Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1944/15.0T8BCL-A.G1
Relator: ALDA MARTINS
Descritores: EXAME À ESCRITA
SEGUNDA PERÍCIA
INDEFERIMENTO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/19/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
I - Não se afigura pertinente e justificado que se requeira uma 2.ª perícia porque, a olho nu, se entende julgar que os factos se apresentam de certa feição, diferente da que foi considerada na 1.ª perícia, uma vez que o objectivo da prova pericial é precisamente ultrapassar as limitações duma percepção não qualificada técnica e ou cientificamente.

II - Quando muito, se essa percepção se afigurar flagrante e inequívoca, justifica-se a apresentação de reclamação contra o resultado da 1.ª perícia, por aparente obscuridade, a fim de o perito esclarecer melhor a divergência das suas conclusões baseadas em especial conhecimento relativamente à percepção por pessoa que o não tem.

III - Já a realização de 2.ª perícia, visando corrigir a eventual inexactidão dos resultados da 1.ª, exige que se aleguem fundadamente as razões da discordância relativamente ao relatório pericial apresentado, pelo que está pressuposto, por natureza, que sejam razões de carácter técnico ou científico capazes de infirmar ou gerar dúvida séria sobre aquele.
Decisão Texto Integral:
1. Relatório

Nos presentes autos de acção declarativa de condenação, com processo comum, em que é A. A. P. e R. JRS, Lda., foi junto relatório de exame de escrita à assinatura do A., tendo este este apresentado requerimento a requerer 2.ª perícia, alegando que:
«1. O exame ora notificado, às assinaturas apostas nos documentos de fls. 290 a 313 dos autos, que alegadamente pertencem ao autor, não se revela preciso, na medida em que relativamente a determinados caracteres não transparece a semelhança a que o mesmo alude.
2. Efetivamente, comparando os caracteres “a” e “l” dos documentos fidedignos e dos documentos questionados verifica-se que, contrariamente ao que consta do exame, não há nenhuma semelhança.
3. Isto porque, “a olho nu” se verifica que a forma como o carácter “a” está escrito nos documentos fidedignos é diferente da forma como está redigido nos documentos questionados.
4. Sendo que o mesmo sucede com o carácter “l”,
5. Já que nas assinaturas questionadas aquele carácter surge com um traço continuado, isto é, prolonga-se até ao carácter seguinte,
6. O que não sucede com a assinatura fidedigna do autor.
7. Ora, esta discrepância é tal que só se pode concluir por erro na elaboração do exame, justificando-se, por isso, a realização de uma segunda perícia, para correção dos resultados do exame pericial.
8. Pelo que, existe fundamento para pôr em causa o teor do relatório pericial, nomeadamente quanto à referida semelhança entre a assinatura real do autor e a assinatura constante dos documentos questionados.»
Seguidamente, foi proferido despacho nos seguintes termos:
«Pela ré foi requerido exame pericial às assinaturas constantes dos documentos de fls. 290 a 313v, exame esse que foi realizado, encontrando-se junto a fls. 476 e ss. o respectivo relatório.
Neste último, concluiu-se ser “praticamente provado” que as assinaturas em causa foram manuscritas pelo autor, fixando o grau dessa probabilidade em 95%.
Não se conformando com este resultado, veio o autor requerer a realização de nova perícia, com o mesmo objecto, a levar a cabo por diferente entidade.
A ré nada disse.
Cumpre apreciar e decidir.
Como resulta do relatório junto aos autos, a entidade que procedeu à realização da perícia não teve quaisquer entraves ou dúvidas em proceder à mesma, estando munida de diversa documentação necessária à análise comparativa da assinatura em apreço.
Conclui de forma assertiva e firme.
O autor não requereu quaisquer esclarecimentos ao Sr. Perito, limitando-se a questionar o resultado do exame por defender uma leitura dos caracteres assente na sua própria análise (leitura pessoal).
Ora, salvo o devido respeito, o autor não é perito pelo que não poderá ajuizar da matéria alvo do exame, designadamente defendendo diferentes leituras a “olho nu”.
Inexiste qualquer inexactidão do resultado da perícia efectuada que importe corrigir – cfr. art. 487º n.º 3 do CPC -, sendo que o autor não alega factos susceptíveis de fundamentarem uma nova perícia por entidade diversa.
Julgamos, pois, salvo melhor entendimento, não se justificar tal pretensão.
Sendo que não deixa de ser curioso que o trabalhador pretenda nova perícia quando, a fls. 326, defendia que a primeira não deveria ter lugar.
Termos em que se indefere o requerido.»
O A., inconformado, veio interpor recurso da decisão, formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem:
«I. Em sede de audiência discussão e julgamento foi requerida pela ré, perícia à letra do Autor, por requerimento de folhas 290, s.s, que foi admitida.
II. Para a realização da referida perícia ordenou a meritíssima juiz e visto que o Autor se encontrava internado na unidade de cuidados continuados de longa duração e manutenção, a junção os autos dos documentos de identificação do Autor bem como outros documentos nos quais tenha aposta a sua assinatura.
III. O que veio o Autor a cumprir procedendo à junção de oito documentos, designadamente documentos identificativos, carta de condução, bilhete de identidade, cartão de pensionista, declaração de IRS, entre outros.
IV. Da referida perícia resultou, conforme relatório, de que “É praticamente provado que as assinaturas apostas nos documentos de fls. 290 a 313 vs são da autoria do punho do autor A. P..”
V. Demais resultou que da análise comparativa entre si dos caracteres apostos nas folhas 290 a 313 do Processo na forma de assinatura com o nome de A. P. mostra semelhanças entre si o que permite afirmar que é praticamente e provado que foram todas manuscritas pelo mesmo punho, a que segundo a Tabela de Significância usada neste Centro para orientar este tipo de perícias corresponde um graus de probabilidade superior a 95%.
VI. Ora do referido relatório se constata que para a referida perícia foi utilizado o método de comparação das características dos documentos homólogos constantes nos termos de comparação.
VII. Porém, a meritíssima juíza a quo indeferiu a referida perícia com base no facto de o Autor não ter pedido qualquer esclarecimento à Perícia bem como não existir qualquer inexatidão do resultado da perícia efetuada que importe corrigir.
VIII. A prova pericial destina-se, como qualquer outra prova, a demonstrar a realidade dos enunciados de facto produzidos pelas partes (artº 341º do Código Civil).
IX. Aquilo que a singulariza é o seu peculiar objeto: a perceção ou averiguação de factos que reclamem conhecimentos especiais que o julgador comprovadamente não domina (artº 388º do Código Civil).
X. A apresentação do relatório da perícia é notificada às partes, que podem reclamar, se entenderem que há nele qualquer deficiência, obscuridade ou contradição ou que as conclusões não se mostrarem devidamente fundamentadas (artº 485º, nºs 1 e 2 do CPC)
XI. A reclamação consiste em apontar a deficiência e pedir que a resposta seja completada, ou em denunciar a obscuridade e solicitar que o ponto obscuro seja esclarecido, ou em notar a contradição e exprimir o desejo de que ela seja desfeita, ou em acusar a falta de fundamentação das conclusões e pedir que sejam motivadas.
XII. Qualquer das partes pode, também, requerer que se proceda a segunda perícia, no prazo de 10 dias, a contar do conhecimento do resultado da primeira (artº 487º, nº 1 do CPC).
XIII. A segunda perícia não é uma nova perícia. A segunda perícia, dado que tem por objeto a averiguação dos mesmos factos sobre que incidiu a primeira e por finalidade a correção da eventual inexatidão dos resultados desta, é, simplesmente, a repetição da primeira (artº 487º, nº 3 do CPC).
XIV. O que justifica a segunda perícia é a necessidade ou a conveniência de submeter à apreciação de outro perito ou peritos os factos que já foram apreciados.
XV. Parte-se do princípio que o primeiro perito ou os primeiros peritos viram mal os factos ou emitiram sobre eles juízos de valor que não merecem confiança, que não satisfazem; porque não se considera convincente o parecer obtido na primeira perícia é que se lança mão da segunda.
XVI. O resultado da perícia é expresso num relatório, no qual o perito – se a perícia for singular - ou peritos – se a perícia for colegial – se pronunciam, fundamentadamente, sobre o respetivo objeto (artº 486 nº 1 do CPC).
XVII. A segunda perícia não inutiliza ou invalida a primeira, antes ambas subsistem, lado a lado, não se substituindo o resultado da segunda ao da primeira.
XVIII. O tribunal aprecia livremente uma e outra, segundo as circunstâncias e as demais provas que se produzirem.
XIX. O princípio da liberdade da prova funciona plenamente, tanto em relação à primeira como em relação à segunda (artº 591 do CPC).
XX. Deste modo, à prova pericial há-de reconhecer-se um significado probatório diferente do de outros meios de prova, maxime da prova testemunhal.
XXI. Deste modo, se os dados de facto pressupostos estão sujeitos à livre apreciação do juiz – já o juízo científico que encerra o parecer pericial, só deve ser suscetível de uma crítica material e igualmente científica.
XXII. Dever que deve ser cumprido com particular escrúpulo no tocante a juízos científicos dotados de especial densidade técnica ou obtidos por procedimentos cuja fiabilidade científica seja universalmente reconhecida.
XXIII. Mas, em boa verdade, não se deve confiar, de forma ilimitada ou irrestrita, no efeito prático do ditame de que o juiz é o perito dos peritos. Dado que a prova pericial supõe a insuficiência de conhecimentos do magistrado, é difícil que este se substitua inteiramente ao perito para refazer, por si, o trabalho analítico e objetivo para o qual não dispõe de meios subjetivos.
XXIV. Isto significa que, a não ser que sobrevenham novos e seguros elementos de prova, maxime uma nova perícia, a liberdade do juiz não o autoriza a estabelecer, sem o concurso dos peritos, as razões da sua convicção.
XXV. Por mais que se afirme a máxima de que o magistrado é o perito dos peritos, a hegemonia da função jurisdicional em confronto com a função técnica e se queira defender o princípio da livre apreciação, não é raro que o laudo pericial desempenhe papel absorvente na decisão da causa.
XXVI. A realização da segunda perícia não se configura, portanto, como puramente discricionária.
XXVII. A jurisprudência tende a considerar como casos de não cumprimento do ónus argumentativo de que a lei faz depender a realização da segunda perícia, aqueles em que falta pura e simplesmente a indicação de qualquer razão, em que a parte, como no regime de pretérito, se limita a requerer a realização da segunda perícia – ou falta a substanciação de elementos sérios, aptos a alicerçar qualquer discordância relativamente ao resultado da primeira perícia.
XXVIII. Todavia, é patente a discordância do recorrente relativamente à metodologia utilizada pelo perito, dado que, tal exame foi realizado tao somente por comparação pela assinatura dos documentos identificativos do Autor, parece, que o relatório pericial foi construído pela análise da documentação que foi facultada ao perito.
XXIX. Em face disso, padece de fundamentação o despacho em crise, pois é fundamentado na medida refere que o requerimento apresentado pelo Autor não apresenta razões concludentes de discordância das razões periciais, que não foram alegadas razões de discordância do relatório pericial.
XXX. Ora um dos princípios instrumentais do processo civil atual, é dos princípios que procuram otimizar os resultados do processo, é o da cooperação intersubjetiva.
XXXI. Este princípio vincula reciprocamente o tribunal e as partes e desdobra-se, no tocante ao primeiro, nos deveres de esclarecimento, de auxílio e de prevenção.
XXXII. A decisão impugnada, ao recusar-lhe, por um fundamento que não se tem por exato, a realização da segunda perícia, vulnerou o direito da recorrente à prova – direito que é habitualmente deduzido para os processos jurisdicionais do artº 6 nº 3 d) do CEDH, mas que sem dificuldade se constrói como uma dimensão ineliminável do direito fundamental a um processo equitativo, artº 20 nº 4 da Constituição da República Portuguesa.
XXXIII. Com efeito, reunidos os requisitos exigidos pelo art.º 487º, n.º 1, a segunda perícia [que não invalida a primeira, sendo uma e outra livremente apreciadas pelo tribunal art.º 489º deve ser admitida.»
Não foi apresentada resposta ao recurso do A..
O recurso foi admitido como apelação, para subir imediatamente, em separado, com efeito meramente devolutivo.
Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto foi emitido parecer no sentido da improcedência do recurso.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.

2. Objecto do recurso

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil –, a única questão que se coloca a este Tribunal é a da admissibilidade de segundo exame pericial de escrita.

3. Fundamentação de facto

Os factos materiais relevantes para a decisão da causa são os que decorrem do Relatório supra.

4. Fundamentação de direito

Estabelece o Código de Processo Civil, na parte que interessa:
Artigo 485.º
Reclamações contra o relatório pericial
1 - A apresentação do relatório pericial é notificada às partes.
2 - Se as partes entenderem que há qualquer deficiência, obscuridade ou contradição no relatório pericial, ou que as conclusões não se mostram devidamente fundamentadas, podem formular as suas reclamações.
3 - Se as reclamações forem atendidas, o juiz ordena que o perito complete, esclareça ou fundamente, por escrito, o relatório apresentado.
4 - O juiz pode, mesmo na falta de reclamações, determinar oficiosamente a prestação dos esclarecimentos ou aditamentos previstos nos números anteriores.
(…)
Artigo 487.º
Realização de segunda perícia
1 - Qualquer das partes pode requerer que se proceda a segunda perícia, no prazo de 10 dias a contar do conhecimento do resultado da primeira, alegando fundadamente as razões da sua discordância relativamente ao relatório pericial apresentado.
2 - O tribunal pode ordenar oficiosamente e a todo o tempo a realização de segunda perícia, desde que a julgue necessária ao apuramento da verdade.
3 - A segunda perícia tem por objecto a averiguação dos mesmos factos sobre que incidiu a primeira e destina-se a corrigir a eventual inexactidão dos resultados desta.
(…)
Artigo 489.º
Valor da segunda perícia
A segunda perícia não invalida a primeira, sendo uma e outra livremente apreciadas pelo tribunal.
Em face do regime legal ora delineado, valem plenamente as asserções constantes do sumário do Acórdão da Relação de Guimarães de 12 de Julho de 2016, proferido no âmbito do processo n.º 559/14.5TJVNF.G1, disponível em www.dgsi.pt:
“1) São mecanismos processuais completamente distintos e inconfundíveis, quanto aos respectivos pressupostos e finalidades, a reclamação contra o relatório pericial e o pedido de realização de segunda perícia.
2) A segunda perícia referida nos artºs 487º e sgs, CPC, pressupõe que sejam alegadas fundadamente razões de discordância quanto ao relatório, tem por objecto os mesmos factos sobre que incidiu a primeira e destina-se a corrigir eventual inexactidão.
3) Tal alegação consiste na invocação, clara e explícita, de sérias razões de discordância da parte, não porque o resultado alcançado contraria ou não satisfaz os seus interesses, mas por, nele e no relatório em que assenta, existir inexactidão (insuficiência, incoerência e incorrecção) dos respectivos termos, maxime quanto à forma como operaram os conhecimentos especiais requeridos sobre os factos inspeccionados e ilações daí extraídas, de modo a convencer que, podendo haver lugar à sua correcção técnica, esta implicará resultado susceptível de diversa e útil valoração para a boa decisão da causa.
4) A segunda perícia coexiste validamente com a primeira, devendo ser-lhe fixada livremente a força probatória do respectivo resultado.
5) Embora o critério de decisão sobre a indicação e produção de meios de prova seja essencialmente o da própria parte, pode vedar-se a sua iniciativa no caso de impertinência, desnecessidade ou irrelevância ou da natureza meramente dilatória do oferecido ou requerido.
(…)”
Veja-se, ainda, a demais jurisprudência e doutrina citada no douto parecer do Ministério Público, em sentido semelhante.
Ora, como resulta do requerimento do A., acima transcrito, o mesmo fundamenta a realização de 2.ª perícia na imprecisão do resultado da 1.ª, designadamente porque, relativamente a determinados caracteres, não transparece a semelhança a que o mesmo alude, concretamente no que concerne aos caracteres “a” e “l” dos documentos fidedignos e dos documentos questionados, já que “a olho nu” se verifica que a forma como o carácter “a” está escrito nos documentos fidedignos é diferente da forma como está redigido nos documentos questionados, sendo que o mesmo sucede com o carácter “l”, que nas assinaturas questionadas surge com um traço continuado, isto é, que se prolonga até ao carácter seguinte, o que não sucede com a assinatura fidedigna do A..
Isto é, tudo esmiuçado, o Recorrente invoca de modo concretizado uma imprecisão traduzida em falta de semelhança, a olho nu, no carácter “l”, na medida em que alegadamente nas assinaturas questionadas surge com um traço continuado, isto é, que se prolonga até ao carácter seguinte, e o mesmo não sucede nas assinaturas fidedignas. Na verdade, apesar de se referir também falta de semelhança, a olho nu, quanto ao carácter “a”, não se concretiza em que se consubstancia a alegada diferença.
De qualquer modo, há que ter em conta que, nos termos do art. 388.º do Código Civil, a prova pericial tem por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, o que a distingue da prova por inspecção, a que se refere o art. 390.º do mesmo código, que tem por fim a percepção directa de factos pelo tribunal.
Assim sendo, não se afigura pertinente e justificado que se requeira uma 2.ª perícia porque, a olho nu, se entende julgar que os factos se apresentam de certa feição, uma vez que o objectivo da prova pericial é precisamente ultrapassar as limitações duma percepção não qualificada técnica e ou cientificamente. Quando muito, se essa percepção se afigurar flagrante e inequívoca, justifica-se a apresentação de reclamação por aparente obscuridade do relatório pericial, a fim de o perito esclarecer melhor a divergência das suas conclusões baseadas em especial conhecimento relativamente à percepção por pessoa que o não tem.
Já a realização de 2.ª perícia, visando corrigir a eventual inexactidão dos resultados da 1.ª, exige que se aleguem fundadamente as razões da discordância relativamente ao relatório pericial apresentado, pelo que está pressuposto, por natureza, que sejam razões de carácter técnico ou científico capazes de infirmar ou gerar dúvida séria sobre aquele. Isto é, como se refere no aresto acima citado, a 2.ª perícia há-de requerer-se fundadamente quando, na 1.ª perícia, “existir inexactidão (insuficiência, incoerência e incorrecção) dos respectivos termos, maxime quanto à forma como operaram os conhecimentos especiais requeridos sobre os factos inspeccionados e ilações daí extraídas, de modo a convencer que, podendo haver lugar à sua correcção técnica, esta implicará resultado susceptível de diversa e útil valoração para a boa decisão da causa.”
Em suma, a apresentação de razões assentes meramente na percepção “a olho nu”, por serem subjectivas e alheias à natureza da prova pericial, não justificam a realização de 2.ª perícia.
Em face do exposto, improcede o recurso.

5. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação improcedente, e, em consequência, em confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo Apelante.
Guimarães, 19 de Outubro de 2017

(Alda Martins)
(Eduardo Azevedo)
(Vera Sottomayor)

Sumário (elaborado pela Relatora):

I - Não se afigura pertinente e justificado que se requeira uma 2.ª perícia porque, a olho nu, se entende julgar que os factos se apresentam de certa feição, diferente da que foi considerada na 1.ª perícia, uma vez que o objectivo da prova pericial é precisamente ultrapassar as limitações duma percepção não qualificada técnica e ou cientificamente.

II - Quando muito, se essa percepção se afigurar flagrante e inequívoca, justifica-se a apresentação de reclamação contra o resultado da 1.ª perícia, por aparente obscuridade, a fim de o perito esclarecer melhor a divergência das suas conclusões baseadas em especial conhecimento relativamente à percepção por pessoa que o não tem.

III - Já a realização de 2.ª perícia, visando corrigir a eventual inexactidão dos resultados da 1.ª, exige que se aleguem fundadamente as razões da discordância relativamente ao relatório pericial apresentado, pelo que está pressuposto, por natureza, que sejam razões de carácter técnico ou científico capazes de infirmar ou gerar dúvida séria sobre aquele.

(Alda Martins)