Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1749/14.GTBVCT-B.G1
Relator: MIGUEL MORAIS
Descritores: PER
CREDOR COMUM
CONCESSIONÁRIO DE AUTO-ESTRADA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/02/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I- As taxas de portagem e os seus juros, os custos administrativos, as coimas e os seus encargos fazem parte do ativo do concessionário, constituem um recurso deste, uma receita, um benefício económico que o mesmo usufrui por permitir, não só mas também, a circulação de viaturas dos utentes por eixos viários sobre os quais possui exclusividade. O Estado assume a função de mero cobrador dessas receitas mas a titularidade das mesmas mantém-se na esfera jurídica do concessionário.

II- Os referidos créditos do concessionário não assumem, assim, natureza de créditos tributários, isto é, de créditos titulados pelo Estado.

III- Nessa medida, os concessionários ficam vinculados às condições de pagamento estabelecidas para os credores comuns no plano de revitalização aprovado e homologado por decisão judicial, mesmo que não tenham participado nas respetivas negociações.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I- RELATÓRIO

No presente processo especial de revitalização requerido pela devedora B., Ldª veio a ser homologado judicialmente plano de revitalização, nele ficando estabelecido o seguinte plano de pagamentos aos credores comuns e ao Estado e entes públicos:
- Credores comuns (fornecedores de bens, serviços e outros direitos)
. Perdão para todos os créditos enumerados na lista provisória de créditos e dos que tenham sido verificados no âmbito das impugnações julgadas procedentes, de todos os juros vencidos e vincendos e aqueles que resultam de situações de mora, com excepção dos relativos aos créditos do "Estado e outros entes públicos", seguindo as normas ditadas por legislação e regulamentação próprias;
. Regularização das dívidas reconhecidas aos fornecedores de bens, serviços e outros direitos mediante o pagamento de 30% do capital em dívida, em 12 anos, sendo os dois primeiros de carência, ou seja, em 20 prestações semestrais, iguais e sucessivas;
. Início dos pagamentos semestrais, no último mês do quinto semestre seguinte, ao mês do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação;
- Estado e Entes Públicos
. Regularização das dívidas reconhecidas à “Fazenda Nacional” em 5 anos, ou seja, em 60 prestações mensais iguais e sucessivas no montante de euro 1.352,00, acrescido de juros de mora calculados no ato de pagamento de cada prestação, com início nos 30 dias após o trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação;
. Regularização das dívidas reconhecidas ao “IMTT” em 5 anos, ou seja, em 60 prestações mensais, iguais e sucessivas, com início nos 30 dias após o trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação”.
Após o trânsito da decisão que homologou o descrito plano, veio a devedora, a fls. 1038 e seguintes, apresentar requerimento no qual impetra que se considere que todos os valores correspondentes às dívidas às concessionárias de autoestradas tenham o tratamento que consta do plano de revitalização para os créditos comuns.
Sobre o aludido requerimento recaiu despacho jurisdicional com o seguinte teor:
“Mau grado a posição sufragada pela Administração Tributária, reiterada entretanto pelo Ministério Público, não pode senão entender-se, tal como vem defendido pelo Sr. Administrador, que a pretendida inclusão dos créditos das concessionárias no plano de pagamentos acordado, na medida em que, pela sua natureza, se tratam de créditos comuns, não podendo por isso estar sujeitos à forma de pagamento prevista para os créditos do Estado.
Desta feita, todos os montantes ora exigidos à devedora por via das execuções fiscais não suspensas não podem ser incluídos na dívida à Autoridade Tributária, tendo de obedecer ao plano de pagamentos estabelecido para os credores comuns.
Notifique”.
Não se conformando com o assim decidido, veio o Ministério Público interpor o presente recurso, o qual foi admitido como apelação, a subir em separado e com efeito meramente devolutivo.
Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes
CONCLUSÕES:
1 - O Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional, interpõe recurso do douto despacho de fls. 1068, proferido na sequência do requerimento elaborado pela devedora B., Ldª, a fls. 1037 e sgs, a qual entende e defende que os créditos referentes às concessionárias, se tratam de créditos comuns e, assim sendo, não estão sujeitos à forma de pagamento prevista para os créditos do Estado, sendo que o despacho em causa deferiu tal posição.
2 - A Fazenda Nacional votou a favor do plano de revitalização apresentado pela devedora B., Ldª nos presentes autos, o qual foi homologado judicialmente por sentença datada de 11/12/2014, já transitada em julgado (cfr. fls. decisão de fls. 789).
3 - O serviço de finanças de Viana do Castelo aprovou, por despacho datado de 07/04/2015, notificado à devedora B., Ldª em 08/04/2015, um plano de pagamento prestacional, elaborado no âmbito do PER, em 150 prestações, de um valor de dívida de € 1.533.610,22.
4 - Do plano faziam parte quer as dívidas reclamadas no PER quer dividas relativas a factos anteriores ao início do PER mas referentes ao processo de execução fiscal instaurado após a reclamação dos créditos do PER.
5 - O plano encontra-se na presente data na situação de interrompido, não tendo a B. pago qualquer prestação do mesmo.
6 - A dívida da empresa, à data de 02/12/2015, ascende ao valor de € 12.976.149,86 (€ 12.800.000,20 de quantia exequenda).
7 - A maior parte da dívida diz respeito a importâncias referentes a taxas de portagens, coimas, custas, juros a ela inerentes, de que são titulares diversas entidades, designadamente, e entre outras, "C., S.A., "D., S.A.", ", E., S.A.", “F., S.A." e "G., S.A.",
8 - A B. não aderiu ao "Regime excepcional de regularização de dívidas resultantes do não pagamento de taxas de portagem e coimas associadas, por utilização de infraestrutura rodoviária" previsto na Lei n." 51/2015, de 8 de Junho.
9 - No requerimento de fls. 1038 e sgs., que deu origem ao despacho ora em crise, a B. alega o seguinte:
- O legislador não permite que a Autoridade Tributária possa reclamar os créditos das concessionárias em processos PER, já que esses créditos não são créditos do Estado;
- Que as execuções relativas a dividas às concessionárias foram efectuadas sem "suporte legal".
10 - Face a tais circunstâncias pretende a B. que todos os valores correspondentes às dívidas das concessionárias tenham o tratamento que consta do plano de revitalização para os créditos comuns, o que foi confirmado pelo despacho ora em crise.
11 - Entendemos que à mesma não assiste razão pelo que discordamos da decisão de fls. 1068, pelos seguintes motivos:
a) Nos termos do n.º 1 do art. 17-A.º, da Lei 25/2006, de 30 de Junho, com a alteração introduzida pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (LOE/2013), a cobrança coerciva das portagens, dos custos administrativos e dos juros de mora devidos, bem como da coima e respectivos encargos é feita pela Autoridade Tributária, através de execução fiscal nos termos do CPPT.
b) Nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, "Os créditos previstos no número anterior gozam de privilégio mobiliário especial sobre os veículos com os quais hajam sido praticadas as infracções a que se refere a presente lei, quando propriedade do arguido à data daquela prática";
c) Para além disso, a instauração e instrução de processos de contra-ordenação por falta de pagamento ou pagamento viciado das portagens (arts. 5.° a 7.° deste diploma) é da competência da Autoridade Tributária, que é também competente para a aplicação das respectivas coimas (n.º 1 do art. 15 da mesma Lei).
d) Por último, as entidades beneficiárias das coimas por utilização irregular de infraestruturas rodoviárias, são, na sua maior parte, entidades públicas, nomeadamente, e nos termos do art. 17.° do referido diploma legal: o Estado (40%); Autoridade Tributária (35%) e o INIR (10%), sendo que, relativamente às taxas de portagem, também, em última análise, é o Estado a ter que ressarcir as concessionárias do seu valor, caso não venha a cobrar, através da Autoridade Tributária, os respectivos valores.
12 - Com base em tais dispositivos legais, a Autoridade Tributária e Aduaneira fez incluir no plano de pagamento prestacional os créditos relativos a taxas de portagem, juros e coimas associadas por utilização de infraestrutura rodoviária, uma vez que: legalmente, a competência para a sua cobrança e reclamação é sua; tais dividas foram constituídas em período anterior à data do inicio do PER; tal inclusão constitui uma oportunidade concedida por lei à B. de pagamento de tais valores em 150 prestações, nos termos do nº 6, do art. 196 do CPPT, possibilidade essa que, de outro modo - fora do âmbito do PER - seria legalmente impossível, só podendo tal dívida ser paga em 60 prestações.
13 - Estando perante créditos do Estado, a Fazenda Nacional está subordinada à observância das normas legais aplicáveis à regularização desses créditos (v. também neste sentido a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, entre outros Acórdãos: proc. 1242/12, de 27/02/2013; processos 1043115, 1059/15 e 808/2015 de 21/10/2015 e processo nº 0766/15 de 14/10/2015).
14 - Tais normas consubstanciam-se nos art°s. 30°./2 e 3 e 36°/3, da LGT, e artºs. 85°./3,196°, e 199°, do CPPT e art° 125°, da Lei 55-A/2010, de 31.12.
15 - Consagram as referidas normas os princípios da indisponibilidade desses créditos e da proibição da moratória, bem como o seu regime de regularização prestacional.
16 - Refira-se que o disposto no nº 2, do art° 30° da LGT, nos termos do nº 3, do mesmo dispositivo legal, na redacção que lhe foi dada pela Lei 55-A/2010, de 31 de Dezembro, "prevalece sobre qualquer legislação especial", impondo-se o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários sobre as disposições estabelecidas no C.I.R.E ou em qualquer outra legislação especial.
17 - Pelo que, neste caso, aplica-se em absoluto e de forma inelutável a regra de que o princípio da indisponibilidade desses créditos se sobrepõe a qualquer outra legislação especial, nomeadamente ao CIRE, e à ideia de que esses créditos cedem face à posição maioritariamente assumida em Assembleia de Credores.

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A devedora apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.

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Após os vistos legais cumpre decidir.

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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Cód. Processo Civil.
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pelo apelante, a questão que é trazida à apreciação deste Tribunal e que importa decidir é a de saber se os créditos das concessionárias assumem (ou não) natureza de créditos comuns, não estando, nessa medida, sujeitos à forma de pagamento dos créditos do Estado prevista no plano de revitalização aprovado no âmbito do presente processo.

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III- FUNDAMENTOS DE FACTO

A factualidade a atender é a que dimana do antecedente relatório.

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IV- FUNDAMENTOS DE DIREITO

Como se deu nota, no presente processo foi aprovado e homologado plano de revitalização no qual foram estabelecidos modos distintos de regularização dos débitos da sociedade “B., Ldª”, consoante se esteja em presença de credores comuns ou então perante créditos do Estado e outros entes públicos.
No caso vertente, a questão que se coloca e que urge dilucidar é a de saber se os créditos que as concessionárias de autoestradas detêm sobre a identificada devedora referentes a taxas de portagem, juros de mora, coimas e custos administrativos se integram na primeira (tal como se decidiu no despacho recorrido) ou na segunda (como preconiza o apelante) das referidas categorias.
Como é consabido, as autoestradas integram o domínio público do Estado. No entanto, por mor dos contratos de concessão (1) que celebrou com as respetivas concessionárias, o Estado cedeu o uso desse bem público para que estas o explorem por sua conta e risco e por um determinado prazo, havendo, em regra, uma aplicação de capital privado na execução da atividade concessionada sendo que esse investimento acaba amortizado, primacialmente, pelas taxas cobradas diretamente ao utente desses eixos viários (2).
Como assim, o Estado, não se despojando embora da titularidade do objeto da concessão (portanto não se privando da propriedade da autoestrada, que permanece no domínio público), transfere o encargo de prestar o serviço para o concessionário particular, sendo este o responsável por esse serviço e relacionando-se este “diretamente” (3) com o utente, posto que o Estado lhe outorgou contratualmente poderes para agir “por sua conta própria” (4) .
Daí que, conforme se vem entendendo (5), a concessão não atribui ao concessionário (6) uma função executiva ou operacional, no contexto de uma colaboração secundária com a Administração concedente. Pelo contrário, ele assume a responsabilidade de gerir um serviço público, sendo que, em resultado da celebração do contrato de concessão, são-lhe atribuídos poderes, prerrogativas e deveres de autoridade típicos dos atributos do Estado, nomeadamente de aplicar taxas de portagem e coimas.
É, por conseguinte, o concessionário que ao explorar o eixo viário se relaciona, como se referiu, diretamente com o respetivo utente (e não o Estado), estabelecendo-se entre ambos uma relação jurídica de natureza privada (diferente da relação contratual de direito público que, por força do contrato de concessão, se estabelece entre concedente e concessionário), nos termos da qual aquele fica autorizado a cobrar portagens aos utentes da autoestrada, sendo que tais receitas, na sua totalidade, reverterão para si e não para o Estado.
Deste modo, as portagens (enquanto contrapartida pecuniária paga pelo utente da autoestrada pela sua utilização) não têm natureza tributária já que está em causa o pagamento do serviço prestado ou do fornecimento efetuado pelo concessionário(7). Nesse caso, essa contrapartida tem antes a natureza de um preço, isto é de um valor a pagar pela prestação de um serviço regulado por um contrato de direito privado. Consequentemente, sendo de direito privado as relações de prestação constituídas entre concessionário e o utente, não faz sentido, como escreve PEDRO GONÇALVES(8), “sustentar a natureza fiscal da contrapartida, que é justamente um dos elementos essenciais da relação contratual”.
A taxa de portagem (9), correspondendo apenas a um preço pago pelo utente ao concessionário, constitui, pois, uma receita exclusiva deste no âmbito da relação jurídica de direito privado em que o Estado não é parte.
Já no concernente às coimas (enquanto consequência contraordenacional resultante do não pagamento atempado das taxas de portagem ou pagamento viciado), não se assume clara a determinação do respetivo titular e da sua natureza jurídica.
É certo que com a publicação da Lei nº 25/2006, de 30.06, o Estado (através da Administração Tributária) decidiu chamar a si a cobrança coerciva das taxas de portagem e dos seus juros, das coimas e dos seus encargos, estabelecendo no nº 4 do seu art. 17º que as quantias obtidas serão entregues mensalmente de acordo com as percentagens definidas no seu nº 1. Certo é igualmente que o art. 17º-A, nº 2 do citado diploma legal (na redação que lhe foi dada pela Lei nº 66-B/2012, de 31.12) preceitua que tais créditos gozam de privilégio mobiliário especial sobre os veículos com os quais hajam sido praticadas as infrações.
Tal realidade, no entanto, não se revela decisiva para qualificar as coimas como créditos tributários.
Neste conspecto, afiguram-se-nos acertadas as considerações adrede tecidas por ALEXANDRA CHíCHARO DAS NEVES(10) que expressamente ressalta que “o bem jurídico protegido pelas infrações contraordenacionais previstas nos arts. 5º e 6º da Lei nº 25/2006 é apenas, e só, os direitos dos concessionários às receitas pelo uso da autoestrada. Isto é, estas coimas têm sempre subjacente o incumprimento da relação contratual entre utente e concessionário: o uso indevido da barreira da portagem e o não pagamento da taxa de portagem pelos utentes (…) inexist[indo qualquer] relação jurídica entre o Estado e aquele que utiliza a autoestrada (…). O Estado não é o credor das coimas devidas pelo infrator/utente ao concessionário, embora seja cobrador das mesmas. E porque exerce essa função de cobrador de receitas do concessionário o Estado recebe uma percentagem do produto cobrado, a título de remuneração”. Daí que, como bem se enfatiza no referido escrito(11), “não se deve confundir a questão da titularidade do crédito com o direito ao produto de uma cobrança. Ou seja, titular do crédito (incluindo as coimas) é o concessionário, funcionando o Estado (através da Administração Tributária) na qualidade de cobrador desses créditos”.
Resulta, assim, do exposto que as taxas de portagem e os seus juros, os custos administrativos, as coimas e os seus encargos fazem parte do ativo do concessionário, constituem um recurso deste, uma receita, um benefício económico que o mesmo usufrui por permitir, não só mas também, a circulação de viaturas dos utentes por eixos viários sobre os quais possui exclusividade. O Estado assume a função de mero cobrador mas a titularidade dos créditos mantém-se na esfera jurídica daquele.
Destarte, os concessionários, relativamente aos créditos (não tributários) que detêm sobre a devedora B. , Ldª, integram-se na categoria de credores comuns, estando, nessa medida, sujeitos à forma de pagamento estabelecida para esta tipologia de credores no plano de revitalização aprovado e homologado nestes autos.
A presente apelação terá, pois, de improceder.

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SÍNTESE CONCLUSIVA

I- As taxas de portagem e os seus juros, os custos administrativos, as coimas e os seus encargos fazem parte do ativo do concessionário, constituem um recurso deste, uma receita, um benefício económico que o mesmo usufrui por permitir, não só mas também, a circulação de viaturas dos utentes por eixos viários sobre os quais possui exclusividade. O Estado assume a função de mero cobrador dessas receitas mas a titularidade das mesmas mantém-se na esfera jurídica do concessionário.

II- Os referidos créditos do concessionário não assumem, assim, natureza de créditos tributários, isto é, de créditos titulados pelo Estado.

III- Nessa medida, os concessionários ficam vinculados às condições de pagamento estabelecidas para os credores comuns no plano de revitalização aprovado e homologado por decisão judicial, mesmo que não tenham participado nas respetivas negociações.

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V- DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, em consequência do que se confirma o despacho recorrido.
Sem custas.

Guimarães, 2.05.2016
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Dr. Miguel Baldaia Morais
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Dr. Jorge Miguel Seabra
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Dr. José Cardoso Amaral
(1) Cujo regime jurídico que se mostra atualmente plasmado no Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado pelo DL nº 18/2008, de 29.01.
(2) Para além disso esse investimento é, também, amortizado por remunerações, rendas, benefícios fiscais, etc.. Com efeito, como esclarece PEDRO GONÇALVES (in A concessão de serviços públicos, pág. 140 e seguinte), a remuneração do gestor pode ser proveniente apenas dos preços pagos pelo utente ou por outras contrapartidas, sem que tal desvirtue a natureza do contrato como de concessão. De igual modo, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA (in Parcerias público-privadas, pág. 177) afirma que nos contratos de concessão, em geral “o ressarcimento, seja da parte privada, seja dos financiadores externos se faz (fundamentalmente) através das receitas mas não exclusivamente por esse meio”.
(3) Isso mesmo é enfatizado por FREITAS DO AMARAL (in Direito Administrativo, vol. III, pág. 294 e seguinte), referindo estarmos perante um “modelo concessionário, caraterizado pela existência de uma relação direta entre o parceiro privado e os utentes finais e pelo facto de o parceiro privado cobrar o pagamento de taxas aos utentes – receitas à qual acresce o pagamento de subvenções pelo Estado Português”.
(4) Assim FREITAS DO AMARAL, ob. citada, pág. 294. Registe-se, de igual modo, a expressão utilizada no art. 407º do CCP, segundo o qual o concessionário age “em nome próprio e sob sua responsabilidade”.
(5) Cfr., por todos, PEDRO GONÇALVES, ob. citada, pág. 139.
(6) Sendo que, entre nós, todas as concessionárias de autoestradas se encontram constituídas como sociedades anónimas, portanto, e independentemente de algumas poderes possuir capitais públicas, constituídas em termos de direito privado. Por via disso, vem-se considerando que essas concessionárias integram a categoria das denominadas «sociedades de interesse coletivo» fazendo consequentemente parte do designado «sector privado» - assim, PEDRO MELO, in A distribuição do risco nos contratos de concessão e obras públicas, pág. 58.
(7) A este propósito a casuística do STA, praticamente una voce, vem outrossim considerando que os referidos créditos não assumem natureza tributária – cfr., inter alia, acórdãos de 27.02.2013 (processo nº 01242/12), de 3.04.2013 (processo nº 1262/12), de 17.04.2013 (processo nº 1297/12) e de 18.06.2013 (processo nº 1184/12), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
(8) Ob. citada, pág. 319 e seguinte: em análogo sentido milita RUI PEREIRA DE SOUSA, in Contratos de concessão, perspetiva económica, financeira e contabilística, págs. 63 e seguintes, considerando que a quantia entregue pelo utente ao concessionário reveste a “natureza de preços ou taxas, como contrapartida do serviço que este lhe presta, ou da faculdade que proporciona ao utente de utilizar um bem público cuja exploração está a cargo do concessionário”.
(9) Igual entendimento é extensivo aos juros de mora devidos pelo não pagamento tempestivo dessa taxa, porquanto, em conformidade com o disposto no art. 561º do Cód. Civil, esses juros, dada a sua (relativa) acessoriedade, encontram-se na dependência da obrigação principal – portanto, na dependência do crédito principal constituído pela taxa de portagem.
(10) A (i)legitimidade do Ministério Público para reclamar taxas de portagem e coimas assentes em contrato de concessão celebrados entre o Estado Português e sociedades anónimas, Revista do Ministério Público, nº 141 (janeiro-março de 2015), págs. 174 e seguinte.
(11) Op. citada, pág. 178, onde se acrescenta que é o produto da cobrança que reverte para o Estado e não os créditos – coima e encargos, taxas e juros, custos administrativos e custas – que são titularidade do concessionário. Se a cobrança obtiver sucesso parte do produto reverte para o Estado – e outras entidades – se não obtiver sucesso o concessionário mantém um direito ao crédito que possui sobre o utente e cujo pagamento será de obter pelas outras vias que não a da cobrança tributária.