Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4981/15.1T8VNF-A.G2
Relator: MARIA JOÃO MATOS
Descritores: EXCESSO DE PRONÚNCIA
EMPREITADA
EXCEÇÃO DE INCUMPRIMENTO DO CONTRATO
RECONHECIMENTO DA DÍVIDA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/23/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
SUMÁRIO
(da responsabilidade da Relatora - art. 663º, n 7 do C.P.C.)

I. Sendo embora a sentença recorrida nula, por excesso de pronúncia, deve o Tribunal ad quem conhecer do demais objecto da apelação desde que disponha já dos elementos necessários para o efeito, nomeadamente, o julgamento dos factos alegados e a pronúncia das partes sobre o Direito tido como aplicável aos mesmos (arts. 615.º, n.º 1 e 665.º, ambos do CPC).

II. Por força dos princípios da utilidade, da economia e da celeridade processual, o Tribunal ad quem não deve reapreciar a matéria de facto quando o(s) facto(s) concreto(s) objecto da impugnação for(em) insusceptível(eis) de, face às circunstância próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, ter(em) relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil.

III. O dono da obra pode excepcionar o incumprimento do empreiteiro para suspender o pagamento da sua obrigação de pagamento do preço, desde que: esta seja de vencimento anterior ao da entrega da obra; a parte do preço cujo pagamento recusa seja proporcional à desvalorização da obra provocada pela existência do defeito; e se encontre em condições de exercer os direitos que lhe assistem por força daquele incumprimento, nomeadamente por os ter denunciado em tempo e estar em prazo para os exercer judicialmente (arts. 428.º, 762.º, n.º 2 e 1225.º, todos do CC, e art. 5.º, n.º 1 e 5.º-A, n.ºs 1, 2 e 3, ambos do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril).
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães,
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I - RELATÓRIO
1.1. Decisão impugnada

1.1.1. M. P. e A. C. (aqui Recorridos), respectivamente residentes em …, em França, e na Rua …, em Esposende, propuseram os presentes embargos de executado, contra J. P. (aqui Recorrente), residente na Avenida …, em Esposende (fazendo-o por apenso à acção executiva proposta por este contra eles próprios, para haver deles coercivamente a quantia de € 16.118,65, titulada por um escrito epigrafado «Reconhecimento de Dívida Compromisso de Pagamento»), pedindo que

· a oposição por eles deduzida fosse julgada procedente, declarando-se em consequência extinta a instância executiva.

Alegaram para o efeito, em síntese, inexistir título executivo, não sendo idóneo a preencher essa qualidade o mero documento particular epigrafado «Reconhecimento de Dívida Compromisso de Pagamento», apresentado para esse efeito pelo Exequente/Embargado (J. P.).
Mais alegaram ser ainda o dito documento nulo, por ter sido obtido em erro que dolosamente lhes foi provocado pelo Exequente/Embargado, já que, tendo sido integralmente preenchido por ele, foi assinado por eles próprios no pressuposto de que o valor de € 13.614,60 de que se reconheciam devedores só seria exigível após a conclusão da obra de remodelação que o Exequente/Embargado se obrigou a executar num prédio urbano seu, não a tendo porém este chegado a concluir (correspondendo o valor dos trabalhos em falta ao valor da dívida ali reconhecida).
Alegaram ainda os Executados/Embargantes que o Exequente/Embargado nunca realizou as obras em falta, nem reparou os defeitos registados nas por ele executadas, não obstante as promessas feitas, tendo por isso eles próprios suspendido os pagamentos, ao abrigo da excepção de não cumprimento do contrato.
Defenderam, por isso, os Executados/Embargantes litigar o Exequente/Embargado em manifesto abuso de direito, o que igualmente obstaria ao prosseguimento da instância executiva.
Por fim, e relativamente aos juros de mora peticionados, alegaram os Executados/Embargantes não serem os mesmos devidos, não só por não se encontrarem em qualquer mora, como ainda por estarem prescritos os relativos aos últimos cinco anos anteriores à propositura da acção executiva; e, relativamente a quaisquer outros que fossem devidos, terem de ser calculados à taxa supletiva legal, de 4% ao ano, e não à taxa especial aplicável aos juros de que sejam titulares empesas comerciais.

1.1.2. Proferido despacho a admitir liminarmente os embargos de executado, e regularmente notificado o Exequente/Embargado (J. P.), o mesmo veio contestá-los, pedindo que fossem julgados improcedentes, por não provados, prosseguindo a acção executiva os ulteriores trâmites até final.
Alegou para o efeito, em síntese, que, à data em que foi subscrito o documento particular que exibiu como título executivo, tinha essa qualidade reconhecida pelo Código de Processo Civil então em vigor, sendo esta a única lei a considerar para aquele efeito.
Mais alegou corresponderem os € 13.614,60 reconhecidos como sendo devidos pelos Executados/Embargantes no dito documento a pagamentos directos que ele próprio fez a subempreiteiros que realizaram trabalhos no prédio urbano daqueles, e a seu pedido, tendo o documento sido assinado por eles de forma livre e consciente.
Alegou ainda o Exequente/Embargado ter concluído integralmente todos os trabalhos que se obrigou a realizar em benefício dos Executados/Embargantes, e sem quaisquer defeitos; e, ainda que estes eventualmente existissem, como não lhe foram denunciados antes da propositura dos presentes embargos, encontrar-se-iam já caducos os direitos neles radicados.
Por fim, o Embargado/Exequente defendeu que, no âmbito do regime específico do contrato de empreitada, não poderiam os Embargantes/Executados, face à eventual existência de defeitos, opor-lhe de imediato a excepção de não cumprimento do contrato, suspendendo os pagamentos a que estivessem obrigados. Teriam sim, e previamente, que pedir a respectiva eliminação, a execução de uma nova obra (caso aquela eliminação não fosse possível), a redução do preço ou, em alternativa, a resolução do contrato, e uma indemnização nos termos gerais; e, ainda que pudessem reter parte do preço acordado, tê-lo-iam que fazer de forma adequada e proporcional aos alegados defeitos, o que não se encontraria assegurado no caso dos autos.

1.1.3. Dispensada a realização de uma audiência prévia, foi proferido despacho: fixando o valor da causa em € 16.118,65; saneador (certificando tabelarmente a competência do Tribunal, a isenção de nulidades no processo, a personalidade e capacidade judiciárias das partes, a sua legitimidade e a regularidade da respectiva representação em juízo, e julgando improcedente a excepção de inexistência e/ou inexequibilidade do título executivo); definindo o objecto do litígio («saber se existem motivos para extinguir a execução de que estes embargos constituem apenso, para o que importa apurar, após o saneamento já realizado, da (in)exigibilidade da obrigação exequenda ou de parte da mesma») e enunciando os temas da prova («Da existência de um orçamento inicial, no valor de € 20.000,00, apresentado pelo embargado para a realização dos trabalhos de restauro da casa dos Embargantes e da alteração para um valor superior a € 33.000», «Aferir quais os trabalhos de restauro acordados fazer na casa dos Embargantes», «Da desconformidade do preenchimento do documento dado à execução com o acordado entre Embargantes e Embargado», «Da não conclusão dos trabalhos de restauro e da existência das desconformidades descritas nos pontos 28, 29, 30, 31, da petição inicial de embargos nos trabalhos realizados» e «Da Inexigibilidade de juros de mora e/ou prescrição de parte dos mesmos»); e apreciando os requerimentos probatórios das partes, bem como designando dia para realização da audiência final.

1.1.4. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, julgando procedente a oposição deduzida à acção executiva, com a consequente extinção da instância executiva, lendo-se nomeadamente na mesma:

«(…)
III - Dispositivo
Por tudo quanto ficou exposto, julgo procedente a presente oposição à execução por embargos de executado e, em consequência, extinta a execução.
Condeno o exequente embargado no pagamento das custas processuais.
Registe e notifique.
(…)»
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1.2. Recurso

1.2.1. Fundamentos do recurso

Inconformado, o Exequente/Embargado (J. P.) interpôs recurso de apelação, pedindo que a sentença recorrida fosse declarada nula.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui reproduzidas ipsis verbis):

A - O Tribunal a quo não poderia ter julgado procedentes os presentes embargos.

B - Na verdade, se analisarmos com atenção o elenco dos factos provados e não provados vemos que a quase totalidade dos factos alegados pelos embargantes nos seus embargos resultaram não provados.

C - O Tribunal a quo fez no entanto uma total subversão das regras processuais julgando procedentes os embargos por um motivo que não foi alegado pelos embargantes.

D - O que é ilegal por inadmissível processualmente tornando nessa media a douta sentença nula, nos termos da alínea d), do referido n.º 1, do artigo 615º, do CPC porquanto deixou de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar e pronunciou-se sobre questões que não devesse conhecer.

E - A redacção dada aos factos provados 11 e 12, pese embora não esteja totalmente incorrecta, também não está totalmente correta, podendo levar ao engano

F - Assim e salvo o devido respeito os factos provados 11 e 12 deveriam ter a seguinte redacção: “O exequente embargado é sócio gerente da Construções J. P. & Filhos, Lda., com sede no Largo …, Freguesia de ..., concelho de Esposende, a qual se destina a construção civil.”

G - Da mesma forma, o facto provado 17 está incorrectamente redigido, pelo que e por maioria de razão o facto não provado da alínea b) – por ser o mesmo do facto provado da alínea 17 – deverá ser considerado provado ao invés de não provado.

H - Em sede de embargos de executado, os recorridos em momento algum puseram em causa a legitimidade do recorrente, assumiram outrossim serem devedores do recorrente mas por montante diferente do peticionado.

I - Nunca alegaram os embargantes que não assinaram o documento de confissão de divida que serve de título executivo, ou que não deviam ao recorrente mas sim a terceiro, nem que pagaram parte da divida objecto dos autos ao recorrente, divida essa proveniente das obras de reparação na sua moradia feitas pelo recorrente.

J - Tão pouco em momento algum negaram que deixaram com o recorrente cheques já por si assinados, e que o recorrente poderia preenchê-los, pelos montantes previamente combinados, recebendo o valor dos mesmos.

K - A douta sentença recorrida deu como provado a realização de obras na moradia dos recorridos (vide factos provados 8, 9, 10, 15 e 16), assim como deu como provado que os recorridos pagaram ao recorrente quantias em consequência dessas obras e teriam deixado meios de pagamento de mais valores por causa desses trabalhos (vide factos provados 5 e 7), não sendo pois lógico referir que o recorrente, no seio da sua actividade comercial, não efectuou as obras de reparação e restauro da moradia dos recorridos.

L - Pelo que e salvo o devido respeito face a posição assumida pelos próprios embargantes recorridos em sede de embargos, que terá de ser considerada como matéria assente porque confessada, deveria o facto provado 17 ter resultado provado na afirmativa e não na negativa.

M - Assim o facto provado 17 deverá ter a seguinte redacção:

N - Devendo consequentemente o facto não provado da alínea b) ser considerado provado, por ser o mesmo facto que o facto 17 mas a contrário.

O - Pelos motivos expostos supra, também o facto não provado da alínea a) deveria ter sido considerado como provado ao invés de não provado. Sendo até ridículo dizer-se que o recorrente não se dedica à construção e reparação de edifícios, porque a forma jurídica como o recorrente trabalha – se por conta própria, se através de uma sociedade comercial – nada tira ao facto da sua profissão ser essa: trabalha na construção civil.

P - Também os factos não provados das alíneas c) e q) deveriam ter sido considerados provados, porquanto os recorridos confessam ter pago as quantias que o recorrente diz que pagaram (facto provado 7) e confessam que deixaram cheques em branco ao recorrente para pagamento do remanescente (facto provado 5).

Q - Para além disso, em sede de embargos, no seu artigo 36º, confessam que suspenderam os pagamentos, não fazendo por isso o mínimo sentido dar-se como não provado o facto não provado da alínea q).

R - Pelo que e admitindo-se que não foi feita prova de que os recorridos foram várias vezes interpelados para pagamento do seu débito, sempre teria de ter resultado provado que não pagaram o remanescente do seu débito (visto que não provaram que o pagaram) e que não se mostram dispostos a fazê-lo (a dedução dos embargos é sinal claro que não pretendem pagar).

S - O facto não provado da alínea h) está mal redigido porquanto a excepção do segmento “à medida que os trabalhos fossem avançando”, toda a restante redacção do facto resultou provado no facto provado 5.

T - Pelo que o facto não provado da alínea h) deverá ter a seguinte redacção, que se sugere: “os cheques referidos no ponto 5 dos factos provados deveriam ser apresentados a pagamento à medida que os trabalhos fossem avançando”.

U - Por outro lado, citados da execução, os recorridos deduziram estes embargos alegando a falta de título executivo por não ter as assinaturas autenticadas, a nulidade do titulo executivo porquanto ninguém teria explicado o teor e alcance do título aos embargantes, tendo-o assinado “enganados”, a errada quantificação do valor em dívida, assim como defeitos da obra e o facto da obra estar inacabada.

V - A questão da falta de titulo executivo por as assinaturas não se encontrarem autenticadas foi ultrapassada e indeferida em sede de despacho saneador.

W - Quanto as demais questões a sentença ora recorrida após elencar os factos provados e não provados e após motivar o porquê de considerar provados e não provados aqueles factos, nenhuma subsunção jurídica fez desses factos ao direito não dando por esse motivo qualquer solução jurídica aos embargos deduzidos pelos recorridos.

X - Sendo por esse motivo a sentença recorrida nula por não conhecer de questões que deveria de conhecer.

Y - Pois que dos factos provados e não provados resulta que não resultou provado de que o recorrente deu um orçamento inicial de € 20.000,00 e que os recorridos foram pelo recorrente enganados ao assinar a declaração que serve de título executivo. Como não resultou provado de que os embargados recorridos não entenderam o teor do documento dado a execução. Assim como não resultou provado que a obra não ficou concluída e que se encontraria incluído no orçamento o restauro da garagem. Finalmente não resultaram provados a maior parte dos defeitos alegados pelos embargantes.

Z - Ora, apesar disso, a douta sentença recorrida pura e simplesmente nada diz quanto a fundamentação jurídica a dar aos factos provados e não provados, sendo por isso nula nos termos do artigo 615º, n.º 1, alínea b), do CPC.

AA - Os embargantes fundamentaram não terem de pagar com base na excepção de não cumprimento devido aos defeitos e ao facto da obra se encontrar inacabada, o que, por maioria de razão, significa que o cumprimento é devido, pese embora segundo eles só quando a obra estiver acabada e sem defeitos.

BB - Existe deste modo contradição entre os factos provados e não provados e a decisão, sendo por isso a decisão nula nos termos da alínea c), do n.º 1, do referido artigo 615º do CPC.

CC - Para além disso, analisada a fundamentação jurídica da douta sentença recorrida, resulta que a decisão de julgar os embargos procedentes torna-se ainda mais ininteligível.

DD - Em primeiro lugar, dir-se-á que o Tribunal a quo veio conhecer de uma questão que não foi suscitada pelas partes mormente pelos embargantes, pois que estes como já se disse supra em momento algum defendem que o pagamento não teria de ser feito ao recorrente, reconhecendo outrossim que é a ele que teriam de pagar.

EE - A excepção da causa da obrigação não é de conhecimento oficioso e não poderia ter sida conhecida porque dependia da vontade dos embargantes a quem competiam o ónus de alegar e provar a inexistência da causa da obrigação.

FF - Para além de que o raciocínio feito pelo Tribunal a quo está totalmente errado e em contradição com a própria fundamentação jurídica alegada.

GG - Pois que, entende o tribunal a quo que o documento particular aqui em causa é um documento recognitivo de uma obrigação, incumbindo ao devedor de provar que essa causa não existe.

HH - Ora, se assim for, erra o Tribunal a quo ao dizer que o recorrente estava obrigado a expor sucintamente os factos que fundamentam o seu pedido, porque não estava, mas apesar disso o fez, já que alegou que a divida corresponde ao preço da obra que, por encomenda dos embargantes, fez.

II - Assim, caberia aos embargantes alegaram e provaram que aquela causa não existe, o que nunca fizeram, muito pelo contrario confessam que essa divida existe, excepcionando o seu não cumprimento com base em defeitos e pelo facto da obra estar inacabada.

JJ - Pelo que a douta sentença recorrida não poderia ter julgado os embargos procedentes se os embargantes não alegaram, nem provaram que a causa da obrigação não existia.

KK - Entende o Tribunal a quo que quem provou que a causa não existia foi o próprio recorrente ao desmentir em sede de contestação aos embargos o que tinha alegado em sede de requerimento executivo.

LL - Discorda-se totalmente desse entendimento na medida em que não se vê onde em sede de contestação o recorrente desmentiu o que disse em sede de requerimento executivo.

MM - O facto do recorrente não trabalhar na construção civil por conta própria mas sim como gerente da empresa Construções J. P. & Filhos, Lda. não retira causa a obrigação, muito pelo contrário confirma essa causa já que corrobora que foi com ele que os recorridos contrataram e não directamente com os subempreiteiros.

NN - Para além disso, no documento de confissão de divida que serve de título executivo não é dito em lado nenhum que os trabalhos executados na moradia foram feitos pelas mãos e punhos do recorrente !!!!

OO - Em sede de contestação explicou ainda o recorrente que conhecia a mãe da embargante mulher, que a pedido destes aceitou fazer-lhes os trabalhos na moradia que lhes foi vendida pela sua cunhada, que recolheu orçamentos das especialidades junto os empreiteiros que trabalham para a sua empresa, pedindo-lhes para fazer um preço especial, como se fosse para a sua empresa, que elaborou para efeitos de empréstimo bancário o orçamento com os trabalhos e quantias necessárias, que a sua tarefa consistiu em orientar os trabalhos, que acima do preço desses subempreiteiros não acrescentou qualquer valor para si e que foi ele quem pagou diretamente aos subempreiteiros e por esse motivo os embargantes assinaram o documento de confissão de divida objecto destes autos e pagaram parte do montante que se confessaram devedores.

PP - Tais factos só vêm corroborar o alegado em sede de requerimento executivo e não o desmentir como erradamente alega a sentença recorrida.

QQ - Por todos os motivos expostos supra, deverá a douta sentença recorrida ser declarada nula com todas as consequências legais.
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1.2.2. Contra-alegações

Os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) não contra-alegaram.
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II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR

2.1. Objecto do recurso - EM GERAL

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC).

Não pode igualmente este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais (destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação).
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2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar

Mercê do exposto, e do recurso de apelação interposto pelo Exequente/Embargado (J. P.), 03 questões foram então submetidas à apreciação deste Tribunal ad quem:

1.ª - É a sentença recorrida nula, nomeadamente por não especificar os fundamentos que justificam a decisão (subsumindo-se desse modo ao disposto no art. 615.º, n.º 1, al. b), I parte, do CPC), ou por os seus fundamentos estarem em oposição com a decisão proferida (subsumindo-se desse modo ao disposto no art. 615.º, n.º 1, al. c), I parte, do CPC), ou por o juiz ter deixado de se pronunciar sobre questões que deveria apreciar (subsumindo-se desse modo ao disposto no art. 615.º, n.º 1, al. d), I parte, do CPC), ou por ter conhecido de questão de que não podia tomar conhecimento (subsumindo-se desse modo ao disposto no art. 615.º, n.º 1, al. d), II parte, do CPC) ?

- Fez o Tribunal a quo uma errada interpretação e valoração da prova produzida, nomeadamente porque:

. não permitia que se dessem como demonstrados os factos provados enunciados na sentença recorrida sob o número 11 («O Exequente/Embargado não trabalha na construção civil a título pessoal, por conta própria»), sob o número 12 («O Exequente/Embargado é sócio gerente de Construções J. P. & Filhos, Lda., com sede no Largo ..., n.º.., Freguesia de ..., concelho de Esposende»), e sob o número 17 («O Exequente/Embargado não efectuou, a pedido e sob encomenda dos Executados/Embargantes, obras de reparação na moradia dos mesmos»);

. e impunha que se dessem como demonstrados os factos não provados enunciados na sentença recorrida sob a alínea a) («O Exequente/Embargado dedica-se à construção e reparação de edifícios»), sob a alínea b) («No seio da sua actividade comercial o Exequente/Embargado efectuou, a pedido e sob encomenda dos Executados/Embargantes, obras de reparação na moradia dos mesmos»), sob a alínea c) («Apesar de várias vezes interpelados para o efeito, os Executados/Embargantes não pagaram o seu débito, nem se mostraram dispostos a fazê-lo»), sob a alínea h) («Os cheques referidos no ponto 5 dos factos provados foram subscritos e entregues pelos Executados/Embargantes para que o Exequente/Embargado os preenchesse e apresentasse a pagamento à medida que os trabalhos fossem avançando e sob autorização prévia daqueles») e sob a alínea q) («Mercê do referido nos factos não provados anteriores, os Executados/Embargantes suspenderam os pagamentos») ?

- Fez o Tribunal a quo uma errada interpretação e aplicação da lei (considerando indevidamente inexistir a obrigação exequenda presumida no título executivo), devendo ser alterada a decisão de mérito proferida (nomeadamente, julgando os embargos totalmente improcedentes) ?
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III - QUESTÕES PRÉVIAS - Nulidades

3.1. Conhecimento de nulidades – Momento

3.1.1. Lê-se no art. 663.º, n.º 2 do CPC que o «acórdão principia pelo relatório, em que se enunciam sucintamente as questões a decidir no recurso, expõe de seguida os fundamentos e conclui pela decisão, observando-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º».
Mais se lê, no art. 608.º, n.º 2 do CPC, que o «juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras».
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3.1.2. Concretizando, tendo sido invocada pelo Exequente/Embargado (J. P.) recorrente a nulidade da sentença proferida pelo Tribunal a quo, deverá a mesma ser conhecida de imediato, e de forma prévia às restantes questões objecto aqui de sindicância, já que, sendo reconhecida, poderá impedir o conhecimento das demais (neste sentido, Ac. da RL, de 29.10.2015, Olindo Geraldes, Processo n.º 161/09.3TCSNT.L1-2, disponível em www.dgsi.pt, como todos os demais citados sem indicação de origem).
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3.2. Nulidade da sentença
3.2.1.1. Em geral

As decisões judiciais proferidas pelos tribunais no exercício da sua função jurisdicional podem ser viciadas por duas distintas causas (qualquer uma delas obstando à sua eficácia ou à sua validade): por se ter errado no julgamento dos factos e do direito, sendo então a respectiva consequência a sua revogação; e, como actos jurisdicionais que são, por se ter violado as regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou as que balizam o conteúdo e os limites do poder à sombra do qual são decretadas, sendo então passíveis de nulidade, nos termos do art. 615.º do CPC (neste sentido, Ac. do STA, de 09.07.2014, Carlos Carvalho, Processo n.º 00858/14).
Não obstante se estar perante realidades bem distintas, é «frequente a enunciação nas alegações de recurso de nulidades da sentença, numa tendência que se instalou e que a racionalidade não consegue explicar, desviando-se do verdadeiro objecto do recurso que deve ser centrado nos aspectos de ordem substancial. Com não menos frequência a arguição de nulidades da sentença acaba por ser indeferida, e com toda a justeza, dado que é corrente confundir-se o inconformismo quanto ao teor da sentença com algum dos vícios que determinam tais nulidades».
Sem prejuízo do exposto, e «ainda que nem sempre se consiga descortinar que interesses presidem à estratégia comum de introduzir as alegações de recurso com um rol de pretensas “nulidades” da sentença, sem qualquer consistência, quando tal ocorra (…), cumpre ao juiz pronunciar-se sobre tais questões (…)» (António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, págs. 132 e 133).
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3.2.1.2. Em particular
3.2.1.2.1. Omissão de fundamentação (art. 615.º, n.º 1, al. b), do CPC)

3.2.1.2.1.1. Lê-se no art. 615.º, n.º 1, al. b) do CPC, e no que ora nos interessa, que «é nula a sentença quando»:
. omissão - «Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão».

Esta nulidade está relacionada, por um lado, com a obrigação imposta pelos arts. 154.º e 607.º, n.ºs 3 e 4, ambos do CPC, e pelo art. 205.º, n.º 1 da CRP, do juiz fundamentar as suas decisões (não o podendo fazer por «simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade», conforme n.º 2 do art. 154.º citado).
Com efeito, visando-se com a decisão judicial resolver um conflito de interesses (art. 3.º, n.º 1 do CPC), a paz social só será efectivamente alcançada se o juiz passar de convencido a convincente, o que apenas se consegue através da fundamentação (M. Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Edições Lex, 1997, pág. 348).
Reconhece-se, deste modo, que é a fundamentação da decisão que assegurará ao cidadão o respectivo controlo e, simultaneamente, permitirá ao Tribunal de recurso a sindicância do bem ou mal julgado: a «fundamentação exerce, pois, a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao ato jurisdicional» (José Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª edição, Coimbra Editora, Setembro de 2013, pág. 317).

Logo, e em termos de matéria de facto, o art. 607.º, n.º 3, n.º 4 e n.º 5 do CPC impõe ao juiz que deixe bem claras: quer a indicação do elenco dos factos provados e não provados; quer dos meios de prova que utilizou para formar a sua convicção (sobre a prova, ou não prova, dos factos objecto do processo); quer a relevância atribuída a cada um desses meios de prova (para o mesmo efeito), desse modo explicitando não só a respectiva decisão («o que» decidiu), mas também quais os motivos que a determinaram («o porquê» de ter decidido assim).

A explicitação da formação da convicção do juiz consubstancia precisamente a «análise crítica da prova» que lhe cabe fazer (art. 607.º, n.º 4 do CPC): obedecendo aos princípios de prova resultantes da lei, será em função deles e das regras da experiência que irá formar a sua convicção, sobre a matéria de facto trazida ao respectivo julgamento.
De seguida, e do mesmo modo, o art. 607.º, n.º 3 do CPC impõe ao juiz que proceda à indicação dos fundamentos de direito em que alicerce a sua decisão, nomeadamente identificando as normas e os institutos jurídicos de que se socorra, bem como a interpretação deles feita, concluindo com a subsunção do caso concreto aos mesmos.

Precisa-se, porém, que vem sendo pacificamente defendido, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, que só a falta absoluta da indicação dos fundamentos de facto ou de direito será geradora da nulidade em causa - nomeadamente, a falta de discriminação dos factos provados, ou a genérica referência a toda a prova produzida na fundamentação da decisão de facto, ou conclusivos juízos de direito -, e não apenas a mera deficiência da dita fundamentação (1).
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3.2.1.2.1.2. Concretizando, veio o Exequente/Embargado (J. P.) defender ser a sentença recorrida nula, por alegadamente ser «totalmente omissa na subsunção jurídica dos factos ao direito», já que: pura «e simplesmente nada diz» a respeito das consequências da «falta de prova quanto ao alegado erro que levou os embargantes a assinar o documento que serve de título executivo» e «do facto de não ter resultado provado que a obra não foi concluída, mormente se essa falta de prova daria lugar ou não à excepção do não cumprimento do contrato»; e «finalmente nada diz quanto aos defeitos que resultaram provados, nomeadamente em que medida tais defeitos anulam ou reduzem o valor aqui em dívida».
Contudo, e compulsada a sentença proferida nos autos, verifica-se que a mesma especificou devidamente os fundamentos de facto e de direito da respectiva decisão.
Com efeito, e quanto aos «fundamentos de facto», identificou os factos que considerava provados e não provados, explicitando ainda a motivação de um tal juízo.
Relativamente aos «fundamentos de direito», identificou a questão que apreciou, isto é, a existência ou inexistência da obrigação exequenda meramente presumida no título executivo, enquanto negócio jurídico unilateral de reconhecimento de dívida sem indicação da respectiva causa; e explicitou o seu regime legal (nomeadamente, identificando a sua sede legal, e a forma como deveriam ser interpretados os preceitos legais em causa - substantivos e processuais -, à luz de diversa doutrina que indicou).
Por fim, procedeu à subsunção dos factos alegados e provados a um tal regime legal - previamente identificado e detalhado -, concluindo pela inexistência da obrigação exequenda (prévia e meramente presumida no título executivo), julgando em conformidade a oposição à execução procedente e extinta a instância executiva.
Dir-se-á ainda que, face ao exposto, ficou necessariamente prejudicado o conhecimento das demais questões antes suscitadas (pelas partes) na oposição à execução deduzida (nos termos do art. 608.º, n.º 2, I parte, do CPC, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, in fine, do mesmo diploma): tendo-se por ilidida a presunção da existência ab initio da obrigação exequenda, do mesmo passo se preclude a necessidade de conhecer de alegada causa de invalidade respectiva (v.g. erro doloso), ou de excepções peremptórios que impediriam o seu cumprimento (v.g. falta de conclusão da obra, ou defeitos registados na sua execução).

Logo, a sentença dos autos não padece de nulidade consistente na falta de especificação dos fundamentos de direito que justificam a sua decisão, que para este efeito sempre teria que ser absoluta.
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3.2.1.2.2. Contradição (art. 615.º, n.º 1, al. c), I parte, do CPC)
3.2.1.2.2.1. Lê-se no art. 615.º, n.º 1, al. c), I parte, do CPC, e no que ora nos interessa, que «é nula a sentença quando»:

. contradição - «Os fundamentos estejam em oposição com a decisão (…)».

Esta nulidade está relacionada, por um lado e de novo, com a obrigação imposta pelos arts. 154.º e 607.º, n.ºs 3 e 4, ambos do CPC, e pelo art. 205.º, n.º 1 da CRP, do juiz fundamentar as suas decisões; e, por outro lado, com o facto de se exigir que a decisão judicial constitua um silogismo lógico-jurídico, em que o seu decisório final deverá ser a consequência ou conclusão lógica da conjugação da norma legal [premissa maior] com os factos [premissa menor].
Reconhece-se, deste modo, que é precisamente a fundamentação da decisão que assegurará ao cidadão o respectivo controlo; e, simultaneamente, permitirá ao Tribunal de recurso a sindicância do bem ou mal julgado.
Por outras palavras, «os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, funcionam na estrutura expositiva e argumentativa em que se traduz a sentença, como premissas lógicas necessárias para a formação do silogismo judiciário». Logo, «constituirá violação das regras necessárias à construção lógica da sentença que os fundamentos da mesma conduzam logicamente a conclusão diferente da que na mesma resulta enunciada» (Ac. da RG, de 14.05.2015, Manuel Bargado, Processo n.º 414/13.6TBVVD.G) (2).
Realidade distinta desta, reitera-se, é o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou erro na interpretação desta: quando - embora mal - o juiz entenda que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação ou dela decorre, o que existe é erro de julgamento e não oposição nos termos aludidos (Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum, Coimbra Editora, 2000, pág. 298).
Por outras palavras, o erro de julgamento gerador da violação de lei substantiva decompõe-se numa das seguintes vertentes: erro de determinação da norma aplicável; erro de interpretação; ou erro de aplicação do direito, isto é, erro de subsunção dos factos e do direito, ou estender-se à sua própria qualificação (3).
Logo, saber se a decisão (de facto ou de direito) está certa, ou não, é questão de mérito e não de nulidade da mesma (conforme Ac. do STJ, de 08.03.2001, Ferreira Ramos Processo n.º 00A3277).
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3.2.1.2.2.2. Concretizando, veio o Exequente/Embargado (J. P.) defender ser a sentença recorrida nula, por alegadamente existir «contradição entre os factos provados e não provados e a decisão», sendo ainda desconforme com a prévia alegação dos Executados/Embargantes, que teriam aceitado «serem devedores do recorrente» e fundamentaram exclusivamente o seu alegado direito de não lhe pagarem «com base na exceção de não cumprimento devido aos defeitos e ao facto de a obra se encontrar inacabada».

Contudo, e compulsada a sentença proferida nos autos, verifica-se que na mesma inexiste qualquer oposição entre os seus fundamentos e a respectiva decisão final.
Com efeito, recorrendo aos factos provados (nomeadamente, aos mesmos que são objecto de impugnação por parte do Exequente/Embargante recorrente), que subsumiu aos preceitos legais previamente seleccionados e interpretados, a sentença recorrida concluiu de forma lógica com uns e ouros, considerando ter ficado demonstrada a inexistência da obrigação exequenda meramente presumida pelo título executivo.
Poderá, e muito legitimamente, o Exequente/Embargado (J. P.) discordar do entendimento exposto (nomeadamente, por entender que a questão conhecida pelo Tribunal a quo extravasaria o elenco das que lhe estavam disponíveis para o efeito, ou foi mal apreciada); mas a eventual razão que lhe possa assistir não comina de nulidade o dito entendimento, por contradição entre os seus fundamentos e a posterior decisão (justificando antes a apreciação de uma outra e distinta nulidade, ou um pedido de reponderação do assim ajuizado).

Logo, a sentença dos autos não padece de nulidade consistente na oposição entre os seus fundamentos e a respectiva decisão final.
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3.2.1.2.3. Omissão de pronúncia (art. 615.º, n.º 1, al. d), I parte, do CPC)

3.2.1.2.3.1. Lê-se no art. 615.º, n.º 1, al. d), I parte, do CPC, que «é nula a sentença quando»:

. omissão de pronúncia - «O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar».

Em coerência, e de forma prévia, lê-se no art. 608.º, n.º 2 do CPC, que «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras».
Há, porém, que distinguir entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos pelas partes (para sustentar a solução que defendem a propósito de cada questão a resolver): «São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão» (Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, Limitada, pág.143, com bold apócrifo).
Ora, as questões postas, a resolver, «suscitadas pelas partes só podem ser devidamente individualizadas quando se souber não só quem põe a questão (sujeitos), qual o objecto dela (pedido), mas também qual o fundamento ou razão do pedido apresentado (causa de pedir)» (Alberto dos Reis, op. cit., pág. 54). Logo, «as “questões” a apreciar reportam-se aos assuntos juridicamente relevantes, pontos essenciais de facto ou direito em que as partes fundamentam as suas pretensões» (Ac. do STJ, de 16.04.2013, António Joaquim Piçarra, Processo n.º 2449/08.1TBFAF.G1.S1); e não se confundem com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes (a estes não tem o Tribunal que dar resposta especificada ou individualizada, mas apenas aos que directamente contendam com a substanciação da causa de pedir e do pedido).
Por outras palavras, as «partes, quando se apresentam a demandar ou a contradizer, invocam direitos ou reclamam a verificação de certos deveres jurídicos, uns e outros com influência na decisão do litígio; isto quer dizer que a “questão” da procedência ou improcedência do pedido não é geralmente uma questão singular, no sentido de que possa ser decidida pela formulação de um único juízo, estando normalmente condicionada à apreciação e julgamento de outras situações jurídicas, de cuja decisão resultará o reconhecimento do mérito ou do demérito da causa. Se se exige, por exemplo, o cumprimento de uma obrigação, e o devedor invoca a nulidade do título, ou a prescrição da dívida, ou o pagamento, qualquer destas questões tem necessariamente de ser apreciada e decidida porque a procedência do pedido dependa da solução que lhes for dada; mas já não terá o juiz de, em relação a cada uma delas, apreciar todos os argumentos ou razões aduzidas pelos litigantes, na defesa dos seus pontos de vista, embora seja conveniente que o faça, para que a sentença vença e convença as partes, como se dizia na antiga prática forense» (Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, Volume III, Almedina, Lisboa, pág. 228, com bold apócrifo).
Logo, a omissão de pronúncia circunscreve-se às questões de que o tribunal tenha o dever de conhecer para a decisão da causa e de que não haja conhecido, realidade distinta da invocação de um facto ou invocação de um argumento pela parte sobre os quais o tribunal não se tenha pronunciado (4).

Esta nulidade só ocorrerá, então, quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição dos pleiteantes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir, o pedido e as excepções, e não quando tão só ocorre mera ausência de discussão das «razões» ou dos «argumentos» invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas, deixando o juiz de os apreciar, conhecendo contudo da questão (Ac. do STJ, de 21.12.2005, Pereira da Silva, Processo n.º 05B2287, com bold apócrifo).
Já, porém, não ocorrerá a dita nulidade da sentença por omissão de pronúncia quando nela não se conhece de questão cuja decisão se mostra prejudicada pela solução dada anteriormente a outra (Ac. do STJ, de 03.10.2002, Araújo de Barros, Processo n.º 02B1844). Compreende-se que assim seja, uma vez que o conhecimento de uma questão pode fazer-se tomando posição directa sobre ela, ou resultar da ponderação ou decisão de outra conexa que a envolve ou a exclui (Ac. do STJ, de 08.03.2001, Ferreira Ramos, Processo n.º 00A3277).
Igualmente «não se verifica a nulidade de uma decisão judicial - que se afere pelo disposto nos arts. 615.º (sentença) e 666.º (acórdãos) - quando esta não aprecia uma questão de conhecimento oficioso que lhe não foi colocada e que o tribunal, por sua iniciativa, não suscitou» (Ac. do STJ, de 20.03.2014, Maria dos Prazeres Beleza, Processo n.º 1052/08.0TVPRT.P1.S1).
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3.2.1.2.3.2. Concretizando, veio o Exequente/Embargado (J. P.) defender ser a sentença recorrida nula, por alegadamente, «após elencar os factos provados e não provados e após motivar o porquê de considerar provados e não provados aqueles factos, nenhuma subsunção jurídica fez desses factos ao direito não dando por esse motivo qualquer solução jurídica aos embargos deduzidos pelos recorridos»; e precisou ainda que, «quanto aos fundamentos dos embargos, (…) é totalmente omissa ma subsunção dos factos ao direito», já que pura «e simplesmente nada diz».
Contudo, e compulsada a sentença proferida nos autos, verifica-se que na mesma o Tribunal a quo não deixou de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, e cujo conhecimento não tivesse ficado prejudicado pela solução dada previamente à verificação da existência da obrigação exequenda (que se teve por inexistente).
Com efeito, e tal como já referido antes, tendo o Tribunal a quo ajuizado que não existiria a obrigação exequenda, por inexistência da causa respectiva presumida no título executivo (e, por isso, julgando procedente a oposição à execução e extinta a instância executiva), do mesmo passo ficou prejudicado o conhecimento da alegada causa de invalidade do título executivo (erro doloso, condicionante da sua emissão), ou da alegada excepção peremptória impeditiva do cumprimento da obrigação exequenda (excepção de não cumprimento do contrato de empreitada, por falta de conclusão da obra e de defeitos registados na mesma).
A natural discordância do Exequente/Embargado (J. P.) face à decisão do Tribunal a quo (quer quanto ao que efectivamente ajuizou, quer quanto ao conhecimento que julgou prejudicado), não consubstancia nulidade da sentença recorrida, mas sim - e apenas - eventual erro de julgamento seu.

Logo, a sentença dos autos não padece de nulidade consistente em qualquer omissão de pronúncia.
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3.2.1.2.4. Excesso de pronúncia (art. 615.º, n.º 1, al. d), II parte, do CPC)
3.2.1.2.4.1. Lê-se no art. 615.º, n.º 1, al. d), II parte, do CPC, que «é nula a sentença quando»:

. excesso de pronúncia - «O juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».

Em coerência, e de forma prévia, lê-se no art. 608.º, n.º 2 do CPC, que o juiz não «pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras»; e lê-se no art. 609.º, n.º 1 do mesmo diploma que a «sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir».
Recorda-se que «questões», para este efeito, são «todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os pressupostos específicos de qualquer acto (processual) especial, quando realmente debatidos entre as partes» (Antunes Varela, RLJ, Ano 122.º, pág. 112); e não podem confundir-se «as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão» (J. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, Limitada, pág. 143) (5).
Compreende-se, por isso, que se afirme que «as questões suscitadas pelas partes e que justificam a pronúncia do tribunal terão de ser determinadas pelo binómio causa de pedir-pedido, e o tribunal não tem de se pronunciar sobre todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes, desde que não deixe de apreciar os problemas fundamentais e necessários à decisão da causa» (Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1979, pág. 220).

Esta nulidade colhe o seu fundamento quer no princípio do dispositivo (que atribui às partes a iniciativa e o impulso processual), quer no princípio do contraditório, com isso significando que - em sede de processo civil, onde se discutem e dirimem conflitos de natureza privada, e não pública - o tribunal não pode resolver o conflito de interesses sem que a resolução lhe seja pedido por uma das partes, e sem que a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.
Compreende-se, por isso, que se lesse no art. 264.º, n.º 2 do anterior CPC que «o juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos artigos 514º e 665º e da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa»; e no art. 664º do mesmo diploma que «o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito; mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no artigo 264».
Contudo, com a última reforma do CPC, mantendo-se o respeito pelo princípio do dispositivo, deu-se mais um passo no sentido da busca de uma justiça cada vez mais substancial/material e menos formal, lendo-se agora no art. 5.º, n.º 1 e n.º 2 do actual CPC que, cabendo às partes «alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas», serão ainda considerados pelo juiz os «factos instrumentais que resultem da instrução da causa», os «factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar», e - tal como outrora - os «factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções»; e mantendo-se no n.º 3 da mesma disposição que «o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito».
Compreende-se, por isso, que a regra enunciada no n.º 1 do art. 609.º do CPC deva ser interpretada em sentido flexível, de modo a permitir ao tribunal corrigir o pedido, quando este traduza mera qualificação jurídica, sem alteração do teor substantivo; ou quando a causa de pedir, invocada expressamente pelo autor, não exclua uma outra abarcada por aquela (conforme Ac. do STJ, de 23.01.2004, Ferreira Girão).
Do mesmo modo o vem entendendo o STJ, na uniformização da jurisprudência que lhe incumbe fazer, nomeadamente:

. no Assento do STJ n.º 4/95, de 28 de Março (DR, I Série A, de 17.05.1995) - onde se consignou que, quando «o tribunal conhecer oficiosamente da nulidade de negócio jurídico invocado no pressuposto da sua validade, e se na acção tiverem sido fixados os necessários factos materiais, deve a parte ser condenada na restituição do recebido, com fundamento no art. 289.º, n.º 1 do CC»;

. no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 3/2001, de 23 de Janeiro (DR, I Série A, de 09.02.2001) - onde se consignou que, tendo «o autor, em acção de impugnação pauliana, pedido a declaração de nulidade ou a anulação do acto jurídico impugnado, tratando-se de erro na qualificação jurídica do efeito pretendido, que é a ineficácia do acto em relação ao autor (art. 616.º, n.º 1 do CC), o juiz deve corrigir oficiosamente tal erro e declarar tal ineficácia, como permitido pelo art. 664.º do CPC» [hoje, art. 5.º, n.º 3 do mesmo diploma].

Deverá, porém, em hipóteses como estas ser assegurado o cumprimento do princípio do contraditório, salvo caso de manifesta desnecessidade, por forma a que as partes não venham a ser confrontadas com uma «decisão surpresa», isto é, com a qual não podiam contar e, por isso, não apreciaram, nomeadamente contraditando (art. 3.º, n.º 3 do CPC).
Concluindo, o «juiz não pode conhecer, em regra, senão das questões suscitadas pelas partes»; e, «na decisão que proferir sobre essas questões, não pode ultrapassar, nem em quantidade, nem em qualidade, os limites constantes do pedido formulado pelas partes» (Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 67).
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3.2.1.2.4.2. Concretizando, veio o Exequente/Embargado (J. P.) defender ser a sentença recorrida nula, por alegadamente o Tribunal a quo ter conhecido «uma questão que não foi suscitada pelas partes mormente pelos embargantes, pois que estes (…) em momento algum defendem que o pagamento não teria de ser feito ao recorrente, reconhecendo outrossim que é a ele que teriam de pagar».
Compulsada a sentença proferida nos autos, verifica-se que, tendo a mesma entendido que o título executivo «RECONHECIMENTO DE DÍVIDA COMPROMISSO DE PAGAMENTO» consubstanciava um negócio jurídico unilateral de reconhecimento de dívida, sem indicação da respectiva causa (dispensando o Exequente/Embargado de a provar, por se ter por presumida até prova em contrário, nos termos do art. 458.º, n.º 1 do CC), a mesma teria sido devidamente indicada no requerimento executivo (conforme imposto pelo art. 724.º, n.º 1, al. e), do CPC, onde se lê que nele se expõem «sucintamente os factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo»); mas que teria depois ficado demonstrada a efectiva inexistência da causa da obrigação exequenda (presumida no título e alegada no requerimento executivo).
Com efeito, lê-se a propósito na sentença recorrida:
«(…)
Como se escreve no Acórdão da Relação de Lisboa, de 30/11/2010, disponível in www.dgsi.pt, prefiguram-se, naquela alínea c), duas espécies de documentos negociais particulares, consoante o teor da declaração neles contida: 1ª - documentos constitutivos da obrigação exequenda, quando deles conste o próprio negócio jurídico que serve de fonte a essa obrigação; 2ª - documentos meramente recognitivos da obrigação, mormente de confissão de dívida, quando o devedor se limite a reconhecer a obrigação, sem menção do respectivo negócio causal, o qual se presume, fazendo recair sobre o devedor o ónus de provar que aquela causa não existe, nos termos do nº1 do art. 458º do Código Civil. Concretizando, dispõe o artigo 458º, n.º1, do Código Civil que “Se alguém, por simples declaração unilateral, prometer uma prestação ou reconhecer uma dívida, sem indicação da respectiva causa, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até prova em contrário.”.
Em anotação ao citado art.458º, escrevem Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil, Anotado, vol.I, 2ª ed., pág.385: «Não se consagra neste artigo o princípio do negócio abstracto. O que se estabelece é apenas a inversão do ónus da prova da existência da relação fundamental (…). Se A, por ex., declara dever a B 10 contos, sem invocação da causa (empréstimo, venda, etc.), presume-se que esta obrigação tem uma causa, podendo, porém, o devedor fazer a prova do contrário. Neste sentido se deve entender o disposto na al.c) do art.46º do Código de processo Civil, ao admitir como título exequível o escrito particular, assinado pelo devedor, do qual conste a obrigação de pagamento de quantia determinada ou de entrega de coisa fungível (…). Sublinhe-se que o nº1 deste artigo não consagra um desvio ao princípio do contrato (…). Nenhum dos actos a que nele se alude (promessa de uma prestação ou reconhecimento de uma dívida) constitui, com efeito, fonte autónoma de uma obrigação (…). Criam apenas a presunção da existência de uma relação negocial ou extranegocial (a relação fundamental a que aquele preceito se refere), sendo esta a verdadeira fonte da obrigação. Se o declarante ou seus sucessores alegarem e provarem que semelhante relação não existe (…), a obrigação cai, não lhe servindo de suporte bastante nem a promessa de cumprimento nem o reconhecimento da dívida».
Na verdade, em regra, para que haja o dever de prestar e o correlativo poder de exigir a prestação é necessário o acordo (contrato) entre o devedor e o credor. É a esta ideia que se tem dado o nome de princípio do contrato, o qual assenta na consideração de não ser razoável, fora dos casos especiais previstos na lei, manter alguém irrevogavelmente obrigado perante outrem, com base numa simples declaração unilateral de vontade (cfr. Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, vol.I, 2ª ed., pág.321).
A causa da dívida, embora não seja um conceito unívoco, significa, para efeitos do disposto no artigo 458º, n.º 1, do Código Civil, a fonte ou o facto constitutivo dessa dívida [António Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, Volume 1º, 1994, páginas 565].
Isto posto, a referência genérica que resulta do documento que serve de base à execução quanto à proveniência da dívida que pelo mesmo se reconhece (“trabalhos realizados na moradia de que sou proprietário”) é, por este prisma, inócua, não podendo afirmar-se que do mesmo resulte a indicação da causa da obrigação que pelo mesmo se reconhece. Logo, e atenta a insuficiência do título, o exequente embargado estava obrigado a expor “…sucintamente os factos que fundamentam o pedido,…”, ou seja, os factos constitutivos do direito de crédito invocado, a causa da obrigação reconhecida pelos executados embargantes (art.724º, n.º1, e), CPC). O que o exequente embargado fez, alegando, em síntese, corresponder o crédito exequente ao preço da obra que por encomenda dos executados embargantes fez. Porém, na contestação deduzida veio desmentir o alegado, o que reiterou em audiência final, destituindo, assim, como também resulta da realidade demonstrada, a obrigação exequenda de causa, o que se julga. Em conformidade, a mesma não é exigível, procedendo a oposição à execução por embargos de executado, o que se julga.
(…)»

Contudo, e salvo o devido respeito por opinião contrária, dir-se-á que não foi alegado nos autos, nomeadamente pelos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.), não ter a obrigação exequenda causa, ou não ter a causa apresentada para ela pelo Exequente/Embargado (J. P.) (antes a tendo aqueles confessado - no requerimento inicial de oposição - como existente e como correctamente indicada); e não ser esta questão de conhecimento oficioso nos autos de oposição à execução.
Com efeito, e diversamente «da contestação da ação declarativa, a oposição à execução, constituindo, do ponto de vista estrutural, algo de extrínseco à acção executiva, toma o carácter duma contra-acção tendente a obstar à produção dos efeitos do título executivo e (ou) da acção que nele se baseia. Quando veicula uma oposição de mérito à execução, visa um acertamento negativo da situação substantiva (obrigação exequenda), de sentido contrário ao acertamento positivo consubstanciado no título executivo (judicial ou não), cujo escopo é obstar ao prosseguimento da acção executiva mediante a eliminação, por via indirecta, da eficácia do título executivo enquanto tal».
Logo, constituindo «os embargos de executado uma verdadeira ação declarativa, que corre por apenso ao processo de execução», a «ideia de que é possível conhecer oficiosamente, no processo da oposição, de objecções não deduzidas pelo executado parece-nos ser de rejeitar; designadamente, no caso da oposição de mérito, a pretensão de acertamento negativo que lhe constitui objeto é fundada na negação formulada ou na exceção concreta deduzida, que constitui a causa de pedir». Assim, «o tribunal deve, na oposição, conhecer oficiosamente das exceções (de conhecimento oficioso) respeitantes ao próprio processo de oposição, mas não de (outras) exceções, dilatórias ou perentórias, respeitantes ao processo executivo» (José Lebre de Freitas, A Acção Executiva À luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª Edição, Coimbra Editora, Fevereiro de 2014, págs. 193, 212 e 214).
Precisando, consta do título executivo que os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) «declaram que são devedores a J. P. (…) da quantia de 13.614,60 €», e que «a presente dívida é proveniente de trabalhos realizados na moradia que sou proprietário na Rua ..., n.º .., Lugar ..., Esposende»; e veio o Exequente/Embargado (J. P.) alegar no requerimento executivo dedicar-se «a construção e reparação de edifícios», ter efectuado, no «seio da sua actividade comercial, (…) a pedido e sob encomenda dos executados, obras de reparação na moradia dos executados», que, em «24 de Junho de 2008, (…) cientes da sua dívida para com» ele «assinaram um documento escrito, onde reconheceram a dívida que mantinham para com o exequente, dívida essa no montante de € 13.614,60», comprometendo-se «ainda a liquidar essa dívida até 31-12-2009», tendo porém apenas satisfeito € 2.250,00, pelo que lhe deveriam «o montante de € 11.364,00».
Face ao exposto, vieram os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) deduzir oposição à execução, alegando nomeadamente que: o «exequente propôs-se executar os trabalhos de restauro da casa» de sua propriedade (artigo 9.º); o «Exequente iniciou (…) as obras já no início de 2008» (artigo 11.º); cerca «de 6 meses depois do início das obras o exequente informou que a quantia inicialmente acordada não seria suficiente e que os trabalhos a realizar importariam em valor acrescido» (artigo 12.º); o «Exequente não concluiu (…) diversos trabalhos correspondentes ao valor da empreitada aposto naquele documento», de «RECONHECIMENTO DE DÍVIDA COMPROMISSO DE PAGAMENTO» (artigo 26.º); o «Exequente nunca negou que não concluiu os serviços e sempre reconheceu os problemas com a obra, sempre se comprometendo a concluir os trabalhos e a reparar os problemas e as infiltrações surgidas», mas «nunca executou qualquer trabalho de reparação» (artigos 33.º e 34.º); e terem sido os «juros moratórias reclamados pelo Exequente aqui embargado (…) indevidamente calculados à taxa comercial, quando não se trata aqui de qualquer transacção comercial, porquanto estamos perante um contrato de empreitada entre um comerciante e dois particulares» (artigo 43.º).
Logo, e de forma indubitável, no requerimento inicial dos embargos que deduziram, os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) não só não ilidiram a existência da relação fundamental tida pelo Tribunal a quo como apenas presumida no título executivo «RECONHECIMENTO DE DÍVIDA COMPROMISSO DE PAGAMENTO» (como seria seu ónus processual), como expressamente a confessaram, nos exactos termos nele alegados pelo Exequente/Embargado (J. P.): a celebração de um contrato de empreitada, tendo por objecto a realização de obras na moradia propriedade dos Executados/Embargantes (donos da obra), por parte do Exequente/Embargado (empreiteiro).
Compreende-se, por isso, que os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) tenham radicado exclusivamente a oposição deduzida à acção executiva, e no que ora nos interessa: na invalidade do título executivo, por eles emitido sob alegado erro doloso provocado pelo Exequente/Embargado (J. P.); na excepção de não cumprimento do contrato de empreitada em causa, por alegada falta de conclusão da obra dele objecto e de defeitos registados na sua execução; e no incorrecto cálculo dos juros moratórios.
Compreende-se ainda que a enunciação dos temas da prova tenha sido feita, precisa e exclusivamente, em torno destes dois fundamentos fácticos de oposição, isto é: «Da existência de um orçamento inicial, no valor de € 20.000, apresentado pelo embargado para a realização dos trabalhos de restauro da casa dos embargantes e da alteração para um valor superior a € 33.000»; «Aferir quais os trabalhos de restauro acordado fazer na casa dos embargantes»; «Da desconformidade do preenchimento do documento dado à execução acordado entre embargantes e embargado»; «Da não conclusão dos trabalhos de restauro e da existência de desconformidade descritas nos pontos 28, 29, 30, 31, da petição inicial de embargos nos trabalhos executados»; e «Da inexigibilidade de juros de mora e/ou da prescrição de parte dos mesmos».
Logo, quando a sentença proferida pelo Tribunal a quo nos autos de oposição à execução veio apreciar e decidir pela inexistência da relação fundamental tida por ele como apenas presumida no título executivo, exposta factualmente no requerimento executivo, e confessada como efectiva e conforme no requerimento inicial de oposição à execução, conheceu de questão de que não podia tomar conhecimento; e, por isso, a sentença recorrida padece de nulidade, consistente precisamente neste excesso de pronúncia, o que deverá ser declarado por este Tribunal ad quem.
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3.2.1.3. Efeito do reconhecimento da nulidade (da sentença) sobre o recurso de apelação

3.2.1.3.1. Lê-se no art. 665.º do CPC que, ainda «que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objecto da apelação» (n.º 1); e se «o tribunal recorrido tiver deixado de conhecer certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, a Relação, se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhece no mesmo acórdão que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha dos elementos necessários» (n.º 2).

Logo, «ainda que a Relação confirme a arguição de alguma das referidas nulidades da sentença, não se limita a reenviar o processo para o tribunal a quo. Ao invés, deve prosseguir com a apreciação das demais questões que tenham sido suscitadas, conhecendo do mérito da apelação, nos termos do art. 665º, nº 2.

Deste modo, a anulação da decisão (v.g. por contradição de fundamentos ou por omissão de pronúncia) não tem como efeito invariável a remessa imediata do processo para o tribunal a quo, devendo a Relação proceder à apreciação do objecto do recurso, salvo se não dispuser dos elementos necessários. Só nessa eventualidade se justifica a devolução do processo para o tribunal a quo» (António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, Julho de 2013, pág. 261).
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3.2.1.3.2. Concretizando, sendo embora a sentença recorrida nula, por excesso de pronúncia, deve este Tribunal ad quem conhecer do demais objecto da apelação, isto é, das concretas questões suscitadas pelos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) como fundamento da oposição à execução que deduziram, uma vez que já dispõe dos elementos necessários para o efeito (nomeadamente, o julgamento dos factos relevantes alegados, e a pronúncia de ambas as partes sobre o Direito reclamado como aplicável aos mesmos).
Prossegue-se, pois, com essa apreciação.
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IV - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

4.1. Decisão de Facto do Tribunal de 1ª Instância
4.1.1. Factos Provados

Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal de 1.ª Instância considerou provados os seguintes factos (aqui apenas reordenados - lógica e cronologicamente - e renumerados):

1 - J. P. (aqui Exequente/Embargado) é sócio gerente de Construções J. P. & Filhos, Lda., com sede no Largo ..., n.º .., Freguesia de ..., concelho de Esposende.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 12)

2 - O Exequente/Embargado (J. P.) não trabalha na construção civil a título pessoal, por conta própria.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 11)

3 - O Exequente/Embargado (J. P.) conhecia A. C. (aqui Executada/Embargante) e os pais desta, por serem naturais da mesma freguesia, a freguesia das ….
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 13)

4 - O Exequente/Embargado (J. P.) elaborou o orçamento junto a fls. 22 dos autos principais, cujo teor aqui se dá por reproduzido, datado de 30 de Novembro de 2007, no valor de € 25.130,00, que foi apresentado ao Banco ..., S.A. com vista a instruir o processo bancário para concessão de crédito a M. P. e A. C. (aqui Executados/Embargantes), para a aquisição de casa e realização de obras na mesma.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 14)

5 - No dia 28 de Dezembro de 2007, por escritura pública, os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) adquiriram a L. C., cunhada do Exequente/Embargado (J. P.), pelo preço de € 60.000,00, o prédio urbano para habitação, sito no Lugar …, Rua de … (conforme fls. 8 e 9 dos autos principais, cujo teor aqui se dá por integramente reproduzido).
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 1)

6- Pelo mesmo instrumento, declararam os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) confessarem-se solidariamente devedores ao Banco ..., S.A. de uma quantia no valor de € 80.000,00, «destinando-se sessenta mil euros à precedente aquisição, e a quantia remanescente de vinte mil euros destina-se a obras de beneficiação no mesmo imóvel e será entregue aos mutuários fraccionada e proporcionalmente à evolução das obras».
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 2)

7 - Os € 20.000,00 a que se alude no facto provado anterior foram entregues aos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) nos meses de Janeiro (€ 10.000,00), Abril (€ 5.000,00) e Junho (€ 5000,00) de 2008 (conforme fls. 98 a 100,107 a 109, e 113 a 114 dos autos principais, e que aqui se dão por integralmente reproduzidas).
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 3)

8 - O Exequente/Embargado (J. P.) não efectuou, a pedido e sob encomenda dos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.), obras de reparação na moradia dos mesmos.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 17)

9 - No dia 24 de Julho de 2008, os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) subscreveram o documento que serve de base à execução dos autos principais, intitulado «RECONHECIMENTO DE DÍVIDA COMPROMISSO DE PAGAMENTO», que é fls. 4 e 10 dos autos principais e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, lendo-se nomeadamente no mesmo:
«(…) declaram que são devedores a J. P. (…) da quantia de 13.614,60 € (treze mil seiscentos e catorze euros e sessenta cêntimos) comprometendo-se a efectuar o pagamento do valor supra citado até 31/12/2009, a presente dívida é proveniente de trabalhos realizados na moradia que sou proprietário na Rua ..., n.º .., Lugar ..., Esposende.
(…)»
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 4)

10 - O documento «RECONHECIMENTO DE DÍVIDA COMPROMISSO DE PAGAMENTO» foi redigido por A. P., filha do Exequente/Embargado (J. P.) e sócia de Construções J. P. & Filhos, Lda., que o apresentou aos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) para assinatura.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 6)

11 - Ao mesmo tempo, porque os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) se ausentariam no final de Julho de 2008 para França - onde o Executado/Embargante já era emigrante -, a solicitação do Exequente/Embargado (J. P.), e com vista ao pagamento da quantia referida no ponto 4, entregaram-lhe os cheques que resultam de fls. 11 a 14 dos autos principais, para preenchimento mediante acordo prévio.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 5)

12 - Em pagamento da quantia de € 13.614,60, referida no documento «RECONHECIMENTO DE DÍVIDA COMPROMISSO DE PAGAMENTO», os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) entregaram uma quantia no valor total de € 2.250,00, sendo € 750,00 em 23 de Dezembro de 2008, € 250,00 em 9 de Fevereiro de 2009, € 500,00 em 20 de Março de 2009, € 250,00 em 1 de Setembro de 2009 e € 500,00 em 16 de Outubro de 2009 (conforme fls. 122 a 124, 128 a 130, e 133 a 135 dos autos principais, que aqui se dão por integralmente reproduzidas).
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 7)

13 - Os trabalhos a executar eram os contemplados no orçamento referido no ponto 14.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 16)

14 - O orçamento junto a fls. 22 dos autos (referido no facto provado enunciado sob o número 4) não prevê a “requalificação” da garagem.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 15)

15 - Depois da subscrição da declaração «RECONHECIMENTO DE DÍVIDA COMPROMISSO DE PAGAMENTO», foram entregues os electrodomésticos da cozinha; e até à data falta colocar o móvel e lavatório da casa de banho.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 8)

16 - A substituição de telha por terraço com tela e tijoleira, cobertura de parte do primeiro andar, concretamente da sala nele situada, carece de estanquidade, permitindo a infiltração de água, que passa até ao tecto da sala, caindo com abundância quando chove, tendo que ser colocado balde.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 9)

17 - Em consequência, o tecto da sala apresenta fissuras, a tinta enegrecida e a descolar.
(facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 10)
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4.1.2. Factos não provados

Na mesma decisão do Tribunal de 1ª Instância, foram considerados não provados os seguintes factos:

a) O Exequente/Embargado (J. P.) dedica-se à construção e reparação de edifícios.

b) No seio da sua actividade comercial, o Exequente/Embargado (J. P.) efectuou a pedido e sob encomenda dos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) obras de reparação na moradia destes.

c) Apesar de várias vezes interpelados para o efeito, os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) não pagaram o seu débito, nem se mostraram dispostos a fazê-lo.

d) O Exequente/Embargado (J. P.) propôs-se executar os trabalhos de restauro da casa dos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.), dando um orçamento para as obras a executar de € 20.000,00.

e) As obras em causa consistiam em restaurar a casa e garagem, designadamente substituição de tela de cobertura por terraço de cobertura, aplicação de pladur em paredes e tectos, fornecimento de soalho flutuante (aplicação excluída), azulejos e loiças de casa de banho, caixilharias, porta de entrada, caixa do correio, móveis de cozinha e alguns electrodomésticos de cozinha, tudo com materiais de baixa gama de preço.

f) O Exequente/Embargado (J. P.) iniciou as obras no início de 2008 e embolsou aquela quantia de € 20.000,00 paga directamente pelo Banco ..., S.A..

g) Cerca de 6 meses depois do início das obras, o Exequente/Embargado (J. P.) informou que a quantia inicialmente acordada não seria suficiente e que os trabalhos a realizar importariam em valor acrescido que ultrapassaria os € 13.000,00, totalizando assim mais de € 33.000,00.

h) Os cheques referidos no ponto 5 dos factos provados foram subscritos e entregues pelos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) para que o Exequente/Embargado (J. P.) os preenchesse e apresentasse a pagamento à medida que os trabalhos fossem avançando e sob autorização prévia daqueles.

h) Na altura em que o Exequente/Embargado (J. P.) deu o documento aos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) para o assinarem, referiu que iria concluir as obras em curso e que os mesmos lhe pagariam aquele valor à medida que as obras fossem avançando.

i) O Exequente/Embargado (J. P.) convenceu assim os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) que aquele valor só seria devido se, e na medida, em que concluísse as obras em curso.

j) Ainda hoje estão por conclui diversos trabalhos, nomeadamente o restauro da garagem, a colocação de vedantes nas caixilharias, colocação da caixa do correio.

k) O Exequente/Embargado (J. P.) bem sabia que as obras não estavam concluídas, mas ainda assim deixou os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) laborarem em erro e convencerem-se que era isso o plasmado no documento que lhes deu a assinar.

l) O Exequente/Embargado (J. P.) bem sabia que os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) estavam convencidos que o documento que fez expressava o acordado, e nunca os esclareceu do verdadeiro sentido e alcance da declaração, deliberadamente ocultando o erro em que aqueles laboravam.

m) O Exequente/Embargado (J. P.) não concluiu trabalhos correspondentes ao valor da empreitada, designadamente o restauro da garagem, a colocação de vedantes nas caixilharia, colocação da caixa do correio, manípulo da porta de entrada.

n) O Exequente/Embargado (J. P.) nunca negou que não concluiu os serviços e sempre reconheceu os problemas com a obra, sempre se comprometendo a concluir os trabalhos e reparar os problemas de infiltrações surgidos.

o) Não obstante as repetidas promessas de reparação dos defeitos, o Exequente/Embargado (J. P.) nunca concluiu os trabalhos acordados.

p) Não obstante as repetidas promessas de que iria reparar o terraço de cobertura, o Exequente/Embargado (J. P.) nunca executou qualquer reparação.

q) Mercê do referido nos factos não provados anteriores, os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) suspenderam os pagamentos.

r) O Exequente/Embargado (J. P.) tentou ajudar os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) a título meramente altruísta.

s) Os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) eram pessoas de baixos recursos económicos e pediram ajuda ao Exequente/Embargado (J. P.) aquando da aquisição da habitação.

t) Como a casa era da sua cunhada e o Exequente/Embargado (J. P.) conhecia os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.), aceitou ajudá-los, a título altruístico, ou seja, gratuito.

u) A ajuda do Exequente/Embargado (J. P.) consistiu em fazer um levantamento dos trabalhos necessários à requalificação da casa e solicitou aos empreiteiros das várias especialidades que costumam trabalhar com a sua empresa (Construções J. P. & Filhos, Lda.) que fizessem os trabalhos necessários pelo preço mais baixo que conseguissem.

v) Os empreiteiros das várias especialidades que costumam trabalhar com Construções J. P. & Filhos, Lda. aceitaram o pedido do Exequente/Embargado (J. P.), por mera consideração ao mesmo.

w) O Exequente/Embargado (J. P.) não ganhou qualquer quantia sobre os valores apresentados pelos subempreiteiros.

x) No final de Julho de 2008, quando os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) se ausentaram para França, a obra já se encontrava concluída.

y) Por não terem disponibilidade financeira para pagar os trabalhos feitos, os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) pediram ao Exequente/Embargado (J. P.) que adiantasse os valores devidos aos subempreiteiros.

z) Os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) alegaram que com a sua emigração para França iriam conseguir pagar mensalmente alguma quantia ao Exequente/Embargado (J. P.) e rapidamente lhe reembolsariam desses valores, ou seja, €13.614,60.

aa) O Exequente/Embargado (J. P.) aceitou esse pedido até porque não queria qualquer tipo de mal estar com os subempreiteiros, que conhecia bem e com quem trabalhava há anos.
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4.2. Modificabilidade da decisão de facto - Erro de julgamento

4.2.1. Incorrecta apreciação da prova legal
4.2.1.1. Prova livre versus Prova legal - Poder (oficioso) do Tribunal da Relação

Lê-se no art. 607.º, n.º 5, I parte, do CPC que o «juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto».
Contudo, esta «livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes» (II parte, do n.º 5, do art. 607.º do CPC citado).
Distingue-se, assim, entre os casos de: prova legal (vinculada, tabelada ou tarifada), isto é, meios de prova cuja força probatória se impõe ao juiz, não tendo este qualquer margem de valoração acerca da factualidade expressa por tais meios probatórios (6); e prova livre, isto é, meios de prova cujo valor probatório é livremente apreciado pelo juiz (7).
A regra geral será, então, a livre apreciação da prova pelo Tribunal, sem prejuízo dos casos de apreciação vinculada, como acontece com a confissão judicial escrita (art. 358.º, n.º 1 do CC), com a confissão extrajudicial constante de documento dirigida à parte contrária (art. 358.º, n.º 2 do CC), e com certa prova documental (arts. 371.º, n.º 1, 376.º, n.º 1 e 377.º, todos do CC).

Mais se lê, no art. 662.º, n.º 1 do CPC, que a «Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa».
Logo, quando os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas, a dita modificação da matéria de facto - que a ela conduza - constitui um dever do Tribunal de Recurso, e não uma faculdade do mesmo (o que, de algum modo, também já se retiraria do art. 607.º, n.º 4 do CPC, aqui aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2 do mesmo diploma). (8)
Estarão, nomeadamente, aqui em causa, situações de aplicação de regras vinculativas extraídas do direito probatório material (regulado, grosso modo, no CC), onde se inserem as regras relativas ao ónus de prova, à admissibilidade dos meios de prova, e à força probatória de cada um deles, sendo que qualquer um destes aspectos não respeita apenas às provas a produzir em juízo.
Quando tais normas sejam ignoradas (deixadas de aplicar), ou violadas (mal aplicadas), pelo Tribunal a quo, deverá o Tribunal da Relação, em sede de recurso, sanar esse vício; e de forma oficiosa. Será, nomeadamente, o caso em que, para prova de determinado facto tenha sido apresentado documento autêntico - com força probatória plena - cuja falsidade não tenha sido suscitada (arts. 371.º, n.º 1 e 376.º, n.º 1, ambos do CPC), ou quando exista acordo das partes (art. 574.º, n.º 2 do CPC), ou quando tenha ocorrido confissão relevante cuja força vinculada tenha sido desrespeitada (art. 358.º do CC, e arts. 484.º, n.º 1 e 463.º, ambos do CPC), ou quando tenha sido considerado provado certo facto com base em meio de prova legalmente insuficiente (vg. presunção judicial ou depoimentos de testemunhas, nos termos dos arts. 351.º e 393.º, ambos do CC).
Ao fazê-lo, tanto poderá afirmar novos factos, como desconsiderar outros (que antes tinham sido afirmados).
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4.2.1.2. Confissão

4.2.1.2.1. Lê-se no art. 352.º do CC, que confissão «é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária».

A confissão é tida como «uma declaração representativa (sobre a realidade dum facto)» (José Lebre de Freitas, A Confissão no Direito Probatório, Coimbra Editora, 1991, pág. 472). Consubstancia, assim, um acto jurídico (uma declaração de ciência), que a lei sujeita a um regime próprio (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Limitada, pág. 313).
Mais se lê, no art. 355.º, n.º 1, n.º 2 e n.º 4 do CC, que, podendo a confissão ser judicial ou extrajudicial, a primeira será a realizada em juízo, e a segundo será realizada por algum modo diferente daquela.
Lê-se ainda no art. 358.º, n.º 2 do CC que a «confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária ou a quem a represente, tem força probatória plena».
Logo, o beneficiário da declaração confessória é dispensado de provar a veracidade do seu conteúdo e, concretamente, de demonstrar, por outras vias, a efectivação do cumprimento, como forma de extinção da obrigação relativa à contrapartida que sobre si impendia (9).

Ora, lê-se no art. 347.º do CC que a «prova legal plena só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objecto, sem prejuízo de outras restrições especialmente determinadas na lei» (10).
Logo, a prova (legal) plena apenas cede mediante a prova do contrário (a demonstração de que certo facto não existe, de que não é verdadeiro). Será, por exemplo, o caso do art. 350.º, n.º 2 do CC, relativo às presunções legais ilidíveis, ou dos arts. 371.º e 372.º , ambos do CC, relativos aos documentos autênticos.
Contudo, precisa-se no art. 393.º, n.º 2 do CC que «quando o facto estiver plenamente provado por documento, ou por outro meio com força probatória plena», «não é admitida prova por testemunhas».
Precisa-se, porém e de novo, que, de acordo com «a utilização da forma verbal “estiver”, (…) que depois de estar definitivamente assente a prova plena, por preclusão do direito de a contrariar ou por improcedência da alegação contrária (vise esta, no caso dos documentos, estabelecer a sua não genuinidade ou a sua falsidade), é que não mais é admissível a prova em contrário daquela. (…) O art. 393º do C. Civil (…), contendo uma norma de prova legal negativa, é um mero reflexo das normas de prova legal positiva acima referidas (…): imposto como possível um único meio de prova, estão excluídos todos os outros (nº 1); imposta uma decisão, está negado valor aos meios de prova que a decisão diferente poderiam conduzir (nº 2)» (José Lebre de Freitas, A Falsidade no Direito Probatório, Almedina, 1984. págs. 182-3, nota 36, com bold apócrifo).
Logo, se num documento particular a parte a quem é imputada a sua letra e assinatura as reconhece como suas, verá plenamente provadas as declarações ali produzidas por si (arts. 374.º, n.º 1 e 376.º, n.º 1, ambos do CC), apenas podendo demonstrar a respectiva falsidade por meio de confissão da parte de que delas se pretende aproveitar (sendo a confissão precisamente «o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária», nos termos do art. 352º do C.C.), ou por meio de um documento idóneo a produzir esse efeito; mas nunca por prova testemunhal.
Do mesmo exacto modo se terá de entender (e decidir) quanto à confissão extrajudicial constante de documento cuja autoria esteja reconhecida, e que tenha sido feito à parte contrária ou a quem a represente, já que - nos termos do art. 358.º, n.º 2 do CC - goza de força probatória plena (assim se contendo na parte final do n.º 2 do art. 393.º do CC, isto é, facto plenamente provado «por outro meio com força probatória plena»).
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4.2.1.2.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)

Concretizando, verifica-se que, tendo o Exequente/Embargado (J. P.) alegado no seu requerimento executivo dedicar-se à construção e reparação de edifícios, tendo no seio da sua actividade comercial efectuado, a pedido e sob encomenda dos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) obras de reparação na moradia de que os mesmos são proprietárias, daí resultando um crédito seu sobre eles de € 13.614,60, conforme aqueles o reconheceram expressamente no titulo executivo («a presente dívida é proveniente de trabalhos realizados na moradia de que sou proprietário»), vieram depois os Executados/Embargantes, no seu requerimento inicial de oposição, expressamente confirmar esta concreta alegação (reclamada fonte da obrigação exequenda e, por isso, factos cuja prova necessariamente lhes era desfavorável).
Com efeito, ao longo do seu articulado afirmaram que o Exequente/Embargado (J. P.) se propôs executar tais obras, que lhes apresentou um orçamento para o efeito, que as iniciou, que depois os informou ser o orçamento inicial insuficiente, que não as concluiu e que realizou outras com defeitos, que nunca reparou, não obstante as reiteradas promessas que lhes fez para o efeito; e que, mercê desse seu incumprimento, vieram eles próprios a cessar os pagamentos a que se haviam obrigado (precisamente, pela subscrição da declaração de dívida consubstanciada no título executivo).
Ora, tendo ocorrido a dita confissão dos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.), ficaram os factos dela objecto definitivamente assentes (conforme arts. 355.º, n.º 1 e n.º 2, 356.º, n.º 1 e 358.º. n.º 1, todos do CC); e, com eles, a efectiva e definitiva existência da relação fundamental da obrigação exequenda, insusceptível de posterior alteração nos autos (nomeadamente, mercê do alegado unilateralmente na resposta à oposição, articulado inidóneo para a alteração do requerimento executivo).
Assiste, assim, razão ao Exequente/Embargado (J. P.), na impugnação que fez dos factos não provados enunciados na sentença recorrida sob a alínea a) («O Exequente dedica-se à construção e reparação de edifícios») e sob a alínea b) («Mo seio da sua actividade comercial, o Exequente efectuou a pedido e sob encomenda dos Executados obras de reparação na moradia destes»), que por isso deverão passar a integrar o elenco dos factos provados.
Já relativamente à impugnação que igualmente fez dos factos provados na sentença recorrida sob o número 11 («O Exequente/Embargado não trabalha na construção civil a título pessoal, por conta própria») e sob o número 17 («O Exequente/Embargado não efectuou, a pedido e sob encomenda dos Executados/Embargantes, obras de reparação na moradia destes»), deverão os mesmos ser puramente e simplesmente eliminados da decisão sobre a matéria de facto, uma vez que: o primeiro é proveniente do articulado de resposta à oposição, excedendo porém o âmbito admissível da mesma (isto é, a resposta às concretas excepções peremptórias deduzidas pelos Executados/Embargantes quanto ao cumprimento da obrigação exequenda), nomeadamente sendo inidóneo para a eventual alteração do requerimento executivo; e o segundo nem mesmo foi alegado por qualquer das partes, uma vez que reproduz, por negação, a alegação positiva da mesma realidade, única e efectivamente feita pelo Exequente/Embargado (J. P.).

Mostra-se, assim, procedente nesta parte o recurso sobre a matéria de facto julgada, apresentado pelo Exequente/Embargado (J. P.).
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4.2.2. Carácter instrumental da impugnação da decisão de facto

4.2.2.1. Tem-se hoje por assente que a impugnação da decisão de facto não se justifica a se, de forma independente e autónoma da decisão de mérito proferida, assumindo antes um carácter instrumental face à mesma.

Com efeito, a «impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, consagrada no artigo 685.º-B [do anterior CPC], visa, em primeira linha, modificar o julgamento feito sobre os factos que se consideram incorrectamente julgados. Mas, este instrumento processual tem por fim último possibilitar alterar a matéria de facto que o tribunal a quo considerou provada, para, face à nova realidade a que por esse caminho se chegou, se possa concluir que afinal existe o direito que foi invocado, ou que não se verifica um outro cuja existência se reconheceu; ou seja, que o enquadramento jurídico dos factos agora tidos por provados conduz a decisão diferente da anteriormente alcançada. O seu efectivo objectivo é conceder à parte uma ferramenta processual que lhe permita modificar a matéria de facto considerada provada ou não provada, de modo a que, por essa via, obtenha um efeito juridicamente útil ou relevante» (Ac. da RC, de 24.04.2012, António Beça Pereira, Processo n.º 219/10.6T2VGS.C1, com bold apócrifo).
Logo, por força dos princípios da utilidade, economia e celeridade processual, o Tribunal ad quem não deve reapreciar a matéria de facto «quando o(s) facto(s) concreto(s) objecto da impugnação for insusceptível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente», convertendo-a numa «pura actividade gratuita ou diletante» (conforme Ac. da RC, de 27.05.2014, Moreira do Carmo, Processo n.º 1024/12.0T2AVR.C1).
Por outras palavras, se, «por qualquer motivo, o facto a que se dirige aquela impugnação for, "segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito", irrelevante para a decisão a proferir, então torna-se inútil a actividade de reapreciar o julgamento da matéria de facto, pois, nesse caso, mesmo que, em conformidade com a pretensão do recorrente, se modifique o juízo anteriormente formulado, sempre o facto que agora se considerou provado ou não provado continua a ser juridicamente inócuo ou insuficiente.
Quer isto dizer que não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objecto da impugnação não for susceptível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, antemão, ser inconsequente, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processual consagrados nos artigos 2.º n.º 1, 137.º e 138.º.» (Ac. da RC, de 24.04.2012, António Beça Pereira, Processo n.º 219/10.6T2VGS.C1, com bold apócrifo) (11).
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4.2.2.2. Caso concreto

Concretizando, veio ainda o Exequente/Embargado (J. P.) recorrente impugnar o facto provado enunciado na sentença recorrida sob o número 12 («O Exequente/Embargado é sócio gerente da Construções J. P. & Filhos, Lda., com sede no Largo ..., n.º.., Freguesia de ..., concelho de Esposende»), propondo para o mesmo o aditamento final «a qual se dedica à construção civil»; e os factos não provados aí enunciados sob a alínea c) («Apesar de várias vezes interpelados para o efeito, os Executados/Embargantes não pagaram o seu débito, nem se mostraram dispostos a fazê-lo»), sob a alínea h) («Os cheques referidos no ponto 5 dos factos provados foram subscritos e entregues pelos Executados/Embargantes para que o Exequente/Embargado os preenchesse e apresentasse a pagamento à medida que os trabalhos fossem avançando e sob autorização prévia dos executados»), e sob a alínea q) («Mercê do referido nos factos não provados anteriores, os Executados/Embargantes suspenderam os pagamentos»).

Contudo, e salvo o devido respeito por opinião contrária, tais factos mostram-se juridicamente irrelevantes para a decisão da causa, segundo qualquer das diversas soluções plausíveis de direito.

Com efeito, estando apenas em causa (tal como alegado no requerimento executivo, e confessado no requerimento de oposição) a actuação do Exequente/Embargado (J. P.) - como autor das obras realizadas na moradia dos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) -, não releva aqui qual o objecto social da empresa de que aquele primeiro é sócio gerente.

Por outro lado, cabendo o ónus da prova do cumprimento da obrigação exequenda aos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.), como facto extintivo da mesma (art. 342.º, n.º 2 do CC) (12), que o não lograram, torna-se desnecessário ao sucesso da pretensão do exequente a prova do seu contrário.
Logo, e por força dos princípios da utilidade, economia e celeridade processual, não deverão tais factos ser aqui apreciados.

Decide-se assim, e sem necessidade de mais alongadas considerações, não se apreciar o remanescente objecto do recurso sobre a matéria de facto.
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V - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

5.1. Erro doloso

5.1.1. Lê-se no art. 251.º do CC, e no que ora nos interessa, que «o erro que atinja os motivos determinantes da vontade, quando se refira (…) ao objecto do negócio, torna este anulável nos termos do art. 247º» do CC.
Admite-se, assim, o «erro», isto é, em tese geral, o desconhecimento ou a falsa representação da realidade (neste caso fáctica) envolvente de uma determinada situação. Logo, a relevância do erro em Direito abrange a própria ignorância da realidade.
Na hipótese referida, está em causa um erro-motivo ou erro-vício, isto é, o declarante quis o que efectivamente declarou (existe aqui conformidade entre a vontade real e a vontade declarada); mas o que declarou só foi querido em virtude de uma representação errónea da realidade (isto é, a vontade real ter-se-á formado em consequência do erro sofrido pelo declarante, falando-se por isso de um erro vício).
Por outras palavras, «há conformidade entre a vontade real e a vontade declarada. Somente, a vontade real formou-se em consequência do erro sofrido pelo declarante. Se não fosse ele [o erro], a pessoa não teria pretendido realizar o negócio, pelo menos nos termos em que o efectuou» (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, Limitada, pág. 235).

O «erro sobre os motivos determinantes da vontade» previsto no n.º 1 do art. 252.º do CC abrange «situações múltiplas, mas entre todas se pode encontrar como factor comum o respeitarem a fins ou móbeis de natureza subjectiva do declarante» (Luís A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, Vol. II, AAFDL, 1983, pág. 288).
«Motivos determinantes são, assim, aquelas motivações concretas e particulares do errante que o levam a celebrar aquele negócio. Se o quisermos, são os elementos presentes na consultatio e sugeridos à electio contratual. Essas motivações são determinantes pelo simples facto que estarem presente naquele juízo intelectual que se debruçou ordine ad ea quae sunt ad finem. De entre essas motivações determinantes, algumas serão essenciais porquanto, sem elas, outra seria a electio contratual; outras, sendo determinantes, não são essenciais» (Diogo Costa Gonçalves, Erro obstáculo e erro vício, AAFDL, 2004, pág. 81, com bold apócrifo).

Lê-se ainda no art. 253.º, n.º 1 do CC que se entende por dolo «qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante».

Logo, «o dolo pressupõe um erro que é induzido ou dissimulado pelo declaratário ou por terceiro. Para que haja dolo são necessários ou seguintes requisitos:

a) Que o declarante esteja em erro;
b) Que o erro tenha sido provocado ou dissimulado pelo declaratário ou por terceiro;
c) Que o declaratário ou terceiro (deceptor) haja recorrido, para o efeito, a qualquer artifício, sugestão ou embuste» (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, Limitada, pág. 237).
Cabem neste dolo quer as condutas positivas ou intencionais (fazendo cair alguém em erro, ou mantê-lo no mesmo), quer omissivas (não esclarecendo alguém que se encontra em erro do mesmo, quando exista o dever de o elucidar).
Contudo, não «constituem dolo ilícito as sugestões ou artifícios usuais, considerados legítimos segundo as concepções dominantes no comércio jurídico, nem a dissimulação do erro, quando nenhum dever de elucidar o declarante resulte da lei, de estipulação negocial ou daquelas concepções» (art. 253.º, n.º 2 do CC).
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5.1.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)

Concretizando, verifica-se que os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) defenderam, no seu requerimento inicial de oposição, ser o título executivo inválido, porque o reconhecimento de dívida por eles aí realizado teria sido determinado por erro doloso provocado pelo Exequente/Embargante (J. P.): só o teriam assinado porque este os convenceu que iria concluir as obras acordadas e em curso, e que o valor de que se confessavam devedores iria sendo pago à medida que as obras avançassem, nada disto tendo porém sucedido.
Contudo, compulsada a sentença recorrida, verifica-se que todos estes factos ficaram por provar; e que nenhuma das partes (nomeadamente, os Executados/Embargantes) os impugnou.

Logo, mostra-se improcedente o primeiro fundamento da oposição à acção executiva, deduzido pelos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.).
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5.2. Excepção de não cumprimento do contrato
5.2.1.1. Em geral

Lê-se no art. 428.º, n.º 1 do CC que, «se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo».
Logo, o funcionamento da exceptio non adimpleti contractus a que se refere este artigo pressupõe a existência de um contrato com prestações correspectivas ou correlativas, isto é, interdependentes, sendo uma o motivo determinante da outra (o que se verifica nos chamados contratos bilaterais ou sinalagmáticos).
Por outras palavras, mercê da sua própria natureza esta excepção é aplicável apenas aos contratos bilaterais com obrigações reciprocamente interligadas por um sinalagma genético-funcional, já que só aí o contraente fiel pode sustar o cumprimento da sua prestação como meio idóneo de coagir a contraparte a cumprir também a sua prestação sinalagmática.
Mas pressupõe igualmente que não estejam fixados prazos diferentes para as prestações, já que, devendo uma delas ser cumprida antes da outra, a exceptio não teria razão de ser.
Contudo, «a fórmula legal “se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimentos das prestações” não é inteiramente rigorosa, pois o que a excepção supõe é que um dos contraentes não esteja obrigado, pela lei ou pelo contrato, a cumprir a sua obrigação antes do outro: se não estiver, pode ele, sendo-lhe exigida a prestação, recusá-la, enquanto não for efectuada a contraprestação ou lhe não for oferecido o cumprimento simultâneo desta. Por conseguinte, a excepção pode ser oposta ainda que haja vencimentos diferentes, dado poder sê-lo pelo contraente cuja prestação deva ser feita depois da do outro contraente, apenas não podendo ser oposta pelo contraente que devia cumprir primeiro» (Vaz Serra, RLJ, 105, pág. 283, com bold apócrifo).
Logo, a excepção peremptória de não cumprimento do contrato é uma excepção de direito material que se destina a permitir que o contraente fiel não cumpra enquanto o contraente faltoso não cumprir também. Não legítima, por isso, o incumprimento definitivo do contrato pelo contraente fiel, mas apenas o cumprimento dilatório do contraente fiel como forma de coagir o contraente faltoso a cumprir também aquilo que tem que cumprir. Pressupõe, por isso, que o cumprimento das obrigações interconexionadas ou seja simultâneo, ou que a obrigação do excipiente deva ser cumprida em último lugar já que então - à data do respectivo adimplemento - ele sabe se a contraparte cumpriu, ou não a prestação, a que está vinculada (Ac. do STJ, de 18.02.2003, Azevedo Ramos, CJ AcSTJ, Ano 2003, Tomo I, págs. 103-106).
Compreende-se, por isso, que se afirme que a «a exceptio não funciona como uma sanção, mas apenas como um processo lógico de assegurar, mediante o cumprimento simultâneo, o equilíbrio em que assenta o esquema do contrato bilateral. Por isso ela vigora, não só quando a outra parte não efectua a sua prestação por que não quer, mas também quando ela a não realiza ou a não oferece porque não pode» (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, Limitada, 4.ª Edição, pág. 406) (13).
Também no caso de incumprimento parcial ou de cumprimento defeituoso é comummente aceite pela doutrina o recurso à exeptio non rite adimpleti contractus: a mesma «vale tanto para o caso de falta integral do cumprimento, como para o cumprimento parcial ou defeituoso, desde que a sua invocação não contrarie o princípio geral da boa fé consagrado nos artigos 227º e 762º, nº 2», ambos do C.C. (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, Limitada, 4.ª Edição, pág. 406).

Com efeito, a doutrina e a jurisprudência têm realçado que, no aferir da legitimidade da invocação da excepção de não cumprimento do contrato, importa ponderar: a regra da boa fé; e a verificação da proporcionalidade (ou do equilíbrio) entre as prestações (14).

É que, por um lado, «seria contrário à boa fé que um dos contraentes recusasse a sua inteira prestação, só porque a do outro enferma de uma falta mínima ou sem suficiente relevo»; e, por outro, «na mesma linha, surge a regra da adequação ou proporcionalidade entre a ofensa do direito do excipiente e o exercício da excepção. Uma prestação significativamente incompleta ou viciada justifica que o outro obrigado reduza a contraprestação a que se acha adstrito. Mas, em tal caso, só é razoável que recuse quando se torne necessário para garantir o seu direito» (Mário Júlio de Almeida Costa, «Anotação ao Ac, do STJ, de 11.11.1984», RLJ, nº 119, 1986/1987, pág. 144).
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5.2.1.2. Em particular - Contrato de empreitada

Lê-se no art. 1208.º do CC que o «empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário previsto no contrato».
Quando tal não aconteça, isto é, a obra apresente defeitos, o dono da obra tem direito, nos termos dos arts. 1221.º, 1222.º e 1223.º, todos do CC: a que o empreiteiro os elimine, se o puderem ser; a que o dono da obra proceda a nova construção, se os defeitos não puderem ser eliminados; a que se reduza o preço; a que seja resolvido o contrato, se os defeitos tornaram a obra inadequada ao fim a que se destina; e a ser indemnizado nos termos gerais.
Isto mesmo é reafirmado pelo art. 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril (Venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas), onde se lê que, em «caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato».

Contudo, e além destes direitos, o dono da obra pode ainda excepcionar o incumprimento do empreiteiro para suspender o pagamento da sua prestação principal, de pagamento do preço, nos termos do art. 428.º do CC.
«Necessário é que a obrigação de pagamento de preço não seja de vencimento anterior ao da entrega da obra e que a parte do preço, cujo pagamento se recusa, seja proporcional à desvalorização da obra provocada pela existência do defeito. O primeiro requisito resulta expressamente do disposto no art.º 428.º do C.C., e o segundo requisito é exigido pelos ditames da boa-fé no cumprimento das obrigações (art.º 762.º, n.º 2, do C.C.).
Assim, nos casos em que o preço não tenha que ser integralmente pago em momento anterior ao da entrega da obra, o dono desta pode suspender o pagamento duma parte, proporcional à desvalorização provocada pela existência de defeitos, enquanto estes não tenham sido eliminados, ou não tenha sido realizada nova obra, ou o dono da obra não tenha sido indemnizado dos prejuízos sofridos» (João Cura Mariano, Responsabilidade contratual do empreiteiro pelos defeitos da obra, Almedina, Março, 2004, pág. 125, com bold apócrifo e indicação de jurisprudência conforme) (15).

Contudo, a «exceptio só pode ser oposta após o dono da obra ter denunciado os defeitos defeitos e manifestado a sua opção pelos direitos que prendia exercer, salvo o direito de resolução, cujos efeitos não são compatíveis com aquele meio e dilação de pagamento» (João Cura Mariano, op. cit., pág. 126, com bold apócrifo e indicação de jurisprudência conforme) (16).
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5.2.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)

Concretizando, verifica-se que os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) defenderam, no seu requerimento inicial de oposição, poderem recusar o pagamento da quantia aposta no título executivo, na parte ainda em falta (alegadamente, € 11.364,00, face aos pagamentos parciais já realizados por eles), por o Exequente/Embargado (J. P.) não ter concluído a obra em causa, e tê-la realizado com defeitos.
Verifica-se ainda ter ficado efectivamente provado que este não colocou o móvel e o lavatório de casa de banho a que se obrigara; e que a substituição de telha por terraço com tela e tijoleira (cobertura de parte do primeiro andar) carece de estanquicidade, permitindo a infiltração de água, pelo que o tecto da sala apresenta fissuras e a tinta enegrecida e a descolar.

Contudo, sendo qualquer destes defeitos absolutamente visíveis a olho nu, teriam os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) que os ter denunciado desde que a obra lhes foi entregue e deles se aperceberam, isto é (e segundo a sua própria alegação), após Outubro de 2009, quando cessaram os pagamentos parcelares a que se tinham obrigado para com o Exequente/Embargado, (J. P.) alegadamente por este preciso motivo.
Sendo consumidores, dispunham para dita denúncia do prazo de um ano previsto no art. 5.º-A, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril (de forma idêntica ao disposto no art. 1225.º, n.º 2 do CC); e após essa denúncia, e a inércia do Exequente/Embargado (J. P.), teriam de ter exercido judicialmente os direitos que lhe assistiam nos três anos subsequentes à primeira, conforme n.º 3 do art. 5.º citado (e não apenas de um ano, previsto no art. 1225.º, n.º 2 e n.º 3 do CC), mas sempre dentro do prazo máximo da garantia legal de cinco anos, subsequentes à entrega da obra, conforme art. 5.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril (de forma idêntica ao disposto no art. 1225.º, n.º 1 do CC).
Ora, e não obstante o tenham alegado, os Executados/Embargantes (M. P. e A. C.) não logram provar a realização da denúncia dos defeitos em causa; e, ainda que o tivessem feito, certo é que não exerceram judicialmente os direitos que, por via dela, lhes assistiriam, uma vez que apenas os excepcionaram em sede de requerimento de oposição à acção executiva que lhes foi movida em Junho de 2015.
Tendo os respectivos direitos (nomeadamente, à eliminação dos defeitos, ou à redução proporcional da desvalorização que importaram para a obra) caducado, já não podem fundamentar a invocação da excepção de não cumprimento do contrato de empreitada, face ao respectivo empreiteiro.

Logo, mostra-se improcedente o segundo fundamento da oposição à acção executiva, deduzido pelos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.).
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5.3. Juros moratórios

5.3.1. Lê-se art. 310.º, al. d), do CC que prescrevem «no prazo de cinco anos os juros convencionais ou legais, ainda que ilíquidos».

Consagra-se aqui um caso de prescrição negativa ou extintiva, isto é, aquela que impõe a extinção dos direitos subjectivos não exercitados durante o lapso de tempo fixado na lei para o efeito, já que, pelo facto de não ter pedido o cumprimento de uma obrigação, o credor perde definitivamente o direito respectivo.

Mais se lê, no art. 1.º Portaria n.º 291/2003,de 8 de Abril que a «taxa anual dos juros legais e dos estipulados sem determinação de taxa ou quantitativo é fixada em 4%».
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5.3.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)

Concretizando, verifica-se que, estando em causa nos autos uma empreitada de bens de consumo (conforme alegado pelo Exequente/Embargado, e confessado pelos Executados/Embargantes), e constando do título executivo que a obrigação exequenda - pagamento da quantia de € 13.614,60 - deveria ocorrer até 31 de Dezembro de 2009, não o tendo sido incorreram os respectivos devedores em mora.
Os juros devidos terão de ser calculados à taxa legal de 4% ao ano, e não - como incorrectamente o fez o Exequente/Embargado - às sucessivas taxas de juros aplicáveis aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, uma vez que não se está perante uma transacção comercial.
Mais se verifica que, sendo os ditos juros devidos desde 1 de Janeiro de 2010, e tendo a acção executiva sido proposta em Junho de 2015, só podem ser exigidos por ela os juros de mora reportados aos últimos cinco anos anteriores à data da sua entrada em juízo, por os demais se encontrarem prescritos.

Logo, mostra-se procedente o terceiro fundamento da oposição à acção executiva, deduzido pelos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.).
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VI – DECISÃO

Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente improcedente, e parcialmente procedente, o recurso de apelação interposto pelo Embargado/Executado (J. P.), e, em consequência, em:

· Declarar parcialmente nula a sentença recorrida, por excesso de pronúncia, conhecendo porém do demais objecto da apelação, por os autos reunirem já os elementos necessários para o efeito;
· Alterar a matéria de facto julgada, eliminando os factos provados enunciados na sentença recorrida sob os números 11 e 17, e passando os factos antes aí não provados sob as alíneas a) e b) para o elenco dos factos provados, com a mesma exacta redacção;
· Declarar que os juros de mora devidos mercê do título executivo dos autos principais deverão ser calculados à taxa supletiva legal, actualmente de 4% ao ano, encontrando-se prescritos os anteriores aos últimos cinco anos que precederam a data da entrada em juízo dos mesmos autos;
· Julgar no demais improcedente a oposição deduzida, prosseguindo em conformidade a acção executiva.
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Custas da apelação pelo Exequente/Embargado (J. P.) e pelos Executados/Embargantes (M. P. e A. C.), na proporção dos respectivos decaimentos (art. 527.º, n.º 1, do CPC).
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Guimarães, 23 de Abril de 2020 (tramitação suspensa de 09.03.2020 a 07.04.2020, por força do art. 7.º, n.º 1 e n.º 5, al. b), da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, incluindo as alterações introduzidas pela Lei n.º 4-A, de 06 de Abril; de 05.04.2020 a 13.04.2020, inclusive, férias judiciais de Páscoa, sendo a sessão de 23 de Abril a primeira realizada após as mesmas).

O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos

Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos;
1.º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias;
2.º Adjunto - António José Saúde Barroca Penha.



1. Por todos, José Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, págs. 703 e 704, e A Acção declarativa Comum à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª edição, Coimbra Editora, Setembro de 2013, pág. 332.
2. No mesmo sentido, Ac. da RC, de 11.01.1994, Cardoso Albuquerque, BMJ, n.º 433, pág. 633, onde se lê que «entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica pelo que se, na fundamentação da sentença, o julgador segue determinada linha de raciocínio apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decide em sentido divergente, ocorre tal oposição». Ainda, Ac. do STJ, de 13.02.1997, Nascimento Costa, BMJ, n.º 464, pág. 524, e Ac. do STJ, de 22.06.1999, Ferreira Ramos, CJ, 1999, Tomo II, pág. 160.
3. Neste sentido, com maiores desenvolvimentos, Ac. do STJ, de 02.07.2015, Ana Luísa Geraldes, Processo n.º 5024/12.2TTLSB.L1-S1.
4. Neste sentido, Ac. do STJ, de 07.07.1994, Miranda Gusmão, BMJ, n.º 439, pág. 526, Ac. do STJ, de 22.06.1999, Ferreira Ramos, CJ, 1999, Tomo II, pág. 161, Ac. da RL, de 10.02.2004, Ana Grácio, CJ, 2004, Tomo I, pág. 105, e Ac. da RL, de 04.10.2007, Fernanda Isabel Pereira.
5. No mesmo sentido, Jacinto Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, Volume III, 3.ª edição, Lisboa 2001, pág. 180, onde se lê que «devem arredar-se os “argumentos” ou “raciocínios” expostos na defesa da tese de cada uma das partes, que podendo constituir “questões”, em sentido lógico ou científico, não integram matéria decisória para o juiz».
6. É o que sucede, em geral, na prova por documentos autênticos (art. 371.º, n.º 1 do CC), autenticados (art. 377.º do CC) e particulares (art. 376.º, n.º 1 do CC), por confissão (art. 358.º do CC), ou por acordo das partes (art. 574.º, n.º 2 do CPC).
7. É o que sucede na prova pericial (art. 389.º do CC e art. 489.º do CPC), na prova por inspecção judicial (art. 391.º do CC), na prova por verificação não judicial qualificada (art. 494.º, n.º 3 do CPC), na prova testemunhal (art. 396.º do CC), e na prova por depoimento/declarações de parte (arts. 463.º a 466.º, n.º 3 do CPC).
8. Defendendo este poder oficioso do Tribunal de Recurso, António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, Julho de 2013, págs. 225 e 226.
9. Neste sentido, Ac. STJ de 17.12.2015, Abrantes Geraldes, Processo n.º 940/10.9TVPRT.P1.S1.
10. No restrito âmbito da prova legal, e para além da prova plena, existem ainda outros dois e diferentes graus de prova (em função das condições em que será possível por em causa a prova que resulte de tais meios vinculados), nomeadamente: a prova bastante, que cede mediante a mera contraprova, que tem por fim tornar incerto o facto (art. 346º do CC), como será o caso do art. 374.º do CC, em que o valor probatório da letra e assinatura de documento pode ser posto em causa por simples impugnação da parte contrária; e a prova pleníssima, que nem mesmo cede perante a prova do contrário.
11. No mesmo sentido, Ac. da RC, de 14.01.2014, Henrique Antunes, Processo n.º 6628/10.3TBLRA.C1, onde se lê que, de «harmonia com o princípio da utilidade a que estão submetidos todos os actos processuais, o exercício dos poderes de controlo da Relação sobre a decisão da matéria de facto da 1ª instância só se justifica se recair sobre factos com interesse para a decisão da causa (artº 137 do CPC de 1961, e 130 do NCPC)», pelo que se «o facto ou factos cujo julgamento é impugnado não forem relevantes para nenhuma das soluções plausíveis de direito da causa é de todo inútil a reponderação da decisão correspondente da 1ª instância»; e isso «sucederá sempre que, mesmo com a substituição, a solução o enquadramento jurídico do objecto da causa permanecer inalterado, porque, por exemplo, mesmo com a modificação, a factualidade assente continua a ser insuficiente ou é inidónea para produzir o efeito jurídico visado pelo autor, com a acção, ou pelo réu, com a contestação».
12. Nas obrigações de dar e/ou de fazer (que se mantêm inalteráveis, no caso de não serem cumpridas), o credor só precisa de provar que a obrigação nasceu e está vencida - o que aqui se presume, mercê do título executivo -, incumbindo ao devedor provar a realização da respectiva prestação, ou que o não fez por causa legítima (conforme art. 342.º, n.º 1 e n.º 2 do CC. No mesmo sentido, Ac. do STJ, de 31.01.2007, João Camilo, onde se lê que o ónus da prova do cumprimento de uma obrigação onera o respectivo devedor. «As leis partem, neste ponto, de uma justificada presunção de experiência. Se o autor, alegando e provando a constituição do seu crédito (mediante a alegação e a prova dos factos dondo brotou o direito), vem a juízo exigir a condenação do titular do dever correspondente, é porque, normalmente, com extrema probabilidade, o direito se manteve e o demandado não cumpriu. Se, excepcionalmente, assim não sucede, justo é que, provada pelo autor a constituição do direito, sejam o réu quem deva alegar e provar a existência dos factos que integram a norma conducente à inexistência ou extinção do direito» (Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª ed., Coimbra Editora, Limitada, pág. 453, nota 2).
13. No mesmo sentido, João José Abrantes, A excepção de não cumprimento do contrato no Direito Civil, onde a pág. 88 se lê que «a excepção do contrato não cumprido não pressupõe a culpa do devedor da contraprestação no seu atraso. A inexecução por parte deste pode ser-lhe imputável ou não, isto é, tanto pode ele constituir-se em mora como não. Ainda que o incumprimento não lhe seja imputável, antes obedeça a circunstâncias fortuitas, independentes da vontade, a excepção é invocável pelo outro contraente».
14. Neste sentido, e em sede de contrato de arrendamento urbano, face ao incumprimento da obrigação do senhorio de proporcionar o gozo da coisa e à dedução da excepção para não pagamento da renda devida pelo arrendatário, Ac. do STJ, de 09.12.2008, Nuno Cameira, Processo n.º 08A965.
15. Em jurisprudência posterior à aí citada - relativa à necessária proporcionalidade da invocação da excepção em sede de contrato de empreitada -, Ac. do STJ, de 22.01.2013, Granja da Fonseca, Processo n.º 4871/07.1TBBRG.G1.S1.
16. No mesmo sentido, Pedro Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso Em Especial Na Compra E Venda E Na Empreitada, Colecção Teses, Almedina, Coimbra, 1994, págs. 324 a 330, lendo-se nomeadamente a pág. 328 que a «exceptio nom rite adimpleti contractus poderá unicamente ser exercida após o credor ter, não só denunciado os defeitos, como também exigido que os mesmos fossem eliminados, a prestação substituída ou realizada de novo, o preço reduzido, ou ainda o pagamento de uma indemnização por danos circa rem».