Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1959/14.6 T8GMR.G1
Relator: ANABELA TENREIRO
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO PATRIMONIAL FUTURO
PROPOSTA DE INDEMNIZAÇÃO
JUROS DE MORA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- A indemnização do dano patrimonial futuro não depende da prova de que o lesado sofrerá prejuízo patrimonial em resultado da incapacidade permanente de que ficou portador uma vez que a jurisprudência uniforme, nesta matéria, reconhece que aquele dano constitui uma lesão do direito fundamental do lesado à saúde e integridade física;

II- Da conjugação dos arts. 39.º, n.º 2 (proposta razoável para regularização de sinistros que envolvam danos corporais) e 38.º, n.º 2 e 3 do Dec.-Lei n.º 291/2007 de 21.08 resulta que, no caso de a responsabilidade não ser contestada e o dano sofrido ser quantificável, no todo ou em parte, a seguradora deve fazer uma proposta razoável de indemnização, sob pena de serem devidos juros no dobro da taxa legal prevista na lei aplicável ao caso sobre o montante da indemnização fixado pelo tribunal.

IV- O cálculo da indemnização proposta ao lesado, nessa fase extra-judicial, depende da respectiva quantificação dos danos conhecidos, no todo ou em parte, e se obedecer ao sistema de avaliação e valorização dos danos corporais por utilização da Tabela indicativa para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, apenas são devidos juros à taxa legal sobre a diferença entre o montante oferecido e aquele que for fixado na sentença.”
Decisão Texto Integral:
Sumário

I- A indemnização do dano patrimonial futuro não depende da prova de que o lesado sofrerá prejuízo patrimonial em resultado da incapacidade permanente de que ficou portador uma vez que a jurisprudência uniforme, nesta matéria, reconhece que aquele dano constitui uma lesão do direito fundamental do lesado à saúde e integridade física;
II- Da conjugação dos arts. 39.º, n.º 2 (proposta razoável para regularização de sinistros que envolvam danos corporais) e 38.º, n.º 2 e 3 do Dec.-Lei n.º 291/2007 de 21.08 resulta que, no caso de a responsabilidade não ser contestada e o dano sofrido ser quantificável, no todo ou em parte, a seguradora deve fazer uma proposta razoável de indemnização, sob pena de serem devidos juros no dobro da taxa legal prevista na lei aplicável ao caso sobre o montante da indemnização fixado pelo tribunal.
IV- O cálculo da indemnização proposta ao lesado, nessa fase extra-judicial, depende da respectiva quantificação dos danos conhecidos, no todo ou em parte, e se obedecer ao sistema de avaliação e valorização dos danos corporais por utilização da Tabela indicativa para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, apenas são devidos juros à taxa legal sobre a diferença entre o montante oferecido e aquele que for fixado na sentença.
*
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I- RELATÓRIO

Hugo, solteiro, natural da freguesia de …, Vila Nova de Famalicão, com residência na Rua …, concelho de Vila Nova de Famalicão, intentou a presente ação declarativa com processo comum contra “Companhia de Seguros X, S.A”, peticionando a condenação da Ré no pagamento de 77.506,98€ (Setenta e Sete Mil Quinhentos e Seis Euros e Noventa e Oito Cêntimos) discriminada da seguinte forma:

1. 40.000,00€ a título de dano biológico/perda de capacidade de ganhos;
2. 250,00€ a título de despesas médicas, medicamentosas e outras;
3. 2.256,98€ a título de perdas salariais (reduzido posteriormente para o montante de 1.408,78 euros).
4. 35.000,00€ a título de danos não patrimoniais,
5. Acrescido de uma quantia cuja total e integral quantificação se relega para posterior incidente de liquidação decorrentes da necessidade atual e futura de efetuar:

a)exames médicos de diagnóstico e de aferição da consolidação das lesões e sequelas supra melhor descritas,
b)de acompanhamento médico periódico nas especialidades médicas de Ortopedia, Fisioterapia e Fisiatria para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas,
c)de realizar tratamento fisiátrico 2 (duas) vezes por ano, sendo que cada tratamento deverá ter a duração mínima de 20 sessões, para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas,
d)de ajuda medicamentosa–antidepressivos, anti-inflamatórios e analgésicos-para superar as consequências físicas das lesões e sequelas supra melhor descritas,
e)de se submeter a várias intervenções cirúrgicas designadamente avaliação artroscópica do joelho direito, a internamentos hospitalares, despesas hospitalares, tratamentos médicos e clínicos, de ajudas técnicas, deslocações a hospitais e clínicas para tratamento e correção das lesões e sequelas melhor descritas,
6. acrescido dos juros no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre a diferença entre o montante oferecido (4.500,00€) e o montante fixado na decisão judicial, contados a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nas disposições identificadas (no caso dos autos desde 14-11-2012) e até à data da decisão judicial ou até à data que vier a ser estabelecida na decisão judicial.
Alega, para tanto, em súmula, que na sequência de acidente de viação/atropelamento cuja culpa imputa ao tomador de seguro da Ré resultaram danos de natureza patrimonial e não patrimonial.
A Ré contestou, impugnando os danos e montante.
*
Proferiu-se sentença que decidiu julgar a presente acção parcialmente procedente, e em consequência, condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia global de € 37.907,25(1) (1408,78+250,00+20.000,00+ 16.248,47) acrescida de juros em dobro sobre a quantia de 1408,78 entre a data de 14.11.2012 e a da presente sentença, e de juros legais desde a data da presente sentença e até pagamento integral sobre a quantia globalmente fixada, absolvendo-a no mais.
*
Inconformada com a sentença, a Ré interpôs recurso, formulando as seguintes
Conclusões

I-O pedido de indemnização deduzido pelo A por perdas salariais foi reduzido, por requerimento apresentado pelo A em 17/11/2016 e devidamente homologado por sentença, para a verba de 1.408,78€;
II- A redução do pedido corresponde a uma desistência parcial deste, ou seja, a uma renúncia à pretensão de receber a esse título a quantia peticionada de 2.256,98€ ou importância superior àquela para a qual o A reduziu o pedido.
III- Ao condenar a Ré no pagamento ao A. da quantia de 1.719,60€ por perdas salariais o julgador condenou para além do pedido, o que acarreta a nulidade da douta sentença, vício esse que se invoca, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615º n.º 1 alínea e) do CPC.
IV- Sem prejuízo da invocada nulidade da decisão, em face da redução do pedido (e sua confissão pela Ré) deve ser reduzida para a verba de 1.408,78€ a indemnização a pagar ao A. por perdas salariais, o que se requer;
V- Na douta sentença sob censura não há a mais pequena referência aos meios probatórios que justificaram a decisão de dar como provado o facto do ponto 17 do elenco da matéria considerada assente, o que corresponde uma manifesta falta de fundamentação, conducente à nulidade da douta sentença, vício esse que, expressamente, se invoca, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615ºn.º 1 alínea b) do CPC.
VI-Refere-se na fundamentação da douta sentença que as perdas salariais do demandante ascendem a 2.519,60€, mas foi dado como provado no ponto 17 da matéria considerada assente que essas perdas ascenderam a 3.056,98€.
VII-Esta contradição torna a decisão ininteligível, o que determina a nulidade da douta sentença, vício esse que se invoca nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615º nº. 1 alínea c) do CPC.
VIII-Na douta sentença sob censura a meritíssima Srª Juiz não se pronunciou sobre os factos alegados pela Ré nos artigos 33º, 34º, 35º, 37º e 38º da contestação;
IX-Esta factualidade era relevante para o desfecho da lide, nomeadamente para o cálculo das perdas salariais do demandante (e eventualmente para o cálculo da indemnização por danos futuros).
X- Assim, a Ré desde já invoca a nulidade da douta sentença, por manifesta omissão de pronúncia quanto aos factos alegados pela Ré nos artigos 33º, 34º, 35º, 37º e 38º da sua contestação, vício esse que argui nos termos do disposto no artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC.
XI- A Ré impugna, por considerar que foi incorrectamente julgado, os factos dos pontos 17 e 38 dos factos dados como provados;
XII- Da informação prestada pela entidade patronal do A em 12/03/2015 e dos documentos de fls 94 e 157 e os documentos de fls 223, 224, 227 e 229 destes autos, resulta que o A auferia as seguintes retribuições brutas: Vencimento mensal base: 488,00€, subsídio de turno: 117,23€, prémio de zelo: variável, subsídio de alimentação: 6,41€ dia.
XIII- Com base nestes elementos documentais e uma vez que o A não alegou factos que sustentem a conclusão de que o prémio de zelo seria recebido com carácter de regularidade ou que o subsídio de alimentação seria pago no mês de férias, é possível apurar, com a absoluta certeza, o rendimento anual bruto regular e previsível do demandante, que era o seguinte:

- 488€ x 14 meses = 6.832,00€ (vencimento base)
- 117,23€ x 14 meses = 1.289,53€ (subsídio de turno)
- 141,02€ x 11 meses = 1.551,22€ (subsídio de alimentação)
Total bruto: 9672,75€
XIV- Como resulta ainda dos recibos de vencimento do A, sobre a dita remuneração bruta mensal de 488€ + 117,23€ e ainda sobre parte do seu subsídio de alimentação, incidiam descontos obrigatórios para a segurança social (11%) e retenção de IRS.
XV- Tendo em conta as regras respeitantes à tributação em sede fiscal e contribuições para a segurança social estabelecidas na Lei é possível calcular o rendimento mensal e anual líquido do demandante, nos seguintes temos:

-nos meses em que há pagamento do subsídio de alimentação, a retribuição bruta do A ascende a 746,25€ (488,00€ + 117,23€ + 141,02€)
-nos meses em que não há pagamento de subsídio de alimentação, a retribuição bruta do A era de 488€ + 117,32€ = 605,32€

Portanto:

-nos meses em que há pagamento de subsídio de alimentação retribuição bruta do A ascendia a 746,25€. Porém, para efeitos de IRS e desconto para a Segurança Social, só são considerados 28,38€ do subsídio de alimentação. Ou seja, a retribuição sujeita a tributação e descontos é de 633,61€ (488€ + 117,23€ + 28,38€). Atento este valor, a retenção mensal a título e IRS era de 4%. Assim: a retribuição líquida nos meses em que há pagamento de subsídio de alimentação ascendia a 633,61€ - (633,61€ - 11%= 69,69€) – (633,61€ - 4% = 25,34€) = 538,58€ líquidos acrescidos da diferença não considerada de subsídio de alimentação 112,64€ (5,12 x 22 dias), sendo o total líquido de 651,22€
-nos meses em que não há pagamento de subsídio de alimentação (férias subsídio de férias e de Natal) a retribuição bruta era de 605,32€. Atento este valor, a retenção mensal a título e IRS era de 2%. Assim: a retribuição líquida nos meses em que não há pagamento de subsídio de alimentação ascendia a 605,32€ - (605,32€ - 11% = 66,58€) – (605,32€ - 2% = 12,11€) = 526,63€ líquidos.
XVI- Em face do exposto, entende a recorrente que os recibos de vencimento do A de fls 94, 157 e os documentos de fls 223, 224, 227 e 229 (em particular a informação prestada pela entidade patronal do A em 15 de Março de 2015), impunham que se tivesse dado como provado, quanto ao facto do ponto 38 dos factos provados, o seguinte:
38. Auferia uma retribuição mensal ilíquida de 746,25€ nos meses em que recebia subsídio de alimentação e de 605,32€ nos meses em que não o recebia, (746,25€x 11 meses + 605,32€ x 3 meses – líquida de 651,22€ nos meses em que recebia subsídio de alimentação e líquida de 526,63€ nos meses em que não o recebia) discriminada mensalmente da seguinte forma:

1. 488,00€ a título de vencimento base mensal x 14 meses
2. 1117,23€ a título de subsídio de Turno x 14 meses
3. prémio de zelo variável e incerto
4. 141,02€ a título de subsídio de alimentação x 11 meses.
XVII- O facto do ponto 17 da matéria de facto dada como provada é conclusivo, pelo que deve ser eliminado do elenco dos factos provados;
XVIII- Por outro lado, como vimos no âmbito da impugnação da decisão proferida quanto ao facto do ponto 38, a retribuição mensal líquida auferida pelo A era a de:

- 651,22€ nos meses em que recebia subsídio de alimentação
-526,63€ nos meses em que recebia não recebia subsídio de alimentação,
XIX- Tendo em consideração o critério utilizado pelo julgador no cálculo das perdas salariais, as mesmas terão ascendido a 2.387,81€, calculados nos seguintes termos: (651,22€ x 3 = 1953,66€) + (651,22€ / 3 x 2 = 434,15€) = 2387,81
XX- Pelo que entende a recorrente que os recibos de vencimento do A de fls 94, 157 e os documentos de fls 223, 224, 227 e 229 (em particular a informação prestada pela entidade patronal do A em 15 de Março de 2015), impunha-se que se tivesse dado como provado, quanto ao facto do ponto 17 dos factos provados (se não for eliminado), o seguinte “17. O Autor, no período de Incapacidade temporária Absoluta para o Trabalho compreendido entre o dia 09 de Julho e o dia 29 de Outubro de 2012 deixou de auferir a quantia total de 2.387,81€ a título de perdas salariais mensais ilíquidas, proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal respeitantes as iguais período de tempo”.
XXI- Seja por via da nulidade da consideração da redução do pedido requerida pelo A e homologada por douta sentença, seja pela anulação da decisão, deverá ser reduzida para a verba de 1.408,78€ a indemnização devida a título de perdas salariais.
XXII-Subsidiariamente, por força da alteração da decisão proferida quanto à matéria de facto, deve ser reduzida tal indemnização para a quantia de 1587,81€ (2.387,81€ - 800,00€, estes já pagos pela Ré).
XXIII-A Ré impugna, por considerar incorrectamente julgados, a decisão proferida quanto aos pontos 19, 20, 24, 27, 33, 36, 39 e 42 da matéria de facto dada como provada;
XXIV- A testemunha Maria, esposa do A e enfermeira, cujo depoimento se encontra gravado no sistema H@bilus no dia 17/11/2016, entre as 15h10m39s e as 15h27m18s, declarou nas passagens dos minutos 02m01s a 10m18s desse depoimento, transcritas no corpo destas alegações e que aqui se dão por reproduzidas e integradas, que não se confirmou a suspeita de fractura da perna do A;
XXV- Da conjugação dos registos das observações do A no CHMA em 09/07/2012 (Doc 7 junto com a PI), 15/07/2012 (Doc 8 junto com a PI) e 16/07/2012 (Doc 9 junto com a PI) resulta que nunca foi diagnosticada ao demandante uma “fractura da cortical proximal da tíbia”, tendo antes sido interpretados os exames radiológicos como susceptíveis de alimentar a suspeita de uma “fissura” a esse nível.
XXVI- Porém, nem mesmo a suspeita de fissura (e não fractura) da tíbia se confirmou em exames posteriores, nomeadamente nos registos de observação no CHMA de 15/07/2012 (Doc 8 junto coma PI) e 16/07/2012 (Doc 9 junto com a PI);
XXVII- A verificação de fractura ao nível da tíbia não é referenciada em qualquer um dos relatórios das duas perícias realizadas nestes autos, a não ser no âmbito da descrição dos dados documentais, com referência à primeira observação na urgência de 09/07/2012, cujo diagnóstico foi corrigido nas intervenções posteriores.
XXVIII- Em face do exposto, entende a recorrente que a documentação clínica constante dos Documentos 7, 8 e 9 juntos com a PI (observações em urgência do Hospital de VNF) e, bem assim, o teor do relatório pericial de fls 366 e seguintes, não confirmam, mas antes infirmam a conclusão de que o A sofreu uma fractura da tíbia direita, pelo que esses mesmos elementos impunham decisão diversa da proferida quanto aos factos dos pontos 19 e 20 da matéria de facto dada como provada nos seguintes termos:

19.O Autor foi assistido no SU do CHMAVE, E.P.E. no dia 09/07/2012, pelas 22h44m, apresentando: traumatismo direito na face interna do joelho direito.
20.tendo-lhe sido colocada tala gessada no membro inferior direito (imobilização do joelho e pé”)
XXIX- O documento de fls 71 é um documento particular, o qual foi impugnado pela Ré, e não tem a valia probatória suficiente para sustentar a decisão proferida quanto ao facto do ponto 24;
XXX- Assente que o A, em consequência do acidente, sofreu apenas um traumatismo da perna direita (cfr ponto 19 dos factos dados como provados e Docs 7, 8 e 9 juntos com a PI)), não é possível que, depois da alta clínica, mantivesse queixas dolorosas ao nível do ombro e da zona lombar, zonas não afectadas;
XXXI- Assim, não atestando o documento invocado – fls 71 – o facto dado como provado no ponto 24 e atendendo ao teor dos documentos juntos com a PI sob os números 7, 8 e 9, onde não há menção a traumatismo ou dores do ombro e zona lombar, impunha-se que o facto do ponto 24 do elenco da matéria dada como provada na douta sentença fosse dado como não provado, o que se requer.
XXXII- Nos pontos 27 e 33 da matéria de facto dada como provada não se menciona que as patologias aí descritas estejam relacionadas com o acidente, pelo que são factos irrelevantes para o desfecho da lide, devendo ser eliminados;
XXXIII- Resulta dos Docs 7, 8 e 9 juntos com a PI e foi dado como provado no ponto 19 da matéria de facto que o A apenas sofreu um traumatismo do membro inferior direito, pelo que não tem qualquer sustentação a ideia de que do acidente resultaram para o A alterações anatómicas ao nível lombar.
XXXIV- No relatório pericial de fls 366 e seguintes e em resposta ao quesito 3º formulado pela Ré, a Srª Perita afasta o nexo causal entre o acidente e as alterações observadas nos exames mencionados nos pontos 27 e 33 dos factos provados, considerando-as prévias a esse evento.
XXXV-A natureza degenerativa dessas patologias foi ainda reconhecida pela esposa do A, a testemunha Maria,no seu depoimento gravado no sistema H@bilus no dia 17/11/2016, entre as 15h10m39s e as 15h27m18s, mais precisamente nas passagens dos minutos 11m08s a 12m16s, transcritas no corpo destas alegações e que aqui se dão por reproduzidas e integradas;
XXXVI- Em face do exposto, perante o relatório pericial da segunda perícia de fls 366 e seguintes e declarações da testemunha Maria, gravadas no sistema H@bilus no dia 17/11/2016, entre as 15h10m39s e as 15h27m18s, mais precisamente nas passagens dos minutos 11m08s a 12m16s, impunha-se, caso não sejam eliminados os factos dados como provados nos pontos 27 e 33, que fosse dado como provado que:

27.“no dia 11/09/2012 realizou um RX que evidenciou escoliose Dorso-Lombar de grande convexidade esquerda, sem relação com o acidente”.
33.“no dia 22-10-2012 realizou uma RM lombar que evidenciou: “…discreta rotação dos corpos vertebrais para a esquerda, sem relação com o acidente”
XXXVII- Se assim não se entendesse, sempre deveria ser anulada a douta sentença por manifesta omissão de pronúncia do julgado quanto aos factos alegados pela Ré nos artigos 13º e 14º da sua contestação (onde se alegava o existência dessas patologias lombares prévias ao acidente) vício esse que argui nos termos do disposto no artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC.
XXXVIII- O relatório pericial de fls 366 e seguintes (e, bem assim, o relatório da primeira perícia), impõe que se dê como provado, quanto ao facto do ponto 36 que a Repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer é de 2, numa escala de 1/7 e não de 3 nessa mesma escala, por ser esse o grau aí fixado;
XXXIX-O julgador não oferece qualquer justificação para a divergência entre o facto que deu como provado (no sentido de que essa repercussão é de 3/7) e o teor do relatório pericial (que aponta para 2/7), sempre se verificaria uma manifesta nulidade da decisão proferida quanto a este facto, por falta de fundamentação, vício esse que desde já se invoca, nos termos do disposto no artigo 615º n.º1 alínea c) do CPC.
XL-A decisão proferida quanto aos factos dos pontos 39 e 42 da matéria dada como provada não foi fundamentada, o que acarreta a nulidade da douta sentença, por falta de fundamentação, a qual se invoca nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615º n.º 1 alínea b) do CPC.
XLI-Os padecimentos dados como provados nos pontos 39 e 42 dos factos provados não são descritos e identificados como sequelas do acidente no relatório pericial de fls 366 e seguintes, sendo esse o único elemento de prova credível nesse âmbito;
XLII-Nem mesmo a testemunha Sara Rodrigues, no seu depoimento gravado, mencionou que o A tenha ficado portador dessas limitações, a não ser a referência ao facto, por si afirmado, de que passou a ser uma pessoa triste, como se vê das passagens dos minutos 08m42s a 09m59s do seu depoimento gravado no sistema H@bilus no dia 17/11/2016, entre as 15h10m39s e as 15h27m18s, as quais se dão aqui por reproduzidas e integradas;
XLIII-Assim, em face do teor do relatório pericial de fls 366 e seguintes e face à total ausência de prova que sustente tais factos, devem ser dados como não provados os factos dos pontos 39 e 42 do elenco da matéria considerada provada, ou, caso se entenda que deve ser dada credibilidade ao depoimento da indicada testemunha, o que não se concede, provado apenas, que _: 39 e 42 Em consequência das lesões e sequelas supra referidas, o Autor tornou-se uma pessoa triste.
XLIV- Em face da factualidade demonstrada e mesmo que não seja alterada a decisão proferida quanto à matéria de facto, impõe-se a redução da compensar pelos danos não patrimoniais sofridos pelo A para a quantia de 5.000€, ou, assim não se entendendo, outra inferior à atribuída na sentença;
XLV-Não está demonstrado que o A sofrerá no futuro qualquer prejuízo patrimonial em resultado da incapacidade permanente de que ficou portador.
XLVI- Assim, não existindo dano patrimonial futuro a indemnizar e já tendo sido atribuída ao A compensação pela única vertente de que se reveste o seu dano biológico (a não patrimonial), deve ser revogada a douta sentença na parte em que condenou a Ré apagar ao A a verba de 16.248,47€, absolvendo-se a demandada deste pedido, o que se requer.
XLVII-Mesmo que assim não se entendesse, atenta a ausência de repercussão patrimonial das sequelas (ou incapacidade permanente), na fixação da indemnização pelo dano biológico deve recorrer-se, essencialmente, à equidade, tendo em conta alguns elementos coadjuvantes;
XLVIII- Recorrendo às regras da das portarias 377/2008 e 679/2009, a compensação do A pelo dano biológico ascenderia a valor entre 2.747,04€ a 3.359,34€ (cfr tabela IV da portaria 679/09);
XLIX- Recorrendo às tabelas usadas para cálculo do dano patrimonial futuro efectivo, tendo em consideração o número de anos de vida activa que restavam ao demandante na data do acidente (48 anos), um vencimento anual médio líquido de cerca de 8.743,31€, uma taxa de crescimento salarial de 1% e da capitação de 3% e o grau da sua incapacidade (3 pontos), a indemnização ascenderia a 8.183,57€.
L- Para a hipótese de considerar relevante no cálculo da indemnização a retribuição auferida pelo A, dá-se aqui por reproduzido e integrado o que se alegou no âmbito da impugnação da decisão proferida quanto aos pontos 17 e 38 da matéria de facto dada como provada, que aponta no sentido de que o rendimento anual líquido do demandante era o de 8.743,31€
LI- Perante todos os elementos coadjuvantes acima invocados e uma vez que não está demonstrada uma efectiva perda de rendimentos, entende a recorrente que se impõe a redução da indemnização pelo dano biológico do A para a verba de 5.500,00€, ou, assim não se entendendo, outra inferior à atribuída na sentença;
LII- O facto do ponto 16 da matéria dada como provada foi impugnado pela Ré no artigo 2º da sua contestação, pelo que era controvertido e carecido de prova;
LIII- Na douta sentença sob censura não há a mais pequena referência aos meios probatórios que justificaram a decisão de dar como provado esse facto, o que corresponde uma manifesta falta de fundamentação, conducente à nulidade da douta sentença, vício esse que, expressamente, se invoca, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615º n.º 1 alínea b) do CPC.
LIV- A Ré impugna a decisão proferida quanto ao ponto 16 da matéria dada como provada, por considerar que foi incorrectamente julgado;
LV- O A não junta um único documento que comprove o gasto dado como provado no ponto 16 e nenhuma testemunha depôs sobre essa matéria;
LVI- Assim, por total ausência de prova, impunha-se que tivesse sido dado como não provado o facto do ponto 16 da matéria de facto considerada provada.
LVII- Eliminado o facto do ponto 16 impõe-se a absolvição da Ré relativamente a verba de 250.00€ por despesas médicas;
LVIII- Mesmo que assim não fosse, não se provou que esse gasto fosse necessário e decorrente do acidente, o que sempre imporia a absolvição da Ré nessa parte;
LIX-A despesa em apreço corresponde ao custo da obtenção de um relatório de avaliação de dano corporal junto aos autos (cfr fundamentação da douta sentença), ou seja, a um meio de prova, pelo que, por total ausência de nexo de causalidade entre o sinistro e esse gasto, impunha-se a absolvição da Ré, o que se requer.
LX- A meritíssima Srª Juiz não se pronunciou sobre os factos alegados pela Ré nos artigos 74º, 75º, 76º, 77º, 78º, 83º, 87º da sua contestação, não os tendo dado como provados ou não provados;
LXI- Para que se pudesse concluir que a Ré apresentou uma proposta não razoável era necessário apurar os pressupostos nos quais baseou a sua proposta e perceber ainda quais as componentes dessa mesma proposta, nomeadamente a título de perdas salariais, factos que foram alegados nesses artigos da contestação;
LXII-Em face do exposto e dada a relevância destes factos para a boa decisão da causa, é a decisão em causa nula, por omissão de pronúncia quanto à indicada factualidade, nulidade essa que, expressamente, se invoca, nos termos do disposto no artigo 615º n.º 1 alínea d) do CPC.
LXIII- Da conjugação dos normativos dos artigos 37º n.º 1 alínea c) e n.º 3 do DL 291/2007 resulta que a seguradora só está obrigada a apresentar uma proposta de indemnização quanto aos danos relativamente aos quais o lesado tenha apresentado, na fase extra-judicial, um pedido de indemnização e sejam quantificáveis.
LXIV- Não tendo o A alegado que formulou o indispensável pedido de indemnização à Ré, esta não estava esta constituída na obrigação de apresentar uma proposta de indemnização, pelo que não sendo devidos juros no dobro da taxa legal sobre a quantia respeitante a perdas salariais;
LXV- A pretensão do A de ver condenada a Ré no pagamento de juros em dobro baseava-se na regra do artigo 38º nº. 3 do DL 291/2007, ou seja, no facto de não ser razoável;
LXVI-A aplicação dessa norma decorreria da violação pela Ré do disposto nos artigos 37º n.º 1 alínea c) e n.º 2 do artigo 37º, ou seja, se decorridos 45 dias após o pedido de indemnização, não tivesse apresentado uma proposta, estando a responsabilidade assumida e sendo o dano quantificável ou se, tendo o lesado aceite uma proposta provisória apresentada pela Ré esta não tivesse apresentado uma proposta no prazo de 15 dias a contar da data do conhecimento do relatório de alta clínica, ou da data a partir da qual o dano deva considerar-se como totalmente quantificável, se posterior.
LXVII- No caso, como se disse, não há pedido de indemnização, pelo que não se pode considerar violada a disposição do artigo 37º n.º 1 alínea c) e não se verifica a circunstância do nº2 desse artigo;
LXVIII- Assim, é patente que a Ré não incumpriu qualquer uma das regras em apreço, pelo que não são devidos juros em dobro.
LXIX- Como se constata do relatório de avaliação de dano corporal elaborado pela Ré -cfr ponto 35 dos factos provados e Doc 18 junto com a PI- aí foram avaliados os vários parâmetros do dano do A, nomeadamente o período de ITA, o quantum doloris e a incapacidade permanente, esta por aplicação da regras da TNI.
LXX- Assim, a proposta da Ré foi efectuada nos termos substanciais e procedimentais previstos no sistema de avaliação e valorização dos danos corporais por utilização da Tabela Indicativa para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, pelo que, neste caso, os juros são devidos apenas à taxa legal prevista na lei aplicável ao caso e sobre a diferença entre o montante oferecido e o montante fixado na decisão judicial, e, relativamente aos danos não patrimoniais, a partir da data da decisão judicial que torne líquidos os montantes devidos – Cfr artigo 39ºn.º3 do DL 291/2007;
LXXI- Deve, também por essa razão, ser a Ré absolvida, nesta parte, do pedido.
LXXII- Mesmo que se entenda que cabia à Ré a prova de que a proposta foi apresentada nos termos substanciais e procedimentais previstos no sistema de avaliação e valorização dos danos corporais por utilização da Tabela Indicativa para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, o certo é que esses factos foram alegados pela demandada na sua contestação, sem que o Tribunal se tenha pronunciado sobre os mesmos.
LXXIII- Pelo que importa reiterar, para a hipótese de se considerar necessário o seu conhecimento, a nulidade acima invocada, por omissão de pronúncia quantos aos factos constantes dos artigos 74º, 75º, 76º, 77, 78, 83º e 87º da contestação.
LXXIV-Sem prejuízo do que acima se disse quanto à indispensabilidade do pedido de indemnização civil, a Ré só poderia estar obrigada a apresentar uma proposta de indemnização tendo por base os danos reclamados pelo A e quantificáveis.
LXXV- O A não alega que a Ré tivesse conhecimento desses danos e da sua extensão (em particular quanto a perdas salariais) e que a proposta apresentada não os contemplasse, ou que não fosse razoável, factos que eram essenciais à procedência do seu direito.
LXXVI- Assim, estão ausentes da matéria de facto dada como provada factos constitutivos e essenciais à procedência deste pedido, o que impõe a absolvição da Ré no que toca aos juros em dobro.
LXXVII- O Tribunal desconhece, em face dos factos que deu como provados, se na proposta final apresentada pela Ré (no valor de 4.500,00€), está ou não incluída uma parcela respeitante a perdas salariais, ou o valor proposto pela Ré a esse título.
LXXVIII- Seja em que circunstância for, a proposta apresentada correspondia à aplicação dos critérios definidos pelas portarias 377/08 e 679/09, sendo, portanto, razoável e adequada aos danos conhecidos pela Ré e até então quantificáveis.
LXXIX- Assim, é manifesto que, no que toca aos danos quantificáveis, a Ré formulou uma proposta que a própria lei considera ser razoável, porque fixada de acordo com os critérios definidos nos indicados diplomas.
LXXX- Pelo menos, não pode o Tribunal concluir, em face dos factos dados como provados, que a proposta apresentada não era razoável no que toca às perdas salariais sofridas pelo A.
LXXXI- E não pode por duas razões:
- a primeira porque o Tribunal desconhece – ou não deu como provado ou não provado- qual era a informação de que dispunha a Ré quanto à extensão dessas perdas salariais na altura em que apresentou a proposta
- a segunda porque ignora o Tribunal qual a parcela dos 4.500,00€ propostos que respeita à indemnização por perdas salariais.
LXXXII- Não dispondo o Tribunal destas informações, nunca poderia ter condenado a Ré a pagar ao A juros no dobro da taxa legal, na exacta medida em que não está provado que essa proposta não contemplasse a totalidade dos danos passíveis de quantificação.
LXXXIII- Deve, pois, ser revogada, nesta parte, a douta sentença, absolvendo-se a Ré dessa parte do pedido.
LXXXIV- E mesmo que assim não se entendesse sempre se imporia, nos termos do disposto no artigo 662ºn.º 2 alínea c) do CPC a anulação da decisão proferida quanto à matéria de facto e a ampliação da matéria de facto, tendo em vista apurar os factos alegados pela Ré nos artigos 74º, 75º, 76º, 77º, 78º, 83º e 87º da contestação da Ré e, em particular:

-qual a informação e conhecimento que tinha a Ré quanto à extensão das perdas salariais do A aquando da apresentação da proposta de indemnização no valor de 4.500,00€;
- se no valor de 4.500,00€ proposto pela Ré está incluída uma parcela de perdas salariais e qual o seu valor.
LXXXV- A norma do artigo 38º n.º 3 do DL 291/2007, prevê o pagamento de juros em dobro sobre a diferença entre o montante oferecido e o montante fixado na decisão judicial, contados a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nas disposições identificadas no n.º 1 até à data da decisão judicial ou até à data estabelecida na decisão judicial.
LXXXVI- Desconhecendo o Tribunal qual o valor proposto a título de perdas salariais (só sabemos que a proposta final foi de 4.500,00€) não poderia assumir que nada foi oferecido.
LXXXVII- O Tribunal não dispunha, portanto, de elementos suficientes para proferir esta decisão, o que, atendendo às regras da distribuição do ónus da prova, sempre imporia a absolvição da Ré do pedido.
LXXXVIII- Ou, quando muito, restaria a aplicação do artigo 662ºn.º 2 alínea c) do CPC, com a consequente anulação da decisão proferida quanto à matéria de facto e a ampliação da matéria de facto, tendo em vista apurar qual o montante proposto a título de perdas salariais.
LXXXIX- E, apurado esse facto, a Ré só poderia ser condenada a pagar juros sobre a diferença entre o valor que se viesse a apurar ter sido oferecido a título de perdas salariais e o valor fixado na decisão, por ser isso mesmo que determina o artigo 38º n.º 3 do DL 291/2007.
*
O Autor interpôs recurso subordinado, terminando com as seguintes

Conclusões

1) A Douta Sentença, padece de um erro de cálculo, na medida em que deveria ter condenado a Ré a pagar ao autor a quantia global de €38.218,07 (trinta e oito mil, duzentos e dezoito euros e sete cêntimos) (1.719,60+250,00+20.000,00+ 16.248,47= €38.218,07) e não €37.218,07 como consta da mesma.
2) O Autor, não concorda com a absolvição e a não condenação da Ré, em pagar ao Autor juros de mora no dobro da taxa legal prevista.
3) O Autor não concorda com o momento a partir do qual são devidos juros de mora - à taxa legal ou em dobro da taxa legal prevista - sobre as indemnizações concedidas ao Autor a título de danos patrimoniais e danos não patrimoniais.
4) A soma das verbas em que a Ré foi condenada a pagar ao Autor a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, perfaz o valor de €38.218,07 (trinta e oito mil, duzentos e dezoito euros e sete cêntimos) (1.719,60+250,00+20.000,00+ 16.248,47= €38.218,07) e não €37.218,07 como consta da mesma.
5) Assim, e sem prejuízo da procedência das outras questões suscitadas com o presente recurso Subordinado do Autor, a decisão final constante da Douta Sentença, deverá ser corrigida passando a mesma ter o seguinte teor: “

Em face do exposto julgo parcialmente procedente por provada a presente ação e consequentemente condeno a ré a pagar ao autor a quantia global de €38.218,07 (trinta e oito mil, duzentos e dezoito euros e sete cêntimos) (1.719,60+250,00+20.000,00+ 16.248,47) acrescida de juros em dobro sobre a quantia de 1.719,60 entre a data de 14.11.2012 e a da presente sentença, e de juros legais desde a data da presente sentença e até pagamento integral sobre a quantia globalmente fixada.”
6) O montante indemnizatório proposto pela Ré ao Autor, nos termos da proposta razoável e por conta de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que advieram para o Autor em consequência do acidente de viação descrito nos presentes autos, atentas as lesões sofridas e as sequelas atuais de que o Autor padece e no montante de €4.500,00, salvo o devido respeito, é assim manifestamente insuficiente e gera um desequilíbrio significativo em desfavor do lesado”.
7) Por conta dos danos patrimoniais e não patrimoniais, a Ré, em sede extrajudicial, apresentou por escrito ao Autor proposta consolidada de indemnização final no valor global de 4.500,00€
8) Tal proposta - no valor global de 4.500,00€ - não discriminou os valores propostos a titulo danos patrimoniais e os valores propostos a título de danos não patrimoniais.
9) Existe uma diferença enorme entre o valor da proposta da Ré e o valor da condenação final no que diz respeito aos Danos Patrimoniais e Danos Não Patrimoniais sofridos pelo Autor em consequência do acidente em discussão nos presentes autos, bastando comparar o valor proposto pela Ré de €4.500,00 versus o valor global €38.218,07 de condenação na 1.ª instância (1.719,60+250,00+20.000,00+ 16.248,47= €38.218,07), para chegarmos à flagrante diferença de €33.718,07 (€38.218,07 -€4.500).
10) É por demais evidente que a Ré não cumpriu o disposto no artº 36º do DL 291/07 porquanto a proposta para ressarcimento dos danos sofridos não constitui “proposta razoável“.
11) Da mera comparação com o valor da indemnização a que se chegou em 1.ª instância, se retirará que efetivamente a proposta feita pela Ré não constitui um valor razoável de ressarcimento dos danos, ou seja, o confronto entre os dois valores revelará uma flagrante desproporção entre o valor da proposta e o valor devido ao autor, gerando um desequilíbrio significativo em desfavor do lesado, podendo considerar-se o montante da proposta, manifestamente insuficiente, nos termos daqueles n.°s 3 e 4 do artigo 38.° do DL 291/2007.
12) Os factos - lesões e sequelas - que serviram de base a proposta da Ré são exatamente os mesmos que estiveram na base da condenação do tribunal em 1ª instância, sendo irrelevante que tenham sido classificados ou interpretados de maneiras diferentes (é essa, alias, a razão pela qual os valores são diferentes).
13) Não releva a forma como a Ré quantificou os danos, porque o que releva, uma vez mais, objetivamente, são os factos e esses já existiam quando a Ré fez a sua proposta.
14) Este normativo visa, claramente, desincentivar o oferecimento por parte das seguradoras de valores muito abaixo dos devidos, o que, infelizmente, acontece de forma muito generalizada.
15) Assim sendo e pela apresentação por parte da Ré ao Autor de uma proposta manifestamente insuficiente e não razoável, deve ser a Ré condenada no pagamento ao Autor dos juros no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre a diferença entre o montante oferecido pela Ré (€4.500,00) e o montante que vier a ser fixado na decisão judicial, contados a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nas disposições identificadas no 39º, n.º 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 291/2007, e até à data da decisão judicial ou até à data que vier a ser estabelecida na decisão judicial, ou desde a data da sua citação e até efetivo e integral pagamento.
16) O Autor não concorda que relativamente aos juros de mora - à taxa legal ou em dobro da taxa legal prevista - devidos sobre os montantes das indemnizações que lhe foram concedidas a título de danos patrimoniais e a titulo de danos não patrimoniais, os mesmo sejam devidos apenas desde a data da sentença e até efetivo pagamento.
17) Com efeito, o Autor não concorda que as indemnizações que lhe foram concedidas a título de danos patrimoniais e a título de danos não patrimoniais, vençam juros de mora - à taxa legal ou em dobro da taxa legal prevista – apenas desde a data da prolação da sentença e até integral e integral pagamento.
18) O Autor, entende que pela apresentação de uma proposta por parte da Ré ao Autor manifestamente insuficiente e não razoável deve ser a Ré condenada a pagar ao Autor juros de mora no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre a diferença entre o montante oferecido (€4.500,00) e o montante que venha a ser fixado na decisão judicial final, contados a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nas disposições identificadas no 39º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 2917/2007, ou seja, desde 14-11-2012 (dado que o termo do prazo de 15 dias, quer após a data alta clínica atribuída pela própria Ré ao Autor, quer após a realização do relatório de avaliação clínica de efetuado pelo própria Ré ao Autor em 29/10/2012 ocorreu a 14/11/2012) e até efetivo e integral pagamento da quantia globalmente fixada.
19) Subsidiariamente e para a hipótese de V.Ex.as entenderem, que os juros de mora - à taxa legal ou em dobro da taxa legal prevista - e relativos aos montantes das indemnizações que lhe foram concedidas a titulo de danos patrimoniais e a titulo de danos não patrimoniais, não são devidos desde 14-11- 2012, entende o Autor, que os juros mora - à taxa legal ou em dobro da taxa legal prevista- e relativos aos montantes das indemnizações que lhe foram concedidas a titulo de danos patrimoniais e a titulo de danos não patrimoniais, são devidos desde a citação da Ré e até efetivo e integral pagamento da quantia globalmente fixada.
20) Nos termos da Jurisprudência uniformizada pelo Acórdão do S.TJ. nº 4/2002, de 9/5/2002 (in DR, I-A de 27/6/2002), sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do artº 566º nº 2 do Código Civil, vence juros de mora por efeito do disposto nos artºs. 805º nº 3 (interpretado restritivamente) e 806º nº1 do Código Civil, a partir da decisão actualizadora e não a partir da citação.
21) Deste Acórdão uniformizador resulta, tendo em conta o seu conteúdo e o das alegações de recurso sobre as quais se pronunciou, a ideia de uma decisão actualizadora da indemnização em razão da inflação no período compreendido entre ela e o momento do evento danoso causador do dano, sob a invocação do artº 566º nº 2 do Código Civil, que consagra o critério derivado do confronto da efectiva situação patrimonial do lesado na data mais recente atendível pelo tribunal e a que teria nessa data se não tivesse ocorrido o dano.
22) A prolação da decisão actualizadora tem que ter alguma expressão nesse sentido, designadamente a referência à utilização no cálculo do critério chamado da diferença na esfera jurídico-patrimonial constante no artº 566º nº 2 do Código Civil e à consideração, no cômputo da indemnização ou da compensação, da desvalorização do valor da moeda.
23) O Tribunal da primeira instância, quanto às indemnizações devidas ao Autor referiu, em sede de fundamentação de Direito, apenas referiu que “Donde que carece de direito nesta parte aos reclamados juros em dobro, tanto mais que os respetivos montantes foram atualizados à data desta sentença.
24) A Autor formulou um pedido de condenação no pagamento de juros em dobro da taxa legal prevista desde o dia seguinte ao final dos prazos previstos nas disposições identificadas no 39º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007, ou seja, desde 14-11-2012 (dado que o termo do prazo de 15 dias, quer após a data alta clínica atribuída pela própria Ré ao Autor, quer após a realização do relatório de avaliação clínica de efetuado pelo própria Ré ao Autor em 29/10/2012 ocorreu a 14/11/2012) ou subsidiariamente desde a data da citação da Ré, não tendo peticionado a sua actualização com base na taxa de inflação, pelo que se entende que renunciou à actualização monetária.
25) Da leitura da decisão de 1ª instância, verifica-se que a mesma teve em conta a referência temporal à data da sentença, sem qualquer actualização.
26)Pese embora se tenha expressamente referido, na sentença, que tais montantes foram actualizados, a verdade é que, na fundamentação, não se mostra reflectido, no cálculo efectuado sobre os danos patrimoniais futuros e na fixação da compensação dos danos não patrimoniais, o factor da desvalorização da moeda no período compreendido entre o acidente e a data da decisão.
27) Em consequência, os juros mora - à taxa legal ou em dobro da taxa legal prevista - e relativos aos montantes das indemnizações que foram concedidas ao Autor a título de danos patrimoniais e a título de danos não patrimoniais, são devidos e devem ser contados desde a citação da Ré para a presente ação e até efetivo e integral pagamento.
*
Contra-alegou a Ré, concluindo que:

I-A soma das parcelas indemnizatórias atribuídas na douta sentença ascende a 38.217,87€, pelo que existe, de facto, um erro de cálculo;
II- Todavia, a correcção desse erro poderá tornar-se desnecessária caso venha a ser dado provimento ao recurso que a recorrida interpôs enquanto recorrente, no qual defende a alteração do quantum indemnizatório;
III- Não são devidos juros em dobro da taxa legal relativamente a qualquer uma das verbas indemnizatórias fixadas, ou daquelas que venham a ser atribuídas;
IV- Da conjugação do disposto nos números 1, alínea c) e 3 do artigo 37.º do DL 291/2007 resulta que a seguradora só está obrigada a apresentar uma proposta de indemnização quanto aos danos relativamente aos quais o lesado tenha apresentado, na fase extra-judicial, um pedido de indemnização e sejam quantificáveis.
V- Não tendo o A formulado o indispensável pedido de indemnização- ou, pelo menos, não tendo sido alegado e provado que o tenha feito - não estava a Ré constituída na obrigação de apresentar uma proposta de indemnização, pelo que não se pode falar na sua manifesta irrazoabilidade, nem são devidos juros em dobro da taxa legal;
VI-Ainda que assim não se entendesse, a norma na qual o A funda a sua pretensão (artigo 38.º nº 3 do DL 291/2007) só seria aplicável se se verificasse a previsão do artigo 39º nº. 2 do mesmo diploma, isto é, se a Ré tivesse deixado de cumprir as prescrições estabelecidas nos números 1, alínea c) e 2 do artigo 37º do mesmo diploma.
VII-A Ré teria incumprido a obrigação estabelecida no número 1, alínea c) do artigo 37º (abrindo a porta à aplicação da regra do artigo 38º nº.3 do DL291/2007), se decorridos 45 dias após o pedido de indemnização, não tivesse apresentado uma proposta, estando a responsabilidade assumida e sendo o dano quantificável.
VIII-No caso, não há pedido de indemnização, nem o A alegou que o dano fosse, ao fim desses 45 dias, quantificável, pelo que não se pode considerar que essa disposição não foi cumprida.
IX-Pelo que, manifestamente, não se verificou o incumprimento das prescrições da norma do artigo 37º n.º 1 alínea c) do CPC, pelo que não é, por essa razão, aplicável a norma do nº. 3 do artigo 38.º.
X-Relativamente às prescrições do nº 2 do artigo 37º, provou-se que a Ré não só apresentou ao A uma proposta provisória como pagou ao demandante a indemnização devida pelos danos quantificáveis até à data (cfr pontos 11 e 12 dos factos provados), pelo que não foi violada a prescrição da alínea a) desse norma;
XI-A Ré teria, por outro lado, violado a regra da alínea b) do nº 2 do artigo 37º do DL 291/2007 se, tendo o A aceite a proposta provisória, a Ré não tivesse apresentado uma proposta consolidada no prazo de 15 dias contados do conhecimento do relatório de alta clínica ou da data em que os danos fossem quantificáveis.
XII-Não releva para o efeito do cumprimento ou não dessa norma se a proposta era razoável, mas, tão só, se foi ou não apresentada no prazo aí fixado.
XIII-O A não alegou a data em que a Ré apresentou a proposta (cfr artigo 122º da sua PI) e, muito menos a data em que a demandada teve conhecimento do relatório de alta clínica, ou aquela em que dano deva considerar-se como totalmente quantificável, pelo que, manifestamente, não é possível concluir pela verificação de qualquer incumprimento dos prazos estabelecidos na lei.
XIV-Não sendo estes factos conhecidos – mas sabendo-se que foi apresentada uma proposta - não se pode concluir que a Ré não observou os prazos legais – sem esquecer que estes só começariam se o A tivesse deduzido um pedido de indemnização- pelo que não é aplicável o nº 3 do artigo 38º do DL 291/2007, nem devidos juros em dobro da taxa legal.
XV-A proposta apresentada pela Ré baseou-se nas regras do DL 291/2007 e a avaliação do dano corporal foi feito nos termos substanciais e procedimentais previstos no sistema de avaliação e valorização dos danos corporais, com observação do sinistrado e exame de todos os elementos clínicos disponíveis (cfr ponto 35 dos factos provados e documento nº 18 junto com a PI)
XVI-Cabia ao A provar que a proposta foi apresentada em termos substanciais e procedimentos distintos dos previstos no sistema de avaliação e valorização de Incapacidade Permanente em Direito Civil, factos que não alegou, nem provou.
XVII-Assim, nos termos do disposto no artigo 39º n.º 3 do DL 281/2007, nunca poderia a Ré ser condenada no pagamento de juros em dobro da taxa legal sobre qualquer uma das quantias arbitradas, antes sendo devidos juros nos termos dessa disposição legal.
XVIII-E mesmo que se entendesse que cabia à Ré a prova de que a proposta foi apresentada nos termos substanciais e procedimentais previstos na no sistema de avaliação e valorização dos danos corporais por utilização da Tabela Indicativa para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, o certo é que esses factos foram alegados pela demandada na sua contestação, sem que o Tribunal se tenha pronunciado sobre os mesmos (cfr artigos 74º, 75º, 76º, 77, 78, 83º e 87º da contestação), pelo que sempre se imporia a anulação da decisão quanto à matéria de facto, tendo em vista a sua anulação, nos termos o que, adiante e no âmbito da ampliação do objecto do recurso, se invocará.
XIX-Mesmo que assim não se entendesse, e sem prejuízo do que acima se disse e sem de forma alguma conceder, a Ré só poderia estar obrigada a apresentar uma proposta de indemnização tendo por base os danos do A que fossem quantificáveis à data da sua apresentação.
XX-O A não alega qualquer facto que permita concluir que a Ré conhecia a extensão dos seus danos (nomeadamente quanto a perdas salariais, dano biológico e quantum doloris), a ponto de se poder afirmar que poderia quantifica-los e apresentar uma proposta de indemnização diferente da que formulou.
XXI-Assim, não resulta da douta sentença que a Ré tenha podido quantificar os danos que vieram a ser apurados e indemnizados nessa decisão.
XXII-Logo, não se pode concluir que a proposta apresentada não fosse razoável em face dos elementos de que dispunha a Ré quanto a apresentou.
XXIII-Era essencial à procedência do pedido que o A formula relativo a juros em dobro que o A tivesse alegado que a Ré tinha conhecimento dos danos sofridos e que os poderia ter quantificado em montante superior ao que ofereceu.
XXIV-Estando ausentes da matéria de facto dada como provada tais factos constitutivos e essenciais à procedência deste pedido do A., deve o mesmo improceder.
XXV-Ainda que assim não se entendesse, não está provado que a Ré soubesse que o A despendeu a quantia de 250,00€ em despesas médicas (facto que o A não alegou), pelo que nunca poderia ter apresentado uma proposta que contemplasse essa despesa.
XXVI-Na ausência de pedido de indemnização apresentado pelo A e de acordo com os artigos 3º e 4º da portaria 377/2008, de 26 de Maio, alterada pela portaria 679/2009, de 25 de Junho, os danos indemnizáveis do A e quantificáveis pela Ré resumiam-se a, no máximo: dano biológico de 3 pontos, quantum doloris de 4 pontos, perdas salariais.
XXVII-As regras dessas portarias não visam estabelecer o exacto valor das indemnizações devidas ao sinistrado em caso de acidente viário – se assim fosse os Tribunais segui-las-iam–mas antes determinar quais os danos que devem ser contemplados na proposta e os critérios que devem ser seguidos na sua quantificação.
XXVIII-Quanto às perdas salariais a informação de que a Ré dispunha aquando da apresentação da proposta era a de que o período de incapacidade temporária se tinha estendido entre 09/07/2012 e 17/09/2012 e entre 01/10/2012 e 29/10/2012.
XXIX-Em face dessa informação a Ré apresentou uma proposta de 1.408,78€, que correspondia, exactamente, ao valor das perdas salariais do demandante;
XXX-Aliás, como se evidenciou no âmbito do recurso que a ora recorrida interpôs como recorrente, esse valor era tão razoável que o próprio A, no início da audiência de discussão e julgamento, reduziu o seu pedido para esse montante, assim atestando a sua razoabilidade!
XXXI-Contemplando a proposta apresentada pela Ré ao A uma indemnização por perdas salariais de 1.408,78€, constataríamos que o valor da indemnização proposta pela Ré ao A integraria, pelo menos, os seguintes valores: perdas salariais: 1.408,78€; - Dano biológico: 2.554,74€; - quantum doloris: 536,48€
XXXII-E mesmo considerando perdas salariais de 1.719,60€, as parcelas da indemnização proposta ascenderiam, pelo menos, a: -perdas salariais: 1.719,60€; Dano biológico: 2.554,74€; quantum doloris: 225,66€.
XXXIII- Isto é, seja em que circunstância for, a proposta apresentada pela Ré correspondia à aplicação dos critérios definidos pelas portarias 377/08 e 679/09, sendo, portanto, razoável e adequada aos danos conhecidos pela Ré e até então quantificáveis.
XXXIV- De referir que não resulta dos autos que a Ré tivesse conhecimento de quaisquer circunstâncias que permitissem considerar especialmente graves os danos sofridos pelo A pela sua incapacidade permanente ou pelo quantum doloris a ponto de se justificar a atribuição dos valores máximos previstos naquela portaria.
XXXV- Assim, é manifesto que, no que toca aos danos quantificáveis, a Ré formulou uma proposta que a própria lei considera ser razoável, porque fixada de acordo com os critérios definidos nos indicados diplomas.
XXXVI- Pelo que não são devido juros ao dobro da taxa legal.
XXXVII- Seja como for, ainda que assim não se entendesse, nunca poderia o Tribunal considerar, com base nos factos dados como provados, que a proposta apresentada não era razoável.
XXXVIII- Para se concluir que a proposta apresentada não foi razoável seria necessário que:- o Tribunal tivesse indagado quais os danos do A de que a Ré tinha conhecimento quando apresentou a proposta de seguro e poderia quantificar (nomeadamente qual a duração do período de incapacidade temporária, qual o dano biológico e quantum doloris); - quais as parcelas que compõem o montante de 4.500,00€ oferecido pela Ré.
XXXIX- Tais factos fora alegados pela Ré nos artigos 74º, 75º, 76º, 77º, 78º, 83º e 87º da sua contestação, sem que o Tribunal sobre os mesmos se tenha pronunciado;
XL- Assim, sempre se imporia, em face do disposto no artigo 662ºn.º 2 alínea c) do CPC, a anulação da decisão proferida quanto à matéria de facto e a ampliação da matéria de facto, tendo em vista apurar os factos alegados pela Ré nos artigos 74º, 75º, 76º, 77º, 78º, 83º e 87º da contestação da Ré e, em particular os factos acima enunciados, sem os quais não é possível proferir uma decisão justa sobre a matéria em questão, o que, subsidiariamente, se requer.
XLI- Mesmo que se entendesse ser aplicável ao caso a regra do artigo 38.º nº 3 do DL 291/2007 – e entendemos que não é – os juros seriam devidos desde 15 dias após “a data do conhecimento pela empresa de seguros do relatório de alta clínica, ou da data a partir da qual o dano deva considerar-se como totalmente quantificável, se posterior” (cfr artigo 37º n.º 2 alínea b) do mesmo diploma).
XLII- O A não alegou que a Ré tenha tido conhecimento do relatório de alta clínica 15 dias antes do dia 14/11/2012, ou o que dano fosse então totalmente quantificável.
XLIII- Portanto, não se tendo provado que a Ré pudesse quantificar totalmente os danos em data anterior à da citação, só desde esse acto poderiam serão devidos juros ao dobro da taxa legal, até à data da decisão.
XLIV- De referir que, como se colhe do Documento nº 9 junto com a contestação, o próprio relatório de avaliação do dano corporal que foi feito a pedido da Ré foi elaborado em data posterior à de 14/11/2012, o que revela, desde logo, que não tem sustentação factual a pretensão do A.
XLV- Seja como for, ainda que se entendesse que está ao alcance do Tribunal, através de uma indagação oficiosa, suprir a omissão de alegação do A quanto à data em que a Ré teve conhecimento do relatório de alta clínica, ou a data a partir da qual o dano deve considerar-se como totalmente quantificável, sempre se imporia a anulação da decisão de facto tendo em vista a sua ampliação, nos termos do disposto no artigo 662ºn.º 2 alínea c) do CPC.
XLVI- E, nesse caso, deveria ser apurado quando foi emitido o aludido relatório ou quando se deve considerar que o dano era totalmente quantificável e só então ser proferida a decisão final sobre esta questão.
XLVII-Na douta sentença sob censura a meritíssima Srª Juiz procedeu a uma actualização das indemnizações e compensações arbitradas.
XLVIII- Pelo que nunca poderia ser devidos juros desde a citação, mas antes desde a data da douta sentença.

Ampliação do objecto do recuro

XLIX-Os factos alegados pela Ré nos artigos 74.º, 75.º, 76.º, 77.º, 78.º, 83.º e 87.º da sua contestação eram relevantes para a decisão a proferir quanto à exigibilidade de juros em dobro e sobre os mesmos não se pronunciou o julgador;
L- Para que se pudesse concluir que a Ré apresentou uma proposta não razoável era necessário apurar os pressupostos nos quais baseou a sua proposta e as componentes indemnizatórias dessa proposta;
LI- Em face do exposto, a título meramente subsidiário e apenas na hipótese de se entender que o conhecimento dessa questão é necessário, a Ré invoca a nulidade da douta sentença por omissão de pronúncia quanto à indicada factualidade, nulidade essa que, expressamente, se invoca, nos termos do disposto no artigo 615º n.º 1 alínea d) do CPC.
LII- Devendo, caso venha a proceder a invocada nulidade, o processo regressar à primeira instância para que a Meritíssima Srª Juiz se pronuncie sobre esses factos e profira nova decisão à luz do que vier a decidir sobre essa matéria.
*
O tribunal a quo pronunciou-se sobre o lapso apontado (determinando a rectificação do valor de €1.719,60 para 1408,78€ relativo a perdas salariais e a eliminação do ponto 17, resultante de lapso) e nulidades da seguinte forma, que se resume :

-a matéria de facto invocada nos artigos 33 a 38 da contestação versa sobre o cálculo que a ré fez sobre o que constitui a retribuição líquida do autor e respectivos subsídios, sendo impugnação motivada; tendo sido plasmada a versão do autor no ponto 38 seguido de motivação, em conformidade com o ónus da prova, não existe omissão de pronúncia;
--as mesmas razões que se prendem com o ónus da prova são igualmente válidas para o tribunal não se ter pronunciado sobre os factos alegados nos arts. 74.º a 76.º da contestação, sendo que os factos 83.º e 87.º são conclusivos e o facto 78.º no que interessa foi considerado no art.º 18.º da sentença;
-A motivação dos factos 1 a 18 da sentença assente na confissão e nos documentos juntos e não impugnados, não se exigindo uma motivação exaustiva;
-A razoabilidade resulta do valor da proposta em confronto com o valor apurado, sendo que o primeiro foi levado à matéria a assente.
+
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II- Delimitação do Objecto do Recurso

As questões a apreciar, delimitadas pelas conclusões dos recursos, são, essencialmente, as seguintes:
--Das nulidades da sentença e rectificação de lapso no cálculo efectuado;
--Da alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto;
--Do quantum da indemnização a título de danos não patrimoniais e dano patrimonial futuro;
--Dos juros em dobro e a data a partir da qual são devidos.
*
Das Nulidades

É nula a sentença quando, além do mais, o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar-cfr. art. 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte do C.P.Civil.
Este vício, meramente formal de omissão de pronúncia, está estritamente conexionado com o princípio do dispositivo.
Como corolário do princípio do dispositivo, o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras—v. art. 660.º, n.º 2 do C.P.Civil.
A questão para efeito de julgamento alicerça-se na causa de pedir (factos concretos que sustentam o pedido) e/ou nas excepções invocadas pelo réu. (2)
Decorre destes esclarecimentos que não se pode confundir, por isso, a decisão sobre questões com os factos dados como assentes ou não no processo.
Insurge-se a Ré por não constar da matéria de facto, dada como provada ou não provada, os factos alegados nos art.ºs 33.º, 34.º, 35.º, 37.º e 38.º da contestação, considerada relevante para o desfecho da lide, nomeadamente para o cálculo das perdas salariais do demandante (e eventualmente para o cálculo da indemnização por danos futuros), os factos dos art.ºs 13.º e 14.º (patologias lombares prévias) e art.ºs 74.º a 78.º, 83.º e 87.º (sobre a proposta da Ré).
Em bom rigor, não se trata de um vício formal resultante da não pronúncia sobre questões, com o sentido jurídico acima assinalado, mas tão só de tal matéria não ter sido atendida, por se considerar mera impugnação motivada.
A discordância sobre a (falta) de julgamento dessa matéria fáctica deverá ser apreciada em sede de impugnação da decisão proferida sobre os factos considerados pertinentes para as soluções jurídicas decorrentes da lei aplicável.
É nula a sentença quando nomeadamente não especifique os fundamentos de facto e de direito que justifiquem a decisão ou condene em quantidade superior do pedido—cfr. artigo 615.º, n.º 1, als.b) e e), do C.P.Civil.
Deve ainda declarar quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção (cfr. n.º 4 do art. 607.º do C.P.Civil).
Tem sido entendido, de forma reiterada e unânime pela doutrina e jurisprudência, que este vício (falta de fundamentação) só existe no caso de se verificar uma absoluta e total falta de fundamentação, quer ao nível do quadro factual apurado quer no que respeita ao respectivo enquadramento legal.

Assim, a sentença que contenha uma deficiente, incompleta ou não convincente fundamentação (3) não enferma deste vício.
Trata-se, portanto, de um vício de natureza meramente formal (omissão total da discriminação dos factos e/ou das normas jurídicas aplicáveis) e não substancial.
Como se sabe, a fundamentação da decisão permite aos destinatários a compreensão do sentido da decisão e a reapreciação da causa, em caso de recurso. (4)
No caso em apreço, a decisão expôs, os fundamentos em que se alicerçou, indicando os meios probatórios que foram ponderados na apreciação global.
Por último, afigura-se-nos existir manifesto lapso de escrita no ponto 36 por se ter consignado a escala 3/7 ao invés de 2/7, na medida em que foi baseda no relatório de fls. 369, determinando-se essa rectificação.
Assim sendo, não se verificam as apontadas nulidades.
*
Da modificabilidade da decisão de facto

Nos termos do artº. 662º. do Código de Processo Civil a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. (negrito nosso)

Assim, sem prejuízo de uma valoração autónoma dos meios de prova utilizados pelo tribunal (5) e ainda de outros que se mostrarem pertinentes, essa operação não pode nunca olvidar os princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas.
Discorda a Recorrente da decisão que julgou a matéria constante dos pontos 19, 20, 24, 27, 33, 36, 39 e 42, censurando ainda a resposta ao ponto 16, por falta de fundamentação.
Analisemos.
Começando pelo ponto 16 (O Autor gastou em exames clínicos a quantia de 250,00€), não assiste razão à Recorrente porquanto em audiência de julgamento ficou consignado o seguinte:

A Autor e Ré estão de acordo em dar por assente o vertido no artigo 50.º da contestação e no ponto 89 da petição inicial da seguinte forma : O Autor suportou com a avaliação do dano corporal, que juntou ao articulado inicial, o montante de € 250,00.
A avaliação do dano corporal, em resultado do acidente de que o Autor foi vítima, pressupõe um exame clínico por parte do médico que o observou.
A Recorrente considera incorrectas as respostas constantes dos pontos 19 e 20 uma vez que a suspeita de fractura do membro inferior (tíbia) do Autor não se confirmou, tendo sido corrigido o diagnóstico.
No ponto 19 deu-se como provado que : O Autor foi assistido no SU do CHM AVE, E.P.E no dia 09-07-2012, pelas 22h44m, apresentando:
Traumatismo direito na face interna do joelho direito,
Fratura da cortical proximal da tíbia.
E no ponto 20 que: Realizou Estudo Radiológico, que evidenciou fratura da cortical proximal da tíbia tendo-lhe sido colocada tala gessada no membro inferior direito (imobilização do joelho e pé).
Esta factualidade baseou-se na documentação clínica (cfr. fls. 45, 48, 51 e 71), como se refere na fundamentação da sentença a fls. 405 verso, pelo que está absolutamente correcta.
Questão diferente é a de saber se o diagnóstico inicial de suspeita de fractura da tíbia foi confirmado.
Resulta do documento de fls. 51, que, após ter realizado RX, não se confirmou essa lesão, o que, naturalmente, foi ponderado e avaliado no relatório pericial junto aos autos.
No que concerne aos factos insertos no ponto 24 (O Autor, após a sua alta hospitalar, manteve Lombalgia e omalgia, intensa e incapacitante), o tribunal a quo baseou-se no documento de fls. 71, subscrito pelo médido especialista em ortopedia, Cruz de Melo, que observou o Autor e declarou que mantinha essa sintomatologia.
Apesar de ter sido impugnado pela Ré, mantém-se essa resposta, por se tratar de um documento clínico, sujeito à livre apreciação do tribunal, inexistindo razões ponderosas para não a confirmar.
Aliás, no documento junto a fls. 146 pela Recorrente, subscrito pelo médico dos seus serviços clínicos, faz-se referência que, 29 de Outubro de 2012, dia em que lhe foi dada alta, o Autor mantinha dores a nível lombar, joelho direito e ombro direito.
Pretende a Recorrente a eliminação dos pontos 27 (No dia 11-09-2012 realizou um RX que evidenciou: Escoliose Dorso-lombar de grande convexidade esquerda) e 33 (No dia 22-10-2012 realizou uma RM lombar que evidenciou : “ ...discreta rotação dos corpos vertebrais para a esquerda...) por não estarem relacionados com o acidente.
O nexo causal entre determinadas lesões e o acidente constitui uma questão distinta das lesões evidenciadas pelos meios complementares de diagnóstico, pelo que se mantêm tais respostas, sendo certo, como refere a Recorrente e bem, a situação clínica do Autor nomeadamente as lesões consideradas prévias ou/e não relacionadas como evento traumático foram tomadas em consideração na avaliação do dano corporal. Daí ser desnecessária a inclusão dos factos indicados, nesse sentido, pela Ré nos arts. 13.º e 14.º da contestação.
Relativamente ao ponto 38 (6), a Recorrente entende que não está em conformidade total com os recibos juntos aos autos e sugere uma nova redacção, que contemple a retribuição líquida e ilíquida nos meses em que recebia subsídio de alimentação bem como naqueles que não o auferia, o que nos parece correcto.

Assim, face aos elementos documentais constantes do processo o ponto 38 passa a ter a seguinte redacção : O Autor auferia uma retribuição ilíquida de € 746,25 e de € 605,32 e líquida de € 651,22 e de € 526,63 respectivamente nos meses em que recebia ou não subsídio de alimentação discriminado da forma seguinte :

1. 488,00€ a título de vencimento base mensal x 14 meses
2. 1117,23€ a título de subsídio de Turno x 14 meses
3. prémio de zelo variável e incerto
4. 141,02€ a título de subsídio de alimentação x 11 meses.
Não concorda igualmente com a prova dos factos vertidos nos pontos 39 (Em consequência das lesões e sequelas supra referidas, o Autor, padece atualmente de alterações de humor, do sono e alterações afectiva) e 42 (Tornou-se uma pessoa triste, deprimida, angustiada, sofredora, insegura, infeliz inibido e diminuído fisicamente e esteticamente muito nervosa, receosa de que o seu estado de saúde piore).
Para tanto, referiu que, em face do teor do relatório pericial de fls 366 e seguintes e depoimento da testemunha Maria, não credível, na sua opinião, por ser esposa do Autor, deviam ter sido dados como não provados, ou, caso seja dada credibilidade à testemunha em causa, deve ser dado como demonstrado apenas que “Em consequência das lesões e sequelas supra referidas, o Autor tornou-se uma pessoa triste.”
O facto de a testemunha ser mulher do Autor se, por um lado, poderia ser considerada pouco credível atenta a natural parcialidade do depoimento, por outro, não há dúvida de que é a pessoa quem acompanhou o lesado e melhor do que ninguém pode relatar ao tribunal o estado psíquico do mesmo, antes e após o acidente, tendo, por isso, convencido o tribunal.
Ora, a testemunha relatou ao tribunal, com clareza e espontaneidade as lesões e sofrimento que o seu jovem marido padeceu, após o acidente, designadamente o gesso que lhe foi aplicado, as dores, os tratamentos dolorosos (infiltrações no joelho), a intensa tristeza e estado perturbado e depressivo por não poder jogar mais futebol com os amigos, conduzir durante muito tempo, receio de não conseguir brincar com os filhos que irá ter da forma como gostaria, pelo que não existem motivos ponderosos para alterar a decisão nesta parte, sob pena de violação do princípio da imediação e livre apreciação da prova.

Por último, sustenta a inclusão dos factos, por si alegados, relativos à apresentação da proposta extrajudicial nos artigos 74º, 75º, 76º, 77º, 78º, 83º, 87º da sua contestação.
Na sua óptica, para que se pudesse concluir que a Ré apresentou uma proposta não razoável era necessário apurar os pressupostos nos quais baseou a sua proposta e perceber ainda quais as2 componentes dessa mesma proposta, nomeadamente a título de perdas salariais, factos que foram alegados nesses artigos da contestação.
Afigura-se-nos que assiste razão à Recorrente na medida em que os factos por si alegados poderão ter interesse na decisão sobre a condenação da mesma no pagamento dos juros em dobro em resultado de se ter qualificado a proposta por si apresentada ao lesado como não sendo razoável.

Assim, acrescenta-se à matéria de facto dada como provada, com base na documentação junta aos autos nomeadamente o documento de fls. 154 os seguintes factos:

-“Depois de concluídos os tratamentos médicos aos quais foi o Autor sujeito, procedeu a Ré, através de médico, à avaliação das sequelas de acordo com a desvalorização pela Tabela do Direito Civil e com os exames auxiliares de diagnóstico, tendo-se concluído que :
-O A. apresentava sequelas às quais era atribuível uma desvalorização permanente de 3 pontos;
-Que o quantum doloris sofrido pelo Autor era avaliável em 4 pontos, numa escala de 1 a 7.
-Que os períodos de incapacidade temporária eram compreendidos entre 09/07/2012 e 17/09/2012 e 01/10/2012 e 29/10/2012.”
E, com base no documento junto a fls. 553, o ponto 18 passa a ter a seguinte redacção:

-“Em 15/02/2013, a Ré enviou ao mandatário do Autor a seguinte proposta final : “De acordo com a avaliação médica final (já na posse de V. Exa.), e tendo por base os pressupostos indemnizatórios vertidos na Portaria 377/2008, propomos o valor de €4.500,00 como total ressarcimento dos danos sofridos pelo cliente de V. Exa.”
*
III- FUNDAMENTAÇÃO
FACTOS

1. No dia 09 de Julho de 2012, pelas 21h30m, na Avenida Dr Mário Soares, n.º 2081 - EN 206, no lugar de Mato da Senra, junto à Escola Primária, freguesia de Joane, concelho de Vila Nova de Famalicão, distrito de Braga, ocorreu um acidente de viação (atropelamento) entre o veículo ligeiro de passageiros, matricula CL, propriedade e conduzido por Sofia e o peão Hugo aqui Autor.
2. O CL, seguia na EN 206 sentido Vila Nova de Famalicão/Guimarães, junto ao eixo da via.
3.O Autor quando fazia a travessia da EN 206 pela passadeira de peões ali existente e sinalizada para os condutores da EN, quer no pavimento como verticalmente, do lado direito para o esquerdo tendo já percorrido sensivelmente cerca de 3 metros foi atropelado pelo CL.
4. O CL embateu no autor com parte frontal esquerda.
5. O autor, por força do embate, foi projetado pelo ar para o seu lado direito cerca de 5/6 metros de distância caindo junto ao eixo da via da Estrada Nacional n.º 206, atento o sentido de marcha do CL.
6. O CL antes do embate deixou um rasto de travagem no piso com uma extensão de 5/6 metros (cinco/seis).
7. A EN no local onde ocorreu o atropelamento e atento o sentido de marcha do CL tem 100 metros de extensão, configuração plana, em forma de reta, sinalizada, nivelada, com boa visibilidade em relação à passadeira de peões.
8. O autor era visível e avistável no campo visual do CL a uma distância de 100 mt.
9.Aquando da ocorrência do acidente de viação a estava transferida para a Ré “Cia de Seguros X, S.A.”, a responsabilidade civil automóvel emergente de circulação rodoviária por contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, válido e eficaz, titulado pela apólice nº 0001534806.
10.O Autor nasceu em 25-02-1990.
11.A Ré procedeu ao pagamento de todas as despesas médicas e hospitalares junto das entidades hospitalares e médicas que prestaram tratamento médico e hospitalar ao Autor, designadamente ao Centro Hospitalar do Médio AVE, E.P.E. e “F. Fisioterapia e Reabilitação LDA.
12. A Ré procedeu ao pagamento ao Autor da quantia de 800,00€ a titulo adiantamentos salariais, a quantia de 84,00€ a título de despesas de deslocação e transporte, a quantia de 12,00€ a título de despesas medicamentosas e a quantia de 90,50€ a título de serviços hospitalares.
13. O Autor, por conta e a expensas da Ré foi acompanhado pelos seus serviços clínicos.
14. Foi assistido por conta e expensas da Ré na Clinica “ “F. Fisioterapia e Reabilitação LDA”, sita em, Braga.
15. As lesões estabilizaram em 29/10/2012.
16. O Autor gastou em exames clínicos a quantia de 250,00€ (Duzentos e Cinquenta Euros).
18. Em 15/02/2013, a Ré enviou ao mandatário do Autor a seguinte proposta final : “De acordo com a avaliação médica final (já na posse de V. Exa.), e tendo por base os pressupostos indemnizatórios vertidos na Portaria 377/2008, propomos o valor de €4.500,00 como total ressarcimento dos danos sofridos pelo cliente de V. Exa.”
19. O Autor foi assistido no SU do CHM AVE, E.P.E no dia 09-07-2012, pelas 22h44m, apresentando:
Traumatismo direito na face interna do joelho direito,
Fratura da cortical proximal da tíbia.
20. Realizou Estudo Radiológico, que evidenciou fratura da cortical proximal da tíbia tendo-lhe sido colocada tala gessada no membro inferior direito (imobilização do joelho e pé).
21. Teve alta hospitalar nesse mesmo dia, pelas 23h26m.
22. No dia 15-07-2012 voltou ao CHM AVE, E.P.E, por ter dores no calcanhar direito.
23. No dia 16-07-2012 voltou ao CHM AVE, E.P.E, em virtude de ter dores no membro inferior direito, devido a complicação com tala gessada (compressão do calcâneo, com flictena) e queimadura de 1.º grau.
24. O Autor, após a sua alta hospitalar, manteve Lombalgia e omalgia, intensa e incapacitante.
25. No dia 26-07-2012 o autor foi a consulta externa no CHM AVE, E.P.E, na qual foi solicitada TAC do joelho, que evidenciou imagem compatível com rotura do menisco interno, tendo sido proposto ao Autor a realização de artroscopia.
26. No dia 16-08-2012 foi a consulta externa no CHM AVE, E.P.E, tendo-lhe sido diagnosticado episódios de instabilidade do joelho direito e dor na interlinha da face interna.
27.No dia 11-09-2012 realizou um RX que evidenciou: Escoliose Dorso-lombar de grande convexidade esquerda.
28. No dia 12-09-2012 teve consulta externa no CHM AVE, E.P.E, visto tac com evidencia de lesão do menisco interno.
29.Após alta hospitalar, passou a locomover-se com ajuda de canadianas durante cerca de 1 (um) mês.
30. Na clinica F. foi-lhe diagnosticado gonalgia com clinica de bloqueio.
31. Foi assistido por conta e expensas da Ré tendo feito infiltração do joelho direito e tratamentos de Fisioterapia.
32. No dia 24-09-2012 realizou uma RM que evidenciou: “.. vestigial derrame articular Sem relevantes alterações....”
33.No dia 22-10-2012 realizou uma RM lombar que evidenciou : “ ...discreta rotação dos corpos vertebrais para a esquerda...” .
34. No dia 17-11-2012 realizou uma RM ao joelho direito que evidenciou: “ ...aumento da espessura da inserção do tendão do semimembranoso na vertente póstero -medial da epifise da tíbia, também com leve aumento da espessura do ligamento coronários na metade posterior do corpo do menisco interno; estas sequelas são compatíveis com sequelas de leão da inserção do semimembranos e do ligamento coronário....”
35. O Autor, em consequência das lesões sofridas com o acidente de viação descrito nos presentes autos, no dia 29-10-2012, foi submetido a um Relatório de Avaliação do Dano Corporal pelos Serviços Clínicos da Ré.
36. No dia 11-01-2013, foi submetido a uma perícia de avaliação do dano corporal em direito civil.

O Autor, teve:

a) défice funcional temporário 138 dias (período de repercussão temporária total da atividade profissional 113 dias + 25 dias de repercussão temporária parcial na atividade profissional)
b) Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica fixável em 3 pontos-Quantum doloris 4/7
-Repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer 2/7.
-Data da consolidação médico legal: 23.11.2012
37º O Autor exercia, as funções de “Porteiro/Rececionista” na “C.–Componentes para a Industria Automóvel S.A.”, trabalho esse predominantemente efetuado em pé e manualmente.
38. Auferia uma retribuição mensal ilíquida de (799,74€ x 14 meses – liquida 687,16) discriminado mensalmente da seguinte forma:
1. - 488,00€ a titulo de Vencimento Base Mensal,
2. - 117,23€ a título de Subsidio de Turno,
3. - 53,49€ a título de Prémio de Zelo, e
4. - 141,02€ a título de Subsidio de Alimentação (adm).
39.Em consequência das lesões e sequelas supra referidas, o Autor, padece atualmente de alterações de humor, do sono e alterações afectiva.
40.O Autor continuará a sofrer de fortes dores físicas, incómodos e mal-estar durante o resto da sua vida, as quais se exacerbam e agravam com as mudanças de temperatura e com os esforços.
41.O Autor, era uma pessoa saudável, dinâmica, expedita, diligente e trabalhadora, alegre, confiante, cheia de projetos para o futuro, cheia de vida, possuidora de uma enorme vontade e alegria de viver, sendo uma pessoa calma, amante da vida, confiante, detentora de um temperamento afável e generoso que lhe permitia bons relacionamentos com as outras pessoas.
42.Tornou-se uma pessoa triste, deprimida, angustiada, sofredora, insegura, infeliz inibido e diminuído fisicamente e esteticamente muito nervosa, receosa de que o seu estado de saúde piore.
43. O Autor não pode e não poderá no futuro praticar qualquer atividade e modalidade de desporto, que requeira movimento e qualquer outro tipo de funcionalidade dos membros inferiores, designadamente futebol, caminhadas e atletismo as quais fazia antes do acidente com regularidade.
44. Depois de concluídos os tratamentos médicos aos quais foi o Autor sujeito, procedeu a Ré, através de médico, à avaliação das sequelas de acordo com a desvalorização pela Tabela do Direito Civil e com os exames auxiliares de diagnóstico, tendo-se concluído que:

-O A. apresentava sequelas às quais era atribuível uma desvalorização permanente de 3 pontos;
-Que o quantum doloris sofrido pelo Autor era avaliável em 4 pontos, numa escala de 1 a 7.
-Que os períodos de incapacidade temporária eram compreendidos entre 09/07/2012 e 17/09/2012 e 01/10/2012 e 29/10/2012.
*
Factos não provados:

Na altura do acidente, o Autor sofreu angústia de poder a vir a falecer.
O Autor, necessita atualmente e necessitará no futuro, de efetuar vários exames médicos de diagnóstico e de aferição da consolidação das lesões e sequelas supra melhor descritas (art 69º da pi).
O Autor, necessita atualmente e necessitará no futuro, de acompanhamento médico periódico nas especialidades médicas de Ortopedia, Fisioterapia e Fisiatria para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
O Autor, necessita atualmente e necessitará no futuro, de realizar tratamento fisiátrico 2 (duas) vezes por ano, sendo que cada tratamento deverá ter a duração mínima de 20 sessões, para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
O Autor, necessita atualmente e necessitará no futuro, de ajuda medicamentosa –antidepressivos, anti-inflamatórios e analgésicos - para superar as consequências físicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
O Autor, terá necessidade no futuro de se submeter a várias intervenções cirúrgicas designadamente avaliação artroscópica do joelho direito, a vários internamentos hospitalares, de efetuar várias despesas hospitalares, de efetuar a vários tratamentos médicos e clínicos, de ajudas técnicas, de efetuar várias deslocações a hospitais e clínicas para tratamento e correção das lesões e sequelas melhor descritas.
O Autor, atualmente e diariamente necessita de descansar por vários períodos de tempo já que não consegue manter-se muito tempo de pé.
É previsível que o Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica (IPG) e a Incapacidade Permanente Parcial (IPP) se venham a agravar com o decurso dos anos, durante toda a sua vida e em função da atividade profissional do Autor à data do acidente de “Porteiro/Rececionista” e outras categorias profissionais semelhantes, tornando mais penoso o desempenho das suas tarefas diárias, sejam atividades domésticas, laborais, recreativas, sociais ou sentimentais e dificultando a sua produtividade e ascensão na carreira. (artigo 74)
As referidas lesões e sequelas numa escala crescente de 1 a 7 conferem ao Autor um “Dano Sexual” fixado no grau 2. (Artigo 105).
Em consequência das referidas lesões e sequelas, o Autor padece de diminuição da libido atendendo ao tipo de traumatismos sofridos, lesões e sequelas, as quais o prejudicam e interferem com a mobilidade no ato sexual em certas posições.
*
IV- DIREITO

Na temática referente à fixação do quantum indemnizatório do dano patrimonial futuro e da compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pelo lesado, a Ré discorda dos valores que foram fixados na sentença, considerando-os excessivos.
No que respeita ao designado dano biológico, a Recorrente sustenta que não ficou demonstrado que o Autor sofrerá, no futuro, qualquer prejuízo patrimonial em resultado da incapacidade permanente de que ficou portador.
E mesmo que assim não se entendesse, atenta a ausência de repercussão patrimonial das sequelas na fixação da indemnização pelo dano biológico deve recorrer-se, essencialmente, à equidade, tendo em conta as regras das portarias 377/2008 e 679/2009, pelo que a compensação pelo dano biológico ascenderia a valor entre 2.747,04€ a 3.359,34€ (cfr tabela IV da portaria 679/09); recorrendo às tabelas usadas para este cálculo (número de anos de vida activa que restavam à data do acidente, um vencimento anual médio líquido de cerca de 8.743,31€, uma taxa de crescimento salarial de 1% e da capitação de 3% e o grau da sua incapacidade (3 pontos) a indemnização ascenderia a 8.183,57€.
Cabe ao lesante, responsável pelo embate, indemnizar o lesado dos danos decorrentes do mesmo, por forma a reconstituir a situação que existiria se o evento não se tivesse verificado--cfr. artigos 483.º e 562.º do C.Civil.
E, nos termos do n.º 2 do art. 564.º do C.Civil, na fixação da indemnização, pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis.
Na definição clássica de Antunes Varela (7) o dano é a perda in natura que o lesado sofreu em consequência de certo facto, nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar.
O conceito de dano corporal adoptado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (8) abrange qualquer dano, na medida em que a sua indemnização esteja prevista a título de responsabilidade civil do segurado pelo direito nacional aplicável ao litígio, resultante da ofensa à integridade da pessoa, que abrange tanto os sofrimentos físicos como psicológicos.
O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04/06/2015 (9) é esclarecedor e sintetiza, no respectivo sumário, a seguinte orientação jurisprudencial: Os danos patrimoniais futuros decorrentes de uma lesão física não se reconduzem à redução da capacidade de trabalho já que, antes de mais, se traduzem numa lesão do direito fundamental do lesado à saúde e integridade física, pelo que não pode ser arbitrada uma indemnização que apenas tenha em conta aquela redução e a perda do rendimento que dela resulte, ou a necessidade de um acréscimo de esforço para a evitar. (negrito nosso)

Relativamente à problemática do cálculo da indemnização do dano patrimonial futuro, o Acórdão do STJ de 15.07.2007, expôs as ideias generalizadas da jurisprudência daquele Tribunal Superior:

- “A indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não auferirá e que se extingue no final do período provável de vida”;
- “No cálculo desse capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equi­dade, o que implica que deve conferir-se relevo às regras da experiência e àquilo que, segundo o curso nor­mal das coisas, é razoável”;
- “As tabelas financeiras por vezes utilizadas para apurar a indemnização têm um mero carácter auxiliar, indicativo, não substituindo de modo algum a ponderação judicial com base na equidade”;
- “No caso de morte do lesado, deve ser proporcionalmente deduzida no cômputo da indemnização a importância que o próprio gastaria consigo ao longo da vida (em média, para despesas de sobrevivência, um terço dos proventos auferidos)”;
- “Deve ponderar-se o facto de a indemnização ser paga de uma só vez, o que per­mitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um des­conto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia”; (10)
- “E deve ter-se preferencialmente em conta, mais do que a esperança média de vida activa da vítima, a esperança média de vida, uma vez que, como é óbvio, as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixa de traba­lhar por vir­tude da reforma (em Portugal, no momento presente, a esperança média de vida dos homens já é de sensivelmente 76 anos, e tem tendência para aumentar; e a das mulheres chegou aos oitenta)”

Por forma a assegurar a atribuição de uma indemnização que não seja arbitrária ou aleatória, o que pressupõe uma base objectiva, o julgador pode e deve socorrer-se de fórmulas matemáticas ou de tabelas; em relação à que consta da Portaria n.º 377/08 de 26.05 actualizada pela n.º 679/09 de 25.06 a jurisprudência tem vindo a reconhecer, de forma unânime, que não garante uma indemnização minimamente adequada, sendo o seu campo de aplicação específico nas soluções extrajudiciais.
A sentença, tendo por base o rendimento anual auferido pelo Autor, de € 9.338.20, a idade de 22 anos, uma esperança de vida até aos 80 anos e o Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 3 pontos, calculou a indemnização do dano patrimonial futuro no montante de 16.248,47 euros.
Não obstante o rendimento médio anual auferido pelo Autor, ser de montante ligeiramente inferior (€ 8.743,31) àquele que foi ponderado na sentença, afigura-se-nos que a indemnização aí atribuída deverá ser mantida na medida em que, como sabemos, nesta matéria impera o recurso à equidade.
Concretizando, não poderá ser esquecido que este jovem exercia funções de porteiro/recepcionista, cujas funções exigem que esteja, na maior parte do tempo laboral, de pé, situação reveladora de uma maior penosidade e que justifica plenamente o valor indemnizatório obtido na sentença, com base num rendimento anual um pouco superior àquele que era auferido pelo lesado.

Do dano não patrimonial

A Recorrente também não se conformou com a compensação, no valor de € 20.000,00, atribuída a título de danos não patrimoniais, por entender que a quantia de € 5.000,00 é mais ajustada ao caso.
O art. 496.º, n.º 1 do C.Civil estabelece que, na fixação da indemnização, deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
E o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º--v. n.º 4 do citado preceito legal.
Essas circunstâncias são nomeadamente o grau de culpabilidade do agente, e a sua situação económica.
O ressarcimento destes danos sempre foi enquadrado pela doutrina e jurisprudência numa vertente compensativa (11), compreendendo todos os danos que não estejam abrangidos no grupo dos danos patrimoniais, não devendo ser meramente simbólica, miserabilista, nem a sua atribuição arbitrária. (12)
A equidade, sustentada nos factos provados, deve ser norteada pelo princípio de igualdade, o que implica uma uniformização de critérios, desde que sejam respeitadas as circunstâncias do caso concreto. (13)
Para resolver esta questão, é importante recordar que o Autor foi vítima de um atropelamento em plena passadeira, demorou, como se salienta na sentença, cerca de 4 meses a consolidar as lesões sofridas, fez vários exames e consultas médicas, usou canadianas para se deslocar, e as sequelas do acidente causaram-lhe, causam e causarão dores, angustia, e sofrimento, especialmente atendiveis atenta a sua jovem idade.
Perante esta factualidade, a que acresce um quantum doloris de 4/7, repercussão permanente desportiva de 2/7 e atendendo aos critérios jurisprudenciais que a sentença fez apelo, o valor arbitrado, a título de compensação, mostra-se absolutamente justo.
Como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 16/12/2015 (14) “O Tribunal de recurso deve adoptar um critério que apenas considere susceptível de revogação, por inadequada, uma solução que, de forma manifesta, exceda certa margem de liberdade decisória do tribunal a quo, havemdo, para tanto, de sindicar o critério de equidade aplicado no caso concreto.”
Neste sentido, o Supremo Tribunal de Justiça (15) tem reforçado a ideia que o juízo de equidade das instâncias deve ser mantido sempre que, situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida, se não revelar colidente com os critérios jurisprudenciais que, numa perspectiva actualista, generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade.
Por todas estas razões, mantemos o valor atribuído a título de compensação pelos danos não patrimoniais.

Da questão dos juros

Ambas as partes discordaram da decisão referente a esta questão.
A sentença, acompanhando as considerações expendidas no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13.12.2012 (16), concluiu que, ao contrário dos danos relativos às perdas salariais, os danos não patrimoniais e patrimoniais futuros eram controvertidos, à data da apresentação da proposta da Ré, e o Autor não demonstrou ter a Ré desrespeitado os termos procedimentais.
Por seu turno, a Ré reclama a sua absolvição porquanto, sucintamente, o Autor não apresentou pedido de indemnização extra-judicial, não alegou que a Ré tivesse conhecimento desses danos e da sua extensão (em particular quanto a perdas salariais) e que a proposta apresentada não os contemplasse, ou que não fosse razoável, por não ter obedecido ao sistema de avaliação dos danos corporais. O tribunal desconhece, em face dos factos que deu como provados, se na proposta final apresentada pela Ré (no valor de 4.500,00€), está ou não incluída uma parcela respeitante a perdas salariais, ou o valor proposto pela Ré a esse título, sendo que correspondia à aplicação dos critérios definidos pelas portarias 377/08 e 679/09, pelo que é razoável e adequada aos danos conhecidos pela Ré e até então quantificáveis.
A diligência e prontidão da empresa de seguros na regularização dos sinistros que envolvam danos corporais, como é o caso dos autos, pressupõe, além do mais, a comunicação ao lesado a assunção, ou a não assunção, da responsabilidade no prazo de 45 dias, a contar da data do pedido de indemnização, caso tenha entretanto sido emitido o relatório da alta clínica e o dano seja totalmente quantificável (cfr. art. 37.º, n.º 1, al. c) do Dec.-Lei n.º 291/2007 de 21.08).
Caso não tenha sido emitido o relatório da alta clínica ou o dano não seja totalmente quantificável, a assunção da responsabilidade assume a forma de “proposta provisória”, em que nomeia especificamente os montantes relativos a despesas já havidas e ao prejuízo resultante de períodos de incapacidade temporária já decorridos; e, se for aceite, deve, no prazo de 15 dias, a contar do conhecimento do relatório da alta clínica ou da data a partir da qual o dano deve considerar-se totalmente quantificável, se posterior, efectuar assunção da responsabilidade consolidada (cfr. art. 37.º, n.º 2, als. a) e b) do Dec.-Lei n.º 291/2007 de 21.08).
Na parte que interessa, resulta da conjugação dos arts. 39.º, n.º 2 (proposta razoável para regularização de sinistros que envolvam danos corporais) e 38.º, n.º 2 e 3 do mencionado diploma legal que, no caso de a responsabilidade não ser contestada e o dano sofrido ser quantificável, no todo ou em parte, a seguradora deve fazer uma proposta razoável de indemnização, sob pena de serem devidos juros no dobro da taxa legal prevista na lei aplicável ao caso sobre o montante da indemnização fixado pelo tribunal.
Entende-se por proposta razoável aquela que não gere um desequilíbrio significativo em desfavor do lesado (cfr. art. 38.º, n.º 4 ex vi art. 39.º, n.º 6 do mencionado diploma legal).
Porém, nos termos do n.º 3 do referido art. 39.º, quando a proposta da empresa de seguros tiver sido efectuada nos termos substanciais e procedimentais previstos no sistema de avaliação e valorização dos danos corporais por utilização da Tabela indicativa para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, os juros nos termos do número anterior são devidos apenas à taxa legal prevista na lei aplicável ao caso e sobre a diferença entre o montante oferecido e o montante fixado na decisão judicial e, relativamente aos danos não patrimoniais, a partir da data da decisão judicial que torne líquidos os montantes devidos.
Em suma, o dano, para cálculo da indemnização apresentada na proposta, depende da respectiva quantificação, no todo ou em parte, e se aquela obedecer ao sistema de avaliação e valorização dos danos corporais por utilização da Tabela indicativa para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, apenas são devidos juros à taxa legal sobre a diferença entre o montante oferecido e aquele que for fixado na sentença.
Considerando que os danos não patrimoniais e patrimoniais futuros, à data da proposta, não estavam totalmente quantificados, como foi reconhecido na sentença, apenas poderia ocorrer incumprimento da Ré se tivesse apresentado uma proposta irrazoável relativamente às perdas de rendimentos laborais.
Neste particular, afigura-se-nos que uma diferença significativa, meramente objectiva, entre o valor proposto pela seguradora e aquele que é fixado na sentença não poderá, em princípio, sustentar, de forma segura, um juízo de irrazoabilidade em relação àquele valor.

Com efeito, deverão ser ponderados quais os danos (quantificados) conhecidos pela seguradora, na data da proposta de indemnização extra-judicial, e compará-los com aqueles que, após instrução, foram dados como provados na sentença.
Por outras palavras, a conclusão sobre a verificação de desequilibrio significativo em desfavor do lesado pressupõe o conhecimento dos factos relativos aos danos que a seguradora dispunha na data da proposta e não a posteriori, ou seja, na data da sentença, a qual inclui a factualidade apurada após a produção dos meios de prova e em que são fixadas indemnizações, com recurso à equidade, como sucede com os danos não patrimoniais e frequentemente em relação ao cálculo do dano patrimonial futuro.
No presente caso, a Ré, apesar de apenas ter quantificadas as perdas salariais, ofereceu um valor superior, desconhecendo-se, por não terem sido discriminados, quais os danos contemplados no cálculo que efectuou.
Tendo o valor da proposta sido superior ao valor em dívida relativo às perdas salariais, e não existindo nos autos elementos sobre o montante oferecido, a esse título, não podemos afirmar que a proposta não foi razoável, não sendo devidos, por isso, juros em dobro.
De qualquer forma, como a proposta foi apresentada tendo por base os pressupostos indemnizatórios vertidos na Portaria 377/2008, ou seja, nos termos substanciais e procedimentais, os juros devidos são apenas os legais nos termos do citado artigo 39.º, n.º 3 do Dec.-Lei n.º 291/2007 de 21.08.
Neste sentido, para além do Acórdão desta Relação de Guimarães de 25/05/2017, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13/12/2012 (17), citado na sentença, esclarece que o agravamento para que remete o nº2 do artigo 39º do diploma em análise pressupõe necessariamente, por um lado, que a responsabilidade não foi objecto de controvérsia e que o dano é quantificável, no todo ou em parte. Mas mesmo quando verificados tais pressupostos, os juros são liquidados à taxa legal, “quando a proposta tiver sido efectuada nos termos substanciais e procedimentais.
Acompanhando o raciocínio do referido Acórdão desta Relação de 25.05.2017 (18), não tendo o Autor alegado a inobservância pela Ré, como lhe competia, nos termos do art. 342.º, nº1, do Código Civil, na sua proposta de indemnização, das regras e procedimentos previstos no sistema de avaliação e valorização dos danos corporais utilizados na Tabela Indicativa para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, não deve ser aplicado o agravamento decorrente do pagamento dos juros em dobro.

Finalmente, a última questão que importa resolver é a que se refere à contagem dos juros dos danos não patrimoniais e dano patrimonial futuro.

O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do S.T.J. nº 4/2002, de 9/5/2002 (in DR, I-A de 27/6/2002), fixou uma interpretação da lei no sentido de que sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do artº 566º nº 2 do Código Civil, vence juros de mora por efeito do disposto nos artºs. 805º nº 3 (interpretado restritivamente) e 806º nº1 do Código Civil, a partir da decisão actualizadora e não a partir da citação.
Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (19) sobre a matéria, o acórdão uniformizador assentou na ideia de uma decisão actualizadora da indemnização, por danos patrimoniais ou não patrimoniais, em razão da inflação no período compreendido entre ela e o momento do evento danoso.

Assim, perfilhando e citando as considerações plasmadas no douto aresto citado, importa apurar, através da interpretação da sentença, (20) se, no cálculo da indemnização por danos patrimoniais futuros ou na fixação da compensação por danos não patrimoniais, incidiu algum índice de actualização, situação que não se reconduz necessariamente ao cálculo da indemnização com base no princípio da diferença da esfera patrimonial a que se reporta o n.º 2 do artigo 566.º do C.Civil.
Tendo a sentença expressamente actualizado, na data em que foi proferida, o montante compensatório atribuído a título de danos não patrimoniais e dano patrimonial futuro, os juros devidos contam-se desde aquela data e não a partir da citação.
*
V- DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem este Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente o recurso da Ré e improcedente o recurso do Autor, e em consequência, alteram a sentença, absolvendo a Ré na parte que a condenou no pagamento de juros em dobro sobre a quantia de €1.408,78, mantendo o mais decidido.
Custas pelo Autor e Ré, em ambas as instâncias, na proporção do respectivo decaímento.
Notifique e registe.
**
Guimarães, 22 de Fevereiro de 2018


(Anabela Andrade Miranda Tenreiro)
(Fernando Fernandes Freitas)
(Alexandra Rolim Mendes)


1. Após rectificação do lapso.
2. Neste sentido cfr. Freitas, José Lebre de, A Acção Declarativa Comum, 3.ª edição, Coimbra Editora, pág. 334.
3. cfr. Reis, Alberto dos, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág. 140, Varela, Antunes, e outros, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, pág. 687.
4. cfr. Freitas, José Lebre de, A Acção declarativa Comum, 3.ª edição, Coimbra Editora, pág. 332 e Varela, Antunes, ob. cit., pág. 689.
5. Cfr. Geraldes, António Santos Abrantes, Temas da Reforma do Processo Civil, II vol., pág. 256.
6. Auferia uma retribuição mensal ilíquida de (799,74€ x 14 meses – liquida 687,16) discriminado mensalmente da seguinte forma:
1. - 488,00€ a titulo de Vencimento Base Mensal,
2. - 117,23€ a título de Subsidio de Turno,
3. - 53,49€ a título de Prémio de Zelo, e
4. - 141,02€ a título de Subsidio de Alimentação (adm), -doc. n.º 28 a fls. 94).
7. Cfr. Das Obrigações em Geral, vol. I, 5.ª edição, Almedina, pág. 558.
8. Cfr. Processo n.º C-371/12 de 23.01.2014 in http://eur-lex.europa.eu.
9. Disponível no site www.dgsi.pt.
10. Contra esta redução v. Acórdão do STJ de 06.10.2011 e Acórdão da Rel. Porto de 15.09.2014, ambos disponíveis no site www.dgsi.pt.
11. Como a dor é insusceptível de ser avaliada em dinheiro, é incorrecta a meu ver a fixação da indemnização a título de pretium doloris; além disso, como a reconstitituição in natura é impossível neste caso, a indemnização em dinheiro funciona como verdadeira compensação (Compensatio doloris), ou seja, a tendencial reparação da angústia, da dor física, da doença ou do abalo psíquico-emocional resultante de uma situação de luto, etc.., através da atribuição de uma quantia pecuniária que permita a aquisição de bens materiais e ou o fruir de prazeres espirituais que funcionam como lenitivo dos danos sofridos. Neste sentido, Pessoa Jorge, Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, pag. 375; v. ainda Varela, João de Matos Antunes, Das Obrigações em Geral, vol. I, 5.ª edição, pág. 562 e segs., Telles, Inocêncio Galvão, Direito das Obrigações, 6.ª edição, pág. 375; Cordeiro, António Menezes, Direito das Obrigações, 2.º volume, 1990, pág. 285.
12. É esta a orientação seguida pelo STJ, indicando como exemplo, entre muitos, o Acórdão de 24.04.2013 disponível no site www.dgsi.pt.
13. v. recentemente, os Acórdãos do STJ de 04.06.2015, 19.02.2015 e 17.01.2012; nesta Relação de Guimarães v. o Acórdão de 19.02.2015.
14. Disponível em www.dgsi.pt.
15. Cfr. Acs. de 22/02/2017 e de 29/06/2017 disponíveis em www.dgsi.pt.
16. Disponível em www.dgsi.pt.
17. Disponível em www.dgsi.pt
18. Disponível em www.dgsi.pt
19. Cfr. Acórdão de 13/07/2004 disponível in www.dgsi.pt.
20. Cfr. Acórdão do STJ de 06/06/2013 disponível in www.dgsi.pt.