Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1802/18.7T8BRG.G1
Relator: MARIA LUÍSA RAMOS
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
VIOLAÇÃO DE NORMA ESTRADAL
PRESUNÇÃO DE CULPA
PERDA DO DIREITO À VIDA
DANOS MORAIS
JUROS DE MORA
DISPENSA DO PAGAMENTO DA TAXA DE JUSTIÇA REMANESCENTE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/23/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- Em matéria de responsabilidade civil resultante de acidente de viação existe uma presunção "iuris tantum” de culpa ou negligência contra o autor de uma contraordenação ao Código da Estrada.
II- A compensação dos danos não patrimoniais, a atender nos termos do art. 496°-n°1 do Código Civil, deve ser decidida pelo tribunal segundo juízos de equidade.
III- A decisão de dispensa do remanescente da taxa de justiça devida a final poderá ser total, ou, apenas parcial, competindo ao tribunal tal fixação, segundo juízo valorativo, decorrente dos princípios da proporcionalidade e da igualdade, e, efetiva correspetividade funcional.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

E. F., viúva, por si e na qualidade de representante dos seus filhos L. P., nascido a -/08/2015, e M. P., nascido a -/04/2017, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra COMPANHIA DE SEGUROS X, SA, pedindo a condenação da ré a pagar-lhes a quantia total de €511.416,92 (quinhentos onze mil quatrocentos dezasseis euros e noventa dois cêntimos), acrescida de juros de mora, desde a citação até efectivo pagamento.
Para tanto, alegou, em suma, que, no dia -/09/2016, pelas 14h40m, na A28, ao Km 44,400, em Fonte Boa - Esposende, ocorreu um acidente de viação, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula LC, propriedade de M. D. e conduzido pelo marido e pai dos autores, A. C., e o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula GB, propriedade de J. E., conduzido por L. F., e segurado na ré, por força da apólice nº ...........350.
O veículo com a matrícula LC circulava pela referida A28, no sentido Porto-Viana do Castelo, quando sofreu uma avaria súbita, tendo-se desligado o motor, motivo pelo qual o seu condutor, logo que pôde e em traçado rectilíneo, o tentou imobilizar totalmente na berma do lado direito, porém, deixou parte do mesmo a ocupar cerca de um metro da metade direita da faixa de rodagem, após o que accionou os quatro piscas intermitentes.
Como a autora E. F., que seguia no veículo como passageira, não conseguia sozinha empurra-lo, o marido, depois de se certificar que dele podia sair, abriu a porta da frente do lado esquerdo e saiu do interior do veículo, após o que fechou aquela.

Quando A. C. estava a chegar próximo do canto de trás do lado esquerdo do veículo, o veículo com a matrícula GB, que seguia no sentido Porto-Viana do Castelo, a velocidade superior a 120km/h, embateu com a parte da frente do lado direito na parte de trás do lado esquerdo do veículo com a matrícula LC, embate que se prolongou pela parte lateral esquerda, altura em que acabou por colher aquele, projectando-o para a berma do lado direito da A28, numa distância de 30 metros, onde ficou prostrado e acabou por falecer.
Tal embate ficou a dever-se a culpa exclusiva do condutor do veículo com a matrícula GB, que o conduzia de forma desatenta e distraída, violando o disposto nos artigos 3.º, 13.º e 24.º, do Código da Estrada.
Em consequência desse acidente, o marido e pai dos autores sofreu diversas lesões traumáticas que foram causa directa e necessária da sua morte, tendo o óbito sido declarado no local. Não obstante, a fracção de segundos que antecedeu o acidente e durante ele, o mesmo sentiu a iminência da morte, o que lhe causou agonia, amargura e angústia, sofrendo, por isso, um grave e considerável dano não patrimonial.
Na data do acidente, o falecido A. C. tinha 28 anos de idade, era saudável e fisicamente bem constituído, expansivo e alegre, gozando da estima de quem com ele convivia, respeitado e respeitador, pelo que é adequada para compensar o dano não patrimonial sofrido pelo falecido a quantia de €35.000,00 (trinta e cinco mil euros) e pela perda do direito à vida a quantia de €100.000,00 (cem mil euros).
Acresce que a autora E. F. viu desfeito, de forma trágica, brutal e permanente, um casamento de dois anos, tanto mais que, à data do acidente, estava grávida do segundo filho, o autor M. P., nascido a -/04/2017, desvanecendo-se os planos que tinha traçado com o falecido, o que lhe provocou uma indescritível dor e sofrimento, devendo tal dano não patrimonial ser compensado com a quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros).
Invocou, de igual modo, que os autores L. P. e M. P. vão crescer sem a presença do pai, com quem nunca poderão brincar ou aprender o que quer que seja, devendo cada um deles ser compensado, por esse dano não patrimonial próprio, com a quantia de €35.000,00 (trinta e cinco mil euros).
Mais alegou que os autores sofreram ainda um dano patrimonial correspondente ao rendimento que mensalmente o falecido auferia e ficava disponível para aqueles, ascendendo tal dano ao montante global de €256.416,92 (duzentos cinquenta seis mil quatrocentos dezasseis euros e noventa dois cêntimos).
Requereu, no final, a intervenção principal provocada de M. S., representado pela sua progenitora J. L., e L. N., representada pela sua progenitora C. G., igualmente filhos do falecido A. C..
Devidamente citada, a ré COMPANHIA DE SEGUROS X SA contestou, excepcionando a caducidade do contrato de seguro em causa nos termos do n.º1 do artigo 21.º, do Decreto-lei n.º291/2007, de 21/08, e, impugnou a dinâmica do embate veiculada na petição inicial, aceitando somente a sua ocorrência, dia, hora, via e o sentido de marcha dos veículos intervenientes, assim como impugnou os danos alegados, defendendo serem desajustados os valores peticionados.
Mais alegou que dos documentos juntos com a petição inicial retira-se que, quando é embatido pelo veículo GB, o veículo LC estava imobilizado ligeiramente atravessado em plena fila de trânsito da direita, com a frente direccionada para o separador central, sendo que, não era exigível ao condutor do veículo GB, a circular numa auto-estrada, que contasse com um veículo imobilizado em plena fila da direita da faixa de rodagem afecta ao seu sentido de marcha, com o falecido A. C. e a autora E. F. a empurra-lo sem colete reflector e sem terem colocado o triângulo de pré-sinalização, daí que o condutor do veículo LC contribuiu para a produção do acidente.
Terminou, concluindo pela procedência da excepção invocada ou, caso assim não se entenda, pela improcedência da acção, absolvendo-se a ré dos pedidos tal como se encontram formulados.
Os autores responderam à matéria de excepção alegada na contestação, nos termos que constam do requerimento de fls.93-94 do suporte físico dos autos, requerendo a final a intervenção principal provocada do FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, J. E. e L. F. [cfr. ref.ª29337635].
Foi proferido despacho de convite da Ré ao aperfeiçoamento da contestação, tendo a Ré oferecido requerimento.
Por despacho de 10/07/2018, foi admitida a intervenção principal provocada de M. S., menor, representado pela progenitora J. L., e de L. N., menor, representada pela progenitora C. G., para intervirem na acção como associados dos autores [cfr. ref.ª159188702].
Citada, a chamada L. N., representada pela sua progenitora C. G., apresentou articulado próprio, onde demandou a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA, o FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, J. E. e L. F., peticionando a condenação solidária destes a pagar-lhe a quantia global de €429.093,48 (quatrocentos vinte nove mil noventa três euros e quarenta oito cêntimos), a título de danos não patrimoniais [€100.000,00, perda do direito à vida, €35.000,00, dano de sofrimento da vítima, e €35.000,00, dano não patrimonial próprio da interveniente] e patrimoniais [€256.416,92, perda futura de ganho, €1.924,23, prestações de alimentos vencidas entre outubro de 2016 e setembro de 2018 e €752,33, metade das despesas de saúde e educação] decorrentes da morte de A. C., acrescida de juros de mora a partir da citação, e ainda no pagamento das prestações de alimentos que se vierem vencer até esta fazer 25 anos e de metade de todas as despesas com saúde e educação que se vierem a realizar até tal idade da mesma [cfr. ref.ª30267980].
Requereu posteriormente a intervenção principal provocada do FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL e de J. E. [cfr. ref.ª31793925].
Citado, também o chamado M. S., representado pela sua progenitora J. L., apresentou articulado próprio, através do qual, aderindo à posição dos autores quanto aos factos sobre a dinâmica do acidente e danos não patrimoniais sofridos pelo falecido, peticionou a condenação solidária dos demandados a pagar-lhe a quantia de €135.000,00 (cento e trinta cinco mil euros), a título de dano não patrimonial de A. C. e perda do direito à vida, a quantia de €40.000,00 (quarenta mil euros), a título de dano não patrimonial do próprio, a quantia de €256.416,92 (duzentos cinquenta seis mil quatrocentos dezasseis euros e noventa dois cêntimos), pela perda futura de ganho e ainda no pagamento de metade de todas as despesas de saúde e educação que se vierem a realizar até aos seus 26 anos, tudo acrescido de juros de mora a partir da citação [cfr. ref.ª30282796].
Notificada destes articulados, veio a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA impugnar a factologia respectivamente alegada, pugnando pela improcedência dos pedidos formulados [cfr. ref.ª30802349].
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Prosseguindo os autos os seus trâmites, foi indeferido o pedido de intervenção principal provocada do FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, J. E. e L. F., dispensada a realização de audiência prévia, proferido, por escrito, despacho saneador, onde se fixou o valor da causa em €980.510,40 (novecentos oitenta mil quinhentos dez euros e quarenta cêntimos), se saneou os autos, se procedeu à identificação do objecto do litígio e à enunciação dos temas da prova, se ordenou a gravação da audiência final, se admitiu a prova indicada pelas partes e se programou e designou audiência final [cfr. ref.ª162757423].
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Realizou-se a audiência final, com observância do legal formalismo, conforme se alcança das atas respectivas [cfr. ref.ªs164983256, 165339234 e 165662642].
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No início da audiência final, a autora E. F., por si e em representação dos seus filhos menores, L. P. e M. P., também autores, e a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA celebraram transacção quanto aos pedidos formulados na sua petição inicial, a qual foi homologada por decisão de 10/10/2019, julgando-se, em consequência, nessa parte, extinta a instância [cfr. ref.ª165281860].
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Realizado o Julgamento foi proferida decisão a julgar a acção nos seguintes termos:

Pelo exposto, decide-se julgar parcialmente procedente, por provada, a presente ação e em consequência:
a) Condenar a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA a pagar à interveniente L. N., representada pela sua progenitora C. G., a quantia global de €59.073,09 (cinquenta nove mil setenta três euros e nove cêntimos), sendo:
- €38.000,00, a título de danos não patrimoniais; e
- €21.073,09, a título de danos patrimoniais sofridos.
Tudo acrescido de juros de mora, à taxa supletiva legal de 4%, contados sobre a quantia fixada a título de danos não patrimoniais desde a data da presente sentença e sobre a quantia a título de danos patrimoniais desde a citação, até efetivo e integral pagamento.
b) Condenar a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA a pagar à interveniente L. N., representada pela sua progenitora C. G., 80% de metade das despesas com a saúde e educação, por esta feitas e devidamente comprovadas, nos termos constantes no ponto 41 dos “factos provados”, até ao momento em que aquela completar 25 anos de idade.
c) Condenar a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA a pagar ao interveniente M. S., representado pela sua progenitora J. L., a quantia global de €69.137,93 (sessenta nove mil cento trinta sete euros e noventa três cêntimos), sendo:
- €40.000,00, a título de danos não patrimoniais; e
- €29.137,93, a título de danos patrimoniais sofridos.
Tudo acrescido de juros de mora, à taxa supletiva legal de 4%, contados sobre a quantia fixada a título de danos não patrimoniais desde a data da presente sentença e sobre a quantia a título de danos patrimoniais desde a citação, até efetivo e integral pagamento.
d) Condenar a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA a pagar ao interveniente M. S., representado pela sua progenitora J. L., 80% de metade das despesas com a saúde e educação, por esta feitas e devidamente comprovadas, nos termos constantes no ponto 50 dos “factos provados”, até ao momento em que aquele completar 25 anos de idade.
e) Absolver a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA do demais peticionado pelos intervenientes L. N. e M. S.”.
Inconformados, de tal decisão vieram os Intervenientes/autores interpor recurso de apelação, tendo a Ré seguradora interposto recurso de apelação subordinado.

Os recursos foram recebidos como recursos de apelação, com subida nos autos e efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresentam, os apelantes formulam as seguintes Conclusões:

A) Recurso de Apelação da Interveniente/Autora L. N.

A apelante apresentou as conclusões de fls.443 a 457 dos autos, concluindo (…):

I.- Versam os presentes autos em efetivar a responsabilidade civil emergente de acidente de viação por factos ilícitos ou, subsidiariamente, pelo risco, do condutor do veículo com a matrícula GB, (cuja responsabilidade por danos causados a terceiros com a circulação de veículo em causa, tinha sido transferida, através da apólice n.°1269203577350, para na Ré Companhia de Seguros X, S.A.), no acidente de viação ocorrido a -/09/2016, ao km 44,400 da A28, em Fonte Boa - Esposende, que provocou a morte de A. C., (condutor do veículo automóvel com a matrícula LC), e, em consequência, na fixação da indemnização para os seus filhos, L. N., aqui recorrente e, M. S..

II. - Com o presente recurso visa-se a revogação da Sentença proferida nos presentes autos, sendo um dos seus fundamentos a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto - reapreciação da prova gravada e julgamento da prova documental. Entende a apelante que, a prova carreada para os autos e os depoimentos prestados em audiência de julgamento mais que justificam decisão diversa da proferida, conforme por si peticionado, como adiante se demonstrará.

III.- No que concerne à MATÉRIA DE FACTO, a A., ora recorrente, considera que:

Os factos que se transcreve infra, foram considerados provados, no entanto, em relação aos mesmos não foi produzida prova bastante e segura, que permitisse considerá-los como provados ou até que, a prova produzida levaria a considerar como provado tal facto, no entanto, noutros termos:
-“33. Nas circunstâncias acima descritas em 5,7 e 8, nem A. C. nem E. F. traziam vestidos os coletes refletores.”;
-“34. (...) assim como não colocaram previamente o triângulo de pré-sinalização de perigo”.
-“38. A interveniente L. N. viveu com A. C. até aos seus 2 anos de idade. ”
IV. -No entendimento da recorrente também deveriam ter sido considerados provados factos controvertidos, assinalados na douta decisão recorrida como não provados, a seguir indicados:
ii) Entre a interveniente L. N. e A. C. havia muita união, carinho e amor;
l)Da memória da interveniente L. N. está a esvair-se a imagem de A. C.;
m)A ausência de A. C. faz com que a interveniente L. N., no meio escolar, se sinta diferente dos colegas; 
facto, como também, o Tribunal da Relação tem o poder dever de formar a sua própria convicção, relativamente aos pontos de facto impugnados pela Recorrente, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das provas, considerando a hipótese de, a prova ter sido incorretamente valorada pelo julgador da 1a Instância. Foi exatamente o que aconteceu com a decisão recorrida.
VI.- Antes de mais, na decisão recorrida há uma flagrante e notória desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, pois, da prova produzida e dos documentos juntos aos autos, o Tribunal não poderia ter dado como provados os factos supra transcritos em 4., bem como, deveria ter dado como provados outros factos alegados pela aqui recorrente, transcritos em 5. e, nesses termos, naturalmente, conduziriam a decisão diferente, tendo por isso, a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, feito uma valoração errada da prova produzida.
VII.- O depoimento das testemunhas arroladas, foi um depoimento idóneo, credível, sério, e, totalmente suficiente para suportar outra decisão, e, os documentos juntos aos autos, permitem confirmar os depoimentos dos mesmos, tudo isto, condizente com a verdade material.
VIII.- Na motivação da sentença de que se recorre, a Meritíssima Juiz considerou, "... para a prova do embate, seguido de atropelamento, ocorrido, das características e propriedade dos veículos nele intervenientes, das circunstâncias de tempo e lugar em que o mesmo se verificou, do sentido de marcha em que circulavam os veículos, da sua dinâmica fenomenológica, das características da via e do local e das condições climáticas”, nomeadamente, “... a sentença condenatória proferida no processo-crime n.°88/16.2GTVCT, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de Esposende - Juiz 1, transitada em julgado a 24/06/2019, ... tudo acrescido do depoimento da testemunha, M. P. 
IX.- No entanto, a Meritíssima Juiz não valorizou devidamente a referida Sentença no seu todo, nem o depoimento sério, isento e credível da testemunha M. P., militar do NICAV de Braga, prestado a 20/09/2019, constando o seu depoimento no suporte digital "00:00:01 a 00:15:40", o qual, em relação aos factos vertidos nos presentes autos, esclareceu perentoriamente o seguinte:
Testemunha - “O local trata-se da A28 que é uma autoestrada o sítio do acidente é uma faixa de rodagem com duas vias de trânsito no mesmo sentido, com uma berma larga, conforme consta no auto que eu elaborei, auto de exame direto ao factos..."
“Estava um dia de bom tempo, via limpa, não havia obstruções visíveis na via..."
Advogada da interveniente L. N. - “A estrada, o local onde se deu o embate, era um local com boa visibilidade, como é que o descreve?"
Testemunha - “Era uma reta com boa visibilidade, o ponto de perceção possível apurado para o local do acidente era de aproximadamente 400 metros."
Advogada da interveniente L. N. - “O ponto de perceção refere-se à visibilidade que?... Testemunha - “A partir do momento... à qual em que se torna visível o obstáculo, neste caso, o veículo imobilizado."
Advogada da Ré - “. Quando o condutor do veículo tem essa visão dos 400 metros nós não podemos garantir que ele vê a 400 metros, o carro já estava parado ou se ainda estava naquela fase do embalamento até parar?"
Testemunha - “A D. E. F. na inquirição que prestou, informou que a viatura avariou, que o condutor que deixou embalar até tentar encostar, que não conseguiram, depois ela saiu para fora, para empurrar a viatura..."
“ . nas declarações prestadas pela E. F. ela informou que estaria a empurrar o veículo, a uma dada altura ela não conseguiu.", “e então, a dada altura, o condutor saiu para fora também no sentido de ajudar e ir buscar sinalização, tudo leva a crer que a viatura estaria parada. ”
Advogada do interveniente M. S. - “O esclarecimento é, segundo a dinâmica do acidente o senhor estaria exatamente a sair pela primeira vez do carro, ...o senhor Guarda disse logo no início que possivelmente iria buscar essas coisas... o colete.”
Meritíssima Juiz - “Iria buscar o quê senhora doutora?”
Advogada do interveniente M. S. - “O colete e o triângulo”.
Testemunha - “De acordo com as declarações prestadas pela testemunha E. F.”.
Advogada do interveniente M. S. - “.em que sitio é que está o triângulo dos carros?" Testemunha -“Varia muito de modelo para modelo”.
Advogada do interveniente M. S. - “Naquele não sabe mas, podia estar nas traseiras, podia estar a sair do carro para ir busca-lo?”
Testemunha - “Podia estar nas traseiras, sim, sim”.
X.- Também na douta Sentença supra identificada, foi dado como provado que, “13. ...o arguido, que conduzia o veículo GB pela via da direita, podia e devia aperceber-se da presença do veículo LC e do seu condutor e passageira naquele local, e de forma atempada desviar-se dos mesmos, uma vez que o local em causa possui boa visibilidade, existem duas vias de trânsito no sentido em que circulava, a via mais à esquerda encontrava-se livre e desimpedida e o seu veículo circulava de forma isolada”.
XI.- Também aí consta que, “consideraram-se as declarações prestadas pela assistente E. F. que, de forma clara, assertiva e circunstanciada, prestou depoimento que se afigurou credível, tendo sido valorado. Quanto às circunstâncias do acidente, O veículo encontrava-se parado, paralelamente à via por onde seguiam.
Não conseguindo empurrar tal veículo, por o mesmo se encontrar carregado com caixas de fruta, ia colocar o triângulo de sinalização. Como o veículo se encontrava carregado, dirigiu- se junto da janela do passageiro e pediu a A. C. para o mesmo sair e vir ao seu encontro, porque a mesma não sabia onde o triângulo se encontrava”.
XII.- Ora, do depoimento da referida testemunha, corroborado com o teor da douta sentença supra aludida, resulta que, o condutor do veículo GB, conduzia de forma desatenta e descuidada, veio a embater no canto lateral esquerdo da traseira do veículo LC e no corpo do falecido A. C. quando este se deslocava para a traseira do seu veículo.
XIII.- Mais acresce que, na Sentença de que se recorre foi dado como provado que, “8. ... o veículo com a matrícula GB ... embateu com a parte frontal e lateral direita frente do seu automóvel ... no corpo de A. C., o qual se deslocava para junto da traseira do veículo com a matrícula LC, ... encontrando-se, nesse instante, a passar junto da lateral esquerda traseira do mesmo”. Circunstância que a Meritíssima Juiz também considera na sua Fundamentação de Direito, página 28, da Sentença de que se recorre, “encontrando-se, nesse instante, a passar junto da lateral esquerda traseira do mesmo."
XIV. - Assim, dúvidas não restam que, o falecido A. C. se dirigia para a traseira do seu veículo para recolher da bagageira a sinalização de perigo - triângulo e colete refletor, infelizmente, não teve tempo para o fazer, tudo por culpa exclusiva do condutor do veículo GB que, ao conduzir de forma desatenta e descuidada, não evitou o embate. Tanto assim é que, da invocada sentença resulta a condenação do condutor do veículo GB, pela prática de um crime de homicídio por negligência.
XV.- Não pode, agora, o tribunal a quo, ter uma percepção diferente da dinâmica do acidente, quando, a realidade dos factos é apenas uma.
XVI.- Os coletes reflectores, não têm de estar alojados no interior do veículo, podendo estar na bagageira. Não existindo qualquer imposição legal que exija a utilização do colete desde que o condutor saia da viatura. Só sendo obrigado a envergar colete, no momento em vai colocar o triângulo de pré-sinalização de perigo. O que, no caso dos autos, o sinistrado nunca conseguiu fazer, uma vez que, foi atropelado antes de estar junto da bagageira da sua viatura.
XVII. -Assim, nunca poderia ter sido dado como provado que "... não colocaram previamente o triângulo de pré-sinalização de perigo”, uma vez que, a pré-sinalização no caso em apreço foi humanamente impossível de ser realizada pois, o condutor do veículo avariado, A. C., foi brutalmente atropelado quando saía da viatura, ou seja, antes de nascer a sua obrigação de pré-sinalização de perigo!
XVIII. - Além do mais, a Ré, não logrou ilidir a presunção de oponibilidade a terceiros da decisão penal condenatória, que resulta do artigo 623.° do Código de Processo Civil, a si oponível.
XIX.. Assim, face ao exposto, foram considerados provados os factos 33. e 34. Da Sentença de que se recorre, em relação aos quais não foi produzida prova cabal e segura que permitisse alcançar com segurança a prova dos mesmos.
XX.- A sentença de que se recorre dá como provado que, “38. A interveniente L. N. viveu com A. C. até aos seus 2 anos de idade.” No entanto, a idade da menor aí dada como provada, certamente por lapso, foi os dois anos de idade.
XXI.- A Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, conforme bem refere na motivação da decisão sobre a matéria de facto, considerou o depoimento da testemunha M. F., progenitora do falecido, não obstante essa qualidade, “desapaixonado e sincero”. 
XXII. - Conforme consta da motivação da decisão sobre a matéria de facto, “M. F. afirmou que o filho, conjuntamente com a mãe da L. N. e esta viveram consigo até cerca dos 3 anos da L. N..”
XXIII.- Aliás, tal motivação resulta do referido depoimento da mãe do falecido, M. F., prestado a 20/09/2019, constando o seu depoimento no suporte digital "00:00:01 a 00:33:04", que, em relação a tal facto, esclareceu perentoriamente o seguinte:
Advogada da interveniente L. N. - “Até que idade é que o seu filho viveu em sua casa?" Testemunha - “Ora ele viveu até quando ele saiu de minha casa a L. N. já tinha 3 anos."
Advogada da interveniente L. N. - “Disse-nos que ele viveu digamos em sua casa até aos 3 anos da filha, da L. N.."
Testemunha -“Sim, sim".
Advogada da interveniente L. N. - “Durante esse período de tempo vivia o seu filho a sua neta e a mãe da L. N., viviam ...viviam mesmo no espaço físico da sua casa, viviam mesmo dentro da sua habitação?"
Testemunha -“Sim, sim, viviam connosco".
Advogada da interveniente L. N. -“Conviviam diariamente?"
Testemunha -“Sim, sim."
XXIV. - Pelo exposto, no facto 38. dos factos provados deverá constar como provado que: A interveniente L. N. viveu com A. C. até aos seus 3 anos de idade.
XXV.- A aqui recorrente entende também que, deveriam ter sido dado como provados factos assinalados na douta decisão recorrida como não provados, melhor identificados supra em 5.
ii) Entre a interveniente L. N. e A. C. havia muita união, carinho e amor;
j)Da memória da interveniente L. N. está a esvair-se a imagem de A. C.;
k)A ausência de A. C. faz com que a interveniente L. N., no meio escolar, se sinta diferente dos colegas;
XXVI.-Conforme já alegado e transcrito, a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, bem refere na motivação da decisão sobre a matéria de facto que, não obstante a qualidade de mãe do falecido A. C., a testemunha M. F., prestou um depoimento que não mereceu censura, qualificado como “desapaixonado e sincero”. No entanto, a Meritíssima Juiz não valorizou de forma plena o referido depoimento prestado a 20/09/2019, constando no suporte digital "00:00:01 a 00:33:04" que, em relação aos factos supra transcritos, esclareceu perentoriamente o seguinte:
Advogada da interveniente L. N. - “Quando a L. N. nasce, o seu filho e a mãe da L. N. já estão a viver na sua casa?"
Testemunha - “Sim, a C. G., que é a mãe da L. N. e o meu filho estavam a viver lá desde que a C. G. estava grávida mais ou menos de 4 meses."
“Quando a L. N. nasceu estavam a viver lá."
Advogada da interveniente L. N. - “Qual é que foi vivência e o estado de espirito do seu filho ... em ser pai?"
Testemunha - “Ui, antes e depois era uma alegria, a ansiedade que ela nascesse e depois da L. N. nascer, o carinho, não é?... 
Meritíssima Juiz - “Portanto, a partir do momento em que o seu filho sai de sua casa com a sua neta com 3 anos, deixaram de conviver?”
Testemunha - "Eu deixei de conviver.”
Meritíssima Juiz - “Quando a senhora diz deixou de conviver, quer nos dizer que o seu filho deixou de ir a sua casa, como é que foi?”
Testemunha - “Sim, deixou de frequentar a minha casa.”
Meritíssima Juiz - “Portanto, o convívio com a filha L. N. também ficou reduzido, já não era igual?”
Testemunha - “Não era a mesma coisa, portanto, em vez de ser diariamente, deixou de ser com tanta frequência, não é.
Meritíssima Juiz - "... mais ou menos com que periodicidade o seu filho conviveu com a L. N. durante esse período em que?...”
Testemunha - “Quando se encontravam não era lá em casa.”
Testemunha - “Isso era mais entre a mãe, procurei não estar muito a par disso,...’’ Testemunha - “Era mais entre a mãe e ele.”
Meritíssima Juiz - “Entretanto aconteceu o que aconteceu, este infortúnio, este acidente que colheu a vida ao seu filho, certamente tiveram que contar à L. N., ela estava lá em casa?” Testemunha - “Sim, no início nós não contamos a L. N. via as outras crianças com os pais e perguntava pelo pai, e o meu pai.?”
Meritíssima Juiz - “Então quando é que contaram?”
Testemunha - “Nós dizíamos sempre o teu pai gosta muito de ti, mas está a trabalhar muito longe e não pode estar contigo, mas ele adora-te.”
“Depois, acontece que, a L. N. anda no infantário e a Psicóloga disse que, aconselhou ... era uma altura que seria bom para a gente elucidar a L. N. do que aconteceu e então foi nessa atura.” 
Testemunha - “Foi mais ou menos um ano trás, um ano e meio, não posso precisar. Foi quando a Psicóloga achou por bem nos informarmos e então explicamos à L. N. que o pai tinha falecido, tinha tido um acidente e que... gostava muito dela. Ela então perguntou logo, então porque é que vocês me disseram que ele estava a trabalhar longe?!“
Testemunha - “Na altura ela pediu para ver a campa do pai.”
Meritíssima Juiz - “Durante o período em que ocultaram a morte do pai à L. N., a L. N. não questionava sequer o facto de nem sequer ir passar uma tarde com ele?. Não sentiu propriamente muito a falta, é isso?”
Testemunha - “Não, sentia a morte do pai, porque ela falava continuamente nele!”
Meritíssima Juiz - “Se durante o período que mediou a morte até lhe contarem a verdade se a ausência do pai, foi assim um choque dramático?
Testemunha - “Não foi um choque dramático, mas ela sentia, ela é uma criança sensível e sentia.”
“Por exemplo o dia do pai, ela tinha acompanhamento do padrinho mas sentia que o pai não estava lá. ” “Sempre se falava, os amiguinhos tinham o pai, vinha os anos dela tinha o pai e ela não tinha o pai.” “Havia ali um vaziozinho na menina pela falta do pai.”
“Ela aceitou porque, portanto, lá está, nós seguimos as normas que nos deu a Psicóloga.”
“De revolta não teve porque foi acompanhada”.
“A L. N. hoje em dia fala mais do pai do que na própria altura em que lhe dissemos que ele tinha falecido., ela fala mais, faz mais perguntas a respeito dele, como é que ele era, como é que ele fazia as coisas, faz mais agora esse género de perguntas. ”
Advogada da interveniente L. N. - “No momento em que o seu filho sai de casa, ... deixa de conviver totalmente com a L. N.?”
Testemunha - “Eu penso que não, ainda se encontravam.., na minha casa não.
“Agora com a mãe eu penso que eles ainda chegaram a encontrar algumas vezes... ela... com a menina com ele. ”
Advogada da interveniente L. N. - ... A L. N. teve a curiosidade em saber onde é que o pai estava sepultado? 
Advogada da interveniente L. N. - “Atualmente a L. N., ... questiona a ligação que os dois tinham7”
Testemunha - “Sim,. pergunta o meu pai também fez isso comigo?... fazia filha.. brincava, dava cambalhotas, punha-te ao carrachucho, ... porque eu não me lembro, eu era pequenina fazia. era verdade não é, brincava com ela, andava às cavalitas, brincava muito com ela.“
“No princípio, quando o pai saiu, ela embora pequenina e falava muito pouco mas ela perguntava pelo pai, .”
“Como ele brincava muito com ela, andava sempre à volta dela, porque estava em casa,.. ela sentiu de facto essa falta e perguntava... muitas vezes. como nós também dissemos que o pai estava a trabalhar longe que a adorava. que não podia vir, isso foi atenuando o facto de ela sempre querer ver o pai.”
Advogada da interveniente L. N. - “.após o momento em que lhe contam à L. N. o sucedido, ...já ocorreu o dia do Pai, o Natal, a L. N. nessas datas. fala na memória do pai.?” Testemunha - “Ela fala, ... nessas alturas sempre foi acompanhada, por exemplo, no dia do Pai, ela tinha o Padrinho presente porque o pai não estava. mas ela pergunta.”
“Ela faz questão de especificar, o meu pai morreu, este não é o meu pai. ”
XXVII. -Conforme resulta provado nos autos, a menor L. N. nasceu em 29/03/2012, o sinistrado A. C. faleceu em 24/09/2016, e, viveu com a filha L. N. até aos 3 anos da mesma, considerando que, depois de deixar de viver com a mãe da L. N., os contactos com a menor foram reduzidos, quanto muito, o falecido deixou de ter convívio diário com a menina, durante 1 ano. Não pode o Tribunal concluir sem mais prova que, não havia qualquer tipo de convívio e/ou união entre a L. N. e o pai A. C., nomeadamente quando refere “quase não conviviam”, até porque, a testemunha M. F., mãe do falecido, por isso avó paterna da L. N. frisa quanto ao convívio entre pai e filha após a separação dos pais “.em vez de ser diariamente, deixou de ser com tanta frequência, não é”. A mãe do falecido afirma ainda que, há encontros entre pai e filha, no entanto, não aconteciam na casa dela. Aliás bem se retira do depoimento supra transcrito do conhecimento direto que esta avó tem que, o seu filho, o falecido A. C. tinha muito carinho e amor pela sua filha. A testemunha tem conhecimento direto dos factos desde a gravidez da mãe da sua neta L. N. que, o seu filho A. C. viveu com alegria e ansiedade essa gravidez e que, depois da filha L. N. nascer, era um carinho constante, inclusive, era um pai extremoso que, conforme narra, unicamente o que não “fazia era mudar fraldas e dar banho dizia que tinha medo de a partir...” Mais esclarece que, entre o seu filho e a menina L. N. havia muita união, carinho e amor, revelado pela narração que faz que, o mesmo, andava sempre à volta da filha e brincava muito com a filha, por exemplo, dava cambalhotas e punha às cavalitas.
XXVIII. -Também não pode o Tribunal formar a sua convicção para não dar como provado a forte união entre pai e filha, na circunstância de, a morte do pai só ter sido dado a conhecer à menor há cerca de um ano/um ano e meio atrás. Essa decisão da família da L. N., omitir o falecimento do seu pai, o sinistrado A. C., à data do acontecimento, tem uma razão de ser, ou seja, tal revelação ou trágica notícia só foi comunicada à menina L. N. quando a Psicóloga entendeu que, a mesma, tinha maturidade para o efeito. Também não pode o Tribunal concluir que, “durante mais de um ano, a menor não questionou nem deu e/ou sentiu a ausência do pai.’ Conforme bem refere a testemunha M. F., mãe do falecido A. C., quando diz, “...no início nós não contamos a L. N. via as outras crianças com os pais e perguntava pelo pai, e o meu pai?.” e, “Nós dizíamos sempre o teu pai gosta muito de ti, mas está a trabalhar muito longe e não pode estar contigo, mas ele adora-te.”, acrescentando, “Depois, acontece que, a L. N. anda no infantário e a Psicóloga disse que, aconselhou era uma altura que seria bom para a gente elucidar a L. N. do que aconteceu e então foi nessa atura.”, frisando que, “Foi quando a Psicóloga achou por bem nos informarmos e então explicamos à L. N. que o pai tinha falecido, tinha tido um acidente e que... gostava muito dela. Ela então perguntou logo, então  porque é que vocês me disseram que ele estava a trabalhar longe?!“. Esclarecendo que não terá sido um choque dramático, “mas ela sentia, ela é uma criança sensível e sentia." e que, a L. N. “...sentia a morte do pai, porque ela falava continuamente nele!" Também referiu que a menina aceitou porque “.nós seguimos as normas que nos deu a Psicóloga." e, “porque foi acompanhada". Pelo que, também não pode o tribunal concluir que, a menor não questionou nem deu e/ou sentiu a ausência do pai!
XXIX. -O Tribunal a quo, face ao transcrito e exposto, devia ter considerado provado que: “i) Entre a interveniente L. N. e A. C. havia muita união, carinho e amor;”
XXX.-Mais acresce que, do depoimento da referida testemunha, mãe do falecido A. C., bem se entende e foi dito com clareza pela mesma que, é frequente a L. N. fazer perguntas sobre o pai, querer saber como é que ele era, que tipo de brincadeiras tinha com a mesma, e, também esclareceu a testemunha que, com o passar da idade, essas perguntas são cada vez mais frequentes, sendo revelador que, a mesma luta contra o perder das memórias que ainda tem do pai. Tudo isto, nomeadamente, quando a testemunha relata que “...A L. N. hoje em dia fala mais do pai do que na própria altura em que lhe dissemos que ele tinha falecido.", “faz mais perguntas a respeito dele, também quando pediu ir ver onde é que o pai estava, referindo a avó “e nós fizemos isso. Pediu se o pudesse ir ver mais vezes.”. Além de referir que a L. N. com frequência pergunta, “o meu pai também fez isso comigo?...", referindo-se às brincadeiras que o falecido tinha com a filha.
XXXI.-E, se tal não bastasse, o depoimento da referida testemunha mãe de A. C., (avó paterna da L. N.), é corroborado, reforçado pelo depoimento da testemunha C. C., irmão do falecido A. C. e Tio da L. N., também prestado em Audiência de Julgamento realizada a 20/09/2019, constando o seu depoimento no suporte digital “00:00:01” a “00:17:27”, a tal respeito refere: 
MERITÍSSIMA JUIZ - “Alguma a L. N. teve alguma conversa consigo, desde então, nestes últimos 3 anos, sobre o pai?"
TESTEMUNHA - “A L. N. recorda-se dele, mantém-se curiosa, quis ir ao cemitério, quis saber e quer saber constantemente sobre o pai, mostrar fotografias..."
MERITÍSSIMA JUIZ - “Ela tem memórias do pai ou ela simplesmente pergunta isto porque não tem memórias?"
TESTEMUNHA - “Ela tem memórias do pai, não tem memórias de como ele era..." “Só não se recorda de coisas que ele gostava de fazer com ela nem nada, por isso ela pede para ver fotografias..."
MERITÍSSIMA JUIZ - “O senhor alguma vez, tem conhecimento ou presenciou... que por exemplo o atual companheiro da mãe da L. N. quisesse fazer tarefas como se fosse o pai dela e ela tivesse ripostado... tipo afasta-te lá, que tu não és o meu pai?"
TESTEMUNHA - “Ela no início ela sentiu muito, principalmente depois da morte dele, sentiu muito, ela afastava toda a gente que tentasse fazer o papel de pai, ... mesmo a mim..." “... as figuras que eram mais próximas masculinas ela não aceitava..."
ADVOGADA DA INTERVENIENTE L. N. - “.Sobre o pai, expressou que a L. N. recorda-se dele, ...a que comportamentos ou conversas se reporta para poder fazer essa conclusão?" TESTEMUNHA - "... a L. N. pede-me para ver fotografias quando era nova, fotografias quando era com o pai, acho que ela não tem a noção de quem era ou como era, a não ser por fotografias mas ela tem noção que teve alguém, até porque nós falamos."
ADVOGADA DA INTERVENIENTE L. N. - “Tem a noção que teve momentos com o pai, não conhece a figura dele, não tem essa memória.?"
TESTEMUNHA - “Ela lembra-se de momentos quando era criança, de brincadeiras, de ir a pic- nics a certos sítios específicos com ele."
TESTEMUNHA - “A L. N. retraiu-se um bocado mesmo em termos de afeto em relação a mim, a L. N. deixou de me dar beijos, porque ela dava-me todos os dias, deixou de fazer tanto o que eu mandava porque achava que já não tinha esse direito.ela não deixava facilmente eu dar- lhe de comer, ajuda-la a comer..."
XXXII. -Logo, também resulta sobejamente provado que, “j) Da memória da interveniente L. N. está a esvair-se a imagem de A. C.”.
XXXIII. - A testemunha M. F. também é clara quando, embora de forma sintética, esclarece que, a L. N., no meio escolar, nomeadamente, em dias festivos ou de atividades, sente a ausência do pai. Nomeia que, "a L. N. via as outras crianças com os pais e perguntava pelo pai, e o meu pai.?", Menciona, a título de exemplo que, “...no dia do pai, ela tinha acompanhamento do padrinho mas sentia que o pai não estava lá."e refere, "... os amiguinhos tinham o pai, vinha os anos dela tinham o pai e ela não tinha o pai." “Havia ali um vaziozinho na menina pela falta do pai.". Acrescenta ainda que, “.nessas alturas sempre foi acompanhada, por exemplo, no dia do Pai, ela tinha o Padrinho presente porque o pai não estava... mas ela pergunta.". Realça a testemunha que, nessas atividades, a L. N. faz questão de, “... especificar, o meu pai morreu, este não é o meu pai."
XXXIV.- Posto isto, também resulta provado que, “k) A ausência de A. C. faz com que a interveniente L. N., no meio escolar, se sinta diferente dos colegas”.
XXXV.-Assim, considerando o depoimento das testemunhas supra identificadas, (depoimentos transcritos supra), os quais, são familiares diretos do falecido A. C. e da sua filha L. N., que coabitaram com o falecido A. C. e a filha L. N., não lhe retirando qualquer credibilidade tal circunstância, antes sim, garantindo o conhecimento direto dos factos, e, depoimentos que, a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, considerou merecedores de credibilidade, terá de se concluir que têm de ser considerandos provados os factos transcritos supra identificados pelas alíneas i), j) e k).
XXXVI.- Se o tribunal a quo fizesse uma correta apreciação e valorização da prova produzida em audiência de julgamento, nos termos vindos de descrever, certamente, conduziria a uma decisão diversa da proferida e da que se recorre.
XXXVII. - Retira-se da fundamentação de direito da Sentença de que se recorre que:
-“. no dia -/09/2016, pelas 14h40m, na autoestrada A28, ao km 44,400, em Fonte Boa- Esposende, o veículo com a matrícula LC, que circulava no sentido Porto/Viana do Castelo, pela metade direita da faixa de rodagem, atento o referido sentido, sofreu uma avaria.;
-“.A. C. saiu também do veículo e dirigiu-se para a sua traseira, com o intuito de a auxiliar.";
-“Sucede que, nesse momento, o veículo com a matrícula GB, que circulava pela via mais à direita da referida autoestrada A28, no sentido Porto/Viana do Castelo, embateu com a parte frontal e lateral direita frente do seu automóvel no canto e lateral esquerda traseira do veículo com a matrícula LC e no corpo de A. C., o qual, ..., encontrando-se, nesse instante, a passar junto da lateral esquerda traseira do mesmo;
-“.a via da esquerda encontrava-se livre e desimpedida, ...’’;
-“O local desenha-se em reta com cerca de 400m de extensão, ...era dia, estava bom
tempo e o local apresentava-se com visibilidade de, pelo menos, 400m.";
-“.o veículo com a matrícula GB, no entanto, em face do que ficou provado, é
certo que a velocidade a que circulava não lhe permitiu imobilizar o veículo de modo a  -“Verifica-se, portanto, existir violação de norma legal destinada a proteger interesses privados, tendo o condutor do veículo com a matrícula GB realizado uma condução perigosa que deu causa ao acidente ocorrido, provocando, em termos de causalidade necessária e adequada, a morte de A. C..";
-“... entende-se que o condutor do veículo com a matrícula GB estava obrigado a conduzir a uma velocidade mais reduzida para poder fazer parar o automóvel caso surgisse, como surgiu, algum obstáculo na via, . tanto mais que aquele tinha visibilidade de, pelo menos, 400 metros.";
-“Resulta evidente, para nós, que o comportamento do condutor do veículo com a matrícula GB é um comportamento culposo, pois, não atuou com o cuidado que lhe era exigível, porque podia (e devia) ter evitado aquele acidente e os seus consequentes danos".
XXXVIII.-Cabendo aos lesados nos autos, nomeadamente, à menor L. N., a prova da culpa do condutor do veículo GB, e, conforme se transcreve supra, nos presentes autos, resulta largamente provado e devidamente fundamentado, o comportamento culposo do condutor do veículo GB, no exercício da condução e na produção do acidente fatal para A. C.. Além do mais, beneficiam ainda os lesados das chamadas presunções simples ou prova de primeira aparência, cabendo ao lesante a produção de contraprova.
XXXIX.- De toda a prova produzida quanto aos intervenientes, às circunstâncias de tempo, lugar e dinâmica do acidente, nomeadamente, a prova documental - a sentença condenatória proferida no processo-crime n.° 88/16.2GTVCT, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de Esposende - Juiz 1, transitada em julgado a 24/06/2019, e, a prova testemunhal produzida e considerada nos autos - M. P., militar do NICAV de Braga - a Ré, não produziu prova bastante que pudesse ilidir 
XL. -Quanto à questão do não uso de coletes refletores e da não colocação prévia do triângulo de pré-sinalização de perigo, nas circunstâncias da produção do acidente dos autos, como questão prévia ao seu não uso, importa questionar o porquê do seu não uso e, quando nasce a obrigação da sua colocação.
XLI. -Resulta da Sentença condenatória proferida no processo-crime n.° 88/16.2GTVCT, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de Esposende - Juiz 1, transitada em julgado a 24/06/2019, que: “consideraram-se as declarações prestadas pela assistente E. F. que, de forma clara, assertiva e circunstanciada, prestou depoimento que se afigurou credível, tendo sido valorado. Quanto às circunstâncias do acidente, ... O veículo encontrava-se parado, paralelamente à via por onde seguiam.
Não conseguindo empurrar tal veículo, por o mesmo se encontrar carregado com caixas de fruta, ia colocar o triângulo de sinalização. Como o veículo se encontrava carregado, dirigiu- se junto da janela do passageiro e pediu a A. C. para o mesmo sair e vir ao seu encontro, porque a mesma não sabia onde o triângulo se encontrava”.
XLII. - Resulta do depoimento da testemunha, M. P., militar do NICAV de Braga, supra transcrito em 14. que: “... nas declarações prestadas pela E. F. ela informou que estaria a empurrar o veículo, a uma dada altura ela não conseguiu.”, “e então, a dada altura, o condutor saiu para fora também no sentido de ajudar e ir buscar sinalização, tudo leva a crer que a viatura estaria parada. ” 
Meritíssima Juiz - “Iria buscar o quê senhora doutora?"
Advogada do interveniente M. S. - “O colete e o triângulo".
Testemunha - “De acordo com as declarações prestadas pela testemunha E. F.".
Advogada do interveniente M. S. - “.em que sitio é que está o triângulo dos carros?" Testemunha -“Varia muito de modelo para modelo".
Advogada do interveniente M. S. - “Naquele não sabe mas, podia estar nas traseiras, podia estar a sair do carro para ir busca-lo?"
Testemunha - “Podia estar nas traseiras, sim, sim".
XLIII. -Da Sentença de que se recorre foi dado como provado que:
“8. ... o veículo com a matrícula GB ... embateu com a parte frontal e lateral direita frente do seu automóvel... no corpo de A. C., o qual se deslocava para junto da traseira do veículo com a matrícula LC, ... encontrando-se, nesse instante, a passar junto da lateral esquerda traseira do mesmo”.
XLIV. - Da Fundamentação de Direito, página 28, da Sentença de que se recorre retira-se: "...encontrando-se, nesse instante, a passar junto da lateral esquerda traseira do mesmo."
XLV. - Da sua página 42 também acompanhamos o raciocínio da Meritíssima Juiz quando refere, "...o lesante, ... conduzia o seu veículo a uma velocidade desadequada à presença de outros utilizadores na via e, à aproximação da viatura conduzida pela vítima e desta, não travou, não abrandou a velocidade nem delas se desviou.” 
XLVI- Ora, do depoimento da referida testemunha, corroborado com o teor da douta sentença condenatória supra aludida e, da fundamentação da sentença de que se recorre, resulta que, o condutor do veículo GB, conduzia de forma desatenta e descuidada, veio a embater no canto lateral esquerdo da traseira do veículo LC e no corpo do falecido A. C. quando este se deslocava para a traseira do seu veículo.
XLVII. -Assim, dúvidas não restam que:
-O veículo conduzido por A. C. encontrava-se carregado com caixas de fruta;
-A mulher de A. C. ia colocar o triângulo de sinalização, no entanto, pediu a A. C. para o mesmo sair e vir ao seu encontro, porque a mesma não sabia onde o triângulo se encontrava;
-o falecido A. C. ainda saiu da viatura;
-Quando A. C. se dirigia para a traseira do seu veículo para recolher da bagageira a sinalização de perigo - triângulo e colete refletor foi atropelado;
-A. C. foi mortalmente atropelado antes de chegar à bagageira onde se encontrava o triângulo;
-o condutor do veículo GB, foi condenado pela prática de um crime de homicídio por negligência;
XLVIII. -Os coletes refletores, não têm de estar alojados no interior do veículo, podendo estar na bagageira. Não existe qualquer imposição legal que exija a utilização do colete desde que o condutor saia da viatura. Só sendo obrigado a envergar colete, no momento em vai colocar o triângulo de pré-sinalização de perigo. O que, no caso dos autos, o sinistrado nunca conseguiu fazer, uma vez que, foi atropelado antes de estar junto da bagageira da sua viatura. A pré-sinalização de perigo, no caso em apreço foi humanamente impossível  de ser realizada, A. C. foi mortalmente atropelado quando ia “...a passar junto da lateral esquerda traseira...” da sua viatura. O condutor do veículo avariado, A. C., foi brutalmente atropelado quando saía da viatura, ou seja, antes de nascer a sua obrigação de pré-sinalização de perigo!
XLIX. - É inconcebível que se considere que o falecido A. C. tenha violado o disposto nos artigos 87.°/1/3, 88.°/2/4 do Código da Estrada, quando, está sobejamente provado e assente nos presentes autos que, o sinistrado não chegou à bagageira da sua viatura, foi atropelado pelo condutor do veículo GB, ainda quando estava a passar junto à lateral esquerda da sua viatura, depois de ter saído do seu habitáculo, desse mesmo lado, do lado do condutor! Teoricamente - em caso de imobilização forçada de um veículo em consequência de avaria ou acidente, o condutor deve proceder à sinalização do perigo, friamente e na prática, no caso dos autos - o condutor foi abalroado antes de poder aceder aos coletes e triângulo e o seu corpo foi projetado a uma distância de 29,90m!
L. -Sem conceder, acresce ainda que, não foi a ausência de colete e de triângulo de sinalização de perigo a razão da ocorrência deste malogrado acidente/atropelamento.
LI. -Não podemos, mais uma vez, deixar de destacar no depoimento acima transcrito, da testemunha supra identificada, M. P., militar do NICAV de Braga, quando refere que, “o ponto de perceção possível apurado para o local do acidente era de aproximadamente 400 metros."Também está provado que era dia, estava bom tempo e, a faixa da esquerda estava livre, sem circulação de trânsito, o que permitiria a um condutor normalmente atento detetar a presença do veículo e do sinistrado, com uma larga distância e assim, reduzir a velocidade e tomar as cautelas necessárias na passagem pelo veículo. 
LII. -A razão deste atropelamento mortal foi a condução descuidada e desatenta do condutor da viatura GB. Este foi o facto causal do atropelamento, da exclusiva responsabilidade do condutor do veículo GB, L. F..
LIII. -Sem conceder, a ausência de colete refletor, atenta a factualidade e dinâmica do acidente dos autos, não concorre, por qualquer forma, para a ocorrência do atropelamento.
LIV. -Ainda sem conceder, nas circunstâncias concretas dos presentes autos, a desatenção e o descuido do referido condutor da viatura GB, nos termos provados nos autos, nunca lhe permitiriam aperceber-se da presença do sinistrado A. C..
LV. -Sendo notória a contradição da fundamentação na Sentença de que se recorre, com a decisão de repartição de culpas, ainda que, em percentagens diferentes, violando, assim, a decisão recorrida o disposto no artigo 483.° e 563.° do Código Civil.
LVI. -Existe, pois, erro notório na apreciação da prova, ao não censurar, em exclusivo a conduta do condutor do veículo GB, na produção deste acidente fatal e, a fundamentação está em contradição com a decisão.
LVII. -Em suma, não se verifica concorrência de culpas quanto ao verificado atropelamento, a que apenas o condutor do veículo GB, deu causa.
LVIII. -Decorrente da culpa exclusiva do condutor do veículo GB, na produção do acidente dos autos, impugna assim, a aqui recorrente todos os montantes indemnizatórios atribuídos à mesma, em relação aos quais, foi deduzida a percentagem de 20%. Vejamos: 
em 85.000,00 €, o valor da compensação pela perda do direito à vida do falecido A. C., a repartir em partes iguais pelo cônjuge e os quatro filhos, no entanto, pelas razões invocadas supra, não pode ser considerado, apenas, 80% desse valor. Cabendo, assim, à recorrente, a quantia de 17.000,00 € (dezassete mil euros), pela perda da vida do seu pai, A. C..
LX. - “sobre os danos não patrimoniais sofridos pela vítima A. C.”: A Sentença de que se recorre considerou adequada a quantia de 15.000,00 €, a título de danos não patrimoniais sofridos pelo sinistrado A. C., pai da recorrente, atendendo ao sofrimento do mesmo. Não aceita a recorrente, face a impugnação que faz da concorrência de culpas, a dedução em 20% a título de culpa da vítima, ao montante indemnizatório, pelo que, sendo o valor de 15.000,00 € a repartir em partes iguais pelo cônjuge e os quatro filhos, cabe à apelante, a quantia de 3.000,00 €, (três mil euros).
LXI. - “sobre os danos não patrimoniais sofridos pelos intervenientes”: Conforme a impugnação da matéria de facto supra, em 35. e seguintes, entende a recorrente que, resulta sobejamente provado que a interveniente L. N. conviveu com o pai, a vítima A. C., até aos seus 3 anos de idade e que, entre pai e filha havia muita união e carinho, mais, não obstante a separação do falecido A. C. da mãe da L. N., o mesmo ainda conviveu com a filha, embora tendo deixado de o fazer diariamente, também resulta impugnado supra que, à data da morte do pai, a L. N. não tinha qualquer convívio com este. De facto, não pode ser esquecido ou considerado irrelevante que, a vítima A. C. viveu com a filha L. N. até aos seus 3 anos, tendo vindo a falecer quando esta tinha 4 anos. O Tribunal a quo não pode concluir que a morte do pai tenha causado um desgosto e abalo emocional menor à L. N. do que, ao seu irmão M. S., porquanto, A L. N. nasceu em 29/03/2012, O M. S. nasceu em -/12/2011, têm uma diferença de 3 meses de idade. No entanto a L. N. apenas teve conhecimento da morte do pai, por aconselhamento de psicóloga, quando tinha mais maturidade, ou seja , apenas lhe foi contado o falecimento do pai entre Março a Setembro 2018, já com 6 anos de idade. 
LXII. - Conforme refere a sua avó paterna, a testemunha M. F., em depoimento
prestado em audiência de Julgamento a 20/09/2019, transcrito supra em 43.:
Meritíssima Juiz - “Então quando é que contaram?”
Testemunha - “Nós dizíamos sempre o teu pai gosta muito de ti, mas está a trabalhar muito longe e não pode estar contigo, mas ele adora-te. ”
“Depois, acontece que, a L. N. anda no infantário e a Psicóloga disse que, aconselhou ... era uma altura que seria bom para a gente elucidar a L. N. do que aconteceu e então foi nessa atura. ”
Meritíssima Juiz - “O acidente foi em 2016 e eu pergunto-lhe ... se foi só há um ano atrás que lhe contaram?...”
Testemunha - “Foi mais ou menos um ano trás, um ano e meio, não posso precisar. Foi quando a Psicóloga achou por bem nos informarmos e então explicamos à L. N. que o pai tinha falecido, tinha tido um acidente e que... gostava muito dela. Ela então perguntou logo, então porque é que vocês me disseram que ele estava a trabalhar longe?!“
Testemunha - “Na altura ela pediu para ver a campa do pai.”
LXIII. -Esclarece a mesma testemunha que, (também no seu depoimento supra transcrito), a L. N. sentiu a morte do pai, referindo:
Meritíssima Juiz - “Durante o período em que ocultaram a morte do pai à L. N., a L. N. não questionava sequer o facto de nem sequer ir passar uma tarde com ele? . Não sentiu propriamente muito a falta, é isso?”
Testemunha - “Não, sentia a morte do pai, porque ela falava continuamente nele!
Meritíssima Juiz - “Se durante o período que mediou a morte até lhe contarem a verdade se a ausência do pai, foi assim um choque dramático?
Testemunha - “Não foi um choque dramático, mas ela sentia, ela é uma criança sensível e sentia."
“Por exemplo o dia do pai, ela tinha acompanhamento do padrinho mas sentia que o pai não estava lá." “Sempre se falava, os amiguinhos tinham o pai, vinha os anos dela tinha o pai e ela não tinha o pai." “Havia ali um vaziozinho na menina pela falta do pai."
“Ela aceitou porque, portanto, lá está, nós seguimos as normas que nos deu a Psicóloga."
“A L. N. hoje em dia fala mais do pai do que na própria altura em que lhe dissemos que ele tinha falecido. . ., ela fala mais, faz mais perguntas a respeito dele, como é que ele era, como é que ele fazia as coisas, faz mais agora esse género de perguntas."
LXIV. - Também a testemunha, C. C., tio paterno da L. N. com quem a mesma viveu, conjuntamente com avó paterna, o seu pai e a sua mãe, (supra transcrito em 80. e seguintes), esclareceu:
MERITÍSSIMA JUIZ - “O senhor alguma vez, tem conhecimento ou presenciou... que por exemplo o atual companheiro da mãe da L. N. quisesse fazer tarefas como se fosse o pai dela e ela tivesse ripostado... tipo afasta-te lá, que tu não és o meu pai?"
TESTEMUNHA - “Ela no início ela sentiu muito, principalmente depois da morte dele, sentiu muito, ela afastava toda a gente que tentasse fazer o papel de pai, ... mesmo a mim..." ... as figuras que eram mais próximas masculinas ela não aceitava..."
ADVOGADA DA INTERVENIENTE L. N. - "...Sobre o pai, expressou que a L. N. recorda-se dele, ...a que comportamentos ou conversas se reporta para poder fazer essa conclusão?" TESTEMUNHA - “... a L. N. pede-me para ver fotografias quando era nova, fotografias quando era com o pai, acho que ela não tem a noção de quem era ou como era, a não ser por fotografias mas ela tem noção que teve alguém, até porque nós falamos."
ADVOGADA DA INTERVENIENTE L. N. - “Quando nos diz que a L. N. sofreu um bocadinho... quando lhe contam a morte do pai porque é que conclui que ela sofreu? O que é que viu nos comportamentos da L. N....?’’
TESTEMUNHA - “A L. N. retraiu-se um bocado mesmo em termos de afeto em relação a mim, a L. N. deixou de me dar beijos, porque ela dava-me todos os dias, deixou de fazer tanto o que eu mandava porque achava que já não tinha esse direito.ela não deixava facilmente eu dar- lhe de comer, ajuda-la a comer..."
LXV. - Pelo exposto, entende a recorrente ser justo e adequado atribuir à menor L. N., a mesma quantia a título de danos não patrimoniais que ao seu irmão, sofridos em consequência prematura da morte do pai, ou seja, a quantia de 30.000,00 €, (trinta mil euros). Pelos mesmos fundamentos de impugnação de atribuída de culpa ao sinistrado A. C., não pode ser deduzia da tal quantia, a percentagem de 20.
LXVI. - “sobre os danos patrimoniais (danos emergentes e lucros cessantes)”:
Considerando os factos provados e conforme consta da motivação da matéria de direito, (página 49.):
-“Por acordo homologado por sentença de 05/11/2013, devidamente transitada em julgado, o falecido estava obrigado a pagar mensalmente, a título de alimentos devidos à filha L. N., ..., a quantia de €75,00 (setenta cinco euros), até ao dia 10 de cada mês, com início no mês de novembro de 2014, a qual, a partir de janeiro de 2016, é atualizada anualmente em janeiro, segunda a taxa de inflação publicada pelo INE, mas nunca inferior a 3%.";
-“Mais se obrigou a comparticipar, na proporção de metade, em todas as despesas médicas e medicamentosas e as despesas com infantário, bem como todas as despesas escolares respeitantes a matrículas, livros, material escolar e visitas de estudo, no prazo de 8 dias, após a apresentação do respetivo comprovativo.
LXVII. -O Tribunal a quo decidiu pelo cômputo da perda do montante global de alimentos que a interveniente L. N. poderia receber, tendo considerado devido à interveniente L. N. a título de pensão de alimentos mensal, atualização incluída, calculada desde Outubro de 2016 até março de 2037, data em que atingirá os 25 anos, acrescido de metade das despesas de saúde (médica e medicamentosas) dadas como provadas no ponto 43 dos factos provados, efetuadas após a morte de vítima, e, bem assim, de metade todas as despesas de saúde e educação que vierem a ser efetuadas.
LXVIII. -Não decidiu bem o Tribunal quando fixa em apenas 80% o montante total devido a título de pensão de alimentos e 80 % de metade das despesas de saúde já provadas e 80% de metade de todas as despesas de saúde e educação que vierem a ser efetuadas, pelas razões já invocadas, ou seja, não resulta provada a culpa do sinistrado na produção de acidente que lhe tirou a vida, pelo que, as pensões de alimentos devidas e metade das despesas de saúde e educação devidas, terão de ser fixadas na sua globalidade, ou seja, 100% do valor.
LXIX. - Assim, é devido à interveniente L. N. o valor de 26.319,36 €, (vinte e seis mil trezentos e dezanove euros e trinta e seis cêntimos), a título de pensão de alimentos mensal, atualização incluída, calculada desde Outubro de 2016 até Março de 2037, data em que atingirá 25 anos, acrescido de 22,00 € (vinte e dois euros), correspondente a metade das despesas de saúde dadas como provadas no ponto 43. dos factos provados e, metade de todas as despesas de saúde e educação que vierem a ser efetuadas.
LXX. -Pelo que, tem a interveniente L. N. direito a receber a quantia total de 76.341,36, (setenta e seis mil trezentos e quarenta e um euros e trinta e seis cêntimos:
- 50.000,00 € - (17.000,00 € + 3.000,00 + 30.000,00 €), a título de danos não patrimoniais; e,
- 26.341,36 € - (26.319,36 € + 22,00 €), a título de danos patrimoniais sofridos.
LXXI- tudo acrescido de juros de mora, à taxa supletiva legal de 4%, contados sobre a quantia a título de danos não patrimoniais desde a data da Sentença e sobre a quantia a título de danos patrimoniais desde a citação, até efetivo e integral pagamento.
LXXII. -Bem como, a Ré terá de pagar à interveniente, metade das despesas com a saúde e com a educação que vierem a ser efetuadas com a L. N., até a mesma completar 25 anos de idade, desde que devidamente comprovadas.
LXXIII.-Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença.
LXXIV. -A sentença padece, assim, por contradição, da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. c) do C.P.C.., pois, a fundamentação está em contradição com a decisão, como se vem de expôr.
LXXV- Em suma, os elementos de prova carreados para os autos, transcritos supra, nos termos que se expõe, impõem decisão diversa da Sentença que se recorre e desde logo, no sentido que se acaba de concluir.
LXXVI- Termos em que, julgando procedente o presente recurso, revogando a douta Sentença nos termos expostos, substituindo-se por outra, em consonância com a aqui alegado, assim se fazendo Justiça.

B) Recurso de Apelação do Interveniente/Autor M. S.

DA MATÉRIA DE FACTO

i. Antes de mais, na decisão recorrida há uma flagrante e notória desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, pois, da prova produzida e dos documentos juntos aos autos, o Tribunal não poderia ter dado como provados os factos supra transcritos (pontos n.° 33 e 34 da sentença) e, nesses termos, naturalmente, conduziriam a decisão diferente,
II. Sucede que, salvo o devido respeito por melhor opinião, a prova produzida não sustenta tal narrativa, tendo por isso, a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, feito uma valoração errada da prova produzida.
III. Na motivação da sentença de que se recorre, a Meritíssima Juiz considerou, “ ..para a prova do embate, seguido de atropelamento, ocorrido, das características e propriedade dos veículos nele intervenientes, das circunstâncias de tempo e lugar em que o mesmo se verificou, do sentido de marcha em que circulavam os veículos, da sua dinâmica fenomenológica, das características da via e do local e das condições climáticas”, nomeadamente, “ .. a sentença condenatória proferida no processo-crime n.° 88/16.2GTVCT, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de Esposende - Juiz 1, transitada em julgado a 24/06/2019,... tudo acrescido do depoimento da testemunha, M. P., militar do NICAV de Braga, que, no exercício das suas funções se deslocou ao local do acidente, no dia da sua ocorrência.”.
IV. No entanto, a Meritíssima Juiz não valorizou devidamente a referida Sentença no seu todo, nem o depoimento sério, isento e credível da testemunha M. P., militar do NICAV de Braga.
V. Na douta Sentença supra identificada, foi dado como provado que, “13. ...o arguido, que conduzia o veículo GB pela via da direita, podia e devia aperceber-se da presença do veículo LC e do seu condutor e passageira naquele local, e de forma atempada desviar-se dos mesmos, uma vez que o local em causa possui boa visibilidade, existem duas vias de trânsito no sentido em que circulava, a via mais à esquerda encontrava-se livre e desimpedida e o seu veículo circulava de forma isolada”.
VI. Ora, do depoimento da referida testemunha, corroborado com o teor da douta sentença supra aludida, resulta que, o condutor do veículo GB, conduzia de forma desatenta e descuidada, veio a embater no canto lateral esquerdo da traseira do veículo LC e no corpo do falecido A. C. quando este se deslocava para a traseira do seu veículo.
VII. Assim, dúvidas não restam que, o falecido A. C. se dirigia para a traseira do seu veículo para recolher da bagageira a sinalização de perigo - triângulo e colete refletor, que infelizmente, não teve tempo para o fazer, tudo por culpa exclusiva do condutor do veículo GB que, ao conduzir de forma desatenta e descuidada, não evitou o embate.
VIII. Não pode, agora, o tribunal a quo, ter uma perceção diferente da dinâmica do acidente, quando, a realidade dos factos é apenas uma.
IX. Por isso, o condutor/vítima só estava obrigado a envergar colete, no momento em vai colocar o triângulo de pré-sinalização de perigo. O que, no caso dos autos, o sinistrado nunca conseguiu fazer, uma vez que, foi atropelado antes de estar junto da bagageira da sua viatura.
X. Assim, nunca poderia ter sido dado como provado que não colocaram previamente o triângulo de pré-sinalização de perigo”, uma vez que, a pré- sinalização no caso em apreço foi humanamente impossível de ser realizada pois, o condutor do veículo avariado, A. C., foi brutalmente atropelado quando saía da viatura, ou seja, antes de nascer a sua obrigação de pré-sinalização de perigo!
Além do mais, a Ré, não logrou ilidir a presunção de oponibilidade a terceiros da decisão penal condenatória, que resulta do artigo 623.° do Código de Processo Civil, a si oponível.
Assim, face ao exposto, foram considerados provados os factos 33. e 34. da Sentença de que se recorre, em relação aos quais não foi produzida prova cabal e segura que permitisse alcançar com segurança a prova dos mesmos.
Sem conceder, sempre se diga que,
XIII. Resulta do depoimento da testemunha L. F. que a senhora, ora Autora E. F., não tinha colete refletor vestido, mas, ainda assim, tal não o impossibilitou de a ver.
XIV. Pois era dia, cerca das 14h40, num “dia de bom tempo, via limpa, não havia obstruções visíveis na via...”e que“o ponto de perceção possível apurado para o local do acidente era de aproximadamente 400 metros.”, como esclarece a testemunha M. P..
XV. Nestes termos, o facto de a vítima utilizar ou não do colete refletor e o triângulo de sinalização não produziria outro resultado que não o que ocorreu, o embate na parte traseira do veículo e atropelamento do condutor, com produção dos danos provados nos presentes autos, pois o lesante não viu a vítima quer ela tivesse ou não colete reflector.

DA MATÉRIA DE DIREITO:

XV Nos presentes autos, resulta largamente provado e devidamente fundamentado, o comportamento culposo do condutor do veículo GB, no exercício da condução e na produção do acidente fatal para A. C..
XVII. Além do mais, beneficiam ainda os lesados das chamadas presunções simples ou prova de primeira aparência, cabendo ao lesante a produção de contraprova.
XVII De toda a prova produzida quanto aos intervenientes, às circunstâncias de tempo, lugar e dinâmica do acidente, nomeadamente, a prova documental - a sentença condenatória proferida no processo-crime n.° 88/16.2GTVCT, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de Esposende - Juiz 1, transitada em julgado a 24/06/2019, e, a prova testemunhal produzida e considerada nos autos - M. P., militar do NICAV de Braga - a Ré, não produziu prova bastante que pudesse ilidir a presunção em causa, pelo contrário.
XIX. Quanto à questão do não uso de coletes refletores e da não colocação prévia do triângulo de pré-sinalização de perigo, nas circunstâncias da produção do acidente dos autos, como questão prévia ao seu não uso, importa questionar o porquê do seu não uso e, quando nasce a obrigação da sua colocação.
XX Resulta da Sentença condenatória proferida no processo-crime n.° 88/16.2GTVCT, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de Esposende - Juiz 1, transitada em julgado a 24/06/2019, que: “consideraram-se as declarações prestadas pela assistente E. F. que, de forma clara, assertiva e circunstanciada, prestou depoimento que se afigurou credível, tendo sido valorado. Quanto às circunstâncias do acidente, ...O veículo encontrava-se parado, paralelamente à via por onde seguiam. Não conseguindo empurrar tal veículo, por o mesmo se encontrar carregado com caixas de fruta, ia colocar o triângulo de sinalização. Como o veículo se encontrava carregado, dirigiu-se junto da janela do passageiro e pediu a A. C. para o mesmo sair e vir ao seu encontro, porque a mesma não sabia onde o triângulo se encontrava”.
XXI E, bem sabe o Tribunal a quo, que a A., E. F. foi a única que presenciou o embate, podendo descrever o modo como este ocorreu e o sofrimento causado ao falecido no momento.
XXII. No entanto, veio o Tribunal a quo julgar prejudicada a tomada de declarações à Autora, E. F., pela instância se encontrar extinta em relação a esta e por não ter sido possível estabelecer contacto com a Autora para prestar depoimento.
XXIII. Contudo, se acordo com o princípio do inquisitório, consagrado na lei processual civil, o juiz tem a iniciativa da prova, podendo realizar e ordenar oficiosamente todas as diligências necessárias para o apuramento da verdade.
XXIV. Por consequência, o tribunal a quo sabendo da pertinência e/ou utilidade da diligência requerida, devia tal como decorre do art.° 6° do CPC, ter diligenciado oficiosamente pela presença da parte nas sessões de julgamento, por se aplicar às declarações de parte o regime previsto para o depoimento de parte, pois o n.° 2 do art.° 417.° do CPC, remete para os artigos 452° e 454° do CPC, ou seja, para o regime da prova por depoimento de parte.
XXV. E, com base nesse depoimento, poderiam ter sido provados ou não provados factos que certamente contribuiriam para uma diferente decisão final, que ora se recorre, designadamente quanto à responsabilidade pela produção do acidente, que foi atribuída ao condutor do veículo/vítima na percentagem de 20.
XXVI. Ainda assim, da Sentença de que se recorre foi dado como provado do depoimento da referida testemunha, corroborado com o teor da douta sentença condenatória supra aludida e, da fundamentação da sentença de que se recorre, que, o condutor do veículo GB, conduzia de forma desatenta e descuidada,
XXVII. Assim, dúvidas não restam que:
- A mulher de A. C. ia colocar o triângulo de sinalização, no entanto,
pediu a A. C. para o mesmo sair e vir ao seu encontro, porque a mesma não sabia onde o triângulo se encontrava;
- O falecido A. C. ainda saiu da viatura;
- Quando A. C. se dirigia para a traseira do seu veículo para recolher da bagageira a sinalização de perigo - triângulo e colete refletor foi atropelado;
- A. C. foi mortalmente atropelado antes de chegar à bagageira onde se encontrava o triângulo;
- O condutor do veículo GB, foi condenado pela prática de um crime de
homicídio por negligência;
XXVIII. Os coletes refletores, não têm de estar alojados no interior do veículo, podendo estar na bagageira.
XXIX. Não existe qualquer imposição legal que exija a utilização do colete desde que o condutor saia da viatura, só sendo obrigado a envergar colete, no momento em vai colocar o triângulo de pré-sinalização de perigo.
XXX. Pois, de acordo com a Nota Técnica sobre a utilização dos coletes retrorreflectores nos termos do disposto no art.° 88.° do Código da Estrada, publicada pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (cuja junção se requer), vem esclarecer que os coletes retrorrefletores não têm que se encontrar alojados no interior do habitáculo do veiculo, podendo encontrar-se na bagageira, nem existe imposição legal que imponha, a quem está obrigado à utilização do colete, que quando da saída do veículo tenha que ter o colete colocado,
XXXI. Só existe infração ao disposto nos n.° 4 e 7 do art.° 88.° do Código da Estrada quando quem se encontre a proceder à colocação do triângulo de pré- sinalização, quem esteja a proceder à colocação do triângulo de pré-sinalização de perigo, não tenha colocado o colete.
XXXII. O condutor do veículo avariado, A. C., foi brutalmente atropelado quando saía da viatura, ou seja, antes de nascer a sua obrigação de pré-sinalização de perigo!
XXXIII. É inconcebível que se considere que o falecido A. C. tenha violado o disposto nos artigos 87.º/1/3, 88.°/2/4 do Código da Estrada, quando, está sobejamente provado e assente nos presentes autos que, o sinistrado não chegou à bagageira da sua viatura,

Sem conceder, sempre se diga que
XXXIV. Não foi a ausência de colete e de triângulo de sinalização de perigo a razão da ocorrência deste malogrado acidente/atropelamento.
XXXV. Também está provado que era dia, estava bom tempo e, a faixa da esquerda estava livre, sem circulação de trânsito, o que permitiria a um condutor normalmente atento detetar a presença do veículo e do sinistrado, com uma larga distância e assim, reduzir a velocidade e tomar as cautelas necessárias na passagem pelo veículo.
XXXVI. A razão deste atropelamento mortal foi a condução descuidada e desatenta do condutor da viatura GB e este foi o facto causal do atropelamento, da exclusiva responsabilidade do condutor do veículo GB, L. F..
XXXVII. Sem conceder, a ausência de colete refletor, atenta a factualidade e dinâmica do acidente dos autos, não concorre, por qualquer forma, para a ocorrência do atropelamento, ao invés do previsto no art.° 570.° do CC.
XXXVIII. Ainda sem conceder, nas circunstâncias concretas dos presentes autos, a desatenção e o descuido do referido condutor da viatura GB, nos termos provados nos autos, nunca lhe permitiriam aperceber-se da presença do sinistrado A. C., como já alegado na impugnação da matéria de facto.
XXXIX. Sendo notória a contradição da fundamentação na Sentença de que se recorre, com a decisão de repartição de culpas, ainda que, em percentagens diferentes, violando, assim, a decisão recorrida o disposto no artigo 483.° e 563.° do Código Civil.
XL. Existe, pois, erro notório na apreciação da prova, ao não censurar, em exclusivo a conduta do condutor do veículo GB, na produção deste acidente fatal e, a fundamentação está em contradição com a decisão.
XLI. Em suma, não se verifica concorrência de culpas quanto ao verificado atropelamento, a que apenas o condutor do veículo GB, deu causa.
XLII. Decorrente da culpa exclusiva do condutor do veículo GB, na produção do acidente dos autos, impugna assim, o aqui recorrente todos os montantes indemnizatórios atribuídos à mesma, em relação aos quais, foi deduzida a percentagem de 20%.
XLIII. O Tribunal a quo, decidiu pela fixação em 85.000,00 €, o valor da compensação pela perda do direito à vida do falecido A. C., a repartir em partes iguais pelo cônjuge e os quatro filhos,
XLIV. No caso concreto a decisão recorrida considerou por um lado os valores que em termos jurisprudenciais têm sido fixadas pelo Supremo Tribunal de Justiça e por outro as condições concretas de idade e de vida da vítima, a juventude à data do acidente e o futuro que tinha à sua frente.
XLV. Consideramos equitativa a compensação, de € 100.000,00 pela perda do mesmo direito, cabendo, assim, ao recorrente, a quantia de 20.000,00 €, (vinte mil euros), pela perda da vida do seu pai, A. C..
XLVI. A Sentença de que se recorre considerou adequada a quantia de 15.000,00 €, a título de danos não patrimoniais sofridos pelo sinistrado A. C., pai do recorrente, atendendo ao sofrimento do mesmo.
XLVII. Não aceita o recorrente, face a impugnação que faz da concorrência de culpas, a dedução em 20% a título de culpa da vítima, ao montante indemnizatório, pelo que, sendo o valor de 15.000,00 € a repartir em partes iguais pelo cônjuge e os quatro filhos, cabe ao apelante, a quantia de 3.000,00 €, (três mil euros).
XLVIII. Atendendo aos factos provados e à demais convicção exposta na sentença decorrida, pelos danos não patrimoniais resultantes da dor/sofrimento pela privação física do pai ao longo da vida afigura-se justo atribuir uma compensação ao menor, ora recorrente, de € 40.000,00, à qual, pelos mesmos fundamentos de impugnação de atribuída de culpa ao sinistrado A. C., não pode ser deduzia a percentagem de 20.
XLIX. Cabendo, assim, ao recorrente, a quantia de 40.000,00 €, (quarenta mil euros), pela perda da vida do seu pai, A. C..
L. sobre os danos patrimoniais (danos emergentes e lucros cessantes), é devido ao interveniente M. S. o valor de 36.422,41 €, a título de pensão de alimentos mensal, atualização incluída, calculada desde Outubro de 2016 até novembro de 2036, data em que atingirá 25 anos, acrescido metade de todas as despesas de saúde e educação que vierem a ser efetuadas, sem a dedução dos 20% pelos fundamentos já expostos.
Resumindo,
LI. A Ré terá de pagar à interveniente, metade das despesas com a saúde e com a educação que vierem a ser efetuadas com o menor, até o mesmo completar 25 anos de idade, desde que devidamente comprovadas.
LII. Tem, ainda, o interveniente M. S. direito a receber a quantia total de € 99.422,41:
- 53.000,00 € - (20.000,00 € + 3.000,00 + 40.000,00 €), a título de danos não patrimoniais; e,
- 36.422,41 €, a título de danos patrimoniais sofridos.
LIII. Acrescido de juros de mora, à taxa supletiva legal de 4%, contados sobre a quantia a título de danos não patrimoniais e sobre a quantia a título de danos patrimoniais desde a citação, até efetivo e integral pagamento, ao contrário do firmado pelo Tribunal a quo, que considera que apenas se vencem juros de mora sobre os montantes reconhecidos a título de danos não patrimoniais a partir da data da sentença.
LIV. Ora, no presente caso, a sentença mencionada que os montantes reconhecidos a título de danos não patrimoniais estão já atualizados à data desta sentença, porque “o equivalente monetário de tais danos foi fixado em função do valor da moeda à data da sentença”.
LV. Todavia, nesta sentença, o tribunal a quo disse expressamente que os montantes reconhecidos pelos danos não patrimoniais são atualizados à data da sentença (página 52 da mesma), mas o certo é que da leitura de todo o conteúdo da mesma tal não resulta demonstrado.
LVI. Nestes termos, são devidos juros desde a citação, por aplicação das disposições conjugadas dos citados art.° 566°, n° 2 e 805°, n° 3 do CC.
Concluindo,
LVII. Em suma, os elementos de prova carreados para os autos, transcritos supra, nos termos que se expõe, impõem decisão diversa da Sentença que se recorre e desde logo, no sentido que se acaba de concluir.
LVIII. A sentença padece, por contradição, da nulidade prevista no artigo 615.°, n.° 1, al. c) do C.P.C., pois, a fundamentação está em contradição com a decisão, como se vem de expor.

C) Recurso de Apelação subordinado da Ré Seguradora

1. Para julgar provada a factualidade que integra o n.°29 dos Factos Provados da sentença recorrida, na total ausência de prova testemunhal sobre esta factualidade, o Tribunal recorrido baseou a sua convicção na prova documental existente nos autos, nomeadamente, na ficha de observação médica de fls. 251 e na informação dali extraída sobre a assistência que, ainda, foi prestada à vítima A. C. no local do acidente, antes de, e AINDA ALI, ser verificado e declarado o seu óbito - fundamentação vertida na pág. 19 da sentença recorrida.
2. Como tem vindo a ser reconhecido pela jurisprudência, aceita-se ser notório e incontestável - porque inerente à condição humana - o sofrimento e a dor físicas de que padece uma pessoa ao sofrer o embate de um veículo automóvel, em particular, quando resultam as lesões descritas no n.° 24 dos Factos Provados e que vieram a ser a causa da sua morte (n.° 25).
3. todavia, já é discutível, e como tal, carece de prova para a sua confirmação o facto de que a vítima tenha tido, necessariamente, a consciência da morte e que, por via de tal consciência, tenha padecido de um sofrimento moral, “que lhe causou agonia, amargura e angústia”, como está provado no n.° 29 aqui posto em crise.
4. Não foi produzida prova testemunhal, máxime das pessoas que acompanharam e assistiram a vítima A. C. após o embate de que tenha tido, necessariamente, a consciência da morte e que, por via de tal consciência, tenha padecido de um sofrimento moral,
5. pelo que, considerando o que se extrai da prova documental, sobre a gravidade e natureza das lesões decorrentes do embate, bem como as manobras de reanimação executadas - que apontam para um estado de perda das funções vitais (como a respiratória) incompatíveis com a manutenção de um estado consciente - terá que se dar como não provado o Facto Provado n.°29, o que se requer, entendendo a qui Recorrente que o douto Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento, ao formar convicção positiva sobre a prova de tal factualidade, perante a manifesta inexistência de meios probatórios suficientes e idóneos para tal.

SEM PRESCINDIR:

6. A sentença recorrida fixou a culpa pela ocorrência do acidente dos autos na proporção de 20% para a vítima A. C. e 80% para o condutor do GB, decisão que, no nosso modesto entendimento, não se poderá manter, atenta a boa aplicação dos critérios legais aplicáveis à factualidade provada nos n.°s 3, 5, 6, 7, 8, 9, 13, 14, 21, 32, 33 e 34 dos Factos Provados da Sentença.
7. Tendo presente que, um acidente de viação, não é uma realidade estática (Acórdão da.SU dfi 17-10-2019. Proc. 15385/15.6T8LRS.L1.S1), importa aferir SE, no decurso da concreta dinâmica que resulta daquela factualidade provada, ocorreu alguma condição anormal ou obstáculo inesperado, “sobretudo os derivados da imprevidência alheia”, com os quais o condutor do GB, na posição de um condutor com a prudência exigível a um condutor normal, não pudesse em concreto contar - Ac. do STJ de 27-09-2002, Proc. 03B444.
8. Ora, sobre a forma como o LC se imobilizou na auto-estrada devido a avaria, temos apenas como factos instrumentais (mas que permitem complementar aquele facto essencial provado no n.°3 da sentença), os que resultam das declarações da ocupante E. F., vertidas no relatório do OPC a fls. dos autos, segundo a qual a carrinha "... estava a circular normalmente e de repente foi abaixo, como vinham a cerca de 100 a hora continuaram com a carrinha embalada até ela parar",
8. mais respondendo à questão sobre se a carrinha avariou na zona do acidente ou antes, que "a carrinha parou antes do acidente cerca de 20 metros".
9. Na fundamentação da sentença e de acordo com a tese dos Intervenientes, é dada particular relevância ao facto de a via, ser uma recta, com visibilidade de pelo menos 400 metros.
10. No entanto, para enquadrar correctamente a relevância de tal facto (n.° 14), de forma a ser aferida a culpa do condutor do GB na produção do resultado aqui em causa, teria sido necessário que tivesse ficado provado a que distância do GB, em andamento, estava da carrinha LC quando esta se imobilizou na via e,
11. posteriormente, de onde o A. C. saiu do seu interior, de forma a apurar-se SE, a essa distância, o condutor do GB tinha obrigação de ter visto na via aqueles obstáculos (o veículo imobilizado e a vítima), reduzir a velocidade e desviado a sua trajectória.
12. Da conjugação dos factos provados nos n.°s 7 e 8 da sentença, analisados criticamente perante uma perspectiva dinâmica do acidente resulta, sem margem para dúvidas, que o embate do veículo GB no corpo da vítima ocorreu de imediato à saída deste do interior do LC, onde ocupava a posição de condutor!
13 o embate não ocorreu minutos depois da saída da vítima do interior do LC, o que podia indiciar que o condutor do GB, previamente, podia e deveria ter-se apercebido da sua presença, ou andamento na via e, assim, teria tido mais tempo para adequar a condução do seu veículo, reduzido a velocidade e desviado a sua trajectória, de forma a não atingir o A. C..
14. Pelo exposto, conclui-se que o condutor do GB foi surpreendido pela presença do A. C. na via, sem tempo para adequar a trajectória do veículo ou reduzir a velocidade, de forma a evitar atingir aquela pessoa que lhe surgiu inopinadamente em plena via por onde circulava, por ter saído do interior do seu veículo, LC, com a intenção de se dirigir à sua traseira para ajudar a mulher a empurrá-lo - como decorre do depoimento da testemunha L. F., condutor do GB, vertida na pág. 16 da fundamentação da sentença recorrida, em harmonia com a versão do acidente que deu desde o início, nomeadamente, no relatório de investigação criminal junto aos autos.
15. Considerando o que está provado nos n.°s 7 e 8 da fundamentação da sentença, conclui-se que, foi o aparecimento anormal, súbito e inesperado do A. C. na via, que “acabou por sair também do veículo, fechando a porta do condutor e dirigindo-se para a sua traseira”, no momento em que o GB, com a sua parte frontal direita, embatia na traseira do LC.
16. A imprevidência alheia, da vítima A. C., foi a causa principal do acidente objecto dos autos já que, só pode ser objecto de forte censura o comportamento de um condutor que, em plena auto-estrada, sai subitamente do interior do veículo onde circula, o LC, ali imobilizado em plena faixa de rodagem da direita, sem qualquer sinalização de perigo (facto n.° 34), e sem atentar aos veículos que, como o GB, circulavam no mesmo sentido de marcha, quando o podia ter avistado antes de sair do interior do LC, olhando pelos espelhos retrovisores, atenta a visibilidade de 400 metros onde ocorreu o acidente.
17. Aceitando a relevância da existência de uma via com visibilidade de, pelo menos, 400 metros então, temos também de tirar ilações de tal facto para ambos os intervenientes e não só para o condutor do GB,
18. devendo ser, então, exigível ao A. C. que, pelos espelhos retrovisores, também se tivesse apercebido da aproximação do GB e, nessa circunstância, não tivesse saído do interior do veículo, assim evitando o embate do GB contra o seu corpo e que veio a determinar na sua morte,
19. ou, quando muito, devendo ter perguntado à ocupante que estava no exterior, sua mulher, se podia sair em segurança, por não circularem veículos na recta de 400 metros que os precedia na via!
20. A vítima A. C., ao sair do interior do seu veículo nos termos em que se encontram provados no n.°s 7 e 8 causou, com a sua presença na via, uma situação de perigo para a sua segurança e dos demais utentes que, de acordo com o comportamento de um condutor medianamente prudente e diligente, não eram obrigados a prever o surgimento de tão inusitado obstáculo em plena auto-estrada.
21. A vítima actuou com uma conduta estradal passível de forte censura, que deu causa ao acidente - segundo critérios plasmados, a título exemplificativo, no Acórdão do STJ de 17-10-2019, Proc. 15385/15.6T8LRS.L1.S1 e Acórdão da Relação de Évora, de 2302-2017. Proc. 3088/12.8TBLLE.E1 - por ter adoptado, de forma livre e voluntária. um comportamento com o qual violou o dever de cuidado previsto no art.°3°, n.°2 do C. Estrada.
22. A desconsideração da vítima A. C. pelas regras de circulação rodoviária, é também patente em outros factos, como o de circular com o LC sem seguro obrigatório e sem inspecção periódica - factos instrumentais sustentados pelas alíneas q) e r) do relatório final do órgão de investigação criminal e pela participação de acidente de viação a fls.18 e 20 dos autos -,
23. assim como, pelo facto de, no momento do acidente, nem ele nem a sua mulher E. F., vestirem coletes reflectores e,
24. ainda, pelo facto de nenhum deles ter de imediato colocado o triângulo de sinalização de perigo, logo após a imobilização do LC na via - factos provados n.° 33 e 34.
25. Refira-se, ainda, que, apesar de ter sido alegado pelos Intervenientes, não foi provado que o LC estivesse imobilizado na via com os “quatro-piscas” intermitentes - al.a c)dos Factos Não Provados - razão pela qual não foi produzida prova de que existisse qualquer dispositivo na via a sinalizar a imobilização do LC, em plena faixa de rodagem da A28, uma via bastante movimentada, a qualquer hora do dia – Facto Provado 32.
26. E não se diga que não se pode julgar provada a factualidade inserta nos n.°s 33 e 34 - como pretendem os Intervenientes L. N. e M. S. - com a desculpa de que O A. C. NÃO TEVE TEMPO DE VESTIR O COLETE E PORQUE, QUANDO FOI EMBATIDO, DIRIGIA-SE PARA A TRASEIRA DO LC PRECISAMENTE PARA RETIRAR E COLOCAR O TRIÂNGULO, facto que, inclusive, é uma QUESTÃO NOVA, SÓ LEVANTADA EM SEDE DE RECURSO DOS INTERVENIENTES E QUE, COMO TAL NÃO PODE SER DISCUTIDA E OBJECTO DE VALORAÇÃO DA SUA PROVA NESTA SEDE RECURSIVA!!!!
27. Era, desde logo, necessário ter ficado provado que o triângulo se encontrava na traseira do LC o que, até se pode aceitar como um facto notório ou o comportamento expectável e normal de um condutor previdente e cumpridor do mínimo das regras estradais, mas já não perante um condutor totalmente alheio a tais regras, que circula sem seguro e sem inspecção periódica, como fazia a malograda vitima!
28. Depois porque, em conformidade com a própria versão alegada e confessada do acidente pelos Intervenientes L. N. lart.°s 11° a 15° da sua P] e M. S. [que aderiu à exposição sobre o acidente da Interveniente e Autores (art.° 7° a 13° da PI)] - está provado, no facto n.°8, que o A. C. saiu do interior do LC, não para adoptar uma atitude preventiva de segurança, colocando o triângulo de pré-sinalização, mas antes para INSISTIR na atitude temerária, de empurrar o LC em plena auto-estrada, protelando o comportamento iniciado pela E. F., após a imobilização do veículo!!
29. Já ao condutor do GB não foi assinalada a infracção de qualquer regra estradal, a não ser a do art.°24° n.° 1 do Código da Estrada, por não ter adequado a velocidade do seu veículo de forma a evitar o embate no LC e depois na vítima.
30. O condutor do GB circulava na A28, onde a velocidade máxima permitida é de 120 Km/h, não tendo ocorrido qualquer circunstância que lhe impusesse o dever de reduzir a velocidade, já que era de dia; estava bom tempo e não circulavam outros veículos à sua frente e pela faixa de rodagem mais à direita.
31. E, considerando os dados disponíveis no site da Autoridade Nacional da Segurança Rodoviária - a que se aludiu em tempo, no art° 31° da nossa contestação, e não APENAS agora em sede de recurso [como faz o Recorrente M. S., juntando nesta sede documento, sem atentar ao estatuído no art.° 423° e 425° do CPC] - à velocidade de 120 Km/h [limite máximo permitido no local do acidente, embora o condutor do GB tenha afirmado que circulava a 100/110 km/h] - a distância necessária para imobilizar o veículo, em segurança, é de 110 metros.
32. Para sustentar a tese da infracção ao art.° 24° do C. Estrada pelo condutor do GB, atendendo à realidade dinâmica em que se subsume um acidente, teria sido necessário provar que o GB circulava a 400 metros, quando o veículo que circulava à sua frente se imobilizou na via, na faixa da direita, por onde ambos circulavam e ainda que, a essa distância, o condutor do GB tinha tido tempo para reduzir a velocidade e desviar-se do LC o que não se provou!
33. Pelo contrário, o que está provado nos n.°s 7 e 8 é prova mais do que concludente de que, pelo menos, no que respeita ao momento da saída da vítima do interior do LC, o GB não estava a uma distância de 400 metros quando o A. C. aparece na via e no momento em que o LC é embatido na traseira pela parte frontal do GB, seguindo-se de imediato o embate na vítima.
34. A única censura que pode ser imputada ao condutor do GB, face à factualidade provada, é a da sua falta de destreza ou perícia perante as circunstâncias anómalas e inopinada que o levou a assustar-se (nas suas próprias palavras) com a presença súbita da vítima na via e o impediu de dominar a marcha do veículo, de forma a evitar o embate, quer no veículo, quer contra o corpo do A. C..
35. A dinâmica do acidente, resultante da factualidade provada, integrada pelos critérios de que a jurisprudência se socorre para concretizar o critério geral do art.° 487° do C. Civil, impunha decisão diversa sobre a repartição da culpa na ocorrência do acidente, a atribuir em proporção sempre superior para a vítima, propondo-se a proporção de 70% para o A. C. e 30 % para o condutor do GB, seguro na Recorrente, com as devidas e legais consequências.
36. A reparação a fixar por danos não patrimoniais, deve ter em conta uma valoração casuística, de acordo com as circunstâncias concretas provadas, orientada por critérios de equidade e tendo em conta os parâmetros jurisprudenciais, geralmente adoptados para casos análogos, como decorre dos art°s 8, n° 3 e 496°, n.°4 do C. Civil, e em obediência ao Principio da Igualdade, consagrado na Constituição da República.
37. Tendo em conta os valores fixados na jurisprudência para reparação do dano não patrimonial de filhos menores, pela morte de um dos progenitores vítima de acidente [dos quais se cita a título exemplificativo o Acórdão do STJ de 10-05-2017, Proc. 131/14.0GBBAO.P1.S1: Acórdão da. Relação Évora, de 21-06-2011 Proc.192/09.3GTSTB.E1: Acórdão do STJ, de 10-05-2017, Proc.131/14.QGBBAO.P1.S1l- e tendo em conta a matéria e facto provada, a sentença recorrida deverá ser revogada nesta parte, fixando-se para reparação deste dano da Interveniente L. N. o valor de 15.000,00€ e do Interveniente M. S. o valor de 20.000,00, pelos fundamentos supra invocados e que aqui se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais.
38.É que, com relevância para apreciar esta questão, no que respeita à Interveniente L. N. importa atentar para os factos provados 37, 38 e 39, sem esquecer a factualidade que não foi provada inserta nas alíneas i, j e k dos Factos Não Provados.
39. No que respeita à relação existente entre a Interveniente L. N. e o seu pai, está provado (factos provados 37, 38 e 39) que viveu com o pai até cerca dos 2 (dois) anos, razão pela qual não se verifica qualquer erro julgamento do Tribunal recorrido ao formar a sua convicção sobre tal factualidade, a qual se sustentou na evidência da prova documental, em documentos autênticos - em particular a que atesta as datas de nascimento da L. N. (29-03-2012), de casamento do pai com a E. F. (24-11-2014) e a certidão do acordo de regulação do poder paternal da Interveniente, titulado por sentença de 05-11-2014.
40. Mas tal facto foi também confirmado pelos depoimentos das testemunhas C. C. e M. F., respectivamente, irmão e mãe da vítima, e tio e avó paternos da Interveniente, sendo esta clara ao referir que a L. N., juntamente com a sua mãe, viveu até aos 3 anos não com o pai, mas com a mãe e avó, na casa desta, uma vez que “a partir do momento em que o filho saiu de casa, deixou de falar com ele e os contactos entre ele e a neta L. N. ficaram reduzidos, quase não conviviam”, o que também resulta do depoimento da testemunha C. C.. - pág. 20 e 21 da sentença.
41. Assim concluindo, e bem, o Tribunal recorrido, sem merecer qualquer censura, que “como flui com mediana clareza dos relatos vindos a referir, à data do trágico acidente, a relação entre o falecido e a menor L. N. era inexistente ou nua, não havendo qualquer tipo de convívio e/ou união entre ambos.” - pág. 21 da sentença.
42. Perante tal factualidade, o valor de 27.500,00€ fixado para reparação dos danos não patrimoniais da menor L. N. afigura-se excessivo, por comparação com outros valores fixados pela jurisprudência, para danos da mesma natureza, razão pela qual deve ser reduzido para 15.000,00€,
43. Também o M. S. não vivia com a vítima, seu pai, resultando da análise do assento de nascimento do M. S. - fls. 156 e 157 - e dos documentos extraídos do processo de regulação das responsabilidades parentais - fls. 362 e 367 - que o M. S. nasceu em .. -12-2011 e cerca de dois meses depois, em ..-02-2012, é apresentada a acção para regulação das responsabilidades parentais, promovida pelo Ministério Público, na qual é referido que, à data, os pais já não viviam juntos e o menor vivia com a mãe.
44. No entanto, entre o M. S. e o pai, ao contrário do que acontecia coma L. N., havia algum convívio pelo que, atendendo aos mesmos critérios jurisprudenciais e os valores fixados para danos não patrimoniais em situações de maior proximidade entre a vítima e o filho, o valor de 30.000,00 deve ser reduzido, julgando-se mais justo e equitativo o valor de 20.000,00€.
45. Considerando que os danos não patrimoniais próprios da vítima correspondem à dor que esta terá sofrido antes de falecer, e devem ser valorados tendo em atenção o grau de sofrimento daquela, a sua duração, o maior ou menor grau de consciência da vítima sobre o seu estado e a previsão da sua morte - cf. Acórdão do STJ de 04-06-2008. Proc. n.° 1618/08 - não se provando a consciência da vítima sobre o seu estado e as consequências daí advindas - COMO SE PRETENDE COM A PROCEDENCIA DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO QUE VERSA O FACTO PROVADO N.° 29 - só se deverá atender à dor e sofrimentos físicos, por se tratar de facto notório e inerente à condição de ser humano.
46. Face a tal factualidade, a reparação pelos danos não patrimoniais da vítima A. C. deve ser fixada em 5.000,00€, seguindo-se de perto o critério de equidade que justificou a decisão plasmada no Acórdão da Relação do Porto, de 19-04-2016, Proc. n.° 602/13.5TBPRD.P1, sobre situação análoga.
47. A redução do valor já fixado para reparação deste dano da vítima, justifica-se, também, face aos critérios jurisprudenciais que, em situações de maior sofrimento da vítima, com um maior período entre o acidente e a morte, vivenciando até clausura hospital, foram fixados valores próximos dos 15.000,00€, aqui atribuídos à vítima que faleceu no próprio local do acidente: cfr. a título exemplificativo o Acórdão do STJ de 0311-2016, Proc. 6/15.5T8VFR.P1.S1 (que fixou em 20.000,00€ a reparação deste dano, de vítima que suportou 23 dias de clausura hospitalar, tratamentos dolorosos e perspectivou a morte, o que lhe causou angustia e medo).
48. A SENTENÇA RECORRIDA, NA PARTE POSTA EM CRISE NAS CONCLUSÕES ANTECEDENTES, NÃO FEZ A MELHOR APLICAÇÃO DO DIREITO E DOS CRITÉRIOS JURISPRUDÊNCIAS APLICÁVEIS, impondo-se decisão diversa no sentido pugnado, em cumprimento, nomeadamente, dos artigos 13° da Constituição da República, art.° 8°, n.° 3, 483°, 487°, 496°, n.° 4 e 570° do Código Civil, 3°, n.°2 e 24° do Código da Estrada.
49 A sentença recorrida, também não se pronunciou sobre a dispensa da taxa remanescente, estando a Recorrente em tempo de requerer a apreciação de tal questão nesta sede, anterior à elaboração da conta final, como tem vindo a ser entendimento da jurisprudência - por todos, Acórdão da Relação de Lisboa, de 28-03-2019, Proc.1835/16.9T8LSBLb 6L Secção.
50. Atenta a simplicidade das questões objecto da lide (ou pelo menos, não revestindo uma complexidade superior ao normal), a forma escorreita como decorreu a tramitação processual (com a produção de prova durante uma sessão de julgamento) e a postura processual das partes (que motivou um desfecho por acordo em parte significativa do objecto dos autos, relativamente á pretensão da autora E. F.) e, finalmente, às taxas de justiça pagas e suportadas na íntegra pela Recorrente, são proporcionais à natureza, complexidade e meios judiciais empregues na resolução da causa.
51. Face ao exposto e ao abrigo da parte final do art.° 6°, n.°7 do RCP, requer-se a V.Exa que a Recorrente seja dispensada do pagamento da taxa de justiça remanescente prevista na primeira parte daquele normativo.

A subsunção da factualidade provada, e a que se pretende alcançar pela impugnação da matéria de facto requerida à previsão das normas jurídicas supra elencadas, enquadradas pelos critérios jurisprudenciais de que os acórdãos citados são exemplo, justifica a procedência do presente recurso, revogando-se a sentença recorrida na parte aqui posta em crise, com a prolação de douto acórdão que atribua a culpa pela ocorrência do acidente em proporção superior para a malograda vítima mortal, sugerindo-se a proporção de 70% para o condutor do LC e 30% para o condutor do GB, veículo seguro na Recorrente, com as devidas e legais consequências, nomeadamente, no que respeita à proporção da responsabilidade da seguradora Recorrente pelo pagamento dos montantes indemnizatórios.
Sem prescindir, os valores fixados a títulos de danos não patrimoniais dos Intervenientes e da vítima deverão ser reduzidos, nos termos supra justificados

Foram proferidas contra – alegações.
Os recursos vieram a ser admitidos neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixado no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, tal como decorre das disposições legais dos artº 635º-nº3 do Código de Processo Civil, atentas as Conclusões da apelação deduzidas, e supra descritas, são as seguintes as questões a apreciar, suscitadas pelos apelantes:

Recurso de Apelação da Interveniente/Autora L. N.:
- invocada nulidade de sentença nos termos do artº 615º-nº1-alc) do CPC.
- reapreciação da matéria de facto: factos provados nº 33, 34, 38 e factos não provados als. i), j) k), l), m)
- reapreciação da decisão que fixou a repartição de culpas na produção do acidente
- do quantum indemnizatório relativo aos danos morais da menor L. N.
- Recurso de Apelação d0 Interveniente/Autor M. S.:
- invocada nulidade de sentença nos termos do artº 615º-nº1-alc) do CPC.
- reapreciação da matéria de facto: factos provados nº 33, 34.
- reapreciação da decisão que fixou a repartição de culpas na produção do acidente
- do quantum indemnizatório relativo à perda do direito à vida do sinistrado
- do quantum indemnizatório relativo aos danos morais do menor M. S.
- data do início da contagem dos juros de mora relativamente a indemnização por danos morais
-Recurso de Apelação, subordinado, da Ré seguradora:
- reapreciação da matéria de facto: facto provado nº 29
- reapreciação da decisão que fixou em 80% a culpa do condutor do veículo GB, segurado na Ré, na produção do acidente e em 20% a culpa do sinistrado, condutor do veículo LC.
- do quantum indemnizatório relativo aos danos morais do sinistrado e dos menores L. N. e M. S.
- requerida dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente- artº 6º-nº 7 do Regulamento das Custas Processuais
*
- condenação em custas - taxa de justiça remanescente- artº 6º-nº 7 do Regulamento das Custas Processuais

FUNDAMENTAÇÃO

I. Os Factos ( são os seguintes os factos declarados provados, e não provados, na decisão recorrida ):

1. No dia -/09/2016, cerca das 14h40m, na autoestrada A28, ao km 44,400, em Fonte Boa-Esposende, ocorreu um acidente de viação em que foram
intervenientes o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula LC, propriedade de M. D. e conduzido por A. C., e o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula GB, propriedade de J. E. e conduzido por L. F. (artigos 1.º da petição inicial e 3.º do articulado da interveniente L. N.).
2. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, o veículo com a matrícula LC circulava no sentido Porto/Viana do Castelo, pela metade direita da faixa de rodagem, atento o referido sentido (artigos 2.º, 3.º da petição inicial, 4.º e 5.º do articulado da interveniente L. N.).
3. Próximo do km 44,400, o veículo com a matrícula LC sofreu uma avaria, imobilizando-se na faixa de rodagem (artigos 5.º [parcial], 6.º da petição inicial, 7.º [parcial] e 8.º do articulado da interveniente L. N.).
4. Uma vez imobilizado, o veículo com a matrícula LC passou a ocupar parte da berma e, pelo menos, um metro da via mais à direita da metade direita da faixa de rodagem (artigos 7.º [parcial] da petição inicial e 9.º do articulado da interveniente L. N.).
5. Na sequência da referida avaria, E. F., mulher de A. C., que seguia, como passageira, no interior do veículo com a matrícula LC, saiu do mesmo, tentou empurrá-lo e encostá-lo mais à direita da berma (artigos 9.º da petição inicial e 12.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
6. (…) mantendo-se A. C. ao volante (artigos 10.º da petição inicial e 12.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
7. Porque E. F. não conseguiu sozinha empurra-lo, A. C. acabou por sair também do veículo, fechando a porta do condutor e dirigindo-se para a sua traseira, com o intuito de a auxiliar (artigos 11.º, 12.º [parcial], 13.º da petição inicial, 13.º, 14.º [parcial] e 15.º do articulado da interveniente L. N.).
8. Nesse momento, o veículo com a matrícula GB, que circulava pela via mais à direita da referida autoestrada A28, no sentido Porto/Viana do Castelo, embateu com a parte frontal e lateral direita frente do seu automóvel no canto e lateral esquerda traseira do veículo com a matrícula LC e no corpo de A. C., o qual se deslocava para junto da traseira do veículo com a matrícula LC, para ajudar a E. F. a encostá-lo mais à direita da berma, encontrando-se, nesse instante, a passar junto da lateral esquerda traseira do mesmo (artigos 14.º, 16.º, 17.º, 18.º, 22.º, 31.º, 33.º da petição inicial, 23.º da contestação, 16.º, 18.º, 19.º e 23.º do articulado da interveniente L. N.).
9. Nessas circunstâncias, a via da esquerda encontrava-se livre e desimpedida, sem que nela circulasse qualquer veículo (artigos 30.º, 42.º da petição inicial, 10.º e 27.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
10. Logo após o embate no veículo com a matrícula LC e no corpo de A. C., o veículo com a matrícula GB embateu com a parte lateral e frente esquerda no separador central, atravessando, de seguida, a metade direita da faixa de rodagem, imobilizando-se sobre a berma direita da faixa de rodagem a uma distância de aproximadamente 63,90m do local do embate (artigos 34.º a 37.º da petição inicial e 33.º a 35.º do articulado da interveniente L. N.).
11. Por força do embate do veículo com a matrícula GB no corpo de A. C., este foi projetado para a frente na faixa de rodagem, a uma distância de cerca de 29,90m do local do embate, vindo a imobilizar-se na berma do lado direito, junto às guardas laterais de segurança (artigos 19.º, 20.º da petição inicial, 20.º e 21.º do articulado da interveniente L. N.).
12. Também o veículo com a matrícula LC foi igualmente projetado para a frente, ficando imobilizado na berma com a parte da frente do lado esquerdo a ocupar parte da via mais à direita da metade direita da faixa de rodagem, atento o sentido Porto/Viana do Castelo (artigo 21.º da petição inicial).
13. Nas circunstâncias acima referidas em 8, o condutor do veículo com a matrícula GB seguia de forma desatenta e descuidada, sem que tivesse reduzido a velocidade imprimida ao mesmo, mantendo-se na via da direita da faixa de rodagem (artigos 23.º, 25.º da petição inicial, 24.º do articulado da interveniente L. N.).
14. O local desenha-se em reta com cerca de 400m de extensão (artigos 27.º da petição inicial e 27.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
15. Trata-se de uma faixa de rodagem em patamar, com duas vias de trânsito no mesmo sentido, marcas rodoviárias bem visíveis no pavimento e piso betuminoso em bom estado de conservação (artigo 27.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
16. As duas vias de trânsito encontram-se separadas por linha longitudinal descontínua (linha M2) (artigo 27.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
17. A faixa de rodagem naquele local, e atento o sentido Porto/Viana do Castelo, tem 7,60m de largura, situando-se a linha central que divide as duas filas de trânsito a 3,80m dos limites dos lados esquerdo e direito (artigos 41.º da petição inicial, 18.º, 19.º da contestação e 27.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
18. (…) a berma do lado direito apresentada 2,40m e a do lado esquerdo 0,90m (artigo 21.º da contestação).
19. Possui guardas metálicas no seu lado direito e separador fixo em cimento no seu lado esquerdo.
20. Possui, ainda, valeta no lado direito, com 0,60m.
21. A velocidade máxima permitida naquele local é de 120Km/h para os veículos ligeiros de passageiros e de 110km/h para os veículos ligeiros de mercadorias (artigo 29.º da contestação).
22. Nas descritas circunstâncias de tempo e lugar, era pleno dia, estava bom tempo e o referido local apresentava-se com visibilidade de, pelo menos, 400m (artigos 28.º [parcial] da petição inicial e 27.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
23. O piso estava seco (artigos 28.º [parcial] da petição inicial e 27.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
24. Em consequência do referido embate, a vítima A. C. sofreu, entre outras, as seguintes lesões:
a. abrasão dorso abdominal transversal completa de 10 cms de largura (altura) no tórax;
b. abrasão dorso abdominal transversal completa de 10 cms de largura (altura) no abdómen;
c. dismorfia craniana;
d. dismorfia do membro superior direito, por fratura do úmero;
e. duas escoriações de 4 x 3 cm e 2 x 4 cm no joelho direito;
f. escoriação de 4 x 3 cm no joelho esquerdo;
g. extensa laceração anterior e lateral bilateral no membro inferior esquerdo coincidente com a fratura descrita no hábito interno;
h. fratura vertical temporal posterior direita;
i. fratura transversal occipital;
j. fratura total no terço médio da base do crânio;
k. fratura de todos os arcos costais à anteriores à direita, com grande infiltrado sanguíneo;
l. fratura do 1º até ao 8º arcos costais posteriores à esquerda, com infiltrado sanguíneo; m. perfurações dos pulmões coincidentes com os topos das fratura costais;
n. laceração posterior do lobo direito, com grande infiltrado sanguíneo e alguns coágulos no fígado;
o. luxação de C1 com calote craniana;
p. fratura completa com desvio de D2 e entre D1 e D3, com grande infiltrado sanguíneo;
q. laceração completa das meninges, com infiltrado sanguíneo;
r. laceração completa ao nível da medula, com infiltrado sanguíneo e
s. fratura exposta do terço médio do membro inferior direito, com extensa laceração (artigos 47.º da petição inicial, 41.º e 43.º do articulado da interveniente L. N.).
25. Tais lesões foram causa direta e necessária da sua morte (artigos 48.º da petição inicial e 42.º do articulado da interveniente L. N.).
26. A. C. foi assistido, no local do acidente, pelo INEM (artigos 49.º da petição inicial e 44.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
27. (…) acabando ali por ser declarado o seu óbito, quando eram 15h02m (artigos 20.º, 50.º da petição inicial e 44.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
28. A. C. nasceu a - de dezembro de 1987 (artigos 57.º da petição inicial e 51.ºdo articulado da interveniente L. N.).
29. No período que mediou entre o embate e a morte, A. C. sentiu a iminência desta, o que lhe causou agonia, amargura e angústia (artigos 51.º [parcial], 52.º da petição inicial, 45.º e 48.º do articulado da interveniente L. N.).
30. A. C. era fisicamente bem constituído e uma pessoa com um feitio sociável, expansivo e alegre (artigos 58.º [parcial] da petição inicial e 53.º do articulado da interveniente L. N.).
31. Por contrato titulado pela apólice n.º...........350, válido e em vigor à data do acidente supra descrito, J. E., proprietário do veículo ligeiro de passageiros com a matrícula GB, transferiu para a ré COMPANHIA DE SEGUROS X SA, a responsabilidade civil obrigatória por danos emergentes da sua circulação (artigos 113.º da petição inicial, 1.º da contestação e 117.º do articulado da interveniente L. N.) – cf. documento de fls.57-82, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
32. A autoestrada A28 é uma via com tráfego automóvel intenso a qualquer hora do dia e da noite (artigo 15.º-A da contestação).
33. Nas circunstâncias acima descritas em 5, 7 e 8, nem A. C. nem E. F. traziam vestidos os coletes refletores (artigo 32.º-A da contestação).
34. (…) assim como não colocaram previamente o triângulo de pré-sinalização de perigo (artigo 33.º da contestação).
35. Através da Ap.06376, de 18/08/2008, foi registada, a favor de J. E., a propriedade do veículo com a matrícula GB, registo que se mantinha na data de 24/09/2016 (artigo 12.º da resposta ao aperfeiçoamento).
36. J. E. é padrasto de L. F. (artigo 13.º da resposta ao aperfeiçoamento).
37. A interveniente L. N. nasceu a -/03/2012 e é filha de A. C. e de C. G. (artigo 1.º do articulado da chamada L. N.).
38. A interveniente L. N. viveu com A. C. até aos seus 2 anos de idade (artigo 64.º do articulado da interveniente L. N.).
39. Por sentença proferida a 05/11/2014, devidamente transitada em julgado, nos autos de regulação do exercício das responsabilidades parentais que correu termos na Instância Central de Vila Nova de Famalicão - 4.ª Secção de Família e Menores sob o n.º4382/14.9T8VNF, foi homologado o acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais da interveniente L. N. (artigo 89.º do articulado da interveniente L. N.).
40. Nesse acordo, o falecido A. C. obrigou-se a pagar, a título de pensão de alimentos a favor da interveniente L. N., a quantia mensal de €75,00 (setenta cinco euros), até ao dia 10 de cada mês, com início no mês de novembro de 2014 (artigo 90.º do articulado da interveniente L. N.).
41. Mais ficou acordado que «o progenitor Pai comparticipará, na proporção de metade, em todas as despesas médicas e medicamentosas e as despesas com infantário, bem como todas as despesas escolares respeitantes a matrículas, livros, material escolar e visitas de estudo, no prazo de 8 dias após apresentação do respetivo comprovativo» (artigo 91.º do articulado da interveniente L. N.).
42. Ficou ainda acordado que o montante devido a título de pensão de alimento «será atualizado anualmente em janeiro, segundo a taxa de inflação publicada pelo INE, mas nunca inferior a 3%», sendo que «a primeira atualização efetuar-se-á em janeiro de 2016» (artigo 92.º do articulado da interveniente L. N.).
43. A interveniente L. N. necessita de utilizar óculos, tendo sido adquiridas, pela progenitora, em 14/09/2018, umas lentes no valor de €44,00 (quarenta quatro euros) (artigos 109.º e 111.º do articulado da interveniente L. N.).
44. O interveniente M. S. nasceu a -/12/2011 e é filho de A. C. e de J. L. (artigo 5.º do articulado do interveniente M. S.).
45. A morte de A. C. causou desgosto e abalo emocional no interveniente M. S. (artigos 9.º e 10.º do articulado do interveniente M. S.).
46. O interveniente M. S. reside com a progenitora (artigo 26.º do articulado do interveniente M. S.).
47. Por sentença proferida a 01/10/2013, devidamente transitada em julgado, nos autos de regulação do exercício das responsabilidades parentais que correu termos no extinto Tribunal de Família e Menores de Braga – 1.ª Secção sob o n.º111/12.0TMBRG, foi homologado o acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais do interveniente M. S. (artigo 27.º do articulado do interveniente M. S.).
48. Nesse acordo, o falecido A. C. obrigou-se a pagar, a título de pensão de alimentos a favor do interveniente M. S., a quantia de €100,00 (cem euros) mensais, até ao dia 08 do mês a que disser respeito, a enviar para a progenitora através de vale correio, para a residência desta, ou cheque, caso não concorde no envio por conta bancária (artigo 27.º do articulado do interveniente M. S.).
49. Mais ficou acordado que tal quantia deverá ser atualizada anualmente, com início em janeiro de 2014, atendendo ao índice de preços ao consumidor, mas em valor nunca inferior a 3%.
50. Foi ainda acordado que «o progenitor pagará igualmente metade de todas as despesas médicas, medicamentosas e escolares, devidamente comprovadas pela progenitora, através do recibo (…)».
51. A. C. e E. F. casaram entre si, no dia -/11/2014, tendo o casamento sido dissolvido por óbito de A. C..
52. L. P. nasceu a -/08/2015 e é filho de A. C. e E. F..
53. M. P. nasceu a -/04/2017 e é filho de A. C. e E. F..

FACTOS NÃO PROVADOS

a) Nas circunstâncias descritas em 2 dos “factos provados”, o veículo com a matrícula LC seguia a velocidade não superior a 90km/h (artigos 4.º da petição inicial e 6.º do articulado da interveniente L. N.).
b) Nas circunstâncias descritas em 3 dos “factos provados”, desligou-se o motor do veículo com a matrícula LC (artigos 5.º [parcial] da petição inicial e 7.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
c) Após o descrito em 3 dos “factos provados”, o condutor do veículo com a matrícula LC acionou de imediato os quatro piscas intermitentes (artigos 8.º da petição inicial e 11.º do articulado da interveniente L. N.).
d) Nas circunstâncias descritas em 7 dos “factos provados”, A. C. certificou que podia sair em segurança do interior do veículo (artigos 12.º [parcial] da petição inicial e 14.º [parcial] do articulado da interveniente L. N.).
e) Nas circunstâncias descritas em 8 dos “factos provados”, A. C., apercebendo-se da trajetória que seguia o veículo com a matrícula GB gritou à sua esposa, E. F., para fugir para a berma, para se proteger (artigos 15.º, 51.º [parcial] da petição inicial, 17.º e 47.º do articulado da interveniente L. N.).
f) Nas circunstâncias descritas em 8 dos “factos provados”, o veículo com a matrícula GB circulava com velocidade superior a 120km/h (artigos 24.º da petição inicial e 29.º do articulado da interveniente L. N.).
g) A. C. era saudável e gozava de estima de quem com ele convivia, respeitado e respeitador (artigos 58.º [parcial] da petição inicial, 52.º e 54.º do articulado da interveniente L. N.).
h) Nas circunstâncias descritas em 4 dos “factos provados”, o veículo com a matrícula LC ocupava, pelo menos, 1,25 metros da via mais à direita e estava numa posição ligeiramente obliquada para a esquerda (artigos 20.º e 27.º da contestação).
i) Entre a interveniente L. N. e A. C. havia muita união, carinho e amor (artigo 65.º do articulado da interveniente L. N.).
j) Da memória da interveniente L. N. está a esvaziar-se a imagem de A. C. (artigo 67.º do articulado da interveniente L. N.).
k) A ausência de A. C. faz com que a interveniente L. N., no meio escolar, se sinta diferente dos colegas (artigo 72.º do articulado da interveniente L. N.).
l) A. C. dedicava-se à prestação de serviços, na área da informática, designadamente reparações e assistência técnica, auferindo, em média, por mês, a quantia de €300,00 (artigo 78.º do articulado da interveniente L. N.).
m) (…) e fazia alguns trabalhos agrícolas, três vezes por semana, durante três horas, auferindo a quantia de €5,00/hora (artigos 79.º e 80.º do articulado da interveniente L. N.).
n) (…) e ao sábado, durante todo o dia, auferindo a quantia de €40,00 (artigo 81.º da interveniente L. N.).
o) O falecido A. C. gastava com ele, por mês, a quantia de €200,00 (artigo 85.º do articulado da interveniente L. N.).
p) Desde o óbito de A. C. até setembro de 2018, a progenitora da interveniente L. N. suportou, em despesas com o infantário desta, a quantia de €1.380,00 (artigos 106.º e 111.º do articulado da interveniente L. N.).
q) No ano letivo de 2018/2019, com material escolar para a interveniente L. N. a progenitora despendeu a quantia de €46,65 (artigos 107.º e 111.º do articulado da interveniente L. N.).
r) A interveniente passou a frequentar o ATL, cujo valor da mensalidade é de €38,00, suportado pela sua progenitora (artigos 108.º e 111.º do articulado da interveniente L. N.).

II. O DIREITO

1. – alegada nulidade de sentença

Invoca a apelante L. N. que é nula a sentença nos termos do disposto no art. 615º nº 1- c) do CPC, por contradição, alegando que é notória a contradição da fundamentação na sentença de que se recorre, com a decisão de repartição de culpas, ainda que, em percentagens diferentes, violando a decisão recorrida o disposto no artigo 483.° e 563.° do Código Civil, e, existe erro notório na apreciação da prova ao não censurar, em exclusivo, a conduta do condutor do veículo GB, na produção deste acidente fatal e a fundamentação está em contradição com a decisão, mais alegando que a fundamentação está em contradição com a decisão.
E, mais alega o apelante M. S. que é notória a contradição da fundamentação na sentença de que se recorre, com a decisão de repartição de culpas, e, existe erro notório na apreciação da prova, ao não censurar, em exclusivo a conduta do condutor do veículo GB, na produção deste acidente fatal e a fundamentação está em contradição com a decisão.
Nos termos do artº 615.º n.º 1 do Código de Processo Civil, é nula a sentença quando, nomeadamente, al.c) “Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”.
Os vícios previstos no citado art.º 615º do Código de Processo Civil, geradores de nulidade da sentença, são vícios de cariz adjectivo ou processual e que afectam a decisão na sua estrutura processual, invalidando-a ou tornando-a incompleta ou incompreensível, relativamente aos vícios ora apontados, “Trata-se de um mero vício formal (e não de erro de substância ou de julgamento)” - Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 23/5/2006, Proc. n.º 06A10 90, in www.dgsi.pt.
Assim, e, no tocante à oposição referida na alínea. c) do n.º1, do artigo 615º, é a que se verifica no processo lógico formal ( v. Rodrigues Bastos, in Notas ao Código de Processo Civil, 1992, art.º 668º ), refere-se á própria estrutura de elaboração da sentença, resultando de forma manifesta desta, correspondendo a frontal oposição entre a decisão e os respectivos fundamentos.“ Apenas ocorre a nulidade da sentença prevista na alínea. c) do nº1 do art.º 668º quando os fundamentos invocados pelo juiz deveriam logicamente conduzir ao resultado oposto ao que vier expresso na sentença “ – Ac. TRP, de 13/11/74, in BMJ 241/344, sendo que não determina a nulidade de sentença prevista na citada alínea, a subsunção dos factos às normas jurídicas julgadas aplicáveis, não obstante se possa vir a demonstrar verificar-se existir erro de julgamento em caso de errada aplicação legal (v. Ac, Tribunal da Relação de Coimbra, de 8/4/2003, n.º convencional JTRC 01959, in www.dgsi.pt), “Trata-se de um mero vício formal (e não de erro de substância ou de julgamento)” - Ac. do Supremo Tribunal de Justiça , de 23- -05-2006, Proc. n.º 06A10 90, in www.dgsi.pt..

No caso em apreço a indicada causa de nulidade não ocorre, sendo a sentença clara e precisa nos seus termos, reportando-se os apelantes não a vício formal mas a vício de julgamento, a conhecer oportunamente.
Improcedendo, assim, nesta parte, os fundamentos das apelações.

2. - Reapreciação da matéria de facto

Nos termos do disposto no artº 662º-nº1 do Código de Processo Civil “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.

Ainda, nos termos do artº 640º -nº1 do Código de processo Civil “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, dever ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.

Impugna a apelante L. N. a matéria de facto alegando que considera que foram incorrectamente julgados os factos declarados provados nº 33, 34, 38 e os factos não provados als. i), j) k), l), m); o apelante M. S. impugna a factualidade dos factos provados nº 33 e 34, e, a apelante Ré seguradora a matéria de facto do ponto nº29 dos factos provados.
Relativamente aos factos não provados als.l) e m) a apelante L. N. impugna os pontos de facto em referência mas com referência ao teor dos factos não provados das als. j) e K), cfr., nomeadamente, Cls.IV, consequentemente, nada havendo a decidir ou reapreciar quanto aos mesmos.
Relativamente aos factos provados nº 33 e 34 os apelantes L. N. e M. S. pedem se declarem não provados declarando, porém!, que tal factualidade se encontra provada- V. cfr., nomeadamente, Cls. XIV e XVII da apelação de autora L. N.: “-Assim, dúvidas não restam que, o falecido A. C. se dirigia para a traseira do seu veículo para recolher da bagageira a sinalização de perigo - triângulo e colete refletor, infelizmente, não teve tempo para o fazer”; “-Assim, nunca poderia ter sido dado como provado que "... não colocaram previamente o triângulo de pré-sinalização de perigo”, uma vez que, a pré-sinalização no caso em apreço foi humanamente impossível de ser realizada”, e, nomeadamente, Cls.VII e X da apelação do autor M. S.: “Assim, dúvidas não restam que, o falecido A. C. se dirigia para a traseira do seu veículo para recolher da bagageira a sinalização de perigo - triângulo e colete refletor, que infelizmente, não teve tempo para o fazer”; “Assim, nunca poderia ter sido dado como provado que não colocaram previamente o triângulo de pré-sinalização de perigo”, uma vez que, a pré- sinalização no caso em apreço foi humanamente impossível de ser realizada”- e, assim, ainda, resultando expressamente confirmada pelos próprios apelantes a verificação dos factos provados em referência, resulta inócua e destituída de sentido útil a invocação da presunção de oponibilidade a terceiros da decisão penal condenatória nos termos do artigo 623.° do Código de Processo Civil, e, a invocada necessidade de ordenar a prestação de depoimento da autora E. F., com vista a provar o que está provado(?).
Impugna a apelante L. N. a matéria de facto do facto provado nº 38, com o seguinte teor: “ 38. A interveniente L. N. viveu com A. C. até aos seus 2 anos de idade”, pretendendo passe a constar que: “A interveniente L. N. viveu com A. C. até aos seus 3 anos de idade” e invocando o depoimento da mãe do falecido, M. F., prestado a 20/09/2019, alegando constar do seu depoimento no suporte digital "00:00:01 a 00:33:04", em relação a tal facto, que quando o seu filho saiu de sua casa a L. N. já tinha 3 anos.

Relativamente a este ponto de facto reitera-se a fundamentação da Mª julgadora, por clara evidência dos seus termos, designadamente: “M. F. afirmou que o filho, conjuntamente com a mãe da L. N. e esta, viveram consigo até cerca dos 3 anos da L. N.. Após a saída do filho, que saiu de casa para ir viver com a E. F., a mãe da L. N. e esta continuaram a residir na sua casa até aos 5 anos da L. N. (quando o filho faleceu, a mãe da L. N. e esta ainda residiam em sua casa). A partir do momento em que o filho saiu de casa, deixou de falar com ele e os contactos entre ele e a neta L. N. ficaram reduzidos, quase não conviviam. (…) Uma primeira conclusão é, desde já, de se retirar: tendo o falecido saído da casa da sua progenitora para residir com E. F., com quem casou a -/11/2014, e tendo a menor L. N. nascido a -/03/2012, como nos parece basilar, aquele viveu, na casa da sua progenitora, com a filha L. N., até aproximadamente aos 2 anos desta, assim se explicando a resposta restritiva dada à factualidade que consta do ponto 38 dos “factos provados”.
Mais impugnando a apelante L. N. a factualidade constante dos factos não provados als. i), j), K), a factualidade das als. i) e j) resulta desde logo infirmada face ao factualismo provado no facto provado nº 38, estando assente que a interveniente L. N. viveu com A. C. até aos seus 2 anos de idade, e, declarando as testemunhas, avó e tio paternos que desde então os contactos com o pai foram esporádicos e ocasionais, e, relativamente ao facto não provado al.k) nenhuma prova foi produzida nem especificamente indicada na apelação como fundamento de impugnação.
Termos em que se mantém a indicada factualidade no elenco dos factos não provados, não tendo sido produzida prova de especial ligação afectiva e regular convívio da menor com o pai à data do falecimento deste, nem de especial afectação da menor na escola decorrente do afastamento da figura paterna traduzida em sentimentos de diferenciação, mantendo-se o decidido, e, designadamente, considerando-se a fundamentação exposta: “… à data do acidente, o falecido A. C. não tinha qualquer tipo de afinidade e/ou ligação afetivo-emocional com a filha L. N. e vice-versa, razão pela qual a factologia inserta nas alíneas i) e j) dos “factos não provados” mereceu resposta negativa. Ainda sobre este aspeto, importa sublinhar que nenhuma prova positiva foi produzida em audiência sobre os alegados sentimentos da menor, em meio escolar, decorrentes da ausência do pai, daí a resposta negativa à materialidade vertida na alínea k) dos “factos não provados”.
Nos termos expostos improcedendo a impugnação da matéria de facto deduzida pelos apelantes L. N. e M. S..
Impugna a apelante ré seguradora o ponto de facto nº 29 dos factos provados- “ 29. No período que mediou entre o embate e a morte, A. C. sentiu a iminência desta, o que lhe causou agonia, amargura e angústia”, requerendo seja declarado não provado, alegando que não foi produzida prova testemunhal, máxime das pessoas que acompanharam e assistiram a vítima A. C. após o embate de que tenha tido, necessariamente, a consciência da morte e que, por via de tal consciência, tenha padecido de um sofrimento moral e que as manobras de reanimação executadas apontam para um estado de perda das funções vitais (como a respiratória) incompatíveis com a manutenção de um estado consciente.
Também quanto a este ponto de facto se julga improcedente a impugnação, desde logo atento o factualismo assente e constante dos factos provados nº 7, 8, 9, 10, 11, 14, 22, que descrevem a dinâmica do acidente, sendo que o sinistrado foi embatido quando se encontrava no exterior, em plena via, em local aberto e de plena visibilidade, e, nestes termos revelando a fundamentação exposta na sentença no sentido de que: “Aliás, o sofrimento moral da vítima ante a iminência da morte nos segundos/minutos pós-acidente é uma evidência – é, por si só, um facto notório”, e, mais relevando a demais fundamentação exposta, designadamente: “A prova do sofrimento moral e psicológico da vítima ante a iminência da morte – factos provados n.º29 – baseou-se, sobretudo, na espécie, natureza e gravidade das lesões sofridas, em conjugação com o que se extrai da ficha de observação médica de fls.251, donde resulta que foram realizadas manobras de Suporte Avançado de Vida (SAV) ao falecido”, e, considerando-se, ainda, que cfr. consta do auto de participação de acidente de fls.129, que o sinistrado foi assistido em cuidados de primeiros socorros prestado por dois médicos que passavam no local após o acidente.

Nos termos expostos se concluindo pela improcedência da impugnação da matéria de facto.
3.- da culpa na produção do acidente - reapreciação da decisão que fixou em 80% a culpa do condutor do veículo GB, segurado na Ré, na produção do acidente e em 20% a culpa do sinistrado, condutor do veículo LC.

Foi nos autos proferida sentença condenatória a julgar a acção parcialmente procedente, nos seguintes termos:

Pelo exposto, decide-se julgar parcialmente procedente, por provada, a presente ação e em consequência:
a) Condenar a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA a pagar à interveniente L. N., representada pela sua progenitora C. G., a quantia global de €59.073,09 (cinquenta nove mil setenta três euros e nove cêntimos), sendo:
- €38.000,00, a título de danos não patrimoniais; e
- €21.073,09, a título de danos patrimoniais sofridos.
Tudo acrescido de juros de mora, à taxa supletiva legal de 4%, contados sobre a quantia fixada a título de danos não patrimoniais desde a data da presente sentença e sobre a quantia a título de danos patrimoniais desde a citação, até efetivo e integral pagamento.
b) Condenar a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA a pagar à interveniente L. N., representada pela sua progenitora C. G., 80% de metade das despesas com a saúde e educação, por esta feitas e devidamente comprovadas, nos termos constantes no ponto 41 dos “factos provados”, até ao momento em que aquela completar 25 anos de idade.
c) Condenar a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA a pagar ao interveniente M. S., representado pela sua progenitora J. L., a quantia global de €69.137,93 (sessenta nove mil cento trinta sete euros e noventa três cêntimos), sendo:
- €40.000,00, a título de danos não patrimoniais; e
- €29.137,93, a título de danos patrimoniais sofridos.
Tudo acrescido de juros de mora, à taxa supletiva legal de 4%, contados sobre a quantia fixada a título de danos não patrimoniais desde a data da presente sentença e sobre a quantia a título de danos patrimoniais desde a citação, até efetivo e integral pagamento.
d) Condenar a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA a pagar ao interveniente M. S., representado pela sua progenitora J. L., 80% de metade das despesas com a saúde e educação, por esta feitas e devidamente comprovadas, nos termos constantes no ponto 50 dos “factos provados”, até ao momento em que aquele completar 25 anos de idade.
e) Absolver a ré COMPANHIA DE SEGUROS X, SA do demais peticionado pelos intervenientes L. N. e M. S.”.
Impugnam os apelantes a decisão recorrida na parte referente à avaliação e verificação da culpa na produção do acidente, defendendo os apelantes L. N. e M. S. a culpa exclusiva do condutor do veículo GB, segurado na ré, e, defendendo a ré seguradora a fixação de um grau de culpa na proporção de 70% para o sinistrado A. C., condutor do veículo LC, e, de 30% para o condutor do veículo GB, segurado na ré, nos termos e pelos fundamentos acima expostos.
Na sentença recorrida a Mª Juiz “a quo“ proferiu decisão condenatória nos termos acima indicados, procedendo a repartição de culpas na produção do acidente, na proporção de 20% para o sinistrado A. C. e de 80% para o condutor do veículo GB, considerando, como da sentença recorrida consta, que:
“(…) não se fez prova da exata velocidade a que circulava o veículo com a matrícula GB, no entanto, em face do que ficou provado, é certo que a velocidade a que circulava não lhe permitiu imobilizar o veículo de modo a evitar o embate, revelando, assim, que a sua condução não observava o nível de cuidado e diligência impostos pelo artigo 24.º do Cód. da Estrada.(…)in casu, não restam dúvidas de que se impunha ao condutor do veículo com a matrícula GB moderar/reduzir a velocidade, adequando-a às caraterísticas e estado da via, às condições meteorológicas e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, que lhe permitisse, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever, de modo a controlar o veículo, desviando nomeadamente para a via da esquerda, dado que a mesma se encontrava livre e desimpedida, evitando, desse modo, o embate em outros utentes/utilizadores da via, como sucedeu com a vítima A. C..(…)
No entanto, no caso dos autos, ficou ainda demonstrado que, nas referidas circunstâncias, nem A. C. nem E. F. traziam vestidos os coletes refletores, assim como não colocaram previamente o triângulo de pré-sinalização de perigo.(…)estando provado que o falecido A. C., após imobilização, por avaria, do veículo por si conduzido, em plena faixa de rodagem da autoestrada, o qual passou a ocupar a berma e, pelo menos, um metro da via mais à direita da faixa de rodagem, se encontrava fora do mesmo, junto da sua lateral esquerda traseira, sem ter cumprido as exigências legais relativas à sinalização de perigo e sem envergar o colete refletor, constitui facto ilícito na medida em que constitui infração aos comandos legais previstos nos artigos 87.º, nºs1 e 3, 88.º, n.ºs2 e 4, do Cód. da Estrada”.
Nos termos expostos, baseando-se a decisão na violação por cada um dos condutores de normas estradais, designadamente, imputando ao condutor do veículo GB, segurado na ré, a violação do artº 24º do Código da Estrada, e, ao sinistrado, condutor do veículo acidentado, ligeiro de mercadorias com a matrícula LC, a violação dos artigos 87º-nº1 e 3, 88º -nºs2 e 4, do citado código.

Decidindo
Com particular relevância para a apreciação da dinâmica do acidente resulta dos factos provados que:
“1. No dia -/09/2016, cerca das 14h40m, na autoestrada A28, ao km 44,400, em Fonte Boa-Esposende, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula LC, conduzido por A. C., e o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula GB, conduzido por L. F.; o veículo com a matrícula LC circulava no sentido Porto/Viana do Castelo, pela metade direita da faixa de rodagem, atento o referido sentido; Próximo do km 44,400, o veículo com a matrícula LC sofreu uma avaria, imobilizando-se na faixa de rodagem; Uma vez imobilizado, o veículo com a matrícula LC passou a ocupar parte da berma e, pelo menos, um metro da via mais à direita da metade direita da faixa de rodagem; Na sequência da referida avaria, E. F., mulher de A. C., que seguia, como passageira, no interior do veículo com a matrícula LC, saiu do mesmo, tentou empurrá-lo e encostá-lo mais à direita da berma; mantendo-se A. C. ao volante; Porque E. F. não conseguiu sozinha empurra-lo, A. C. acabou por sair também do veículo, fechando a porta do condutor e dirigindo-se para a sua traseira, com o intuito de a auxiliar; Nesse momento, o veículo com a matrícula GB, que circulava pela via mais à direita da referida autoestrada A28, no sentido Porto/Viana do Castelo, embateu com a parte frontal e lateral direita frente do seu automóvel no canto e lateral esquerda traseira do veículo com a matrícula LC e no corpo de A. C., o qual se deslocava para junto da traseira do veículo com a matrícula LC, para ajudar a E. F. a encostá-lo mais à direita da berma, encontrando-se, nesse instante, a passar junto da lateral esquerda traseira do mesmo; Nessas circunstâncias, a via da esquerda encontrava-se livre e desimpedida, sem que nela circulasse qualquer veículo; Logo após o embate no veículo com a matrícula LC e no corpo de A. C., o veículo com a matrícula GB embateu com a parte lateral e frente esquerda no separador central, atravessando, de seguida, a metade direita da faixa de rodagem, imobilizando-se sobre a berma direita da faixa de rodagem a uma distância de aproximadamente 63,90m do local do embate; Por força do embate do veículo com a matrícula GB no corpo de A. C., este foi projetado para a frente na faixa de rodagem, a uma distância de cerca de 29,90m do local do embate, vindo a imobilizar-se na berma do lado direito, junto às guardas laterais de segurança (artigos 19.º, 20.º da petição inicial, 20.º e 21.º do articulado da interveniente L. N.); Também o veículo com a matrícula LC foi igualmente projetado para a frente, ficando imobilizado na berma com a parte da frente do lado esquerdo a ocupar parte da via mais à direita da metade direita da faixa de rodagem, atento o sentido Porto/Viana do Castelo; Nas circunstâncias acima referidas em 8, o condutor do veículo com a matrícula GB seguia de forma desatenta e descuidada, sem que tivesse reduzido a velocidade imprimida ao mesmo, mantendo-se na via da direita da faixa de rodagem; O local desenha-se em reta com cerca de 400m de extensão; Trata-se de uma faixa de rodagem em patamar, com duas vias de trânsito no mesmo sentido, marcas rodoviárias bem visíveis no pavimento e piso betuminoso em bom estado de conservação; As duas vias de trânsito encontram-se separadas por linha longitudinal descontínua; A faixa de rodagem naquele local, e atento o sentido Porto/Viana do Castelo, tem 7,60m de largura, situando-se a linha central que divide as duas filas de trânsito a 3,80m dos limites dos lados esquerdo e direito; a berma do lado direito apresentada 2,40m e a do lado esquerdo 0,90m; Possui guardas metálicas no seu lado direito e separador fixo em cimento no seu lado esquerdo; Possui, ainda, valeta no lado direito, com 0,60m; A velocidade máxima permitida naquele local é de 120Km/h para os veículos ligeiros de passageiros e de 110km/h para os veículos ligeiros de mercadorias; Nas descritas circunstâncias de tempo e lugar, era pleno dia, estava bom tempo e o referido local apresentava-se com visibilidade de, pelo menos, 400m; O piso estava seco.” ( cfr. factos provados nº 1 a 23 ), mais resultando provado que: ”Nas circunstâncias acima descritas em 5, 7 e 8, nem A. C. nem E. F. traziam vestidos os coletes reflectores; assim como não colocaram previamente o triângulo de pré-sinalização de perigo” (factos provados nº 33 e 34), e, ainda, tendo resultado não provada factualidade invocada pelos autores de que “ Após o descrito em 3 dos “factos provados”, o condutor do veículo com a matrícula LC acionou de imediato os quatro piscas intermitentes; Nas circunstâncias descritas em 7 dos “factos provados”, A. C. certificou que podia sair em segurança do interior do veículo” ( cfr. factos não provados als. c) e d) ).
Atentos os factos apurados relativamente ao modo de verificação do acidente conclui-se que os factos apontam para a violação, pelos condutores dos veículos LC e GB , respectivamente, das disposições legais dos art.º 3º e 24º do Código da Estrada, (não se mostrando verificada a previsibilidade dos artº 87.º, nºs1 e 3, 88.º, n.ºs2 e 4, do Cód. da Estrada).
Nos termos do artigo 3º-nº 2, do Código da Estrada, é obrigação dos condutores e peões, em geral, absterem-se de actos que impeçam ou embaracem o trânsito ou comprometam a segurança ou a comodidade dos utentes das vias, dispondo o indicado preceito legal, e com versão idêntica à data da ocorrência do sinistro: “As pessoas devem abster-se de atos que impeçam ou embaracem o trânsito ou comprometam a segurança, a visibilidade ou a comodidade dos utilizadores das vias, tendo em especial atenção os utilizadores vulneráveis”, constituindo a respectiva violação infracção sancionada com coima nos termos do nº3 do citado artigo.
E, nos termos do disposto no artigo 24º- nº 1, do Código da Estrada, na versão aplicável, “O condutor deve regular a velocidade de modo a que, atendendo à presença de outros utilizadores, em particular os vulneráveis, às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente”, igualmente, constituindo a respectiva violação infracção sancionada com coima nos termos do nº3 do citado preceito legal.
“A regra de que o condutor deve especialmente fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente significa dever assegurar-se, no exercício da condução automóvel, de que a distância entre ele e qualquer obstáculo visível é suficiente para, em caso de necessidade, o fazer parar, rege especialmente para o caso de os condutores circularem com veículos automóveis à sua vanguarda e pressupõe a não verificação de condições anormais ou obstáculos inesperados, não lhe sendo exigível que contem com eles, sobretudo os derivados da imprevidência alheia.
O dever geral de regulação da velocidade dos veículos automóveis em conformidade com as respectivas características, estado da via, condições meteorológicas ou ambientais, intensidade do trânsito e outras circunstâncias relevantes, é um corolário do dever objectivo de cuidado, com base na ideia de que a acção ou a omissão inadequada do agente implica o aumento da probabilidade do dano, naturalmente para além do risco permitido em função das exigências da vida em sociedade.” – cfr. Ac. Supremo Tribunal de Justiça, supra citado.

No caso em apreço, sendo indiscutível a culpa do condutor do veículo com a matrícula GB, segurado na ré, na produção do acidente, face aos factos provados, demonstrando-se actuação culposa e causal e ilícita, por violadora das normas estradais, concretamente do artº 24º do Código da Estrada, tal culpa na produção do acidente não é, porém, exclusiva, como pretendem os apelantes L. N. e M. S., pois que se demonstra também actuação ilícita do condutor sinistrado, por infracção da norma estratal imposta pelo artigo 3º-nº 2 do Código da Estrada, por violação das regras de segurança, traduzida no facto de ter saído do veículo sem as devidas precauções, o que se demonstra pela verificação de ter ocorrido o embate quando tendo saído do veículo se dirigia para as traseiras do mesmo, do que se conclui, consequentemente, que o sinistrado, não tomou as diligências necessárias a aperceber-se da presença na via rápida, e em circulação, do veículo GB, ou, tendo-se apercebido negligenciou tal facto e cuidados inerentes, não tendo adoptado as medidas de segurança e atenção adequadas, nomeadamente, ainda, não se demonstrando, sequer, que tenha accionado os quatro piscas intermitentes como medida imediata de segurança ao imobilizar o veículo na via, particularmente tendo em atenção as características da via e intenso tráfego e perigosidade e exigências de medidas de segurança, presumindo-se a sua culpa decorrente da infracção às regras do Código da Estrada.
Com efeito, e como se refere no Ac. STJ de de 8/9/2011, proc. nº 2336/04.2TVLSB.Ll.S, in www.dgsi.pt: "2.Tem sido predominantemente entendido, na doutrina e na jurisprudência que a prova de inobservância de leis ou regulamentos faz presumir culpa na produção dos danos dela decorrentes, dispensando a correcta comprovação de falta de diligência. 3. Porque se trata de normas legais de protecção de perigo abstracto, a conduta infractora que as infringe, traduzindo a inexistência do necessário cuidado exterior, só não responsabilizará o agente se este demonstrar ter tido o necessário cuidado interior. 4. Assim, em matéria de responsabilidade civil resultante de acidente de viação existe uma presunção "iuris tantum”, por negligência, contra o autor de uma contra-ordenação", nestas circunstâncias, e como refere o Ac. STJ de de 28.11.2013, proc. nº 372/07.6TBSTR.S1, in www.dgsi.pt: “se presumindo a culpa do contraventor se não forem por ele demonstradas circunstâncias excepcionais excludentes do juízo de imputação subjectiva”.
Assim, e se bem que se considere que dos factos não resulta a violação dos artº 87º, nº1 e 3, 88º, nº 2 e 4, do Código da Estrada, nesta parte nos afastando da fundamentação expressa na sentença, e, valorando os fundamentos da apelação dos Intervenientes/autores L. N. e M. S., pois que não se demonstra a efectiva possibilidade de, ao momento do acidente, o sinistrado ter já alcançado o colete reflector, bem como a passageira E. F., e, do mesmo modo, de ter alcançado e colocado o triângulo de pré-sinalização de perigo, que poderiam, eventualmente, encontrar-se no porta-bagagem, o certo é que estava também este condutor obrigado a um especial dever de cuidado, impondo-se que antes de sair do veículo se certificasse que o podia fazer em segurança e sem causar acidentes, ou ser embatido, o que se mostra não ter ocorrido conforme decorre dos factos provados, nesta medida, igualmente, se revelando a sua conduta causal relativamente à produção do acidente, “(…) o facto que actuou como condição do dano só deixará de ser considerado como causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo em todo indiferente (…) para a verificação do dano” (Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 8ª edição, pág. 917 e, em sentido idêntico, Almeida Costa, Direito das Obrigações, 10ª edição, págs. 763-764), cfr. vem citado no Ac. STJ de 11/4/2019, in www.dgsi.pt, mais se referindo, no indicado aresto, e citando Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. I, 13ª edição, pág. 313 e Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, VIII, 2016, pág. 550: “Doutrina mais recente, já representada entre nós, vem invocando nesta matéria a teoria do escopo da norma violada, segundo a qual “(…) para o estabelecimento do nexo de causalidade é apenas necessário averiguar se os danos que resultaram do facto correspondem à frustração das utilidades que a norma visava conferir ao sujeito através do direito subjectivo ou da norma de protecção (…)”, o que “(…) acaba por se reconduzir a um problema de interpretação do conteúdo e fim específico da norma que serviu de base à imputação dos danos”.
Nestes termos se concluindo resultar provada a actuação ilícita e transgressora de ambos os condutores, tendo ambos violado normas reguladoras do trânsito de veículos automóveis nas vias públicas constantes do Código da Estrada, mais resultando dos factos provados ter a conduta transgressional de ambos os condutores sido causal para a produção do acidente, sendo as suas culpas concorrentes, nos termos do n.º1 do art.º 570º do Código Civil.
Nestes termos se mantendo o decidido, embora por fundamentos de direito não inteiramente coincidentes no tocante à verificação da ilicitude e culpa do sinistrado, e, nenhuma censura havendo a fazer relativamente ao grau de repartição de culpa, fixado na proporção de 20% para o condutor sinistrado e 80% para o condutor do veículo seguro na ré.
Provando os Intervenientes/autores a culpa do condutor do veículo segurado na Ré na produção do acidente, por facto voluntário e ilícito, incorre a Ré na obrigação de indemnizar os Autores, na indicada proporção, pelo valor dos danos causados, nos termos dos art.º 483º, 487º, 496º, 562º, 566º e 570º, todos do Código Civil.
Como referem P.Lima e A.Varela, in Código Civil, anotado, pg. 444, “A responsabilidade extracontratual compreende: a) a responsabilidade por factos ilícitos (art.º 483º e sgs.); a responsabilidade pelo risco (art.º 499º e sgs.) e a responsabilidade por factos lícitos.
A simples leitura do art.º 483º mostra que vários pressupostos condicionam, no caso da responsabilidade por factos ilícitos, a obrigação de indemnizar imposta ao lesante, cabendo a cada um desses pressupostos um papel especial na complexa disciplina das situações geradoras do dever de reparação do dano.
É necessário, desde logo, que haja um facto voluntário do agente; que esse facto do agente seja ilícito por violar direitos alheios ou disposição legal destinada a proteger esses direitos; que haja um nexo de imputação desse facto voluntário e ilícito ao agente em termos de dolo ou mera culpa; que dessa violação decorrente de actuação voluntária, ilícita, culposa, decorram danos para terceiros e que se demonstre existir um nexo de causalidade adequada entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima, de forma a poder concluir-se que o dano é resultante da violação.
Na falta de outro critério legal, a culpa é apreciada pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso (artigo 487º, nº 2, do Código Civil).
O critério legal de apreciação da culpa é, pois, abstracto, ou seja, aproximando a referida norma do caso concreto, tendo em conta as concretas circunstâncias da dinâmica do acidente de viação em causa por referência a um condutor normal, em termos de se determinar se nas mesmas circunstâncias ele teria agido da mesma ou de diferente forma. “- Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 19/3/2009, in www.dgsi.pt.
No caso, o ónus de prova dos factos integrantes da alegada culpa do condutor do veículo segurado na Ré, a título de responsabilidade civil extracontratual pelos danos decorrentes do acidente dos autos, cabe aos Autores/ apelantes, nos termos dos artigos 342º- n.º 1 e 487º - n.º 1, do Código Civil, pois que é a parte demandante, que peticiona o seu direito de crédito indemnizatório.
Ainda, invocando os apelantes L. N. e M. S. os efeitos da Sentença condenatória proferida no processo-crime n° 88/16.2GTVCT, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de Esposende - Juiz 1, transitada em julgado a 24/06/2019, salienta-se que os mesmos apenas se reportam ao julgamento de facto, estabelecendo o artº 623º do CPC mera presunção ilidível no que se refere à existência dos factos que integram os pressupostos da punição e os elementos do tipo legal, bem como os que respeitam às formas do crime, nenhuns efeitos legais produzindo ao nível da apreciação e graduação da culpa no acidente, em acção cível de indemnização por responsabilidade extracontratual por facto ilícito.
Nos termos expostos se julgando improcedentes, quanto a esta questão, os fundamentos das apelações.

4- do quantum indemnizatório relativo à perda do direito à vida do sinistrado
Relativamente à fixação do quantum indemnizatório relativo à perda do direito à vida do sinistrado decidiu-se na sentença recorrida fixar tal valor em € 85.000,00, considerando-se, em conclusão: “(…) em especial, a juventude da vítima à data do acidente e o futuro que tinha à sua frente [cfr. factos provados n.ºs28, 30, 37, 44 e 51 a 53], considera-se justo e adequado fixar em €85.000,00 (oitenta cinco mil euros), o valor da compensação pela perda da vida da vítima direta (…)”.
Reclama o apelante M. S. a fixação do indicado montante no valor de € 100.000,00, alegando ser o valor equitativo.
Relativamente ao valor da indemnização, a mesma “ (…) é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor”, e “ Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados“ ( art.º 566º-n.º 1 e 3 do Código Civil ).
É entendimento unânime na doutrina e jurisprudência que a fixação equitativa dos danos morais, e máxime do dano por perda do direito à vida, não corresponde a juízos de mera discricionariedade do julgador, devendo este seguir-se por critérios de uniformidade existentes e orientadores.
Como se refere no Supremo Tribunal de 28/01/2016 (proc. n° 7793/09.8T2SNT.L1.S1), in www.dgsi.pt:“- A compensação dos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (art. 496°, n° 1, do CC), não pode - por definição - ser feita através da fórmula da diferença. Deve antes ser decidida pelo tribunal segundo um juízo de equidade (art. 496°, n° 4, primeira parte, do CC), tendo em conta as circunstâncias previstas na parte final do art. 494°, do CC;
(…) – “ O dano da morte é o prejuízo supremo, é a lesão de um bem superior a todos os outros. Quanto ao dano morte, como referia o Acórdão deste Supremo de 27-09-2007, in www.dgsi.pt, sabe-se que a vida é o bem mais precioso da pessoa que ele não tem preço, porque é a medida de todos os preços, e que a sua perda arrasta consigo a eliminação de todos os outros bens de personalidade. À míngua de outro critério legal, na determinação do concernente quantum compensatório importa ter em linha de conta, por um lado, a própria vida em si, como bem supremo e base de todos os demais “ – Ac. STJ de 3/12/2014. P. 250/08.1GILRS.L1.S1, in www.dgsi.pt.
Nestes termos, e seguindo de perto os critérios de fixação de indemnização decorrentes da jurisprudência que vem sendo fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça nenhum reparo nos merece a decisão recorrida, que se reitera, sendo correspondente aos valores de indemnização que vêem sendo arbitrados na jurisprudência, para o indicado tipo de danos, por critérios de equidade, designadamente do STJ ( v. Ac. STJ citados na decisão recorrida,e, nomeadamente, critérios em referência no recente Ac. STJ de 13/5/2021, P.10157/16.3T8LRS.L1.S1, in www.dgsi.pt).
Nos termos expostos, nesta parte improcedendo os fundamentos da apelação.
5 - do quantum indemnizatório relativo aos danos morais da menor L. N. e M. S.
Tendo-se fixado na decisão recorrida o quantum indemnizatório relativo aos danos morais da menor L. N. no montante de € 27.500,00 e de € 30.000,00 para o interveniente M. S., reclama a apelante L. N. a fixação de tal montante na quantia de € 30.000,00 em valor igual ao fixado a seu irmão M. S., e, reclama este a fixação de tal montante na quantia de € 40.000,00, atendendo aos factos provados e “convicção exposta na sentença”, e, ainda, requer a apelante ré a redução de tais montantes para os valores de € 15.000,00 relativamente a L. N. e € 20.000,00 relativamente a M. S..
Relativamente a estas questões, mostrando-se correcta a fundamentação na sentença, encontrando-se tais montantes fixados de acordo com os valores que vêem sendo fixados na jurisprudência, designadamente do STJ, para o indicado tipo de danos, por critérios de equidade, (v. Ac. citados na sentença e, nomeadamente, recente Ac. STJ de 25/5/2021, P.4086/18.3T8FAR.E1.S1, in www.dgsi.pt), e, considerando o concreto factualismo indicado na sentença, reiteram-se os respectivos termos e o decidido, designadamente, em particular: “(…)no caso sub judicio, tais laços afetivos se mostravam mais estreitos entre o falecido e o menor M. S., cuja morte daquele lhe causou desgosto e abalo emocional, comparativamente com a menor L. N., a qual, à data da morte do pai, não tinha qualquer tipo de convívio com este. Não podemos, contudo, deixar de ponderar que o falecido viveu com a filha L. N. até aproximadamente aos dois anos de idade. (…) Desta sorte, julga-se adequada e equitativa a fixação a cada um dos intervenientes L. N. e M. S., a título de danos não patrimoniais sofridos em consequência da prematura morte do pai, da quantia de:- €27.500,00 (vinte sete mil e quinhentos euros) para a interveniente L. N.; - €30.000,00 (trinta mil euros) para o interveniente M. S.”.
Consequentemente, improcedendo os fundamentos das apelações.
6- do quantum indemnizatório relativo aos danos morais do sinistrado
E, igualmente no tocante aos danos morais do sinistrado, pretendendo a apelante ré seguradora a redução de tal valor e a fixação de tal indemnização na quantia de € 5000,00, atento o factualismo apurado, e decorrente de critérios de equidade, mostra-se a correcta a decisão recorrida, que fixou o respectivo quantum indemnizatório na quantia de € 15.000,00, fundamentando-se na decisão: “(…) A este respeito, in casu, mostra-se provado que, em decorrência do sobredito embate, o falecido A. C. foi projetado para a frente durante cerca de 29,90m, ficando prostrado na berma do lado direito, até à chegada do INEM, que lhe prestou assistência (efetuando-lhe nomeadamente manobras de suporte avançado de vida). Mais ficou demonstrado que o falecido sofreu as lesões traumáticas descritas no ponto 24 dos “factos provados” e, por essa razão, sofreu dores físicas. Está ainda assente que, no período que mediou entre o embate e a morte, o falecido sentiu a iminência da morte, o que lhe causou agonia, amargura e angústia, sabido como é, que tantas vezes acontece a morte de alguém em consequência deste tipo de embates, tendo a sua morte sido decretada no local do acidente depois da respetiva ocorrência, mais precisamente quando eram 15h02m, ou seja, 22 minutos depois da ocorrência do embate (considerando que este ocorreu pelas 14h40m). Desta sorte, sopesando todos estes aspetos que importam à determinação do quantum indemnizatório devido a título de danos não patrimoniais, e tendo presente as indemnizações mais recentes atribuídas, a este título, pelo Supremo Tribunal de Justiça, reputa-se como adequada a atribuição da quantia de €15.000,00 (quinze mil euros), para ressarcir a dor do sofrimento de A. C. com a antevisão da morte que lhe sobreveio em consequência do ajuizado acidente”, fundando-se a decisão na jurisprudência do STJ, nomeadamente, Ac.de 24/05/2007, Revista n.º1359/07 -7.ª Secção; de 22/06/2010, processo n.º3013/05.2 TBFAF.G1.S1, de 25/06/2009, Revista n.º521/09 - 2.ª Secção, in www.dgsi.pt, e, v. cfr. Ac. STJ, supra citados.
Nos termos expostos improcedendo nesta parte os fundamentos da apelação.

7 - Recurso de Apelação do Interveniente/Autor M. S.:
- data do início da contagem dos juros de mora relativamente a indemnização por danos morais
Na sentença recorrida fixaram-se os juros de mora sobre as quantias de indemnização por danos morais desde a data da sentença por aplicação do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Uniformizador de Jurisprudência, n.º 4/02, de 09/05/2002, publicado no DR – Série IA, de 27/06/2002, fundamentando-se na decisão: “(…) considerando que os montantes reconhecidos a título de danos não patrimoniais estão já atualizados à data desta sentença (o equivalente monetário de tais danos foi fixado em função do valor da moeda à data da sentença), apenas vencem juros de mora a partir da data da mesma (cfr. artigos 805.º, n.º3, 806.º, n.ºs1 e 2, 559.º, n.º1, todos do Cód. Civil)”.
É o seguinte o teor do citado acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 4/2002: “Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do art. 566 do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos art. 805, n.º 3 (interpretado restritivamente) e 806º, n.º 1 também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora e não a partir da citação”, sendo que nos termos do mesmo Acórdão não há distinção entre danos não patrimoniais e danos patrimoniais.
“O acórdão de uniformização de jurisprudência em causa veio fazer valer uma interpretação restritiva do n.º 3 do art.º 805º do Código Civil, com vista a impedir a duplicação de indemnização ao mesmo título arbitradas ou devidas, sendo que, nos termos da actual redacção da norma em causa, os juros atribuídos ao abrigo do disposto no artº 805º nº 3 Código Civil, em condenação proferida em acção de responsabilidade civil por acidente de viação, contados desde a data da citação, assumem uma função compensatória, e não já simplesmente remuneratória, a par da mesma função reparadora decorrente da actualização da indemnização à data mais recente a que o Tribunal pode atender a efectuar nos termos do artº 566º nº 2 Código Civil, sendo, ainda, que o artº 805, nº 3 do Código Civil não estabelece igualmente distinção entre a indemnização por danos patrimoniais e indemnização por danos não patrimoniais (Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 19/11/2002, in www.gde.mj.pt).
No caso sub judice verifica-se que os danos em causa, de natureza não patrimonial, foram fixados na sentença de acordo com actuais valores correspondentes a juízos de equidade, em valoração actualizada, como da sentença decorre, e assim, deverão ser contados desde a sentença, nos termos decididos e por aplicação do indicado acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 4/2002.
Improcedendo, consequentemente a apelação no tocante a esta questão.

8– Dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça
Nos termos do artº 6º-nº 7 do Regulamento das Custas Processuais, “Nas causas de valor superior a € 275000,00, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”, devendo considerar-se, por via da indicada norma, a possibilidade de ser estabelecida justa correspectividade ou proporcionalidade entre o valor da acção e complexidade do processo, ou não complexidade e a taxa de justiça devida.
“Trata-se de uma dispensa excepcional que, podendo ser oficiosamente concedida (à semelhança do que ocorre com o agravamento previsto no n.º 7 do art.º 7.º), depende sempre de avaliação pelo juiz, pelo que haverá de ter lugar aquando da fixação das custas (o que o regime que decorre do n.º 9 do art.º 14.º e n.º 2 do art.º 15.º também inculca) - (v. cfr Ac. TRL de 6/10/2015; Ac. TRP de 7/11/2013, Ac, TRC, de 29/4/2014 ).
Como se refere no Ac. STJ 28/2/2019, in www.dgsi.pt “ A decisão sobre a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça nos termos do disposto no art. 6.º, n.º 7, do RCP, deve ter lugar com a decisão que julgue a ação, incidente ou recurso e no momento em que o juiz se pronuncie quanto à condenação em custas, nos termos do disposto no art. 527.º, n.º 1, do CPC, apenas podendo ocorrer posteriormente nos casos em que seja requerida a reforma quanto a custas ou nos casos em que tenha havido recurso da decisão que condene nas custas (cf. art. 616.º do CP C), mas sempre antes da elaboração da conta”, e, ainda, referenciando o Ac.Tribunal Constitucional, acórdão de 04.10.2016, n.º 527/16: “Como vem realçado no Acórdão n.º 442/2015:
“O artigo 20.º da Constituição garante o direito de acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, impondo igualmente que esse direito se efetive – na conformação normativa pelo legislador e na concreta condução do processo pelo juiz - através de um processo equitativo (n.º 4). (...)
Trata-se, em suma, de verificar se o ónus imposto à parte – ou seja, aqui, apresentar o requerimento de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do RCP – revela adequação funcional e respeito pela regra da proporcionalidade, uma vez que resultam “[...] constitucionalmente censuráveis os obstáculos que dificultam ou prejudicam, arbitrariamente ou de modo desproporcionado, o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva [...]” (Acórdão n.º 774/2014). O requisito da adequação funcional visa, precisamente, evitar a imposição de exigências puramente formais, impostas arbitrariamente e destituídas de qualquer sentido útil e razoável (Acórdão n.º 275/1999; no mesmo sentido, v. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I – 2.ª edição, Coimbra: Coimbra Editora, 2010, pág. 440)”.
“Nas causas de valor superior a €275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.
Segundo Salvador da Costa, esta disposição legal, “visa, excepcionalmente, antes do termo da causa, atenuar a obrigação de pagamento fraccionado da taxa de justiça nas ações de maior valor.” (in As Custas Processuais, Análise e Comentário, 2017, pág. 134)
A dispensa do pagamento pode ser determinada oficiosamente pelo juiz ou a requerimento das partes” - Ac. STJ de 24/10/2019;Ac STJ 13/7/2017, entre muitos outros.
Também, como se refere no Acórdão do TRG de 19/6/2014, P. 7198/12.3TBBRG-A.G1, em igual sentido, relativamente á norma do artº 6.º, n.º7, do Regulamento de Custas Processuais (RCP) estatui que “.... Trata-se de normativo cuja ratio legis emana do Preâmbulo do próprio RCP (Dec.Lei nº 34/2008, de 26.02 e republicação através da Lei nº 7/2012, de 13.02), no qual se proclama que a reforma do regime de custas processuais “pretende instituir todo um novo sistema de concepção e funcionamento das custas processuais (…). A taxa de justiça é, agora com mais clareza, o valor que cada interveniente deve prestar, por cada processo, como contrapartida pela prestação de um serviço (sublinhado nosso).
De um modo geral, procurou também adequar-se o valor da taxa de justiça ao tipo de processo em causa e aos custos que, em concreto, cada processo acarreta para o sistema judicial, numa filosofia de justiça distributiva, à qual não deve ser imune o sistema de custas processuais (…) estabelece-se agora um sistema misto que assenta no valor da acção, até um certo limite, e na possibilidade de correcção da taxa de justiça quando se trate de processos especialmente complexos, independentemente do valor económico atribuído à causa”.
“Deve existir correspectividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais, quer de acordo com o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 2º CRP, quer ainda do direito de acesso à justiça acolhido no artigo 20º igualmente da Constituição da República Portuguesa” – Ac. TRG de 21/5/2013, P. 412/11.4TCGMR.G1.”.
E, a decisão de dispensa do remanescente da taxa de justiça devida a final poderá ser total, ou, apenas parcial, competindo ao tribunal tal fixação, segundo juízo valorativo, “iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade” (STJ 12/12/2013, P.1319/12.3TVLSB-B.L1.S1., in www.dgsi.pt )
Nos termos expostos, considerando o grau de morosidade da causa e sendo várias as apelações deduzidas, e atento o demais circunstancialismo do caso concreto, designadamente, não sendo de especial complexidade a causa, julga-se adequado reduzir a 80% o valor de remanescente da taxa de justiça, consequentemente, dispensando-se o pagamento de 20%, e relativamente a todas as partes ( artº 529º-nº1 e 2 e 530º-nº 1 e 7 do Código de Processo Civil e artº 6º-nº 7 do Regulamento das Custas Processuais ).

Conclusão ( Sumário ):

- Em matéria de responsabilidade civil resultante de acidente de viação existe uma presunção "iuris tantum” de culpa ou negligência contra o autor de uma contra-ordenação ao Código da Estrada.
- A compensação dos danos não patrimoniais, a atender nos termos do art. 496°-n°1 do Código Civil, deve ser decidida pelo tribunal segundo juízos de equidade.
- A decisão de dispensa do remanescente da taxa de justiça devida a final poderá ser total, ou, apenas parcial, competindo ao tribunal tal fixação, segundo juízo valorativo, decorrente dos princípios da proporcionalidade e da igualdade, e, efectiva correspectividade funcional.

DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedentes os recursos de apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
E decide-se reduzir a 80% o valor de remanescente da taxa de justiça, consequentemente, dispensando-se o pagamento de 20%, relativamente a todas as partes.
Custas pelos apelantes, na proporção dos respectivos decaimentos, respectivamente.
Guimarães, 23 de Junho de 2021

( Maria Luísa D. Ramos )
( Eva Almeida )
( António Beça Pereira)