Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2/10.9TBMFR.G1
Relator: MARIA FERNANDA VENTURA
Descritores: RESPONSABILIDADE PRÉ-CONTRATUAL
INTERESSE CONTRATUAL NEGATIVO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/15/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1-A responsabilidade por culpa in contrahendo decorre do facto de uma das partes ter gerado na outra a confiança e a expectativa legítima de que o contrato seria concluído e não da ruptura das negociações, da não conclusão do contrato ou da recusa da sua celebração, as quais são manifestações da liberdade contratual negativa.
2- A Alegação e prova dos factos constitutivos do direito cabe àquele que o invoca como se impõe no art.º 342º do C.Civil.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães (1ª Secção):
I – RELATÓRIO
Nos presentes autos de acção declarativa sob a forma de processo ordinário intentada por B. veio este pedir a condenação dos RR. C., Lda.; D., Lda. e E. SA., no seguinte:
Pagar ao A. a quantia global de 42 677,15€, sendo 34 414,07€ de capital e 8 260,08€ de juros vencidos;
- e juros que se vençam até integral pagamento;
Sustenta o Autor a sua causa de pedir na responsabilidade pré-contratual, derivada da perda de expectativa criada pelos Réus na contratualização de um contrato de arrendamento tendo por objecto um imóvel sito em Macedo de Cavaleiros onde aquele explorava uma estação de serviço de que era proprietário. Não se tendo concretizado o negócio viu frustrada a sua expectativa fundada e razoável na sua conclusão, com compromissos assumidos de parte a parte, mesmo por escrito (as missivas, entretanto dirigidas, uns aos outros).
Por via do compromisso assumido com os Réus, o autor desmontou a estação de serviço que ali estava montada e em funcionamento que originaram prejuízos, o que reclama.
Regularmente citados, os Réus F. e “C., LDA contestaram a presente acção, defendendo-se por excepção e impugnação, alegando, em síntese, que a Ré sociedade é parte ilegítima da presente acção, uma vez que nunca mandatou quem quer que seja para a representar no negócio dos autos, nada tendo a ver com isso.
Ademais, refere que o réu F., acompanhado do (…), em data que não recorda, terá falado com o autor sobre a possibilidade de arrendamento de um imóvel a este pertencente. Desde logo, foi explicado ao Autor que a empresa “E.” estaria à procura de um local para instalar um supermercado, sendo que foi o Autor que disponibilizou o imóvel a que se reportam os autos.
Apesar dos contactos terem sido sempre feitos com o Réu Fernando, alega este que sempre esteve o Autor ciente, que a decisão nunca seria tomada em definitivo, sem a prévia autorização da empresa “E.”.
Concluíram pela improcedência da acção.
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Por seu turno, também a Ré, D., LDA, regularmente citada, contestou a presente acção – cfr. fls.119 e ss. - defendendo-se por excepção impugnação, alegando, em síntese, que a Ré sociedade é parte ilegítima da presente acção, uma vez que nunca mandatou quem quer que seja para a representar no negócio dos autos, nada tendo a ver com isso.
Ademais, refere que o réu F., acompanhado do (…), em data que não recorda, terá falado com o autor sobre a possibilidade de arrendamento de um imóvel a este pertencente. Desde logo, foi explicado ao Autor que a empresa “E.” estaria à procura de um local para instalar um supermercado, sendo que foi o Autor que disponibilizou o imóvel a que se reportam os autos.
Apesar dos contactos terem sido sempre feitos com o Réu F., alega este que sempre esteve o Autor ciente, que a decisão nunca seria tomada em definitivo, sem a prévia autorização da empresa “E.”.
Concluíram pela improcedência da acção.
*
Em resposta às excepções invocadas na contestação, de fls. 134 e ss, veio o Autor responder às excepções invocadas e pugnar pela procedência da acção.
Foi oportunamente proferido despacho saneador que estabeleceu o valor da presente acção; pronunciou-se sobre a ilegitimidade activa invocada; tendo-se seleccionado a matéria de facto assente e a que constitui a base instrutória, não tendo sido a mesma objecto de qualquer reclamação.
Foi realizada audiência de discussão e julgamento. Tendo a final vindo a ser proferida decisão que julgou a acção totalmente improcedente, e em consequência, absolveu os Réus, F., C. Lda., D. Lda., e E., S.A, do pedido contra si formulado.

2. Inconformado vem o A. apelar de tal decisão, formulando as seguintes CONCLUSÕES:
1) Existiu uma reunião onde se acordaram os termos do negócio;
2) O Autor levou a efeito o encerramento da sua actividade em resultado do acordado;
3) Da reunião o Autor criou legítimas espectativas da consumação do negócio;
4) Nessa decorrência encetou trabalhos para o encerramento do estabelecimento e providenciou para que o contrato de arrendamento (nos termos que haviam acordado) fosse reduzido a escrito;
5) E o mesmo viesse a produzir os seus efeitos;
6) Despendeu tempo;
7) Recursos;
8) Perdeu rendimentos quer os provenientes da sua actividade,
9) E os que legitimamente previa receber do arrendamento;
10) Agiu sempre de boa-fé;
11) Foi diligente;
12) O Autor ficou legitimamente convencido de que a manifestação de vontade de quem se apresentada como representante das Sociedades (nunca se demarcando desse associação), se concretizaria no negócio jurídico a que as negociações se reportavam;
13) Pelo que tal obrigação de indemnização abrange o ressarcimento do denominado interesse contratual negativo ou dano da confiança (art.º 227, n.º 1,parte final, do CC);
14) Inserindo-se a indemnização nos danos emergentes que se mostrem adequadamente ligados por um nexo causal ao facto gerador da responsabilidade (art.º 563 do CC)
15) Bem como onde se integram as despesas necessárias, normais e razoáveis, que o Autor realizou na sequência e por causa das negociações encetadas.
16) Em face de tudo quanto foi exposto, cabe concluir pela procedência do recurso, por fundamentado e assim julgar procedente o pedido de indemnização formulado pelo autor nos autos

3. Os RR apresentaram contra-alegações no sentido da manutenção do decidido, concluindo da seguinte forma:
1. Vem o recurso interposto da decisão do tribunal de 1ª instancia que julgou a acção totalmente improcedente, e nessa conformidade absolveu o Réu F. E OUTROS, de todos os pedidos que, contra eles o Autor formulou.
2. Ora no presente caso, verifica-se que o recurso, foi interposto fora de prazo, pois nos termos do artigo 638º do CPC mesmo é de 30 dias. Tendo também presente o previsto nos art. 40º e 47º do CPC e do art. 24º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho.
3. Devendo, assim ser presente o recurso ser rejeitado, por extemporâneo, encontrando-se a sentença proferida transitada em julgado nos termos do art. 628 do CPC.
4. Sem prescindir,
O recurso interposto pelo recorrente B., da decisão proferida em 17-12-2015, não tem qualquer sustentação e outra não poderá ser a decisão que não a sua total improcedência.
5. Pois a mesma não ostenta nenhum erro a nível da subsunção do Direito que o Tribunal faz relativamente à matéria de facto dada como provada, como o Recorrente pretende assacar-lhe.
6. Desde logo, o Recorrente insurge-se contra o facto de os Recorridos não terem agido de acordo com as regras de boa fé aquando da negociação, tendo violado os deveres relevantes para a decisão de concluir ou não o processo negocial e de terem prestado informação enganosa, influenciando, assim, o Recorrente na formação da vontade de concluir o negócio.
7. Ora, tal não corresponde à verdade, pois, como não ficou provado, os Recorridos não interpelaram o Recorrente no sentido de arrendar o referido imóvel para ali instalar um supermercado, apenas procederam a uma prospecção de mercado, nunca tendo formalizado qualquer tipo de negócio.
8. Mais, o Recorrido F. nunca disse ao Recorrente que este negócio estava ligado à sua empresa “C. Lda.”, ora recorrida e que actuava em nome dos demais Réus, ora recorridos.
9. Igualmente, dos factos não provados consta a ratificação de contratos e negociações e a fixação do contrato de arrendamento pelo prazo de 5 anos, a estipulação do valor das rendas e da quantia de €29.927,87 a título de indemnização.
10. Recorrente alega que deixou de concretizar negócios com terceiros por ser um homem de palavra e já ter “prometido” o imóvel ao Recorridos, chegando a afirmar em Sede de Audiência e Julgamento.
11. Mas tal como consta da douta sentença: “… até podiam existir várias pessoas interessadas, mas nenhuma de facto formalizou essa intenção, caso contrário, não faria sentido que o autor – ou quem o bem pertence – não tenha aceitado fazer negócio e ficar à espera de algo que desde o seu início se mostrou peculiar.”
12. Assim sendo, contrariamente ao que o Recorrente quer fazer crer, este não perdeu nenhum negócio com terceiros por causa do suposto negócio formalizado com o Recorridos.
13. Verdade seja dita, o imóvel em questão nem sequer era propriedade do Recorrente, sendo antes seu proprietário o seu cunhado (…), e mais, o Recorrente não possuía qualquer procuração que lhe atestasse poderes para formalizar e concluir o negócio, constando nos autos apenas uma declaração em que este se intitula de gestor de negócios.
14. Portanto, nem o Recorrente tinha sequer poderes para negociar um contrato de arrendamento que versasse sobre aquele imóvel!
15. Por tudo exposto, não existiu qualquer vínculo negocial ou contratual entre o Recorrente e o Recorrido, e mesmo que tivesse existido qualquer contratualização, mesmo que verbal, que não se aceita, sempre estaria dependente, ao abrigo do princípio da liberdade contratual, de uma condição causal.
16. O Recorrente pede indemnizações baseadas em rendas e compensações de estabelecimentos comerciais que há muito se encontravam encerrados, assumindo posições contratuais unilaterais.
17. Mais, não foram os Recorridos que agiram de má fé, uma vez que foi junto aos autos uma carta com a assinatura do Recorrido F., que nunca foi assinada por este, tal como foi concluído pelo relatório pericial.
18. Por conseguinte, no caso em apreço não poderia aplicar-se o regime consagrado no art. 227.º do Código Civil, como o Recorrente faz crer.
19. Mesmo que assim não fosse, nunca os Recorridos violaram os deveres de informação, lealdade e diligência, requisitos estes necessários para aplicação da responsabilidade pré-contratual.
20. Assim sendo, é nosso entendimento que bem andou a Meritíssima Juíza a quo na apreciação da prova produzida em julgamento, o que fez de forma crítica e conjugada.
21. Atenta a matéria dada como provada e que não merece, como vimos, qualquer reparo, igualmente deverá permanecer intocada a decisão de direito que o tribunal a quo deixou plasmada na douta sentença recorrida.
22. O Autor procura pôr em crise a aplicação do direito aos factos levada a efeito pelo Tribunal a quo, com fundamentos ambíguos com os quais não podemos concordar.
23. Deve, assim, manter-se intocada a douta sentença recorrida, julgando totalmente improcedente a acção, com a consequente absolvição dos Réus dos pedidos contra si formulados pelo Autor.

4. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir

II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Tendo em consideração que o objecto do recurso é delimitado pelas questões suscitadas nas conclusões dos recorrentes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras: art.ºs 608º nº 2, ex vi do art.º 663º nº 2, do Código de Processo Civil (de futuro, apenas CPC).
No caso apreciar a alegada responsabilidade pré contratual dos RR já que, no que concerne à invocada intempestividade do recurso a mesma já se decidiu no despacho do seu recebimento.

III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
OS FACTOS
Foram os seguintes os factos considerados na douta sentença:
1. No Registo Comercial, D., Lda. figura como uma sociedade por quotas, com o número de matrícula …, com sede em …, e com o objecto social de comércio de produtos alimentares, bebidas, utilidades e artigos para o lar (alínea A) da matéria assente),
2. Do documento com a data de 28 de Maio de 2001 pode ler-se “ (…) Quero agradecer a visita de: Exas. E do prazer que me deram de almoçarem comigo na companhia das V/ Dgms. Esposas e simultaneamente a honra de conhecer o V/ Dgº sócio (…) Depois do acordo de ambos, deveríamos ter feito um pequeno apoio do contrato para mais tarde não haverem dúvidas, mas como estou a lidar com pessoas de bem, julgo e estou convicto que tudo vai bater certo. (…) Mas mesmo assim, para que involuntariamente não haja falhas de memória, a seguir foco os pormenores mais importantes (…)Quando quiserem fazer a escritura, agradeço que nos avisem com 15 dias de antecedência, deixando o caso à V/ disposição. No dia 01 de Julho de próximo mês de Julho, aguardo que me mandem o 1.º cheque de 150 contos e outro de igual valor, como é norma (…) (alínea B) da matéria assente)
3. Do documento com a data de 15 de Outubro de 2001 pode ler-se “(…) Exmo. Amigo e Snr. J., (…) Depois daquele acordo verbal. Pu-los tanto à vontade e confiei religiosamente que nem lhes exigi um mero papel a confirmar os itens estipulados, nem um cheque (…)“ – documento de folhas 21 (alínea C) da matéria assente)
4. Do documento em que figura como remetente D. Lda. e destinatário B., pode ler-se, de entre o mais, “Serve a presente para o seguinte: 1.º Agradecer-lhe todas as atenções dispensadas no passado 26/5 aos nossos sócios Srs. (…) e seus familiares, aquando da visita ao armazém. 2.º Pedir-lhe desculpa na demora desta resolução, já se arrasta desde Março findo, mas sem a última decisão do Sr. … nada lhe poderíamos adiantar, como lhe tínhamos dito. 3.º Como gostou do local tal como os restantes sócios, vimos confirmar-lhe em definitivos os principais pormenores do arrendamento, desde já nos vinculamos a dar pleno cumprimento (…)”.(alínea D) da matéria assente)
5. Do documento em que figura como remetente D. Lda. e destinatário B., pode ler-se, de entre o mais, “(…) Em resposta às cartas que me enviou tanto para mim como para o Sr. …, pedimos desculpa só hoje respondermos às mesmas. Acontece que estávamos a ver se poderíamos abrir a loja em …, conforme tudo estava previsto. No entanto lamento informar que não nos foi autorizada a abertura da mesma, por razões que nos são alheias. Pedimos mais uma vez desculpa mas sendo assim o que estava previsto fica sem qualquer efeito, dando por isso o assunto por encerrado (…)”(alínea E) da matéria assente)
6. Do documento em que figura como remetente (…), na qualidade de Advogado, e destinatário Gerência da Sociedade E., pode ler-se, de entre o mais, “Desde Março de 2001 houve negociações para arrendamento de um baixo sito (…) em …., entre V.Ex.as e o representante de M/Cliente Carlos Alberto Gradíssimo. No dia 26 de Maio foi acordado em definitivo esse arrendamento (…) Este acordo foi feito na presença e com a aceitação do sócio Sr. Américo Nicolau. Este acordo só não foi reduzido a escrito porque foi feito de boa fé (…) ” (alínea F) da matéria assente)
7. Do documento em que figura como remetente (…), e destinatário B., pode ler-se, de entre o mais, “(…) Vimos confirmar a recente visita do nosso Inspector (…) ao vosso armazém na Avenida …, bem como todas as atenções de simpatia e respectivas fotografias internas e externas ao edifício e sua implantação. (…) temos duas opções para decidir, sendo a primeira para … e a segunda para …, a fim de implantarmos um supermercado. Por consequência a nossa maior oferta com o fim de transaccionarmos são as seguintes, ficando a aguardar a vossa decisão até fins de Agosto sem falta (…)”(alínea G) da matéria assente)
8. Em Março de 2001, o réu F. contactou o autor e transmitiu-lhe o interesse em tomar de arrendamento o mencionado imóvel (artigo 4º da base instrutória)
9. … para ali instalar um supermercado (artigo 5º da base instrutória)
Mais resultou provado com interesse para a boa decisão da causa, por via dos documentos juntos aos autos a fls.282 e ss que:
10. A Ré E., SA, foi declarada insolvente em 13.10.2009, no âmbito do processo nº.852/09.9TBSLCV, que correu os seus termos pelo 1º Juizo do Tribunal Judicial de Silves.
11. O referido processo foi declarado encerrado por decisão proferida em 07.03.2013

II.2 Não se provou que:
i. Em Março de 2001, o autor era quem explorava de uma estação de serviço (artigo 1º da base instrutória),
ii. … instalada num imóvel, constituído de armazém comercial (artigo 2º da base instrutória)
iii. … sito em …, na Avenida … (artigo 3º da base instrutória)
iv. O autor conhece, desde há vários anos, o réu F. (artigo 6º da base instrutória)
v. O autor sabia que o réu F. era sócio gerente e o rosto, perante terceiros, da sociedade C.ª Lda. (artigo 7º da base instrutória)
vi. A quando do primeiro contacto mantido pessoalmente entre o autor e o réu F., este último referiu que pretendia arrendar o imóvel em apreço para depois ali instalar um supermercado (artigo 8º da base instrutória)
vii. … que resultaria da parceria entre si e a sua sociedade C. Lda. e ainda as rés D. e a E. (artigo 9º da base instrutória)
viii. O réu F. referiu que tinha a anuência dos responsáveis da D. e da E. (artigo 10º da base instrutória)
ix. … interessados no desfecho do negócio para procurar e contratar o arrendamento de um espaço que servisse os interesses de todos (artigo 11º da base instrutória)
x. O autor ficou convencido, naquele primeiro contacto, que seria o réu F. o interveniente directo no contrato de arrendamento (artigo 12º da base instrutória)
xi. … ficando ao critério deste réu a cedência do espaço para a utilização referida à dita parceria formada por si e pelas demais rés (artigo 13º da base instrutória)
xii. O réu F. transmitiu ao autor a informação de estar igualmente a actuar em nome dos demais réus (artigo 14º da base instrutória)
xiii. … dos quais tinha consentimento para procurar e contratar o arrendamento do espaço (artigo 15º da base instrutória)
xiv. … pois o interesse e objectivo final seria estabelecer entre todos, incluindo ele pessoalmente, uma parceria para instalar no imóvel acima mencionado um supermercado com a designação comercial E. (artigo 16º da base instrutória)
xv. Dos contactos havidos entre o autor e o réu F. resultou a marcação de uma reunião para o dia 26 de Maio de 2001 (artigo 17º da base instrutória)
xvi. … onde estiveram presentes todos os réus, estando a ré E. representada por (…) (artigo 18º da base instrutória)
xvii. … e a ré D. representada por (…) (artigo 19º da base instrutória)
xviii. … reunião onde a intervenção de todos foi confirmada pelo autor (artigo 20º da base instrutória)
xix. … reunião onde estiveram presentes as mulheres das pessoas cima mencionadas (artigo 21º da base instrutória)
xx. Nessa reunião foram ratificados os contactos e negociações já havidas (artigo 22º da base instrutória)
xxi. … destinando-se a mesma a negociar e fixar definitivamente as condições pelas quais o autor faria o arrendamento do dito armazém (artigo 23º da base instrutória)
xxii. O autor convidou as pessoas acima mencionadas para almoçar (artigo 24º da base instrutória)
xxiii. Dirigiram-se todos para visitar o baixo comercial (artigo 25º da base instrutória)
xxiv. … a todos os réus agradando e por todos tendo sido manifestado interesse em fechar negócio (artigo 26º da base instrutória)
xxv. Nesse encontro estabeleceu-se que o arrendamento seria pelo prazo de 05 anos, sucessivamente renovável (artigo 27º da base instrutória)
xxvi. … que os réus pagariam ao autor a quantia de € 29.927,87, a título de compensação pelo fecho da estação de serviço automóvel e para que este fosse vantajoso encerrar a actividade que ali exercia (artigo 28º da base instrutória)
xxvii. … que as rendas se fixavam em € 748,20 por mês, no primeiro ano de vigência do arrendamento (artigo 29º da base instrutória)
xxviii. … € 997,60 por mês, no segundo ano de vigência (artigo 30º da base instrutória)
xxix. … e € 1246,99 por mês, a partir do terceiro ano de vigência (artigo 31º da base instrutória)
xxx. … sendo que a partir daí a renda se actualizaria de acordo com o índice de inflação (artigo 32º da base instrutória)
xxxi. As referidas rendas mensais resultariam de subarrendamento que o autor faria aos réus (artigo 33º da base instrutória)
xxxii. Na altura, o autor já tinha obtido o acordo do seu cunhado (…) para o efeito (artigo 34º da base instrutória)
xxxiii. O contrato não foi reduzido a escrito, pelo avançado da hora (artigo 35º da base instrutória)
xxxiv. … tendo ficado assente que o contrato escrito seria reduzido a escrito nos dias seguintes (artigo 36º da base instrutória)
xxxv. … em data a marcar pelos réus e com prévio acordo de (…) que se deslocava de mais longe (artigo 37º da base instrutória)
xxxvi. No dia seguinte, o autor contactou o réu F. (artigo 38º da base instrutória)
xxxvii. … e transmitiu-lhe que o melhor seria marcar rapidamente o contrato e encerrar o problema (artigo 39º da base instrutória)
xxxviii. O autor enviou a carta referida em B ao réu F., em 28 de Maio de 2001 (artigo 40º da base instrutória)
xxxix. O réu F. foi dizendo ao autor para que descansasse que dali a dias já lhe diria qualquer coisa concreta (artigo 41º da base instrutória)
xl. … e disse-lhe garantia seriedade de todos os demais réus e para que ficasse tranquilo que lhe poria isso por escrito (artigo 42º da base instrutória)
xli. Em 06 de Junho de 2001, a segunda ré envia a carta mencionada em C. ao autor (artigo 43º da base instrutória)
xlii. O autor tratou imediatamente de tirar tudo o que era do seu interior do baixo, deixando-o livre (artigo 44º da base instrutória)
xliii. Os réus não apareceram no dia 01 de Julho (artigo 45º da base instrutória)
xliv. … nem nunca mais (artigo 46º da base instrutória)
xlv. … nem para pagar as rendas ou para instalar a E. (artigo 47º da base instrutória)
xlvi. Nesse dia 01, o autor contactou o réu F. que lhe disse que estavam a acabar de organizar as coisas para começar as obras (artigo 48º da base instrutória)
xlvii. Passados dias, novo contacto e a mesma conversa (artigo 49º da base instrutória)
xlviii. Passados outros dias, a mesma desculpa e assim sucessivamente durante meses (artigo 50º da base instrutória)
xlix. Nesse entretanto, o autor foi abordado por um banco que ali se queria instalar e lhe interessava o baixo (artigo 51º da base instrutória)
l. … e transmitiu que já havia dado a sua palavra aos réus (artigo 52º da base instrutória)
li. Em 05 de Outubro, o autor escreve a carta referida em C. aos réus F. e ré D. (artigo 53º da base instrutória)
lii. Às cartas mencionadas em B. e C., os réus dão resposta, em 09 de Novembro de 2001, conforme carta referida em D. (artigo 54º da base instrutória)
liii. A viabilidade do negócio por parte dos réus foi aferida antes da reunião acima mencionada (artigo 55º da base instrutória)
liv. Com base no acima descrito o autor acabou por encerrar uma estação de serviço automóvel (artigo 56º da base instrutória)
lv. … e procedeu à sua desmontagem, remoção e limpeza do baixo (artigo 57º da base instrutória)
lvi. Os réus não avisaram com tempo razoável ao autor que tinham perdido o interesse (artigo 58º da base instrutória)
lvii. De 01 de Julho de 2001 a 09 de Novembro de 2001, o autor deixou de arrendar o baixo a terceiros (artigo 59º da base instrutória)
lviii. O autor procurou contactar os réus logo que recebeu a carta referida em E. (artigo 60º da base instrutória)
lix. … reclamando responsabilidades (artigo 61º da base instrutória)
lx. Já em 2002, por intermédio de Advogado, o autor procurou contactar os réus, com o mesmo intuito, através da carta referida em F. (artigo 62º da base instrutória)
lxi. Na sequência da carta referida em E., o réu F. entrou em contacto com o autor a dizer que tinha sido contactado por (…) da E. e que esperasse porque talvez ainda houvesse uma hipótese de o contrato vir a ser reatado e que brevemente lhe diria alguma coisa (artigo 63º da base instrutória)
lxii. Em Junho de 2002, o autor é abordado por responsáveis do supermercado LIDL, no sentido de manifestar interesse no arrendamento do baixo, conforme documento referido em G. (artigo 64º da base instrutória)
lxiii. O autor contactou o réu F. a transmitir o teor da proposta acima mencionada e que deveria decidir se realmente lhe interessava ou não o baixo (artigo 65º da base instrutória)
lxiv. Nessa conversa, foi-lhe dito que não aceitasse a proposta da (…), porque agora é que iria ser e era dessa que viriam tomar conta do armazém (artigo 66º da base instrutória)
lxv. O réu F., acompanhado por (…), falou com o autor sobre a possibilidade de arrendarem um imóvel pertença deste (artigo 67º da base instrutória)
lxvi. Aí, havia funcionado, anos antes, uma empresa, que se dedicava à exploração de umas bombas de gasolina, que entretanto haviam encerrado, estando desactivadas (artigo 68º da base instrutória)
lxvii. Nesse encontro, foi explicado ao autor que a ré E. estaria à procura de um local para instalar um supermercado (artigo 69º da base instrutória)
lxviii. Nunca a instalação desse supermercado resultaria de uma parceria entre o réu F., a ré C. Lda., a ré D., Lda. e a ré F., S.A. (artigo 70º da base instrutória)
lxix. Nesse mesmo dia, o autor disponibilizou-se para, caso o imóvel interessasse, encher com areia um antigo depósito de combustível, uma vez que este era perigoso (artigo 71º da base instrutória)
lxx. Logo ali lhe foi dito que não podiam tomar qualquer decisão sem prévia autorização da ré E. (artigo 72º da base instrutória)
lxxi. Tendo disso ficado ciente o Autor (artigo 73º da base instrutória)
lxxii. Não existiu qualquer almoço com o autor e as mulheres do réu F. e demais interessados (artigo 74º da base instrutória)

O DIREITO .
No caso presente o A/apelante pretende ser indemnizado pelos danos que alegadamente terá sofrido em consequência da ruptura, por parte dos RR, das negociações que com ele vinham mantendo com vista à celebração do negócio descrito no autos, e relacionado com o subarrendamento de um espaço alegadamente explorado pelo A (estação de serviço)-
Ora, tal transporta-nos para o instituto da responsabilidade pré-contratual (como é mais vulgarmente conhecido) ou da culpa in contrahendo Responsabilidade essa que entre nós se encontra consagrada no artº 227 do C. Civil, ao dispor, no seu nº 1, que “quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa-fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte.”
Subjacente a tal instituto está não só a consideração de interesses particulares mas também de interesses públicos. Nos primeiros visa-se directamente tutelar a confiança fundada de cada uma das partes em que a outra conduza as negociações segundo a boa-fé e, por conseguinte, tutelar as expectativas legítimas que a mesma lhe crie, não só quanto à validade do próprio negócio, mas também quanto à sua futura celebração. No que concerne aos segundos está naturalmente a preocupação da defesa dos valores sociais da segurança e da facilitação do comércio jurídico.
Do próprio citado artº 227 é possível descortinar que prévia ou anteriormente à fase da formação dos contratos existem outras duas fases ou ciclos:
a) uma fase negociatória, integrada pelos actos preparatórios realizados sem marcada intenção vinculante, desde os primeiros contactos das partes até à formação da proposta contratual definitiva, que, visa, assim, preparação do conteúdo do acordo;
b) e uma fase decisória, que é constituída por duas declarações de vontade que ambas as partes emitem com vista a vincular-se ao futuro acordo que negociaram, ou seja, pela proposta e pela aceitação do contrato.
A boa-fé de que se fala no aludido normativo legal, ao contrário do que sucede em outras situações em que tal conceito é igualmente empregue, é marcado por um sentido vincadamente ético das condutas dos agentes envolvidos, que vai muito para além do elemento ou significado psicológico que normalmente lhe está associado.
Muito embora se trate de com conceito indeterminado, deverá, todavia, ser apreciado e concretizado casuisticamente, ou seja, segundo a justiça de cada caso concreto, e sempre à luz de critérios objectivos.
De qualquer modo, e nessa perspectiva, é hoje cada vez mais consensual que emergindo do referido conceito de boa-fé com que as partes devem actuar, em qualquer das fases da formação dos contratos, surgem para elas uma série de deveres que se mostrem, perante cada caso, relevantes para a decisão de contratar, tais como os deveres de informação, de lealdade, de probidade, de honestidade, de correcção, de lisura, e até mesmo de conservação e cuidado. Aliás, deve mesmo dizer-se que perante a cada vez maior complexidade do mundo negocial, vem cada vez ganhando mais adeptos a corrente que defende a imposição, nesse domínio, aos contraentes não só de uma atitude de correcção traduzida em obrigações de escopo negativo - visando impedir toda e qualquer lesão na esfera jurídica de outrem -, mas inclusive também uma colaboração activa, no sentido da satisfação das expectativas que entretanto foram criadas.
Assim, com a chamada responsabilidade pré-contratual visa o direito proteger directamente a confiança recíproca de cada uma das partes em que a outra conduza as negociações segundo a boa-fé, ou seja, num plano de proibidade, lealdade e seriedade de propósitos, e capaz de levar razoavelmente à expectativa (objectiva e fundada) de que tal possa conduzir à conclusão de um negócio.
E dai que a violação (culposa) por uma das partes desse dever de confiança seja susceptível de a responsabilizar pelos danos que tal conduta possa causar à contraparte.
Vem hoje constituindo entendimento dominante que obrigação decorrente de tal responsabilidade é índole ou natureza extracontratual, pelo que em qualquer situação susceptível de gerar a responsabilidade pré-contratual necessário se torna a presença ou o preenchimento dos requisitos específicos de que atrás falámos e bem como ainda daqueles outros que disciplinam e são constitutivos da responsabilidade civil extracontratual (e nomeadamente que a conduta de um dos contraentes seja ilícita à luz dos princípios de que supra falámos em que assenta a responsabilidade pré-contratual, que seja culposa, e que tenha adequadamente causado danos).
Importa ainda também sublinhar constituir hoje igualmente entendimento dominante entre nós que a aludida responsabilidade que vimos abordando impõe apenas a obrigação de indemnizar o chamado dano ou interesse negativo ou de confiança (ou seja, o dano resultante da violação da confiança, e por forma a colocar um dos contraentes prejudicados na situação em que se encontraria se não tivesse entrado nas negociações e sido levado a confiar na contraparte violadora dessa confiança, evitando, desse modo, os prejuízos que, por via de tal, veio a ter) – nele se incluindo quer o dano emergente, quer o lucro cessante – e que só em casos muito excepcionais poderá estender-se ao chamado dano ou interesse positivo ou de cumprimento.
Por todos vide Ac. da R. Coimbra datado de 27-05-2015 e disponível em http://www.trc.pt/index.php/jurisprudencia-do-trc.
Como resulta do artº 227º do C. Civil, ‘quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte’.
1. No Ac. Rel. de Évora de 22/06/2004, in Col Jur. Ano XXIX, tomo III, pg. 255, diz-se (escreve-se) que: “Para que, com base no disposto no artº 227º, nº 1 do CC, surja a obrigação de indemnizar, é necessário, para além da produção de danos e da existência dos demais pressupostos da responsabilidade civil, que tenham ocorrido efectivamente negociações conduzidas de tal forma que tenham criado uma confiança razoável na conclusão de um contrato válido e a consequente obtenção dos efeitos do mesmo decorrentes, perante a seriedade de propósitos evidenciada, bem como a ruptura das referidas negociações, de forma arbitrária ou ilegítima, porquanto sem motivo justificativo”.
2. A responsabilidade por culpa in contrahendo decorre do facto de uma das partes ter gerado na outra a confiança e a expectativa legítima de que o contrato seria concluído e não da ruptura das negociações, da não conclusão do contrato ou da recusa da sua celebração, as quais são manifestações da liberdade contratual negativa.
3. Se houver danos resultantes de culpa in contrahendo, em princípio, a indemnização refere-se ao interesse negativo, ou seja, a reparação reporta-se aos danos resultantes de ter existido confiança na validade do contrato, danos estes que são os que não teria sofrido se não tivesse confiado na realização do contrato; mas se a dita culpa estiver na violação de um dever de conclusão de um contrato, é de indemnizar o interesse positivo, ou seja o interesse do cumprimento
O MÉRITO DO RECURSO:
Feitas estas considerações de direito vejamos o caso dos autos.
Está assente que entre o A e os RR existiu troca de correspondência que inculca a ideia de que haveria interesse, pelo menos por parte do R F. em tomar de arrendamento um espaço (conf. pontos 8 e 9 dos factos provados ) mostrado pelo A. a representantes da (…) (conf. Pontos 7 dos factos provados ); o C. Lda. (ponto 4).
O qual não se concretizou disso tendo sido informado o A. , pelo menos por C. Lda. (ponto 5).

No entanto não mais do que isso se provou e o ónus impunha-se ao A. artº 342º, n.º1 do C.Civil - não se provou sequer que o A. fosse dono do espaço que alegadamente serviria como locado, (nem ele o alegou referindo pertencer ao seu cunhado (…)); nem tão pouco que dele tinha posse uso ou fruição- já que não se provou que o A. Em Março de 2001 era quem explorava uma estação de serviço, instalada num imóvel, constituído de armazém comercial sito em …( conf factos não provados artigos, 1º 2º e 3º da base instrutória)
Que este tenha tido qualquer prejuízo: factos não provados: o autor acabou por encerrar uma estação de serviço automóvel (artigo 56º da base instrutória)
lv. … e procedeu à sua desmontagem, remoção e limpeza do baixo (artigo 57º da base instrutória)
lvi. Os réus não avisaram com tempo razoável ao autor que tinham perdido o interesse (artigo 58º da base instrutória)
lvii. De 01 de Julho de 2001 a 09 de Novembro de 2001, o autor deixou de arrendar o baixo a terceiros (artigo 59º da base instrutória)
lxii. Em Junho de 2002, o autor é abordado por responsáveis do supermercado LIDL, no sentido de manifestar interesse no arrendamento do baixo, conforme documento referido em G. (artigo 64º da base instrutória)
lxiii. O autor contactou o réu F. a transmitir o teor da proposta acima mencionada e que deveria decidir se realmente lhe interessava ou não o baixo (artigo 65º da base instrutória)
lxiv. Nessa conversa, foi-lhe dito que não aceitasse a proposta da (…), porque agora é que iria ser e era dessa que viriam tomar conta do armazém (artigo 66º da base instrutória)

Ou a existir que tenha havido qualquer nexo de causalidade entre o dano e o comportamento dos RR.
Assim, manifestamente a pretensão do A. está votada ao insucesso como bem se decidiu na sentença recorrida que, por tal facto, não merece qualquer censura.
Improcedendo assim a pretensão recursiva do A.

IV. DECISÃO
Pelo que fica exposto, acorda-se nesta secção cível da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.
Custas a cargo do Recorrente.
Guimarães 15 de dezembro de 2016.------------------

Relatora, Fernanda Ventura
1ª Adjunto, Pedro Alexandre Damião e Cunha
2º Adjunto, Maria João Marques Pinto de Matos

V- SUMARIANDO (art. 663º nº 7 do CPC)
1-A responsabilidade por culpa in contrahendo decorre do facto de uma das partes ter gerado na outra a confiança e a expectativa legítima de que o contrato seria concluído e não da ruptura das negociações, da não conclusão do contrato ou da recusa da sua celebração, as quais são manifestações da liberdade contratual negativa.
2- A Alegação e prova dos factos constitutivos do direito cabe àquele que o invoca como se impõe no art.º 342º do C.Civil.