Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
193/11.1GAVPA-A.G1
Relator: LUÍS ANTUNES COIMBRA
Descritores: PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CÍVEL
PROCESSO CRIME
REMESSA DAS PARTES PARA OS MEIOS COMUNS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/25/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I) Da conjugação do disposto nos artºs 71º, 82º, nº 3, ambos do CPP, decorre que a regra é a de que o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é sempre deduzido no âmbito do respectivo processo em que existe acusação da prática do crime, crime esse que, por se revelar como facto danoso para o sujeito passivo do crime, constitui causa de pedir do próprio pedido.
II) Todavia, pelo facto de se verificar uma qualquer das situações a que aludem as alíneas do nº 1 do citado artº 72º, o pedido cível pode ser deduzido em separado, ou seja, num foro e no âmbito de um outro processo que não aquele onde decorre a investigação ou foi deduzida acusação pela prática de um crime.
III) E mesmo que já tenha sido deduzido no âmbito do processo-crime, permite o nº 3 do citado artº 82º que, quer a requerimento quer oficiosamente, o tribunal remeta a apreciação do pedido de indemnização civil para os tribunais civis.
IV) É o que sucede, in casu, pois que não se justificava o retardamento dos autos devido ao pedido civil em causa, nem havia fundamento legal para adiar por largos meses (ou mesmo sine die) o início de um julgamento crime por causa de um pedido de indemnização que podia ser deduzido no foro próprio (o tribunal civil).
Decisão Texto Integral:




Tribunal da Relação de Guimarães
Secção Penal
Largo João Franco – 4810-269 Guimarães
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Processo nº 193/11.1GAVPA-A.G1

Processo nº 193/11.1GAVPA-A.G1
Comarca de Viana Real
Vila Pouca de Aguiar - Instância Local – Secção de Competência Genérica – J1

Recurso em Separado


Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO
1. Nos autos de Processo Comum nº 193/11.1GAVPA, e que originaram o presente recurso em separado, por despacho judicial proferido em acta da audiência de julgamento do dia 01.10.2014 (logo após ter sido declarada aberta a audiência de julgamento) foi decidido remeter as partes para os meios comuns no que toca ao pedido de indemnização civil do assistente/demandante Manuel R. , nos termos do art. 82.º nº 3 do Código de Processo Penal.

2. Inconformado com o decidido, recorreu o referido assistente/demandante, finalizando a respectiva motivação recursiva com as seguintes conclusões (transcrição):
“1-Nos termos do disposto no artigo 71.º do C.P.P., o pedido cível deverá, em regra, ser alvo de decisão no processo onde o crime seja alvo de decisão.
2-Só em situações extremas e de existência de retardamento intolerável por incidentes que origine o pedido de indemnização cível, poderá este ser alvo de remissão para os meios cíveis comuns.
3-É certo que nos termos do disposto no artigo 82 n.º 3 do C.P.P., o tribunal pode remeter as partes para os tribunais civis quando as questões do pedido de indemnização civil inviabilizarem uma decisão rigorosa, ou forem suscetíveis de suscitar incidentes que retardem intoleravelmente o processo penal, mas esse poder não é discricionário e muito menos arbitrário.
4-Para fundamentar a Douta Decisão em crise, a Meritíssima Juiz alegou que a obtenção do relatório pericial, que considerou necessário a uma boa decisão, pode levar a solicitação de esclarecimentos, realização de uma segunda perícia, e também a pedido para comparecimento do perito em julgamento para prestar esclarecimentos adicionais.
5-Com o devido respeito, entendemos que tais elementos que tais elementos são insuficientes para fundamentar tal decisão, tanto mais que alguns deles já se encontravam nos autos, caso de exames médicos e a sua realização não seria um incidente que retardaria intoleravelmente o processo, antes constituindo a realização de um processamento normal (prova pericial) de atos necessários a uma boa decisão da causa.
6-A decisão em crise, carece de fundamentação porquanto a Meritíssima Juiz formula um juízo conclusivo não indicando motivos de facto e de direito demostrativos da existência de factos sustentadores dessa decisão, assim violando o disposto nos artigos 97, n.º 5 e 374 nº 2 do C.P.Penal.
7-O processo penal é suficiente para resolver todas as questões que interessem à decisão da causa sejam elas prejudiciais penais ou não penais e, como consequência desse princípio estipulando no artigo 7º do C.P.Penal, o artigo 71º do mesmo diploma estipula a obrigatoriedade da adesão do pedido de indemnização cível ao processo penal.
8-É essencial para determinar a medida da pena a aplicar no caso do crime de ofensa à integridade física que se conheça toda a extensão dos danos corporais e lesões causadas, pelo que a realização de uma perícia médico-legal determinativa da incapacidade parcial e permanente causada numa vítima de acidente de viação é essencial para uma boa decisão penal e, necessariamente, para determinar a indemnização cível a atribuir.
9-A realização de prova pericial através de exame médico-legal para determinar a extensão dos danos sofridos por uma vítima de acidente de viação não pode pois justificar que a sua realização constitua um incidente resultante do pedido cível e que é suscetível de retardar intoleravelmente o processo.
10-O poder conferido ao tribunal, no artigo 82º nº 3 do CPP, deve ser usado com cautela de modo a não defraudar as legítimas expectativas do lesado/ vítima que, corretamente, no processo penal procura obter o ressarcimento dos danos que sofreu
11-O texto do n.º 1 do artigo 82.º, como corolário do princípio vertido no artigo 71.º, prescreve ainda que o Meritíssimo Juiz, se não dispuser de elementos suficientes para fixar a indemnização, pode condenar no que se liquidar em execução de Sentença.
12-O que significa que, para além do expediente previsto no artigo 152.º n.º 1, o Meritíssimo Juiz ainda dispunha da possibilidade prevista no artigo 82.º do mesmo C.P.P.
13-A conjugação destes dois normativos permite classificar a remessa do pedido de indemnização cível para os meios comuns comum como a ultima” ratio”.
14-Não vislumbramos qualquer razão fatual que possa afastar a aplicabilidade do princípio da adesão referido supra, prescindindo o Tribunal dos meios que a Lei dispõe para evitar tal decisão.
15-O despacho impugnado violou pois o disposto nos artigos 71º, 82º nº 1e 3, 152º nº1, 7º, e 71º nº 2 al .a) e 148º nº 3 do C.Penal.
Termos em que deve ser revogado o douto despacho em crise e em sua substituição ser decidido que deverá o Tribunal “ a quo” proceder à produção de toda a prova e apreciação do pedido cível em devido tempo apresentado e admitido.
Assim decidendo Vºas Exªs Farão a Costumada Justiça”

3. O recurso foi admitido, por despacho proferido no dia 13.01.2015, a subir nos próprios autos (principais) com o interposto da decisão final (cfr. fls. 161 destes autos de recurso em separado).
4. Não foi apresentada qualquer resposta ao recurso.
5. Entretanto, nesta Relação, por decisão proferida pela Juíza Desembargadora Relatora a quem foram distribuídos os autos principais, foi determinado que o presente recurso tivesse subida em separado daqueles autos principais, tendo para o efeito ordenado a baixa de tais autos à primeira instância para instrução do presente recurso (cfr. despacho constante de fls. 185 a 188 destes autos de recurso em separado).
6. Depois de, então, instruídos em separado, subiram os presentes autos a esta Relação.
7. Nesta instância, o Exmo Procurador-Geral Adjunto, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
8. No âmbito do art.º 417.º, n.º 2 do Código Penal, não foi apresentada resposta.
9. Na sequência de despacho proferido pelo ora Relator a fls. 176, foram entretanto juntos aos autos mais elementos daquele processo principal a melhor instruir o presente recurso em separado.
10. Colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência, cumprindo apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO
Constitui jurisprudência corrente dos tribunais superiores que o âmbito do recurso se afere e se delimita pelas conclusões formuladas na respectiva motivação (artigo 412º, nº 1, in fine, do Código de Processo Penal), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
No caso vertente, vistas as conclusões do recurso, a questão que fundamentalmente se coloca é a de saber se, ao remeter as partes para os tribunais civis quanto ao pedido de indemnização civil que havia sido deduzido nos autos pelo assistente/demandante Manuel R. contra o arguido Rodrigues R. e o Fundo de Garantia Automóvel, o tribunal a quo violou os comandos ínsitos nos arts 71º e 82º nº 3 do Código de Processo Penal.

É o seguinte o teor do despacho recorrido (proferido, como dissemos, em sede de audiência de julgamento do dia 01.10.2014):
“Compulsados os presentes autos constata-se que o exame pericial solicitado no âmbito do inquérito cujo visado é o ofendido Manuel R. não se encontra actualmente concluído em virtude de se afigurar necessária a obtenção de elementos clínicos que à data da realização de tal exame não foram oportunamente remetidos (cfr. fls. 147, 149, 221, 222).
Assim, a determinação da realização de tal exame neste momento seria susceptível de retardar de forma intolerável o presente processo, sendo certo que tal elemento se afigura decisivo para a decisão a proferir na parte civil, ou seja na decisão a proferir quanto ao PIC deduzido pelo assistente Manuel R. a fls. 272 a 302.
Pelo exposto e porque os elementos que constam do processo habilitam o Tribunal a proferir decisão quanto à parte criminal bem como quanto ao PIC do hospital, remeto a questão do PIC deduzido pelo assistente para os meios comuns ao abrigo do disposto no artigo 82°, n° 3 parte final do CPP.
Notifique.”
E mais se constata que logo depois do mandatário do assistente/demandante ter requerido a palavra e manifestado para a acta a sua discordância acerca do mencionado despacho e em relação ao qual logo interpôs recurso, a Mma Juíza logo de seguida proferiu ainda o seguinte despacho (em jeito de complemento/sustentação daquele primeiro):
“Pese embora os elementos clínicos juntos a fls. 379, pelo assistente/demandante Manuel R.. não existe, como dissemos, de momento, qualquer relatório médico elaborado pela entidade competente nesta matéria (neste caso o IML), em que se analisem e determinem com rigor as consequência que resultaram para o demandante na sequência do acidente descrito nos autos, nem é sequer elaborado ou analisado o grau de tais lesões.
Ora, não existindo tal relatório neste momento, não possível comprovar com grau de certeza os danos actuais alegados pelo assistente no seu requerimento.
O instrumento de liquidação em execução de sentença, destina-se essencialmente a situações em que os danos indemnizatórios não são concretamente determináveis, ou porque se trata de danos futuros ou porque a a situação não esta estabilizada ou não permite uma actual apreciação de tais consequências.
Os danos alegados pele assistente/demandante e são determinados e é possível obter os elementos bastantes para fixar uma indemnização actual ao demandante, não dispondo unicamente o processo de tais elementos em virtude de não se mostrar concluída a perícia médica requerida no âmbito do inquérito.
Por essa razão não pode o tribunal pronunciar-se sobre os valores concretamente peticionados pelo demandante civil no pedido deduzido nos autos e porque a obtenção de tal relatório retarda ele forma intolerável o processo (já que pode originar incidentes tais como solicitação de esclarecimentos ao relatório pericial, eventual realização de uma segunda perícia, pedido para comparecimento de perito em julgamento a fim dê prestar esclarecimentos adicionais). o Tribunal ao abrigo do disposto na nossa lei processual penal lançou mão do preceituado no art 82, nº 3 do CPP, onde se refere expressamente que as partes podem ser remetidas para os meios civis quando as questões suscitadas pelo PIC forem suscepível de geral incidente que retardem o processo.
Assim e porque a lei dispõe expressamente desta possibilidade, tratando-se de uma decisão fundamentada e ponderada é de manter o despacho proferido nos autos.
Quanto ao recurso interposto pelo assistente/demandante aguardem os autos a apresentação das competentes alegações.
Mais determino que se dê início a presente audiência de julgamento.
Notifique.”

Insurge-se, pois, o recorrente contra a decidida remessa para os tribunais civis do pedido de indemnização civil que pelo recorrente havia deduzido nos autos contra o arguido e o Fundo de Garantia Automóvel, com o fundamento central de que a realização do exame médico-legal ainda em falta para determinar a extensão dos danos por si sofridos não causa atraso intolerável de um processo.
Vejamos desde já o que estabelecem os artigos 71º e 82º nº 3 do Código de Processo Penal (diploma a que se reportarão as demais disposições citadas sem menção de origem), normativos estes que o recorrente entende terem sido violados.
Dispõe o primeiro normativo, que tem por epígrafe “Princípio de adesão” que “O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei.
Ora, na lei adjectiva penal estão logo previstas no artigo subsequente (ou seja no artigo 72º e mais concretamente nas várias alíneas do nº 1 deste artigo) situações que permitem a dedução do pedido de indemnização civil fora do processo penal.
Por sua vez estabelece o nº 3 do artigo 82º: “O tribunal pode, oficiosamente ou a requerimento, remeter as partes para os tribunais civis quando as questões suscitadas pelo pedido de indemnização civil inviabilizarem uma decisão rigorosa ou forem susceptíveis de gerar incidentes que retardem intoleravelmente o processo penal.
Da análise destes normativos decorre que a regra é a de que o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é sempre deduzido no âmbito do respectivo processo em que existe acusação da prática do crime, crime esse que, por se revelar como facto danoso para o sujeito passivo do crime, constitui causa de pedir do próprio pedido.
Todavia, pelo facto de se verificar uma qualquer das situações a que aludem as alíneas do nº 1 do artigo 72º, esse mesmo pedido pode ser deduzido em separado, ou seja, noutro foro e no âmbito de um outro processo que não aquele onde decorre a investigação ou foi deduzida acusação pela prática de um crime.
E mesmo que já tenha sido deduzido no âmbito do processo-crime, permite o nº 3 do artigo 82º que, quer a requerimento quer oficiosamente, o tribunal remeta a apreciação do pedido de indemnização civil para os tribunais civis.
No caso do despacho recorrido, embora de forma não exaustivamente fundamentada no seu início (mas depois complementada essa fundamentação na despacho subsequente e também supra transcrevemos), face ao desenvolvimento que os autos vinham tendo, afigura-se-nos correcta a decisão recorrida.

Com efeito, para além do referido na decisão recorrida, entre outras referências, importa ter presente também o seguinte (em parte já mencionado no antecedente relatório) que decorre da análise dos elementos que instruem o presente recurso em separado:
- O pedido de indemnização civil em causa, no montante de €37.898,50, acrescido de juros, tinha sido deduzido pelo recorrente contra o arguido Rodrigues R. e também contra o Fundo de Garantia Automóvel (ou seja, contra o arguido e um outro sujeito processual apenas com alegada responsabilidade meramente civil);
- À data da prolação do despacho recorrido ainda não tinha sido junto aos autos o relatório de exame médico-legal que pudesse ser evidenciador do tempo de incapacidade de trabalho e das sequelas e grau de lesões que possam ter resultado para o demandante na sequência das lesões sofridas em consequência do acidente a que se reportam os autos.
- Nas conclusões do último relatório de exame médico-legal do IML constante destes autos, elaborado em 15.02.2013, constava expressamente o seguinte:
Para uma avaliação mais completa das consequências médico-legais do evento:
- Solicita-se o envio de informação clínica do Serviço de Ortopedia do Hospital de Vila Real que responda concretamente às seguintes questões: o sinistrado em apreço irá ser submetido a nova intervenção cirúrgica para extracção de material de osteossíntese adicional, como o próprio afirma? Qual a data de estabilização do quadro clínico decorrente da fractura dos pratos tibiais do joelho direito? ……….
Assim que a informação supracitada nos seja enviada, e caso não ocorra nova intervenção cirúrgica ao joelho direito, será necessária a marcação de novo exame pericial pela entidade requisitante, efeito para o qual o sinistrado deve estar presente. Na eventualidade de se proceder a nova intervenção cirúrgica, o novo exame deverá ocorrer depois da estabilização clínica pós-operatória.
É necessária a presença do(a) Examinando(a). A entidade requisitante necessitará de proceder à marcação de novo exame ……. (cfr. fls. 17 e 18 destes autos de recurso em separado que corresponderão a fls. 240 e 241 dos autos principais).
- Mais se constata que logo a fls. 243 e segs daqueles autos principais o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido, imputando, além do mais, também a prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência p. e p. pelo artigo 148º nºs 1 e 3 do Código Penal (sendo que o último relatório pericial que indica como meio de prova é aquele de fls. 240 e 241 dos autos principais, cujas conclusões atrás foram antecedentemente transcritas).
- E ao longo do articulado do pedido de indemnização civil que deduziu contra o arguido e o Fundo de Garantia Automóvel, entre outros fundamentos para a pretendida indemnização, tinha alegado o recorrente:
67°
Conforme se referiu, o demandante foi sujeito a várias cirurgias, como ainda terá outra, afim de conseguir uma melhor mobilidade, já que durante os primeiros meses, o Demandante teve que ficar acamado, por não ser possível mecher a perna.
68º
No entanto, tais operações foram infrutíferas, no sentido de permitir ao demandante que se mobilize como fazia até à data do acidente, ou seja,
69°
Dificilmente e com um grande grau de improbabilidade, o Lesado, conseguirá movimentar-se sem a ajuda de uma canadiana.
70º
Tanto que lhe foi diagnosticada uma incapacidade permanente para o trabalho (…)
72°
O acidente de que foi vitima teve uma repercussão desastrosa na sua vida laboral (…)”
73°
Para algumas tarefas até bastante simples para um homem médio estará sempre dependente de outra pessoa, até para levantar objetos, ou lavrar a. terra…
74º
Apesar de ter seguido escrupulosamente as prescrições médicas, vai ficar toda a vida com essa incapacidade e, certo é, que, em termos normais, a sua independência era absoluta, o que agora é totalmente impossível...
75º
O demandante, desconhece, se após a cirurgia do dia 20 de Maio de 2013, terá que ser sujeito a tratamentos de fisioterapia devido a dificuldade que vai sentir na sua mobilidade pela ausência dos ferros na perna, ao que deverá ser atendido possíveis danos futuros, que deverão ser calculados em sede de execução de sentença.
(…)” (cfr. pedido de indemnização civil de fls. 28 a 41 destes autos de recurso em separado que corresponderão a fls. 272 a 285 dos autos principais)
- Logo após o despacho recorrido, naquele mesmo dia 01.10.2014, teve efectivamente início a audiência de julgamento (dia em que foram ouvidos o arguido, o assistente/demandante (ora recorrente) Manuel R. e a testemunha Manuel R. (cfr. acta da audiência de julgamento daquele dia que nestes autos de recurso em separado consta a fls. 2 a 8 e que corresponderá a fls. 380 a 385 dos autos principais).
- Tendo ocorrido outras sessões da audiência de julgamento, a sentença entretanto proferida naqueles autos principais mostra-se datada de 29.10.2014 (cfr. sentença de fls. 98 a 142 destes autos de recurso em separado e que corresponderão a fls. 413 a 460 daqueles autos principais).

Ora, naquela altura em que foi proferido o despacho recorrido (recorde-se em plena acta da audiência de julgamento, tendo-se logo iniciado a produção de prova), adiar a audiência de julgamento por forma a permitir/possibilitar que o ora recorrente fosse, no âmbito daquele processo, sujeito a novo exame médico-legal no IML com vista a aquilatar das consequências médico-legais (em termos de quantum doloris, em termos tempo de incapacidade parcial temporária e/ou de grau de IPP, etc), em vez de enveredar pela remessa das partes civis para os tribunais civis, necessariamente implicaria o adiamento da audiência de julgamento que se mostrava agendada para aquele dia 01.10.2014 (e para a qual se encontravam presentes todas as pessoas convocadas, à excepção da testemunha José R. que entretanto até compareceu e até foi ouvida logo naquela primeira sessão de julgamento) e um novo agendamento para vários meses mais à frente (senão mesmo um adiamento sine die) por forma a possibilitar também o envio de um posterior novo relatório de exame médico-legal que poderia ainda não ser o último…
Adiar o início de julgamento causaria graves transtornos à já delineada marcha do processo (como referimos estavam presentes todas as pessoas convocadas, excepto uma testemunha que compareceu naquele mesmo dia).
Para além disso, após a chegada aos autos de novo exame médico-legal, poderia o mesmo ainda são ser conclusivo (por exemplo por ser necessária a obtenção de mais informações clínicas e designar novo exame) ou mesmo que o fosse, poderia vir a ser alvo de pedidos de esclarecimentos por parte dos diversos sujeitos processuais, incidentes esses que de permeio poderiam ocorrer e que ainda mais viessem agudizar o protelamento indefinido do início (sabe-se lá quando) do julgamento.
Ou seja, daqui se conclui que a manutenção da exigência de apreciação do pedido de indemnização civil em causa no âmbitos destes autos inevitavelmente retardaria de forma intolerável o desenvolvimento do presente processo penal (no qual se fazem sentir razões de ordem pública de celeridade e do interesse do arguido em ver uma decisão penal proferida em prazo razoável) e a obtenção de uma, tão rápida quanto possível, sentença que, primordialmente vise apreciar a questão penal. Dir-se-á ainda que por via desse mesmo princípio da adesão é a acção cível que acompanha a acção penal e não esta que se submete às incidências das questões cíveis.
Aliás decorre do Ac da Relação de Lisboa de 12/11/1997, acessível pela internet através do site www.dgsi.pt/ (Acórdãos TRL) que "O interesse público na celeridade do processo penal sobrepõe-se ao interesse privado na indemnização que pode ser tutelado por outra via."
Por outro lado, ainda se acrescentará que pelo próprio valor do pedido (superior à alçada da Relação), e ressalvados alguns hipotéticos pormenores atinentes à questão da sucumbência, sempre poderia ser admissível recurso, restrito à parte cível, para o STJ, com o consequente atraso do processo penal, processo que se impõe célere (quer face à comunidade em geral quer face ao próprio arguido porque ambos, regra geral, pretendem que a questão de índole criminal seja o mais rapidamente decidida, em definitivo). Para além disso, no processo, como também já dissemos, para além do arguido já figurava um outro sujeito processual com alegada responsabilidade meramente civil.
Acresce ainda o facto de que o pedido de indemnização civil em causa poderia ser sempre deduzido, em separado, perante os tribunais civis face ao que decorre das alíneas dispõem as alíneas a), f) e g) do nº 1 do art. 72º do Código de Processo Penal, motivo pelo qual não havia atropelo ou menosprezo pelos chamados “direitos da vítimas”.
Consideramos, pois, tal como entendeu a Mma Juiz a quo que não se justificava o retardamento dos autos devido ao pedido civil em causa, nem havia fundamento legal para adiar por largos meses (ou mesmo sine die) o início de um julgamento crime por causa de um pedido de indemnização que podia ser deduzido no foro próprio (o tribunal civil). Recordemos, aqui de novo, o já supra mencionado Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/11/1997: "O interesse público na celeridade do processo penal sobrepõe-se ao interesse privado na indemnização que pode ser tutelado por outra via."
E manifestamente numa questão complexa e demorada como a dos autos, deve o juiz dar prevalência às exigências ínsitas, desde logo, nas normas da alínea f) do artigo 72º e do nº 3 do artigo 82º, ambos do Código de Processo Penal.
Termos em que, não merecendo censura o despacho recorrido que (no respeitante ao pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente/demandante - ora recorrente - contra o arguido e o Fundo de Garantia Automóvel) remeteu as partes civis para os tribunais civis, será de negar provimento ao recurso por se concluir que o despacho recorrido não violou os invocados arts 71º e 82º nº 3 do Código de Processo Penal, nem os demais normativos legais mencionados pelo recorrente (sendo que a alusão a àqueles dois artigos, tal como ao artigo 152º nº 1 como sendo “do C.Penal” certamente se deverá a de mero lapso do recorrente, pois tais normativos respeitarão ao Código de Processo Penal).
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III. DISPOSITIVO
Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso e, consequentemente, confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC´s.
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(Elaborado em computador e revisto pelo relator, o primeiro signatário - art. 94º nº 2 do Código de Processo Penal)
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Guimarães, 25 de Janeiro de 2016

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(Luís Coimbra)
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(Maria Manuela Paupério)