Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1182/18.0T8VRL.1.G1
Relator: MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Descritores: DANOS NÃO PATRIMONIAIS
DANOS PATRIMONIAIS FUTUROS
AJUDA DE TERCEIRA PESSOA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/10/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - A Portaria n.º 377/2008 de 26 de Maio, com as alterações que lhe foram sendo introduzidas, não vincula ou limita o Tribunal na fixação dos danos.
II - Respeitante a ajuda doméstica temporária, trata-se de uma ‘tabela indicativa para proposta razoável em caso de despesas incorridas e rendimentos perdidos por incapacidade’, que igualmente não vincula o tribunal, antes representando uma mera indicação para efeito de proposta, entendida como razoável, para um eventual acordo.
III - Na quantificação dos danos não patrimoniais, há que ter sempre em atenção as semelhanças e dissemelhanças das situações factuais de cada caso, na medida em que são geralmente tais elementos que fundamentam as discrepâncias registadas, tendo em conta que a diferença dos factores a ter em consideração varia muito de um caso para o outro.
IV - A indemnização a arbitrar por danos futuros deve partir da esperança média de vida (e não apenas da duração da vida profissional activa do lesado, até este atingir a idade normal da reforma, aos 65 anos), já que a perda de capacidade geral de ganho tem repercussões negativas ao longo de toda a vida do lesado.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I – Relatório

R. F. instaurou incidente de liquidação, contra o Fundo de Garantia Automóvel e A. M., pedindo a liquidação da condenação ilíquida dos R.R., no montante de € 165.210,21, acrescida de juros de mora, contados desde a citação dos R.R. para a acção declarativa, invocando, para tanto ter sido proferida sentença, que condenou os R.R. a pagarem-lhe determinadas quantias ilíquidas, que liquida no valor de € 165.210,21 (descontado o valor que já lhe foi adiantado de € 23.400,00).
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Contestou o R. Fundo de Garantia Automóvel impugnando parte da factualidade invocada pela A.
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Foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual, designadamente, se identificou o objecto do litígio e se enunciou os temas da prova.
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Realizou-se audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou o incidente parcialmente procedente, e, em consequência, liquidou em € 96.650,12 (noventa e seis mil seiscentos e cinquenta euros e doze cêntimos), a quantia que os R.R. estão obrigados a pagar ao A. (ao que há que descontar - como consta da sentença proferida nos autos principais - a quantia que a A. já recebeu do R. FGA no âmbito do apenso A.), por força da condenação ilíquida proferida nos autos principais, acrescido esse montante de juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia de € 96.167,62, contados desde a data da decisão até integral pagamento e, sobre a quantia de € 482,50, contados desde a citação/notificação dos R.R. até integral pagamento, absolvendo os R.R. do demais peticionado.
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II- Objecto do recurso

Não se conformando com a decisão proferida, veio o Fundo de Garantia Automóvel interpor recurso, juntando, para o efeito, as suas alegações, e apresentando, a final, as seguintes conclusões:

1. O Apelante não se conforma com a decisão do Tribunal a quo, quanto às quantias a liquidar ao lesado a título de indemnização, pelos danos não patrimoniais, pelos danos patrimoniais futuros e ainda quanto ao valor fixado para ajuda de terceira pessoa, por serem manifestamente exagerados e desajustados atendendo ao caso concreto.
2. Sempre se dirá que o Tribunal a quo não fez uma correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.
3. No que concerne ao valor da indemnização a liquidar à Requerente, aqui Recorrida, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, decidiu o Tribunal de 1ª instância julgar parcialmente procedente o valor peticionado pela Autora, aqui Recorrida, no valor de € 25.000,00, mas, alvo o devido respeito, que é muito e merecido, o Recorrente FGA não perfilha do mesmo entendimento, por considerar que o valor fixado pelo Tribunal a quo é manifestamente excessivo para o caso concreto.
4. O Apelante não concorda com o valor fixado, por entender ser manifestamente exagerada a indemnização atribuída a título de danos não patrimoniais, que expressamente se impugna, face aos danos dados como provados, aos montantes fixados pela jurisprudência para casos semelhantes e aos atuais usos a nível de indemnizações extrajudiciais.
5. A portaria n.º 679/2009, de 25 de junho, que veio alterar a portaria n.º 377/2008, de 26 de maio, veio estabelecer critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação de proposta razoável para indemnização dos danos sofridos pelos lesados por acidente de automóvel. Sendo certo que esta portaria é apenas aplicável à regularização extrajudicial de sinistro, deverá ser tida em conta como uma referência para a jurisprudência sob pena de os lesados evitarem sempre a resolução extrajudicial e contribuírem para a judicialização de conflitos.
6. Assim, entende o Recorrente que a referida portaria deverá ser utilizada pela jurisprudência como referência, não querendo afirmar que os tribunais devam abdicar do seu poder soberano e a sua liberdade de julgamento, pelo que tais montantes indemnizatórios deverão ser sempre calculados mediante recurso à equidade, como critério aferidor, face ao seu grau de racionalidade, razoabilidade e atualização, na procura de indicadores que permitam tratar o mais igual possível, situações iguais.
7. Mais refere ainda o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26.01.2011 (processo n.º 585/06.8GEGDM.P1), disponível em www.dgsi.pt que: “Quanto muito, esses indexadores valorativos de autocomposição da sinistralidade rodoviária podem servir como patamar mínimo do ressarcimento em caso de heterocomposição de um acidente viação, mas sempre coadjuvado pelos critérios correntes adoptados pela jurisprudência [Ac. STJ de 2009/Nov./05; 2010/Mar./18(9)., que considerou ajustado um acréscimo de 20 % em relação aos valores daquela portaria], e balizados pelos critérios legais da responsabilidade civil.”
8. Assim, o Recorrente FGA entende que é justa e adequada a quantia de € 12.311,32, acrescida de 20% desse valor, a título de majoração, nos termos definidos pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26.01.2011 (processo n.º 585/06.8GEGDM.P1), para indemnização dos danos não patrimoniais sofridos pela Autora, aqui Recorrida, ou seja, deverá ser fixada a quantia de € 14.773,58.
9. Entendeu o Meritíssimo Tribunal a quo arbitrar uma indemnização de € 40.466,82 a título de danos patrimoniais futuros, mas, sempre com o máximo respeito por entendimento diverso, não pode, de forma alguma, o aqui Recorrente, conformar-se com tal decisão, uma vez que, a referida quantia se afigura sobejamente desadequada, por excessiva, face aos critérios legais e jurisprudenciais aplicáveis.
10. A Recorrida auferia um salário líquido de € 554,34, pelo que, pelo período de 8 de maio de 2018 a 01 de janeiro de 2020, deverá ser-lhe liquidada a quantia de € 13.858,5 (25 meses x € 554,34).
11. E no período de 01 de janeiro de 2020 até 01 de agosto de 2023, à quantia de € 27.162,66 (49 meses x € 554,34), deverá ser deduzida a quantia auferida pela Recorrida, no valor de € 516,10, a título de pensão de velhice.
12. Assim sendo, relativamente ao período de 01 de janeiro de 2020 a 01 de agosto de 2023, a Recorrida deverá ser liquidada à Recorrida a quantia de € 1.873,76.
13. Isto posto, coligida a factualidade que resultou provada nos presentes autos, e sempre com o máximo respeito por opinião diversa, o que se verifica é que a quantia que deverá ser fixada a título de indenização pelos danos patrimoniais futuros computa-se no valor global de € 15.732,26.
14. O Recorrente não se conforma com o método utilizado pelo Tribunal a quo para apurar o valor da indemnização a liquidar a título de danos de ajuda de terceira pessoa, na medida em que, o Tribunal a quo se limitou a efetuar a simples média aritmética do número de horas/meses/anos em falta até aos 83,7 anos de esperança de vida.
15. E este valor anual deverá ser multiplicado pelo fator relativo aos 20 anos em falta, previsto no Anexo III (Método de Cálculo do Dano Patrimonial Futuro), da Portaria n.º 377/2008, de 26 de maio, que fixa os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel de proposta razoável para indemnização do dano corporal, que corresponde a 15,398672.
16. Para apurar o valor a fixar a título de indemnização pelo dano não patrimonial devido à Recorrida, teremos de multiplicar a quantia de € 1.416,96, que corresponde ao valor da despesa anula e multiplicar por 15,398672, o que corresponde à quantia final de € 21.819,30.
17. O valor apurado de € 21.819,30, poderá ter, no máximo, um acréscimo de 20%, o que corresponde à quantia final de € 26.183,16, que é o valor justo e equitativo a ser liquidado à Recorrida a título de indemnização pelo dano de ajuda de terceira pessoa.
18. O Tribunal recorrido na douta Sentença proferida, não teve em consideração o circunstancialismo supra descrito, pelo que, com o devido respeito, fez uma incorreta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.
19. Ao julgar de modo diferente daquele que é defendido nestas alegações de recurso, fez o Tribunal recorrido uma menos correta interpretação dos factos e aplicação do direito ao caso concreto, com violação das disposições legais dos artigos 496º nº 3 e 562º e seguintes do Código Civil e as disposições da Portaria nº 679/2009, de 25 de junho e respetivos anexos.
Atento tudo quanto exposto, requer-se a V. Exia. se dignem jugar totalmente procedente o recurso apresentado pelo Apelante, só assim se fazendo a mais sã e elementar JUSTIÇA.
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Recebido o recurso, foram colhidos os vistos legais.
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III - O Direito

Como resulta do disposto nos artos. 608º., nº. 2, ex vi do artº. 663º., nº. 2, 635º., nº. 4, 639º., n.os 1 a 3, 641º., nº. 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem das conclusões que definem, assim, o âmbito e objecto do recurso.
Deste modo, e tendo em consideração as conclusões acima transcritas cumpre apreciar e decidir se os montantes fixados, a liquidar à lesada a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, pelos danos patrimoniais futuros e, por último, quanto ao valor fixado a título de ajuda de terceira pessoa, são ajustados e equilibrados ou, como o entende o R./Recorrente, manifestamente exagerados e desajustados ao caso concreto.
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- Fundamentação de facto

Factos provados

A) No âmbito do processo n º 1182/18.0T8VRL, a que os presentes autos estão apensos, e que foi instaurado pela aqui A. contra os aqui R.R., foi proferida sentença, já transitada em julgado, na qual foram considerados provados os seguintes factos:
1 - A R. Seguradora celebrou com a Cooperativa Agrícola …, CRL, como tomadora de seguro, um contrato de seguro obrigatório automóvel, referente ao veículo de matrícula QS, titulado pela apólice n º ….08, que fora renovado para a anuidade 09-06-2016 a 08-06-2017.
2 - A Cooperativa Agrícola …, CRL, “proprietária” do veículo, doou-o ao R.
3 - A aquisição da propriedade do referido veículo foi registada a favor do R., em 05-09-2016.
4 - No dia 8 de Abril de 2017, pelas 12.30 horas, na Avenida …, na freguesia de ..., na cidade de Chaves, ocorreu um embate, entre, por um lado, o veículo ligeiro de mercadorias, marca Toyota, modelo Hylux, com a matrícula QS, conduzido pelo R. A. M., e, por outro lado, a A.
5 - O veículo circulava na Avenida ..., no sentido descendente.
6 - A A., por sua vez, realizava a travessia dessa Avenida, caminhando sobre a passadeira para atravessamento de peões ali existente, em frente à Junta de Freguesia de ... e, em direção ao estabelecimento comercial “pingo doce”, situado do outro lado da via.
7 - Quando se encontrava sensivelmente a meio da via, sobre a passadeira, foi embatida pelo veículo, que não parou a sua marcha para permitir o atravessamento da via que a A. havia iniciado há algum tempo.
8 - A Avenida ..., no local do sinistro, é composta de uma via de sentido único, descendente, com cerca de 8 metros de largura, por onde seguia o veículo, que após a passadeira, se decompõe em duas vias, com cerca de 4 metros de largura, cada.
9 - O veículo embateu na A., tendo esta sido projetada para a via esquerda da faixa de rodagem, para a hemi-faixa que desce a Avenida ..., onde caiu.
10 - A referida Avenida apresentava pavimento em bom estado.
11 - Não chovia, nem havia neblina ou nevoeiro, havendo boa visibilidade.
12 - Em consequência do embate e queda da A., esta esteve deitada no chão, esperando o transporte para o hospital.
13 - Sofrendo dores, designadamente na testa, costas e pernas, com especial enfoque para a anca da perna direita.
14 - Durante esse período de tempo, deitou sangue da testa.
15 - Esteve angustiada durante esse período de tempo, vendo-se ensanguentada em toda a sua face e com ferimentos.
16 - Temeu ter sofrido lesões graves.
17 - Foi transportada, por ambulância dos Bombeiros, aos Serviços de Urgência do Hospital de Chaves, onde lhe foi diagnosticada fratura do colo do fémur direito e corte na testa, onde ficou com cicatriz de cerca de 2 ou de 7 centímetros.
18 - Em face da fratura do colo do fémur direito, foi objeto de intervenção cirúrgica de osteossíntese, no serviço de ortopedia do Hospital de Chaves, nesse mesmo dia;
19 - Na qual reuniram mecanicamente os fragmentos ósseos da fratura, por intermédio de três parafusos metálicos canelados que ainda hoje é deles portadora, tendo daí resultado uma cicatriz com cerca de 6/7 centímetros;
20 - A A. teve alta 10 dias depois, a 18 de Abril de 2017.
21 - Durante o período em que esteve internada, foi sujeita à ingestão de medicamentos.
22 - Apresentando, em consequência do acidente que lhe provocou a fratura, rigidez dos movimentos da anca e coxa direita, apenas tendo sido autorizada a efetuar pequenos movimentos e gradualmente.
23 - Teve que fazer treino de subir e descer escadas.
24 - Na cama teve que ter os membros inferiores apoiados em almofadas.
25 - Logo após a alta hospitalar, foi forçada a sair de sua casa e a mudar-se para casa de sua irmã, onde ficou os subsequentes cinco meses.
26 - Atos como tomar banho, vestir-se, cortar as unhas, apertar os sapatos, ir à casa de banho fazer as suas necessidades, lavar a cara, os dentes (…) tinham de ser efetuadas por terceiros ou com a ajuda de terceiros, geralmente a sua irmã.
27 - Locomoveu-se acompanhada de duas canadianas, durante os subsequentes quatro meses após a alta hospital, tendo-se libertado de uma delas em Agosto e, continuando a auxiliar a sua marcha com apenas uma, até ao final de Outubro de 2017.
28 - Nessa altura, o simples ir à casa de banho, gerava-lhe dor.
29 - O ato de dormir sempre com almofadas por debaixo dos membros inferiores, tendo que manter a mesma posição, geravam-lhe desconforto e dor, o que ocorreu durante meses.
30 - Desde então, locomove-se ainda com dor, na zona da anca direita.
31 - Socorrendo-se, ainda hoje, da ajuda de uma muleta, em dias em que sente mais dor.
32 - Não se consegue agachar sem dor, nem consegue estar muito tempo de pé, pois fica com dores, tendo que se sentar de imediato.
33 - Não consegue fazer caminhadas, pois fica com dores na zona afetada. 34 - Tem dificuldades em limpar a sua casa.
35 - Tem dificuldades em passar a ferro.
36 - Tem dificuldades em fazer a cama e, em lavar e estender a roupa.
37 - Está-lhe recomendado, medicamente, que não realize esforços.
38 - É expectável a necessidade de ter de realizar nova cirurgia (artroplastia total da anca).
39 - A cicatriz que tem na testa, tem-lhe gerado alguma diminuição da autoestima.
40 - Quando saía à rua, tentava esconder a cicatriz com o seu cabelo, tendo então alguma vergonha de se apresentar em público.
41 - A A. nasceu em - de Agosto de 1953.
42 - Até à data do acidente, era saudável, forte e enérgica.
43 - Agora sente-se angustiada, revoltada e triste, pois vê-se incapacitada, sem poder ter a sua vida normal, sem poder trabalhar, com dores e com necessidade de tomar analgésicos.
44 - As lesões de que padece ao nível da anca são irreversíveis e não melhorarão com o decurso do tempo, ao invés, tendem a agravar-se.
45 - A A. está, desde a data do sinistro, de baixa médica e, sem trabalhar, por imposição médica.
46 - Previamente ao sinistro, trabalhava como auxiliar de armazém, repondo stocks numa superfície grossista, da sociedade X - Mercearias Reunidas de Chaves, Lda;
47 - Onde tinha que fazer esforços, de forma habitual.
48 - Está sem auferir o seu salário, desde a data do sinistro, o qual se cifrava na quantia ilíquida de € 622,85 e líquida de € 554,34.
49 - Foi-lhe atribuído, por parte da Segurança Social, um subsídio de doença.
50 - Porém, no mês de Agosto de 2017, a A. recebeu uma nota de restituição, oriunda da Segurança Social, pedindo-lhe o reembolso dos montantes pagos por referência aos meses de Abril a Julho de 2017, no montante global de € 1.613,28.
51 - Por causa das sequelas que lhe advieram do acidente, a A. carece de ajuda de terceira pessoa, durante 4 horas por semana, para auxílio nas lides domésticas.
52 - Em consequência do sinistro, a A. ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 11 pontos, decorrente das seguintes sequelas: artrose traumática da anca e perturbação persistente do humor.
53 - As sequelas que do acidente advieram à A., são impeditivas do exercício da sua atividade profissional habitual.
54 - A A. sofreu um dano estético permanente de grau 3.
55 - Sofreu e sofre dores;
56 - Sendo o seu quantum doloris de grau 5.
57 - Por causa das lesões sofridas no acidente, a A. necessita, e necessitará, de despender quantias, em medicamentos (medicação analgésica e psiquiátrica), em consultas de psiquiatria e fisioterapia e com a expectável necessidade futura de artroplastia total da anca direita, com inerentes deslocações.
58 - A A. acompanhar-se-á, no futuro, de dores e de dificuldade/limitações de movimentação da perna e da anca.
59 - O R. pagou o prémio de seguro do veículo, referente à anuidade 09-06-2016 a 08-06-2017, por meio de cheque emitido sobre a sua conta bancária, prémio que a R. Seguradora recebeu.
60 - Desde Maio de 2018, a A. recebe a quantia mensal de € 600,00, do Fundo de Garantia Automóvel, em cumprimento da decisão proferida no apenso A.
B) No âmbito do processo n º 1182/18.0T8VRL foi proferida decisão, nomeadamente, nos seguintes termos:
a) Condeno os R.R. Fundo de Garantia Automóvel e A. M., a pagarem à A., solidariamente, a quantia que se vier a liquidar, referente aos danos patrimoniais e não patrimoniais que se provou ter sofrido em consequência do acidente;
b) Condeno os referidos R.R., a pagarem à A., solidariamente, os juros moratórios, incidentes sobre tal quantia, contados desde a citação até trânsito em julgado desta decisão (quanto aos danos que, em sede de liquidação, não sejam objeto de cálculo atualizado por referência à data da decisão de liquidação);
c) Condeno os mesmos R.R., a pagarem à A., solidariamente, a quantia ilíquida correspondente aos montantes que a A. venha a despender em medicamentos (medicação analgésica e psiquiátrica), em consultas de psiquiatria e fisioterapia e com a expectável necessidade futura de artroplastia total da anca direita, e com as inerentes deslocações.
C) O valor hora de um prestador de serviços domésticos é de cerca de € 7,38.
D) A realização de artroplastia da anca à A., foi-lhe orçamentada num valor estimado de € 9.180,00.
E) Em 2020 e 2021, a A. foi a 9 consultas de psiquiatria, nas quais despendeu € 302,50.
F) Cada consulta importa no montante de € 70,00, se o utente não beneficiar de seguro de saúde.
G) A A. deslocou-se às consultas referidas em E), de Chaves a Vila Real, despendendo cerca de € 20,00 com cada deslocação.
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Factos não provados

1 - A A. carece de 3 consultas anuais, da especialidade de psiquiatria e fisioterapia.
2 - Em medicação analgésica e psiquiátrica a A. despende € 100,00 anuais.
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- Fundamentação jurídica

O R./Recorrente fundamenta a sua discordância relativamente ao decidido quanto aos montantes fixados a liquidar à lesada a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, pelos danos patrimoniais futuros e, por último, quanto ao valor fixado a título de ajuda de terceira pessoa, por os considerar manifestamente exagerados e desajustados ao caso concreto.
Assim, por essa mesma ordem, nos iremos pronunciar.

Quantos aos danos não patrimoniais.

Fixou-os o tribunal a quo em €25.000,00, pretendendo a recorrente que sejam reduzidos a €14.773,58, tendo por referência, em primeira linha, a portaria de 679/2009, de 25/6, com um acréscimo de 20% sobre o valor apontado de €12.311,32, a título de majoração nos mesmos termos que foram definidos no proc. 585/06.8GEGDM.P1 pelo Tribunal da Relação do Porto.
Ora, os danos não patrimoniais reportam-se a prejuízos insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens que não integram o património do lesado, que apenas podem ser compensados por via de uma satisfação mais do que uma indemnização, sem cunho ou feição reparatória.
Entre os danos merecedores da tutela do direito inclui-se necessariamente o dano corporal em sentido restrito, caracterizado como o prejuízo de natureza não patrimonial que recai na esfera do próprio corpo, dano à integridade física e psíquica: as dores físicas, ‘o pretium ou quantum doloris’ possíveis de verificar através da extensão e gravidade das lesões e complexidade do seu tratamento clínico; e morais, traduzidas pelas aflições, desgostos, angústias e inquietações.
Contudo, a natureza destes danos impõe que, a seu respeito, não se fale de indemnização, mas apenas de compensação, através da qual se proporcionará ao lesado meios que lhe permitam usufruir momentos de prazer e alegria que, tanto quanto possível, contrabalancem o dano sofrido.
Segundo Prof. Mota Pinto, in “Teoria Geral do Direito Civil”, pág. 86, sempre que se trate de compensar a dor física ou a angústia moral, sofrida pelo lesado, atender-se-á ao critério pelo qual a quantia em dinheiro há-de permitir alcançar situações ou momentos de prazer bastantes para neutralizar, na medida do possível, a intensidade dessa respectiva dor, sem descurar que a obrigação de ressarcir os danos morais tem mais uma natureza compensatória do que indemnizatória.
Sob esta perspectiva, importa, face ao critério que o recorrente entende ser de atender, ter em conta que a Portaria n.º 377/2008 de 26 de Maio (com as alterações que lhe foram sendo introduzidas, designadamente pela Portaria n.º 679/2009 de 25 de Junho) não vincula ou limita o Tribunal na fixação dos danos com recurso à equidade, a que se refere o n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil.
Aliás, o n.º 1 do artigo 1.º da referida Portaria esclarece que através da mesma se fixam “os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel de proposta razoável” pelo Segurador e o n.º 2 do artigo 1.º determina, inclusive, que “as disposições constantes da presente portaria não afastam (…) a fixação de valores superiores aos propostos”.
Assim, na quantificação dos danos não patrimoniais, há que ter sempre em atenção as semelhanças e dissemelhanças das situações factuais de cada caso, na medida em que são geralmente tais elementos que fundamentam as discrepâncias registadas, tendo em conta que a diferença dos factores a ter em consideração varia muito de um caso para o outro.
Importa, por outro lado, ter sempre presente também que, quando se trata de formular juízos equitativos, há sempre uma margem de discricionariedade, apesar da preocupação de observância do princípio da igualdade e da uniformização de critérios.
Contudo, como tem decidido pacificamente a nossa Jurisprudência, «não devendo confundir-se a equidade com a pura arbitrariedade ou com a total entrega da solução a critérios assentes em puro subjectivismo do julgador, deve a mesma traduzir a “justiça do caso concreto, flexível, humana, independente de critérios normativos fixados na lei”, devendo o julgador ter em conta as regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida» (Acs. do STJ de 10-02-2008 in CJ/STJ, t. 1, pg. 65 e de 23.10. 2008 (Relator, Cons. Serra Baptista, P.º 08B2318 in www.dgsi.pt).
Por outro lado, tal como é também orientação da jurisprudência, tal compensação não pode ser simbólica nem miserabilista, devendo, antes, ser significativa, mas não exorbitante nem excessiva.
Considerando todos estes factores, importa em particular atentar no facto da A., em consequência do embate e queda, ter ficado deitada no chão, esperando o transporte para o hospital, sofrendo, durante todos esse período de tempo, dores, designadamente na testa, costas e pernas, com especial enfoque para a anca da perna direita, deitando sangue da testa e sofrendo angústia ao ver-se ensanguentada em toda a sua face e com ferimentos, temendo ter sofrido lesões graves.
Tendo-lhe sido diagnosticada fratura do colo do fémur direito, foi objecto de intervenção cirúrgica de osteossíntese, ficando com três parafusos metálicos canelados e com uma cicatriz com cerca de 6/7 centímetros, bem como uma cicatriz na testa.
Apresenta também rigidez dos movimentos da anca e coxa direita, o que a obrigou a permanecer com os membros inferiores apoiados em almofadas, tendo que manter a mesma posição, o que lhe causou desconforto e dor, durante meses, vendo-se obrigada a sair de sua casa e a mudar-se para casa de sua irmã, onde ficou cinco meses.
Teve de fazer medicação, treino de subir e descer escadas, simples actos como tomar banho, vestir-se, cortar as unhas, apertar os sapatos, ir à casa de banho fazer as suas necessidades, lavar a cara, os dentes tiveram de ser efectuadas por terceiros ou com a ajuda de terceiros.
Mais teve de se locomover acompanhada de duas canadianas, durante os subsequentes quatro meses após a alta hospital, continuando a auxiliar a sua marcha com apenas uma, até ao final de Outubro de 2017.
Nessa altura, o simples ir à casa de banho, gerava-lhe dor, bem como, ainda agora, a sente na zona da anca direita, socorrendo-se, ainda hoje, da ajuda de uma muleta, em dias em que sente mais dor e não se consegue agachar sem dor, nem consegue estar muito tempo de pé, pois fica com dores, tendo que se sentar de imediato.
Igualmente não consegue fazer caminhadas, pois fica com dores na zona afectada, tem dificuldades em limpar a sua casa, em passar a ferro, em fazer a cama e, em lavar e estender a roupa, tendo-lhe sido recomendado, que não realize esforços.
Por outro lado, é expectável a necessidade de ter de realizar nova cirurgia (artroplastia total da anca).
A cicatriz que tem na testa, tem-lhe gerado alguma diminuição da autoestima e quando saí à rua tenta esconder a cicatriz com o seu cabelo, tendo então alguma vergonha de se apresentar em público.
Também se sente angustiada, revoltada e triste, pois vê-se incapacitada, sem poder ter a sua vida normal, sem poder trabalhar, com dores e com necessidade de tomar analgésicos, tendendo as suas lesões a agravarem-se.
Em consequência do sinistro, a A. ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 11 pontos, decorrente de artrose traumática da anca e perturbação persistente do humor, impeditivas do exercício da sua actividade profissional habitual, ficando com um dano estético permanente de grau 3, quantificado tendo sido o seu quantum doloris num grau 5.

Considerando este quadro em concreto, importa efectuar um paralelismo com alguns arestos (todos disponíveis in www.dgsi.pt), em que se fixou os seguintes quantitativos:
- Ac. do STJ de 12/07/2018 (Rosa Tching), Proc. nº1842/15.8T8STR.E1.S1, € 60.000,00 de indemnização a título de danos não patrimoniais - lesado de 45 anos - Quantum Doloris no grau 6/7 - dano estético no grau 3/7 - repercussão permanente nas actividade desportivas e de lazer de 3/7 - repercussão permanente na actividade Sexual no grau 3/7;
- Ac. do STJ de 07/06/2018, Proc. nº418/13.9TVCDV.L1.S1, € 50.000,00 de indemnização a título de danos não patrimoniais - lesado com 30 anos à data do acidente de viação, dores quantificáveis em 4 numa escala de gravidade crescente até 7; dificuldades de ereção no relacionamento sexual; deixou de poder praticar actividades desportivas e de lazer; perdeu um ano escolar e continua a necessitar, pontualmente, de tomar medicação anti-álgica;
- Ac. do STJ de 13/07/2017 (Tomé Gomes), Proc. N.º 3214/11.4TBVIS.C1.S1, € 60.000,00 de indemnização a título de danos não patrimoniais - dano estético de grau 4, numa escala de sete graus de gravidade crescente - prejuízo de afirmação pessoal, no grau 4, numa escala de cinco graus de gravidade crescente - repercussão permanente na actividade sexual fixável no grau 3, numa escala de 7 graus de gravidade crescente - quantum doloris de grau 7, também numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- Ac. do STJ de 16/06/2016 (Tomé Gomes), Proc. nº1364/06.8TBBCL.G1.S2, € 20.000,00 de indemnização a título de danos não patrimoniais - lesada de 39 anos de idade - grau de quantum doloris fixado em 4 pontos;
- Ac. do STJ de 07/04/2016 (Maria da Graça Trigo), Proc. nº237/13.2TCGMR.G1.S1, € 50.000,00 de indemnização a título de danos não patrimoniais - lesada de 22 anos de idade - quantum doloris foi fixado em 4 - dano estético fixado em 3 - repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer de 1;
- Ac. da RG de 13/07/2021 (Ana Cristina Duarte), Proc. nº1880/17.6T8VRL.G1, € 20.000,00 de indemnização a título de danos não patrimoniais - lesada de 34 anos de idade, défice funcional permanente de 3 pontos, quantum doloris de grau 4;
- Ac. da RG de 18/06/2020 (Rosália Cunha), Proc. nº5334/17.2T8GMR.G1, € 25.000,00 de indemnização a título de danos não patrimoniais - lesada com 32 anos - quantum doloris de 5; e
-Ac. da RG de 21-10-2021 (Pedro Maurício), Proc. 5405/19.0T8GMR.G1 – € 22.000,00 de indemnização a título de danos não patrimoniais DFP de 10 pontos, 21 anos de idade - dano estético permanente de grau 3 - repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer de grau 2 - quantum doloris de grau 4.
Nestas circunstâncias, sopesando todos referidos elementos, e ainda que a Autora não contribuiu com qualquer grau de culpa para o acidente, e também os valores comummente atribuídos na jurisprudência para casos susceptíveis de comparação afigura-se-nos ser de manter o montante indemnizatório fixado na sentença recorrida.
Quanto à indemnização a título de danos patrimoniais futuros entende a Ré/Recorrente que, no período de 1.1.20 a 1.8.23, à quantia de €27.162,66 (correspondente a 49mesesx€554,34), deverá ser deduzida a quantia auferida pela A./Recorrida, nesse período, a título de pensão de velhice, pelo que devido seria apenas o valor de €1.873,76 que, somado ao de €13.858,50, perfaria o valor global de €15.732,26.
Vejamos.
Actualmente, no que se refere à Incapacidade Permanente Geral (IPG), este dano é hoje qualificado como «dano biológico», «dano corporal» ou «dano à integridade psico-física» e vem sendo entendido como dano-evento, reportado a toda a violação da integridade físico-psíquica da pessoa com tradução médico-legal, ou como diminuição somático-psíquica e funcional do lesado, com repercussão na sua vida pessoal e profissional, independentemente de dele decorrer ou não perda ou diminuição de proventos laborais (cfr. acórdãos do STJ de 20/05/2010, de 23/11/2010 e de 26/01/2012, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
A tutela deste dano encontra o seu substrato último, no âmbito do direito civil, no art. 25.º n.º 1 da CRP, que considera inviolável a integridade física das pessoas, e no art. 70,º n,º 1 do CCivil, que protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral, atendendo ao corpo humano, na sua amplitude física e moral, integrando a sua constituição físico-somática, a componente psíquica e as relações fisiológicas, como um bem jurídico protegido perante terceiros.
Daí que “o responsável pelo dano biológico, porque incidente sobre o valor humano, em toda a sua dimensão, em que o bem saúde é objecto de um autónomo direito básico absoluto, deve repará-lo, em qualquer caso, mesmo que se prove que a vítima não desenvolvia qualquer actividade produtora de rendimento” (Ac. do STJ de 23/11/2010, que cita o acórdão do STJ de Itália, n.º 7101, de 6/7/1990, publicado na “Rivista de Giurisprudenza in Tema di Circolazione e Transporto”, 1991, pg. 644; bem como, nesse mesmo sentido, o estudo de José Borges Pinto, intitulado “Notas sobre o Dano Corporal e a Perícia Médico-Legal”, de Fevereiro de 2007, disponível em Compilações Doutrinais, no site da Verbo Jurídico).
Assim, mesmo que a afectação da pessoa do ponto de vista funcional não se traduza em perda efectiva do rendimento do trabalho, releva o designado dano biológico, determinante de consequências negativas a nível da actividade geral do lesado, decorrente da afectação funcional que a incapacidade sempre lhe trará (Ac. STJ de 23.11.2006 disponível em www.dgsi.pt e Ac. STJ de 12.10.2006, Revista n.º2461/06 – 2.ª Secção).
Sendo o dano patrimonial o reflexo do dano real sobre a situação patrimonial do lesado, pelo que se encara a integridade física e a saúde como um bem patrimonial humano valorizável – correspondente à sua capacidade física e intelectual de gerar riqueza ou outros bens com significado patrimonial. Mesmo que essa potencialidade não seja utilizada, ou não o seja na sua totalidade, ela pertence ao indivíduo como bem único que só ele pode alienar.
Acontece que, sobre a determinação do montante da indemnização, a lei civil não prevê uma fórmula rigorosa para calcular o montante da indemnização – dizendo simplesmente que a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo Tribunal (a do encerramento da discussão da causa, em 1ª instância) e a que teria nessa data se não existissem danos (teoria da diferença, consagrada no n.º 2 do mesmo art.º 566.º).
E ante o esforço da doutrina e da jurisprudência no sentido de a encontrar, mas sempre através de fórmulas que têm variado no tempo, mesmo com resultados algo divergentes, a jurisprudência tem-se inclinado para a utilização de tabelas financeiras e fórmulas matemáticas, como base de cálculo, embora sempre com a prevenção do carácter meramente auxiliar de tal método de cálculo, bem como de qualquer outro que seja a expressão de um critério abstracto.
Porém, e como vem sendo uniformemente reconhecido, o valor estático alcançado através da automática aplicação de uma tabela «objectiva» - e que apenas permitirá alcançar um «minus» indemnizatório - terá de ser temperado através do recurso à equidade – que naturalmente desempenha um papel corrector e de adequação do montante indemnizatório às circunstâncias específicas do caso, permitindo ainda a ponderação de variantes dinâmicas que escapam, em absoluto, ao referido cálculo objectivo, como sejam, a evolução provável na situação profissional do lesado, o aumento previsível da produtividade e do rendimento disponível, a melhoria expectável das condições de vida, a inflação provável ao longo do extensíssimo período temporal a que se reporta o cômputo da indemnização e que, ao menos em parte, poderão ser mitigadas ou compensadas pelo «benefício da antecipação», decorrente do imediato recebimento e disponibilidade de valores pecuniários que normalmente apenas seriam recebidos faseadamente ao longo de anos, com a consequente possibilidade de rentabilização em termos financeiros.

No caso vertente, o tribunal a quo entendeu ser de atribuir uma indemnização que visasse ressarcir os danos futuros, através de uma quantia em dinheiro susceptível de produzir o rendimento mensal fixo perdido, considerando a idade de 70 anos até à qual é normal que alguém se mantenha laboralmente activo, ainda que possa reformar-se antes dessa idade.
Assim, para o efeito de determinação da indemnização desse dano, tendo-se tido em conta, para além do mais, esse factor, bem como o facto da A. ter ficado numa situação de incapacidade para o exercício de qualquer actividade profissional, pese embora lhe tenha sido atribuído um déficie funcional permanente da integridade físico-psíquica de 11 pontos, consideramos que o montante de indemnização fixado a esse título (ou seja,€40.466,82), se mostra ajustado, equilibrado e capaz de compensar a A., dentro do que é possível, das perdas e dificuldades inerentes à afectação que passou a sofrer em consequência do acidente.
Acresce que, para além do mais, importa atentar nos factos provados e no que tem sido o entendimento habitual na jurisprudência quanto ao momento temporal final para o cálculo do valor indemnizatório que sempre imporiam o mesmo resultado.
É que, constitui entendimento jurisprudencial reiterado que a indemnização a arbitrar por tais danos futuros deve partir da esperança média de vida (e não apenas da duração da vida profissional activa do lesado, até este atingir a idade normal da reforma, aos 65 anos), já que, como é evidente, “a perda de capacidade geral de ganho tem repercussões negativas ao longo de toda a vida do lesado. Quer porque, prejudicando a sua carreira contributiva, vem a reduzir, ou até a excluir, a pensão de reforma, quer porque sempre condicionará a possibilidade de obtenção de ganhos no exercício de actividades económicas alternativas (isto é, não estritamente profissionais) a realizar para além da idade da reforma” (STJ 01.03.2018, Relatora – Graça Trigo).
Já quanto à questão final, insiste o R./Recorrente na aplicação da tabela e não no simples cálculo aritmético do número de horas a ter em conta anualmente até aos 83,7 anos de esperança de vida.
Acontece que a Portaria n.º 679/2009 de 25 de Junho, no seu anexo V, respeitante a ajuda doméstica temporária, faz referência a uma ‘tabela indicativa para proposta razoável em caso de despesas incorridas e rendimentos perdidos por incapacidade’, que, como se referiu, não vincula o tribunal, antes representando uma mera indicação para efeito de proposta, entendida como razoável, para um eventual acordo.
Não tendo sido esse o caso, importa, no presente caso, atentar-se na concreta e específica situação em que ficou a A.
A este propósito provou-se que, por causa das sequelas que lhe advieram do acidente, a A. carece de ajuda de terceira pessoa, durante 4 horas por semana, para auxílio nas lides domésticas, considerando o valor hora de € 7,38.
Como tal, resultando dos autos que a A. tinha 63 anos e 8 meses à data do sinistro e que a sua esperança média de vida é de 83,7 anos, considerou-se, de forma arredondada, um período de cerca de 20 anos, afigurado como justo e equilibrado, à luz da equidade, em consideração ao facto, por um lado, que o valor hora a cobrar por terceira pessoa tenderá a aumentar com o decorrer dos anos, e, por outro lado, a circunstância da A. receber tudo de uma vez, quando, só terá de ir pagando os serviços em causa fraccionadamente ao longo do tempo.
Neste contexto, igualmente julgamos ser de manter assim o valor indemnizatório em € 30.700,80 fixado pelo tribunal a quo, por equilibrado e justo.
Nestes termos, tem o recurso interposto pela Ré de improceder, mantendo-se, em consequência, a decisão proferida
*
IV – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes da 2.ª secção cível, deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o recurso, mantendo, consequentemente a decisão proferida.
Custas pelo R./Recorrente.
Registe e notifique.
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Guimarães, 10 de Novembro de 2020
(O presente acórdão foi elaborado em processador de texto pela primeira signatária, sem observância do novo acordo autográfico, a não ser nos textos transcritos com adesão ao mesmo, e é assinado electronicamente)