a ré/seguradora, o que, a verificar-se, terá directa atinência com a determinação da entidade responsável obrigada a indemnizar o autor/sinistrado.

A ré/seguradora, invoca que o sinistro sub judice deveu-se (porventura) à violação da regras de segurança por parte da entidade empregadora, alegando que esta não respeitou/adoptou os procedimentos que decorrem dos artºs. 127º, nº. 1 do Código do Trabalho e art. 126º, nº. 3 do Decreto-Lei nº. 162/90, porquanto decorriam ao mesmo tempo trabalhos em dois blocos que se encontravam muito próximos, num deles com recurso a maquinaria pesada, nomeadamente uma “giratória de rastos” e, que, a frente de desmonte onde ocorriam os trabalhos não foi previamente inspeccionada por pessoal competente, nem os trabalhadores que se encontravam nas imediações foram advertidos para se retirarem pada lugar seguro, ou seja.
(…)

Vejamos a quem assiste razão.

Como é sabido, a responsabilidade emergente de acidente de trabalho constitui um caso típico de responsabilidade objectiva, incidindo sobre o empregador independentemente da culpa deste na ocorrência do acidente (cfr. art. 1º daquela Lei).

O n.º 1 do artigo 18.º da Lei n.º 98/2009, de 4/09 (aplicável ao caso), sob a epígrafe «Actuação culposa do empregador», estabelece que «[q]uando o acidente tiver sido provocado pelo empregador, seu representante ou entidade por aquele contratada e por empresa utilizadora de mão-de-obra, ou resultar de falta de observação, por aqueles, das regras sobre segurança e saúde no trabalho, a responsabilidade individual ou solidária pela indemnização abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares, nos termos gerais.

(…)
Do citado preceito decorre que para que o acidente recaía sob a alçada da entidade empregadora é necessário que, cumulativamente, se verifiquem os seguintes requisitos:

a) que sobre a entidade empregadora recaia o dever de observar determinada(s) norma (s) ou regra(s) de segurança e que a(s) não haja observado por facto que lhe é imputável, a título de culpa;
b) que entre essa conduta omissiva e o acidente ocorra um nexo de causalidade adequada, de modo a que se possa concluir que, não fosse a omissão, o acidente não teria ocorrido.

A aplicação desta norma exige que se verifique, em concreto, a falta de cumprimento ou a violação das regras de segurança no trabalho, imputável à entidade empregadora, e que exista nexo de causalidade entre essa inobservância e a produção do acidente(11 Cfr. Carlos Alegre, in Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2.ª edição, págs. 102 a 105 e, entre outros, o Acórdão da Relação do Porto de 2006-03-20, disponível in www.dgsi.pt.).
(…)

Assim, para efeitos de aplicação dos artigos 18.º, n.º 1, e 79.º, n.º 3, da Lei n.º LAT em vigor, cabe ao beneficiário do direito à reparação por acidente de trabalho, bem como às instituições seguradoras que pretendam ver desonerada a sua responsabilidade infortunística, o ónus de alegar e provar os factos que revelem que o acidente ocorreu por culpa da entidade empregadora ou, que o mesmo, resultou da inobservância por parte daquela de regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho.
Não basta, todavia, que se verifique um comportamento culposo da entidade empregadora ou a inobservância das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho por banda da mesma entidade, para responsabilizar esta, de forma agravada, pelas consequências do acidente, tornando-se, ainda, necessária a prova do nexo de causalidade entre essa conduta ou inobservância e a produção do acidente.

Como é jurisprudência pacífica, o ónus da prova dos factos que agravam a responsabilidade da entidade empregadora, nos termos do citado art. 18º, n.º 1 da LAT, cabe a quem dela tirar proveito, no caso, aos beneficiários do direito à reparação por acidente de trabalho (cfr. art. 342º, n.º 1 do Código Civil) e à seguradora (cfr. art. 342º, n.º 2 do Código Civil).

No caso dos autos, apenas a ré/seguradora suscitou tal questão, incumbindo-lhe, por isso, alegar (como alegou) e provar não só a inobservância por parte da entidade empregadora de regras sobre segurança no trabalho, mas também a existência de nexo de causalidade entre essa alegada inobservância e o acidente (12- Cfr. Ac. do STJ de 12/09/2007 (Relator Conselheiro Pinto Hespanhol), disponível in www.dgsi.pt).
*
Importa, agora, examinar as regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho com pertinência para a situação versada nos autos, mormente as invocadas pelas partes.

Estipula o artigo 281.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro (C.T./2009), sob a epígrafe «Princípios gerais em matéria de segurança e saúde no trabalho», que:

«1 - O trabalhador tem direito a prestar trabalho em condições de segurança e saúde.
2 - O empregador deve assegurar aos trabalhadores condições de segurança e saúde em todos os aspectos relacionados com o trabalho, aplicando as medidas necessárias tendo em conta princípios gerais de prevenção. (…)».

Por sua vez, o Decreto-Lei n.º 50/2005, de 25/02, transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2001/45/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Junho, relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde para a utilização pelos trabalhadores de equipamentos de trabalho, e revogou o Decreto-Lei n.º 82/99 (13- O citado Decreto-Lei n.º 82/99 regulava as prescrições mínimas de segurança e saúde dos trabalhadores na utilização de equipamentos de trabalho, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 89/655/CEE, do Conselho, de 30 de Novembro, alterada pela Directiva n.º 95/63/CE, do Conselho, de 5 de Dezembro), de 16 de Março (art. 1º, n.º 1).

Segundo o seu art. 3.º, «[p]ara assegurar a segurança e a saúde dos trabalhadores na utilização de equipamentos de trabalho, o empregador deve:

a) Assegurar que os equipamentos de trabalho são adequados ou convenientemente adaptados ao trabalho a efectuar e garantem a segurança e a saúde dos trabalhadores durante a sua utilização;
b) Atender, na escolha dos equipamentos de trabalho, às condições e características específicas do trabalho, aos riscos existentes para a segurança e a saúde dos trabalhadores, bem como aos novos riscos resultantes da sua utilização;
c) Tomar em consideração os postos de trabalho e a posição dos trabalhadores durante a utilização dos equipamentos de trabalho, bem como os princípios ergonómicos;
d) Quando os procedimentos previstos nas alíneas anteriores não permitam assegurar eficazmente a segurança ou a saúde dos trabalhadores na utilização dos equipamentos de trabalho, tomar as medidas adequadas para minimizar os riscos existentes;
e) Assegurar a manutenção adequada dos equipamentos de trabalho durante o seu período de utilização, de modo que os mesmos respeitem os requisitos mínimos de segurança constantes dos artigos 10.º a 29.º e não provoquem riscos para a segurança ou a saúde dos trabalhadores».

E, quanto às prescrições mínimas de segurança e de saúde para a utilização pelos trabalhadores de equipamentos de trabalho, visando, em especial, regulamentar a utilização de equipamentos destinados à execução de trabalhos em altura, para proteger a segurança e saúde dos trabalhadores, tendo em consideração, como se consignou no seu preâmbulo, dispõe que «[a] execução dos trabalhos em altura expõe os trabalhadores a riscos elevados, particularmente quedas, frequentemente com consequências graves para os sinistrados e que representam uma percentagem elevada de acidentes de trabalho».

Especificamente, o atinente artigo 3.º, «Obrigações gerais do empregador», reza que «[p]ara assegurar a segurança e a saúde dos trabalhadores na utilização de equipamentos de trabalho, o empregador deve: a) [a]ssegurar que os equipamentos de trabalho são adequados ou convenientemente adaptados ao trabalho a efectuar e garantem a segurança e a saúde dos trabalhadores durante a sua utilização; b) [a]tender, na escolha dos equipamentos de trabalho, às condições e características específicas do trabalho, aos riscos existentes para a segurança e saúde dos trabalhadores, bem como aos novos riscos resultantes da sua utilização; c) [t]omar em consideração os postos de trabalho e a posição dos trabalhadores durante a utilização dos equipamentos de trabalho, bem como os princípios ergonómicos […].»
E dispõe, no artigo 8.º, que «[o] empregador deve prestar aos trabalhadores e seus representantes para a segurança, higiene e saúde no trabalho a informação adequada sobre os equipamentos de trabalho utilizados» (n.º 1) e que «[a] informação deve ser facilmente compreensível, escrita, se necessário, e conter, pelo menos, indicações sobre: a) [c]ondições de utilização dos equipamentos; b) [s]ituações anormais previsíveis; c) [c]onclusões a retirar da experiência eventualmente adquirida com a utilização dos equipamentos; d) [r]iscos para os trabalhadores decorrentes de equipamentos de trabalho existentes no ambiente de trabalho ou de alterações dos mesmos que possam afectar os trabalhadores, ainda que não os utilizem directamente» (n.º 2).

No capítulo II, estabelecem-se os requisitos mínimos de segurança dos equipamentos de trabalho que são aplicáveis «na medida em que o correspondente risco exista no equipamento de trabalho considerado» (artigo 10.º), sendo que o «equipamento de trabalho que provoque riscos devido a queda ou projecção de objectos deve dispor de dispositivos de segurança adequados» (n.º 1 do artigo 15.º), consignando-se, na Secção IV, requisitos complementares dos equipamentos de elevação de cargas, reportados à respectiva instalação (artigo 27.º), sinalização e marcação (artigo 28.º).

No respeitante às regras específicas sobre a utilização dos equipamentos de trabalho destinados a trabalhos em altura, estipula o artigo 36.º: «[n]a situação em que não seja possível executar os trabalhos temporários em altura a partir de uma superfície adequada, com segurança e condições ergonómicas apropriadas, deve ser utilizado equipamento mais apropriado para assegurar condições de trabalho seguras» (n.º 1); «[n]a utilização de equipamento destinado a trabalhos temporários em altura, o empregador deve dar prioridade a medidas de protecção colectiva em relação a medidas de protecção individual» (n.º 2); «[o] dimensionamento do equipamento deve corresponder à natureza dos trabalhos e às dificuldades que previsivelmente ocorram na sua execução, bem como permitir a circulação de trabalhadores em segurança» (n.º 3), sendo que «[a] passagem, em qualquer sentido, entre meios de acesso a postos de trabalho em altura e plataformas e passadiços deve, se for caso disso, estar protegida contra riscos adicionais de quedas» (n.º 6).

Por último, estatui o artigo 37.º, que «[a]s medidas de protecção colectiva destinadas a limitar os riscos a que os trabalhadores que executam trabalhos temporários em altura estão sujeitos e devem atender ao tipo de características dos equipamentos de trabalho a utilizar» (n.º 1), que «[s]empre que a avaliação de riscos considere necessários, devem ser instalados dispositivos de protecção contra quedas, com configuração e resistência que permitam evitar ou suster quedas em altura» (n.º 2), que «[o]s dispositivos de protecção contra quedas só podem ser interrompidos nos pontos de acesso de escadas, verticais ou outras» (n.º 3) e que, «[s]e a execução de determinados trabalhos exigir, tendo em conta a sua natureza, a retirada temporária de dispositivos de protecção colectiva contra quedas, o empregador deve tomar outras medidas de segurança eficazes e, logo que a execução dos trabalhos termine ou seja suspensa, instalar esses dispositivos» (n.º 4).

Por sua vez, a Lei nº.100/2009, de 10 de Setembro, no seu art. 15º, sob a epígrafe “Obrigações gerais do empregador, dispõe:

1 - O empregador deve assegurar ao trabalhador condições de segurança e de saúde em todos os aspectos do seu trabalho.
2 - O empregador deve zelar, de forma continuada e permanente, pelo exercício da actividade em condições de segurança e de saúde para o trabalhador, tendo em conta os seguintes princípios gerais de prevenção: a) Evitar os riscos; b) Planificar a prevenção como um sistema coerente que integre a evolução técnica, a organização do trabalho, as condições de trabalho, as relações sociais e a influência dos factores ambientais; c) Identificação dos riscos previsíveis em todas as actividades da empresa, estabelecimento ou serviço, na concepção ou construção de instalações, de locais e processos de trabalho, assim como na selecção de equipamentos, substâncias e produtos, com vista à eliminação dos mesmos ou, quando esta seja inviável, à redução dos seus efeitos; d) Integração da avaliação dos riscos para a segurança e a saúde do trabalhador no conjunto das actividades da empresa, estabelecimento ou serviço, devendo adoptar as medidas adequadas de protecção; e) Combate aos riscos na origem, por forma a eliminar ou reduzir a exposição e aumentar os níveis de protecção; f) Assegurar, nos locais de trabalho, que as exposições aos agentes químicos, físicos e biológicos e aos factores de risco psicossociais não constituem risco para a segurança e saúde do trabalhador; g) Adaptação do trabalho ao homem, especialmente no que se refere à concepção dos postos de trabalho, à escolha de equipamentos de trabalho e aos métodos de trabalho e produção, com vista a, nomeadamente, atenuar o trabalho monótono e o trabalho repetitivo e reduzir os riscos psicossociais; h) Adaptação ao estado de evolução da técnica, bem como a novas formas de organização do trabalho; i) Substituição do que é perigoso pelo que é isento de perigo ou menos perigoso; j) Priorização das medidas de protecção colectiva em relação às medidas de protecção individual; l) Elaboração e divulgação de instruções compreensíveis e adequadas à actividade desenvolvida pelo trabalhador.
3 - Sem prejuízo das demais obrigações do empregador, as medidas de prevenção implementadas devem ser antecedidas e corresponder ao resultado das avaliações dos riscos associados às várias fases do processo produtivo, incluindo as actividades preparatórias, de manutenção e reparação, de modo a obter como resultado níveis eficazes de protecção da segurança e saúde do trabalhador.
4 - Sempre que confiadas tarefas a um trabalhador, devem ser considerados os seus conhecimentos e as suas aptidões em matéria de segurança e de saúde no trabalho, cabendo ao empregador fornecer as informações e a formação necessárias ao desenvolvimento da actividade em condições de segurança e de saúde.
5 - Sempre que seja necessário aceder a zonas de risco elevado, o empregador deve permitir o acesso apenas ao trabalhador com aptidão e formação adequadas, pelo tempo mínimo necessário.
6 - O empregador deve adoptar medidas e dar instruções que permitam ao trabalhador, em caso de perigo grave e iminente que não possa ser tecnicamente evitado, cessar a sua actividade ou afastar-se imediatamente do local de trabalho, sem que possa retomar a actividade enquanto persistir esse perigo, salvo em casos excepcionais e desde que assegurada a protecção adequada.
7 - O empregador deve ter em conta, na organização dos meios de prevenção, não só o trabalhador como também terceiros susceptíveis de serem abrangidos pelos riscos da realização dos trabalhos, quer nas instalações quer no exterior.
8 - O empregador deve assegurar a vigilância da saúde do trabalhador em função dos riscos a que estiver potencialmente exposto no local de trabalho.
9 - O empregador deve estabelecer em matéria de primeiros socorros, de combate a incêndios e de evacuação as medidas que devem ser adoptadas e a identificação dos trabalhadores responsáveis pela sua aplicação, bem como assegurar os contactos necessários com as entidades externas competentes para realizar aquelas operações e as de emergência médica.
10 - Na aplicação das medidas de prevenção, o empregador deve organizar os serviços adequados, internos ou externos à empresa, estabelecimento ou serviço, mobilizando os meios necessários, nomeadamente nos domínios das actividades técnicas de prevenção, da formação e da informação, bem como o equipamento de protecção que se torne necessário utilizar.
11 - As prescrições legais ou convencionais de segurança e de saúde no trabalho estabelecidas para serem aplicadas na empresa, estabelecimento ou serviço devem ser observadas pelo próprio empregador.
12 - O empregador suporta a totalidade dos encargos com a organização e o funcionamento do serviço de segurança e de saúde no trabalho e demais sistemas de prevenção, incluindo exames de vigilância da saúde, avaliações de exposições, testes e todas as acções necessárias no âmbito da promoção da segurança e saúde no trabalho, sem impor aos trabalhadores quaisquer encargos financeiros.

Resulta globalmente das normas destinadas a garantir a segurança no trabalho, que o uso do cinto de segurança é obrigatório, para além dos casos especialmente previstos, quando o trabalhador estiver exposto a um risco efectivo de queda livre e esse risco não possa ser evitado ou suficientemente limitado por meios técnicos de protecção colectiva.

Por sua vez, o art.º 11.º da Portaria 101/96, de 3 de Abril, prescreve, no que concerne a “Quedas em altura”, o seguinte:

“1. Sempre que haja risco de quedas em altura, devem ser tomadas medidas de protecção colectivas adequadas e eficazes ou, na impossibilidade destas, de protecção individual, de acordo com a legislação aplicável, nomeadamente o Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil.
2. Quando, por razões técnicas, as medidas de protecção colectiva forem inviáveis ou ineficazes, devem ser adoptadas medidas complementares de protecção individual, de acordo com a legislação aplicável.”
Ao caso dos autos são, também, aplicável as regras específicas que resultam do Decreto- Lei nº. 162/90, de 22 de Maio.

No caso em apreço, da matéria factual resulta provado que o autor/sinistrado foi vítima de um acidente de trabalho numa pedreira propriedade da empresa “Granitos R., Lda.”, quando se encontrava a efectuar trabalhos de perfuração de um bloco granítico com o recurso a um martelo pneumático, altura em que uma parte da bancada onde se encontrava resvalou e arrastou consigo o autor/sinistrado, causando a sua queda e as lesões reportadas nos autos.
Provado resulta, ainda, que o autor/sinistrado executava aquele trabalho sobre uma bancada de superfície plana (sem inclinação), situada a 3 a 4 metros da altura do solo e a 2 a 3 metros da sua extremidade, utilizando nessa tarefa botas, capacete, luvas e auriculares.
Que a queda do autor/sinistrado se deveu ao deslocamento de um bloco granítico da bancada onde o autor prestava essa tarefa.

Não resultou provado, no que ao aqui importa apreciar, que:

- a máquina giratória manuseada por um dos seus trabalhadores, embateu com a pá no bloco onde se encontravam o autor e seus colegas de trabalho e que a queda do autor/sinistrado tenha sido consequência do embate de pá da máquina giratória no bloco;
- que o bloco de granito onde o autor se encontrava a laborar e que pretendia deslocar constituía uma plataforma instável;
- nas circunstâncias de tempo e lugar referidos em 3. e 4. dos factos provados, decorriam, ao mesmo tempo, trabalhos de desmonte em dois blocos graníticos que se encontravam muito próximos, sendo que num desses blocos se encontravam diversos trabalhadores já a laborar;
- o desmonte nesse outro bloco de granito estava a ser realizado com recurso a maquinaria pesada, nomeadamente uma “giratória de rastos”;
- o uso de arnês ou cinto de segurança teria impedido a queda do autor.
- a frente de desmonte onde decorriam os trabalhos não foi previamente inspeccionada por pessoal competente.

Cremos assim que, face a esta factualidade, não se poder concluir que a entidade empregadora tenha infringido ou inobservado regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, mormente as alegadas pela ré/seguradora, uma vez que a queda do autor/sinistrado, de cerca de 3 a 4 metros de altura do solo, não se deveu à falta do uso por parte do autor/sinistrado de qualquer equipamento individual e/ou colectivo de segurança, mas sim ao facto de parte do bloco granítico se ter deslocado e arrastado para a queda o autor/sinistrado, em virtude da existência de uma fissura, não visível, nem detectada.

Por outro lado, conforme se evidencia da factualidade enunciada, não ficou provado que o autor/sinistrado, na ocasião do acidente, executava actividade laboral sujeita a um específico risco de queda, já que se encontrava a executar a sua tarefa numa superfície plana, ampla, sem desnível e limpa e afastado cerca de 2 a 3 metros da sua extremidade (borda).

E resultou também provado que a queda do autor/sinistrado apenas se deveu ao deslocamento dessa parte rochosa, que não devido a uma queda directa do autor.

Também resultou provado, que os meios de protecção individual – linha de vida e arnês – e colectiva – linhas de vida e/ou guarda corpos –, não se mostravam necessários à tarefa que o autor/sinistrado estava a efectuar e, se implementados, não evitariam a queda do autor/sinistrado.

Assim, embora se mostre provado que o autor/sinistrado não utilizava arnês de segurança, nada se provou que permita concluir que a queda do autor seria evitada com a existência de cinto de segurança e ou de qualquer outro equipamento de protecção (individual ou colectivo).

De todo o modo, não se extrai dos factos materiais dados como provados qualquer vinculação causal entre a circunstância do sinistrado não utilizar esse equipamento individual antiqueda (linha de vida/arnês ou protecção colectiva) e o acidente que o vitimou.

Acresce que, também não resultou provado que a entidade empregadora não tenha procedido à prévia inspecção da frente do desmonte rochoso onde o autor/sinistrado estava a laborar, nem resultou provada a factualidade alegada pela ré/seguradora de que a entidade empregadora estava a levar a efeito trabalhos de desmonte em dois blocos de pedra que se encontravam muito próximos, num deles com recurso a maquinaria pesada, nomeadamente uma “giratória de rastos”. Também não se vislumbra que a situação e a execução dos trabalhos que a entidade empregadora estava a efectuar na altura do acidente, se enquadre na situação/previsão do disposto no art. 137º da Lei Nº. 162/90, de 22/05, quanto à advertência ali prevista.

Assim, não é possível assacar qualquer juízo de censura à entidade empregadora quanto à alegada inobservância dos das regras de segurança, higiene e saúde no trabalho, não se podendo concluir que o acidente resultou da inobservância de quaisquer regras de segurança, higiene e saúde no trabalho, mormente das obrigações gerais para si decorrente, enquanto empregadora, dos normativos supra referidos.

Assim, não tendo a ré/seguradora logrado demonstrar que o acidente que vitimou o autor/sinistrado resultou de qualquer violação das condições de segurança e saúde no trabalho por parte da entidade empregadora, não se pode concluir que o acidente em causa ocorreu por culpa da entidade empregadora.

Por outro lado, perante as circunstâncias concretas apuradas, cremos que se poderá afirmar que um empregador médio, normalmente cuidadoso e diligente, teria adoptado pelas mesmas soluções quanto à observância das regras de segurança, não sendo de lhe exigir quaisquer outras soluções face às circunstâncias apuradas, às características da tarefa que estava a ser executada e à causa que provocou a queda do autor/sinistrado.

Não se mostram, assim, verificados quaisquer dos requisitos exigidos pelo n.º 1 do art. 18º da LAT, para que se possa afirmar que o acidente resultou da falta de observação das regras de segurança por parte da entidade empregadora “Granitos R., Lda.”, nem se mostra demonstrado o nexo de causalidade entre qualquer inobservância das regras de segurança, imputável à entidade empregadora, e a produção do acidente em questão.
Nestes termos, afigura-se-nos não se poder responsabilizar a entidade empregadora, pela reparação do sinistro, nos termos do atrás citado art. 18º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009, de 04/09.”.

Acrescente-se que não se pode dizer, sem mais, que no caso a actividade do sinistrado comportava riscos de queda grave nos termos do artº 131º, nºs 1 e 2 do citado DL 162/90, atento desde logo às circunstâncias exemplificativas para que essas normas apontam (1 - Nos trabalhos que comportem riscos de quedas graves, nomeadamente trabalhos de saneamento ou limpeza de frentes muito inclinadas, os trabalhadores devem usar cintos de segurança, solidamente fixados acima do local de trabalho e mantidos tensos por outros trabalhadores ou dispositivos adequados; 2 - Considera-se que comportam riscos de quedas graves, designadamente, os trabalhos executados a mais de 4 m acima do patamar imediatamente inferior, em frentes com inclinação superior a 45º ou a 30º, no caso de materiais particularmente escorregadios).

Como antevisto, o mero uso do arnês não pode também ser visto como circunstância que por si evitava a queda com as consequências funestas aqui verificadas.

E no que concerne à aplicabilidade do artº 137º do DL 162/90 (nas explorações a céu aberto, aquando da subida ou descida de carga por meio de equipamento de extracção, o responsável pela operação deve advertir todos os trabalhadores que se encontrem nas imediações para se retirarem para lugar seguro), resta ainda dizer que não se constataria qualquer nexo de causalidade entre a inexistência de advertência face ao motivo mencionado na norma e a produção do acidente.

Pelo exposto, encontrando-se prejudicado igualmente o conhecimento das demais questões acima elencadas deve-se concluir que o recurso é improcedente in totum.

Sumário, da única responsabilidade do relator

1- As provas que serviram de fundamento à decisão sobre um determinado facto devem ser analisadas e examinadas em conjunto.
2- No julgamento da matéria de facto os poderes da 2ª instância estão delimitados pelo nº 1 do artº 662º do CPC (artº 640º, nº 1, alª b) do CPC), pelo que a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser alterada se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
3- Por isso devem ser especificados não meios de prova que admitam, permitam ou consintam decisão diversa da recorrida mas que imponham antes decisão diversa da impugnada.
4- Inexistindo no regime processual civil norma idêntica à do artº 646º, nº 4 do CPC anterior deve manter-se o mesmo desiderato através do disposto no artº 607º, nº 4 do CPC interpretado a contrario sensu.
5- “Para efeitos de aplicação dos artigos 18.º, n.º 1, e 79.º, n.º 3, da Lei n.º LAT em vigor, cabe ao beneficiário do direito à reparação por acidente de trabalho, bem como às instituições seguradoras que pretendam ver desonerada a sua responsabilidade infortunística, o ónus de alegar e provar os factos que revelem que o acidente ocorreu por culpa da entidade empregadora ou, que o mesmo, resultou da inobservância por parte daquela de regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho”.

Decisão

Acordam os Juízes nesta Relação em julgar improcedente a apelação confirmando a sentença.
Custas pela recorrente.
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O acórdão compõe-se de 44 folhas, com os versos não impressos.
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31.10.2018

Eduardo Azevedo
Vera Sottomayor