Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
967/11.3TBBRG-A.G1
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: INJUNÇÃO
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/29/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – Com a entrada em vigor das alterações que o Dec-.Lei nº 226/2008 de 20.11, introduziu ao processo executivo, tendo a execução por base requerimento de injunção a que foi aposta a fórmula executória, a executada só pode opor-se-lhe com os fundamentos previstos no art. 814º CPC e não com os do art. 816º do mesmo diploma.

II – E, os fundamentos do artº 814, do CPC só podem ser invocados, na oposição à execução, caso não tenham podido ser deduzidos na oposição à injunção.

Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório

V… , Ld.ª veio deduzir oposição à execução comum, a que estes se encontram apensos, contra si instaurada por B… , Sa, alegando que, em finais do ano de 2006 ou princípios do ano de 2007, a Exequente lhe solicitou, por necessidade de liquidez, que para o pagamento das quantias pendentes na conta corrente, mas ainda não vencidas, aceitasse uma letra no montante de 60.548,87 Euros, comprometendo-se a exequente a pagar 50% das despesas iniciais, decorrentes ou do pagamento total da letra ou de uma eventual reforma da mesma. Mais, alegou que de comum acordo entre as partes, a referida letra foi sendo descontada e acabou por ser objecto de cinco reformas. Alega, ainda, que a exequente se constituiu em mora, desde que apresentou as notas de débito à executada em 31 de Janeiro de 2007, por falta de envio do respectivo comprovativo bancário por forma a confirmar as despesas reclamadas e a executada pudesse efectuar o pagamento. A exequente nunca enviou os documentos solicitados e por isso em 2010 a executada comunica-lhe que só pagaria o montante devido após o recebimento daqueles documentos, o que até hoje não aconteceu, razão porque não efectuou o pagamento por culpa única e exclusiva da exequente. Mais, acontecendo o atraso no cumprimento da obrigação da conduta da exequente, sem qualquer motivo justificativo, incorre em mora e, a consequência imediata, é o facto de a soma devida deixou de vencer juros, sejam legais ou convencionais.

Conclui pedindo a procedência da presente oposição e, na sequência, a sua absolvição.

Foi proferido despacho onde se decidiu indeferir liminarmente a oposição à execução deduzida pela apelante.

É deste despacho que a executada/apelante interpôs o presente recurso, tendo apresentado as seguintes Conclusões:

(…)

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Considerando que, o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso, a questão a decidir é saber se, na execução fundada em requerimento de injunção no qual foi aposta a fórmula executória, a executada pode vir invocar na oposição, por si deduzida contra a execução, as questões que suscitou como pretende a apelante ou apenas os fundamentos previstos no artº 814, do CPC, como foi decidido.

II – FUNDAMENTAÇÃO

O circunstancialismo fáctico e processual a ter em conta é o descrito no relatório.

É o seguinte o texto da decisão recorrida com interesse para a apreciação do presente recurso:

“Compulsados os autos de execução de que os presentes constituem apenso constata-se que o título que serve de base à mesma é um requerimento de injunção, em que figura como Requerente o ora Exequente e como Requerida a ora Executada/Oponente.

Tal requerimento deu entrada no Balcão Nacional de Injunções em 18.10.2010, tendo-lhe sido aposta fórmula executória em 31.01.2011.

Atenta a data de aposição da fórmula executória, é, inequívoco, que aplicável a esta acção o regime emergente dos art.s 814.º e 816.º do Código de Processo Civil na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro.

Tal diploma veio equiparar a injunção à sentença para os efeitos previstos no art. 814º do CPC, encerrando as formas de oposição à execução nela fundada no quadro de mecanismos de reacção contra os títulos de emanação judicial.

Com efeito, a reforma executiva de 2008, equiparou o título executivo extrajudicial de injunção aos títulos judiciais impróprios, de modo que, fundando-se a execução em requerimento de injunção ao qual foi aposta fórmula executória a oposição só poderá ter algum dos seguintes fundamentos:

a) Inexistência ou inexequibilidade do título;

b) Falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da execução;

c) Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento;

d) Falta ou nulidade da citação para a acção declarativa quando o réu não tenha intervindo no processo;

e) Incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, não supridas na fase introdutória da execução;

f) Caso julgado anterior à sentença que se executa;

g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento – cfr. art. 814º, n.º 1 e 2 do CPC.

Ora, no caso vertente a Executada assenta a sua oposição em fundamentos diversos dos previstos no normativo em apreço, pretendendo usar os meios de defesa de que deveria ter lançado mão no âmbito do procedimento de injunção, e que, por isso, ficaram precludidos.

Nestes termos, por a presente oposição à execução não se basear em qualquer fundamento legal previsto no art. 814º, n.º 1 do CPC, indefiro-a liminarmente.

Custas pela Executada/ Oponente.

Registe e notifique.”.


*

A executada insurge-se contra o decidido, por em seu entender: “… o requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória não é nem tem o valor de uma sentença, nem de um despacho judicial ou outras decisões de autoridade judicial que condenam no cumprimento de uma obrigação pecuniária. Não se concebe que se atribua natureza judicial a um título executivo formado através de um mero carimbo, atribuindo-lhe fórmula executória, aposto por um funcionário judicial, no decorrer de uma fase desjuridiscionalizada. Como não se concebe que, por força dessa posição, se limite o direito de defesa de um qualquer cidadão, impedindo-o de se defender com a máxima amplitude. A aposição de fórmula executória num requerimento de injunção é insusceptível de assumir o efeito de caso julgado ou preclusivo para o requerido, não funcionando o disposto no nº 2 do artigo 489º do C.P.C.. Em conformidade, entende que, sendo a injunção com força executória, um título executivo extrajudicial, deve ser aplicável ao regime da oposição o disposto no artigo 816º do C.P.C., podendo o executado defender-se com fundamento em quaisquer factos, não tendo que se cingir aos fundamentos enumerados no art. 814º do C.P.C…”.

Vejamos:

Na base da execução de que esta oposição é dependência está um requerimento de injunção, apresentado pela aqui exequente contra a ora executada, ao qual o Sr. Secretário de Justiça do Balcão Nacional de Injunções apôs, a fórmula executória a que alude o nº 1 do artº 14º do DL 269/98 “este documento tem força executiva” (trata-se do respectivo título executivo).

A referida fórmula executória foi aposta no dito requerimento de injunção em virtude da executada, ora apelante, não ter deduzido oposição à injunção, pois se o tivesse feito aquela não teria lugar e a injunção teria sido distribuída como acção declarativa, seguindo os termos previstos nos arts. 16º nº 1, 17º, 3º e 4º do DL 269/98.

O DL 226/2008, de 20 de Novembro, introduziu alterações ao regime do processo de execução, tendo os arts. 22º nº 1 e 23º daquele diploma legal limitado a sua aplicação aos processos iniciados após 31/03/2009, data em que tal diploma entrou em vigor.

Entre essas alterações, no que ao caso nos interessa, tem relevância o aditamento de um nº 2 ao artº 814º do CPC com a seguinte redacção “O disposto no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, à oposição à execução fundada em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória, desde que o procedimento de formação desse título admita oposição pelo requerido”. O DL 269/98 admite sempre oposição, conforme defende Amâncio Ferreira, in “Curso de Processo de Execução”, 11ª ed., 2009, pág. 184.

Como a execução, a que esta oposição se encontra apensa, foi instaurada em data posterior a 31.03.2009 (o requerimento de injunção entrou no Balcão Nacional de Injunções em 18.10.2010 e tendo-lhe sido aposta a fórmula executória em 31.01.2011), não se suscitam quaisquer dúvidas quanto à aplicação do nº 2 do artº 814º do CPC.

Efectivamente, se em relação a processos instaurados antes da entrada em vigor do DL 226/2008, a jurisprudência e a doutrina não foram unânimes na afirmação do tipo de oposição que o executado pode opor à execução baseada no título assim formado. Enquanto, uns consideravam ser aplicável o disposto no art. 814º do CPC, conforme se defendeu no Ac.RL de 10.12.2009, in www.dgsi.pt e Salvador da Costa, in “A Injunção e as Conexas Acção e Execução”, 6ª ed., págs. 324-326, outros entendiam que o executado pode fundamentar a sua oposição em qualquer causa permitida pelo art. 816º do CPC, conforme se defende nos Acs.RP de 10.01.2006 e de 05.07.2006 e, no Ac.RC de 05.05.2009, todos in www.dgsi.pt e, a nível da doutrina, Remédio Marques, in “Curso de Processo Executivo Comum à face do Código Revisto”, pág. 79.

A esta polémica veio pôr termo o DL 226/2008, no sentido de constituírem apenas fundamentos de oposição os constantes do nº 1 do artº 814º do CPC, com o título (Fundamentos de oposição à execução baseada em sentença ou injunção) e, com o aditamento do nº 2 a este artigo, com a redacção supra referida.

Sendo relevante, também, referir aqui o que dispõe o artº 816º, com o título (Fundamentos de oposição à execução baseada noutro título), onde se lê: Não se baseando a execução em sentença ou em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória, além dos fundamentos de oposição especificados no n.º 1 do artigo 814.º, na parte em que sejam aplicáveis, podem ser alegados quaisquer outros que possam ser invocados no processo de declaração.”.

Daqui resulta que não só nos termos do nº2, do artº 814, se aplica o disposto no seu nº1, “…com as necessárias adaptações, à oposição à execução fundada em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória,…”, como nos termos do artº 816, além dos fundamentos de oposição especificados no nº1 do artigo 814º, na parte em que sejam aplicáveis, podem ser alegados quaisquer outros que possam ser invocados no processo de declaração, não se baseando a execução em sentença ou em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória.

Face ao exposto e tendo em atenção o tipo de título executivo e o requerimento executivo em causa nos autos, um requerimento de injunção em que foi aposta a fórmula executória, não se suscitam dúvidas que estamos perante uma oposição a execução baseada em injunção, onde a exequente pede que a executada/apelante lhe pague as quantias referidas nas notas de débito que lhe enviou acrescidas dos respectivos juros.

Agora, a executada veio deduzir oposição à execução, porquanto, em seu entender, não pagou as quantias peticionadas por culpa da exequente, que não lhe enviou os comprovativos bancários das quantias reclamadas, pelo que a mora não lhe é imputável, nem os juros são devidos à taxa peticionada pela exequente no requerimento de injunção.

Estes os argumentos da oposição da apelante e, que a mesma defende que pode deduzir, porque em seu entender, pode defender-se nos termos do disposto no artº 816, do CPC.

Ora, como resulta da decisão impugnada, não foi este o entendimento do Tribunal, “a quo, nem é o nosso, entendemos que esta questão deveria ter sido suscitada na injunção.

Pois, sem apreciar da bondade dos fundamentos de oposição alegados pela apelante, o certo é que a mesma não os pode invocar nesta situação.

O tipo de defesa, agora deduzido deixou de ser possível com a nova redacção do artº 814, introduzida pelo DL nº 226/2008, já referido.

Com a entrada em vigor deste diploma, “A injunção passou a ser equiparada à sentença, para efeitos de oposição, pelo que não se pode deduzir oposição com os fundamentos que deveriam ter sido apresentados quando o devedor foi notificado da injunção.”, cfr. Edgar Valles, in “Cobrança Judicial de Dívida, Injunções e Respectivas Execuções, 2011, 4ª edição, pág. 155.

Nos requerimentos de injunção nos quais foram apostas as fórmulas executórias, os exequentes expressam o valor que consideram em dívida e interpelam os executados para as pagar.

Não tendo os executados deduzido oposição a esta, após a notificação para o efeito, fica precludido o direito de o fazer, na oposição à execução, com fundamento em quaisquer factos que seria lícito deduzir como defesa no processo de declaração.

Nos termos em que dispôs no DL 269/98, o legislador concedeu ao requerido, no procedimento de injunção, um prazo para deduzir oposição, de 15 dias, antecedido de um rigoroso formalismo no acto de notificação, conforme prescreve o art. 12º do Dec.Lei 269/98.

Nos termos do nº1 do artº 489º do CPC, toda a defesa deve ser deduzida na contestação precludindo o direito se não for exercido.

No caso, a defesa agora invocada pela executada, poderia ter sido apreciada, se tivesse sido deduzida no procedimento de injunção, o que a mesma não fez. Pelo que, agora, não o pode fazer.

A não se entender assim, então o procedimento de injunção era um acto inútil, uma vez que o executado poderia suscitar na execução as questões que poderia ter suscitado na injunção, entre elas era desnecessário deduzir oposição, pois sempre poderia deduzi-la na execução.

Tudo para concluir que, no caso «sub judice», a executada não pode estribar a sua oposição em fundamento que poderia ter deduzido no procedimento de injunção e que só podia fazê-lo ao abrigo do art. 814º do CPC.

Uma vez que os fundamentos que argui, neste momento, podiam ter sido opostos no âmbito do procedimento de injunção que esteve na base do título executivo, que sustenta a execução que a exequente lhe move, a mesma não pode deduzi-lo na presente oposição.

Pelo que bem andou o Tribunal “a quo” quando indeferiu liminarmente a oposição, atento o disposto no art. 817º nº 1 al. b) do CPC e, não violou nenhum dos dispositivos legais mencionados pela apelante.

Assim, porque bem decidiu a 1ª instância, há, consequentemente, que julgar improcedente a apelação, mantendo-se a decisão recorrida.


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SUMÁRIO (art. 713º nº 7 do CPC):

I – Com a entrada em vigor das alterações que o Dec.Lei nº 226/2008 de 20.11, introduziu ao processo executivo, tendo a execução por base requerimento de injunção a que foi aposta a fórmula executória a executada só pode opor-se-lhe com os fundamentos previstos no art. 814º CPC e não os do art. 816º, do mesmo diploma.

II – E, os fundamentos do artº 814, do CPC só podem ser invocados, na oposição à execução, caso não tenham podido ser deduzidos na oposição à injunção.


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III –DECISÃO

Em conformidade com o que se expôs, julga-se improcedente a apelação e confirma-se a sentença recorrida.

Custas pela apelante.

Notifique.

Guimarães, 29 de Novembro de 2011

Rita Romeira

Amílcar Andrade

José Rainho