Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
787/15.6T8FAF.G1
Relator: ANABELA TENREIRO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO
DEVER DE INFORMAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/21/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- A importância do cumprimento do dever de informação pelo intermediário financeiro não tem como finalidade exclusiva um interesse meramente particular de tutela dos interesses dos investidores mas também razões de protecção do mercado financeiro, que se pretende transparente e regular.

II- O legislador europeu (Directiva n.º 2004/39/CE de 21/04 do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos mercados de instrumentos financeiros) teve uma particular atenção com a tutela dos investidores, proporcionando um elevado nível de protecção; com esse objectivo, enunciou normas de conduta dirigidas às empresas de investimento, destinadas a assegurar uma actuação honesta, equitativa e profissional, em função dos interesses dos clientes, a prestação correcta e clara de todas as informações, e que não induzam em erro os clientes.

III- Assim, a informação respeitante a instrumentos financeiros deve ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita, aplicando-se seja qual for o meio de divulgação e ainda que seja inserida em conselho, recomendação, mensagem publicitária ou relatório de notação de risco (art. 7.º, n.º 1 e 2 do CVM).

IV- A lei exige que o intermediário financeiro paute a sua actuação por elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, pois só dessa forma se exerce uma tutela efectiva dos investidores, os quais, se forem não qualificados, constituem a parte menos experiente no contrato.

V- Um cliente que pretende fazer um depósito a prazo e é convencido pelo funcionário bancário a investir em obrigações, sem informar minimamente este potencial investidor, não qualificado, sobre a natureza, características e riscos desse valor mobiliário, transmitindo-lhe que é igual, em termos de segurança, a um depósito a prazo, pode responsabilizar civilmente o banco uma vez que, para além de não ter sido cumprido o dever de informação a que se encontrava adstrito, induziu em erro o cliente, parte mais inexperiente, em termos financeiros, do contrato.
Decisão Texto Integral:
I- RELATÓRIO

António e Rosa, residentes na Praceta …, na freguesia e concelho de Fafe, intentaram acção declarativa sob a forma de processo comum contra “Banco A, S.A.”, com sede na Av. …, Lisboa, pedindo:
A. Seja declarado nulo qualquer eventual contrato de adesão que o réu invoque para ter aplicado os €50.000,00 que os autores entregaram ao réu, através do cheque nº 14715547 sacados sob a Banco X e que foi objecto de depósito na conta nº...1 do Banco A;
B. Seja declarado ineficaz em relação aos autores a aplicação que o réu tenha feito desse montante;
C. Seja condenado o réu a restituir aos autores a quantia de €50.000,00 que estes lhe entregaram em Setembro de 2007, acrescida de juros legais vincendos desde a citação até efectivo e integral cumprimento.

Alegaram, em síntese, que são clientes do Réu, sendo titulares da conta que identificam no art. 1º, da petição inicial; que em Setembro de 2007, demonstraram perante o seu gestor de conta–José– vontade de ali efectuar um depósito a prazo, no valor de € 50.000,00; nessa altura foi-lhes dito pelo referido gestor de conta que tinha um produto mais lucrativo onde investir a referida quantia, assegurando que tal produto tinha as mesmas características de segurança e isenção de risco que um depósito a prazo; os autores, que sempre foram investidores conservadores, tendo por base a relação de confiança que tinham com o seu gestor de conta aceitaram fazer o referido investimento; aquando da realização do mesmo, aos autores nada mais foi explicado e nenhum documento lhes foi entregue, para além do manuscrito que consta dos autos como documento n.º 2; alegam por fim que, não obstante as insistentes reclamações, estão privados do capital investido, no valor de € 50.000,00.

Contestou o Réu, invocando, antes de mais, a incompetência territorial deste Tribunal de Fafe, para conhecer da presente acção; invocou, depois, a prescrição do direito dos autores, por aplicação do disposto no art. 324º, do Código dos Valores Mobiliários; impugnaram ainda a matéria alegada pelos autores, afirmando que os mesmos tinham perfeito conhecimento do produto que estavam a subscrever pois sempre receberam os pagamentos semestrais de juros relativos ao dito produto; sabiam ainda os autores as obrigações em causa tinham um prazo de 10 anos, durante os quais a única forma de reaver o montante investido seria transmitir as obrigações para um terceiro, mediante endosso; termina pedindo a improcedência da acção.
Foi julgada procedente a excepção de incompetência territorial, tendo a dita decisão sido, depois, revogada pelo Tribunal da Relação de Guimarães.
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Proferiu-se sentença que julgou a acção totalmente procedente e condenou o Réu a pagar aos Autores a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
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Inconformado com a sentença, o Réu interpôs recurso, terminando com as seguintes

Conclusões

I.O Banco Recorrente não pode deixar de discordar, de uma forma generalizada, com a matéria de facto dada como provada, mormente aquela atinente às circunstâncias em que o produto em causa foi contratado.
II.O Banco Recorrente não pode, assim, concordar com a matéria de facto dada como provada descrita nos números 1.6, 1.8, 1.10, 1.14, 1.15, 1.16, 1.17, 1.19 e 1.20.
III. E isto porque não foi produzida prova que permita suportar toda a matéria fáctica dada como provada.
IV.Da análise da prova produzida, resulta claro que, na verdade, o Tribunal decidiu considerar como provados estes factos com base única e exclusivamente nas declarações de parte do Autor, uma vez que resulta claro dos depoimentos das testemunhas que estas não tiveram qualquer intervenção na contratação do produto, nem sequer a tal assistiram.
V.A testemunha Mário, amigo de longa data do Autor marido, apenas relatou a circunstância desta testemunha ser um dos lesados pelo esquema fraudulento montado e desenvolvido pelo ex-gerente da Agência de Fafe do Banco A, José fraude esta que foi alvo de processo crime (Proc. 414/09.0TAFAF, que correu termos no Juízo Central Criminal de Guimarães - J3) já transitado em julgado, tendo o Arguido em causa sido condenado pela prática, em concurso real e efectivo e em autoria material de um crime de burla qualificada e de um crime de abuso de confiança agravado.
VI.Na verdade, conforme a aludida testemunha Mário confirmou no seu depoimento, este nunca pretendeu adquirir qualquer produto financeiro, nem mesmo um depósito a prazo, tendo sido o aludido gerente José que, movimentou sem a sua autorização, um depósito a prazo que este detinha na sua conta e adquirido obrigações (Cfr. ficheiro áudio n.º 20171011110000_5072566_2870580, mino 00:09:19 a 00:09:31; mino 00:10:00 a 00:10:28:
VII.Também no que se refere ao depoimento da testemunha Nuno, cumpre referir que também esta testemunha não assistiu à apresentação das obrigações BANCO A1 Rendimento Mais 2004, ao Autor, pelo que não foi capaz de indicar quais as informações que foram transmitidas pelo gerente de conta do Autor, José, ao Autor, aquando da apresentação do aludido produto.
VIII.Acresce que, do teor do depoimento da testemunha, que ainda que não tivesse comercializado ao Autor o produto em causa nos presentes autos, vendeu o aludido produto a outros clientes, resulta que as informações sobre a taxa, e o prazo a que estava sujeito o produto eram transmitidas (Cfr. ficheiro áudio n.Q 20171011104758_5072566_2870580, mino 00:07:40 a 00:08:20:
IX.Por fim, e no que concerne ao depoimento de parte do Autor, diga-se que não tendo o mesmo assumido carácter confessório, deverá o mesmo ser livremente apreciado.
X.E, diga-se que quanto a este aspecto, o depoimento do Autor foi notoriamente tendencioso, incongruente, artificial e artificioso.
XI.Começa o Autor por referir que aquando da subscrição do produto financeiro em causa, não lhe foi explicado sequer qual o prazo a que o produto estava sujeito (Cfr. ficheiro áudio n.º 20171011101733 5072566 2870580min. - - 00:01:27 a 00:03:14:
XII.Logo aqui, o depoimento do Autor se mostra absolutamente incongruente na medida em que não crível que alguém que se diz zeloso do seu dinheiro, deposite um valor sem sequer ter conhecimento do prazo a que o produto está sujeito.
XIII.A sujeição das aplicações financeiras a um prazo aplica-se não só nas obrigações, como também nos depósitos a prazo.
XIV.Acresce que, o documento n.º 2 junto aos autos pelo A. a fls 13 com a P.I. e que consiste na Comunicação de Cliente subscrita e assinada pelo Autor, aquando da subscrição do produto em causa refere que a taxa de juro sofre majoração após os 5 primeiros anos de vigência do mesmo.
XV.A comunicação supra referida, alude precisamente a que o produto é a 10 anos, fazendo referência ao aumento da taxa de juro nos primeiros cinco anos e nos cinco anos seguintes.
XVI.É inevitável que o depoimento do A. tendo em consideração o interesse que este detém na causa, seja tendencioso. Pelo que, não deve ser dado crédito total ao mesmo e, muito menos, devem ser considerados provados factos que apenas são referidos pelo Autor.
XVII.Chamamos aqui à colação o Acórdão do Relação do Porto Nas declarações de parte [artgo 466º do novo CPC]- que divergem do depoimento de parte ¬devem ser atendidas e valoradas com algum cuidado. As mesmas, como meio probatório, não podem olvidar que são declarações interessadas, parciais e não isentas, em que quem as produz tem um manifesto interesse na acção. Seria de todo insensato que sem mais, nomeadamente, sem o auxílio de outros meios probatorios, sejam eles documentais ou testemunhais, o Tribunal desse como provados os factos pela própria parte alegados e por ela, tão só, admitidos.
XVIII. Acresce que, no que concerne ao prazo a que o produto estava sujeito, a testemunha Nuno referiu que o prazo a que o produto estava sujeito era sempre referido (dr. ficheiro áudio n.Q 20171011104758_5072566_2870580, mino 00:07:40 a 00:09:08).
XIX.Pelo que, os pontos 1.6, 1.10, 1.16 e 1.17 dos factos provados deverão ser considerados como não provados na medida em que nenhuma prova foi produzida sobre essa matéria, conforme se expõe infra.
xx.Acresce que, tendo em consideração a resposta como não provada que deverá ser dada aos pontos supra referidos, por inerência, também o ponto 1.14, 1.15 e 1.20 deverá ser dado como não provado, na medida em que os AA. não lograram provar que não lhes tenha sido explicado que o produto que haviam adquirido eram obrigações subordinadas BANCO A1.
XXI.O ponto 1.19 dos factos provados também não resultou provado na medida em que foi junto aos autos pelo Autor, com a P.I. a fls 13, a comunicação de cliente assinada pelo Autor, na qual é dada ordem para subscrição do produto em causa nos presentes autos, conforme resulta da transcrição supra. Acresce que, o Autor confirma no seu depoimento que recebeu tal documento, onde constam as características essenciais do produto (Cfr. ficheiro audio n..º 20171011101733_5072566_2870580, mino 00:08:18 a 00:09:26).
XXII.Pelo que, o ponto 1.19 dos factos provados deverá ser dado como não provado.
XXIII.Por fim, relativamente ao ponto 1.8 dos factos provados, diga-se que, não foi produzida qualquer prova sobre o facto de ter sido garantido aos Autores que o reembolso do capital investido, findo o prazo a que o produto estava sujeito, era garantido pelo banco, e não pela Banco A1 (BANCO A1), a entidade emitente das obrigações em causa.
XXIV.A única testemunha que poderia comprovar tal alegação por parte dos Autores, era o ex-funcionário do Banco A Nuno, que tal como referido supra, ainda que não tenha vendido as obrigações em causa nos presentes autos, aos Autores, vendeu-as a outros clientes.
XXV.Também seria esta a única testemunha capaz de comprovar se este produto era vendido como de um depósito a prazo se tratasse e cujo reembolso do capital era assegurado pelo Banco Réu, e não pela entidade emitente, a Banco A1, o que não sucedeu! (Cfr. ficheiro áudio n.Q 20171011104758_5072566_2870580, mino 00:07:40 a 00:08:20).
XXVI.Do depoimento do Autor não consta qualquer menção a que lhe tivesse sido transmitido, ou sequer que aquando da subscrição do produto, os Autores tivessem ficado convencidos de que era o Banco A, quem garantia o reembolso do produto (Cfr. ficheiro áudio n.º 20171011101733_5072566_2870580, mino 00:01:29 a 00:03:07, mino 00:06:18 a 00:07:14, mino 00:08:18 a 00:09:26, mino 00:16:43 a 00:17:20, mino 00:19:00 a 00:19:53, mino 00:08:18 a 00:09:26.
XXVII.Do supra exposto resulta que, também o ponto 1.8 dos factos provados deverá ser dado como não provado, na parte em que refere que era um produto "garantido em absoluto pelo banco", devendo ser formulado da seguinte forma: "O dito gerente sempre argumentou que havia instruções da Direcção Comercial do Banco A de que se tratava de um investimento seguro, que era um investimento feito dentro do mesmo grupo empresarial que o Banco A, afirmando a segurança do produto, a sua solidez, a boa rentabilidade."
XXVIII.Nos termos do disposto no art. 342.º, n.º 1 do Cód. Civil, o ónus da prova daquilo que terá sido transmitido no momento da venda impendia sobre o Autor.
XXIX.Caberia aos Autores a prova (i) da deficiência ou omissão de informação relevante, susceptível de integrar a violação da obrigação do intermediário financeiro, ou outra violação de obrigações do Réu que julgasse relevantes; (ii) da causalidade adequada entre o dito facto ou omissão, sua ilicitude e ao dano produzido; (iii) do dano! Ao Banco-Réu caberia a contraprova da sua culpa na prática do dito acto ou omissão!
XXX. Dos factos dados como provados não consta qualquer facto que suporte a conclusão de que o banco actuou com dolo ou culpa grave.
XXXI.Não logrou assim o Autor também provar qualquer facto consubstanciador do dolo ou culpa grave do Banco Recorrido.
XXXII.O Tribunal a quo condenou o Recorrente por considerar que o facto do gerente bancário do Réu ter dito ao Autor que a aplicação financeira tinha "garantia de capital e juros" no termo do prazo configura a prestação de uma informação falsa.
XXXIII.O uso dessa expressão apenas pode ser visto como referencia à mecânica de funcionamento do investimento, que é feito por um determinado prazo, findo o qual o capital é reembolsado na totalidade, acrescido da rentabilidade.

É utópico pretender ver nessa singela referência qualquer espécie de garantia absoluta do investimento, até porque essa garantia não existe.
XL.Mesmo que se compare o investimento efectuado com aquele que é afirmado como paradigma de investimento seguro - o depósito a prazo - essa garantia não existe, sobretudo até considerando que uma hipótese de insolvência da instituição bancária sempre redundaria na cobertura pelo Fundo de Garantia de Depósitos que, à data do investimento se cifrava em apenas 25.000,00 euros, o que seria fraco consolo para ressarcir uma perda de investimento de 50.000,00 euros.

O Tribunal a quo parece considerar que a aplicação financeira era afinal um "produto de risco", pelo facto do Autor não ter recebido o capital investido no final do prazo.

Porém esse raciocínio é uma falácia, pois confunde a causa com a consequência. Não é porque um investimento se possa vir a revelar ruinoso, que o mesmo pode ser classificado como investimento de risco.

Tal juízo tem que ser feito retroagindo ao momento da subscrição e tendo por base a prognose que então era possível fazer com os dados conhecidos.

As obrigações eram então, como são ainda, um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente. Ao que acrescia, no caso concreto, o facto de a entidade emitente pertencer ao mesmo Grupo que o Banco Réu, detendo-o até a 100%.

O investimento efectuado era assim um investimento seguro e não um investimento em qualquer "produto de risco".

Pelo que o investimento efectuado era então adequado a alguém como o Recorrente.

A sentença recorrida merece censura por tratar indistintamente os deveres que incidem sobre o intermediário financeiro, sem cuidar de perceber o momento ou o negócio a que dizem respeito e em função do qual devem ser cumpridos.
Os deveres de informação podem ser categorizados segundo o momento em que devem ser cumpridos (informação pré-contratual ou informação contratual) ou também segundo a estrutura própria dos negócios de intermediação financeira.
Trata-se, em suma, de sistematizar os deveres de informação, consoante se referem: i) ao negócio de cobertura - a saber, o contrato de intermediação propriamente dito celebrado entre o intermediário financeiro e o cliente -; ii) ao negócio de execução - a saber, os contratos que o intermediário celebra com terceiros com base nos poderes que lhe foram conferidos pelo negócio de cobertura, ou até mesmo os contratos celebrados entre o cliente e o terceiro, com intermediação do intermediário -; iii) ao instrumento financeiro propriamente dito.
Esta segmentação do dever de informação pode ser claramente vista no corpo do n.º 1 do art. 312.º do CdVM, donde resulta que os deveres de informação aí previstos dizem respeito ao negócio de cobertura, com excepção da alínea d) do referido n.º 1 que se refere aos instrumentos financeiros propriamente ditos. O art. 312.º do CdVM serve como verdadeiro índice programático dos deveres de informação que são aí genericamente afirmados, para depois serem densificados nos preceitos seguintes. Por isso, não tem qualquer cabimento a alegação do Recorrente de que o Recorrido violou as disposições vertidas no art. 312.º n.º 1 alíneas d) e e). A afirmação desses deveres não assume qualquer autonomia, tendo antes que se buscar na densificação desses preceitos o conteúdo do dever de informação aí genericamente afirmado.
A menção do art. 312.º n.º 1 alínea e) quanto aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar refere-se necessariamente ao negócio de intermediação financeira, enquanto negócio de cobertura e não pode nunca equivaler ao dever de informação sobre o instrumento financeiro em si. Por isso o art. 312.º n.º 1 alínea e) em nada se relaciona com a situação aqui em crise, de nada servindo a sua invocação para aí estribar um ilícito do Banco Réu.
XLVIII. O dever de informação previsto no art. 312.º n.º 1 alínea d) do CdVM respeitante aos instrumentos financeiros e às estratégias de investimento propostas é depois densificado no art. 312.º-E n.ºs 1 e 2.
XLIX. A referência do n.º 1 deste artigo à natureza do instrumento financeiro refere-se às características e funcionamento do instrumento financeiro.
L. O que, no caso presente, foi suficientemente cumprido pelo Banco Recorrido, conforme resulta da boa análise dos factos provados.
LI. A menção do art. 312.º-E n.º 1 do CdVM quanto aos riscos do tipo do instrumento financeiro remete para o n.º 2 do mesmo preceito, onde o legislador esclareceu a que riscos se refere e sobre os quais está o intermediário financeiro obrigado a informar o investidor, desde que tais riscos sejam aplicáveis, claro está, ao tipo de instrumento financeiro escolhido para o investimento.
LII. Nos termos da lei, são estes e apenas estes os riscos do tipo do instrumento financeiro sobre os quais o intermediário financeiro tem que prestar informação.
LIII. Os riscos a que se refere o art. 312.º-E n.º2 são riscos endógenos e próprios do tipo de instrumento financeiro e não motivados por quaisquer factores extrínsecos aos mesmos.
LIV. Ora, o investimento sobre que versa o presente processo foi feito em Obrigações e é, portanto, um investimento de baixo risco por se tratar de investimento não sujeito a qualquer volatilidade.
LV. Logo, não há necessidade de que a advertência do risco da perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso, porque não é inerente ao produto!
LVI. E não se confunda o cumprimento do dever de informação quanto ao risco da perda da totalidade do investimento com a necessidade de advertência do investidor sobre os riscos de incumprimento pelo obrigado da obrigação de compra decorrente do cumprimento da opção de venda, ou sequer com qualquer advertência sobre uma hipotética insolvência desse mesmo obrigado.
LVII. É que essa característica excludente do risco de perda da totalidade do investimento em nada se confunde ou exclui o risco geral de incumprimento de toda e qualquer obrigação.
LVIII. De facto, esse é um RISCO GERAL e latente de toda e qualquer obrigação e não qualquer risco específico do tipo de instrumento financeiro escolhido e, portanto, não se insere naquela previsão do art. 312.º-E n.º 2 alínea a).
L1X. A redacção do CDVM anterior à DMIF era muito mais ligeira na obrigação de informação do intermediário financeiro.
LX. E, então, não estava sequer tão densificado o dever de informação, conforme hoje resulta das disposições dos arts. 312.º-A a 312.º-G, que apenas foram aditadas com o já referido D.L. 357-A/2007 de 31/10.
LXI. À data da subscrição das Obrigações, não existia sequer qualquer dever de informação quanto aos riscos associados ao instrumento financeiro, ou quanto ao risco de perda da totalidade do investimento, conforme hoje decorre do art. 312.º-E n.º 2 alínea a)!
LXII. Para além disto, a anterior redacção do CDVM apenas afirmava no art. 323.º uma regra geral quanto ao dever de informação nos negócios de execução, donde resultava a obrigação do intermediário informar o cliente sobre a execução e resultados da operação, da ocorrência de dificuldades especiais na execução ou a inviabilidade da operação, ou de qualquer circunstância que pudesse justificar a modificação ou revogação da ordem.
LXIII. Ao contrário do que hoje sucede, não havia na anterior redacção do CdVM qualquer norma que taxativamente obrigasse o intermediário financeiro a prestar informações acerca dos riscos do tipo de instrumento financeiro em que se pretendia investir. Essa foi a grande inovação da D.M.I.F. e do diploma que a transpôs!
o incumprimento do dever de informação implica uma presunção de culpa do intermediário financeiro, nos termos do art. 304.º-A n.º 2 do CDVM, porém não existe qualquer presunção de ilicitude a este respeito, cabendo portanto ao lesado e aqui Autor alegar e provar o que concretas informações é que o Réu deveria ter dado que não deu.
O que, como não foi feito, condena a presente acção ao fracasso.
A ideia que fica de toda a prova produzida é que a referência que foi feita pelo funcionário do Banco Réu à garantia de capital e juros tinha que ver com o modo de funcionamento da aplicação financeira (que não estava sujeita a volatilidade de preço/cotação no termo do prazo) e que, findo o prazo de investimento, haveria o retorno integral do capital, acrescido dos juros.
A expressão garantia tem que ver por isso com um retorno certo do capital e não com qualquer caução que o Banco prestasse.
E aliás diga-se que, o próprio funcionário do Banco associou essa garantia de capital e juros com o reembolso dos títulos ser efectuado ao valor nominal acrescido dos respectivos juros na data de vencimento de cada emissão, conforme consta da nota informativa!

Fica assim suficientemente esclarecido o que o funcionário pretendia dizer! Ora, esta expressão do funcionário do Banco Réu tem também que ser vista no contexto em que foi proferida. De facto, no início do 2008 ainda não tinha deflagrado a crise financeiro de Setembro de 2008 (com a falência do LB). Nessa altura não era vulgar o incumprimento das obrigações assumidas em títulos, ou a insolvência dos emitentes.
Por isso, esse risco não era algo que o público em geral tivesse consciência e que se buscasse certificar ou fosse necessário elucidar.
E tal terá sucedido também com o Autor, que se importou mais com a melhor rentabilidade oferecida, do que propriamente com a identidade de quem ficaria perante si obrigado.
E a informação a prestar pelo intermediário financeiro tem que ser prestada segundo o critério objectivo previsto no art. 312.º-Na.º 1 alínea c) CdVM, ou seja, de forma a ser perceptível pelo destinatário médio.
Nada obrigando a que o intermediário financeiro tenha, para além do dever de informar, o dever também de se assegurar que o investidor compreendeu a informação!
Por tudo isto é necessário concluir que o Banco Réu agiu sem culpa.
Não está provado que se tenha tornado total ou parcialmente impossível receber o montante investido pelo Autor nas Obrigações BANCO A1.
Daí resulta, portanto, que a condenação do Banco Réu no pagamento da integralidade do valor desembolsado pelo Autor é manifestamente excessiva e não cumpre com o critério teoria da diferença prevista no art. 566.º n.º 2 do CC, uma vez que dá azo a que o Autor venha depois a receber o que lhe couber da BANCO A1 e que acrescerá ao valor da indemnização já porventura pago pelo Réu e equivalente ao montante por ele desembolsado na subscrição do valor mobiliário.
Ainda que se censure a conduta do Banco Réu (o que não se concede), essa censura NUNCA poderá ser reconduzível a um dolo ou a uma culpa grave.

De facto, lida e relida a matéria de facto, a sensação que fica é que o funcionário do Banco Réu nem sequer concebeu a possibilidade de estar a faltar ao dever de informação acerca da aplicação financeira e que, com essa falta, poderia estar a determinar o investimento do cliente num produto que este não quereria se estivesse devidamente informado. A ideia que perpassa é que o funcionário do Banco Réu estava absolutamente convencido da segurança do investimento e da adequação do mesmo ao perfil de investidor do Autor.
Terá havido portanto (e quando muito) uma indução do Autor em erro, sem que por parte do funcionário do Banco Réu houvesse intenção ou consciência de o fazer - trata-se portanto de uma indução negligente em erro-.

Uma tal conduta apenas pode ser reconduzível à mais leve das formas de negligência - a negligência inconsciente -, pois revela que o agente agiu por imprevidência, descuido, imperícia ou ineptidão, não chegando sequer a conceber a possibilidade do facto se verificar, podendo e devendo prevê-lo e evitar a sua verificação, se usasse da diligência devida.
Esta graduação da culpa do intermediário financeiro tem particular interesse, sobretudo em sede da prescrição, pois o art. 324.º do CdVM permite o advento mais precoce da prescrição nos casos em que, como o presente, não há dolo ou culpa grave.
E considerando a matéria de facto provada, constatamos que já estavam volvidos mais de dois anos entre a data em que o Autor tomou conhecimento da concreta aplicação efectuada e a data em que propôs a acção.
E portanto, já se encontrava prescrita qualquer putativa responsabilidade do Banco Réu!
Não é porque foi afirmado ao Recorrido que a aplicação financeira tinha "capital garantido e juros garantidos", que podemos legitimamente concluir que o Banco assumiu a dívida da BANCO A1!

Conforme dispõe o art. 595.º n.º 1 alínea b) do Código Civil, a assunção de dívida pode verificar-se por contrato entre o novo devedor e o credor, com ou sem consentimento do antigo devedor. Acrescenta depois o n.º 2 que "em qualquer dos casos a transmissão só exonera o antigo devedor havendo declaração expressa do credor; de contrário, o antigo devedor responde solidariamente com o novo obrigado."

A assunção da dívida pode ser liberatória nos casos previstos na primeira parte do n.º 2 do art. 595º do cc. Isto é, dependendo de declaração expressa do credor, o devedor originário pode ficar dela exonerado, pela assunção da dívida por novo devedor. Ou então, como acontece na maioria dos casos, ser uma assunção cumulativa da dívida, em que devedor originário e novo devedor se obrigam simultaneamente, sendo ambos solidariamente responsáveis perante o credor.

Um dos indícios que pode apontar para a assunção cumulativa da dívida é o facto de, aquando da declaração do novo devedor, tanto o credor quanto o declarante terem conhecimento de que o devedor principal não estava em condições de pagar, uma vez que não se verifica a característica essencial da fiança, traduzida na esperança de que o devedor principal pagará ao fiador sub¬rogado.

Não estaria certamente na mente do Banco Recorrente prescindir do direito de ficar sub-rogado nos direitos do credor, por qualquer pagamento que porventura fizesse em prol do emitente do papel comercial, se tivesse assumido a dívida deste.
Essa assunção de dívida alheia como se fosse própria, não era inócua nas contas do Banco Réu!
Não se vislumbra que o Recorrente pudesse ter qualquer interesse real, directo e objectivo próprio no cumprimento dessa obrigação pois, apesar de integrar o mesmo grupo, a aportação de capitais à BANCO A1 em nada beneficiava o Réu Banco, sendo antes e apenas útil à cadeia hierárquica societária que estava a montante daquela.
Tratando-se de uma fiança, estaria a mesma sujeita à mesma forma exigida para a obrigação principal, nos termos do art. 628º do c.c.
A garantia a, para ser válida, teria necessariamente que constar do documento de subscrição.
Não constando, mais não resta do que concluir que a mesma é NULA, nos termos do art. 220º do c.c.
Os subscritores de valores mobiliários estão numa situação de paridade entre si, não sendo possível a emissão dos mesmos com características ou garantias diferentes, sob pena de traição da identidade da figura e violação do princípio par conditio credito rum ou princípio da igualdade dos credores.
Se o Banco Apelante tivesse prestado qualquer garantia, ela não poderia ser privativa dos AA., mas teria isso sim que se estender à generalidade dos subscritores e, por isso, estar contida na nota informativa do papel comercial, figurando o aqui Apelante como garante do reembolso, o que, tal qual resulta da nota informativa junta aos autos a fls., não sucedeu!
A condenação do Banco Réu com base na assunção de uma dívida extravasa em muito quer a causa de pedir, quer o pedido dos presentes autos, não sendo por isso viável e legal.
A declaração de uma garantia deve ser especifica e expressamente emitida, não sendo consentânea com declarações vagas e de sentido dúbio.
Uma declaração negocial corresponde a uma vontade de uma parte em se vincular negocia I mente de acordo com o teor dos termos da mesma. Claramente uma declaração negocial não resulta apenas da impressão do declaratário e do valor que lhe possa dar. Resulta antes de mais da vontade do declarante em se vincular negocialmente, o que não vislumbramos no caso! Não foi feita a prova de que a declaração em causa - capital garantido - não fosse mais do que uma mera caracterização do produto - que até era!
Falta, em suma, a prova de que o Banco, ou o seu funcionário em seu nome,se queria vincular a uma obrigação jurídica.
Não havendo declaração negocial, bem ou mal emitida, não pode haver obrigação jurídica - seja ela qualquer for - de fonte contratual, pelo que não pode, em qualquer circunstância, entender-se que o Banco assumiu uma obrigação de reembolso ou que a afiançou!
A decisão recorrida violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 236.º, 570.º, 595.º, 628.º, 220.º do Código Civil, 7.º, 290.º n.º 1 alínea a), 304.º, 304.º-A e 312.º a 314.º-D e 323.º a 323.º-D do CDVM e 4.º, 12.º, 17.º e 19.º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE.
*
Os Autores contra-alegaram, concluindo que:

a)Inconformado com a douta sentença que julgou procedente a acção, e em consequência condenou o réu apelante a pagar aos autores apelados a quantia de €50.000,00 acrescida de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento, interpôs o réu o presente recurso, indicando existir erro na apreciação da matéria de facto, visando a alteração da matéria de facto inserta sob os pontos 1.6, 1.8, 1.10, 1.14, 1.15, 1.16, 1.17, 1.19 e 1.20 da matéria de facto dada como provada, mais apontando o vicio da errada interpretação da lei quanto ao ónus da prova e do preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil, apontando existir erro no enquadramento jurídico dos factos e suas consequências;
b)Não assiste qualquer razão ou fundamento ao apelante nesta sua pretensão, não merecendo a decisão do tribunal "a quo" a censura que este lhe faz;
c)Pois no que aqueles pontos da matéria de facto dados como provados diz respeito, o Tribunal "a quo" no exercicíoju do princípio da livre apreciação da prova, fez uma absoluta e correcta apreciação dos depoimentos das testemunhas e demais elementos de prova carreados para os autos, tendo extraído o verdadeiro sentido do teor dos respectivos depoimentos, que dessa forma permitiram a concretização das respostas constantes da douta sentença;
d)Aliás, dos depoimentos testemunhais, é certo que vistos na íntegra, tais depoimentos asseveram a posição tomada pelo Tribunal. Assim, sobre esta matéria a Testemunha Nuno, cujo depoimento se encontra gravado no sistema digital áudio do Tribunal das 10:47:59 às 10:58:11, deu conta da forma com as coisas funcionavam e sobretudo da pouquíssima informação ou até a ausências dela, no âmbito da relação estabelecida entre o Banco e cliente, também a testemunha Mário, cujo depoimento se encontra gravado no sistema digital áudio do Tribunal, das11:00:01 às 11:15:34, demonstrou ser pratica corrente a falta de informação por parte do banco e até o abuso cometido muitas vezes na subscrição das obrigações, além de ter dado nota do perfil do autor, como conservador no que se refere a investimentos de risco a par de ser pessoa sem formação na área financeira ou de grandes conhecimentos para fazer investimentos em obrigações, antes procurava sempre depósitos a prazo, com capital garantido e recebimento de juros;
e)Sendo que, os depoimentos prestados e que foram valorados pelo Tribunal" a quo", resulta de forma manifesta que o Banco não cumpriu com o dever de informação; que o autor só em Outubro de 2014, tomou conhecimento da situação e que até aí o banco sempre ocultou a situação, depositando os juros do capital, fazendo acreditar que a situação era normal e sem riscos;
f)Sendo ainda certo que, contrariamente ao alegado pelo recorrente, o Tribunal “a quo", para formular as respostas à matéria de facto não se alicerçou única e exclusivamente nas declarações de parte do autor, mas antes teve em atenção quer os documentos quer os depoimentos das testemunhas que corroboram aquilo que o autor adiantou em declarações de parte e neste sentido, estas são válidas para efeitos de prova;
g)Pelo que, a decisão proferida mostra-se justa e correcta face a toda a prova produzida, não havendo qualquer justificação para a alteração dos pontos da matéria de facto dados como provados, que o recorrente pretende.
h)No que respeita à segunda questão suscitada no recurso e que se prende com o erro na aplicação do direito, é facto que nenhuma razão assiste ao recorrente, pois o Tribunal" a quo" fez uma correcta avaliação dos factos e bem assim uma justa e adequada integração ou subsunção dos mesmos na lei;
i)Na verdade, houve preterição de informação essencial que induziu em erro os AA. e que, se tivessem tido conhecimento das características do produto bancário negociado, nunca teriam aceite a proposta do Banco e que por isso o prejuízo que lhes foi causado deve ser suportado pelo apelante;
j)A comercialização de produto financeiro com informação de ter capital garantido, isso significa que essa responsabilidade se estende inevitavelmente ao intermediário financeiro, se no relacionamento contratual que desenvolveu com o cliente o intermediário assumiu em nome desse ajuste negocial também o reembolso do capital investido;
k)A responsabilidade civil do intermediário financeiro aqui apelante, por violação de deveres respeitantes ao exercício da sua actividade, impostos por lei ou regulamento emanado de autoridade pública, está, especificamente, prevista no artigo 4140 do Código dos Valores Mobiliários (CVM), sendo que, atendendo à data dos factos dos autos, é aplicável a versão anterior à introduzida pelo DL n.º 357 -A/2007, de 31 de Outubro;
I) É indiscutível que a qualidade da informação deve ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita;
m)Estamos num território em que as declarações negociais não podem ser desviadas do sentido da ordem jurídica na sua globalidade. Isto é, apesar da legislação específica a que estão sujeitas as operações e os sujeitos bancários, as instituições financeiras e de crédito estão vinculadas às regras de direito positivo relativas à boa -fé e à lealdade e transparência contratuais sediadas no Código Civil.
n)E, por isso, os funcionários bancários dotados de poderes de direcção e representativos estavam vinculados a agir com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição de riscos e da segurança das aplicações e ter em conta o interesse dos depositantes, dos investidores, dos dema is credores e de todos os clientes em geral.
o)Por via dos princípios gerais conformadores do cumprimento obrigacional e da cláusula geral da boa-fé, torna-se imperioso concluir que, desde sempre, a lisura contratual e as regras hermenêuticas no domínio da responsabilidade contratual impunham - e impõem - que o intermediário financeiro seja diligente na prestação de informações que permitam ao cliente ficar consciente dos riscos envolvidos em qualquer operação financeira realizada.
p)No domínio do direito bancário, a relação entre o Banco e o cliente é uma relação particular, em que as partes são levadas a confiar uma na outra. Sobretudo, o sujeito que se encontra na posição de cliente não profissional, e que não tem formação nem experiência na área financeira, baixa as suas defesas naturais por conferir à instituição bancária uma total competência para cuidar dos seus investimentos, depositando nela uma especial confiança.
q)Resulta claramente das impressivas declarações tomadas ao Autor e às testemunhas que a comunicação contratual efectuada não foi completa nem é integralmente verídica, estando igualmente patenteado na matéria de facto apurada que foram subtraídos elementos informativos que não permitiram que o cliente compreendesse os riscos essenciais envolvidos na operação financeira realizada.
r)Como resultou provado, o argumentário de venda estava estruturado como um produto de capital garantido e foi afirmado pelos colaboradores do banco que o risco era equivalente ao de um depósito a prazo e isto comporta necessariamente um efeito vinculante entre as partes;
s)Sendo até de salientar que no caso dos autos, como ficou provado, o gestor de conta nem sequer deu ao cliente aqui autor qualquer prospecto explicativo das obrigações BANCO A1, limitando-se a entregar o documento nº 2 junto aos autos a fls., que apenas refere o facto do capital ser garantido 100% e a taxa de juro e o seu vencimento semestral;
t)Para efeitos de observância do ónus de prova sobre a adequada comunicação e informação, é facto que incumbe ao proponente dessa aquisição, no caso, ao Banco, o dever de informar e provar que informou adequadamente;
u)Os deveres de comunicação e esclarecimento, na íntegra, do conteúdo negocial resultam directamente do princípio da boa fé contratual consagrado no art. 227° do Código Civil, estendendo-se a todas as partes dos contratos que tenham poder de impor cláusulas negociais ao consumidor adquirente, que neste caso, o dever impendia e impende sobre o Banco réu, que manifestamente não cumpriu, como aliás, resulta quer das declarações de parte prestadas pelo autor quer dos depoimentos das testemunhas e ainda alicerçado pelos documentos juntos a fls.
v)Ademais, resulta suficientemente dos autos, face á prova produzida, que o Banco aqui apelante através do seu funcionário não só omitiu informação relevante a propósito das obrigações BANCO A1, como faltou deliberadamente à verdade, enganando o cliente.
w)Na verdade, resultou provado que foi proposto ao A. marido a aplicação do seu dinheiro, sem que lhe tenha sido dito em concreto se este se destinava à aquisição de obrigações BANCO A1, tendo este entregado a quantia de 50.000,00€, que o funcionário do Banco aplicou naquele produto. Mais tendo ficado provado que, foi dada ao A. marido a indicação de se tratar de uma aplicação segura e idêntica ao depósito a prazo, mas melhor remunerada, sendo o seu reembolso 100% garantido.
x)No caso, não obstante os AA. tivessem tido conhecimento do produto que adquiriram em finais de 2014, como ficou provado, o que é certo é que o Réu não provou, como lhe competia, que aquando da aplicação do dinheiro em Outubro de 2007, nessa altura os informou das reais características do produto, acrescendo que os AA. sempre receberam, semestralmente, a remuneração dos juros do depósito que adquiriram, o que ocorreu até finais de outubro de 2014 e, por outro lado, só nesta data terminou o período de subscrição, permitindo aos subscritores reclamar o capital.
y)Aliás, as Obrigações Subordinadas BANCO A1 Rendimento Mais 2004 eram emitidas por um prazo de 10 anos, não sendo permitido o reembolso antecipado da emissão por iniciativa dos obrigacionistas. Assim, se não era permitido aos AA. pedir o reembolso do capital antes de outubro de 2014, como é que eles poderiam saber antes dessa data que a quantia investida não lhes iria ser reembolsada? Acresce que a remuneração lhe foi sendo paga até ao fim do prazo, criando-lhe uma aparência de normalidade, não obstante as vicissitudes porque passou o Banco e a BANCO A1;
z)Deste modo, nada resulta provado no sentido de que aquando do investimento ou aplicação do dinheiro, o Réu explicou aos AA. todas as características do produto. Por outro lado, o facto de não poder reclamar o reembolso da quantia investida antes de outubro de 2014 faz com que, antes dessa data não poderem exercer o seu direito a esse reembolso.
aa)Pelos motivos expostos, é facto que o prazo prescricional só se iniciou em outubro de 2014, pelo que, tendo a ação sido intentada em 22 de Dezembro de 2015, a prescrição sempre se teria por interrompida a nessa data (v. art. 323°, n.º 2 do C. Civil), ou seja, antes do decurso do prazo de dois anos acima referido.
bb)Ainda que assim não se entendesse, ou seja, mesmo que se entenda que o prazo prescricional se iniciou em finais de 2009, o que não se admite, ainda assim, não se pode considerar prescrito o direito dos AA..
cc)Exige-se que o intermediário financeiro aja de acordo com padrões de diligência, lealdade e transparência superiores aos de um homem médio, o que se compreende atenta a progressiva complexidade dos produtos financeiros e a necessidade de proteção dos clientes que na maioria das vezes são a parte menos experiente na contratação;
dd)No caso em apreço temos que o funcionário do Banco convenceu o A. marido a adquirir um produto financeiro, convencendo-o de que era seguro, que o capital estava garantido, não lhe explicando as características do produto e o risco envolvido na sua aquisição. Além disso, não entregou ao A. qualquer informação sobre as características do papel comercial que estava a adquirir, sendo que os AA. eram investidores não qualificados, pelo que a obrigação de esclarecimento que impendia sobre o intermediário era mais acentuada.
ee)Deve pois concluir-se que o Banco apelante não cumpriu as exigências impostas pelos mencionados preceitos, violando as exigências de boa-fé e a confiança que o cliente depositava na instituição bancária, tendo prestado informação que não era verdadeira acerca da garantia de reembolso do capital investido.
ff)A conduta do Banco tem pois de ser qualificada como gravemente culposa, ficando pois excluída da aplicação do prazo curto de prescrição e sujeita ao prazo ordinário de 20 anos.
gg)Relativamente à responsabilidade civil do intermediário financeiro, contrariamente ao defendido pelo recorrente, o Tribunal" a quo" decidiu bem, pois como acima se alegou, o Banco agindo na qualidade de intermediário financeiro violou de forma grave o dever de informação que tinha para com o cliente aqui AA..;
hh) E esta violação causou um dano aos AA. pois os mesmos viram-se privados da quantia de 50.000,00€ que lhes pertenciam;
ii) Ora, a obrigação de indemnizar por parte do apelante resulta da aplicação das regras gerais de direito civil pois, situando-se o dever de informação no domínio da responsabilidade pré-contratual, tal obrigação deriva do preceituado no art. 227°, n.º 1 do C. Civil, conjugado com o disposto no art. 483° do mesmo Código.
jj) A obrigação de indemnizar tem como pressupostos, o facto voluntário do agente, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, que no caso se verificam.
kk) Por aplicação do disposto no art. 562° do C. Civil, o dano indemnizável é aquele que o lesado não teria sofrido se não fosse a lesão, pelo que os AA. devem receber do Réu a quantia investida, ou seja 50.000,00€, sendo ainda devidos juros de mora, cujo direito aos mesmos deriva do disposto nos arts. 804°, nºs 1 e 2, 805°, n.º 1 e 806°, nºs 1 e 2, todos do C. Civil, devendo estes ser calculados desde a data da interpelação, que no caso será a data da citação.
II) Pese embora o recorrente nas suas alegações procure desmistificar a sua posição no negócio, querendo fazer transparecer que nenhuma responsabilidade tem enquanto intermediário financeiro, fazendo inclusivamente uma análise sobre os pressupostos da responsabilidade civil, tal é absolutamente errado, pois efectivamente, estão preenchidos todos os pressupostos para a responsabilização do apelante, nos termos expressos na sentença recorrida.
mm) Aliás, a lei ao estipular que o intermediário financeiro está obrigado a prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada quanto aos riscos especiais envolvidos pelas operações que o investidor se propõe realizar, está a referir-se não apenas aos riscos específicos da atividade de intermediação financeira, mas também aos outros riscos associados aos instrumentos financeiros propriamente ditos. E, se não o fizer, isto é, se não prestar essas informações ou se as prestar de forma errada, fica o intermediário financeiro obrigado a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação desse seu dever, sendo que a sua culpa, nesse âmbito, se presume - artigo 3140 CVM.
nn) No caso em apreço, temos por certo, que não foi só omitida informação relevante por parte do intermediário financeiro que viabilizou a aplicação financeira em causa nos autos, como, e sobretudo, foi prestada ao A informação errada a respeito dessa mesma aplicação. Pois como bem declarou o A, e se mostra provado nos autos, na sequência do anterior relacionamento entre o A e gerente do Banco recorrente, este sugeriu àquele que subscrevesse obrigações BANCO A1 rendimento mais 2004, não lhe dizendo em concreto o que era nem lhe explicando convenientemente a situação nem lhe entregando qualquer propospecto acerca da mesma. Aliás, para o convencer a essa subscrição, o dito gerente disse ao A que tais obrigações "lhe trariam uma maior rentabilidade e que tinham a mesma segurança que os depósitos a prazo, que a aplicação que lhe estava a propor era segura, que não corria qualquer risco, que tinha o reembolso do capital investido garantido a 100%". Além disso, também lhe transmitiu que essa aplicação poderia sempre e a qualquer momento ser objecto de resgate antecipado e que ao fim de 5 anos, o juro ainda seria maior.
oo)Sucede que estas informações não correspondiam à verdade. As obrigações em causa não tinham a garantia de reembolso do capital investido (como o prova esta ação), tal como não tinham sequer a garantia de liquidez que fora assegurada ao A. Quando este, em outubro de 2014, se deslocou ao Banco para resgatar o capital investido em tais obrigações, foi informado de que o não poderia fazer. Sinal, portanto, de que toda a informação que, antes, lhe tinha sido prestada, a este respeito, era falsa. Tal como falsa era a garantia de retorno do capital investido.
pp) Ora, como ficou provado, foi com base na confiança que depositava no gerente do Banco recorrente e nas informações que o mesmo lhe prestou, que o A. marido acedeu em fazer a aplicação do seu dinheiro, que julgou ser um deposito a prazo, mas que se traduziu na subscrição de obrigações. Ou seja, foi por causa dessas informações erróneas que os AA. apelados ficaram privados do capital que nelas foram investidas.
qq) É líquido, assim, do nosso ponto de vista, que está assegurado o necessário nexo causal entre as referenciadas informações e o dano sofrido pelos AA.
rr) De resto, como é sabido, no âmbito da responsabilidade por facto ilícito, o nexo causal afere-se com recurso à denominada formulação negativa da causalidade; ou seja, "o facto que actuou como condição do dano só deixará de ser considerado causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo em todo indiferente [ ... ] para a verificação do dano, tendo-o provocado só por virtude das circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas que intercederam no caso concreto" (artigo 5630 do Código Civil).
ss) Ora, sabendo nós que as informações erradas prestadas ao A. foram determinantes para a sua decisão de aplicar as suas economias e em que resultou a subscrição nas referidas obrigações, facilmente se conclui que essas informações, ao contrário de serem indiferentes ao dano, o originaram direta e necessariamente. Daí que seja de recusar a pretensa ausência de nexo causal, esgrimida pelo Apelante.
tt) Por outro lado, a culpa do intermediário financeiro presume-se. E, à luz dos factos provados, deve mesmo ter-se por demonstrada, uma vez que houve da parte do gerente do intermediário financeiro que contactou o A. marido um nítido propósito de o induzir em erro; isto é, de o levar a formar a sua vontade com base em pressupostos que aquele sabia serem falsos. Alias, como se extrai do depoimento da testemunha Nuno, ao tempo funcionário do Banco recorrente, havia instruções deste para assim actuarem vendendo dessa forma o produto financeiro, ou seja, o Banco deu instruções aos seus funcionários para assim actuarem, daí que a culpa existe.
uu) Pois bem, tendo o A. sido induzido em erro nos termos supra expostos, temos de considerar que o intermediário financeiro atuou com culpa e actuou, através do seu agente, com culpa grave.
vv) Assim, como resulta do exposto e se encontra plasmado na douta sentença recorrida, é facto que os factos, a sua interpretação e subsunção jurídica é correcta, não assistindo qualquer razão ao recorrente no seu argumentário a este propósito.
ww) Não violou, por conseguinte, o Meritíssimo Juiz" a quo" qualquer disposição legal e como tal deve entender-se que a decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz" a quo" não merece qualquer censura, devendo manter-se inalterada.
*
Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II- Delimitação do Objecto do Recurso

As questões decidendas, delimitadas pelas conclusões do recurso, consistem na modificação da decisão sobre a matéria de facto, na prescrição do direito dos Autores e se, no caso, se verificam os pressupostos de responsabilidade civil do Banco Réu, decorrente do incumprimento do dever de informação.
*
Da modificabilidade da decisão de facto

Nos termos do artº. 662º. do Código de Processo Civil, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. (negrito nosso)

Assim, sem prejuízo de uma valoração autónoma dos meios de prova utilizados pelo tribunal(1)e ainda de outros que se mostrarem pertinentes, essa operação não pode nunca olvidar os princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas.
O Réu manifestou discordância relativamente à decisão que considerou demonstrada a factualidade vertida nos pontos 1.6, 1.8, 1.10, 1.14, 1.15, 1.16, 1.17, 1.19 e 1.20 por entender que os meios de prova em que o tribunal a quo se alicerçou não permitem essa resposta.

Defendeu que as declarações do Autor não podem ser valoradas por ser parte interessada e as testemunhas inquiridas sobre esta matéria, Nuno e Mário A., não tiveram intervenção directa na contratação do produto de investimento em causa.

A factualidade em causa é a seguinte :

1.6. Dias depois, o dito gestor de conta referiu aos autores que tinha um produto financeiro muito bom, igual ao depósito a prazo, com taxas muito melhores;
1.8. O dito gerente sempre argumentou que havia instruções da Direcção Comercial do Banco A de que se tratava de um investimento seguro, garantido em absoluto pelo banco, uma vez que era um investimento feito dentro do mesmo grupo empresarial que o Banco A, afirmando a segurança do produto em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e que o Banco cobriria sempre a solvabilidade do produto;
1.10. O dito gerente não explicou qual era o produto financeiro, nem qualquer diferença entre esse produto e os depósitos a prazo de seis meses, nem mesmo entregou aos autores qualquer nota informativa acerca do produto financeiro;
1.14. Vieram então a saber que aquela quantia de €50.000,00/Cinquenta mil euros) tinha sido aplicada em obrigações BANCO A1 – Rendimento Mais 2004;
1.15. Produto financeiro esse que os autores não conheciam e que nunca quiseram comprar;
1.16.Sendo certo que nem sequer foram informados sobre a compra das obrigações BANCO A1 – Rendimento Mais 2004;
1.17. E nunca o gestor de conta e gerente do réu, nem ninguém, leu ou explicou aos autores o que eram obrigações subordinadas - Rendimento Mais 2004, ou lhes apresentou para assinar qualquer contrato de compra de obrigações;
1.19. Porém, o réu não entregou aos autores qualquer contrato nem mesmo lhes foi lido nem explicado, nem entregue qualquer cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações perpétuas ou subordinadas BANCO A1 ou ainda sobre o rendimento mais BANCO A1, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos autores;
1.20. Os autores nunca aceitariam, se caso o réu lhes tivesse explicado o que eram as “obrigações”gt–BANCO A1 Rendimentos Mais 2004 e o risco inerente a tal produto financeiro.
Em primeiro lugar, após audição dos depoimentos em causa, cumpre desde já salientar que as declarações proferidas pelo Autor foram muito genuínas, claras e pormenorizadas.

Referiu que o gerente o contactou no sentido de fazer uma aplicação num produto atractivo, com garantia do capital, e juros semestrais, igual ao que tinha na Banco X, de onde tirou o dinheiro para investir, tendo, por isso, ficado absolutamente convencido que estaria a investir num produto com as mesmas características de um depósito a prazo.Garantiu-lhe que não corria qualquer risco, a única diferença em relação à Banco X consistia apenas numa remuneração superior. Atendendo à relação de confiança que tinha com o gerente, aceitou o que este propôs, embora ficasse convencido que se tratava de um produto igual a um depósito a prazo. De 2007 a 2014, os juros foram creditados semestralmente até que reparou que tal não havia acontecido, altura em que teve conhecimento que o gerente tinha fugido para Angola. Nunca suspeitou que o produto era de risco porque durante aquele tempo todo, os juros foram creditados na sua conta; pensava que o contrato se renovava automaticamente, tal como acontece com os depósitos a prazo. Limitou-se a assinar o documento junto a fls. 13, não lhe tendo sido entregue qualquer outro documento, desconhecendo o que sejam obrigações.
A testemunha Nuno, funcionário bancário, trabalhou quatro anos no Banco A, conhece o Autor há vários anos e assegurou que este último é uma pessoa conservadora no sentido de que não faz aplicações financeiras com risco.
A testemunha Mário, amigo do Autor há mais de 30 anos, afirmou que este último é uma pessoa rígida, ou seja, não faz aplicações com risco; a testemunha relatou que, no seu caso, o gerente transferiu dinheiro da conta para o referido produto financeiro, sem lhe dar conhecimento. Posteriormente, disse-lhe que era um depósito garantido. Teve conhecimento que o gerente da agência enganou muios clientes.
A testemunha Ricardo, funcionário do Réu, confirmou que o Autor é um cliente conservador.

Em suma, conjugando as declarações prestadas pelo Autor com os depoimentos das referidas testemunhas e recorrendo a presunções judiciais, conclui-se que a decisão sobre a matéria de facto não podia ser outra, não havendo absolutamente nada a apontar.
Com efeito, a relação de confiança existente entre o Autor e o gerente da agência bancária e a forma como este último o convenceu a transferir as suas economias da Banco X para o Banco Réu, assegurando que se tratava de um produto atractivo, com garantia do capital, e juros semestrais, igual ao da Banco X, conjugado com o depoimento das referidas testemunhas e o teor do documento de fls. 13 não deixa margem para dúvidas quanto ao acerto da decisão.
É importante salientar que no referido documento junto a fls. 13, único assinado pelo Autor, o Réu, através do seu gerente, se fez constar que o capital e juros eram garantidos e liquidez assegurada e venciam-se semestralmente a uma taxa de 4.5% líquido.
Em resumo, consideramos que a valoração da prova foi feita com rigor e em obediência às regras aplicáveis ao direito probatório, razão pela qual não existem razões ponderosas para a alterar.
*
II- FUNDAMENTAÇÃO

FACTOS

1.1.Os autores são clientes do réu, sendo titulares da conta nº ...1.
1.2.O gestor e conta dos autores era o gerente da agência de Fafe do réu, o Sr. José;
1.3.Em Setembro de 2007, os autores pretenderam efectuar naquela agência do réu, o depósito a prazo de €50.000,00 (Cinquenta mil euros);
1.4.Contactado o dito gestor de conta para a constituição do depósito a prazo, os autores entregaram-lhe o cheque nº 14715547, sacado sob o Banco X, no montante de €50.000,00 e o cheque nº 14715548, sacado sob o mesmo banco, no montante de €450,00, em 27/09/2007;
1.5.O autor marido depositou aqueles cheques de € 50.000, 00, e €450,00 respectivamente, na conta nº ...1, na agência do Banco A em Fafe;
1.6.Dias depois, o dito gestor de conta referiu aos autores que tinha um produto financeiro muito bom, igual ao depósito a prazo, com taxas muito melhores;
1.7.E que aquele produto tinha igualmente a liquidez do capital garantida e os juros garantidos nas datas dos respectivos vencimentos, como os depósitos a prazo.
1.8.O dito gerente sempre argumentou que havia instruções da Direcção Comercial do Banco A de que se tratava de um investimento seguro, garantido em absoluto pelo banco, uma vez que era um investimento feito dentro do mesmo grupo empresarial que o Banco A, afirmando a segurança do produto em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e que o Banco cobriria sempre a solvabilidade do produto;
1.9.Pelo que, os autores confiando no gestor acabaram por aceitar fazer a dita aplicação do dinheiro, no caso, €50.000,00, no dito produto de liquidez de capital e rendimento garantidos;
1.10.O dito gerente não explicou qual era o produto financeiro, nem qualquer diferença entre esse produto e os depósitos a prazo de seis meses, nem mesmo entregou aos autores qualquer nota informativa acerca do produto financeiro;
1.11. Passaram a surgir notícias preocupantes do Banco A e designadamente quanto à actuação do gerente da agência de Fafe;
1.12.E que o dito gerente teria fugido para o estrangeiro;
1.13.Perante a situação, os autores procuraram então saber da posição dos seus depósitos junto do réu;
1.14. Vieram então a saber que aquela quantia de €50.000,00 /Cinquenta mil euros) tinha sido aplicada em obrigações BANCO A1 – Rendimento Mais 2004;
1.15. Produto financeiro esse que os autores não conheciam e que nunca quiseram comprar;
1.16.Sendo certo que nem sequer foram informados sobre a compra das obrigações BANCO A1 – Rendimento Mais 2004;
1.17.E nunca o gestor de conta e gerente do réu, nem ninguém, leu ou explicou aos autores o que eram obrigações subordinadas - Rendimento Mais 2004, ou lhes apresentou para assinar qualquer contrato de compra de obrigações;
1.18.Passado todo este tempo e apesar da solicitação feita, não feita a devolução daquele capital;
1.19.Porém, o réu não entregou aos autores qualquer contrato nem mesmo lhes foi lido nem explicado, nem entregue qualquer cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações perpétuas ou subordinadas BANCO A1 ou ainda sobre o rendimento mais BANCO A1, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos autores;
1.20.Os autores nunca aceitariam, se caso o réu lhes tivesse explicado o que eram as “obrigações”gt–BANCO A1 Rendimentos Mais 2004 e o risco inerente a tal produto financeiro.
*
2. Factos não provados

2.1.Os AA. têm conhecimento da alegada subscrição abusiva, pelo menos, desde inícios de 2009 imediatamente posterior à nacionalização do Banco A;
2.2.Circunstâncias totalmente inesperadas e imprevisíveis vieram a inverter o juízo de segurança da emissão;
2.3.Mas nunca invalidando a autenticidade da informação prestada originalmente;
2.4. O Autor foi ainda informado de que a única forma do investidor liquidar este tipo de produtos, de forma unilateral e antecipada, seria transmitindo as suas obrigações a um terceiro interessado, mediante endosso;
2.5.O que na altura da subscrição era algo muito fácil, uma vez que esses produtos tinham muita procura, por causa da elevada rendibilidade que ofereciam.
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III-DIREITO

O Réu invocou a prescrição do direito dos Autores por não ter actuado com dolo ou culpa grave, sendo que estes tiveram conhecimento, em 2009, do investimento em obrigações denominadas BANCO A1 – Rendimento Mais 2004.
Como se refere na sentença, para se decidir esta questão, cumpre convocar o quadro legal aplicável e analisar o relacionamento ocorrido entre Autor e Réu.

Quadro Legal
São actividades de intermediação financeira, segundo o disposto no artigo 289.º, n.º1, al.a) do CVM (Código de Valores Mobiliários), os serviços e actividades de investimento em instrumentos financeiros, elencados no art.º 290.º, podendo ser intermediários financeiros as entidades referidas no art. 293.º, n.º1 designadamente as instituições de crédito (al.a)), ou seja, os bancos (v. art. 3.º do RGICSF, Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras).

Relativamente à intervenção dos bancos neste domínio, Engrácia Antunes explica que desenvolvem uma actividade de intermediação no mercado de crédito (art. 2.º do RGIC) que consiste na captação de poupanças monetárias do público em geral, “máxime”, as famílias (soba forma de depósitos ou outros fundos reembolsáveis), e na respectiva transferência por conta própria para outros agentes económicos, “maxime”, as empresas (sob a forma de concessão de crédito, financiamento, garantias, ou outros instrumentos): numa palavra, uma função de intermediação creditícia, caracterizada pela interposição entre agentes excedentários (depositantes) e agentes deficitários (empresas carecidas de crédito) (2).
Uma das actividades de investimento consiste na execução de ordens por contra de outrem (cfr. art. 290.º, n.º 1, al. b) do CVM e art. 199.º-A do RGICSF).
Os contratos de intermediação financeira, segundo a noção de Engrácia Antunes, (3) são aqueles negócios jurídicos celebrados entre um intermediário financeiro e um cliente (investidor) relativos à prestação de actividades de intermediação financeira.
A Directiva 2004/39/CE de 21/04 do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos mercados de instrumentos financeiros (DMIF) foi transposta para a ordem jurídica interna através do Dec.-Lei n.º 357-A/2007 de 31.10, que entrou em vigor em 01.11.2007.
Considerando que os factos, relatados no presente processo, ocorreram em 27 de Setembro de 2007, importa ter em conta a questão da sucessão de leis no tempo.
Apesar do princípio da não retroactividade da lei consagrado no n.º 1 do art. 12.º do C.Civil determinar que a lei nova só rege para o futuro, pode a mesma aplicar-se, segundo o n.º 2, ao conteúdo das relações jurídicas estabelecidas anteriormente, ou seja, aos direitos e obrigações assumidos pelas partes.
Esta norma assume relevância nos contratos de execução continuada, que se protela no tempo pois o seu conteúdo tem de se adaptar às exigências da nova legislação (4).

No que concerne à problemática da informação, prescreve o artigo 7.º, n.º 1 do CVM., com redacção similar à anterior, que a informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às actividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes deve ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita, aplicando-se seja qual for o meio de divulgação e ainda que seja inserida em conselho, recomendação, mensagem publicitária ou relatório de notação de risco (n.º 2).

Numa apreciação global, refere Paulo Câmara, (5) “…pode afirmar-se que as regras sobre informação procuram servir uma quádrupla função : prosseguir objectivos de protecção dos investidores, de robustecimento da governação, de defesa do mercado e de prevenção de ilícitos.”

Decorre destes preceitos legais que a importância do cumprimento do dever de informação pelo intermediário financeiro não tem como finalidade exclusiva um interesse meramente particular de defesa dos interesses dos investidores mas também o funcionamento regular e transparente do mercado financeiro. (6)
Aliás, o legislador europeu teve uma particular atenção com a tutela dos investidores, expressando que a referida Directiva tem como objectivo proporcionar um elevado nível de protecção.
Com esse propósito, enunciou, no artigo 19.º, normas de conduta dirigidas às empresas de investimento, destinadas a assegurar uma actuação honesta, equitativa e profissional, em função dos interesses dos clientes (n.º 1), a prestação correcta e clara de todas as informações, e que não induzam em erro os clientes (n.º2). (sublinhado nosso)
E no n.º 3 dessa norma concretiza que devem ser prestadas informações adequadas, de forma compreensível, aos clientes ou clientes potenciais acerca dos instrumentos financeiros, que deverão incluir orientações adequadas e avisos sobre os riscos inerentes, que lhes permitam razoavelmente compreender a natureza e os riscos do tipo de instrumento financeiro que é oferecido, e por conseguinte, tomar decisões de investimento de forma informada.
Um dos institutos de protecção que a DMFI mais aprofunda, refere Sofia Nascimento Rodrigues, (7) é o dos deveres de informação dos intermediários financeiros aos clientes pois esta Directiva prevê com grande detalhe a informação que os intermediários financeiros devem prestar aos seus clientes actuais e potenciais.

Assim, é inegável que, nesta matéria, tem particular acuidade o princípio de protecção do investidor em valores mobiliários, o qual, segundo Lina Castro Baptista (8), desdobra-se, além do mais, nos deveres de categorização (art. 30.º do CVM) e de informação (art.º 7.º do CVM).
Nesta linha de raciocínio, Lina Castro Baptista considera que “…numa fase preliminar, o intermediário financeiro deve informar espontânea e detalhadamente o cliente sobre todas as características de cada instrumento financeiro cuja negociação seja equacionada, com vista a proporcionar uma decisão de investimento informada e esclarecida.” (9)
Acrescenta a referida autora, com relevante interesse para o caso sub judice, que deve ser observado “…o princípio da idoneidade ou proporcionalidade inversa, segundo o qual o intermediário deverá adaptar as informações, recomendações e advertências à experiência e conhecimentos do cliente concreto…” (10)
Ou seja, explica, o importante é assegurar que os investidores estejam em condições de decidir os seus investimentos de uma forma livre, responsável e esclarecida, na sequência de uma actuação diligente, neutral e leal do intermediário financeiro. (11)
O intermediário financeiro, nos termos do art. 312.º-E, n.º 1 do CVM, deve informar os investidores da natureza e dos riscos dos instrumentos financeiros, explicitando, com um grau suficiente de pormenorização, a natureza e os riscos do tipo d einstrumento financeiro em causa.
A descrição dos riscos deve incluir, designadamente, os riscos associados ao instrumento financeiro, incluindo uma explicação do impacto do efeito de alavancagem e do risco de perda da totalidade do investimento (n.º 2, al.a) do citado art. 321.º-E).
No caso em apreciação, ficou provado que o Banco Réu, através do seu gerente da agência de Fafe, teve conhecimento que, em Setembro de 2007, os Autores pretendiam efectuar, naquela agência do Réu, o depósito a prazo no valor de €50.000,00; o dito gestor de conta referiu-lhes que tinha um produto financeiro muito bom, igual ao depósito a prazo, com taxas muito melhores. E que aquele produto tinha igualmente a liquidez do capital garantida e os juros (garantidos) nas datas dos respectivos vencimentos, tal como os depósitos a prazo.
O dito gerente sempre argumentou que havia instruções da Direcção Comercial do Banco A de que se tratava de um investimento seguro, garantido em absoluto pelo banco, uma vez que era um investimento feito dentro do mesmo grupo empresarial que o Banco A, afirmando a segurança do produto em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e que o Banco cobriria sempre a solvabilidade do produto.
Os Autores, confiando no gestor, acabaram por aceitar fazer a dita aplicação do dinheiro, no caso de €50.000,00, no dito produto de liquidez de capital e rendimento alegadamente garantidos.

No entanto, o dito gerente não explicou qual era o produto financeiro, nem qualquer diferença entre esse produto e os depósitos a prazo de seis meses, nem mesmo entregou aos Autores qualquer nota informativa acerca das respectivas características.
As obrigações (12) são valores mobiliários emitidas por sociedades anónimas que conferem direitos de crédito iguais (cfr. art. 1.º, al. b) do CVM e art. 348.º do C.Soc.Com.)
Nas palavras de Paulo Câmara, (13) o titular da obrigação é fundamentalmente um credor perante a entidade emitente e como relação jurídica subjacente na base deste valor mobiliário existe tipicamente um contrato de mútuo.
Os Autores, que pretendiam apenas efectuar um depósito a prazo com a mencionada quantia de €50.000,00, tornaram-se, sem o saberem, investidores em valores mobiliários, por ter sido aplicado esse dinheiro, por iniciativa do gestor do banco, na compra de obrigações, o que se traduz, na prática, de um empréstimo de dinheiro à sociedade emitente, que era uma empresa do mesmo grupo do banco.

Por conseguinte, os Autores não foram minimamente informados sobre o seu investimento em valores mobiliários, razão pela qual não tem qualquer relevância o baixo risco do produto financeiro ou saber se a entidade emitente oferecia, na altura, garantias de cumprir o reembolso da quantia monetária em causa.

Como já anteriormente salientámos, não foi entregue aos Autores um prospecto ou um contrato escrito com a descrição das características específicas das obrigações que o banco pretendia transaccionar. E não cumpre essa obrigação o documento junto a fls. 13.
A informação que, na ocasião, lhes foi facultada pelo gestor no sentido de que tinha um produto financeiro muito bom, igual ao depósito a prazo, com taxas muito melhores, e que tinha igualmente a liquidez do capital garantida e os juros garantidos, nas datas dos respectivos vencimentos, como os depósitos a prazo, induziu os clientes, aqui Autores, manifestamente em erro.
Ora, com esse comportamento, o gestor desrespeitou o disposto no artigo art. 74º do RGICSF (Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras) que impunha aos empregados das instituições de crédito o dever de proceder com diligência e lealdade e respeito consciencioso dos interesses que estão confiados.

Nos termos do art. 304.º, n.º 1 e 2 do CVM, os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado, devendo, nas relações com todos os intervenientes no mercado, observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.

Para cumprimento destes deveres na prestação do serviço deve informar-se junto do cliente sobre os seus conhecimentos e experiência no que respeita ao tipo específico de instrumento financeiro ou serviço oferecido ou procurado, bem como, se aplicável, sobre a situação financeira e os objectivos de investimento do cliente (n.º 3).

A este propósito, refere Ana Afonso (14) que o intermediário deve, por um lado, recolher informação sobre o cliente, concretamente sobra a sua situação financeira, experiência em matéria de investimentos (Princípio know your costumer) e por outro, prestar-lhe informação, quer sobre os riscos envolvidos nas operações, quer de todos os aspectos relativos à execução do contrato e, designadamente, sobre os resultados das operações, dificuldades especiais ou inviabilização da execução do contrato (cfr. arts. 312.º, 323.º e 336.º CVM e também arts. 38.º, 39.º, 40.º, 41.º, 42.º e 44.º do Regulamento n.º 12/2000 da CMVM).

Calvão da Silva (15) sublinhou que a especial relação obrigacional complexa, de confiança mútua e dominada pelo intuitus personae, imporá, mesmo no silêncio do contrato, à instituição financeira, padrões profissionais e éticos elevados numa política de “conhece o teu cliente”, traduzidos em deveres de protecção dos legítimos interesses do cliente, em consonância com os ditames da boa fé (art. 762.º n.º 2, do Código Civil; arts. 73.º e segs. da Lei-Quadro bancária: deveres de diligência e cuidado, deveres de alerta, aviso, advertência e prevenção para certos riscos e sua repartição, deveres de informação, deveres de discrição, (…), cuja inobservância ou violação poderá pôr em causa a uberrima fides do cliente e o intuitus personae da relação e assim originar a responsabilidade de instituição financeira imprudente ou não diligente.
Neste particular, concorda-se com o entendimento expresso na sentença no sentido de que o desconhecimento por parte do Autor das características do produto financeiro não releva para a qualificação jurídica da intervenção do Réu como intermediário financeiro.

Defende o Réu que o direito dos Autores prescreveu uma vez que decorreram dois anos após o ano de 2009, ano em que o Autor teve conhecimento que tinha adquirido obrigações.

Prescreve o art. 324.º, n.º 2 do CVM que “Salvo dolo ou culpa grave, a responsabilidade do intermediário financeiro por negócio em que haja intervindo nessa qualidade prescreve decorridos dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e dos respectivos termos.”

O Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 17/03/2016 (16), igualmente citado na sentença, faculta ao intérprete uma linha de orientação deste preceito legal na definição do conceito dolo ou culpa grave, para efeitos da análise do (curto) prazo prescricional, considerando que se deve ter em conta a ponderação de interesses inerente à norma; as características da relação entre o banco e o cliente – a confiança especial depositada por este na instituição bancária; e os deveres de informação, lealdade, cuidado com valores alheios e boa-fé do Banco em relação ao cliente. E que a graduação do grau de negligência (grave, leve e levíssima) terá de aferir-se pelo padrão de culpa consagrado no art. 304.º, n.º 2 do CVM, segundo o qual «nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência».

Neste mesmo sentido, Ana Afonso (17) entende que o padrão de normalidade abstracto previsto nos arts. 799.º, n.º 2 e 487.º, n.º 2 do C.Civil, é agravado no domínio da actividade de intermediação financeira atendendo às expressões utilizadas pelo legislador como “elevados padrões de diligência, lealdade e transparência” e “elevados níveis de aptidão profissional” que remetem para uma modalidade de culpa levíssima.

Como acertadamente afirmam os Recorridos, exige-se que o intermediário financeiro aja de acordo com padrões de diligência, lealdade e transparência superiores aos de um homem médio, o que se compreende atenta a progressiva complexidade dos produtos financeiros e a necessidade de proteção dos clientes que na maioria das vezes são a parte menos experiente na contratação.

Apurou-se no presente processo que após terem começado a surgir notícias preocupantes do Banco A designadamente quanto à actuação do gerente da agência de Fafe e fuga do mesmo para o estrangeiro, os Autores procuraram então saber da posição dos seus depósitos junto do Réu e tomaram conhecimento que aquela quantia de €50.000,00 tinha sido aplicada em obrigações BANCO A1 – Rendimento Mais 2004, produto financeiro esse que não conheciam e que nunca quiseram comprar, sendo certo que nem sequer foram informados sobre a compra das obrigações BANCO A1 – Rendimento Mais 2004.
E nunca o gestor de conta e gerente do Réu, nem ninguém, leu ou explicou aos Autores o que eram obrigações subordinadas-Rendimento Mais 2004, ou lhes apresentou, para assinar, qualquer contrato de compra de obrigações.
Portanto, não ficou provado que o Autor, mesmo nesse ano, ficou devidamente esclarecido sobre o investimento que o Réu havia feito com o seu dinheiro, nomeadamente, como bem se alerta na sentença, sobre a impossibilidade de reembolso antecipado por iniciativa dos obrigacionistas uma vez que as Obrigações Subordinadas BANCO A1 Rendimento Mais 2004 eram emitidas por um prazo de 10 anos.

Assim sendo, mesmo nessa data não se pode afirmar que os Autores tiveram conhecimento completo dos termos do negócio, pelo que não podiam exercer efectivamente o seu direito, não podendo considerar-se iniciado o prazo de prescrição, nos termos do artigo 306.º do C.Civil.

Por outro lado, perante a situação de conflito de interesses, o Banco Réu, na qualidade de intermediário financeiro, devia ter assegurado aos Autores, seus clientes, um tratamento transparente e equitativo, pois está obrigado a dar prevalência aos interesses do cliente tanto em relação aos seus próprios interesses ou de sociedades com as quais se encontra em relação de domínio ou de grupo, como em relação aos interesses dos titulares dos seus órgãos sociais ou dos de agente vinculado e dos colaboradores de ambos (cfr. art. 309.º, n.º 2 e 3 do CVM).

Tendo os Autores logrado provar a falta de informação adequada, clara e compreensível e de esclarecimentos relevantes sobre a operação proposta pelo gestor do Réu e ainda que foram induzidos em erro, na fase pré-contratual, sendo que aquela omissão persistiu depois do investimento ter sido concretizado, afigura-se-nos manifesto que o comportamento do gestor do Réu, configura culpa grave, o que torna inaplicável o prazo prescricional previsto na citada norma jurídica.
Perante todos estes argumentos, e à luz do art. 324.º, n.º 2 do CMV e do art. 306.º do C.Civil, conclui-se que o direito dos Autores de responsabilizarem o Réu pelo incumprimento do dever de informação não se encontra prescrito.
No caso de violação destes deveres, o artigo 304.º-A, n.º 1 do CMV, prevê que os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência desse incumprimento.
E, nos termos do n.º 2, presume-se a culpa do intermediário financeiro quando o dano seja causado no âmbito das relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação dos deveres de informação.
Em bom rigor, a lei transpõe, em parte, para este domínio, o que já resultava das normas aplicáveis à responsabilidade civil (v. arts. 483.º e segs. e 227.º do C.Civil)
Aos Autores competia provar a ilicitude da actuação do Réu, o que fizeram com a prova de incumprimento do dever de informação, presumindo-se, em conformidade com a norma acima referida, a culpa; o nexo de causalidade entre a ilicitude e o dano, como se bem refere na sentença, decorre de ter ficado demonstrado que os Autores nunca aceitariam, caso o Réu lhes tivesse explicado o que eram as “obrigações” – BANCO A1 Rendimentos Mais 2004 e o risco inerente a tal produto financeiro, aplicar o seu dinheiro nesse valor mobiliário.
Relativamente à aplicabilidade desta norma que consagra uma presunção de culpa, atendendo a que foi aditada pelo Dec.-Lei n.º 357-A/2007 de 31.10, nem se suscita qualquer problema, uma vez que a culpa, no caso concreto, ficou demonstrada, não sendo necessário recorrer à mencionada presunção legal.
E, acompanhando o entendimento do Acórdão desta Relação de Guimarães, de 27/04/2017, (18) alicerçado na doutrina, (19) a violação do dever de informação situa-se no âmbito da responsabilidade pré-contratual, não obstante o facto de o contrato se ter realizado.
E ainda sobre o dano, reproduzimos o Acórdão desta Relação de Guimarães (20), de 11/01/2018, sobre uma situação similar: “Ora, como se provou, foi com base na confiança que depositava no gerente do Banco A já mencionado e nas informações que o mesmo lhe prestou, que o A. acedeu em subscrever as referidas obrigações. Ou seja, foi por causa dessas informações erróneas que o A. ficou privado do capital que nelas investiu.
É líquido, assim, do nosso ponto de vista, que está assegurado o necessário nexo causal entre as referenciadas informações e o dano sofrido pelo A. (…)
Ora, sabendo nós que as informações erradas prestadas ao A. foram determinantes para a sua decisão de subscrever as referidas obrigações, facilmente se conclui que essas informações, ao contrário de serem indiferentes ao dano, o originaram direta e necessariamente (21). Daí que seja de recusar a pretensa ausência de nexo causal, esgrimida pelo Apelante.”
O dano indemnizável, face ao disposto no artigo 562.º do C.Civil, e concordando com o expendido no mencionado Acórdão desta Relação de Guimarães de 27/04/2017, também citado na sentença, corresponde àquele que o lesado não teria sofrido se não fosse a lesão, ou seja, a quantia investida de € 50.000,00, cuja inexistência de risco foi assegurada pelo Réu (22).
Numa palavra, a violação inegável do dever rigoroso de informação que impendia sobre o Réu, determina que deva ser condenado a restituir a situação que existiria se tal não tivesse sucedido, improcedendo, em consequência, o recurso.
*
III- DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem este Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando a sentença.
Custas pelo Apelante.
Notifique.
Guimarães, 21 de Junho de 2018

(Anabela Andrade Miranda Tenreiro)
(Fernando Fernandes Freitas)
(Alexandra Rolim Mendes)


1. Cfr. Geraldes, António Santos Abrantes, Temas da Reforma do Processo Civil, II vol., pág. 256.
2. Direito dos Contratos Comerciais, Almedina, pág. 470 e segs.
3. Direito dos Contratos Comerciais, Almedina, pág. 573.
4. Cfr. Martinez, Pedro Romano, Direito do Trabalho, 2015, pág. 250.
5. Os Contratos de Intermediação Financeira, 2016, 3.ª edição, pág. 139.
6. Afonso, Ana, O Contrato de Gestão de Carteira, Deveres e Responsabilidade do Intermediário Financeiro, in Jornadas Sociedades Abertas, Valores Mobiliários e Intermediação Financeira, pág. 71.
7. A Protecção dos Investidores nos Contratos sobre Valores Mobiliários, Jornadas, Sociedades Abertas, Valores Mobiliários e Intermediação Financeira, pág. 154.
8. Os Contratos de Intermediação Financeira, Tese de Mestrado, disponível no Repositório da Faculdade de Direito da Universidade do Porto.
9. Ob. cit., pág. 38.
10. Ob. cit., pág. 39.
11. Ob. cit., pág. 43.
12. Citando o estudo do instituto de valores mobiliários, o Acórdão desta Relação de Guimarães, de 10/05/2018, disponível em www.dgsi.pt, faz alusão ao risco das obrigações, comparativamente com os depósitos a prazo nomeadamente por não estarem protegidos pelo fundo de Garantia de Depósitos.
13. Ob. cit., pág. 139.
14. Ob. cit., pág. 74.
15. Direito Bancário, Almedina, pág. 335.
16. Disponível em www.dgsi.pt.
17. Ob. cit., pág. 83 e nota 59.
18. Relatado pela Exma. 2.ª Adjunta e disponível em www.dgsi.pt.
19. Pires de Lima e Antunes Varela, C.C.Anotado, 3.ª edição, nota 1., pág. 215 e Menezes Leitão, Direito das Obrigações, 14.º edição, vol. I, pág. 355.
20. Disponível em www.dgsi.pt em que foram 1.º e 2.º Adjuntos, a presente Relatora e o Exmo. Primeiro Adjunto.
21. Nesse sentido também se concluiu no Ac. RP de 02/03/2015, Processo n.º 1099/12.2TVPRT.P1, consultável em www.dgsi.pt.
22. Neste mesmo sentido, cfr. Acórdão desta Relação de Guimarães de 10/05/2018 in www.dgsi.pt.