Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6982/18.9T8VNF.G1
Relator: MARIA LEONOR CHAVES DOS SANTOS BARROSO
Descritores: TRANSFERÊNCIA DE LOCAL DE TRABALHO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
do Documento: RG
Data do Acordão: 02/20/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
I - Na resolução por justa causa invocada pelo trabalhador há um menor nível de exigência na avaliação da inexigibilidade na manutenção da relação laboral relativamente àquele que é exigido ao empregador quando invoca justa causa para despedir.

II - O que se justifica pelo facto de a protecção do emprego não se aplicar ao trabalhador que se auto despede e porque este não dispõe de outros meios para reagir a incumprimentos, enquanto que o empregador dispõe de todo um leque de sanções.

III - Integra justa causa objectiva a resolução do contrato baseada em mudança de local de trabalho para sítio que se situa a 43km do local de residência da autora e que implica o uso de 4 transportes (2 autocarros, 2 comboios) ou, em alternativa o uso de automóvel privado, quando os custos dessas deslocações não foram previamente garantidos à trabalhadora.

IV - E quando esses custos podem atingir cerca de 100€, o que representa uma diminuição incomportável num vencimento de cerca de 800€, totalmente gastos em despesas familiares essenciais.

V - E que, além do mais, impede a autora de exercer as responsabilidades parentais de levar e trazer da escola um filho menor de 7 anos, que necessita, ainda, duas vezes por semana, de ser levado a cuidados de saúde especiais.
Decisão Texto Integral:

I. RELATÓRIO

AUTOR/RECORRIDA- L. M.
RÉ/RECORRENTE- X – Sociedade de Vestuário, Lda.

A autora pede que se reconheça como lícita a resolução com justa causa do contrato de trabalho celebrado com a ré e que esta seja condenada a pagar-lhe 14.301,60€ a título de indemnização, 424,20€ de formação não prestada, 1.616€ que foram retirados pela ré no acerto de contas efectuado com a autora a título de indemnização por falta de aviso prévio, 2.500€ a título de indemnização por danos não patrimoniais, tudo acrescido de juros de mora
Alega que, em 25/09/2006, celebrou contrato de trabalho com a ré, nos termos do qual se obrigou a exercer, em VNFamalicão, as funções de modelista. Em 21/07/18 recebeu uma comunicação da ré dando conta da transferência de local de trabalho para Vila Nova de Gaia o que motivou que a autora, por carta registada, tenha declarado resolver o contrato de trabalho com justa causa, invocando os prejuízos que para si decorrem daquela transferência. Entende que a ré não cumpriu os requisitos formais da transferência do local de trabalho, já que a comunicação é omissa sobre se a transferência é temporária ou definitiva, não é fundamentada, nem menciona o dever de custear as despesas decorrentes do acréscimo dos custos de deslocação, não tendo ainda sido cumprida a antecedência imposta por lei. A indemnização pela resolução do contrato deve calcular-se a 45 dias por ano de antiguidade, atento o elevado grau de ilicitude. Pede, ainda, o crédito de horas de formação profissional não prestada nos últimos dois anos e o valor que a ré lhe deduziu pela indemnização por falta de aviso prévio e, finalmente, alega ter sofrido danos não patrimoniais com a conduta da ré, peticionando a correspondente indemnização.
A ré contestou. Alega que a situação em causa nos autos não justificaria a resolução do contrato com justa causa, mas tão só a resolução do contrato com direito a compensação, não se verificando, ainda assim, os pressupostos desta resolução. Impugna a factualidade alegada pela autora, alegando que já em Abril de 2017 comunicou à autora e demais trabalhadores que a mudança de local de trabalho iria acontecer e que disponibilizou à autora o passe público e um autocarro gratuito entre a estação de comboios de Gaia e as novas instalações da ré. Nega a restante factualidade.
Procedeu-se a julgamento e proferiu-se sentença.

DECISÃO RECORRIDA (DISPOSITIVO): decidiu-se do seguinte modo:

“Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente e, consequentemente:

a) Julgo verificada a justa causa da resolução do contrato operada pela autora, condenando a ré a pagar a esta a compensação a que alude o artigo 366º do C. Trabalho e artigo 5.º da Lei n.º 69/13, de 30/08, no valor que vier a ser liquidado;
b) Condeno a ré a pagar à autora a quantia de 326,20€ a título de formação profissional não prestada;
c) Condeno a ré a pagar à autora a quantia de 1.616€ relativa ao valor por aquela deduzido a título de “indemnização por falta de aviso prévio”;
d) Condeno a ré a pagar à autora juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, sobre as quantias referidas em a), b) e c), desde a data do respetivo vencimento até efectivo e integral pagamento (artigo 559.º, 804.º, 805.º e 806.º do Código Civil); e
e) no mais, absolvo a ré do pedido contra si formulado.
*
Custas da acção pela autora e ré, na proporção do respectivo decaimento, a apurar aquando da liquidação da condenação aludida em a), sem prejuízo da isenção de que beneficia a autora.”

A RÉ RECORREU – SÃO AS SEGUINTES AS CONCLUSÕES (IMPUGNAÇÃO DE FACTO E DE DIREITO):

DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
DO DEPOIMENTO DE PARTE:

“1. Para além da matéria confessória identificada pelo Tribunal a quo, resultou demonstrado nos autos, através da sua própria intervenção em sede de audiência de julgamento, que, entre a comunicação da alteração da mudança de instalações em abril de 2017 e resolução do contrato promovido no final de julho de 2018, a Recorrida não tinha conhecimento, nem nunca se interessou por ter conhecimento efetivo, direto e na primeira pessoa: i) da existência de escolas nas imediações das novas instalações da Recorrente; ii) dos efetivos trajetos que teria de efetuar de transportes públicos para as novas instalações da Recorrente; iii) do acréscimo efetivo de tempo que a deslocação para as novas instalações da Recorrente implicaria para si; iv) do acréscimo efetivo de custos que a deslocação para as novas instalações da Recorrente implicaria para si; e v) das soluções escolares alternativas (que, conforme resultou demonstrado, são abundantes em Vila Nova de Gaia) (cfr. L. M. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 1m40 a 2m15, 4m00 a 5m15, 8m05 a 8m55, 21m55 a 22m30, 28m25 a 29m00, 28m25 a 29m00, 40m45 a 41m35);
2. A factualidade em causa afigura-se muito relevante para a boa decisão da causa, na medida em que, por um lado, é suscetível de colocar em causa a própria comunicação resolutiva e, por outro lado, permite formular um juízo em relação à boa fé (ou falta dela) da Recorrida com a resolução imediata do seu contrato de trabalho;
3. Assim sendo, nos termos e para os efeitos do previsto no n.º 1 do artigo 72.º do Código de Processo do Trabalho e no n.º 2 do artigo 5.º e nos artigos 452.º e seguintes do Código de Processo Civil, deverá o Digníssimo Tribunal considerar devidamente demonstrado nos autos o seguinte: Até à comunicação resolutiva, a Autora não se havia deslocado às novas instalações da Ré sitas em Vila Nova de Gaia para aferir dos trajetos que poderia utilizar, do acréscimo de custos e de tempo que a mudança de instalações implicaria para si e de alternativa escolares nas imediações;

DAS ALÍNEAS M), N), O) E P) DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA:

4. No que concerne especificamente às alíneas N), O) e P), a Recorrida deixou registadas na sua comunicação resolutiva, a propósito do acréscimo de tempo e de custos com a mudança, meras conclusões e invocações vagas e genéricas, não cumprindo, assim, o ónus previsto no n.º 1 do artigo 395.º do Código do Trabalho;
5. Assim sendo, não poderia o Tribunal a quo se ter substituído à Recorrida e colmatado a deficiência da comunicação resolutiva, pelo que deverá o Digníssimo Tribunal determinar a eliminação das alíneas N), O) e P) da matéria de facto dada como provada;
6. Em qualquer caso, as declarações de parte da Recorrida foram, a este respeito, particularmente desprovidas de relevância probatória, uma vez que todo o seu discurso se baseou no que ouviu dizer de terceiros, cuja identidade se desconhece, que claramente não prestaram depoimento nos autos, que não se sabe bem o que afirmaram, em que circunstâncias, em que momento temporal, em relação a que trajetos e se estariam em circunstâncias sequer comparáveis (cfr. declarações prestadas nos autos por L. M. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 1m40 a 2m15, 4m00 a 5m15, 8m05 a 8m55, 21m55 a 22m30, 28m25 a 29m00, 40m45 a 41m35);
7. O depoimento das testemunhas arroladas pela Recorrida, nomeadamente as Senhoras C. S. (irmã da Recorrida e antiga trabalhadora da Recorrente que saiu da empresa «muito chateada»), L. S. (Autora num outro processo judicial em que reclama da Recorrente a mesmíssima coisa reclamada pela Recorrida nos presentes autos) e S. D., revelou-se igualmente comprometido e parcial e/ou meramente conclusivo e genérico, sem oferecer um arrimo seguro e credível que pudesse sustentar a resposta positiva dada pelo Tribunal a quo em relação à factualidade aqui em causa (cfr. C. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 0m22 a 0m38 e 1m00 a 1m39; L. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 0m08 a 0m45);
8. As referidas testemunhas: i) não moram ou trabalham em Vila Nova de Gaia; ii) não foram abrangidas pela mudança de instalações para Vila Nova de Gaia, e iii) depuseram de forma vaga e conclusiva, não demonstrando qualquer conhecimento direto e minimamente concretizado dos trajetos (que nunca fizeram) e do acréscimo de tempo e de custos decorrente da mudança das instalações da Recorrente para Vila Nova Gaia e afirmando que o (pouco) que sabem é porque ouviram dizer de terceiros, cuja identidade se desconhece, que claramente não prestaram depoimento nos autos, que não se sabe bem o que afirmaram, em que circunstâncias, em que momento temporal, em relação a que trajetos e se estariam em circunstâncias sequer comparáveis (cfr. C. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 4m10 a 7m50 e 14m10 a 14m35; L. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 8m40 a 9m15, 17m55 a 18m05 e 23m30 a 25m10; S. D. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 0m25 a 0m35, 5m00 a 5m25, 10m20 a 10m45 e 11m20 a 11m50);
9. Com as diligências instrutórias por si promovidas oficiosamente, o Tribunal a quo acabou por carrear para os autos um conjunto de supostos factos (e não provas) não alegado pela Recorrida na sua petição inicial ou, pior, na sua comunicação resolutiva (nomeadamente os diferentes vários horários de comboios da CP entre Vila Nova de Gaia e Famalicão e vice-versa, o respetivo tempo de viagem e custos; o tempo de chegar a casa até à estação de comboios; os trajetos alternativos, respetivo tempo de viagem e custos para deslocação de automóvel), os quais não poderiam ter sido valorados na sentença recorrida, sob pena de violação dos mais elementares princípios processuais, como sejam o princípio da paridade de armas, da igualdade processual, do dispositivo e do contraditório pleno;
10. Mesmo que se admitissem as diligências processuais promovidas pelo Tribunal a quo, a verdade é que os supostos factos e os papéis trazidos para o processo não apresentariam relevância probatória e teriam sido sempre, em qualquer caso, erroneamente valorados e interpretados pelo Tribunal a quo;
11. No que concerne à passagem «ter de se socorrer de transporte público (autocarro) para se deslocar da estação de comboios de V.N. Gaia – Devesas às instalações da Rua ...» constante da alínea O), nunca a mesma poderia ter sido dada como provada, na medida em que resultou igualmente provado que «a ré assegurou a existência de um autocarro gratuito para transportar os trabalhadores desde a estação de comboios de Gaia até às novas instalações da ré, em Vila Nova de Gaia» (cfr. alínea Y) da matéria de facto dada como provada);
12. As declarações de parte da Recorrida não podem fundamentar - nem poderiam ter fundamentado - a convicção do Tribunal a quo em relação à confirmação ou infirmação destes factos, uma vez que as mesmas surgiram nos autos desacompanhadas de outros elementos probatórios que, com a devida segurança, pudessem corroborar essas mesmas declarações, sendo que, sob pena de violação das mais elementares regras e princípios probatórios e de segurança jurídica, essa prova complementar não se poderia reconduzir a testemunhos de ouvi dizer, como acontece precisamente na presente ação;
13. A Recorrida carregava o ónus de alegar e provar os factos (ainda que, no caso, não alegados) que pudessem sustentar e fundamentar a existência do tal prejuízo sério provocado pela mudança de instalações da Recorrente, pelo que, qualquer dúvida em relação ao cumprimento do ónus de alegação e de prova dos elementos que constituem o prejuízo sério deverão – e deveriam ter sido – decididos contra, neste caso, contra si;
14. Pelo exposto, pelas variadas ordens de razões acima descritas, deverá o Digníssimo Tribunal considerar como não provada a matéria de facto vertida nas alíneas M), N), O) e P) do elenco de factos dados como provados pelo Tribunal a quo;

DAS ALÍNEAS R) E S) DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA:

15. O depoimento das testemunhas arroladas pela Recorrida, nomeadamente as Senhoras C. S., L. S. e S. D., revelou-se, também em relação a esta matéria, comprometido e parcial, nos termos acima já expostos, e meramente conclusivo e genérico, sem oferecer um arrimo seguro e credível que pudesse sustentar a resposta positiva dada pelo Tribunal a quo relativamente à factualidade em causa;
16. Nenhuma testemunha confirmou ou sequer abordou os supostos «largos períodos de tempo fora de casa» do marido da Recorrida, nem tampouco foi capaz de concretizar o seu horário de trabalho ou a existência e termos (local e horário) de um suposto part-time no setor da restauração;
17. Caso se assentasse nos horários de trabalho constantes do documento n.º 11 junto com a petição inicial, o que não se concede e apenas por mera cautela de patrocínio se equaciona, sempre se concluiria que o marido da Recorrida acaba o seu trabalho entre as 15h00 e as 17h30 e não trabalha às quintas-feiras e sextas-feiras, circunstâncias que lhe permitiriam: i) buscar o filho menor ao ATL às 19h00; ii) levar e buscar o filho menor à escola às quintas-feiras e sextas-feiras;
18. Ficou provado que o marido da Recorrida tem uma viatura da empresa e que a família dispõe de um outro veículo de cinco portas, pelo que não faltariam condições de transporte do filho menor da Recorrida;
19. A ser verdade que a Recorrida coloca o filho no ATL, o que não se concede, então o que deveria ter sido dado como provado é que é o ATL que vai buscar o filho da Recorrida à escola pelas 18h00 e esta vai buscá-lo ao ATL pelas 19h00 (cfr. L. M. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 24m40 a 25m00);
20. Para além do marido da Recorrida ter condições para ajudar nas tarefas relacionadas com o transporte do filho menor, resultou da instrução da causa que também a filha maior da Recorrida poderia auxiliar nessas tarefas, uma vez que é titular de carta de condução, não tendo sido feita qualquer prova segura que, por força da sua vida académica, se encontrasse impossibilitada de ajudar nas lides domésticas e no transporte do irmão (cfr. C. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 16m08 a 16m48; L. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 25m30 a 27m48);
21. Cabia à Recorrida demonstrar o prejuízo sério que para si implicaria a mudança de instalações da Recorrente e, muito concretamente, o por si alegado em relação à impossibilidade de auxílio por outros elementos familiares, nomeadamente marido e filha maior, na execução das tarefas de apoio às deslocações do filho menor, sendo certo que as suas declarações de parte, desacompanhadas de qualquer outro elemento probatório minimamente seguro e credível (e não meros testemunhos de ouvi dizer), não poderão constituir prova dos factos invocados por si invocados;
22. Resultou demonstrada nos autos a existência de um estabelecimento de ensino para os 2º e 3º ciclos – no caso a Escola Básica ... –, a escassos dois minutos de distância das novas instalações da Recorrente (cfr. alínea Z) dos factos dados como provados), sendo certo que a Recorrida não alegou, nem demonstrou qualquer impossibilidade de compatibilização entre estas soluções alternativas com a sua vida pessoal e familiar;
23. Pelo exposto, em relação às alíneas R) e S) da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo, deverá o Digníssimo Tribunal concluir que, no limite, apenas poderia resultar demonstrado nos autos o seguinte: A Autora era responsável por levar o filho menor ao estabelecimento de ensino frequentado por este e por o ir buscar ao ATL pelas 19h00;

DA ALÍNEA U) DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA:

24. A presente factualidade não se encontra vertida na comunicação resolutiva constante da alínea J) da matéria dada como provada, pelo que, nos termos do n.º 1 do artigo 395.º do Código do Trabalho, a mesma não poderia nunca ter sido considerada pelo Tribunal a quo como fundamento do prejuízo sério para efeitos de resolução contratual e, nessa medida, deverá o Digníssimo Tribunal desconsiderar, para todos os efeitos, a matéria em causa e, nessa medida, eliminá-la dos factos dados por provados;
25. Em qualquer caso, o depoimento das testemunhas arroladas pela Recorrida, nomeadamente as Senhoras C. S., L. S. e S. D., revelou-se, no que toca à presente matéria, igualmente comprometido e parcial, nos termos acima já expostos, e meramente conclusivo e genérico, sem oferecer um arrimo seguro e credível que pudesse sustentar a resposta positiva dada pelo Tribunal a quo à factualidade em causa;
26. No que concerne em concreto ao pequeno-almoço, nenhuma testemunha foi capaz de confirmar se era, de facto, a Recorrida que o preparava e a que horas (cfr. S. D. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 11m20 a 11m50);
27. A prova produzida nos autos leva necessariamente a concluir que, por um lado, o marido da Recorrida poderia levar o filho menor à escola pelo menos às quintas-feiras e sextas-feiras e, por outro lado, a filha da Recorrida poderia igualmente auxiliar nessas tarefas (cfr. declarações prestadas nos autos por C. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 16m08 a 16m48; e L. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 25m30 a 27m48);
28. Cabia à Recorrida demonstrar o prejuízo sério que para si implicaria a mudança de instalações da Recorrente e, muito concretamente, o por si alegado em relação à impossibilidade de auxílio por outros elementos familiares, nomeadamente marido e filha maior, na execução das tarefas de apoio às deslocações do filho menor, sendo certo que as suas declarações de parte, desacompanhadas de qualquer outro elemento probatório minimamente seguro e credível (e não de ouvi dizer), não poderão constituir prova dos factos por si invocados;
29. Pelo exposto, pelas variadas ordens de razões acima descritas, deverá o Digníssimo Tribunal considerar como não provada a matéria de facto vertida na alínea U) do elenco de factos dados como provados pelo Tribunal a quo;

DA ALÍNEA W) DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA:

30. O Tribunal a quo não justificou ou fundamentou a sua decisão de dar como demonstrada a factualidade em causa, sendo certo que não foi produzida a mínima prova a este respeito e sempre seria uma grande coincidência que os encargos mensais do agregado familiar da Recorrida correspondessem, ao cêntimo, à sua remuneração mensal na Recorrente;
31. Pelo exposto, deverá o Digníssimo Tribunal considerar como não provada a matéria de facto vertida na alínea W) do elenco de factos dados como provados pelo Tribunal a quo;

DA ALÍNEA X) DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA:

32. Na sua comunicação resolutiva, a Recorrida deixou registadas, a propósito do acréscimo de tempo e de custos com a mudança, meras conclusões e invocações vagas e genéricas, não cumprindo, assim, com o ónus previsto no n.º 1 do artigo 395.º do Código do Trabalho;
33. Assim sendo, não poderia o Tribunal a quo se ter substituído à Recorrida e colmatado a deficiência da comunicação resolutiva, pelo que deverá o Digníssimo Tribunal determinar a eliminação da alínea X) da matéria de facto dada como provada;
34. Em qualquer caso, as declarações de parte da Recorrida foram, a este respeito, particularmente desprovidas de relevância probatória, uma vez que todo o seu discurso se baseou no que ouviu dizer de terceiros, cuja identidade se desconhece, que claramente não prestaram depoimento nos autos, que não se sabe bem o que afirmaram, em que circunstâncias, em que momento temporal, em relação a que trajetos e se estariam em circunstâncias sequer comparáveis (cfr. declarações prestadas nos autos por L. M. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 1m40 a 2m15, 4m00 a 5m15, 8m05 a 8m55, 21m55 a 22m30, 28m25 a 29m00, 40m45 a 41m35);
35. O depoimento das testemunhas arroladas pela Recorrida, nomeadamente as Senhoras C. S., L. S. e S. D., revelou-se, a este propósito, igualmente comprometido e parcial e/ou meramente conclusivo e genérico, sem oferecer um arrimo seguro e credível que pudesse sustentar a resposta positiva dada pelo Tribunal a quo em relação à factualidade em causa (cfr. declarações prestadas por S. D. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 0m25 a 0m35 e 10m20 a 10m45; C. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 0m22 a 1m40 e14m10 a 14m35; L. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 0m10 a 0m45, 17m55 a 18m05 e 23m30 a 25m10);
36. Nos termos já acima explicitados, os factos carreados e os papéis juntos aos autos pelo Tribunal a quo a título oficioso não podiam, nem deviam ter sido utilizados para fundamentar o que quer que seja a este respeito;
37. O Tribunal a quo, na fundamentação da sua decisão de facto, faz referência à existência de portagens e de custos de combustível que, pura e simplesmente, não foram alegados, não constam dos autos em lugar algum, pelo se tratam de meras suposições e conclusões sem qualquer fundamentação ou adesão com a realidade processual;
38. As declarações de parte da Recorrida não podem fundamentar - nem poderiam ter fundamentado - a convicção do Tribunal a quo em relação à confirmação ou infirmação de determinados factos, porque desacompanhadas de outros elementos probatórios que, com a devida segurança (o que não ocorre com testemunhos de ouvir dizer), pudessem corroborar essas mesmas declarações;
39. A Recorrida carregava o ónus de alegar e provar os factos (ainda que, no caso, não alegados) que pudessem sustentar e fundamentar a existência do tal prejuízo sério provocado pela mudança de instalações da Recorrente, pelo que, qualquer dúvida em relação ao cumprimento do ónus de alegação e de prova dos elementos que constituem o prejuízo sério deverão – e deveriam ter sido – decididos contra, neste caso, si;
40. Pelo exposto, pelas variadas ordens de razões acima descritas, deverá o Digníssimo Tribunal considerar como não provada a matéria de facto vertida na alínea X) do elenco de factos dados como provados pelo Tribunal a quo;

DA ALÍNEA 6) MATÉRIA DE FACTO DADA COMO NÃO PROVADA:

41. A matéria em causa resultou devidamente demonstrada através das declarações prestadas, na primeira pessoa, pela Senhora C. F. (não obstante a grande pressão a que foi sujeita pelo Tribunal a quo e pelo Ilustre Mandatário da Recorrida, sempre confirmou, de forma consistente, ter transmitido informação em questão à Recorrida) e devidamente corroborados e enquadrados pelos depoimentos das restantes testemunhas arroladas pela Recorrente, nomeadamente E. S., S. G. e S. P. (na qualidade de declaraente de parte) (cfr. C. F. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 10m20 a 14m30 e 37m05 – 53m05; S. G. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 6m30 a 9m30; S. P. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 7m27 a 8m02; 9m15 a 9m38 e 10m25 a 11m38; E. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 11Min36 a 13Min56);
42. A Recorrida admitiu ter tomado conhecimento daquilo que a Recorrente pretendia disponibilizar aos trabalhadores aquando da mudança, ainda que através de outras colegas de trabalho (cfr. L. M. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 6m20 a 7m15);
43. Assim sendo, deverá o Digníssimo Tribunal considerar devidamente demonstrado nos autos o seguinte: A Autora tinha conhecimento, nomeadamente através da sua superiora hierárquica C. S. e através de conversas entre outras colegas de trabalho, que, por força da mudança de local de trabalho, a Ré lhe disponibilizaria o pagamento do passe mensal de transportes públicos e um autocarro gratuito entre a Estação das Devesas e as novas instalações da empresa;

DA ALÍNEA 7) MATÉRIA DE FACTO DADA COMO NÃO PROVADA:

44. A testemunha S. G., à data Diretora de Recursos Humanos da Recorrente, explicou em Tribunal, de uma forma serena e bastante detalhada, que, em face do atraso que se verificava na obra de requalificação das novas instalações da Recorrente, o qual impediu a mudança no primeiro semestre do ano de 2018, a data escolhida (agosto de 2018) teve também em conta o período de férias escolares, de modo a que os trabalhadores pudessem considerar aquele evento aquando da inscrição dos filhos nas escolas (cfr. S. G. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 2m00 a 5m20);
45. Assim sendo, deverá o Digníssimo Tribunal considerar devidamente demonstrado nos autos o seguinte: Em face do atraso que se verificava na obra de requalificação das novas instalações da Recorrente, o qual impediu a mudança no primeiro semestre do ano de 2018, a data escolhida (agosto de 2018) teve também em conta o período de férias escolares, de modo a que os trabalhadores pudessem ter em conta aquela circunstância aquando da inscrição dos filhos nas escolas;

DA DECISÃO QUANTO À QUESTÃO RELATIVA À TRANSFERÊNCIA DE LOCAL DE TRABALHO:

46. Grande parte das circunstâncias indicadas na comunicação resolutiva vertida na alínea J) da matéria dada como provada pelo Tribunal a quo resultaram não provadas nos presentes autos;
47. Para além disso, a dita comunicação encontra-se pejada de imprecisões, conclusões e juízos, as mais das vezes vagos e descontextualizados, carecendo de indicação, ainda que sucinta, de factos – concretos expressos – que pudessem justificar o prejuízo sério que a Recorrida invoca para resolver o seu contrato de trabalho, como, por exemplo, as seguintes passagens: «claro acréscimo de tempo», «com o parco salário base que aufiro (€808,00), no qual só com muita dificuldade e privação consigo fazer face aos encargos mensais do meu agregado familiar, tais como alimentação, vestuário, saúde, habitação, é-me de todo impossível suportar os encargos com a deslocação diária da minha casa para Vila Nova de Gaia e proceder à viagem de regresso»;
48. Nessa medida, a comunicação resolutiva é inepta a produzir os efeitos pretendidos pela Recorrida, designadamente a licitude do rompimento contratual imediato e a legitimidade do pedido de pagamento da compensação prevista no artigo 366.º do Código do Trabalho (ex vi n.º 5 do artigo 194.º do mesmo diploma), donde os pedidos da Recorrida deverão ser considerados improcedentes, revogando-se, em conformidade, a sentença recorrida;
49. Caso assim não se entenda, por não traduzirem uma indicação de factos, os referidos fundamentos não poderiam nunca ter sido atendidos pelo Tribunal a quo para efeitos de aferição da existência de prejuízo sério e devem ser desconsiderados pelo Digníssimo Tribunal;
50. Subsidiariamente, cumpre referir que, na sua petição inicial, a Recorrida reclamou o reconhecimento de justa causa da resolução contratual com base em comportamento culposo da Recorrente e na ilicitude da transferência de local de trabalho (cfr. capítulo C)) e, ainda, com base na existência de prejuízo sério decorrente da transferência de local de trabalho (cfr. capítulo D));
51. No entanto, em sede de supostos créditos laborais, a Recorrida peticionou (apenas) uma indemnização (a que chamou indemnização de antiguidade), nos termos do n.º 1 do artigo 396.º do Código do Trabalho, por força da suposta justa causa de resolução contratual por alegado facto ilícito e culposo praticado pela Recorrente (cfr. artigos 56.º a 58.º da petição inicial);
52. Não houve qualquer comportamento culposo da Recorrente, nem tampouco a ordem de transferência definitiva de local de trabalho se revelou ilegal ou ilícita, pelo que o Tribunal a quo não reconheceu justa causa de resolução do contrato por facto ilícito de culposo praticado pela Recorrente, tendo, no entanto, reconhecido que existia prejuízo sério decorrente da transferência de local de trabalho e, nessa medida, reconheceu justa causa objetiva de resolução e condenou a Recorrente no pagamento de uma compensação prevista no artigo 366.º do Código do Trabalho (ex vi n.º 5 do artigo 194.º do Código do Trabalho);
53. Assim sendo, o Tribunal a quo condenou a Recorrente em pedido diverso daquele que constava da petição inicial, o que configura uma nulidade da sentença e impõe a censura e correção do Digníssimo Tribunal (cfr. alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil), sendo certo que não é possível lançar mão do expediente previsto no artigo 74.º do Código de Processo do Trabalho, uma vez que em causa não se encontram direitos indisponíveis ou preceitos inderrogáveis, tanto mais que, à data da prepositura da ação, o contrato de trabalho já não se encontrava em vigor;
54. Em qualquer caso, a resolução do contrato de trabalho operada pela Recorrida ocorreu em momento anterior (20 dias antes) à efetiva mudança de instalações da Recorrente (cfr. alíneas H) e J) da matéria de facto dada como provada), pelo que aquela não experimentou, não vivenciou, no fundo, não sofreu nenhum dos alegados prejuízos que invocou na sua deficiente comunicação resolutiva e, aquando da resolução do contrato, o evento / fundamento supostamente legitimador da resolução ainda não havia ocorrido e nenhum prejuízo, dano ou constrangimento se verificava, não sendo, assim, possível promover uma comparação razoável e efectiva entre a situação pré-mudança (não alegada pela Recorrida, desde logo a propósito dos custos de transporte) e a situação pós-mudança de local de trabalho, o que determina a ilicitude da resolução contratual;
55. A Recorrida não poderia defender que o acréscimo de despesas seria um dos fundamentos para a resolução contratual e, simultaneamente, não ter aguardado pela mudança das instalações para a empresa poder, efetivamente, custear esse acréscimo nos termos legais (o que acabou por fazer para os restantes trabalhadores que não resolveram o contrato de trabalho);
56. Também por este motivo, sempre deveria o pedido de reconhecimento de licitude da resolução do contrato de trabalho com fundamento em prejuízo sério provocado pela mudança definitiva de local de trabalho (e os consequentes pedidos compensatórios) ser julgado improcedente pelo Digníssimo Tribunal;
57. Acresce que a aferição da existência de prejuízo sério como requisito de licitude para a resolução contratual operada pelo trabalhador deverá assentar no princípio da boa fé;
58. À data da resolução contratual com alegada justa causa, a Recorrida nunca tinha experimentado o trajeto que passaria a efetuar, nunca se tinha inteirado, na primeira pessoa, sobre o acréscimo efetivo de tempo e de custos que para si (e não para terceiros) representaria a mudança para Vila Nova de Gaia, nem tampouco havia indagado sobre soluções alternativas escolares para o seu filho menor;
59. A Recorrida teve conhecimento da mudança de instalações com uma antecedência superior a um ano e nunca, durante esse longo período, foi capaz de promover a mínima diligência que fosse a este respeito ou adotando um comportamento adequadamente zeloso, ativo, consciente e consciencioso;
60. A Recorrida não contactou os recursos humanos da Recorrente para procurar uma solução, nem lançou mão ou sequer ponderou lançar mão de outros expedientes legais suscetíveis de compatibilizar os alegados (não provados) constrangimentos familiares por si invocados com a mudança de local de trabalho para Vila Nova de Gaia, como, por exemplo, o trabalho a tempo parcial (cfr. artigo 55.º do Código do Trabalho) e o horário flexível (cfr. artigo 56.º do Código do Trabalho);
61. A Recorrida não atuou, assim, com a boa fé exigida, sobretudo considerando que impôs à Recorrente uma resolução imediata do contrato de trabalho (que lhe provocou sérios prejuízos, transtornos e constrangimentos) e que pretende reclamar uma compensação de valor superior a uma dezena de milhar de euros;
62. Assim sendo, e também por este motivo, sempre deveria o pedido de reconhecimento de licitude da resolução do contrato de trabalho com fundamento em prejuízo sério provocado pela mudança definitiva de local de trabalho (e os consequentes pedidos compensatórios) ser julgado improcedente pelo Digníssimo Tribunal;
63. Por outro lado, a resolução de qualquer contrato – e, muito concretamente, do contrato de trabalho – afigura-se como a última reação possível em face do incumprimento protagonizado ou do prejuízo provocado pela contraparte;
64. A Recorrida, pura e simplesmente, não sabia, nem quis saber o que a mudança representaria para si e promoveu o mínimo esforço no sentido de tentar perceber quais as formas possíveis para acomodar a mudança aos seus hábitos pessoais e familiares e teve mais de um ano para o fazer;
65. A Recorrida não abordou a empresa, de uma forma séria e colaborante, no sentido de encontrar qualquer solução para esta situação (cfr. S. G.– Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 12m30 a 13m30);
66. A Recorrida não recorreu a outros expedientes legais suscetíveis de compatibilizar os alegados (não provados) constrangimentos familiares por si invocados com a mudança de local de trabalho para Vila Nova de Gaia, como, por exemplo, o trabalho a tempo parcial (cfr. artigo 55.º do Código do Trabalho) e o horário flexível (cfr. artigo 56.º do Código do Trabalho);
67. Conclui-se, portanto, que a resolução contratual em causa dos autos não foi operada pela Recorrida em ultima ratio;
68. Pelo exposto, e também por este motivo, sempre deveria o pedido de reconhecimento de licitude da resolução do contrato de trabalho com fundamento em prejuízo sério provocado pela mudança definitiva de local de trabalho (e os consequentes pedidos compensatórios) ser julgado improcedente pelo Digníssimo Tribunal.
69. Por outro lado ainda, entende a Recorrente que a Recorrida não cumpriu com o ónus de prova do prejuízo sério provocado pela mudança definitiva de local de trabalho que se lhe encontrava acometido;
70. A mudança para a Vila Nova de Gaia, estamos certos, teria implicado a necessidade de conformar a vida pessoal com esta nova realidade, mas, nem de perto nem de longe, resultou demonstrada qualquer circunstância que pudesse consubstanciar um efetivo, sério e legítimo prejuízo que colocasse em causa, de forma insuportável ou irremediável, o seu plano de vida pessoal e familiar;
71. Assim sendo, e também por este motivo, sempre deveria o pedido de reconhecimento de licitude da resolução do contrato de trabalho com fundamento em prejuízo sério provocado pela mudança definitiva de local de trabalho (e os consequentes pedidos compensatórios) ser julgado improcedente pelo Digníssimo Tribunal;
72. De resto, mesmo que se considerasse verificados os fundamentos invocados pela Recorrida, a conclusão seria sempre a mesma, levando em atenção os parâmetros decisórios vertidos na Doutrina e na Jurisprudência dos Tribunas Superiores em relação à resolução do contrato de trabalho com fundamento no prejuízo sério decorrente de mudança definitiva de local de trabalho;
73. Com efeito, mesmo que se considerasse que a alteração do local de trabalho de Vila Nova de Famalicão para Vila Nova de Gaia passaria a implicar uma deslocação de cerca de 40 quilómetros, com o aumento do tempo de deslocação e de despesas e com a necessidade de conformação da vida familiar a essa nova realidade, nunca se poderia concluir pela existência de um prejuízo sério, particularmente quando não resultou provado a impossibilidade de auxílio por outros elementos da família (marido e filha maior da Recorrida) nas tarefas domésticas e familiares e resultou demonstrado que a entidade empregadora disponibilizava o pagamento de passe de transportes públicos e um autocarro entre a estação e as novas instalações, que nas imediações das novas instalações havia oferta escolar e que a Recorrida dispôs de mais de um ano para perceber o que, em concreto, a mudança representaria para si, não tendo, no entanto, promovido qualquer diligência tendente a identificar ou experimentar qualquer forma alternativa para acomodar a mudança nos hábitos pessoais e familiares;
74. Tratou-se de uma mudança dentro da mesma região, na mesma malha urbana, onde a generalidade dos trabalhadores se confronta diariamente com trânsito, transportes públicos, esperas, filas e as mais variadas mudanças, como de escola, de hábitos e rotinas familiares, pelo que o “esforço” exigido à Recorrida não seria, nesta perspetiva, muito diferente do que aquele que é exigido à generalidade das famílias que vivem em polos ou centros urbanos no nosso país;
75. A residência a escassos minutos do local de trabalho é, nos dias de hoje, um verdadeiro luxo, sendo que, em conformidade, os Tribunais Superiores têm vindo a entender que a perda dessa regalia cada vez mais em desuso não releva para efeitos de aferição do prejuízo sério;
76. No quadrante oposto, a Recorrente foi confrontada com uma resolução contratual com efeitos imediatos e com a reclamação de milhares de euros de compensação, quando a conduta da Recorrida lhe causou, a ela sim, efetivos prejuízos e transtornos, circunstância que deve ser igualmente sopesada na avaliação do Digníssimo Tribunal (cfr. C. F. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 16m20 a 19m20; E. S. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 4m00 a 6m30; S. P. – Audiência de Julgamento de 2 de abril de 2019 – 16m30 a 19m00);
77. Tudo visto e ponderado, sempre, em qualquer caso, deverá o pedido de reconhecimento de licitude da resolução do contrato de trabalho com fundamento em prejuízo sério provocado pela mudança definitiva de local de trabalho (e os consequentes pedidos compensatórios) ser julgado improcedente pelo Digníssimo Tribunal, considerando-se, em consequência, legítimo o desconto promovido pela Recorrente no recibo final de vencimento, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 399.º e 401.º do Código do Trabalho (equivalente ao pré-aviso em falta, no caso concreto, 60 dias de salário base, isto é, EUR 808,00 x 2 = EUR 1616,00).
78. No artigo 186.º da sua contestação, a Recorrente impugnou a matéria vertida no artigo 59.º da petição inicial, isto é, o alegado pela Recorrida a propósito de supostos créditos de formação.
79. Tendo sido expressa e devidamente impugnada, caberia à Recorrente, nos termos gerais, o ónus da prova dos factos que alegou no artigo 59.º da sua petição inicial.
80. Não o tendo feito, isto é, não resultando demonstrada a referida factualidade (tanto que o Tribunal a quo nem sequer a levou ao elenco de factos provados), deverá o Digníssimo Tribunal concluir pela improcedência do pedido de condenação da Recorrente no pagamento de supostos créditos de formação.

Nestes termos, e nos mais de Direito cujo suprimento de V. Exas. se espera e inova, deverá o Digníssimo Tribunal da Relação de Guimarães julgar o presente recurso integralmente procedente, determinado, em consequência, a substituição da decisão recorrida por outra que conclua nos termos vertidos nas presentes alegações.”
CONTRA-ALEGAÇÕES DA RÉ: defende a manutenção da decisão recorrida.
PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO: propugna que não ocorrem nulidades na sentença recorrida e que esta deve ser mantida, quer quanto à matéria de facto, quer de direito.
A ré respondeu propugnado pela procedência do recurso.
Foram colhidos os vistos dos adjuntos e o recurso foi apreciado em conferência – art. s 657º, 2, 659º, do CPC.

QUESTÕES A DECIDIR (o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recurso1):

1 – A nulidade da sentença;
2 - Impugnação da matéria de facto;
3 – Direito de resolução do contrato decorrente de mudança de local de trabalho;
4- Pedido de condenação por créditos de formação profissional.

I.I. FUNDAMENTAÇÃO

A- FACTOS

Na primeira instância foram julgados provados os seguintes factos:

A) A ré exerce a actividade industrial do sector têxtil, cujo objecto é comércio e indústria de confecções de roupas, com mais de 150 trabalhadores ao seu serviço.
B) A autora é associada do Sindicato Têxtil do Minho e Trás-os-Montes.
C) A 25/09/2006, entre a autora e a ré foi celebrado um contrato de trabalho a termo certo, reduzido a escrito, para exercer, como sempre exerceu, sob a autoridade, fiscalização e direcção desta, as funções correspondentes à categoria profissional de Modelista, mediante retribuição.
D) Na data de admissão da autora foi estipulado que o local de trabalho seria na Rua … – V.N. Famalicão, ou noutro local que a ré determinasse posteriormente.
E) A autora à data da celebração do contrato de trabalho até à presente data sempre residiu na Rua …, concelho de V.N. Famalicão.
F) Na data de admissão da autora, a ré determinou que o horário de trabalho seria de 40 (quarenta) horas semanais, a prestar de segunda a sexta-feira: das 08:30 horas às 12:30 horas e das 13:30 horas às 17:40 horas.
G) À data da resolução, o horário da autora era das 9h00 às 18h00 com uma hora de almoço.
H) Em 21/07/2018, a autora recebeu, via e-mail, a comunicação de transferência de local de trabalho, por parte da ré, para a Rua ..., V.N. Gaia, com o seguinte teor: “(...) no âmbito da mudança das instalações da sede social do grupo, vimos pelo presente informar que o Departamento de Senhora irá mudar o seu local de funcionamento para as instalações na Rua ..., Vila Nova de Gaia, a partir do próximo dia 20 de Agosto de 2018.
Assim, deverão até lá preparar a mudança, utilizando caixas para transferir todo o material e/ou documentação que necessitem”.

I) Na sequência do e-mail, a autora em 26/07/2018, enviou à ré, carta registada com aviso de recepção, cujo teor é o seguinte:

“Exmos Senhores,

Como sabem encontro-me ao serviço de V.Exªs., por contrato de trabalho subordinado e sem termo, no qual um dos elementos essenciais para a celebração do mesmo foi exactamente o local de trabalho. Como também sabem, resido na freguesia de …, concelho de Vila Nova de Famalicão, sendo que o meu local de trabalho foi, como é, nas instalações fabris de V.Ex.ªs, sitas na Rua ..., freguesia de ... VNF, no qual dista apenas 3km. Facilmente se depreende assim que qualquer alteração do local de trabalho para Vila Nova de Gaia, do qual dista da minha residência 43 km implica um claro acréscimo de tempo nas deslocações de ida de minha casa para as referidas instalações e respectiva viagem de regresso. Para além do acréscimo de tempo não possuo forma de me deslocar de minha casa para as instalações fabris em Vila Nova de Gaia, o que impossibilita a minha deslocação para as instalações. Acresce que, o meu agregado familiar é constituído por mim, pelo meu marido e dois filhos, sendo um menor de 7 anos de idade, no qual necessita do meu apoio, quer para deixá-lo no respectivo estabelecimento de ensino, quer ainda para ir buscá-lo no mesmo estabelecimento de ensino após o horário escolar, o que sucede pelas 18:00 horas, sendo que a partir dessa data tenho necessariamente de estar com ele, uma vez que o pai encontra-se, por largos períodos de tempo, fora de casa e com horários incompatíveis com tais obrigações, com a agravante, ainda, de não ter mais qualquer outro familiar a quem possa socorrer para cumprir com as minhas obrigações parentais, motivo pelo qual é de todo impossível deslocar-me para as instalações de Vila Nova de Gaia. Importa, ainda, referir que o meu filho tem uma anomalia psíquica e dificuldades de fala que necessita do meu permanente apoio e presença diária, nos períodos pré e pós laboral, o que apenas reforça a minha impossibilidade de ir trabalhar para Vila Nova de Gaia. Por outro lado, é do meu conhecimento que as instalações a que correspondem o meu actual posto de trabalho continuarão em funcionamento, pelo que naturalmente que pretendo ter o mesmo direito de continuar aí a trabalhar, tal como sucede com outros colegas de trabalho. Por último, importa referir que a comunicação de “mudança das instalações da sede social do grupo” não obedece aos requisitos formais e materiais impostos por lei para comunicar qualquer transferência de local de trabalho, motivo pelo qual tal ordem sempre seria ilegal. Pelos motivos expostos, reafirmo que pretendo continuar a trabalhar no local onde sempre trabalhei, ou seja, nas instalações fabris de V.Exªs. sitas na Rua ..., freguesia de ... VNF.”

J) A autora enviou à ré, carta registada com aviso de recepção, em 31/07/2018 e recepcionada por aquela no dia 01/08/2018, com o seguinte teor:

“Como é do vosso conhecimento, fui admitida ao vosso serviço em 25/09/2006, por contrato de trabalho a termo, para exercer, como sempre exerci, as funções correspondentes à categoria profissional de modelista, mediante retribuição. Na data da celebração do contrato ficou determinado que o meu local de trabalho seria, como sempre foi, nas instalações fabris de V.Ex.ª(s), sitas na rua ..., na freguesia de ..., no concelho de Vila Nova de Famalicão. O meu local de trabalho supra referido foi, como é, um elemento essencial para a celebração do referido contrato de trabalho que me vinculava a V.Ex.ªs. Com efeito, como sabem, resido, como residia à data da celebração do referido contrato, na freguesia de ..., no qual dispa apenas 3 km, cuja viagem de ida e regresso do trabalho para casa não despendo mais que 5 minutos. Ora, fui agora confrontada com uma mera comunicação via e-mail, recebido em 20/07/2018, com o seguinte teor: “(...) no âmbito da mudança das instalações da sede social do grupo, vimos pelo presente informar que o Departamento de Senhora irá mudar o seu local de funcionamento para as instalações na Rua ..., Vila Nova de Gaia, a partir do próximo dia 20 de Agosto de 2018. Assim, deverão até lá preparar a mudança, utilizando caixas para transferir todo o material e/ou documentação que necessitam”. Ora, tal ordem de transferência do local de trabalho, que é definitiva, implica graves prejuízos sérios para mim.
Como referi, resido na freguesia de ..., concelho de Vila Nova de Famalicão, sendo que o meu local de trabalho foi, como é, nas instalações fabris de V.Ex.ªs, sitas na Rua ..., freguesia de ..., do mesmo concelho de Vila Nova de Famalicão, no qual dista apenas 3 km.
Facilmente se depreende assim que qualquer alteração do local de trabalho para Vila Nova de Gaia, do qual dista da minha residência 43 kms implica um claro acréscimo de tempo nas deslocações de ida de minha casa para as referidas instalações e respectiva viagem de regresso. Para além do acréscimo de tempo não possuo forma de me deslocar de minha casa para as instalações fabris em Vila Nova de Gaia, o que impossibilita a minha deslocação para estas instalações. Acresce que, o meu agregado familiar é constituído por mim, pelo meu marido, sendo um menor de 7 anos de idade, no qual necessita do meu apoio, quer para deixá-lo no respectivo estabelecimento de ensino, quer ainda para ir buscá-lo ao mesmo estabelecimento de ensino após o horário escolar, o que sucede pelas 18:00 horas, sendo que a partir dessa data tenho necessariamente de estar com ele, uma vez que o pai encontra-se, por largos períodos de tempo, fora de casa e com horários incompatíveis com tais obrigações, com a agravante, ainda, de não ter qualquer outro familiar a quem possa socorrer para cumprir com as minhas obrigações parentais, motivo pelo qual é de todo impossível deslocar-me para as instalações de Vila Nova de Gaia. Importa, ainda, referir que o meu filho tem uma anomalia psíquica e dificuldades de fala que necessita do meu permanente apoio e presença diária, nos períodos pré e pós laboral, o que apenas reforça a minha impossibilidade de ir trabalhar para Vila Nova de Gaia. Por outro lado, é do meu conhecimento que as instalações a que correspondem o meu local de trabalho continuarão em funcionamento, não se justificando, assim, a ordem de transferência. Por último, importa referir que a comunicação de “mudança das instalações da sede social do grupo” não obedece aos requisitos formais e materiais impostos por lei para comunicar qualquer transferência de local de trabalho. Acresce, ainda, que com o parco salário base que aufiro (€808,00), no qual só com muita dificuldade e privação consigo fazer face aos encargos mensais do meu agregado familiar, tais como alimentação, vestuário, saúde, habitação, é-me de todo impossível suportar os encargos com a deslocação diária da minha casa para Vila Nova de Gaia e proceder à viagem de regresso. Nestas circunstâncias, não me resta outra alternativa que não seja resolver o contrato, fundamentado no prejuízo sério que é a ordem de transferência do meu local de trabalho, nos termos das disposições conjugadas dos artºs 129.º, n.º1. al. f), 194.º, n.º5 e 395.º, todos do Cod. do Trabalho.
Aliás, tal ordem de transferência definitiva do meu local de trabalho consubstancia, também, a violação culposa por parte de V.Ex.ªs das garantias legais e convencionais que me são atribuídas, bem como a lesão dos meus interesses patrimoniais sérios, o que, também por aqui, constitui nos termos do art. 394.º, n.º2. als. b) e e), motivo para a resolução do contrato de trabalho com justa causa, o que também se invoca.”

K) A autora e todos os restantes mais de 200 trabalhadores que exerciam funções em ..., foi remetido e-mail, datado de 21 de Abril de 2017, que a autora recebeu, com o seguinte teor:

Em nome da administração, serve a presente comunicação para informar todos os colaboradores que se prevê uma mudança de sede social do Grupo e de todas as empresas participadas para o empreendimento … em Vila Nova de Gaia, durante o primeiro semestre de 2018.
Esta mudança afectará todos os colaboradores com local de trabalho na Rua ... em ..., excepto os colaboradores afectos à Logística e Qualidade, cujo local de trabalho permanecerá ou alterará (dependendo do caso) para as instalações dos nossos armazéns na Trofa e Famalicão.
Dado que serão necessárias obras de adaptação do empreendimento para a recepção do Grupo, oportunamente comunicaremos de forma formal a mudança de local de trabalho aos colaboradores visados e a data exacta da mesma.”.

L) A residência da autora dista do local de trabalho da ré em 3km, demorando esse trajecto de automóvel cerca de 5 minutos.
M) Da residência da autora à Rua ..., V.N. Gaia, distam cerca de 43km.
N) Na deslocação da sua casa para a Rua ..., V.N. Gaia e desta para sua casa, a autora demoraria, em cada deslocação, entre cerca de 50 minutos – se se deslocasse de automóvel – a cerca de 1 hora e 13 minutos – se viajasse de comboio.
O) O transporte público de VN Famalicão para VN Gaia não é directo e obrigaria a autora, pelo menos, a ter de se deslocar em 2 comboios – de ... a Porto Campanhã e outro de Porto Campanhã a V.N. Gaia – Devesas e, ainda, a ter de se socorrer de transporte público (autocarro) para se deslocar da estação de comboios de V.N. Gaia – Devesas às instalações da Rua ....
P) Tem ainda a autora de percorrer a distância necessária para a respectiva estação de comboios, que consubstancia uma distância de cerca de 5 km.
Q) O agregado familiar da autora é constituído pela própria, pelo seu marido e dois filhos, sendo um menor de 7 anos de idade.
R) A autora é, como sempre foi, responsável por levar o filho menor ao estabelecimento de ensino frequentado por este, pelo facto do seu marido se encontrar, por largos períodos de tempo, fora de casa e com horários incompatíveis com tais obrigações, tendo igualmente de o ir buscar ao mesmo estabelecimento de ensino após o horário escolar, o que sucede pelas 18:00 horas.
S) A autora não tem mais nenhum outro familiar a quem possa socorrer para cumprir com as referidas obrigações parentais.
T) O filho menor de 7 anos sofre de problema relacionado com voz, motricidade orofacial e fala que faz necessitar de frequentar um terapeuta da fala, às terças e quintas-feiras, das 19:00 às 19:30 horas, sendo acompanhado pela autora.
U) No período pré-laboral, por voltas das 08:00 horas, a autora tem de providenciar pelo pequeno-almoço do seu filho e por levar à escola às 08:30 horas, sito em ..., o que deixava de o poder fazer com o seu novo local de trabalho, sendo que não podia deixar com mais ninguém.
V) A autora auferia o salário mensal de 808€.
W) Os encargos mensais do agregado familiar da autora, incluindo alimentação, vestuário, saúde, habitação, ascendem a 808€.
X) A deslocação diária da sua casa para o estabelecimento da ré em V.N. Gaia e viagem de regresso ascende a um encargo mensal de, entre cerca de 60€ a 103,95€.
Y) A ré assegurou a existência de um autocarro gratuito para transportar os trabalhadores desde a estação de comboios de Gaia até às novas instalações da ré, em Vila Nova de Gaia.
Z) Existe um estabelecimento de ensino para os 2º e 3º ciclos – no caso a Escola Básica ... –, a escassos dois minutos de distância das novas instalações da ré.
AA) A ré mudou as instalações em que laborava para as novas instalações de Vila Nova de Gaia e para ali transferiu a totalidade dos trabalhadores que laboravam anteriormente em ..., com excepção os colaboradores afectos à Logística e Qualidade.
BB) A responsável da divisão a que pertencia a autora reuniu pessoalmente com a autora, ainda durante o ano de 2017, para informar sobre o encerramento das instalações sitas na Rua de Mabor e consequente mudança de instalações e sede da empresa para Vila Nova de Gaia.
CC) A autora deslocava-se de carro para o local de trabalho.
DD) No recibo do mês de Agosto de 2018, a ré deduziu no valor pago à autora a quantia de 1.616€ a título de indemnização por incumprimento do aviso prévio.
Mais se provou (factos que se aditam ao abrigo do desposto no artigo 72.º do CPT):
EE) A ré, na sequência da alteração das instalações, suporta os custos do passe público dos trabalhadores que se deslocam de comboio, não custeando os custos dos trabalhadores que se deslocam em viatura automóvel próprio.

B) NULIDADES DA SENTENÇA:

Alega a ré que foi condenada em coisa diversa daquela que havia sido peticionada pela autora, porque o tribunal a quo recorreu à compensação por resolução do contrato por justa causa objectiva (366º CT), ao passo que a autora pediu a declaração de licitude de resolução do contrato e indemnização por justa causa subjectiva (394º/2, 396º/1, CT).

Segundo o artigo 615º/1, CPC, é nula se sentença quando:
…e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.

Esta disposição relaciona-se com uma outra, a saber, o artigo 609º/1, CPC, que estipula:

”A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir”
Estas normas são sobretudo informadas pelo princípio do dispositivo segundo o qual compete às partes escolher a tutela ou providência que pretendem, e não ao juiz.
A questão que se põe é a de saber se a condenação numa compensação em vez de numa indemnização, com reconfiguração do específico efeito desejado, altera qualitativamente o pedido (pois quantitativamente condenou-se em quantidade inferior).
A jurisprudência tem feito uma interpretação destas normas que se afasta de uma perspectiva puramente formal, de modo a aproveitar a causa e a evitar que se tenha de pôr uma nova acção com prejuízo para a economia das partes e do bom funcionamento judiciário em geral. São exemplos disso os casos em que a parte pede a declaração de nulidade/anulação do acto/contrato, mas o seu efeito é na verdade a ineficácia, tratando-se de um erro de qualificação jurídica, que o tribunal corrige. É também exemplo disso o pedido de reconhecimento de titularidade que é convolado para reconhecimento de contitularidade, tratando-se de um minus (2).

Ora, no caso a matéria alegada pela autora é suscetível de ser juridicamente enquadrada no “mais” que é a resolução do contrato por justa causa subjectiva, ou no “menos” que é a resolução do contrato por causa objectiva. A primeira causa de pedir invocada tem um campo de abrangência mais vasto (porque exige culpa do empregador), estando alegados factos que servem às duas, tudo dependendo da prova, sendo possíveis consequências/efeitos diferentes.
O julgador é livre na qualificação jurídica dos factos, não estando limitado pelo enquadramento de direito feito pelas partes – 5º/3, CPC. Assim, não se tendo provado o mais, é correcto que o tribunal recorrido subsuma a matéria alegada noutro enquadramento jurídico e, consequentemente, requalifique o efeito pretendido também para um “menos.
Improcede a arguição.

C) RECURSO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO

A regra legal em sede de modificabilidade da decisão de facto é a de que o tribunal superior deve alterar esta decisão se os factos considerados como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem, e não somente admitirem, decisão diferente – art. 662º do CPC. A utilização do verbo “impor” confere um especial grau de exigência imposto à segunda instância que, assim, deve ser cautelosa e parcimoniosa na modificação da decisão de facto.
O tribunal da relação é uma instância de recurso que, por isso mesmo, conhece em moldes mais restritos sobre a matéria de facto, a qual já foi sujeita a um primeiro crivo. O que também se relaciona com o facto de, no ordenamento jurídico português, vigorar a regra da livre apreciação da prova e subsequente fixação da matéria de facto por parte do julgador, a efectuar segundo a sua prudente convicção, salvo se a lei exigir formalidade especial - art. 607º do Cód. Proc. Civil. O tribunal a quo, pese embora ao abrigo daquele princípio seja livre na apreciação da matéria de facto (3) (assim como o tribunal ad quem), nos termos supra referidos, tem ainda o dever de explicar na fundamentação da matéria de facto qual o fio condutor lógico de raciocínio crítico que ditou aquela materialidade fáctica. Alcançando-se por essa via as razões de ciência, de lógica e as regras de experiência de vida que lhe estiveram subjacentes. Assim, a reapreciação da prova em segundo instância, não devendo ser minimalista, nem meramente formalista, deve, contudo, ter presente este princípio. Mormente quando incide sobre prova testemunhal, porque não se pode também escamotear o facto de ao tribunal superior faltar a leitura dos gestos, da postura e das expressões dos declarantes, complementares da audição e somente assegurados pela oralidade e imediação.
Decorre também do exposto que a reapreciação de prova não equivale a novo julgamento, devendo, com referência à matéria impugnada, circunscrever-se aos casos de clara desarmonia entre a prova disponível e a decisão tomada, a incongruências ou outras anomalias que claramente sobressaiam. Ou seja, o julgador do tribunal superior tem de estar bem seguro de que a prova foi mal apreciada e, só nessa circunstância, a deve modificar (4).

No caso concreto:

Relativamente a diversos pontos de facto provados a ré utiliza a argumentação de que a autora na sua comunicação resolutiva alega meras conclusões e invocações vagas e genéricas, não cumprindo, assim, o ónus previsto no artigo 395º/1 CT, designadamente a propósito do acréscimo de tempo e de custos com a mudança, e da necessidade de ser ela a levar o filho à escola. Pretende que, em consequência, tais factos sejam não provados.
A ré confunde as coisas. A prova dos factos apenas tem a ver com o bem ou mal fundado da decisão de os considerar provados ou não provados. A sua relevância, se podem ou não e de que modo são valorados, integra, ao invés, questão de direito.
Improcede a alegação.

Diz a recorrente que deve ser provado que:

Até à comunicação resolutiva, a Autora não se havia deslocado às novas instalações da Ré sitas em Vila Nova de Gaia para aferir dos trajetos que poderia utilizar, do acréscimo de custos e de tempo que a mudança de instalações implicaria para si e de alternativa escolares nas imediações.
A recorrente não referencia a fonte desta matéria, ou seja, não diz onde está alegada. Incumpriu, assim e desde logo, o ónus de especificação dos concretos pontos de facto por referência, ou aos articulados, ou à matéria algo de despacho saneador, ou alvo de menção na sentença, o que levaria a que a mesma não seja conhecida – art. 640/1, a/, CPC.
E, na verdade, não o podia ter cumprido pois não se descortina tal alegação nos seus articulados.
Tal como refere o Sr Procurador Geral-Adjunto no seu parecer : ”Trata-se de matéria de facto não alegada no seu articulado, que não poderá ser aditada nos termos do art. 72º, do CPT, visto sobre ela não ter havido discussão, por a Ré nada haver requerido até ao encerramento da audiência de discussão e julgamento e a julgadora da 1ª instância, não a ter considerado relevante para a boa decisão da causa;
Finalmente também não se descortina a relevância desta matéria face às inúmeras fontes alternativas para aferir dos custos e tempo gasto no trajecto.
Diz a recorrente que deve ser não provada a matéria de facto vertida nas alíneas M, N), O) e P).

É esta a redacção das alíneas em causa:

M) Da residência da autora à Rua ..., V.N. Gaia, distam cerca de 43km.
N) Na deslocação da sua casa para a Rua ..., V.N. Gaia e desta para sua casa, a autora demoraria, em cada deslocação, entre cerca de 50 minutos – se se deslocasse de automóvel – a cerca de 1 hora e 13 minutos – se viajasse de comboio.
O) O transporte público de VN Famalicão para VN Gaia não é directo e obrigaria a autora, pelo menos, a ter de se deslocar em 2 comboios – de ... a Porto Campanhã e outro de Porto Campanhã a V.N. Gaia – Devesas e, ainda, a ter de se socorrer de transporte público (autocarro) para se deslocar da estação de comboios de V.N. Gaia – Devesas às instalações da Rua ....
P) Tem ainda a autora de percorrer a distância necessária para a respectiva estação de comboios, que consubstancia uma distância de cerca de 5 km.

Diz a recorrente que as declarações de parte da Recorrida foram, a este respeito, particularmente desprovidas de relevância probatória. Que os depoimento das testemunhas arroladas pela Recorrida, nomeadamente C. S. (irmã da Recorrida e antiga trabalhadora da Recorrente que saiu da empresa «muito chateada»), L. S. (Autora num outro processo judicial em que reclama da Recorrente a mesmíssima coisa reclamada pela Recorrida nos presentes autos) e S. D., revelou-se igualmente comprometido e parcial e/ou meramente conclusivo e genérico.
Que a passagem «ter de se socorrer de transporte público (autocarro) para se deslocar da estação de comboios de V.N. Gaia – Devesas às instalações da Rua ...» constante da alínea O), nunca poderia ter sido dada como provada, na medida em que resultou igualmente provado que:
«a ré assegurou a existência de um autocarro gratuito para transportar os trabalhadores desde a estação de comboios de Gaia até às novas instalações da ré, em Vila Nova de Gaia»(cfr. alínea Y) da matéria de facto dada como provada).

A este respeito consta na sentença:

“As testemunhas C. S., L. S. e S. D. corroboraram, no essencial, as declarações da autora, relatando o que assistiram enquanto trabalharam com a autora.
Explicaram estas testemunhas a forma como os trabalhadores da ré que vivem nesta cidade e cidades próximas se deslocam para as novas instalações da ré, o que foi conjugado com os horários juntos a fls. 97/98 e os “prints” de fls. 92 verso a 96.
Foi analisando os horários da CP que o tribunal conclui qual o tempo que demoraria a viagem entre a casa da autora e as novas instalações da ré, caso a autora se deslocasse de comboio.
Assim, considerou-se que, para chegar às 9h da manhã a autora teria que apanhar o comboio que parte de VNFamalicão às 7h38m e que chega a VN Gaia às 8h25m. Aí apanharia o autocarro que a ré disponibilizou aos seus trabalhadores que, atentas as regras da experiência comum, se poderá presumir que demorará cerca de 10 minutos a percorrer os 5 km que distam da estação das Devesas às instalações da ré.
Note-se que o comboio seguinte, que sai às 8h chega às 8h49m, sendo que seria necessário que mal a autora chegasse à estação apanhasse o tal autocarro que a levaria às instalações da ré. Ora, ficou o tribunal convencido, com base nos depoimentos das testemunhas que os autocarros passavam ciclicamente pela estação e não que saía um autocarro a cada 5 minutos.
No trajecto de volta, sendo o seu horário de saída às 18h, depois de ir de autocarro até à estação das Devesas apenas conseguiria apanhar o comboio que parte às 18h45m, chegando a VN Famalicão às 19h12m.
Ao tempo destes trajectos, acresce o tempo que a autora demoraria a chegar de casa à estação de comboios e vice versa, o que, como a própria autora afirmou, é de cerca de 8 minutos.
Caso a autora viajasse de automóvel o tempo da respectiva viagem é o que consta dos aludidos “prints”.

A senhora juiz explicou fundamentadamente como chegou à matéria provada. E, ouvida a prova, designadamente as referidas testemunhas e atentos os documentos mencionados, não vemos que outra pudesse ter sido a resposta, nenhuma dúvida existindo quanto ao trajecto e tempo.
Quanto à alegada incongruência entre o facto de a autora ter de apanhar um autocarro entre Gaia e a nova sede da ré e o outro facto que diz que a ré assegurou a existência de um autocarro gratuito para transportar os trabalhadores, trata-se de uma aparente desconformidade que só existe se não atentarmos em todo o julgamento, globalidade dos factos e fundamentação da prova. Na verdade, o primeiro faco refere-se às condições da autora ao tempo da resolução. O segundo facto refere-se ao que se passou à posteriori, em que a ré acabou por assegurar tal transporte (tal como aliás resulta do tempo do verbo “assegurou”).
Da audição do julgamento resultou claro que a ré não informou em concreto a autora (e ao que parece outros trabalhadores) dos custos de deslocação que a empresa iria assumir, deixando-a numa incerteza até ao último momento. Tal resulta também evidente da comunicação de Julho/18 onde a ré confirma a transferência de local de trabalho e nada refere quanto à assunção de custos de deslocação. E este terá sido o grande problema. Só tardiamente a empresa decidiu assumir alguns custos.
E fizeram-no de uma forma dita “descendente”, isto é, sendo alguns trabalhadores abordados individualmente pelas chefias que depois reportariam aos RH, onde seria formalizada a assunção de custos e em que termos. A autora não foi abordada pela chefia-testemunha C. F.. Cujo depoimento foi vago quanto a este ponto e completamente inconsistente, face ao modo como foi mudando as suas declarações, as quais não condizem sequer com o depoimento da directora de RH, S. G., que reconheceu que a autora não foi chamada aos RH porque não falou com a chefia.
Improcede assim a alegação.

Diz a recorrente que deve ser não provada a matéria de facto vertida nas alíneas R) e S):

É esta a redacção das alíneas em causa:

R) A autora é, como sempre foi, responsável por levar o filho menor ao estabelecimento de ensino frequentado por este, pelo facto do seu marido se encontrar, por largos períodos de tempo, fora de casa e com horários incompatíveis com tais obrigações, tendo igualmente de o ir buscar ao mesmo estabelecimento de ensino após o horário escolar, o que sucede pelas 18:00 horas.
S) A autora não tem mais nenhum outro familiar a quem possa socorrer para cumprir com as referidas obrigações parentais.

Diz a recorrente que os depoimentos de C. S., L. S. e S. D., revelaram-se, também em relação a esta matéria, comprometido e parcial. Que a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo, deverá o Digníssimo Tribunal concluir que, no limite, apenas poderia resultar demonstrado nos autos o seguinte: A Autora era responsável por levar o filho menor ao estabelecimento de ensino frequentado por este e por o ir buscar ao ATL pelas 19h00.
Ouvida a prova também aqui a ré não tem razão. A prova foi no sentido respondido.

Concorda-se com a sentença que refere:

“Esclareceu o tribunal sobre as suas condições pessoais e familiares, tendo as mesmas, no essencial foram corroboradas pelas testemunhas C. S., L. S. e S. D..
A autora explicou, de forma lógica e coerente, a razão pela qual é a si que incumbe preparar, levar e buscar os filhos à escola o que fez de forma lógica que, de resto, está de acordo com a (ainda) maior parte das famílias da nossa sociedade. Mais explicou a razão pela qual o seu marido não o pode fazer – a saber, o facto de sair para trabalhar por voltas das 6 horas da manhã e o facto de ter um segundo trabalho num restaurante das 19h às 24h – e o facto de a sua filha também não o poder fazer, a saber porque anda na faculdade, não vivendo actualmente em Famalicão.
Esclareceu o tribunal sobre a necessidade do filho fazer terapia da fala, para o que foi também considerado o relatório de fls. 30 verso e 31.
Finalmente, descreveu a situação da sua família alargada.
As testemunhas C. S., L. S. e S. D. corroboraram, no essencial, as declarações da autora, relatando o que assistiram enquanto trabalharam com a autora. “

Nada há a criticar, está correcto o julgamento, em conformidade com o declarado pelas testemunhas e de modo que se afigura corresponder á realidade.

Diz a recorrente que que deve ser não provada a matéria de facto vertida na alínea U).

É esta a sua redacção:

U) No período pré-laboral, por voltas das 08:00 horas, a autora tem de providenciar pelo pequeno-almoço do seu filho e por levar à escola às 08:30 horas, sito em ..., o que deixava de o poder fazer com o seu novo local de trabalho, sendo que não podia deixar com mais ninguém.

Diz a recorrente que tal facto não foi comprovado.
Improcede a alegação, pois dos depoimentos das referidas testemunhas resulta claro que era a autora a assumir estas tarefas e nos termos provados.

Diz a recorrente que deve ser não provada a matéria de facto vertida na alínea W).
É esta a sua redacção:
W) Os encargos mensais do agregado familiar da autora, incluindo alimentação, vestuário, saúde, habitação, ascendem a 808€.

Diz a recorrente que tal facto não se encontra fundamentado.
Este facto resultou comprovado das declarações das testemunhas em causa o que se depreende de toda a fundamentação, não sendo exigível que o juiz diga facto a facto qual a fonte, sob pena de se transformar uma sentença numa peça infindável, não gerível, nem compreensível, ademais numa matéria que não se afigura ser de complexo alcance.
E quanto à ironia de se dizer que os encargos não podem coincidir ipsis verbis com o que ganha (808€), percebe-se facilmente que este ponto significa que a autora gastava todo o seu ordenado nos encargos que tinha.

Diz a recorrente que deve ser não provada a matéria de facto vertida na alínea X:
É esta a sua redacção:
X) A deslocação diária da sua casa para o estabelecimento da ré em V.N. Gaia e viagem de regresso ascende a um encargo mensal de, entre cerca de 60€ a 103,95€.

Diz a recorrente que as declarações de parte não revelam relevância probatória e os depoimentos de C. S., L. S. e S. D., revelaram-se este propósito, igualmente comprometido e parcial e/ou meramente conclusivo e genérico. Que os factos carreados e os papéis juntos aos autos pelo Tribunal a quo a título oficioso não podiam, nem deviam ter sido utilizados para fundamentar o que quer que seja a este respeito.
Também aqui carece de razão. As testemunhas revelaram o conhecimento suficiente sobre esta matéria, sendo tudo conjugado com os documentos oficiosamente junto pelo tribunal. Ademais, são de fácil apreensão os custos que decorrem da distância entre locais sobre a qual não se descortina dúvida, bem como dos meios de transporte que foram identificados como necessários e respectivos custos relatados pela prova até em valor superior, optando-se na decisão recorrida por um valor comedido e prudente. No mais, diga-se que o tribunal pode oficiosamente determinar as diligências que entender necessárias ao apuramento da verdade ao abrigo do princípio do inquisitório – 411º CPC.

Quanto à matéria não provada na alínea 6):

É esta a redacção do 6 da matéria não provada:

6) A ré disponibilizou o pagamento à autora do passe público, devendo, para o efeito, apresentar, mensalmente, o comprovativo de pagamento do mesmo, com o número de identificação fiscal da sociedade, e a ré reembolsaria a trabalhadora dessa despesa, o que a autora nunca fez, nem alguma vez mostrou interesse em beneficiar desta medida.

Diz a recorrente que com base nos depoimentos de C. F., E. S., S. G. e S. P. deve ser antes provado que:

A Autora tinha conhecimento, nomeadamente através da sua superiora hierárquica C. S. e através de conversas entre outras colegas de trabalho, que, por força da mudança de local de trabalho, a Ré lhe disponibilizaria o pagamento do passe mensal de transportes públicos e um autocarro gratuito entre a Estação das Devesas e as novas instalações da empresa.

Nesta matéria remetemos para o supra dito sobre a indefinição em que a ré deixou os trabalhadores, pelo menos alguns, não dando a conhecer atempadamente se assegurava os custos, quais, em termos concretos, e o que iria ser assegurado. Porquanto só assim a autora poderia avaliar a sua situação. O depoimento de C. F. já acima se assinalou que não mereceu valoração e porquê. De resto o depoimento da directora de RH, S. G. e as declarações de parte de S. P., confirmaram esta situação de indefinição, até certa altura, sobre aquilo que se iria custear e em que termos. E. S., gestora de produtos e também superior hierárquica da autora, igualmente confirmou que só bem mais tarde tiveram a informação concreta sobre as despesas que seriam pagas, e que tal foi comunicado pelos RH. Sendo certo que no caso da autora, como supra referido, foi pela directora de RH confirmado que este departamento não contactou a autora para este fim.

Quanto à matéria não provada na alínea 7):

É esta a redação do 7 da matéria não provada:

7) A ré procedeu à transferência dos trabalhadores no decurso do mês de Agosto, em período de férias escolares, para que os trabalhadores pudessem ter em conta essa transferência no momento da inscrição dos filhos, caso assim o entendessem, procurando, por esta via, minorar o impacto da mudança e evitar que os trabalhadores tivessem – caso o pretendessem – de transferir os filhos para outro estabelecimento – a meio do ano lectivo.

Diz a recorrente que deve considerar devidamente provado o seguinte:

“Em face do atraso que se verificava na obra de requalificação das novas instalações da Recorrente, o qual impediu a mudança no primeiro semestre do ano de2018, a data escolhida(agostode2018)teve também em conta o período de férias escolares, de modo a que os trabalhadores pudessem ter em conta aquela circunstância aquando da inscrição dos filhos nas escolas.”

Ora, igualmente aqui, esta matéria não encontra arrimo na prova produzida que foi apenas no sentido de a transferência depender do término das obras.
Improcede a alegação.

B – ENQUADRAMENTO JURÍDICO

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões dos recorrentes (5), e decididas já as questões de facto, as questões de direito a analisar são as acima sumariadas em sede de relatório.

A resolução do contrato de trabalho por mudança definitiva do local de trabalho:

Grande parte da oposição da ré alicerçava-se na alteração da matéria de facto, a qual foi já julgada improcedente. Logo, nesta parte decai a fundamentação da ré sobre a inexistência de justa causa objectiva de resolução do contrato.
Outra parte alicerçava-se em que a comunicação resolutiva seria inepta a produzir os efeitos pretendidos porque genérica e conclusiva, carecendo de indicação, ainda que sucinta, de factos concretos expressos que pudessem justificar o prejuízo sério.

Acolhe-se sem nenhuma reserva a fundamentação da sentença, em especial esta parte:

A resolução tem de ser comunicada por escrito, com a indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias seguintes ao conhecimento desses factos pelo trabalhador (artigo 395º). Na acção em que for apreciada a justa causa da resolução apenas são atendíveis os factos constantes da referida comunicação escrita (artigo 398.º, n.º 3).
Como salienta Pedro Furtado Martins (Cessação do contrato de trabalho, 4ª edição, pág. 582) ao contrário do que sucede com a nota de culpa, não se exige uma descrição circunstanciada dos factos, mas apenas a sua indicação sucinta.
Justifica este autor “Compreende-se a diferença. No primeiro caso, a descrição factual insere-se num procedimento de despedimento, sendo essencial para o trabalhador, já que as suas possibilidades de defesa dependem do conhecimento dos factos de que é acusado. No segundo, trata-se de anunciar à contra parte o fundamento de uma resolução imediata, em termos tais que permitam, se necessário, a apreciação judicial da justa causa alegada. Mas é indispensável indicar factos concretos que, no entender do trabalhador, consubstanciam o comportamento ilícito do empregador, em relação ao qual é declarada a resolução. Não basta, pois, a mera formulação de afirmações conclusivas sobre a actuação do empregador, desacompanhada de uma indicação factual mínima”.
No mesmo sentido, João Leal Amado defende “Não é, pois, indispensável proceder a uma descrição circunstanciada dos factos, bastando uma indicação sucinta dos mesmos, de modo a permitir, se necessário, a apreciação judicial da justa causa invocada pelo trabalhador” (Contrato de Trabalho, Noções básicas, 2016, Almedina, Coimbra, pág. 384).

Concorda-se e nada mais é necessário acrescentar. Improcede a alegação.
A questão da nulidade por alegada condenação em objecto diferente já foi acima abordada, remetendo-se para a sua fundamentação.

A questão da “precocidade” da resolução do contrato antes de ocorrer a transferência foi tratada na sentença nos seguintes moldes:

“Preliminarmente, dir-se-á que não tem qualquer fundamento o argumento aduzido pela ré no sentido de que não é possível a verificação de prejuízo sério resultante de factos que ainda não ocorreram.
De facto, não tem qualquer cabimento jurídico a interpretação das normas de que se vem falando no sentido de o contrato poder apenas ser resolvido depois da transferência efectiva do trabalhador.
É que, como explica Lobo Xavier, distinguindo o prejuízo sério do dano "O prejuízo hipotético, neste sentido, há-de ser achado através de uma avaliação diferencial ou de uma comparação entre a situação do trabalhador e aquela em que ele provavelmente estaria se tivesse sido transferido" – “O lugar da prestação do trabalho”, Lisboa, 1971, pág. 37.
Tem-se, assim, aqui em vista uma situação hipotética: aquela em que a autora se encontraria se tivesse sido transferida. “

Concorda-se plenamente, nada mais sendo preciso acrescentar.

Quanto ao mérito propriamente dito de justa causa na resolução do contrato:

Considerou-se na sentença que existia justa causa objectiva para resolver o contrato decorrente de uma alteração de local de trabalho que causaria prejuízo sério à autora.
Invocou-se o disposto no artigo 394º/3/b), CT que refere que constitui justa causa da resolução do contrato a alteração substancial e duradoura das condições de trabalho no exercício lícito de poderes do empregador. Norma conjugada com o artigo 194º/5 do C.T., nos termos do qual, no caso de transferência definitiva, o trabalhador pode resolver o contrato se tiver prejuízo sério, tendo direito à compensação prevista no artigo 366º, CT.
Acolhe-se a fundamentação expendida na sentença para a qual se remete em termos globais.

Em especial quanto ao “menor grau de exigência” na verificação da justa cauda invocada pelo trabalhador, comparativamente com a invocada pelo empregador, diz-se correctamente na sentença:

“A doutrina e a jurisprudência vêm entendendo este conceito de justa causa tal como este é empregue no âmbito do despedimento promovido pelo empregador, como a impossibilidade definitiva da subsistência do contrato de trabalho (cfr. Albino Mendes Baptista, Estudos sobre o Código do Trabalho, 2.ª edição, pág. 25 e seg.).
Todavia, como bem refere Júlio Gomes, na apreciação da justa causa de resolução o limiar da gravidade do incumprimento do empregador que justifica a resolução pode situar-se abaixo do limiar do incumprimento do trabalhador que justifica o despedimento. É que, apesar de existir um núcleo comum aos dois conceitos de justa causa, eles não são absolutamente ou idênticos, nomeadamente quanto ao grau de intensidade que a violação concreta dos direitos da contraparte tenha de atingir para se considerar inexigível a continuação da relação num e noutro caso, já que o empregador dispõe de outros meios de auto tutela do seu interesse, nomeadamente as sanções de natureza conservatória, pelo contrário o trabalhador não dispõe de outro mecanismo que não seja o da resolução do contrato (cfr. “Direito do Trabalho”, I, Coimbra, 2007, pág. 1044-1045).
A justa causa é apreciada pelo tribunal em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 351.º - cfr. n.º 4 do artigo 394.º.
Assim, deverá o tribunal atender ao grau de lesão dos interesses do trabalhador, ao carácter das relações entre as partes e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes. “

Seguidamente na sentença considerou-se que o prejuízo sério resultava do aumento dos custos de deslocação cujo pagamento a ré não assegurou previamente que seriam custeados, associado ao aumento irrazoável do tempo de deslocação que não permitiria a autora exercer as responsabilidades parentais.
Não podemos deixar de enfatizar o primeiro aspecto, porquanto desde logo decorre de lei que em caso de transferência definitiva de local de trabalho “O empregador deve custear as despesas do trabalhador decorrentes do acréscimo dos custos de deslocação…” 194/ 4, CT.
Ora, como referimos em sede de impugnação da matéria de facto, a ré não se disponibilizou a pagar os custos de deslocação. Só o fez a posteriori com a transferência e, aparentemente, em face das reivindicações de alguns trabalhadores. Seja como for, provou-se que à autora não foi assegurado o pagamento das despesas acrescidas de deslocação inerentes á mudança do local de trabalho.
Ora, note-se que este cenário representaria uma diminuição do salário da autora que poderia ascender a cerca de 100€, o que no conjunto do seu salário baixo (808€) é uma parcela muito significativa e, em nosso entender, incomportável (além de ilegal), considerando também que o salário era todo consumido nas despesas essenciais.
A atitude da ré não só foi ilegal, como irrazoável e incompreensível, pois bastaria assegurar as despesas de transporte em carro para a autora ficar colocada em situação completamente diferente.
Na verdade, esta recusa repercute-se também nos outros dois fundamentos de justa causa, que não verdade se fundem, em termos de importância, num só argumento principal. Que é o de que a transferência de local de trabalho nos moldes em que a autora o anteviu no momento da resolução do contrato (pois como se explica na sentença é este o momento temporal a atender), tal impediria a autora, face aos horários e ao tempo de deslocação, de exercer as suas funções parentais. Repara-se que o filho tinha à data apenas 7 anos, sendo a autora que o levava e trazia da escola, criança que necessitava ainda de cuidados de terapia de falta 2xsemana, não existindo outro familiar que pudesse desempenhar estas tarefas.
Portanto, ao contrário do referido pela ré do que se trata não é de um incómodo de maior tempo de deslocação de cerca de uma hora de ida e outra de regresso, estamos a falar de um aumento de tempo de deslocação que impede exercício de outros direitos pessoais de importância, atenta a idade do menor e sua situação de saúde, e limitações familiares.

Concorda-se assim com a conclusão da decisão recorrida que diz:

Tudo ponderado, a alteração do local de trabalho da autora para VN Gaia, para além de colocar irremediavelmente o exercício pleno dos direitos e deveres de mãe da autora, que deixava de poder levar e buscar o filho à escola e às sessões bi-semanais de terapia da fala, sendo que não tem mais ninguém a quem possa pedir para o fazer; que iria levar a autora a suportar custos de deslocação de cerca de 1/6 do seu salário – pouco acima do valor do salário mínimo nacional e de igual valor às despesas quotidianas mensais que a autora suporta – e iria acrescer cerca de 1 hora e 20 minutos em cada viagem que teria de fazer para trabalhar, o que se traduziria num penoso sacrifício de consequências profundamente negativas na sua vida pessoal e familiar.

Justifica-se, portanto, a resolução do contrato operada pela autora, sendo que tal conclusão, pelo supra dito, é incompatível e afasta o seu contrário, alegado pela ré de que a autora não agiu com boa fé, que assim se afasta.

Dos créditos por falta de formação profissional

Nesta parte a ré tem razão. Da matéria provada nada consta a este título.
Ora, para haver direito a tal crédito teria de se ter provado que a ré não lhe proporcionou a formação prevista na lei – artº 131 e 134.º do CT.
O ónus da prova de que o empregador não prestou a formação profissional cabe ao trabalhador (6) - 342/1 do CC.

Procede assim esta alegação.

I.I.I. DECISÃO

Pelo exposto, de acordo com o disposto nos artigos 87º do C.P.T. e 663º do C.P.C., acorda-se em revogar a decisão recorrida na parte referente à condenação da ré em créditos de formação profissional e em confirmar, no mais, a decisão recorrida.
Custas a cargo da recorrente e recorrida na proporção do decaimento
Notifique.
Guimarães, 20-02-2020

Maria Leonor Chaves dos Santos Barroso (relatora)
Antero Dinis Ramos Veiga
Vera Sottomayor



1. Segundo os artigos 635º/4, e 639º e 640º do CPC.
2. António Santos Abrantes Geraldes e outros, Código de Processo civil Anotado, Vol. I, p. 728-730.
3. Salvo especialidades probatórias.
4. Referindo-se às limitações da 2ª instância quanto a factores coligidos pela psicologia judiciária e no sentido de evitar alterações quando não seja possível concluir com segurança pela existência de erro, vd António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Código de Processo Civil, 5ª ed., p.s 292, 299, 300.
5. Segundo os artigos 635º/4, e 639º e 640º do CPC, o âmbito do recurso é balizado pelas conclusões do/s recorrente/s.
6. AC. RL 30-11-2016.