Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5778/14.1T8VNF-C.G1
Relator: MARIA CRISTINA CERDEIRA
Descritores: VENDA JUDICIAL
NOTIFICAÇÃO POR VIA POSTAL
RETOMA DO CONTRATO DE MÚTUO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I) - Não tendo o executado constituído mandatário, a notificação para a venda a realizar em acção executiva, por propostas em carta fechada, é feita ao próprio executado nos termos previstos no artº. 249º, nº. 1 do NCPC.

II) - Da análise do normativo do artº. 249º, nºs 1 e 2 do NCPC resulta evidente que, no âmbito das notificações por via postal, a data que, por regra, se há-de considerar como da notificação é a que a lei presume e não a da efectiva notificação.

III) - Sendo assim, em caso de devolução da carta com a indicação “não atendeu – avisado - não reclamado”, ou de não devolução da carta, a notificação presume-se efectuada no terceiro dia posterior ao do registo, sendo que, se esse terceiro dia não coincidir com um dia útil, a notificação considera-se efectuada no primeiro dia útil seguinte.

IV) - Para que se possa ilidir a presunção estabelecida no artº. 249º, nºs 1 e 2 do NCPC, a lei exige não só a demonstração de que a notificação não foi efectuada ou que ocorreu em data posterior à presumida, mas também a demonstração de que tal ocorreu por razões que não sejam imputáveis ao notificado.

V) - Quem é parte num processo judicial e sabe que, por isso, vai receber notificações para a prática de determinados actos, deve providenciar no sentido de haver alguém disponível para receber essas notificações ou, pelo menos, para consultar regularmente a caixa de correio para se inteirar dos avisos de registos que os serviços postais ali depositem e proceder, diligentemente, ao levantamento das cartas.

VI) - Quem pelo seu desinteresse ou negligência deixar que as cartas registadas que lhe são enviadas pelos tribunais ou pelos intervenientes processuais sejam devolvidas, ou quem conscientemente ou por negligência deixar que essas cartas aguardem na estação dos Correios, durante vários dias, quando podiam ser levantadas no dia em que foi deixado o aviso na caixa do correio, ou no dia útil imediatamente a seguir, sujeita-se à consequência de se presumir notificado no terceiro dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte, quando o não seja.

VII) - De acordo com o disposto no artº. 23º-B da Lei nº. 59/2012 de 9/11, é permitido ao executado, no prazo para a oposição à execução relativa a créditos à aquisição ou construção de habitação e créditos conexos garantidos por hipoteca, ou até à venda executiva do imóvel sobre o qual incide a hipoteca do crédito à aquisição ou construção de habitação, caso não tenha havido lugar a reclamações de créditos por outros credores, que retome o contrato de crédito desde que proceda ao pagamento das prestações vencidas e não pagas, juros e despesas em que a instituição de crédito incorreu, quando as houver.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

Nos autos de execução sumária para pagamento de quantia certa em que é exequente Banco X, S.A. e executados e Maria, foi iniciada em 27/06/2016 a diligência de abertura de propostas em carta fechada para a venda da fracção autónoma designada pela letra “O”, destinada a habitação, apartamento 28, Tipo T1, no rés-do-chão, com uma arrecadação com a letra C e com a garagem na cave com o nº. 18, que faz parte do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito no Lugar (...), (...), (...), (...), freguesia de (...), concelho de Esposende, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº. .../(...), inscrito na respectiva matriz predial sob o artº. ... da União das Freguesias de Esposende, (...) e Gandra, pertencente aos executados e penhorada nos autos em 24/02/2015 (cfr. fls. 21vº a 22vº destes autos e refª. 1251970 no processo de execução disponível na plataforma Citius).

No âmbito da referida diligência, em que estiveram presentes o Agente de Execução, o executado José e o respectivo mandatário, procedeu-se à abertura das três propostas apresentadas - pela D. V., Lda., Y. – Mediação Imobiliária, Lda. e Banco X, S.A. - tendo o mandatário do executado José requerido a apreciação do requerimento por ele remetido via Citius, naquela mesma data, em que arguiu nulidades processuais, procedendo à junção do articulado e do documento apresentados, por ter verificado que os mesmos não constavam dos autos (cfr. fls. 21vº a 22vº destes autos).

No aludido requerimento enviado por via electrónica em 27/06/2016, antes do início da diligência acima referida, veio o executado José arguir nulidade por falta de notificação para a diligência de venda em dia prévio ao designado para a abertura de propostas, e invocar o facto de não ter obtido resposta do exequente ao seu pedido de retoma do crédito nos termos do artº. 23º-B da Lei nº. 59/2012 de 9/11 e ao pedido de informação sobre os valores indicados por aquele referentes a “despesas de contencioso, honorários e despesas da AE”, alegando, ainda, que na execução é peticionado um acréscimo de 4% de juros nos termos contratados, mas o que consta dos documentos juntos aos autos é um acréscimo de 2%, não estando quantificados os montantes devidos com os gastos de cobrança.

Invoca, ainda, o facto de não ter sido notificado do incidente de habilitação de cessionário apresentado por Banco X, S.A., pedindo que fosse dada sem efeito a venda agendada para 27/06/2016, a marcação de nova data para a venda e o cumprimento das formalidades legais prévias à venda (cfr. fls. 23 a 26 destes autos).

Na sequência de tal requerimento, foi proferido despacho, na referida diligência de abertura de propostas realizada em 27/06/2016, a conceder o prazo de 10 dias para o exequente se pronunciar sobre o requerimento a que o executado fez referência e que ainda não se encontrava disponível no sistema informático, bem como para o Agente de Execução se pronunciar quanto à questão da notificação, devendo juntar os comprovativos relacionados com esta questão, tendo sido designado o dia 11/07/2016 pelas 14 horas para a continuação da diligência de venda do imóvel (cfr. auto de abertura de propostas de fls. 21vº a 22vº destes autos).

O exequente pronunciou-se por requerimento de 28/06/2016, considerando que a questão da falta de notificação do executado diz apenas respeito às notificações efectuadas pela Agente de Execução, pelo que, quanto a este aspecto, aquela melhor se pronunciaria, e relativamente às restantes questões, nomeadamente no que tange às negociações efectuadas com vista à retoma do contrato e habilitação de cessionário, refere que as mesmas em nada influem na referida venda (cfr. fls. 19 e 20 destes autos).

Em 29/06/2016 veio a Agente de Execução (doravante designada por AE) dar conhecimento ao Tribunal de todas as diligências por ela efectuadas para citação e notificação do executado (e, posteriormente, também do seu mandatário), do respectivo resultado, dos contactos telefónicos tidos com o executado e dos emails trocados entre o mesmo e a AE, juntando aos autos cópia desses emails e das notificações remetidas para os diferentes domicílios, esclarecendo no final da sua informação que “apesar de todos os esforços envidados pela AE signatária no intuito de notificar o executado, este sempre se furtou a tal por todos os meios, em quaisquer dos domicílios – o da citação e o indicado pelo próprio.

Coincidência ou não, após ter sido avisado via email da data da abertura de propostas, o referido executado requereu apoio judiciário, levantou o correio que lhe era dirigido e constituiu mandatário” (cfr. fls. 27 a 39 destes autos).

Em 11/07/2016 teve lugar a continuação da diligência de venda do imóvel (constando do auto de abertura de propostas, por lapso, a data de 8/07/2016), em que estiveram presentes a AE, o executado José e respectivo mandatário e a proponente Y. – Mediação Imobiliária, Lda., na qual o mandatário do executado reiterou o pedido de adiamento da venda, alegando, em aditamento ao seu requerimento de 27/06/2016, que:

- o executado não foi notificado do requerimento/exposição da AE de 29/06/2016, necessitando de prazo para responder adequadamente a tais informações;
- de uma rápida leitura da referida exposição, pode referir não ser verdade que o executado tenha comunicado a alteração de morada e que tenha sido tentada qualquer notificação ao mesmo em finais de Maio de 2016;
- quanto à tentativa de notificação de 14/06/2016 para a morada de citação, o que sabe, é que recebeu tal ou similar notificação no dia da própria venda, desconhecendo qualquer outra tentativa de notificação;
- face à falta de impugnação pelo exequente dos factos invocados no seu requerimento apresentado antes da venda, e não constando dos autos qualquer tentativa anterior de notificação, acreditou ser-lhe possível efectuar o pagamento do valor que viesse a ser apurado e/ou indicado discriminadamente pelo exequente para retoma do crédito até efectivação da venda, tendo a expectativa que tal poderia ocorrer, pelo menos, até 10/09/2016 (cfr. auto de abertura de propostas de fls. 40 a 41vº destes autos).

Na referida diligência de 11/07/2016 foi proferido o despacho que passamos a transcrever, apenas na parte que aqui interessa:

«Foi iniciada a diligência de venda com a abertura de propostas em carta fechada no dia 27/06/2016, conforme auto de folhas 65 e ss.
No decurso de tal diligência foram apresentadas três propostas.
O executado suscitou uma nulidade com a falta da notificação para a diligência de venda.
(…)
Quanto à questão da falta de notificação do executado, o exequente pronunciou-se por requerimento de 28 de Junho, folhas 62 vº a 63, considerando que tal questão não lhe dizia respeito pela simples razão que a notificação foi feita pela Agente de Execução ficando a aguardar que a mesma se pronunciasse quanto a tal.
A Agente de Execução pronunciou-se por requerimento de 29/06/2016 que consta de folhas 64, 65 e ss.
Foi excecionalmente designada a continuação da diligência da venda para o dia de hoje a fim de permitir que a Agente de Execução se pronunciasse quanto a tal questão conforme foi expressamente determinado pelo Tribunal e ficando o executado ciente de tal determinação.
Tal informação foi prestada em 29/06/2016 tendo já decorrido o prazo de vista, razão pela qual indefere o pedido do executado para novo adiamento da diligência com esse fundamento.

A questão suscitada pelo executado tem de ser analisada à luz do art. 249º/1 CPC, uma vez que à data em que foi designada a diligência de venda não tinha constituído mandatário.

Nesse caso, as notificações são efetuadas nos termos previstos nesse normativo. A presunção que o executado teve oportunamente conhecimento da data designada para a abertura de propostas é uma presunção "iure et iure";

No entanto, o executado não logrou infirmar a presunção de que teve conhecimento da data de abertura de propostas em carta fechada.

Para tanto, basta que o tribunal pondere o procedimento descrito a folhas 64 e ss que foi comprovado pela senhora Agente de Execução. Acresce que, mesmo fazendo um paralelismo pela falta de citação, não basta que o destinatário da mesma demonstre não ter tido conhecimento do acto, é ainda necessário alegar e provar que tal falta de conhecimento não lhe é imputável.

No decurso desta diligência, não provou como lhe compete nos termos do art, 342º/1 CPC que não recebeu a carta da notificação por facto que não lhe é imputável.
Analisados os documentos da Agente de Execução, verificámos que foi o executado que lhe comunicou a alteração da residência, que a data de abertura foi comunicada para nova e antiga morada, e que, de qualquer modo, a nova morada, tem sido, como consta da procuração e do requerimento de apoio judiciário que consta dos autos.

Daí que para todos os efeitos se tenha que considerar validamente efetuada a notificação da data de abertura de propostas, improcedendo assim a irregularidade invocada pelo executado.
Uma última nota para dizer que qualquer possibilidade de acordo entre executado e exequente tem que ser apresentada até à aceitação de propostas, conforme impõe art. 806º/1/2 CPC.
Tal não sucedeu no caso dos autos, nem sequer no prazo que mediou o dia 27/06/2016 e a presente diligência.

Em face do exposto, decido aceitar a proposta apresentada pelo proponente Y. - Mediação Imobiliária, Lda.
Uma vez que o imóvel é para revenda, nos termos do disposto no Artº 7º do CIMT, dispenso o proponente do pagamento do IMT.»

Inconformado com tal despacho, o executado José dele interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]:

1 - O despacho recorrido indeferiu o pedido de adiamento da venda invocando a não notificação da mesma ao ora apelante e ao facto de o exequente não prestar as indicações necessárias à retoma do crédito nos termos do artº 23º B da Lei 59/2012, de 9/11, bem como ao facto, invocado no próprio dia do despacho, de que não fora notificado da "exposição" do agente de execução, acreditando assim que mantendo-se o invocado, a venda teria de ser adiada.
2 - Consta da acta de 11/7/2016 (por lapso datada de 8/7/2016) que o executado, em aditamento ao seu pedido de 27.6.2016, invocou que não fora notificado da exposição do Agente de Execução datada de 29.6.2016 e que, face a tal, por um lado carecia de prazo para se pronunciar sobre o mesmo e por outro, acreditou que atenta a não junção de qualquer documento no prazo fixado, a venda teria de ser adiada - expectativa que seria legítima e cujo pedido reiterou em 11.7.2016.
3 - O despacho recorrido afirma que a exposição da AE data de 29.06.2016, pelo que já teria decorrido o prazo de vista, indeferindo-se por isso o pedido de adiamento.
4 - Os prazos para a prática de acto, no caso pronunciar-se sobre a exposição da AE e os documentos juntos, conta-se da respectiva notificação e não da junção aos autos - como determina o nº 2 do artº 149º do CPC, que se mostra violado.
5 - A exposição e documentos juntos pela AE nunca foram notificados ao ora apelante, e mesmo que o tivessem sido na data da junção, 29.6.2016, o prazo supletivo de 10 dias só findaria em 14.7.2016 - e o despacho data de 11.7.2016.
6 - O Tribunal refere que a presunção de notificação é inilidível, mas não repara que tal sucede no caso de tentativa regular de notificação feita/tentada na forma legal, e não é o caso.
7 - A própria AE enviou mail ao apelante, em 20.06.2016, em que diz remeter cópia da notificação da venda e em que afirma o seguinte:
"Mais se informa V. Exª que as notificações continuam a ser enviadas para a morada de citação, uma vez que não indicou por escrito nova morada para futuras notificações."
8 - Mas o apelante foi citado por carta enviada para Rua (...) Leiria, cfr. requerimento da Agente de Execução, datado de 13.3.2015 e constante do Citus com data de 14.3.2015, com a ref. 1307202, para onde foi enviada também a notificação com a decisão de venda.
9 - Mas não foi para esta "válida" morada que foi enviada a notificação com a data da venda, pois a única missiva enviada tempestivamente, e que permitiria fazer operar a ficção legal, foi enviada em 24.5.2016 para a R. (...), em Braga, mostrando-se violado o disposto no nº 1 do artº 249º do CPC, sendo relevante o decidido pelo TRP em 8.1.2008:

3) Não tendo constituído mandatário, a notificação é feita ao próprio executado, segundo as formalidades prescritas nos arts. 255º, n.º 1, e 254º, n.º 1 do Código de Processo Civil, ou seja, através de carta registada remetida para o local da sua residência ou para o domicílio escolhido para as receber, entendendo-se como tal a morada onde foi citado, se, entretanto, outra não for indicada.
10 - Ou seja, a notificação não foi enviada para a morada que a lei indica, e que a própria Agente de Execução no dia 20.6.2016 afirma que é a morada "vigente" para notificações ao executado, até comunicação escrita que indique diversa morada.
11 - A notificação enviada para a "morada de citação", foi enviada em 20.06.2016 e foi recebida, mas no dia 27.6.2016 - o dia da venda!
12 - A venda foi realizada sem a devida notificação do executado/apelante.
13 - O apelante no seu primeiro requerimento, referiu que vinha fazendo tentativas há vários meses para que o Exequente indicasse valores em dívida e fazendo propostas e que tinha "(...) pedido expressamente para retomar o crédito nos termos do artº 23º B da Lei 59/2012, de 9/11, mas apenas foi informado de que o valor das prestações vencidas e não pagas é de 7.542,58€, ao que acresce o valor de 3.909.51€, "referente a despesas de contencioso e honorários e despesas da AE."
14 - Assim como invocou que "Apesar da insistência em obter informação sobre o discriminativo do valor que acresce, tal não foi respondido."
15 - Atenta a notificação do exequente do conteúdo deste requerimento e a não impugnação de qualquer facto no articulado de 28.6.2016, temos os factos invocados como aceites.
16 - Pelo que temos que o executado pretende a retoma do crédito nos termos que a lei lhe permite, mas para tal precisa de saber o valor a depositar, sendo que o exequente fornece indicações devidamente discriminadas sobre os valores necessários para que o executado/apelante exerça o direito que a lei lhe confere.
17 - Atenta a atitude do credor, que não indicou discriminada e comprovadamente aqueles valores, apesar de várias vezes pedidos, há mora do credor, impõe-se dar prazo ao executado para que possa "retomar o crédito" nos termos legalmente permitidos, após indicação discriminada do credor, mostrando-se violado o disposto no artº 813º do Código Civil.
18 - Constitui abuso de direito que o exequente pretenda uma venda judicial, que poderia ser impedida pelo executado, retomando o crédito, quando é o exequente que não indica reiteradamente os valores a pagar para a retoma, mostrando-se violado o disposto no artº 334º do Código Civil.

Termina entendendo que deve ser:

a) revogada a decisão recorrida e a venda realizada;
b) concedido prazo ao apelante para se pronunciar sobre a exposição e documentos juntos pelo AE em 29.6.2016;
c) concedido prazo ao executado para que retome o crédito, após indicação discriminada pelo exequente dos valores necessários;
d) ordenada a venda caso não seja retomado o crédito;
e) notificada a decisão da venda com a devida antecedência.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido por despacho de fls. 8, sendo-lhe atribuído o efeito devolutivo por despacho proferido a fls. 12.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, tendo por base as disposições conjugadas dos artºs 608º, nº. 2, 635º, nº. 4 e 639º, nº. 1 todos do Novo Código de Processo Civil [doravante NCPC], aprovado pela Lei nº. 41/2013 de 26/6.

Nos presentes autos, o objecto do recurso interposto pelo executado José, delimitado pelo teor das suas conclusões, circunscreve-se à apreciação das seguintes questões:

- Se a venda do imóvel penhorado nos autos foi realizada sem a devida notificação do executado/recorrente da data e local designados para a abertura de propostas;
- Se deve ser concedido prazo ao executado/recorrente para se pronunciar sobre a exposição e documentos juntos pela AE em 29/06/2016;
- Se deve ser concedido prazo ao executado para que possa “retomar o crédito”, após indicação discriminada pelo exequente dos valores que terá de depositar para exercer aquele direito.

Com relevância para a apreciação e decisão das questões suscitadas no presente recurso, importa ter em consideração a dinâmica processual supra referida, em sede de relatório e ainda a seguinte factualidade que resulta dos documentos constantes dos presentes autos e do processo de execução disponível na plataforma Citius:

1. O executado José foi citado pessoalmente em 9/03/2015, nos termos e para os efeitos do disposto no artº. 856º do NCPC, através de carta registada com aviso de recepção, remetida para a Rua (…) Leiria (cfr. fls. 16 a 18 destes autos).
2. Em 16/06/2015 a AE remeteu ao executado carta registada a notificá-lo para, no prazo de 10 dias, se pronunciar sobre a modalidade e valor base de venda da fracção autónoma penhorada, nos termos e para os efeitos do disposto no artº. 812º, nº. 1 do CPC (cfr. refª. 2239985 no processo de execução electrónico).
3. A referida carta foi remetida para a mesma morada onde o executado José tinha sido citado, supra indicada em 1. (cfr. refª. 2239985 no processo de execução electrónico).
4. Em 8/07/2015 a AE remeteu carta registada para a morada indicada em 1., a notificar o executado da decisão sobre a venda do imóvel penhorado, com indicação da modalidade e valor base de venda, nos termos e para os efeitos do disposto no artº. 812º, nº. 6 do CPC (cfr. fls. 38vº e 39 destes autos).
5. Em 29/01/2016 a AE enviou um email dirigido ao executado, para o endereço electrónico (...)@hotmail.com, com o seguinte teor [transcrição]:

“No seguimento do telefonema de hoje de manhã, segue em anexo, nota de liquidação de custas provisória, tendo em consideração a liquidação da dívida por € 40.000,00 nesta data, resultando custas a pagar no valor de € 2.226,26”, ao qual o executado respondeu na mesma data, agradecendo a atenção (cfr. fls. 28vº e 29 destes autos).
6. Por despacho proferido em 18/05/2016, foi designado o dia 27/06/2016 pelas 14 horas, para a abertura de propostas em carta fechada com vista à venda do imóvel penhorado, o qual foi notificado à AE em 19/05/2016 (cfr. refª. 147085388 do processo de execução electrónico).
7. Em 24/05/2016 a AE remeteu ao executado a carta registada junta a fls. 30 destes autos, notificando-o de que “foi designado o dia e hora adiante indicado para a abertura das propostas de venda dos bens penhorados:
Dia: 27 de Junho de 2016
Hora: 14h00 (catorze horas)
Local: Comarca de Braga – V.N. Famalicão – Inst. Central – 2ª S. Execução – J1”.
8. A referida carta foi remetida para a Rua (…) Braga, tendo sido devolvida à AE com a indicação “Não atendeu – Avisado - Objecto não reclamado” (cfr. fls. 30 e 31 destes autos).
9. Foi dada publicidade à determinada abertura de propostas em carta fechada, por anúncio publicado pela AE em 27/05/2016 e por edital afixado em 2/06/2016 no imóvel penhorado, sito na (...), (...), (...), R/C, freguesia de (...), concelho de Esposende, de onde constavam, além do mais, a descrição do bem a vender, a data e o local designados para a realização da diligência, a modalidade e o valor base da venda (cfr. refª. 3967926 do processo de execução electrónico).
10. Em 25/05/2016 a AE remeteu ao executado o seguinte email: “Conforme combinado telefonicamente, segue em anexo a nota discriminativa no âmbito do presente processo, bem como a respectiva guia de pagamento. Em caso de dúvida não hesite em contactar” (cfr. fls. 31vº a 33 destes autos).
11. Tal nota discriminativa indica os honorários e despesas, bem como a quantia exequenda, juros, imposto de selo e custas em dívida pelos executados (cfr. fls. 32 e vº destes autos).
12. Em 14/06/2016 a AE remeteu carta registada para a morada referida em 1., a notificar o executado da data designada para a abertura de propostas em carta fechada (27/06/2016 pelas 14 horas), a qual foi devolvida ao remetente com a indicação “Não atendeu – Avisado - Objecto não reclamado” (cfr. fls. 34 e 35 destes autos).
13. Em 20/06/2016 a AE enviou nova carta registada de notificação do executado da data agendada para a abertura de propostas, para a morada onde o mesmo foi citado, bem como um email para o endereço electrónico do executado, com cópia da notificação devolvida, e ainda com a informação de que “as notificações continuam a ser enviadas para a morada de citação, uma vez que não indicou por escrito nova morada para futuras notificações. Assim, caso pretenda receber as futuras notificações em morada diversa da citação, deverá enviar um ofício indicando a morada que pretende ser notificado” (cfr. fls. 35vº e 36 destes autos).
14. Em 21/06/2016 foi deixado aviso pelos Correios, na referida morada, da existência da carta de notificação referida em 13., a qual foi levantada pelo executado no dia 27/06/2016 pelas 12h26 (cfr. fls. 23vº a 25 destes autos).
15. Em 21/06/2016 o executado juntou aos autos cópia do requerimento de apoio judiciário apresentado na Segurança Social nessa mesma data, no qual indicou como sua morada a Rua (…) Braga (cfr. refª. 3950440 e 4176688 no processo de execução electrónico).
16. O executado constituiu mandatário nos autos, mediante procuração junta ao processo de execução em 22/06/2016, na qual consta como sua residência a Rua (…), em Braga (cfr. refª. 3961666 do processo de execução electrónico).
17. Nesse mesmo dia 22/06/2016, foi enviada por fax – que se frustou – e para o email profissional do mandatário do executado, a notificação da data agendada para a abertura de propostas (cfr. fls. 36vº a 37vº destes autos).
18. Em 23/06/2016 o mandatário do executado foi notificado, ainda, por via telemática da data da referida diligência (27/06/2016 pelas 14 horas), com cópia da notificação ao executado da decisão sobre a venda do imóvel penhorado (cfr. fls. 38 a 39 destes autos).
19. Em 28/06/2016 a AE enviou ao mandatário do executado, por via telemática, cópia do auto da diligência realizada em 27/06/2016, notificando-o novamente da data designada para a continuação da diligência de abertura de propostas (11/07/2016 pelas 14 horas) – cfr. refª. 4027396 do processo de execução electrónico.
20. Nesse mesmo dia 28/06/2016, a AE enviou ao executado, através de carta registada, cópia do auto da diligência realizada em 27/06/2016, notificando-o novamente da data designada para a continuação da diligência de abertura de propostas (11/07/2016 pelas 14 horas) – cfr. refª. 4035639 do processo de execução electrónico.
*
Apreciando e decidindo.

O executado, ora recorrente, insurge-se contra a decisão proferida na diligência de abertura de propostas realizada em 11/07/2016, que indeferiu o pedido de adiamento da venda do imóvel penhorado nos autos por ele formulado, julgou improcedente a irregularidade invocada pelo executado, por considerar validamente efectuada a notificação da data de abertura de propostas e que qualquer possibilidade de acordo entre executado e exequente tem de ser apresentada até à aceitação de propostas, o que não sucedeu “in casu”, e decidiu aceitar a proposta apresentada pela proponente Y. - Mediação Imobiliária, Lda., argumentando que:
- a exposição e documentos juntos pela AE em 29/06/2016 nunca foram notificados ao recorrente, e mesmo que o tivessem sido na data da junção, o prazo supletivo de 10 dias para se pronunciar sobre aqueles só terminaria em 14/07/2016, tendo o despacho recorrido sido proferido em 11/07/2016;
- a notificação da data da venda enviada em 24/05/2016 não o foi para a morada que a lei indica (neste caso, a morada onde o executado foi citado) e que a própria AE, no email que enviou ao executado em 20/06/2016, afirma ser a morada "vigente" para notificações ao executado, até comunicação escrita que indique diversa morada, mas sim para a Rua (...), em Braga;
- a notificação do executado enviada para a "morada de citação" foi enviada em 20/06/2016 e recebida apenas em 27/06/2016 - o dia da venda – tendo a venda sido realizada sem a devida notificação do executado/recorrente;
- o executado pretende “retomar o crédito” nos termos que a lei lhe permite, necessitando para tal de saber o valor a depositar, e não tendo o exequente indicado discriminada e comprovadamente tal valor, apesar de várias vezes solicitado, impõe-se que seja dado prazo ao executado para que possa "retomar o crédito" nos termos legalmente permitidos, após indicação discriminada do credor.

Vejamos se lhe assiste razão.

Conforme resulta dos autos, a diligência de venda da fracção autónoma penhorada neste processo foi iniciada com a abertura de propostas em carta fechada no dia 27/06/2016, tendo o executado/recorrente suscitado uma nulidade relacionada com a alegada falta de notificação para aquela diligência.

Perante tal requerimento do executado, a Mª Juíza “a quo” concedeu o prazo de 10 dias para o exequente e a AE se pronunciarem sobre o mesmo, determinando que a AE se pronunciasse sobre a questão da notificação e juntasse os comprovativos relacionados com esta questão, tendo designado logo o dia 11/07/2016 pelas 14 horas para a continuação da diligência.

Quanto à questão da falta de notificação do executado, o exequente pronunciou-se no sentido de que tal questão dizia respeito à Agente de Execução que efectuou as notificações, considerando que esta melhor esclareceria a situação.

Por sua vez, a AE pronunciou-se através da exposição datada de 29/06/2016 e junta a fls. 27 e 28 destes autos, na qual descreveu todas as diligências por ela efectuadas com vista à citação e notificação do executado (e, posteriormente, também do seu mandatário), o resultado dessas diligências, os contactos telefónicos tidos com o executado e os emails trocados entre o mesmo e a AE, juntando com a sua exposição cópia desses emails e das notificações remetidas para os diferentes domicílios, bem como dos documentos comprovativos das devoluções apontadas (cfr. fls. 28vº a 39), esclarecendo no final da sua informação que “apesar de todos os esforços envidados pela AE signatária no intuito de notificar o executado, este sempre se furtou a tal por todos os meios, em quaisquer dos domicílios – o da citação e o indicado pelo próprio - fazendo, ainda, referência ao facto do executado, após ter sido avisado via email da data da abertura de propostas, ter requerido apoio judiciário, constituído mandatário e levantado o correio que lhe era dirigido.

Refere a Mª Juíza “a quo”, na decisão recorrida, que a questão suscitada pelo executado, ora recorrente – ou seja, a venda do imóvel foi realizada sem que ele tivesse sido devida e atempadamente notificado da data designada para a abertura de propostas - tem de ser analisada à luz do artº. 249º, nº. 1 do NCPC, uma vez que à data em que foi designada a diligência de venda aquele não tinha constituído mandatário e, nesse caso, as notificações são efectuadas nos termos previstos naquele normativo.
Entendeu, ainda, o julgador que o executado não logrou infirmar a presunção de que teve oportunamente conhecimento da data de abertura de propostas em carta fechada - não bastando que o destinatário da notificação demonstre não ter tido conhecimento do acto, sendo ainda necessário alegar e provar que tal falta de conhecimento não lhe é imputável – porquanto no decurso da diligência o executado não provou, como lhe competia nos termos do artº. 342º, nº. 1 do Código Civil, que não recebeu a carta de notificação por facto que não lhe é imputável, considerando, assim, validamente efectuada a notificação da data de abertura de propostas.

Adiantamos, desde já, que esta decisão merece a nossa concordância.

Importa começar por dizer que, embora a presença do executado no acto de abertura de propostas não seja considerada por lei essencial e muito menos indispensável, a lei confere-lhe o direito de assistir e tomar posição nas decisões que devam ser proferidas sobre a venda, designadamente quando esta decorrer na modalidade de propostas em carta fechada a que alude o artº. 811º, nº. 1, al. a) do NCPC.

Neste sentido dispõe o nº. 1 do artº. 820º do NCPC que as propostas são abertas na presença do juiz, “devendo assistir à abertura o agente de execução e podendo a ela assistir o executado, o exequente, os reclamantes de créditos com garantia sobre os bens a vender e os proponentes”. De salientar que, diferentemente do que sucede em relação à presença do agente de execução, em que a lei usa a expressão “devendo assistir”, para acentuar a relevância essencial da sua presença no acto da abertura das propostas, tanto mais que lhe compete elaborar o auto de abertura e aceitação das propostas (artº. 826º do NCPC), em relação à presença do executado, do exequente, dos credores reclamantes e dos proponentes, a lei usa a expressão “podendo a ela assistir”, como se tratando de uma mera faculdade dos próprios, que a exercem ou não, sem afectação da regularidade e da normalidade do acto (cfr. acórdão da RP de 8/01/2008, proc. nº. 0726381, acessível em www.dgsi.pt).
Não restam dúvidas de que o executado tinha o direito de estar presente ao acto de abertura de propostas, como efectivamente esteve, acompanhado do seu mandatário. E, por isso, tinha que ser notificado do dia, hora e local da sua realização.

Coloca-se, pois, a questão de saber se o executado foi devida e regularmente notificado.

Conforme se alcança da factualidade descrita na decisão recorrida e que resulta dos documentos constantes dos presentes autos e do processo de execução disponível na plataforma Citius, foi designado por despacho judicial o dia 27/06/2016 pelas 14 horas, para a abertura de propostas em carta fechada com vista à venda da fracção autónoma penhorada nos autos.

Em 24/05/2016 a AE enviou uma carta registada ao executado, a notificá-lo do dia, hora e local designados para a abertura das propostas de venda do bem penhorado, tendo remetido a mesma para a Rua (…) Braga, que curiosamente é a mesma morada que consta do requerimento de apoio judiciário apresentado pelo executado na Segurança Social em 21/06/2016 e da procuração forense junta ao processo de execução em 22/06/2016 (através da qual o executado constituiu mandatário nos autos) como sendo a residência daquele, carta essa que foi devolvida à AE com a indicação “Não atendeu – Avisado - Objecto não reclamado”.

Posto isto, em 14/06/2016 a AE remeteu novamente carta registada ao executado, mas desta vez para a morada referida em 1. e que correspondia àquela em que o mesmo foi citado para a execução - Rua (…) Leiria - a notificar o executado da data designada para a abertura de propostas em carta fechada, a qual foi devolvida ao remetente com a indicação “Não atendeu – Avisado - Objecto não reclamado”.
Em 20/06/2016 a AE enviou nova carta registada de notificação do executado da data agendada para a abertura de propostas, para a morada onde o mesmo foi citado, bem como um email para o endereço electrónico do executado, com cópia da notificação devolvida, e ainda com a informação transcrita no ponto 13 da factualidade assente, tendo os serviços postais em 21/06/2016, deixado na referida morada, aviso da existência da referida carta de notificação, a qual foi levantada pelo executado apenas no dia 27/06/2016 pelas 12h26.

Considerando que, quando foi designada data para a realização da diligência de abertura de propostas em carta fechada, o executado/recorrente ainda não havia constituído mandatário nos autos (o que só veio a acontecer em 22/06/2016), a notificação do executado foi efectuada nos termos previstos no nº. 1 do artº. 249º do NCPC, segundo o qual “se a parte não tiver constituído mandatário, as notificações são feitas por carta registada, dirigida para a sua residência ou sede ou para o domicílio escolhido para o efeito de as receber, presumindo-se feita no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando o não seja”, estabelecendo o nº. 2 que “a notificação não deixa de produzir efeito pelo facto de o expediente ser devolvido, desde que a remessa tenha sido feita para a residência ou a sede da parte ou para o domicílio escolhido para o efeito de a receber; nesse caso, ou no de a carta não ter sido entregue por ausência do destinatário, juntar-se-á ao processo o sobrescrito, presumindo-se a notificação feita no dia a que se refere a parte final do número anterior”.

Neste caso, os elementos constantes dos autos revelam que a AE, a quem cabia fazer as notificações, enviou ao executado/recorrente duas cartas registadas para a morada onde tinha sido citado para esta execução, notificando-o do dia, hora e local designados para a abertura de propostas, assim cumprindo integralmente a formalidade prescrita no citado artº. 249º, nº. 1 do NCPC.

Sucede, porém, que a primeira dessas cartas (a enviada em 14/06/2016) foi devolvida à AE pelo motivo de que, primeiro, quando o carteiro se dirigiu à morada do executado para a entregar pessoalmente, ninguém atendeu; depois porque, tendo o carteiro deixado aviso na referida morada para que fosse levantar a carta nos Correios, dentro do prazo ali fixado, o executado não a foi reclamar.

Por outro lado, no que concerne à segunda notificação (a enviada em 20/06/2016) também foi deixado aviso pelo carteiro em 21/06/2016, na morada do executado, da existência dessa carta nos serviços postais, tendo o executado levantado a carta somente passados 6 dias – estranhamente no dia designado para a realização da diligência de abertura de propostas, ou seja, no dia 27/06/2016 pelas 12h26, quando a diligência estava agendada para as 14 horas.

Da análise do normativo do artº. 249º, nºs 1 e 2 do NCPC resulta evidente que, no âmbito das notificações por via postal, a data que, por regra, se há-de considerar como da notificação é a que a lei presume e não a da efectiva notificação.

Sendo assim, em caso de devolução da carta com a indicação “não atendeu – avisado - não reclamado”, ou de não devolução da carta, como sucedeu no caso em apreço, a notificação presume-se efectuada no terceiro dia posterior ao do registo, sendo que, se esse terceiro dia não coincidir com um dia útil, a notificação considera-se efectuada no primeiro dia útil seguinte.

Esta presunção pode ser ilidida pelo notificando, desde que prove que a notificação não foi efectuada, ou ocorreu em data posterior à presumida, por razões que não lhe são imputáveis.

Acolhemos aqui a posição defendida no acórdão da Relação de Lisboa de 9/06/2014, proferido no proc. nº. 2085/13.3TBBRR-A (acessível em www.dgsi.pt), que passamos a transcrever:

“A lei considerou normal, por isso presumiu, até prova em contrário, que a notificação se efectua no terceiro dia posterior ao do registo no correio, ou seja, provado o facto base da presunção, a expedição da carta sob registo no correio dirigida a determinada pessoa, fica assente o facto desconhecido de a carta lhe ter sido entregue no terceiro dia útil posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte (artigos 349º e 350º do Código Civil).
A prova em contrário visa demonstrar que a carta de notificação não foi entregue ao notificando ou o foi em dia posterior à presumida por razões que lhe não sejam imputáveis.
(…)
É ao notificando que incumbe demonstrar em juízo, com vista à determinação do início do prazo para a prática do acto processual por ele pretendido, que a notificação ocorreu em data posterior à presumida por razões que lhe não sejam imputáveis (vide Ac. do STJ, Proc. nº 07B3024, de 11-10-2007, in www.dgsi.pt).”

Perante este quadro normativo e interpretativo, no caso da carta de notificação remetida pela AE em 14/06/2016 para a morada onde o executado/recorrente foi citado, e posteriormente devolvida conforme consta do ponto 12 dos factos assentes, presume-se que a mesma foi recebida, e a notificação efectuada, em 17/06/2016, porquanto o executado não logrou demonstrar, com factos e provas concretas, como lhe competia, que o não recebimento da carta de notificação não lhe era imputável. É que, mesmo aceitando que o executado pudesse não estar em casa no momento em que ali se dirigiu o carteiro, este deixou-lhe aviso para que fosse levantar a carta nos Correios, dentro de um determinado prazo, o que o executado não fez.

Quanto à carta de notificação enviada pela AE em 20/06/2016 para a morada onde o executado foi citado, referida no ponto 13 dos factos assentes, presume-se que a mesma foi recebida em 23/06/2016.

Sucede que, como resulta da factualidade assente, tentada a entrega pessoal da carta naquela morada, a mesma não foi possível, tendo em 21/06/2016 sido deixado aviso na referida morada, para levantamento dessa carta nos Correios, acabando a mesma por ser levantada, apenas, no dia 27/06/2016 pelas 12h26.

Importa, ainda, referir que, conforme se alcança dos elementos fácticos constantes dos autos, na data em que foi enviada ao executado a segunda carta de notificação (ou seja, em 20/06/2016), a AE enviou um email para o endereço electrónico daquele, com cópia da notificação devolvida, e ainda com a informação supra transcrita no ponto 13 dos factos assentes, não olvidando, também, que foi dada publicidade à abertura das propostas em carta fechada, por anúncio publicado pela AE em 27/05/2016 e por edital afixado em 2/06/2016 no imóvel penhorado sito na (...), (...), (...), R/C, freguesia de (...), concelho de Esposende, de onde constavam, além do mais, a descrição do bem a vender, a data e o local designados para a realização da diligência, a modalidade e o valor base da venda, o que nos permite concluir que o executado teve oportunamente conhecimento da data designada para a abertura de propostas.

Tanto assim é que, por coincidência ou não, como refere a AE na sua exposição de 29/06/2016, após ter sido avisado via email da data da abertura de propostas, o executado requereu apoio judiciário, constituiu mandatário nos autos e levantou o correio que lhe era dirigido (cfr. pontos 14 a 16 dos factos assentes).

Ademais, tendo o executado constituído mandatário, no mesmo dia em que foi junta aos autos a respectiva procuração forense (ou seja, em 22/06/2016), a AE enviou por fax e para o email profissional do mandatário do executado, a notificação da data agendada para a abertura de propostas (27/06/2016 pelas 14 horas). Tendo-se frustrado a notificação por fax, em 23/06/2016 o mandatário do executado foi notificado por via telemática da data da referida diligência, com cópia da notificação ao executado da decisão sobre a venda do imóvel penhorado (cfr. pontos 17 e 18 dos factos assentes). Todas estas diligências realizadas pela AE e que se encontram documentadas nos autos, permitem-nos concluir que o mandatário do executado também teve antecipadamente conhecimento da data designada para a abertura de propostas.

Mas contra isto o que disse o executado, ora recorrente, já devidamente representado por advogado?

No requerimento em que arguiu nulidades processuais apresentado em 27/06/2016, não disse rigorosamente nada para ilidir a presunção acima referida, e no requerimento que formulou na diligência de abertura de propostas realizada em 11/07/2016, apenas invocou que “o que sabe, é que recebeu tal ou similar notificação no dia da própria venda”, desconhecendo qualquer outra tentativa de notificação, como se da parte do Tribunal, ou neste caso, da Agente de Execução, nenhuma diligência tivesse sido feita.

Assim, o executado, em vez de tentar provar que o não recebimento da primeira carta de notificação e o recebimento da segunda carta em data posterior à presumida não lhe podiam ser imputáveis, limitou-se a defender a tese de que as notificações feitas a si e ao seu mandatário da data designada para a abertura de propostas, não foram efectuadas com a devida antecedência.

Tanto quanto nos é possível perceber, quer nos requerimentos acima referidos, quer agora nas alegações de recurso, pretende o executado/recorrente socorrer-se da data em que levantou a carta de notificação que lhe foi remetida em 20/06/2016, como sendo aquela em que a notificação se deve considerar efectuada, referindo que só foi notificado no dia da venda do imóvel.

Mas, em nosso entender, sem razão.

Como vem sendo pacificamente defendido pela jurisprudência, para que se possa ilidir a presunção estabelecida no artº. 249º, nºs 1 e 2 do NCPC, a lei exige não só a demonstração de que a notificação não foi efectuada ou que ocorreu em data posterior à presumida, mas também a demonstração de que tal ocorreu por razões que não sejam imputáveis ao notificado.

Assim, se a notificação tiver ocorrido em data posterior à presumida por razões imputáveis ao notificado ou se nem sequer puder determinar-se a razão de tal ter ocorrido, deve considerar-se que a notificação se efectivou na data presumida.

No caso em apreço, tendo o executado logrado provar que a notificação ocorreu em data posterior à presumida, não conseguiu provar, a nosso ver, que tal aconteceu por razões que lhe não são imputáveis.

Com efeito, o executado sabia da pendência do processo de execução e que a fracção autónoma penhorada ia ser vendida, tanto assim é que foi notificado, por carta registada remetida para a morada onde foi citado, para se pronunciar sobre a modalidade e valor base de venda, bem como da decisão sobre a venda do imóvel, com indicação da modalidade e valor base de venda, conforme resulta dos pontos 2 a 4 da factualidade assente.

Ora, quem é parte num processo judicial e sabe que, por isso, vai receber notificações para a prática de determinados actos, deve providenciar no sentido de haver alguém disponível para receber essas notificações ou, pelo menos, para consultar regularmente a caixa de correio para se inteirar dos avisos de registos que os serviços postais ali depositem e proceder, diligentemente, ao levantamento das cartas.

Quem assim não proceder, quem pelo seu desinteresse ou negligência deixar que as cartas registadas que lhe são enviadas pelos tribunais ou pelos intervenientes processuais sejam devolvidas, ou quem conscientemente ou por negligência deixar que essas cartas aguardem na estação dos Correios, durante vários dias, quando podiam ser levantadas no dia em que foi deixado o aviso na caixa do correio, ou no dia útil imediatamente a seguir, sujeita-se à referida consequência, ou seja, a de a notificação se considerar efectuada no terceiro dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte, quando o não seja (cfr. acórdãos da RC de 24/01/2013, proc. nº. 26/12.1TTGRD-A e da RL de 31/10/2007, proc. nº. 7033/2007-4, ambos acessíveis em www.dgsi.pt).

Assim, impunha-se ao executado que estivesse minimamente atento à distribuição do correio, mais concretamente à correspondência que lhe fosse dirigida pelo Tribunal recorrido ou pela AE, preocupando-se em abrir a caixa do correio para se inteirar da correspondência que fosse ali depositada; mais se lhe impunha que, constatado o depósito de qualquer aviso postal referente a uma carta proveniente do Tribunal ou da AE, procedesse diligentemente ao respectivo levantamento.

Ora, dos autos e da factualidade assente não resulta a razão pela qual os Correios não lograram fazer a entrega ao executado da carta de notificação quando a mesma foi tentada em 21/06/2016, deixando aviso para proceder ao seu levantamento. Logo, não pode concluir-se no sentido de que a carta não foi entregue ao executado nesse dia por razões que lhe foram alheias, pois não está excluída a possibilidade daquele ter actuado de forma intencional no sentido de a entrega da carta não ser conseguida naquele dia.

Por outro lado, fica sem se perceber as razões pelas quais o executado só levantou a carta de notificação em 27/06/2016 (exactamente no dia agendado para a venda do imóvel), quando desde 21/06/2016 estava depositado na sua morada um aviso para o seu levantamento, não se excluindo a hipótese do executado ter actuado com o intuito de protelar o andamento normal do processo, mais concretamente evitar a concretização da venda do imóvel naquele dia. Por isso, não pode também concluir-se que a carta só foi entregue em 27/06/2016 e não antes por razões de todo alheias ao recorrente.

Deste modo, para além de se poder concluir que o executado/recorrente não logrou demonstrar que não teve conhecimento, em tempo oportuno, da data designada para a abertura de propostas (conclusão esta que se mostra reforçada pelo facto do executado e o seu mandatário terem estado presentes naquela diligência), também não provou que a efectiva entrega da carta de notificação que lhe foi enviada em 20/06/2016, em data posterior à decorrente da presunção legal, aconteceu por razões que não lhe são imputáveis, pelo que bem andou o Tribunal “a quo” ao considerar validamente efectuada a notificação da data de abertura de propostas.
*
Alega, ainda, o recorrente que na diligência realizada em 11/07/2016, em aditamento ao seu requerimento de 27/06/2016, invocou que não fora notificado da exposição e documentos juntos pela AE em 29/06/2016 e que carecia de prazo para se pronunciar sobre tal exposição, tendo reiterado o seu pedido de adiamento da venda do imóvel penhorado.

Insurge-se o recorrente contra a decisão sob escrutínio que indeferiu o seu pedido de novo adiamento da diligência com aquele fundamento, por já ter decorrido o prazo de vista, afirmação esta que considera descabida porquanto não houve qualquer notificação ao executado com indicação da junção daquela exposição, acrescentando que mesmo que aquela exposição e os documentos juntos pela AE em 29/06/2016 lhe tivessem sido notificados naquela data, o prazo supletivo de 10 dias para se pronunciar sobre aqueles só terminaria em 14/07/2016, tendo o despacho recorrido sido proferido em 11/07/2016.

Como bem se refere na decisão recorrida, na diligência de 27/06/2016 foi designada a continuação da abertura de propostas para o dia 11/07/2016 a fim de permitir que a AE se pronunciasse sobre a questão da falta de notificação do executado, conforme foi expressamente determinado pelo Tribunal, tendo o executado ficado ciente de tal determinação.

Como já foi referido, a AE pronunciou-se através da exposição datada de 29/06/2016 (e não requerimento, como é referido na decisão recorrida), na qual descreveu todas as diligências por ela efectuadas com vista à citação e notificação do executado (e, posteriormente, também do seu mandatário), o resultado dessas diligências, os contactos telefónicos tidos com o executado e os emails trocados entre o mesmo e a AE, juntando com a sua exposição cópia desses emails e das notificações remetidas para os diferentes domicílios, bem como dos documentos comprovativos das devoluções apontadas, em cumprimento do determinado pelo Tribunal.

Tal exposição e os documentos acima referidos foram remetidos pela AE para o processo de execução, através da plataforma Citius (refª. 4036001), podendo o mandatário do executado ter acesso à mesma e tomar conhecimento do seu conteúdo, mediante a consulta electrónica do processo.

Embora o mandatário do executado, na diligência de abertura de propostas realizada em 27/06/2016, tivesse referido que não foi notificado da exposição da AE e que carecia de prazo para responder às informações por ela prestadas, conforme se alcança da respectiva acta, o mesmo acabou por se pronunciar sobre a aludida exposição, após ter feito, como ele próprio admite, uma “leitura rápida”, pois alegou não corresponder à verdade que o executado tivesse comunicado a alteração de morada e que tivesse sido tentada qualquer notificação ao mesmo em finais de Maio de 2016, acrescentando, ainda, que no tocante à tentativa de notificação de 14/06/2016 para a morada da citação, o que sabe, é que recebeu tal ou similar notificação no dia da própria venda, desconhecendo qualquer outra tentativa de notificação, não tendo, em parte alguma daquela sua intervenção, requerido expressamente que lhe fosse concedido prazo para se pronunciar sobre as informações prestadas pela AE, tendo apenas reiterado o pedido de adiamento da venda, que já havia feito no seu requerimento apresentado em 27/06/2016.

Por outro lado, a existir, eventualmente, alguma irregularidade processual (o que, em nosso entender, não sucede), para além da mesma não ter sido invocada pelo mandatário do executado, ela estaria sanada com a resposta que apresentou na diligência de 11/07/2016 e que consta da respectiva acta junta a fls. 40 a 41vº destes autos.
*
Por último, invoca o recorrente que pretende “retomar o crédito” nos termos que a lei lhe permite, necessitando para tal de saber o valor a depositar, e não tendo o exequente indicado discriminada e comprovadamente tal valor, apesar de várias vezes solicitado, impõe-se que seja dado prazo ao executado para que possa "retomar o crédito" nos termos legalmente permitidos, após indicação discriminada pelo exequente dos valores que terá de depositar para exercer aquele direito, acrescentando que constitui abuso de direito que o exequente pretenda uma venda judicial, que poderia ser impedida pelo executado, retomando o crédito, quando é o exequente que não indica reiteradamente os valores a pagar para a retoma, mostrando-se violado o disposto no artº. 334º do Código Civil.

Sobre esta questão, alega, ainda, o recorrente que no seu requerimento de 27/06/2016 referiu que vinha fazendo tentativas há vários meses para que o exequente indicasse os valores em dívida e que tinha «(...) pedido expressamente para retomar o crédito nos termos do artº 23º B da Lei 59/2012, de 9/11, mas apenas foi informado de que o valor das prestações vencidas e não pagas é de 7.542,58€, ao que acresce o valor de 3.909.51€, "referente a despesas de contencioso e honorários e despesas da AE"», acrescentando que apesar "apesar da insistência em obter informação sobre o discriminativo do valor que acresce, tal não foi respondido", e não tendo o exequente impugnado os factos alegados naquele seu requerimento, considera os mesmos como aceites.

No que se refere à matéria alegada pelo executado no seu requerimento de 27/06/2016, relacionada com a sua pretensão de “retomar o crédito” nos termos do artº. 23º-B da Lei nº. 59/2012 de 9/11 e a sua discordância quanto ao acréscimo de juros peticionado na execução, entendemos que se trata de matéria que deveria ter sido alegada, discutida e decidida em sede de oposição à execução mediante embargos, nos termos dos artºs 728º e 731º do NCPC, e não na fase de venda judicial do imóvel penhorado, como veio a acontecer.

Conforme se alcança dos autos, o executado não deduziu oposição à execução – sendo aquele o meio processual próprio para alegar e provar os factos relacionados com a sua pretensão de “retomar o crédito” e o alegado comportamento do exequente, bem como para manifestar a sua discordância em relação ao acréscimo de juros peticionado na execução. Daí que o exequente, quando se pronunciou sobre o requerimento de 27/06/2016, apenas tenha referido que a questão das negociações efectuadas tendo em vista a retoma do contrato em nada influi na venda, não tendo impugnado os factos alegados pelo executado, certamente por tal se revelar inútil naquela fase processual.

Assim, contrariamente ao alegado pelo recorrente e pelas razões atrás explanadas, não se poderão considerar como aceites, por falta de impugnação do exequente, os factos alegados pelo executado no seu requerimento de 27/06/2016.

Mas mesmo que assim não se entendesse, afigura-se-nos que não assiste razão ao recorrente quando alega que o credor/exequente não fornece indicações devidamente discriminadas sobre os valores necessários para que o recorrente exerça o direito que a lei lhe confere de retomar o crédito.

Conforme resulta dos pontos 5, 10 e 11 dos factos assentes, em 29/01/2016 a AE enviou um email dirigido ao executado, para o endereço electrónico (...)@hotmail.com, com a nota de liquidação de custas provisória, indicando, ainda, a quantia exequenda em dívida naquela data e o valor das custas a pagar, ao qual aquele respondeu.

Em 25/05/2016 a AE remeteu ao executado um novo email em que anexava a nota discriminativa no âmbito do processo de execução e a respectiva guia de pagamento, tendo indicado nessa nota discriminativa os honorários e despesas, bem como a quantia exequenda, juros, imposto de selo e custas em dívida pelos executados, dirigindo-se no final ao executado dizendo “Em caso de dúvida não hesite em contactar”, estando todos estes factos documentados a fls. 28vº, 29 e 31vº a 33 destes autos.

Alega o executado que pretende retomar o crédito nos termos do artº. 23º-B da Lei nº. 59/2012 de 9/11.

Estabelece o citado artº. 23º-B, nº. 1, sob a epígrafe “Retoma do crédito à habitação”, o seguinte:

1 - No prazo para a oposição à execução relativa a créditos à aquisição ou construção de habitação e créditos conexos garantidos por hipoteca ou até à venda executiva do imóvel sobre o qual incide a hipoteca do crédito à aquisição ou construção de habitação, caso não tenha havido lugar a reclamações de créditos por outros credores, tem o mutuário direito à retoma do contrato, desde que se verifique o pagamento das prestações vencidas e não pagas, bem como os juros de mora e as despesas em que a instituição de crédito incorreu, quando as houver.

De acordo com o disposto no supra citado preceito legal, era permitido ao executado/recorrente, no prazo para a oposição à execução relativa ao crédito para aquisição de habitação garantido por hipoteca, ou até à venda executiva do imóvel sobre o qual incide a hipoteca do crédito para aquisição de habitação, que retomasse o contrato de crédito desde que procedesse ao pagamento das prestações vencidas e não pagas, juros e despesas em que a instituição de crédito incorreu, o que não aconteceu “in casu”, não obstante ter sido remetida ao executado, em 25/05/2016, uma nota discriminativa com indicação dos honorários e despesas, bem como da quantia exequenda, juros, imposto de selo e custas em dívida pelos executados, e a respectiva guia de pagamento.
Por outro lado, o executado/recorrente tinha, ainda, a possibilidade de acordar com o exequente o pagamento da dívida exequenda em prestações, definindo um plano de pagamentos e comunicando tal acordo à agente de execução, nos termos do artº. 806º do NCPC.

Todavia, na sequência do que é referido na decisão recorrida, a comunicação à AE de tal acordo entre executado e exequente, no caso de venda do bem penhorado mediante propostas em carta fechada, teria de ser apresentada até à aceitação das propostas, como impõe o nº. 2 daquele dispositivo legal, o que não sucedeu no caso dos autos, nem sequer no prazo que mediou entre o dia 27/06/2016 e a diligência do dia 11/07/2016.

Em face do acima exposto, entendemos que não ficou demonstrado nos autos que tenha havido abuso de direito por parte do exequente e, consequentemente, violação do disposto no artº. 334º do Código Civil, nos termos invocados pelo recorrente.

Nestes termos, improcede o recurso de apelação interposto pelo executado.
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SUMÁRIO:

I) - Não tendo o executado constituído mandatário, a notificação para a venda a realizar em acção executiva, por propostas em carta fechada, é feita ao próprio executado nos termos previstos no artº. 249º, nº. 1 do NCPC.
II) - Da análise do normativo do artº. 249º, nºs 1 e 2 do NCPC resulta evidente que, no âmbito das notificações por via postal, a data que, por regra, se há-de considerar como da notificação é a que a lei presume e não a da efectiva notificação.
III) - Sendo assim, em caso de devolução da carta com a indicação “não atendeu – avisado - não reclamado”, ou de não devolução da carta, a notificação presume-se efectuada no terceiro dia posterior ao do registo, sendo que, se esse terceiro dia não coincidir com um dia útil, a notificação considera-se efectuada no primeiro dia útil seguinte.
IV) - Para que se possa ilidir a presunção estabelecida no artº. 249º, nºs 1 e 2 do NCPC, a lei exige não só a demonstração de que a notificação não foi efectuada ou que ocorreu em data posterior à presumida, mas também a demonstração de que tal ocorreu por razões que não sejam imputáveis ao notificado.
V) - Quem é parte num processo judicial e sabe que, por isso, vai receber notificações para a prática de determinados actos, deve providenciar no sentido de haver alguém disponível para receber essas notificações ou, pelo menos, para consultar regularmente a caixa de correio para se inteirar dos avisos de registos que os serviços postais ali depositem e proceder, diligentemente, ao levantamento das cartas.
VI) - Quem pelo seu desinteresse ou negligência deixar que as cartas registadas que lhe são enviadas pelos tribunais ou pelos intervenientes processuais sejam devolvidas, ou quem conscientemente ou por negligência deixar que essas cartas aguardem na estação dos Correios, durante vários dias, quando podiam ser levantadas no dia em que foi deixado o aviso na caixa do correio, ou no dia útil imediatamente a seguir, sujeita-se à consequência de se presumir notificado no terceiro dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte, quando o não seja.
VII) - De acordo com o disposto no artº. 23º-B da Lei nº. 59/2012 de 9/11, é permitido ao executado, no prazo para a oposição à execução relativa a créditos à aquisição ou construção de habitação e créditos conexos garantidos por hipoteca, ou até à venda executiva do imóvel sobre o qual incide a hipoteca do crédito à aquisição ou construção de habitação, caso não tenha havido lugar a reclamações de créditos por outros credores, que retome o contrato de crédito desde que proceda ao pagamento das prestações vencidas e não pagas, juros e despesas em que a instituição de crédito incorreu, quando as houver.

III. DECISÃO

Em face do exposto e concluindo, acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelo executado José e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhe foi concedido.

Notifique.
Guimarães, 11 de Outubro de 2018
(processado em computador e revisto, antes de assinado, pela relatora)


(Maria Cristina Cerdeira)
(Raquel Baptista Tavares)
(Margarida Almeida Fernandes)