Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4726/15.6T8BRG.G1
Relator: ANTERO VEIGA
Descritores: PER
RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
PRECLUSÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/21/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário: A não reclamação de crédito no PER nos termos do artigo 17º-D, nº 2 do CIRE, não tem os efeitos preclusivos.
- Não tendo efeito preclusivo, haverá que permitir ao credor o recurso a tribunal a fim de ver reconhecido o seu direito, e por uma questão de economia processual, deve aproveitar-se o processo que tenha sido suspenso nos seus termos ao abrigo da primeira parte do nº 1 do artigo 17º-F.
- Admitir a extinção da instância nos termos do artigo 17º-F, nº 1 parte final, de outras ações que não as executivas, implicaria que os créditos litigiosos em causa ficariam sem proteção, o que viola as mais elementares regras e princípios do Estado de Direito.
Decisão Texto Integral: Relação de Guimarães – processo nº 4726/15.6T8BRG.G1



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

Maria… intentou ação declarativa comum contra …– Sociedade de Construções, S. A., formulando o seguinte pedido:
a) Ser declarada a justa causa da resolução do contrato de trabalho efetuada pela autora, tendo o contrato cessado a 17/11/2014.
b) Ser a ré condenada a pagar à autora uma indemnização de antiguidade no valor de 16.339,82€;
c) Ser a ré condenada a pagar à autora a quantia de 15.924,94€, a título de créditos vencidos até 17 de novembro de 2014;
d) Ser ainda a ré condenada a pagar juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde a data de vencimento de cada uma das quantias parcelares até efetivo e integral pagamento.
Alega ter desempenhado funções para a ré, tendo resolvido o contrato com invocação de justa causa com fundamento na falta de pagamento de salários.
- A ação foi intentada a 8/10/2015.
- A solicitação foi junto aos autos a certidão de fls. 12 ss, contendo sentença homologatória do plano de recuperação, proferida no PER registado no nº …/13.0TB…, em que é devedora a aqui ré, proferida a 20/5/2014 e com trânsito a 1/10/2014.
- Os créditos em causa não foram reclamados no PER.
- Junta a certidão foi proferido o seguinte despacho:
“ Tendo em conta a informação de que foi homologado o plano de revitalização da aqui Ré, nos termos do disposto nos artigos 17º-E, nº 1 do CIRE e 277º, alínea e) do CPC (ex vi artigo 1º, nº 2, alínea a) do CPT) julgo extinta a instância, por impossibilidade superveniente da lide, na presente ação com processo comum que Maria… intentou contra “…– SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, S.A.”…”
Inconformado a autora interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões:
1. Entendeu a sentença recorrida que, tendo sido homologado plano de recuperação da ré, a presente ação está abrangida pelo disposto no nº 1 do artigo 17º -E do CIRE.
2. Em consequência, extinguiu a presente ação por inutilidade superveniente da lide.
3. Do disposto no nº 1 do artigo 17º-E do CIRE não resulta que um credor cujos créditos se vençam depois da homologação do plano de revitalização esteja impedido de fazer valer os seus direitos em qualquer ação judicial.
4. A sentença homologatória do plano de revitalização da recorrida foi proferida no dia 20.05.2014, tendo transitado em julgado no dia 01.10.2014.
5. O contrato de trabalho da recorrente cessou no dia 17.11.2014, ou seja, os créditos reclamados na presente ação venceram-se já depois do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de revitalização,
6. pelo que não podem estar abrangidos pelo disposto no artigo 17º-E, nº 1, do CIRE.
7. Pronunciou-se já o Tribunal da Relação do Porto neste sentido, por Acórdão datado de 08.09.2014, segundo o qual “o nº 1 do artigo 17º-E do CIRE abrange qualquer ação judicial (…) Porém, sendo o pretenso crédito do trabalhador posterior à reclamação de créditos no PER não se encontra abrangido por este. Nesta situação pode o trabalhador credor fazer valer os seus direitos em relação a tal crédito num qualquer processo judicial”.
8. O entendimento vertido na sentença recorrida retira à recorrente a possibilidade da mesma ver o seu crédito reconhecido judicialmente, apesar do mesmo se ter vencido em momento posterior ao encerramento do processo especial de revitalização da recorrida.
9. Transcrevendo novamente o citado Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, “… por um lado, tal acordo, e consequente plano de recuperação não abrange créditos que à data não existiam, por outro, aprovado o acordo e homologado o plano de recuperação, não extrai da lei, maxime do referido artigo 17º- E, nº 1, que um credor cujos créditos se venceram posteriormente à reclamação de créditos no PER e, portanto, não estejam enquadráveis neste, se encontre impedido de fazer valer os seus direitos em qualquer processo”.
10. Também já o mesmo Tribunal da Relação do Porto, por Acórdão de 05.01.2015, decidiu que “não estão abrangidos pelo disposto no artigo 17º- E, nº 1, do CIRE, os créditos vencidos após o despacho que procedeu à nomeação do administrador judicial provisório, referentes ao pagamento de salários e à resolução com justa causa, na medida em que este normativo se reporta apenas às dívidas existentes à data da decisão a que se refere a alínea a) do nº 3 do artigo 17º- C do CIRE”.
11. Não pode a recorrente ficar impedida de ver judicialmente reconhecido o seu crédito em virtude da recorrida ter dado início, em momento anterior ao vencimento dos créditos daquela, a um processo especial de revitalização.
12. O nº 1 do artigo 337º do Código do Trabalho dispõe que “o crédito de empregador ou trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a parti do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho”.
13. Tendo o contrato de trabalho da recorrente cessado no dia 12 de novembro de 2014, a partir do dia 18 de novembro de 2015 não mais poderá aquela reclamar judicialmente o mesmo.
14. Ao considerar-se que o processo especial de revitalização impede a instauração de todas as ações judiciais contra o devedor, está-se a atribuir a esse processo o efeito de fazer extinguir os direitos dos credores cujos créditos se vençam posteriormente à instauração daquele processo.
15. Os presentes autos têm utilidade e devem prosseguir para discutir e apreciar a questão da alegada justa causa da resolução do contrato de trabalho efetuada pela recorrente e a existência e montante dos créditos por si reclamados.
16. A revitalização dos devedores não pode ser feita à custa da extinção dos direitos dos credores.
17. Dispõe o artigo 20º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa que “a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos”.
18. A sentença recorrida, ao considerar que os credores cujos créditos se vençam posteriormente à homologação do plano de recuperação estão impedidos de ver reconhecido judicialmente o seu crédito por aplicação do disposto no artigo 17º -E, nº 1, do CIRE, viola o princípio constitucionalmente consagrado de acesso ao direito e aos tribunais, previsto no nº 1 do artigo 20º da CRP.
19. A decisão recorrida fez incorreta aplicação e interpretação do disposto no nº 1 do artigo 17º -E do CIRE, pelo que deve ser revogada e substituída por outro que determine o regular prosseguimentos dos presentes autos.
Sem contra-alegações.
O Emº PGA deu parecer no sentido da improcedência.
Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos há que conhecer do recurso.
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A factualidade com interesse é a que resulta do precedente relatório.
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Conhecendo do recurso:
Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.
No presente caso temos que, tendo em conta os créditos peticionados, uns são anteriores e outros posteriores quer à nomeação de administrador provisório, quer à data em que foi proferida a decisão homologatória em primeira instância.
Colocam-se duas questões, uma a de saber se os créditos de constituição anterior podem ser exigidos e /ou pode prosseguir a ação declarativa tendo em vista o seu reconhecimento, e outra a de saber se relativamente aos créditos de constituição posterior pode ser intentada ação declarativa tendo em vista o seu reconhecimento.
Em nosso entender, uma e outra questão deve merecer resposta positiva (a menos que, quanto aos de constituição anterior, estejam reconhecidos no PER).
A (s) questão (s) contende(m) com a interpretação do artigo 17º-E do CIRE.
Refere o normativo:
1 - A decisão a que se refere a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as ações em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação. …
Não se coloca no presente caso a questão de saber se as ações declarativas comuns estão abrangidas pelo artigo referido. Sobre a abrangência de tal tipo de ações, desde que respeitam a cobrança de uma dívida, o Ac. da RG de 29/1/2015, processo nº 5632/12.1TBBRG.G1, do mesmo relator, disponível na net.
Deverá uma ação declarativa suspensa nos termos do artigo referido, ser declarada extinta logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação como refere o normativo? E poderá intentar-se ação declarativa para reconhecimento de crédito de constituição posterior?
A questão deve responder-se ponderando a situação factual em que o pretenso credor fica colocado. E é, como fica o seu direito? Fica acautelado?
Se o crédito estiver reconhecido no PER, a solução parece clara, extinção da instância.
Certo que a lei refere, “extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação”.
Esta expressão, deste modo irrestrito apenas se pode compreender e aceitar com o sentido que aparenta, se se entender que as “ações para cobrança de dívidas” a que o normativo se reporta são as executivas, cujo prosseguimento não teria sentido dado que o pagamento do crédito exequendo fica abrangido pelo plano aprovado.
Mas inclinando-se a jurisprudência maioritária para uma interpretação mais abrangente, abarcando ações declarativas, importa então fazer uma leitura diversa, sob pena de prejuízo dos credores não reconhecidos e dos não reclamantes.
Seja, o credor se impedido de prosseguir na ação declarativa, não tem meio de cobrar o seu crédito, já que não foi reconhecido e é litigioso, isto mesmo para créditos de constituição anterior, pois que a não reclamação no PER não é preclusiva dada a simplicidade emprestada ao mecanismo, e mais, mesmo o reclamante pode ter o seu crédito impugnado e não ter sido reconhecido no PER. Sendo que aliás o reconhecimento neste tem os limitados efeitos que se apontarão.
Assim é que, neste tipo de processo, o juiz pode considerar o voto do credor impugnado, não reconhecido. Refere o nº 3 do antigo 17º-F; “Sem prejuízo de o juiz poder computar no cálculo das maiorias os créditos que tenham sido impugnados se entender que há probabilidade séria de estes serem reconhecidos, considera-se aprovado o plano de recuperação que…”
É que o PER, dada a sua natureza urgente e a celeridade que o carateriza, impondo-se prazos curtos, não tem vocação para resolver litígios sobre a existência e amplitude dos créditos carecidos de uma mais profunda indagação e prova. A decisão sobre a reclamação de créditos é meramente incidental, não constituindo caso julgado fora do processo (art. 91º CPC), visando a formação e apreciação do quórum deliberativo (Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE Anotado, 2.ª edição, 2013, pág. 159 e segs.). Assim é que já se entendeu que mesmo admitido o crédito, caso se prossiga para insolvência, podem vir nesta a ser impugnado mesmo os não impugnados no PER. Ac. RC de 24/6/2014, www.dgsi.pt, processo nº 288/13.7T2AVR-F.C1.
O critério do julgador, dado o curto prazo de apreciação – 5 dias – no caso dos créditos impugnados, pauta-se por uma apreciação sumária. Vd. Decisão de 20/6/2014, RC, processo nº 3106/13.2TBVIS-A.C1.
- Veja-se que no caso presente alguns reclamantes não viram os seus créditos apreciados conforme resulta da sentença, onde consta:
“ No que tange às impugnações ainda pendentes… importa ter presente que, no contexto do processo especial de revitalização, “ a decisão sobre as impugnações visa exclusivamente computar o quórum e deliberação da decisão de aprovação do plano…Deste modo… haverá que concluir pela inutilidade do prosseguimento das respetivas impugnações…”
Pretendeu-se com este procedimento (PER), instituir um processo rápido e expedito, reorientando “ o Código da Insolvência e Recuperação de Empresas para a promoção da recuperação, privilegiando-se sempre que possível a manutenção do devedor no giro comercial, relegando-se para segundo plano a liquidação do seu património sempre que se mostre viável a sua recuperação”, como consta da proposta de Lei nº 39/XII, o mecanismo, como se refere na proposta, pretende-se célere e eficaz e constitui uma das concretizações de uma das medidas previstas no memorando de entendimento, conforme resolução do C.M nº 43/2011.
Este processo especial tem algum pendor extrajudicial, embora limitado, sujeito aos princípios orientadores aprovados pela Resolução do Conselho de Ministros nº 43/2011, de 25/10, conforme nº 10 do artigo 17-D.
Assim e além do mecanismo estritamente extrajudicial, cujos princípios orientadores constam da dita resolução do CM, criou-se este mecanismo ainda fortemente extrajudicial, mas com algumas particularidades em relação àquele.
Com o mecanismo em causa, pretendeu-se possibilitar de forma célere a consecução de um acordo entre credores e devedor, tendo em vista a permanência deste no mercado, com as vantagens daí decorrentes (elencadas na resolução do CM nº 43/2011). Apenas é aplicável a empresas que não se encontrem em situação de insolvência, tal como a define o artigo 3º, mas apenas se encontrem em situação de insolvência “meramente iminente”.
O processo em causa tem regulamentação própria, bastante simplificada, diversas e distantes da regulamentação do processo de insolvência, (situação em que a empresa não pode encontrar-se).
Assim é que não está prevista a citação de credores. O que resulta do artigo 17º-D, é que o devedor deve logo que nomeado o administrador provisório (despacho da al. a) do nº 3 do 17-C), comunicar aos restantes credores, a todos os que não hajam subscrito a declaração mencionada no nº 1 do art. 17º-C, que deu início a negociações com vista à sua revitalização, convidando-os a participar, prestando as demais informações que refere o normativo.
Saliente-se que nos termos do nº 11º do artigo 17º-D, o devedor, bem como os seus administradores de direito ou de facto, no caso de aquele ser uma pessoa coletiva, são solidária e civilmente responsáveis pelos prejuízos causados aos seus credores em virtude de falta ou incorreção das comunicações ou informações a estes prestadas.
O mecanismo de reclamação previsto no nº 2 do artigo 17º-D, que refere que qualquer credor dispõe de 20 dias contados da publicação no portal Citius do despacho a que se refere a alínea a) do n.º 3 do artigo anterior para reclamar créditos, devendo as reclamações ser remetidas ao administrador judicial provisório, não parece ter outra função que não a de permitir a intervenção dos credores para efeitos de negociações e votação do plano.
Veja-se o que conta na proposta de Lei nº 39/XII:
“Este processo especial permite ainda a rápida homologação de acordos conducentes à recuperação de devedores em situação económica difícil celebrados extrajudicialmente, num momento de pré-insolvência, de tal modo que os referidos acordos passem a vincular também os credores que aos mesmos não se vincularam, desde que respeitada a legislação aplicável à regularização de dívidas à administração fiscal e à segurança social e observadas determinadas condições que asseguram a salvaguarda dos interesses dos credores minoritários. “

Prevê-se ainda uma tramitação bastante simplificada para a efetivação das reclamações de créditos, bem como da impugnação dos créditos reclamados, sem no entanto se fazer perigar a observância do princípio do contraditório, e definem-se prazos bastante curtos para a sedimentação dos créditos considerados definitivos, em ordem a permitir-se uma rápida tramitação deste processo especial e, assim, preservando-se a possibilidade de recuperação do devedor que se encontre envolvido no mesmo.”
Da proposta parece resultar que a sedimentação dos créditos tem como finalidade não propriamente a fixação definitiva dos débitos da requerente, mas sim permitir uma rápida tramitação do processo, ou seja, visa as negociações e aprovação do plano e não mais que isso.
Por outro, se a não reclamação fizesse precludir o direito do credor, que sentido teria o disposto no nº 11 do artigo 17º-D? E o disposto no artigo 17º-F, nº 6, que refere que a decisão do juiz vincula todos os credores mesmo que não hajam participado nas negociações?
Poderia pensar-se que a norma visaria apenas os credores constantes da lista definitiva (seja porque indicados pelo devedor seja porque reclamantes), tanto mais que os credores não têm que participar nas negociações, podendo optar por não o fazer – artigo 17º-D nº 7. A letra da norma, contudo aponta em sentido diverso; refere-se “os credores” e não os credores reconhecidos.
Outras normas apontam no mesmo sentido, como o já referido nº 11 do artº 17-D, e sobremaneira o nº 7 do artigo 17º-G. Refere este:
“Havendo lista definitiva de créditos reclamados, e sendo o processo especial de revitalização convertido em processo de insolvência por aplicação do disposto no n.º 4, o prazo de reclamação de créditos previsto na alínea j) do n.º 1 do artigo 36.º destina-se apenas à reclamação de créditos não reclamados nos termos do n.º 2 do artigo 17.º -D.”
Esta norma só pode significar que a não reclamação de crédito nos termos do artigo 17º-D, nº 2 não tem os efeitos preclusivos (ou quase preclusivos) relativamente aos créditos contra o devedor como ocorre no processo de insolvência (onde resta após o decurso do prazo de reclamação de créditos, o recurso ao artigo 146º ss).
Ora, não havendo efeito preclusivo, haverá que permitir ao credor o recurso a tribunal a fim de ver reconhecido o direito que a devedora não reconhece. E por uma questão de economia processual, deve aproveitar-se o processo que tenha sido suspenso nos seus termos ao abrigo da primeira parte do nº 1 do artigo 17º-F.
Relativamente aos créditos de constituição posterior, em que o credor nem sequer os poderia ter reclamado no PER, a solução é ainda mais evidente. Até porque seria incongruente criar limitações aos futuros credores, numa altura em que a firma mais necessita de “negociar” de laborar e criar riqueza, em suma, de se manter no mercado. Quem se prestaria a negociar com ela sabendo que o acionamento de eventuais créditos ficaria sujeitos a limitações?
Poderia conjeturar-se que o reconhecimento do direito apenas poderia ocorrer após o termo do período de duração do plano, mantendo-se durante esse as “tréguas processuais”. Não se vê razão que justifique uma solução tão penosa para a justiça material, pois é sabido que com o decurso do tempo o risco de perda e a perda efetiva de provas é uma realidade. Nem razão se descortina para que o credor que logra fazer reconhecer o seu direito em ação para o efeito intentada, tenha um tratamento diverso daqueles que foram reconhecidos no PER. Ponto é que fique sujeito aos termos do plano.
Admitir a extinção da instância de outras ações que não as executivas tendo em vista a cobrança de uma dívida, implicaria nas ações laborais para contratos em vigor, violação da natureza indisponível e da imperatividade das normas respetivas.
Quanto às ditas ações executivas a extinção da instância é logica, dado que o pagamento dos débitos fica sujeito ao plano. Tal raciocínio não tem cabimento nas ações em que se pretende ver reconhecido o direito.
Em conclusão e porque a não reclamação no PER nem é preclusiva, a não se admitir o curso da ação declarativa, ficariam os créditos litigiosos sem proteção, o que viola as mais elementares regras e princípios do Estado de Direito.
Sobre a não aplicabilidade do artigo 17º-E, nº 1 aos créditos vencidos após o despacho que procedeu à nomeação do administrador provisório, RP de 5/1/2015, processo nº 290/14.1TTPNF.P1; RP de 17/11/2014, processo nº
295/14.2TTPNF.P1; RC de 28/1/2016, processo nº 791/15.4TBGRD.C1;
Quanto aos anteriores, vd o voto vencido no Ac. RC de 19/5/2015, processo nº 3105/13.4TBLRA.C1 e Ac. da RG de 29/1/2015, processo nº 5632/12.1TBBRG.G1, já acima referido.
Assim procede a apelação.
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DECISÃO:
Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente a apelação, determinando-se o prosseguimento dos autos.
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Custas pela recorrida.


Sumário:

- A não reclamação de crédito no PER nos termos do artigo 17º-D, nº 2 do CIRE, não tem os efeitos preclusivos.
- Não tendo efeito preclusivo, haverá que permitir ao credor o recurso a tribunal a fim de ver reconhecido o seu direito, e por uma questão de economia processual, deve aproveitar-se o processo que tenha sido suspenso nos seus termos ao abrigo da primeira parte do nº 1 do artigo 17º-F.
- Admitir a extinção da instância nos termos do artigo 17º-F, nº 1 parte final, de outras ações que não as executivas, implicaria que os créditos litigiosos em causa ficariam sem proteção, o que viola as mais elementares regras e princípios do Estado de Direito.