Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
26068/22.0YIPRT.G1
Relator: JOSÉ FERNANDO CARDOSO AMARAL
Descritores: CONTRATO DE EMPREITADA
REPARAÇÃO DE DEFICIÊNCIAS
CONFISSÃO FICTA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/02/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. Alegando-se como causa de pedir, numa acção em que o empreiteiro peticiona a condenação dos donos da moradia onde realizou certos trabalhos, a pagar-lhe o preço correspectivo, compete-lhe provar que com estes celebrou o alegado e concreto contrato de empreitada respetivo, nos termos do artº 342º, nº 1, do CC.
II. Negando os donos do imóvel que hajam celebrado tal contrato e motivando a sua impugnação com a alegação de que os trabalhos consistiram em reparações de deficiências subsistentes na obra de construção da moradia executada pela autora e, portanto, que apesar de executados, nada devem por eles, o reconhecimento de que efectivamente não os pagaram e que eles foram feitos não constitui confissão ficta dos factos integrantes da causa de pedir mas antes impugnação motivada dos mesmos.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. RELATÓRIO [[1]]

V... - Sociedade de Construções, Ldª, requereu, em 17-03-2022, a notificação, em procedimento injuntivo, de AA e de BB para lhe pagarem a quantia de 6.231,66€ (preço, juros, despesas com o processo e taxa de justiça), invocando, como causa, um contrato de empreitada entre eles celebrado em 30-08-2015, tendo por objecto o fornecimento e colocação de capoto numa sua casa, após apresentação de proposta e aceitação da mesma e do preço nele indicado, que não pagaram, apesar da obra concluída e da interpelação para o efeito.

Na oposição, os requeridos, além de excepcionarem a prescrição, da alegada dívida (item 3) negaram a sua existência (item 5), dizendo que os únicos trabalhos executados o foram exclusivamente no âmbito da empreitada de edificação daquela moradia, cujo preço pagaram na totalidade, e da correcção de defeitos por si reclamados (itens 6, 15 e 17 a 22).

A requerente apresentou resposta (com 96 itens), repetindo o alegado no requerimento inicial, refutando a aplicação ao caso da alegada excepção, enfatizando, por um lado, que os réus confessam a realização de uma “obra” e que, portanto, admitem, implicitamente, a celebração do alegado contrato (itens 38 e 40) e, por outro, que eles “procedem à negação dos factos constitutivos invocados pela A.” (item 57).

Após audiência de discussão e julgamento (cfr. acta), foi proferida, com data de 03-10-2022, pelo Tribunal ..., onde fora distribuído o processo como acção para cumprimento de obrigações pecuniárias, sentença de improcedência totalmente absolutória.

A autora não se conformou e apelou à revogação do assim decidido e condenação dos réus no pedido, apresentando longa peça recursiva com 73 páginas, repartindo-se as alegações por 195 parágrafos numerados e as conclusões por outros 95 ocupantes das últimas 15 páginas, que são, em grande parte, a repetição daquelas, incluindo transcrição de depoimentos, e que, por isso e por manifestamente não observarem o comando do nº 1, do artº 639º, do CPC, aqui nos escusamos de inserir.

Na resposta, os réus, salientaram que a autora não provou o contrato alegado, que, aliás, não existiu, que a decisão da matéria de facto não foi objecto de impugnação (por ela se limitar a transcrever os depoimentos) e que, por isso, deve improceder o recurso e confirmar-se a sentença.

O recurso foi admitido como de apelação, a subir de imediato, nos autos, com efeito devolutivo, na circunstância tendo a Mª Juíza recorrida apreciado e indeferido (artºs 617º, nº 1, e 641º, nº 1, do CPC) as nulidades arguidas.

Corridos os Vistos legais e submetido o caso à apreciação e julgamento colectivo, cumpre proferir a decisão, uma vez que nada a tal obsta.

II. QUESTÕES A RESOLVER

(…)

Dos 95 parágrafos apresentados a pretexto de conclusões ao longo de 15 páginas, em que a recorrente, mais do que sintetizar o que pede e os fundamentos para tal, alega vasta e desordenadamente (e, ainda não satisfeita, amiúde remete para o teor do texto das alegações, dando-o por reproduzido, com o argumento da economia processual), não é tarefa fácil identificar e organizar, certa e logicamente, as exactas questões merecedoras de apreciação (artº 608º, nº 2, CPC). [[2]]

Ainda assim [[3]], colhe-se daquelas que, grosso modo, ela questiona, com múltiplos argumentos de diversa natureza, sobretudo a decisão da matéria de facto e a de direito, mormente quanto aos pontos não provados essenciais C, D, E e F, imputando à sentença diversos erros e invalidades.

Assim, em suma, importa decidir se aqueles pontos devem ser considerados provados, consequentemente demonstrada a celebração do contrato de empreitada invocado como causa de pedir e o incumprimento da obrigação de pagamento do preço e se, assim, deve ser revogada e substituída a sentença por decisão condenatória dos recorridos no pedido.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Na sentença, foram dados como provados os seguintes factos:

“1. A A., é uma sociedade comercial denominada “V... - Sociedade de Construções, LDA”, com o NIF: ... e com sede na Estrada Nacional ...12, ..., ..., ..., Concelho ..., Distrito ....
2. Encontra-se junto aos autos o documento datado de 24 de Agosto de 2015 e designado de “proposta de orçamento”, onde se prevê que o preço dos trabalhos (4 000,01 €) seria pago em duas prestações: 50 % no início dos trabalhos e 50 % no final dos trabalhos.
3. A Autora procedeu à colocação de “Capoto” na parede lateral direita da obra e colocação de granito ... nos dois esquinais da referida parede e à volta das janelas existentes nessa parede na habitação sita na rua ..., ..., ....
4. A Autora iniciou o trabalho referido em 3 no Verão do ano de 2016.
5. Em inícios de Setembro de 2016 o trabalho foi concluído tendo a Autora através da conta de e-mail do seu Gerente, enviado fotografias dos trabalhos concluídos e o n.º de conta bancário para o meio de contacto que os RR. lhe facultaram.
6. A Autora emitiu a Fatura n.º ...9 datada de 30/09/2016, no valor de € 4.000,01, referente aos trabalhos referidos em 3, tendo-a enviado aos RR.
7. Os Réus até à data não pagaram a fatura referida em 6.
8. A A., no dia 12-09-2016, enviou e-mail ao contacto fornecido pelos RR. a declarar a conclusão das obras e a questionar a quem entregava o comando da porta da garagem da habitação referida em 3.
9. A A., por diversas vezes, interpelou os RR. para que estes procedessem ao pagamento da fatura referida em 6, nomeadamente:
- Em 30/12/2016, por via e-mail para o meio contacto fornecido pelos RR.
- Em 20/01/2017, por via de carta registada com aviso de receção para a residência dos RR.
- Em 18/02/2017, por via de carta registada com aviso de receção para a residência dos RR., que foi devolvida por não ter sido levantada nos correios.
- Em 21/04/2017, por via e-mail para o meio de contacto fornecido pelos RR.
- Em 18/06/2018, por via de carta registada com aviso de receção para a residência dos RR.
10. Os Réus procederam à notificação avulsa da Autora na qual lhe exigem a correção dos defeitos da obra contratada e a reparação da parte da obra feita de forma incorreta ou em desconformidade com o contratado, aí se tendo feito constar que:
a) “Em obra foram executadas lajes aligeiradas pré-esforçadas e fabricadas com abobadilha de 15 cm de altura, no pavimento do piso 1, e de 12 cm de altura no pavimento do vão de cobertura, em desacordo, com o que estava previsto em projeto.
b) As lajes aligeiradas executadas em obra não foram as mais indicadas para os vãos e cargas existentes, sendo esta a maior deficiência para o funcionamento da estrutura resistente do edifício, nomeadamente, por permitirem excessiva flecha provocando fissuração de tetos e paredes e não garantido as sobrecargas máximas de projeto;
Todos os anos o requerente se desloca à obra e se compromete a realizar a obra e corrigir todos os defeitos da mesma, nomeadamente:
c) Execução de estrutura metálica, e respetivas fundações, conforme peças desenhadas;
d) Regularização de pavimento e colocação de mosaico, no pavimento do piso 0, nas zonas das fundações;
e) Tratamento de fissuras em tetos e paredes, interiores exteriores;
f) Execução de paredes e tetos falsos em placas de gesso cartonado, conforme peças desenhadas, para “camuflagem “da estrutura metálica;
g) Peças em madeira decorativas, conforme peças desenhadas, fixadas nos pilares metálicos ao nível da sala;
h) Pinturas de paredes e tetos, interiores e exteriores, intervencionados;”
11. A notificação avulsa referida em 10 apenas veio a ser realizada em fevereiro de 2022, na pessoa do Sr. CC.”.

E foram julgados não provados os seguintes:

“A. A Ré AA, com o NIF: ..., é proprietária de uma habitação sita na rua ..., ..., ..., Concelho ..., Distrito ....
B. O Réu BB, é casado com a Ré AA.
C. Os Réus solicitaram à Requerente a elaboração de um orçamento para a realização dos trabalhos referidos em 3.
D. A “proposta de orçamento” referida em 2 foi aceite pelos Réus.
E. Foi celebrado contrato verbal entre as partes onde ficou acordada a realização dos trabalhos referidos em 3.
F. Os Réus aceitaram a obra realizada pela Autora após o seu termo.
G. A A. tentou interpelar os RR. através de chamada telefónica, quer para o n.º de telemóvel de ambas, quer para o n.º de telefone fixo, contudo os RR. nunca atenderam as chamadas daquela.
H. A conduta dos RR. tem causado danos à Autora.
I. Tudo acordado e reconhecido pelo representante da requerida, CC, quer perante os requeridos, quer perante o engenheiro responsável, quer do mandatário, das inúmeras deslocações que ali fizeram.
J. Logo na data da entrega da obra o responsável pela requerente assumiu que a obra tinha defeitos e foi construída em desconformidade com o projetado.
K. Desde essa data que mais de uma dezena de vezes se deslocaram ao local para resolver a questão, aceite por todos, sem sucesso.
L. Os únicos trabalhos que ali realizou foram os contratados e pagos e algumas correções de obra por defeitos e obras indevidamente realizadas, como o próprio aceitou.
M. Nomeadamente, a entrada de humidade em todas as paredes do ... mercê das deficiências de isolamento que a requerente fez ao nível das fundações,
N. Das humidades no vão de escadas e no ... andar, nomeadamente quando chove, que nem a mudança dos alumínios efetuado pelo requerente, a conselho e imposição da requerida e dos seus responsáveis, mudou.
O. As únicas deslocações depois do fim da obra foram sempre e exclusivamente para tentar reparar os defeitos e remoção da humidade.
P. O que somente resultou no vão de escadas.
Q. Apesar do mau trabalho, dos defeitos e da desconformidade da obra com o projetado e acordado e pago, pagamento que os requeridos fizeram devido aos pedidos insistentes do responsável da requerente.”.

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Como acertadamente refere a apelante nas suas extensíssimas alegações (nºs 34 e 134), o “objecto do processo é definido nos articulados, mais concretamente, no pedido, na causa de pedir e nas excepções deduzidas” e, no caso, ela (sociedade) “invocou na sua causa de pedir um contrato de empreitada”, celebrado com o casal de réus, “como facto constitutivo da obrigação” de estes lhe pagarem a quantia peticionada.

Com efeito, olhando ao requerimento injuntivo, apresentado no BNI em 17-03-2022, consta nele indicado, como causa do seu alegado crédito, um contrato de empreitada (verbal), datado de 30-08-2015.

Mais precisamente, segundo a “exposição dos factos que fundamentam a pretensão” formulada e daí recortando os essenciais:

“4-Os Requeridos solicitaram à Requerente a elaboração de um orçamento para a realização de uma empreitada de fornecimento e colocação de "Capoto", na habitação descrita […]”.
5-Para tal, a Requerente em 24 de Agosto de 2015, elaborou proposta de orçamento, para realização dos referidos trabalhos.
6- A proposta de orçamento foi aceite pelos Requeridos; Após a aceitação da proposta de orçamento, foi celebrado entre as partes, contrato verbal de empreitada.
7-O trabalho a realizar (conforme proposta de orçamento) consubstanciava-se na colocação de capoto em placas eps de 6 cm, na parede lateral direita da obra, devidamente arrematada da ... ou DD e na colocação de granito ... nos dois esquinais da referida parede e à volta das janelas existentes nessa parede.
8-O preço dos trabalhos referidos no número anterior foi orçamentado em 4000,01 €, conforme a proposta de orçamento aceite pelos Requeridos.”

Em face da sua notificação injuntiva, os requeridos deduziram oposição e, nela, invocaram:

-em primeiro lugar, que o alegado crédito está prescrito (pelo decurso do prazo de 2 anos referido na alínea b), do artº 317º, do CC);
-em segundo lugar e “por mera cautela”, que “tal dívida não existe” (item 5, do articulado) e que “Todos os montantes devidos pela obra que foi contratada pelos requeridos à requerente foi integral e atempadamente paga” (item 6).

E mais acrescentaram que a autora age de má fé (itens 7 e 14) em “retaliação” por a terem, mediante notificação judicial avulsa, interpelado para corrigir defeitos da “obra contratada”, que “não é verdade que tenha realizado trabalhos não pagos” (item 15), que “Os únicos trabalhos que ali realizou foram contratados e pagos e algumas correções de obra por defeitos e obras indevidamente realizadas” (item 17), que “As únicas deslocações que depois do fim da obra foi sempre e exclusivamente para tentar reparar defeitos e remoção da humidade” (item 20) e que “Apesar do mau trabalho, dos defeitos e da desconformidade da obra com o projetado e acordado e pago, pagamento que os requeridos fizeram, indevidamente e na totalidade, devidos aos pedidos insistentes do responsável da requerente” (item 22).

Concluíram, assim, que deve considerar-se prescrita tal dívida ou o pedido julgado improcedente por não provado.

Juntaram a cópia de uma notificação avulsa efectuada em 23-02-2022 à autora e a CC onde alegam que celebraram com este um contrato de empreitada “para realização de obras no imóvel”, obras estas “realizadas com defeitos ou realizadas em desacordo com o que constava no projeto e havia sido convencionado”, que aquele se comprometeu a reparar mas não cumpriu, por isso o notificando, para o efeito, com cominações.

Ora, joeirando as maçudas alegações e conclusões, consegue apreender-se nelas que, a toda a argumentação da recorrente no sentido de que a sentença é não só nula como padece de erro de julgamento na decisão de facto e na decisão de direito, subjaz, como essencial, a pretensão recursiva de que, sobre o alegado contrato, não deveria sequer ter sido produzida prova, uma vez que a factualidade inerente não foi impugnada na oposição, ela tem-se por acordada e confessada “por escrito” e, portanto, que os pontos de facto não provados C, D, E e F – integrantes da causa de pedir – deveriam ter sido considerados plenamente assentes (“admitidos por acordo”, nos termos do artº 607º, nº 4, CPC).

Em causa está, portanto, fundamentalmente, não uma impugnação da decisão (livre) da matéria de facto em sentido próprio, com o pressuposto e com o objectivo de a parte pretender a sua correcção/modificação com base em erro de julgamento provocado por deficiente análise e valoração dos meios de prova (artº 640º), mas, diversamente, no erro que consistiria em, face ao “acordo” ou “confissão”, não se atentar e considerar estar-se, afinal, ante prova vinculada que necessariamente devia ter sido atendida, mas não o foi, e que impõe a modificação.

Como é bom de ver, a situação problematizada prende-se com a modalidade de confissão judicial nos articulados, não propriamente uma confissão escrita em documento próprio nem feita fora daqueles pelos réus, ainda que na audiência (artºs 355º, nºs 1 e 2, 356º), a qual deveria ser inequívoca e, reunindo as condições legais, teria, então, força probatória plena (artºs 357º, nº 1, e 358º, todos estes do CC).

Mais precisamente: trata-se da chamada confissão ficta de que, segundo o Acórdão do STJ, de 20-06-2018 [[4]], fala a Doutrina “para designar o efeito probatório que se extrai do silêncio da parte sobre a realidade de um facto alegado pela parte contrária, seja por pura falta de contestação, ou por falta de impugnação desse facto, em contestação ou outro articulado, em inobservância do ónus de impugnação”. [[5]]

Com efeito, além da hipótese do artº 567º, CPC (revelia do réu), o artº 574º, a propósito do chamado ónus de especificação, estabelece que:

“1 - Ao contestar, deve o réu tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor.
2 - Consideram-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, se não for admissível confissão sobre eles ou se só puderem ser provados por documento escrito; a admissão de factos instrumentais pode ser afastada por prova posterior.”.

A este propósito discorrem, esclarecidamente e nos seguintes termos, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre [13]:

“Direta ou indireta, a impugnação repousa normalmente numa certeza. O réu afirma que o facto alegado pelo autor não se verificou ou que se verificou outro facto com ele incompatível. A afirmação e negação constituem declarações de ciência, que são informações sobre a realidade, baseadas no conhecimento do declarante: trata-se de manifestações da esfera cognoscitiva sobre fragmentos da realidade que é objeto do conhecimento. Mas pode acontecer que o réu esteja em dúvida sobre a realidade de determinado facto e, neste caso, a expressão dessa dúvida é suficiente para constituir impugnação se não se tratar de facto pessoal ou de que o réu deva ter conhecimento, valendo como admissão no caso contrário (nº 3). Constitui facto pessoal ou de que o réu deve ter conhecimento, não só o ato praticado por ele ou com a sua intervenção, mas também o ato de terceiro perante ele praticado (…), ou o mero facto ocorrido na sua presença, e ainda o conhecimento do facto ocorrido na sua ausência (…)” [[6]]

Ora, na oposição, os réus tomaram posição clara e definida ante aqueles factos constitutivos da causa de pedir de onde pretensamente emerge o crédito.

Além de, à cabeça, invocarem a prescrição presuntiva deste – ou seja, de que, em face do prazo decorrido, se presume o pagamento solicitado – e, portanto, excepção impeditiva de aquele lhe ser exigido, podendo recusá-lo, impugnaram a existência de qualquer dívida relativa à obra contratada, alegando, por um lado, que pagaram todo o preço dela (obviamente da empreitada geral da construção da vivenda), refutando que hajam sido realizados trabalhos não pagos (ou seja, alegados trabalhos, extra ou objecto de um autónomo contrato de empreitada, traduzidos na colocação de capoto e a tal destinados) e que os realizados na sua casa foram feitos e pagos no âmbito da dita empreitada geral e de correcção de defeitos.

Trata-se, pois, de uma impugnação definida dos factos alegados no requerimento de injunção alusivos ao aqui invocado contrato de empreitada alegadamente celebrado em 30-08-2015 ou, pelo menos, estão eles em oposição com a defesa considerada no seu conjunto: nenhum foi acordado nem feito fora das obrigações decorrentes da empreitada geral que remonta a data muito anterior e, por isso, tendo o preço daquela sido pago na íntegra, nada mais é devido, nenhuma dívida subsiste.

E de uma impugnação motivada: todas as intervenções, segundo a oposição dos demandados, teriam sido realizadas no âmbito da reparação de defeitos, mormente da infiltração de humidade através da parede intervencionada, e não no do cumprimento, por parte da empreiteira, de uma obrigação emergente do autónomo e concreto contrato de 30-08-2015 (o alegado) a que haveria de corresponder, uma vez demonstrado o mesmo, a sinalagmática obrigação correspectiva de os donos da obra lhe pagarem o preço.

Tal se torna ainda mais evidente se se tiver em conta a notificação avulsa junta pelos réus com o seu articulado e através da qual estes interpelam a autora e seu sócio CC para repararem os defeitos denunciados e, bem assim, o documento junto no decurso da audiência em que aquele requerido, por documento assinado em 06-08-2006, declarou que alterou o projecto de estabilidade sem consentimento e sem conhecimento dos réus e do técnico da obra e que assumia as responsabilidades inerentes.

Não é, pois, correcto afirmar-se que os réus apenas invocaram a prescrição e o cumprimento (pagamento) e que nunca negaram a celebração deste concreto contrato de empreitada invocado como causa da injunção de pagamento.

O que eles não negaram foi que os ditos trabalhos (de colocação do capoto) foram feitos (e que não foram pagos como autónomos) . Mas impugnaram que tal fosse prestação típica do contrato invocado como causa de pedir, que por eles tivesse sido estipulado um preço e ao pagamento deste se houvessem vinculado.

Relembre-se, aliás, que, a apelante, no seu articulado de resposta à contestação dos apelados, não deixou de concordar e notar que estes “procedem à negação dos factos constitutivos invocados pela A.” (item 57), assim emergindo como incoerente a tese por que, a diversos títulos mas com base no mesmo argumento, agora batalha denodadamente ao longo das densas alegações de recurso.

Sendo assim, como é, cai pela base a argumentação da recorrente sobre a admissão por acordo ou confissão dos factos integrantes do alegado contrato de empreitada.

Logo, não estava ela (autora) dispensada do encargo cometido pelo artº 342º, nº 1, do CC: cabia-lhe provar os factos integrantes da causa de pedir.

Nem ocorreu, como diz, qualquer presunção de incumprimento da obrigação de pagar o preço que competisse aos réus ilidir, por força do artº 350º, conjugado com o 799º, do CC.

Assim como cai pela base a tese concomitante alardeada de que os réus alteraram, na audiência de julgamento, a sua defesa e que a “substituíram” pela “excepção peremptória de celebração de um acordo de remoção de defeitos”!

É que, nessa circunstância, não foi feita qualquer alteração de tal género. O que aconteceu foi, naturalmente, que a produção da prova e a discussão não deixaram de incidir sobre a questão de saber se a alegada empreitada da obra de colocação do capoto tinha sido acordada como contrato independente ou se, diversamente, os trabalhos respectivos foram executados no âmbito da reparação dos vícios da empreitada geral que remonta a 2006 e da qual, segundo os réus, persistiram.

Exemplo disso se encontra nas declarações prestadas pela ré esposa – já que nenhuma testemunha algo mostrou saber sobre a negociação e conclusão do invocado contrato em 2015 –, declarações estas que a autora transcreve na íntegra e cuja fiabilidade, ela própria, não pôs em causa.

Disse aquela que “O que foi combinado na altura foi para tirar a humidade fazer o capoto, foi o que a gente acordou, nunca foi dito a nenhuma parte para pagar, compôs simplesmente, entrava lá muita água”; “Não, não foi concordado fazer orçamento nenhum, simplesmente foi para compor”; “nunca foi acordado um orçamento para ter uma fatura a pagar”. Perguntada, aliás, pela Mª Juíza, sobre se “nunca pagou esta fatura”, respondeu, confirmando que não: “Claro, nunca houve factura, primeiro houve, não sei porquê, porque não foi esse o acordo”; sobre comunicações a pedir-lhe o pagamento, reiterou: “Não foi isso que concordámos, por isso não teria que pagar, nem houve uma factura de pagamento, se só foi ele insistia que o capoto não ia resultar, e a gente teve que fazer a experimentação numa parede.”

Daí que o reconhecimento de que a autora executou os trabalhos de colocação de capoto não significa admissão implícita de que ela celebrou com os réus o concreto e autónomo contrato de empreitada de 30-08-2015 tendo-os por objecto e obrigando-se a pagar-lhos.

Deste modo, não ocorre qualquer erro de aplicação da lei ao terem sido considerados controvertidos os factos das alíneas C, D, E e F (que vieram a ser julgados não provados), não se tratando da desconsideração indevida de confissão (apesar das “aceitações” brandidas no longo articulado de resposta apresentado pela autora), nem de consideração indevida de qualquer “substituição” da defesa que os réus hajam promovido à revelia do indicado artº 573º, CPC, e o tribunal consentido, censuravelmente, na audiência.

Não estando provados “plenamente” por acordo das partes ou por confissão reduzida a escrito – como enfatiza a recorrente – os factos cruciais, não tem qualquer sentido argumentar-se que a Mª Juíza “malogrou em definir o objecto do processo” a pretexto de também consideraram que, na sentença, foi omitida a consideração de que nunca os réus negaram a celebração do contrato de empreitada e que apenas se referem nela a excepções de cumprimento/pagamento e de prescrição. [[7]]

É que – repete-se – os réus impugnaram motivadamente qualquer dívida com fundamento no alegado contrato.

Sendo, portanto, efectivamente controvertidos e, por isso, carecidos de prova os factos essenciais (alíneas C, D, E e F), haverá erro de julgamento que deva ser corrigido?

As alegações e as conclusões apresentadas não mostram, de forma evidente, uma verdadeira impugnação nos moldes do artº 640º (como defendem os recorridos) nem um escrupuloso cumprimento total dos ónus aí estabelecidos.
(…)
Pelo que resultaram não provados os factos referidos em C) a F).”.

(…)
E, enfim, face ao já dito quanto aos C, D, E e F, não há lugar a qualquer alteração da decisão da matéria de facto.

Não a havendo aí, também a não haverá na de direito [[8]].

Além de, como já se disse mais atrás, dos factos circunstanciais provados não resultar a demonstração dos essenciais, constitutivos da causa de pedir invocada, muito menos a “prova” do direito de crédito respectivo, vale o que acertadamente consta da sentença e em relação à qual se não descortina nem foi invocada razão procedente de censura:

“No caso decidendo, pese embora tenha resultado assente que a autora emitiu e enviou aos réus a fatura onde se mostra inscrita a quantia peticionada nos autos, não resultou provado qualquer outro facto constitutivo do direito pela autora invocado, designadamente que a autora se haja obrigado a realizar certa obra perante os réus, mediante o pagamento do respetivo preço.
Em face do exposto e sem necessidade de mais considerações, soçobrando os requisitos do instituto da responsabilidade contratual à luz do qual pretendia a autora obter provimento na sua pretensão, impõe-se concluir pela absolvição dos réus.
[…]
Outras quantias:
A Autora vem ainda peticionar, a título de “Outras quantias”, o pagamento da quantia de € 600,00.
Contudo, conforme decorre do requerimento injuntivo, a este propósito não alegou a Autora quaisquer factos que pudessem eventualmente justificar a condenação dos Réus no pagamento daquele montante.
Por outro lado, também não se mostra aplicável no caso o disposto no artigo 7.º do DL n.º 62/2013, de 10 de Maio, por não estarmos no caso perante transação comercial entre empresas, já que os Réus são pessoas singulares.
Pelo exposto, sem necessidade de quaisquer outras considerações, absolvo igualmente os Réus do pagamento da quantia peticionada pela Autora a título de “Outras quantias”.
*
Não se atenderá ainda ao pedido de reembolso da taxa de justiça paga, no valor de € 102,00, uma vez que este valor é levado em linha de conta nas custas, designadamente a título de custas de parte, nos termos do disposto nos artigos 7.º, n.º 4, parte final, e 25.º e seguintes do Regulamento das Custas Processuais.
Pelo que, tendo o requerimento de injunção sido transmutado em ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, não se aplica a partir desse momento o disposto no artigo 10.º, n.º 2, al. f) e 12.º, n.º 1 do DL n.º 269/98, de 1 de Setembro.”

Do mesmo passo, falece a pretensão de que os réus sejam condenados como litigantes de má fé.

Com efeito, não se evidenciam quaisquer factos consubstanciadores, objectiva e subjectivamente, de alguma das hipóteses previstas no artº 542º, CPC, sendo certo, de resto, que a tese dos réus foi e se mantém acolhida, o que mais afasta a alegada actuação atentatória da boa fé exigida no artº 8º e alegadamente causadora de danos cuja indemnização a este título se pretendia.

De resto, como na sentença se refere, acabou por ficar prejudicada a questão da prescrição, que pressupunha naturalmente a da prova da celebração válida e da vigência obrigatória entre as partes do concreto contrato de empreitada de 30-08-2015 e, como efeito dele, a estipulação da prestação creditícia exigida aos réus como sendo da responsabilidade destes. [[9]]

Acrescente-se, embora tal nem fosse necessário (face até ao disposto no artº 665º, CPC), que de nenhuma das imputadas nulidades a sentença padece.

Ela é claríssima no que decidiu e nos fundamentos em que se baseou, seja quanto à decisão de direito, seja quanto à de facto. A própria motivação desta cumpre escrupulosamente o exigido nos nºs 4 e 5, do artº 607º, maxime quanto aos não provados. Não há aí insuficiência, generalidade nem conclusividade censuráveis.  Não se perfila – ao contrário do alegado – qualquer ambiguidade nem obscuridade que a tornem ininteligível – artº 615º, nº 1, alínea c), segunda parte.

Se a apelante “não compreende, pois, não percebe, porquê que existe uma ausência de prova”, não nos parece que a dificuldade advenha do teor da sentença, onde tal bem se explica.

Não ocorre qualquer falha por ela não ter considerado factos admitidos por acordo ou por confissão reduzida a escrito, como já se viu ou por não se ter pronunciado sobre “excepção peremptória de inexistência da dívida” [[10]]. Ainda que aquela desconsideração ocorresse, tal não configura o vício da alínea d), do nº 1, primeira parte, do artº 615º. Tratar-se-ia de erro de julgamento e não de nulidade. A inexistência da dívida, alegada no pressuposto da celebração do contrato de empreitada invocado como causa de pedir, constitui impugnação dos factos consubstanciadores desta (de resto apreciada e decidida) e não propriamente “questão” no sentido relevante para este alegado efeito [[11]], já que tal se não confunde com argumentos, muito menos quando eles são abstractamente aduzidos e apartados da realidade processual a que temos – todos – de nos cingir. [[12]]

Também não se verifica excesso de pronúncia – artº 615º, nº 1, alínea d), segunda parte. A alegação de que “não podem os réus invocar excepções que não invocaram oportunamente” prende-se com a de que eles vieram “substituir”, na audiência, a excepção invocada pela de inexistência da dívida, mormente pela alegação de que os trabalhos realizados o foram no contexto da reparação de defeitos.

Ora, como já se viu, as coisas não se passaram e não são assim. Nada mais invocaram os réus, nem “substituíram”, nem a sentença foi além ou ficou aquém do thema ou do objecto do processo definido pelas partes nos articulados respectivos, ou seja, no requerimento inicial, contestação e resposta, nenhum outro havendo nem como tal tendo sido considerado pelo Tribunal a quo. Não há, pois razão para a autora se manifestar “espantada” com o desfecho (conclusão 55).

Anota-se que o invocado risco de os recorridos, por via da improcedência desta acção, “estarem a obter um enriquecimento sem causa” (conclusão 72ª), não tem aqui qualquer implicação. Não foi com esse fundamento de responsabilidade que a recorrente peticionou a sua condenação.

Concluindo-se, enfim, que a falta de razão da apelante é inversamente proporcional à extensão desmedida das suas alegações e conclusões, não resta senão julgar improcedente o seu apelo e confirmar a decisão recorrida.

V. DECISÃO

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso e, em consequência, negando provimento à apelação, confirmam a decisão recorrida.
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Custas da apelação pela recorrente – (artºs 527º, nºs 1 e 2, e 529º, do novo CPC, e 1º, nºs 1 e 2, 3º, nº 1, 6º, nº 2, referido à Tabela anexa I-B, 7º, nº 2, 12º, nº 2, 13º, nº 1 e 16º, do RCP).
                                                                                  
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Notifique.
Guimarães, 02 de Março de 2023

Este Acórdão vai assinado digitalmente no Citius, pelos Juízes-Desembargadores:

Relator: José Fernando Cardoso Amaral
                       
Adjuntos: Maria João Marques Pinto de Matos
José Alberto Martins Moreira Dias


[1]Por opção do relator, o texto próprio não segue as regras do novo acordo ortográfico.
[2] A recorrente vai ao ponto de, nas denominadas conclusões, historiar a tramitação do processo e de nelas explanar até aquilo com que está de acordo, mesmo quanto aos factos, em vez de se focar concisamente naquilo de que discorda e nos fundamentos que efectivamente tenha para impugnar e alterar a decisão.
[3] A organização e apresentação de conclusões, no recurso, obedece a regras jurídicas e técnicas, sobretudo de cariz funcional. Sobre isso, veja-se o Acórdão desta Relação de Guimarães, de 29-06-2017, processo nº 413/15.3T8VRL.G1 (mesmo relator): “1) Ao peticionar, num recurso, a alteração ou anulação de uma decisão, seja a proferida sobre a matéria de facto seja a proferida sobre a matéria de direito, o recorrente tem o ónus de indicar, na síntese conclusiva exigida pelo artº 639º, nº 1, os fundamentos de qualquer desses pedidos eventualmente formulados e, ainda, neste último caso, o ónus de fazer as indicações previstas no nº 2. 2) Não vale como conclusões a simples reprodução, sob esse nome, mediante copy past, do texto das alegações. 3) Como ensina o STJ, o recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida). Essas conclusões devem, assim, ser idóneas para delimitar de forma clara, inteligível e concludente, o objecto do recurso, permitindo apreender as questões de facto ou de direito que o recorrente pretende suscitar na impugnação que deduz e que ao tribunal superior cumpre solucionar. Não devem valer como conclusões arrazoadas longas e confusas em que se não discriminam com facilidade as questões invocadas.” Não são susceptíveis sequer de convite ao aperfeiçoamento as conclusões imperfeitas relativas à impugnação da matéria de facto – cfr., v. g., o Acórdão do STJ, de 09-02-2021, processo nº 16926/04.0YYLSB-B.L1.S1: “IV - No recurso sobre a matéria de facto se as conclusões forem deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não contemple o estatuído no art. 640, o relator não tem o dever de convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, na parte afetada. V - Ou seja, quando o recurso da matéria de facto se apresenta deficiente, sem dar cumprimento ao disposto no art. 640 do CPC, não há lugar a despacho de convite ao aperfeiçoamento.”. No mais, em face da já muito experimentada inutilidade do referido convite, perdas de tempo e enredo na tramitação que o mesmo gera, adopta-se a atitude complacente preconizada pelo STJ, no acórdão de 28-10-2021, processo nº  8975/17.4TSTB.E1.S1 (Rijo Ferreira): “I. Não obstante o disposto as prescrições dos artigos 637º, nº 2 e 639º, nº 1, do CPC, são frequentíssimas as situações de afastamento de tais critérios, com a apresentação de alegações e/ou conclusões insuficientes, contraditórias, excessivas, incongruentes, confusas, prolixas ou inócuas, que tornam sobremaneira penoso descortinar qual seja o objecto do recurso. II. Assumindo-se impotente para obviar a um tão generalizado e reiterado afastamento dos padrões legalmente estabelecidos e procurando assegurar uniformidade de critério e evitar o excesso de imputação às partes das consequências de condutas que não dominam, entranhou-se na jurisprudência uma atitude condescendente em que os Tribunais Superiores desconsideram o incumprimento dos ónus de alegação e conclusão, avançando para a decisão em face do que têm como, em face do que depreendem da decisão recorrida e da alegação, as questões que constituem o objecto do recurso. III. Atitude que se adopta, entendendo que, para além da total inexistência, só em casos extremos em que de todo em todo não se consiga vislumbrar qualquer conteúdo útil na alegações e/ou conclusões se deve lançar mão da rejeição do recurso, cabendo ao tribunal, nos demais casos, delimitar o âmbito do recurso em função do que, em face da decisão recorrida e do conteúdo da alegação e suas conclusões, ainda que deficientes, depreende serem as questões relevantes, sem embargo, porém, do respeito pelo contraditório. IV. Esse abaixamento do grau de exigência no critério de aferição do cumprimento do ónus de alegação e conclusão implica, no entanto, que os recorrentes fiquem destituídos de legitimidade para contestar posteriormente o resultado da especificação levada a cabo pelo tribunal. V. O art.º 640º do CPC exige a quem pretende impugnar a decisão quanto à fixação do elenco factual que tome posição específica sobre os motivos da discordância, indicando e explicitando de forma pormenorizada, individualizada e minuciosa os concretos pontos de facto que se pretendem impugnar, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa e a decisão que entendem ser a correctas, não sendo para o efeito suficiente uma genérica ou exemplificativa afirmação dessa discordância.”.
[4] Processo n18067/15.5T8LSB.P1.S1º (Chambel Mourisco).
[5] Aí citando Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, no Código de Processo Civil Anotado, volume 2.º, páginas 266 e 267.
[6] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª edição, páginas 572 e 573.
[7] Como diz a recorrente (conclusão 28), os recorridos “reconhecem a existência passada de uma obrigação para com a autora”. Todavia isso não significa que o façam “pelo menos” nem que daí se possa extrair que reconheceram o “mais”, ou seja, a nova empreitada alegada e a obrigação de pagar o preço respectivo.
[8] A apelante pretendeu, ainda, impugnar a decisão com a alusão e transcrição de depoimentos testemunhais – método obviamente inadequado e objectivo inalcançável por ele.
[9] Sendo certo que, como se entendeu e explicou no Acórdão desta Relação de Guimarães, de 08-01-2013, processo nº 235585/11.4YIPRT.G1 (Edgar Gouveia Valente): “As obras de execução de contratos de empreitada que respeitem a reparações efectuadas em imóveis destinados a longa duração não se enquadram na expressão ''execução de trabalhos'' prevista no artº 317º, alínea b) do Código Civil e, consequentemente, a obrigação do pagamento respectivo não está sujeita à prescrição presuntiva que tal norma igualmente prevê.” No mesmo sentido, Acórdão do STJ, de 08-05-2013, processo nº 199632/11.5YIPRT.L1.S1  (Moreira Alves): “A prescrição presuntiva não tem aplicação no âmbito de créditos emergentes de contrato de empreitada de construção civil ou relacionados com a construção.”.
[10] Ainda que a apelante censure o próprio relatório da sentença (conclusão 25) a pretexto de ele não exprimir correctamente o objecto do processo, note-se que a inobservância ou deficiência de elaboração do relatório não é censurável nos termos do artº 615º, nº 1, alínea d), CPC.
[11] Como se refere em Acórdão do STJ, de 28-02-2013, processo nº 60/2001.E1.S1 (João Bernardo): “A nulidade duma sentença ou dum acórdão por omissão de pronúncia só tem lugar quando o juiz deixe de conhecer, sem prejudicialidade, de algum dos pedidos deduzidos, de alguma das causas de pedir, de alguma das exceções invocadas ou de alguma das exceções de que oficiosamente lhe cumpra conhecer”.
[12] Segundo também se refere, v.g., no Acórdão do STJ Acórdão do STJ, de 20-11-2014, processo nº 810/04.0TBTVD.L1.S1 (Álvaro Rodrigues): “I - É jurisprudência consensual dos tribunais portugueses que importa não confundir questões (cuja omissão de pronúncia desencadeia nulidade da decisão nos termos da alínea d) do nº 1 do artº 615º do actual CPC) com argumentos, razões ou motivos que são aduzidos pelas partes em defesa ou reforço das suas posições. II - Esta é também a lição da generalidade da doutrina, como ensinou, além do eminente processualista que foi Alberto dos Reis, também Antunes Varela, de cuja lição permitimo-nos transcrever a seguinte passagem: «Não pode confundir-se de modo nenhum, na boa interpretação da alínea d) do artº 668º do CPC, as questões que são colocadas que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões (de facto e de direito), os argumentos e pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão» (A. Varela, Rev. Leg. Jur., ano 122º, pg. 112). III - De igual sorte, esta também é a orientação consensual da nossa jurisprudência, como se pode ver, inter alia, no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 27- 03-2014 (Pº 555/2002.E2.S1, disponível em www.dgsi.pt) assim sumariado na parte que ora interessa: «Para efeitos de nulidade de sentença/acórdão há que não confundir «questões» com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes nos seus articulados, e aos quais o tribunal não tem obrigação de dar resposta especificada ou individualizada». IV - Com efeito, as nulidades não são, em regra, vícios que inquinem a generalidade das decisões judiciais nem correspondem, em regra, ao que as partes, com muito maior frequência do que seria de desejar, consideram como tal, pois o legislador português foi deveras cauteloso em não fulminar com nulidade toda e qualquer omissão ou insuficiência da decisão que a parte entenda haver ou possa mesmo ter ocorrido, aliás em consonância com a orientação perfilhada por vários ordenamentos jurídicos tendo, como trave mestra, o vetusto princípio francês «pas de nulité sans texte». Elas estão devidamente fixadas em «numerus clausus» na lei, presentemente no artº 615º no NCPC/2013.”