Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
830/12.0TBVCT.G1
Relator: EUGÉNIA MARIA DE MOURA MARINHO DA CUNHA
Descritores: CONTRATO DE SEGURO
INVALIDEZ ABSOLUTA E DEFINITIVA
DIREITO À INDEMNIZAÇÃO
EXCLUSÃO DE RESPONSABILIDADE
INCAPACIDADE PARA O EXERCÍCIO DA ACTIVIDADE PROFISSIONAL
NULIDADE DA CLÁUSULA DE DEFINIÇÃO DE INVALIDEZ ABSOLUTA E DEFINITIVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/30/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1- Celebrado contrato de seguro entre as partes, em que um dos riscos cobertos é a invalidez absoluta e definitiva por doença, ao Autor cabe a prova da sua verificação, por se tratar de facto constitutivo do direito indemnizatório de que se arroga (art. 342º, n.º 1 do CC), competindo à seguradora o ónus da alegação e da prova de factos conducentes à exclusão da sua responsabilidade (n.º 2 do art. 342º do CC);

2- Cumpre aquele ónus o segurado que logra demonstrar ter sido afetado por doença (do foro oncológico) que fez com que ficasse, desde que a mesma lhe foi diagnosticada, com invalidez e incapacitado para o exercício da sua atividade profissional (e até de qualquer atividade remunerada), não tendo habilitações que lhe permitam exercer qualquer outra atividade, e que a sua situação e limitação é permanente e sem possibilidade de melhoria (dado o risco de infeções que corre);

3- Na vigência do Decreto-lei nº 176/95, de 26 de julho, no seguro de grupo, o dever de informar o segurado sobre as condições do contrato, designadamente sobre o âmbito das coberturas e exclusões e dos direitos e obrigações em caso de sinistro, já impendia sobre o tomador do seguro, recaindo, também, sobre este o ónus da prova de ter cumprido esse dever. Incumprido tal dever de informar, o segurado não pode opor à seguradora o seu desconhecimento e dele se fazer prevalecer contra ela;

4- Porém, no caso de cláusula contratual geral, constante das condições da apólice, abusiva e, por isso, nula, nos termos dos art.ºs 12º, 15º e 16º (Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais), deve o tribunal conhecer, oficiosamente, da questão e declarar a nulidade da mesma;

5- É nula a cláusula de definição de “invalidez absoluta e definitiva” constante do contrato de seguro (não conhecida do segurado, anteriormente à assinatura da proposta de adesão ao seguro de grupo), pela qual a seguradora proponente, afastando-se do escopo do contrato e do dever de consideração do interesse real dos aderentes, impõe o prévio reconhecimento “pela ISS pela qual a pessoa segura se encontra abrangida ou pelo Tribunal de Trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou instituição de Segurança Social, por junta médica”, por violar, desde logo, os arts 15º e 16º, do DL nº446/85, de 25/10 (RJCCG), já que constitui limitação sem justificação e trai as legítimas expetativas e a confiança do segurado aderente de que o seguro cobria, sem mais, esse risco, verificada que realmente estivesse situação de invalidez absoluta e definitiva.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães
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I. RELATÓRIO

Recorrente: X - Companhia de Seguros, S.A
Recorrido: José

José instaurou contra Banco A, S.A, com sede na Av. João XXI, nº 63, 1049-103 Lisboa e Companhia de Seguros X, SA, com sede no … Lisboa, a presente ação declarativa de condenação sob a forma comum, pedindo que:

a) Se declare que o contrato de seguro do Ramo Vida titulado pela apólice … e pelo certificado …, celebrado entre o A e a Ré X - Companhia de Seguros, S.A e a que o A aderiu foi imposto e exigido pela Ré Banco A como exigência e condição para a celebração do contrato de mútuo da quantia de 100,000,00 €;
b) Se declare que o A se encontra em situação de invalidez absoluta e definitiva por doença;
c) Se condene a 2ª Ré X - Companhia de Seguros a proceder à liquidação total do crédito hipotecário do A na Banco A, referente ao empréstimo nº …, pagando à Banco A a totalidade do capital em dívida do empréstimo, seguro através do contrato de seguro titulado pela apólice … junto como doc. 2 com a p.i.
d) Se condene a 2ª Ré X - Companhia de Seguros a pagar ou restituir ao A todas as prestações mensais do empréstimo que este pagou à Banco A desde 30 de Novembro de 2011 e até à data da liquidação total do empréstimo, acrescida dos juros legais contados desde a data de vencimento de cada prestação até ao seu reembolso, a liquidar em momento ulterior;
e) Se condene a 2ª Ré a pagar ao A o capital do seguro remanescente ao capital em dívida;
f) Se condenem as R.R. a restituir ao A todos os prémios mensais de seguro pagos desde a data da interpelação para o pagamento do capital seguro (30 de Novembro de 2011) até à data da liquidação do empréstimo e do pagamento do remanescente do capital seguro, a liquidar em momento ulterior.
Alega, para tanto e em síntese, que, tendo contraído empréstimo bancário, lhe foi, então, exigida a celebração de um contrato de seguro do ramo vida, para o caso de morte ou invalidez total e permanente por acidente e invalidez absoluta e definitiva por doença, e que garantiu o capital em dívida à instituição mutuante à data da ocorrência, por contrato de seguro ao qual se limitou a aderir, sem lhe haver sido prestada qualquer informação ou esclarecimento quanto ao seu conteúdo e que a sua situação se enquadra desde, pelo menos, a data em que a comunicou à Ré, 30 de Novembro de 2011, na previsão contratual do dito seguro, por invalidez absoluta e definitiva por doença.
Contestou a Ré X - Companhia de Seguros nos termos do articulado de fls. 60 e ss dos autos, alegando, em sua defesa, que não recusou o sinistro e o pagamento da indemnização, pois continuou a aguardar por documentação solicitada ao Autor e que pelos elementos de que dispõe a situação do mesmo não tem enquadramento nas condições gerais da apólice, sendo que é considerada invalidez absoluta e definitiva a “limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a pessoa segura para o exercício de qualquer atividade remunerada, necessitando de assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária” e que nos termos da nota informativa entregue ao Autor "a pessoa segura é considerada no estado de invalidez absoluta e definitiva quando, em consequência de doença susceptível de constatação médica objetiva, fique total e definitivamente incapacitada de exercer qualquer atividade remunerável e necessite de recorrer, de modo contínuo, à assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária, não sendo possível prever qualquer melhoria, com base nos conhecimentos médicos actuais", tendo-lhe as referidas condições do contrato de seguro titulado pela apólice … e adesão … sido comunicadas e explicadas por si, não sendo o Autor portador de um grau de invalidez definitiva e absoluta por doença e não tendo necessidade do acompanhamento de uma terceira pessoa.
Contestou a co-Ré Banco A, SA nos termos do articulado de fls. 92 e ss, pugnando pela sua absolvição do pedido, impugnando factos alegados pelo Autor e alegando ter-lhe sido explicado, com pormenor, o teor das cláusulas do contrato de seguro, mormente as condições em que poderia acionar o capital, ou seja, os riscos que o seguro cobria: a invalidez total e permanente poa acidente e a invalidez absoluta e definitiva por doença.
O Autor replicou nos termos constantes do articulado de fls. 101 e ss, pugnando pela improcedência da exceção deduzida pela Ré X - Companhia de Seguros, SA. e pedindo que se declarem nulas ou excluídas do contrato celebrado a cláusula 1ª na parte em que define invalidez absoluta e definitiva como “limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a pessoa segura para o exercício de qualquer actividade remunerada, necessitando de assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária” e a cláusula 8ª nº 2.2. alínea c) 2 das condições gerais.
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Procedeu-se ao saneamento do processo, com seleção da matéria de facto relevante para a boa decisão da causa, nos termos constantes do despacho de fls. 142 e ss dos autos.
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No início da audiência de julgamento – v. fls 316 -, deduziu o A. requerimento alegando a ocorrência na pendência da ação de factos supervenientes que conduzem à inutilidade superveniente da lide quanto ao pedido formulado em III do pedido final da petição inicial (al. c) supra).
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Procedeu-se a julgamento com observância dos legais formalismos.
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Foi proferida sentença a julgar a ação parcialmente procedente e, em consequência, a:

a) declarar que o contrato de seguro do Ramo Vida titulado pela apólice … e pelo certificado …, celebrado entre o A. e a Ré X - Companhia de Seguros, S.A. e a que o A. aderiu foi imposto e exigido pela Ré Banco A como exigência e condição para a celebração do contrato de mútuo da quantia de 100,000,00 €;
b) declarar que o A. se encontra em situação de invalidez absoluta e definitiva por doença impeditiva do e para o exercício de qualquer actividade profissional remunerada desde 30/1/2010;
c) declarar nula, por ser abusiva, a cláusula do mencionado contrato de seguro na parte em que exige a necessidade de recorrer, de modo contínuo à assistência de uma terceira pessoa para efetuar os atos normais da vida diária, não sendo possível prever qualquer melhoria com base nos conhecimento médicos atuais.
d) declarar extinta instância, por inutilidade superveniente da lide, na parte do pedido final relativo à condenação da 2ª Ré X - Companhia de Seguros a proceder à liquidação total do crédito hipotecário do A. na Banco A, referente ao empréstimo nº …, pagando à Banco A a totalidade do capital em dívida do empréstimo, seguro através do contrato de seguro titulado pela apólice 5.000.906 junto como doc. 2 com a p.i.
e) Condenar a 2ª Ré X - Companhia de Seguros a pagar ou restituir ao A. todas as prestações mensais do empréstimo que este pagou à Banco A desde 30 de Novembro de 2011 e até à data da liquidação total do empréstimo (4/8/2015), acrescida dos juros legais contados desde a data de vencimento de cada prestação até ao seu reembolso, a liquidar em momento ulterior;
f) Condenar a 2ª Ré X - Companhia de Seguros a pagar ao A. o capital do seguro remanescente ao capital em dívida, a liquidar em momento ulterior;
g) Condenar a segunda Ré X - Companhia de Seguros a restituir ao A. todos os prémios mensais de seguro pagos desde a data da interpelação para o pagamento do capital seguro (30 de Novembro de 2011) até à data da liquidação do empréstimo, a liquidar em momento ulterior;
h) Absolver a 1 ª Ré Banco A dos pedidos contra si formulados em VI do pedido final.
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A Ré X - Companhia de Seguros, S.A. apresentou recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a referida sentença, com base nas seguintes

CONCLUSÕES:

. - Resulta da matéria de facto dada como provada que o Autor encontra-se sem trabalhar, incapaz para o trabalho, reformado por invalidez desde 2013, sendo que até à data da reforma e desde que lhe foi detectada a doença supra referida em 30/1/2010, esteve sem auferir qualquer rendimento e sem capacidade nem hipótese de arranjar trabalho.
– Só após a reforma o A. pode accionar a cobertura de invalidez total e permanente.
. - No relatório pericial de 15 de Maio de 2013 foi fixada a data da consolidação médico-legal em 02/04/2013.
. - O documento junto aos autos denominado atestado multi-usos de 14/02/2011– documento nº 5 junto com a p.i. – atribui ao A. a incapacidade permanente de 60% e que não é definitiva.
- Constando do referido documento a reavaliação futura no ano de 2015.
- No relatório pericial elaborado em 22 de Fevereiro de 2014 a Srª perita remeteu o A. para a Junta médica de Saúde Pública a fim de lhe ser atribuída a incapacidade.
. - Nos termos das condições gerais da apólice é considerada com invalidez absoluta e definitiva “a limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria em que, cumulativamente, estejam preenchidos os seguintes requisitos:
a) A pessoa segura fique completa e definitivamente incapacitada de exercer a sua profissão ou de qualquer outra actividade remunerada, compatível co os seus conhecimentos e aptidões;
b) Corresponda a um grau de desvalorização igual ou superior à percentagem definida em condições particulares, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por acidentes de trabalho e Doenças Profissionais em vigor na data da avaliação, não entrando para o seu cálculo quaisquer incapacidades ou patologias pré-existentes;
c) Seja reconhecida previamente pela ISS pela qual a pessoa segura se encontra abrangida ou pelo Tribunal de Trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou instituição de Segurança Social, por junta médica.."
O A. encontra-se sem trabalhar, incapaz para o trabalho, reformado por invalidez desde 2013: ponto 29 da sentença.
. - Correspondendo essa situação ao risco assumido pela Ré aquando da celebração do seguro e, desse modo, não estão preenchidos os pressupostos para ser accionada a cobertura de invalidez total e permanente antes de o A. se encontrar reformado ou seja, antes do ano de 2013.
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O Autor ofereceu contra-alegações, onde pugna pela rejeição ou improcedência do recurso interposto pela Ré Seguradora e, à cautela e a título subsidiário, requer a ampliação do objeto e âmbito do recurso e que se julgue provado e procedente o pedido formulado pelo A. na réplica, declarando-se “nulas ou excluídas do contrato celebrado a cláusula 1ª, na parte em que define invalidez absoluta e definitiva como “limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a pessoa segura para o exercício de qualquer atividade remunerada, necessitando de assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária” e a cláusula 8ª nº 2.2. alínea c) 2 das condições gerais”, mantendo-se a douta sentença recorrida na parte decisória. Para tanto, formula as seguintes

CONCLUSÕES:

1- A contestação da R. baseia-se no pressuposto de que o A. não é portador de invalidez definitiva e absoluta e no facto de entender que o A. não tem necessidade do acompanhamento de terceira pessoa, tendo exigido ao A. um documento comprovativo da necessidade de terceira pessoa (complemento de terceira pessoa – modelo … da Segurança Social, a confirmar a necessidade da Pessoa Segura recorrer, de modo contínuo, à assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária) – cfr. contestação da Seguradora (nomeadamente o art. 11) e da carta da Ré Seguradora de 10/1/2012 (doc. 2 junto com a réplica).
2- Tais questões (invalidez absoluta e definitiva do A. e a necessidade de terceira pessoa) foram decididas na douta sentença recorrida, a cuja argumentação o A. adere e dá por reproduzida.
3- Apenas no recurso interposto a Ré Seguradora coloca uma questão nova, que salvo o devido respeito, não pode ser apreciada por não ter sido alegada na contestação: o facto de o A. ter sido reformado por invalidez pela Segurança Social em 2013.
4- Entende a Ré Seguradora que, independentemente de o A. se encontrar incapaz para o trabalho e com invalidez absoluta desde Janeiro de 2010, o facto de só ter sido declarado reformado por invalidez pela Segurança Social desde 2013, impede o accionamento da cobertura de incapacidade total e permanente, constituindo esta uma questão nova, pois não foi alegada na contestação e que por isso não pode ser apreciada, devendo o recurso ser rejeitado e julgado improcedente, até porque o que está em questão não é a invalidez total e permanente (na qual se baseia o seu recurso), mas a invalidez absoluta e definitiva.
5- A Ré Seguradora está a confundir a invalidez total e permanente por acidente, com a invalidez absoluta e definitiva por doença.
6- A cobertura que o A. accionou e reclama é a Invalidez Absoluta e Definitiva por Doença e quanto a esta as condições gerais definem-na como “a limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a Pessoa Segura para o exercício de qualquer actividade remunerada, necessitando da assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária” – cfr. art. 1º das Condições Gerais.
7- O que a Ré Seguradora alega no recurso ora interposto diz apenas respeito à Invalidez Total e Permanente, que não está em discussão nos autos, nem o A. accionou tal cobertura.
8- Como a Ré Seguradora baseia o seu recurso na cobertura da invalidez total e permanente, que não está em questão nem em discussão nos autos, deve o recurso ser rejeitado e julgado totalmente improcedente.
9- De qualquer forma, à cautela e a título subsidiário, o A. requer, também, a ampliação do objecto e âmbito do recurso, por forma a que seja -apreciado o pedido formulado pelo A. na réplica no sentido de “declarar-se nulas ou excluídas do contrato celebrado a cláusula 1ª na parte em que define invalidez absoluta e definitiva como “limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a pessoa segura para o exercício de qualquer actividade remunerada, necessitando de assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária” e a cláusula 8ª nº 2.2. alínea c) 2 das condições gerais”, em que decaiu e cuja procedência afecta o recurso interposto pela Ré Seguradora, para prevenir a eventual procedência do recurso da Ré.
10- Não obstante o doutamente explanado na decisão recorrida, entende o A. que deviam, como devem, ser declaradas nulas ou excluídas do contrato celebrado a cláusula 1ª, na parte em que em que define invalidez absoluta e definitiva como “limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a pessoa segura para o exercício de qualquer actividade remunerada, necessitando de assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária” e a cláusula 8ª nº 2.2. alínea c) 2 das condições gerais, o que se requer e pretende.
11- Resultando dos factos provados que ao A. não foram comunicadas as condições gerais, não lhe tendo, aliás, sido entregues na data da assinatura da proposta de adesão nenhuma cópia das condições gerais, nem nenhuma nota informativa, devem ser excluídas das condições do seguro a cláusula 1ª na parte em que em que define invalidez absoluta e definitiva como “limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a pessoa segura para o exercício de qualquer actividade remunerada, necessitando de assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária” e a cláusula 8ª nº 2.2. alínea c) 2 das condições gerais, não podendo a Ré opor ao A. a necessidade de documento comprovativo do reconhecimento da invalidez emitido pelo Instituto da Segurança Social ou pelo Tribunal de Trabalho, situação que conduz ao mesmo resultado decisório da douta sentença recorrida, cuja parte dispositiva se deve manter.
12- Nesta parte a douta decisão recorrida viola por errada interpretação o disposto nos arts. 1, 5, 6 e 8 a) do D.L. 446/85 de 25/10 (Cláusulas Contratuais Gerais).
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Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto pela Ré Seguradora.
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II. OBJETO DO RECURSO

Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Assim, são as seguintes as questões a decidir:
- Qualificação jurídica do contrato;
- Âmbito da cobertura do seguro;
- Se a invalidez de que o Autor padece, por doença, é risco coberto.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
III . A - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

São os seguintes os factos provados, com relevância para a decisão:
(provindos da Matéria de Factos Assente)

1. Em 26 de abril de 2005 o Autor contraiu um empréstimo no Banco A, agência de Viana do Castelo, no montante de € 100.000,00 (cem mil euros) para financiamento da construção de imóvel para habitação própria permanente;
2. O empréstimo foi feito pelo prazo de trinta e quatro anos e para garantia do capital emprestado foi constituída hipoteca sobre o imóvel do Autor descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº …;
3. No dia 26 de abril de 2005 foi celebrada a escritura de mútuo com hipoteca, no Primeiro Cartório Notarial de Viana do Castelo, através da qual a primeira Ré emprestou ao Autor a quantia de € 100.000,00 pelo prazo de trinta e quatro anos, nos termos do documento nº 1 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por reproduzido;
4. Por carta datada de 7 de junho de 2005 a segunda Ré comunicou ao Autor a aceitação da proposta de adesão ao Seguro Vida Grupo e que a apólice garantia a cobertura de morte, invalidez total e permanente por acidente e invalidez absoluta e definitiva por doença, nos termos constantes do documento nº 3 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido;
5. Em 22 de junho de 2005 a Ré X - Companhia de Seguros aceitou expressamente o contrato de seguro celebrado com o Autor e a que este aderiu e considerou-o efetivamente celebrado com início em 7 de junho de 2005, ficando titulado pela apólice 5.000.906 e pelo certificado 116,284 - documento nº 4 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
6. A Ré X - Companhia de Seguros emitiu, em 22 de junho de 2005, o respetivo certificado de seguro, que enviou ao Autor, fazendo constar do mesmo como pessoa segura José, como tomador e beneficiário a Banco A, como data de início 07 de junho de 2005, o capital seguro de € 100.000,00 nos termos constantes de fl. 30 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e que o mesmo garantia e garante o pagamento do capital em dívida em cada anuidade ao beneficiário em caso de morte, de invalidez total e permanente por acidente e de invalidez absoluta e definitiva por doença - (doc. 4);
7. A Ré "X - Companhia de Seguros, S.A." celebrou com o Autor o seguro de vida titulado pela apólice nº …, com a adesão nº …, e com as condições gerais e particulares constantes de fls. 67 a 71 e 80 a 90 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
8. Aquando da assinatura do boletim de adesão e proposta de seguro foi dito ao Autor que em caso de morte ou de invalidez absoluta e definitiva para o exercício da sua profissão ou de qualquer outra, em consequência de acidente ou de doença, tinha direito a acionar o contrato de seguro;
9. Bem como teve de pagar, como continua a pagar, à 2ª Ré mensalmente os prémios do seguro, que lhe são debitados por transferência da conta bancária que possui na 1 ª Ré;

(Da Base Instrutória)

10. Dado que o Autor era cliente da Banco A esta exigiu-lhe e propôs-lhe a subscrição de um seguro de vida na Companhia de Seguros X (sua agrupada) por forma a garantir o pagamento do capital mutuado em dívida, em caso de morte e de invalidez absoluta e definitiva por doença e/ou acidente;
11. Para o efeito a primeira Ré solicitou ao Autor o seu nome, morada, data de nascimento, atividade profissional, bem como os elementos relativos ao empréstimo bancário em questão, nomeadamente número de contribuinte, montante do empréstimo, número do processo de empréstimo e NIB, elementos e documentos que lhe foram fornecidos e com base nos quais foi celebrado o contrato de seguro do Ramo Vida, mediante a subscrição do boletim de adesão de fls. 28 dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido;
12. A subscrição do seguro de vida foi imposta pela primeira Ré como uma das condições e exigências para a concessão do mútuo de € 100.000,00;
13. No dia 26 de abril de 2005, a primeira Ré apresentou ao Autor a proposta de seguro de vida para garantia do capital mutuado, junta a fls. 28, que o mesmo se limitou a assinar;
14. A primeira Ré apresentou ao Autor um documento intitulado Ramo Vida Grupo - Boletim de Adesão, já preenchido com os seus dados pessoais e os dados do empréstimo, que o Autor se limitou a assinar;
15. Foi apenas no pressuposto e no convencimento que o contrato de seguro mencionado em dos factos assentes garantia o pagamento, à primeira Ré, do capital do empréstimo nº …, no caso de morte, de invalidez total e permanente por acidente e de invalidez absoluta e definitiva por doença que o Autor aceitou assinar e assinou em abril de 2005 a proposta de seguro junta com a petição inicial a fls. 28;
16. Na data da assinatura da proposta de adesão, em 26-04-2005, não foi entregue ao Autor nenhuma cópia da mesma, nenhuma cópia das condições gerais ou especiais, nenhuma nota informativa nem nenhuma cópia da apólice;
17. Só mais de um mês e meio após a assinatura da proposta de adesão, a segunda Ré enviou ao Autor a carta datada de 7 de junho de 2005, junta com a petição inicial, a fls. 29 dos autos, a comunicar a aceitação da proposta de adesão do seguro de vida Grupo cobrindo os riscos de morte, invalidez total e permanente por acidente e invalidez absoluta e definitiva por doença;
18. Tendo enviado posteriormente, em 22 de junho de 2005, apenas o certificado de seguro junto com a petição inicial como documento nº4, a fls. 30 dos autos;
19. Ao Autor não foi dada cópia das condições gerais, especiais e particulares da apólice nem na data da assinatura da proposta, nem na data da celebração do contrato, nem posteriormente, nem pela 1 ª Ré, nem pela 2ª Ré;
20. No ano de 2010 o Autor foi acometido de leucemia aguda mielomonocítica/leucemia mielóide aguda diagnosticada em 30/1/2010;
21. Desde a supra referida data fez tratamentos hospitalares no Hospital e de quimioterapia no IPO/Porto e foi submetido a transplante de medula óssea em 29 de julho de 2010;
22. Em consequência da doença de que foi acometido o Autor ficou e encontra-se com invalidez e incapacitado para o exercício da sua atividade profissional e de qualquer atividade remunerada, mantendo tratamento de imunossupressão, não sendo de prever remissão completa da patologia base e co- morbilidades associadas;
23. Encontrando-se dependente de ajudas técnicas permanentes, tais como medicamentosas, tratamentos médicos regulares e ajudas técnicas;
24. Antes de lhe ter sido diagnosticada a doença, o Autor trabalhava como vendedor ambulante e comissionista, atividade que lhe exigia constantes deslocações e movimentação e sujeição ao sol, chuva e intempéries;
25. Desde que lhe foi diagnosticada a doença, o Autor cessou a sua atividade profissional e não tem capacidade física para a exercer, nem tem habilitações que lhe permitam exercer qualquer outra atividade;
26. Atualmente, o Autor não tem capacidade nem resistência para o exercício de qualquer atividade profissional, não podendo fazer esforços, não podendo apanhar sol nem estar sujeito a diferenças de temperatura;
27. Devido ao transplante de medula óssea o Autor encontra-se sob vigilância médica e acompanhamento permanente no IPO, sob imunossupressão e particularmente sujeito e suscetível a infeções, implicando cuidados gerais de proteção e prevenção;
28. A sua situação e limitação é permanente e sem possibilidade de melhoria, dado o risco de infeções que corre;
29. O Autor encontra-se sem trabalhar, incapaz para o trabalho, reformado por invalidez desde 2013, sendo que até à data da reforma e desde que lhe foi detetada a doença suprareferida em 30/1/2010, esteve sem auferir qualquer rendimento e sem capacidade nem hipótese de arranjar trabalho;
30. Em consequência da doença e sequelas de que ficou portador o Autor ficou afetado de uma I.P.G. de 66,85000%;
31. Também a sua mulher se encontrou doente e com invalidez, sofrendo de linfoma renal crónico, tendo acabado por falecer em consequência da doença que a afetava no passado dia 22/3/2015;
32. O Autor não dispunha de qualquer rendimento ou possibilidade para continuar a fazer face às amortizações mensais do empréstimo;
33. Sobrevivendo apenas com a ajuda da sua família;
34. O Autor comunicou à primeira Ré, em meados de 2011, a sua situação de invalidez absoluta e definitiva por doença, a fim de acionar o seguro de vida que tinha contratado, mas aquela nada fez;
35. Por carta registada, com aviso de receção, datada de 29-11-2011 dirigida à 1 ª Ré e por esta efetivamente recebida em 30-11-2011 o Autor comunicou à Ré Banco A a sua situação de invalidez absoluta e definitiva e solicitou a liquidação do empréstimo e que diligenciassem junto da 2ª Ré pelo pagamento do montante do empréstimo ainda em dívida e que não lhe fosse exigido o pagamento de mais prestações, nos termos constantes do documento junto com a petição inicial sob o nº 7, fls. 38, cujo teor se dá por reproduzido;
36. Por carta, registada com aviso de receção, datada de 29-11-2011 dirigida à 2ª Ré e por esta efetivamente recebida em 30-11-2011 o Autor comunicou à Ré X - Companhia de Seguros, S.A a sua situação de invalidez absoluta e definitiva e solicitou a liquidação do empréstimo, ou seja, o acionamento do seguro com vista ao pagamento à 1ª Ré do capital em dívida do empréstimo, a fim de cessarem as prestações do mesmo que estavam a ser pagas e debitadas da sua conta, nos termos constantes do documento junto com a petição inicial sob o nº 8, fls. 46, cujo teor se dá por reproduzido;
37. Em consequência da recusa das Rés, o Autor teve de continuar a pagar as prestações do empréstimo ao Banco A até à data da liquidação do empréstimo pela co-ré X - Companhia de Seguros em face do óbito da esposa do A, o que fez com dinheiro emprestado pelos seus familiares;
38. No dia 22 de março de 2015 faleceu Maria, esposa do A e também pessoa segura pelo contrato de seguro em causa nos autos;
39. Em consequência do óbito da esposa do A foi acionada a cobertura de morte garantida pela apólice do contrato de seguro dos autos;
40. Nesse seguimento, a Ré X - Companhia de Seguros pagou em 4/agosto de 2015 a quantia de €86.045,32 para liquidação do montante do empréstimo que estava nessa data em dívida ao Banco A, sendo que o capital efetivamente em dívida ascendia €85.798,41 (sendo a diferença de €246,91);
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41. A Ré "X - Companhia de Seguros, S.A" solicitou ao Autor diversa documentação, nos termos constantes de fls. 115 dos autos, tendo o A. respondido nos termos da carta de fls. 116 a 118, à qual por sua vez a Ré respondeu nos termos da carta de fls. 119, cujo teor se dão aqui por reproduzidos para os devidos efeitos legais;
42. Ao Autor nunca foram explicadas, comunicadas nem entregues as condições gerais e especiais do contrato de seguro junto com a contestação de fls. 67 a 71 e 80 a 90;
43. E não lhe foi explicado nem comunicado o teor e conteúdo da "nota informativa" junta com a contestação a fls. 72-73 nem lhe foi entregue cópia da mesma;
44. O Autor apenas teve cópia do boletim de adesão e das condições gerais e especiais através da carta da Ré seguradora datada de 25-08-2010;
45. Só muito mais tarde foi entregue ao Autor fotocópia da nota informativa junta a fls. 112-114;
46. Nunca ninguém falou, comunicou, explicou ou disse ao Autor que para que o seguro funcionasse a invalidez só seria considerada se, para além dela, o Autor precisasse de assistência de terceira pessoa para os atos normais da sua vida diária.
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Factos Não Provados.

1. Foi entregue ao Autor, aquando da contratação do seguro em causa nos autos, uma "nota informativa" nos termos da qual "a pessoa segura é considerada no estado de invalidez absoluta e definitiva quando, em consequência de doença susceptível de constatação médica objetiva, fique total e definitivamente incapacitada de exercer qualquer atividade remunerável e necessite de recorrer, de modo contínuo, à assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária, não sendo possível prever qualquer melhoria, com base nos conhecimentos médicos actuais".
2. A Ré comunicou e explicou ao Autor todas as condições que se aplicavam ao contrato de seguro titulado pela apólice nº …, com a adesão …, assim como a respetiva "nota informativa".
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III . B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

- Qualificação jurídica do contrato, âmbito do mesmo e se a invalidez de que o Autor padece, por doença, é risco coberto.

Demandou o Autor, conjuntamente, o Banco e a Seguradora, formulando pedido relativamente à Ré instituição bancária, tendo como causa de pedir o contrato de mútuo para aquisição de habitação em que foi exigido, como garantia de pagamento, seguro de vida, e pedido relativamente à Ré Seguradora, como fundamento no contrato de seguro de vida referido, coligado àquele.
O contrato sub judice foi celebrado na vigência do Decreto-Lei n.º 176/95, de 26 de julho (alterado pelos DL n.º 60/2004, de 22 de março, e 357-A/2007, de 31 de outubro), sendo-lhe aplicável o regime previsto no referido diploma legal, dado que o regime atual, aprovado pelo DL 72/2008 de 16/4, só entrou em vigor em 01/01/2009 (cfr art. 7º).
O contrato de seguro, como qualquer outro contrato, tem elementos essenciais, naturais e acidentais.
São elementos essenciais do contrato de seguro aqueles de que depende a sua validade, isto é, os que são imperativamente previstos na lei.
Contrato de seguro é a convenção pela qual uma das partes (segurador) se obriga, mediante retribuição (prémio) paga pela outra parte (segurado), a assumir um risco ou conjunto de riscos e, caso a situação de risco se concretize, a satisfazer ao segurado ou a terceiro, uma indemnização pelos prejuízos sofridos ou um determinado montante previamente estipulado, cfr. Almeida Costa, in RLJ, ano 129, pág. 20.
São, pois, elementos essenciais do contrato de seguro os intervenientes (seguradora, tomador de seguro), as obrigações dos intervenientes (pagamento do prémio pelo tomador do seguro, suportação do risco e realização da prestação pela seguradora) e objeto (risco).
O contrato de seguro é regulado pelas condições gerais, particulares e especiais – art.º 426º, do Código Comercial, vigente à data da celebração do contrato (entretanto revogado - v. art.º 32º do citado Decreto-Lei 72/2008, de 16 de abril, que passou a vigorar a partir de 1 de janeiro de 2009 para os contratos celebrados após aquela data (cfr. art. 2º e segs).
O referido Decreto-Lei 72/2008, de 16 de abril veio estabelecer o regime jurídico do contrato de seguro harmonizando soluções, adaptando as diversas regras em vigor, procedendo a uma atualização e concatenação de conceitos dispersos em vários diplomas e preencher lacunas. Procedeu, assim, a uma consolidação do direito do contrato de seguro e introduziu diversas soluções inovadoras, mais conformes às necessidades atuais.
O seguro configura-se como um contrato bilateral ou sinalagmático, por dele emergirem obrigações para ambas as partes, oneroso, por implicar vantagens também para ambas, e de execução continuada.
Em regra, surge como um contrato de adesão, pois a vinculação do segurado faz-se através da subscrição de um esquema contratual preestabelecido pelo segurador, consubstanciado nas condições gerais da apólice que são elaboradas sem prévia negociação individual, limitando-se os proponentes ou destinatários a subscrever o contrato, aderindo a elas.
José Vasques, in Contrato de Seguro, Coimbra, 1999, pág. 94, define Contrato de Seguro como sendo “ um contrato pelo qual a seguradora, mediante retribuição pelo tomador do seguro, se obriga, a favor do segurado ou de terceiro, à indemnização de prejuízos resultantes, ou ao pagamento de valor pré-definido, no caso de se realizar um determinado evento futuro e incerto”.
Preceitua o artigo 1.º, do Decreto-Lei 72/2008, de 16 de abril, que, “por efeito do contrato de seguro, o segurador cobre um risco determinado do tomador do seguro ou de outrem, obrigando-se a realizar a prestação convencionada em caso de ocorrência do evento aleatório previsto no contrato, e o tomador do seguro obriga-se a pagar o prémio correspondente”.
E dispõe o art.º 183º do Decreto-Lei 72/2008 de 16 de abril que “no seguro de vida, o segurador cobre um risco relacionado com a morte ou a sobrevivência da pessoa segura”.
O contrato de seguro em benefício de terceiro constitui, assim, um verdadeiro contrato a favor de terceiro, definido pelo artigo 443.º do Código Civil, como aquele em que um dos contraentes (o promitente) atribui, por conta e à ordem de outro (o promissário) uma vantagem a um terceiro (o beneficiário) estranho à relação contratual, mas titular definitivo e autónomo do direito de crédito de exigir do promitente o cumprimento da prestação, e não um simples destinatário da prestação (ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, I, 1970, 251 e 252; ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 2ª edição, revista e atualizada, 134; STJ, de 21-6-97, BMJ nº 468, 384).
“O Segurado é a pessoa no interesse da qual o contrato é celebrado ou a pessoa (pessoa segura) cuja vida, saúde ou integridade física se segura” José Vasques, ob. cit. pag 102.
“O Tomador do Seguro é a entidade que celebra o contrato de seguro com a seguradora…” José Vasques, ob. cit. pag 102.
“O Beneficiário é a pessoa singular ou coletiva a favor de quem reverte a prestação da seguradora decorrente do contrato de seguro ou de uma operação de capitalização” José Vasques, ob. cit. pag 98.
O contrato de seguro é um contrato bilateral ou sinalagmático, formal e aleatório, sendo-o na medida em que a prestação da seguradora fica dependente de um evento futuro e incerto.
Os elementos naturais do contrato de seguro são aqueles que não são essenciais à validade de tal contrato, resultando de normas supletivas – o contrato de seguro regular-se-á pelas estipulações da respetiva apólice não proibidas pela lei e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições do Código Comercial (cfr. artº 427º, do C. Comercial), atualmente DL nº 72/2008, de 16/4.
Para que exista contrato de seguro é necessário, desde logo, que exista uma proposta e que essa proposta seja aceite pela Seguradora destinatária.
O artº 426º, do C.Comercial, vigente à data da celebração do contrato em causa nos autos, estipulava que o contrato de seguro deve ser reduzido a escrito num instrumento que constituirá a apólice de seguro. O contrato de seguro era, pois, à data da celebração do contrato dos autos, um contrato formal já que a lei impunha, para a sua válida celebração, não só o consenso de vontades das partes mas ainda a redução a escrito.
Assim, no contrato de seguro, a forma não era exigida apenas para prova do negócio mas para que o mesmo se considerasse existente e válido. A apólice surgia como a forma necessária para a própria existência do contrato (forma “ad substantiam”).
Sem apólice não havia seguro. Aquela era, ao mesmo tempo, título constitutivo e documento probatório do contrato de seguro. O facto de o contrato de seguro ser um contrato solene, sendo “ad substantiam” a sua redução a escrito, significava que o negócio jurídico não tinha existência legal enquanto não estivesse lavrada a apólice ou o documento equivalente.
Acresce, ainda, que e conforme exigido no § único, do artº 426º, do C.Comercial, a apólice de seguro deve ser datada e assinada pelo segurador, deve enunciar: o nome ou firma, residência ou domicilio do segurador; o nome ou firma, qualidade, residência ou domicílio do que faz segurar; o objeto do seguro e a sua natureza e valor; os riscos contra que se faz o seguro; o tempo em que começam e acabam os riscos; a quantia segurada, o prémio do seguro; e, em geral, todas as circunstâncias cujo conhecimento possa interessar o segurador, e todas as condições estipuladas pelas partes.
A apólice é, assim, o documento que titula o contrato celebrado entre o tomador do seguro e a seguradora e de onde constam as respetivas condições gerais, especiais, se as houver, e particulares, cfr.artº 1º, al. f), do DL 176/95, de 26.07.
A aceitação da proposta de seguro pela seguradora, manifesta-se pela emissão da respetiva apólice.
A forma é “ad substantiam” quando ela própria é um requisito da validade do acto jurídico, e, por isso, “a declaração negocial que careça de forma legalmente prevista é nula, quando outra não seja a sanção especialmente prevista na Lei”, cfr. artº 220º, do C.Civil.
Com o Decreto-Lei nº 72/2008, de 16/4, que entrou em vigor em 1/1/2009, deixou de se exigir forma escrita para os contratos posteriormente celebrados.
Atualmente o art. 32º, do DL nº 72/2008, de 16/4, estabelece no seu nº1 que “a validade do contrato de seguro não depende de observância de forma especial” e no nº2 que “o segurador é obrigado a formalizar o contrato num instrumento escrito, que se designa por apólice de seguro, e a entregá-lo ao tomador do seguro”. Pode, assim, não ser papel, pode ser outro instrumento escrito. O nº3, do referido preceito dispõe que a apólice deve ser datada e assinada pelo segurador, consagrando os artigos seguintes regras sobre a apólice, designadamente o art. 37º, o que deve constar da apólice.
Quanto à forma, e superando as dificuldades decorrentes do artigo 426º, do Código Comercial, sem descurar a necessidade de o contrato de seguro ser reduzido a escrito na apólice, admite-se a sua validade sem observância de forma especial. Apesar de não ser exigida forma especial para a celebração do contrato, bastando o mero consenso, mantem-se a obrigatoriedade de redução a escrito na apólice. Assim, a validade do contrato não depende, presentemente, de observância de forma especial.
O contrato de seguro é também um contrato de adesão, isto é, um contrato em que um dos contraentes não tem a menor participação na preparação e redação das cláusulas do mesmo, limitando-se a aceitar o texto que o outro contraente oferece, em massa, ao público interessado –, cfr. Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, pág. 262 -, a sua celebração, porém, está condicionada à apresentação, pelo potencial tomador do seguro, de uma proposta correspondente ao ramo e modalidade que pretende contratar, proposta essa que se traduz num formulário fornecido pela entidade seguradora, cfr. artº 17º nº 2 do DL 176/95, de 26.07.
Porém, a mera subscrição da proposta e a sua subsequente entrega nos serviços da Seguradora, quer diretamente quer através de mediador de seguros, não confere, desde logo, plena validade e eficácia ao contrato a que se reporta tal proposta.
Na verdade e conforme estabelecia o nº 1, do art. 17º, do DL nº 176/95, de 26/7, “No caso de seguros individuais em que o tomador seja uma pessoa física e sem prejuízo de poder ser convencionado outro prazo, considera-se que, decorridos 15 dias após a recepção da proposta de seguro sem que a seguradora tenha notificado o proponente da aceitação, da recusa ou da necessidade de recolher esclarecimentos essenciais à avaliação do risco, nomeadamente exame médico ou apreciação local do risco ou da coisa segura, o contrato considera-se celebrado nos termos propostos”.
Ora, in casu, está assente que foi preenchida e assinada a proposta da Ré Seguradora de adesão a seguro de vida, abrangendo a morte, invalidez total e permanente por acidente e invalidez absoluta e definitiva por doença do proponente, com vista a garantir o pagamento do capital em dívida em cada anuidade ao beneficiário do seguro, proposta essa que a Ré Seguradora recebeu e aceitou.
Estamos face a um seguro de grupo – “seguro de um conjunto de pessoas ligadas entre si e ao tomador de seguro por um vínculo ou interesse comum” (alínea g) do artigo 1.º do DL 176/95, de 26 de julho), neste caso serem clientes da instituição bancária tomadora de seguro – negociado entre a seguradora e o Banco Réu e aplicável aos clientes deste que com ele celebrem contratos de mútuo.
Como se decidiu no Acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto de 19-11-2012, no Processo 1560/11.6TJPRT.P1, in dgsi.net
“I - No processo de formação do contrato de seguro de grupo celebra-se um contrato entre a seguradora e o tomador do seguro em que se estipula a possibilidade de virem a aderir às cláusulas uma generalidade de pessoas que beneficiarão da cobertura do seguro e, em seguida o tomador do seguro promove a adesão ao contrato dos segurados”.
No processo de formação do contrato de seguro de grupo destacam-se dois momentos distintos. Um primeiro em que o contrato é celebrado entre a seguradora e o tomador do seguro (neste caso o Banco), estipulando-se a possibilidade de virem a aderir às suas cláusulas uma generalidade de pessoas (segurados, clientes do banco tomador do seguro), que beneficiarão da cobertura do seguro nos termos que foram estipulados entre a seguradora e o tomador e um segundo momento em que o tomador de seguro promove a adesão ao contrato junto dos membros do grupo.

Face à factualidade provada, o contrato em causa nos autos qualifica-se como contrato de seguro de grupo, sendo-lhe aplicável o disposto no artigo 4.º do citado DL 176/95, de 26 de julho, que estabelece que:

“1 - Nos seguros de grupo, o tomador do seguro deve obrigatoriamente informar os segurados sobre as coberturas e exclusões contratadas, as obrigações e direitos em caso de sinistro e as alterações posteriores que ocorram neste âmbito, em conformidade com um espécimen elaborado pela seguradora.
2 - O ónus da prova de ter fornecido as informações referidas no número anterior compete ao tomador do seguro.
3 - Nos seguros de grupo contributivos, o incumprimento do referido no n.° 1 implica para o tomador do seguro a obrigação de suportar de sua conta a parte do prémio correspondente ao segurado, sem perda de garantias por parte deste, até que se mostre cumprida a obrigação.
4 - O contrato poderá prever que a obrigação de informar os segurados referida no n.° 1 seja assumida pela seguradora.
5 - Nos seguros de grupo a seguradora deve facultar, a pedido dos segurados, todas as informações necessárias para a efectiva compreensão do contrato”.
O contrato de seguro de grupo é titulado pela apólice e a ela aderem uma pluralidade de clientes.
Com base nos boletins de adesão dos candidatos à participação no contrato, a seguradora emite, por cada pessoa segura, um certificado individual ou outro documento comprovativo de inclusão no grupo seguro, de que constem os elementos de identificação de pessoa segura e a designação dos beneficiários.
Existe o contrato de seguro titulado pela apólice referida e há suporte documental que permite concluir que a ele aderiu o Autor, verificando-se aceitação dessa adesão por parte da seguradora.
Ora, resulta do citado no artigo 4.º do DL 176/95, de 26 de julho, que competia ao tomador do seguro, o Banco 1º Réu, a obrigação de informação das cláusulas contratuais ao segurado, cabendo-lhe, ainda, o ónus da prova do cumprimento desse dever.
O Autor alega tratar-se de um contrato de adesão e que lhe não foram comunicadas nem explicadas as condições gerais e especiais, com violação, desde logo, do artº 5º do DL nº 446/85 de 25 de Outubro (Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais), abreviadamente RJCCG.
Dispõe o art.1 º DL 446/85, de 25/10 que "As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respetivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma".
Pese embora o legislador tenha optado por não consagrar uma definição acabada de cláusulas contratuais gerais, pode dizer-se serem elas "cláusulas reformuladas com vista à disciplina uniforme de uma série, em regra indeterminada, de contratos de certo tipo a celebrar pelo predisponente ou por terceiro" (S. Ribeiro, Cláusulas Contratuais Gerais e o Paradigma do Contrato, p.173).
São três os requisitos essenciais que têm de estar verificados para que se possa considerar estarmos perante tais cláusulas (cf. A. Costa e M. Cordeiro, Cláusulas Contratuais Gerais - Anotação ao Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, pp.17 ss, P. Machado, Sobre Cláusulas Contratuais Gerais e Conceito de Risco, pp.13 ss. e S. Ribeiro, ob. cit, pp.173 ss):
1) pré-elaboração: são pré-elaboradas, existindo disponíveis antes de surgir a declaração que as perfilha;
2) rigidez: apresentam-se rígidas, independentemente de obterem ou não a adesão das partes, sem possibilidade de alterações;
3) indeterminação: podem ser utilizadas por qualquer pessoa, quer como proponente, quer como destinatária.

Verificando-se tais requisitos in casu, está, pois, o contrato agora em análise, também, sujeito à disciplina das cláusulas contratuais gerais.

Dispõe o referido artigo 5º que:

“1 - As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las.
2 - A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efetivo por quem use de comum diligência.
3 - O ónus da prova da comunicação adequada e efetiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais”.
Cumpre, desde já, referir que este dever de comunicação não impõe a obrigação de explicar cada uma das cláusulas e o seu significado, antes vincula a seguradora a colocar o destinatário na situação de melhor conhecer essas cláusulas de modo a poder formar a sua vontade.

Ora, no caso concreto, resultou provado que tal comunicação e informação não foi efetuada, nem pela tomadora do seguro, a 1ª Ré, nem pela Seguradora, 2ª Ré.
Na verdade, não se provou que tenha sido entregue ao Autor, aquando da contratação do seguro em causa nos autos, uma "nota informativa" nos termos da qual "a pessoa segura é considerada no estado de invalidez absoluta e definitiva quando, em consequência de doença susceptível de constatação médica objetiva, fique total e definitivamente incapacitada de exercer qualquer atividade remunerável e necessite de recorrer, de modo contínuo, à assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária, não sendo possível prever qualquer melhoria, com base nos conhecimentos médicos actuais" nem que a Ré tenha comunicado e explicado ao Autor todas as condições que se aplicavam ao contrato de seguro titulado pela apólice nº …, com a adesão …, assim como a respetiva "nota informativa".
Mas, mais do que isso, provou-se, até, que:

- Por carta datada de 7 de junho de 2005 a segunda Ré comunicou ao Autor a aceitação da proposta de adesão ao Seguro Vida Grupo e que a apólice garantia a cobertura de morte, invalidez total e permanente por acidente e invalidez absoluta e definitiva por doença, nos termos constantes do documento nº 3 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido;
- Em 22 de junho de 2005 a Ré X - Companhia de Seguros aceitou expressamente o contrato de seguro celebrado com o Autor e a que este aderiu e considerou-o efetivamente celebrado com início em 7 de junho de 2005, ficando titulado pela apólice … e pelo certificado … - documento nº 4 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
- A Ré X - Companhia de Seguros emitiu, em 22 de junho de 2005, o respetivo certificado de seguro, que enviou ao Autor, fazendo constar do mesmo como pessoa segura José, como tomador e beneficiário o Banco A, como data de início 07 de junho de 2005, o capital seguro de € 100.000,00 nos termos constantes de fl. 30 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e que o mesmo garantia e garante o pagamento do capital em dívida em cada anuidade ao beneficiário em caso de morte, de invalidez total e permanente por acidente e de invalidez absoluta e definitiva por doença - (doc. 4);
- A Ré "X - Companhia de Seguros, S.A." celebrou com o Autor o seguro de vida titulado pela apólice nº …, com a adesão nº …, e com as condições gerais e particulares constantes de fls. 67 a 71 e 80 a 90 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
- Aquando da assinatura do boletim de adesão e proposta de seguro foi dito ao Autor que em caso de morte ou de invalidez absoluta e definitiva para o exercício da sua profissão ou de qualquer outra, em consequência de acidente ou de doença, tinha direito a acionar o contrato de seguro;
- No dia 26 de abril de 2005, a primeira Ré apresentou ao Autor a proposta de seguro de vida para garantia do capital mutuado, junta a fls. 28, que o mesmo se limitou a assinar;
- A primeira Ré apresentou ao Autor um documento intitulado Ramo Vida Grupo - Boletim de Adesão, já preenchido com os seus dados pessoais e os dados do empréstimo, que o Autor se limitou a assinar;
- Foi apenas no pressuposto e no convencimento que o contrato de seguro mencionado em dos factos assentes garantia o pagamento, à primeira Ré, do capital do empréstimo nº …, no caso de morte, de invalidez total e permanente por acidente e de invalidez absoluta e definitiva por doença que o Autor aceitou assinar e assinou em abril de 2005 a proposta de seguro junta com a petição inicial a fls. 28;
- Na data da assinatura da proposta de adesão, em 26-04-2005, não foi entregue ao Autor nenhuma cópia da mesma, nenhuma cópia das condições gerais ou especiais, nenhuma nota informativa nem nenhuma cópia da apólice;
- Só mais de um mês e meio após a assinatura da proposta de adesão, a segunda Ré enviou ao Autor a carta datada de 7 de junho de 2005, junta com a petição inicial, a fls. 29 dos autos, a comunicar a aceitação da proposta de adesão do seguro de vida Grupo cobrindo os riscos de morte, invalidez total e permanente por acidente e invalidez absoluta e definitiva por doença;
- Tendo enviado posteriormente, em 22 de junho de 2005, apenas o certificado de seguro junto com a petição inicial como documento nº4, a fls. 30 dos autos;
- Ao Autor não foi dada cópia das condições gerais, especiais e particulares da apólice nem na data da assinatura da proposta, nem na data da celebração do contrato, nem posteriormente, nem pela 1 ª Ré, nem pela 2ª Ré;
- Ao Autor nunca foram explicadas, comunicadas nem entregues as condições gerais e especiais do contrato de seguro junto com a contestação de fls. 67 a 71 e 80 a 90;
- E não lhe foi explicado nem comunicado o teor e conteúdo da "nota informativa" junta com a contestação a fls. 72-73 nem lhe foi entregue cópia da mesma;
- O Autor apenas teve cópia do boletim de adesão e das condições gerais e especiais através da carta da Ré seguradora datada de 25-08-2010;
- Nunca ninguém falou, comunicou, explicou ou disse ao Autor que para que o seguro funcionasse a invalidez só seria considerada se, para além dela, o Autor precisasse de assistência de terceira pessoa para os atos normais da sua vida diária.
O contrato de seguro, conforme o art. 427º, do Código Comercial, regula-se pelas estipulações da respetiva apólice, não proibidas pela lei e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições daquele Código.

Como vimos, foi declarada nula, por ser abusiva, a cláusula do mencionado contrato de seguro na parte em que exige a necessidade de recorrer, de modo contínuo à assistência de uma terceira pessoa para efetuar os atos normais da vida diária, não sendo possível prever qualquer melhoria com base nos conhecimento médicos atuais, pois que ao Autor, até à assinatura do boletim de adesão e proposta de seguro, nada mais foi informado nem comunicado para além de que em caso de morte ou de invalidez absoluta e definitiva para o exercício da sua profissão ou de qualquer outra, em consequência de acidente ou de doença, tinha direito a acionar o contrato de seguro, tendo sido apenas no pressuposto e no convencimento que o contrato de seguro mencionado em dos factos assentes garantia o pagamento, à primeira Ré, do capital do empréstimo nº …, no caso de morte, de invalidez total e permanente por acidente e de invalidez absoluta e definitiva por doença que o Autor aceitou assinar e assinou em abril de 2005 a proposta de seguro junta com a petição inicial a fls. 28.
E foi declarada nula com os seguintes fundamentos “sabendo-se que o A. não contratou, não aceitou, não foi sequer informado da cláusula que para o risco da invalidez absoluta e definitiva decorrente de doença era necessária a verificação cumulativa da necessidade de assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária - note-se que do boletim de adesão (cf fls. 28) não existe texto expresso quanto a tal requisito e bem assim da comunicação da Ré da aceitação dessa proposta e do certificado de seguro (cf. respectivamente fls. 29 e 30), apenas consta "Invalidez Absoluta e Definitiva por Doença"-, e não tendo a R. demonstrado que cumpriu o dever de comunicação (art.5º-1 e 2 DL 446/85 cit.) tem de concluir-se ter sido violado o dever de comunicação imposto pelo art. 5º DL 446/85 cit, que obriga o utilizador das cláusulas contratuais gerais a comunicar ao aderente o respectivo conteúdo de forma adequada, atempada, completa e integral (cf. S. Ribeiro, O Problema do Contrato - As Cláusulas Contratuais Gerais e o Princípio da Liberdade Contratual, pp.368 SS).
Contudo, estando-se perante um seguro de grupo, quem estava obrigado a informar o segurado sobre as coberturas e exclusões previstas no contrato era o tomador do seguro e não o segurador, ou seja, a co-ré Banco A.
Sobre este entendimento pronunciou-se o AC STJ de 5/4/2016 (disponível em www.dqsi.pt) que aqui nos limitamos a reproduzir: «Como se aponta no acórdão deste Supremo Tribunal de 14 de abril de 2015 (proferido no processo nº 385/12.6TBBRG.G1.S1, disponível em www.dqsi.pt). o Supremo Tribunal de Justiça teve já a ocasião de se pronunciar diversas vezes sobre a questão de saber sobre quem recai a obrigação de informação das cláusulas de exclusão de riscos ao segurado que adere a um contrato de seguro de grupo contributivo. Assim sucedeu nos Ac.s de 25 de Junho de 2013, proc. nº 24/10.0TBVNG.P1.Sl, de 22 de Janeiro de 2009, proc. nº 08B40491, de 20 de Janeiro de 2010, proc. nº 294/06.8TBOAZ.P1, de 7 de Outubro de 2010, proc. 651/04.4TBETR.P1.S1, de 12 de Outubro de 2010, proc. nº 646/05.0TBAMR.G1.S1, de 1 de Janeiro de 2011, proc. nº 1443/04.6TBGDM.P1.S1, de 29 de Maio de 2012, proc. nº 7615/06.1TBVNG.P1.S1, de 21 de Fevereiro de 2013, proc. nº 267710.6TBBCL.G1.S1, de 27 de Março de 2014, proc. nº 2971/12.5TBBRG.G1.S1, de 9 de Julho de 2014, proc. nº 841110.0TVPRT.L 1.S1 ou de 18 de Setembro de 2014, proc. nº 2334/10.7TBCDM.P1.S1, todos disponíveis em www.dqsi.pt. Nestes acórdãos decidiu-se no sentido de que resultava expressamente do nº 1 do 4º do Decreto-Lei nº 176/95 que era ao tomador que incumbia o dever de informação dos segurados quanto às coberturas e exclusões contratadas, cabendo-lhe igualmente o ónus da prova de ter fornecido estas informações. (...)
A questão deve, pois, ser vista como a viu o acima aludido acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 25 de junho de 2013, e passamos a citar:
"É incontroverso que tal dever de esclarecimento do aderente recai sobre o banco/tomador de seguro, é este o regime que decorre expressamente do estatuído no art. 4º do DI. 176/95 nos seguros de grupo, salvo convenção em contrário, o tomador de seguro deve obrigatoriamente informar os segurados sobre as coberturas e exclusões contratadas e as obrigações e direitos em caso de sinistro, em conformidade com um espécimen elaborado pela seguradora, cabendo-lhe o ónus da prova de ter fornecido estas informações, por sua vez, deve a seguradora facultar, a pedido dos segurados, todas as informações necessárias para a efectiva compreensão do contrato.
Note-se que este regime legal continua a vigorar, no essencial, no âmbito do DL 72/08 (art. 78º), apesar da preocupação, bem expressa no preâmbulo, de tutela acrescida dos aderentes no âmbito da regulamentação do seguro de grupo contributivo, ao afirmar-se: «Nos contratos de seguro de grupo em que os segurados contribuem para o pagamento, total ou parcial, do prémio, a posição do segurado é substancialmente assimilável à de um tomador de seguro individual. Como tal, importa garantir que a circunstância de o contrato de seguro ser celebrado na modalidade de seguro de grupo não constitui um elemento que determine um diferente nível de protecção dos interesses do segurado e que prejudique a transparência do contrato». (...) saliente-se que este regime especial, fundado na peculiar natureza e estrutura da figura do seguro de grupo, envolvendo uma relação triangular entre os interessados, se sobrepõe naturalmente (precisamente como regime especial que é) ao regime regra das cláusulas contratuais gerais, que impõe ao outro contraente (nos casos normais, que não tenham subjacente um seguro de grupo, obviamente a própria seguradora) a obrigação de comunicar e explicitar as cláusulas ao aderente, porém, no caso do seguro de grupo, este dever de comunicação e informação está legalmente posto a cargo do tomador de seguro, pelo que, em primeira linha, ele não incide sobre a seguradora, a menos que algo diferente resulte das estipulações das partes. "
No sentido (no essencial) do entendimento que defendemos, refiram-se ainda os acórdãos deste Supremo Tribunal de 20 de maio de 2015 (proferido no processo nº 17/13.5TCGMR.G1.51, disponível em www.dqsi.pt) e de 3 de Março de 2016 (proferido no processo nº 137/11.0TBALD.C1.51, igualmente disponível em www.dqsi.pt. e cujos Autores e Ré são, aliás, os mesmos do presente processo).»
E, sendo assim, não constando do contrato de seguro celebrado entre a ora Ré e o respectivo Tomador (co-ré Banco A) que a obrigação de comunicação impendia sobre a primeira, conclui-se no sentido de que a Ré X - Companhia de Seguros não responde perante o Autor em decorrência da não comunicação das coberturas e exclusões. Ou seja, o Autor não se poderia fazer prevalecer contra a Ré X - Companhia de Seguros pelo facto das condições não lhes terem sido por ela comunicadas.
Contudo, a questão da falta de informação ou comunicação das condições gerais e especiais do contrato é uma questão secundária ou que fica prejudicada por uma outra que se entende ser prevalecente.

A cláusula da exigência do requisito da necessidade de terceira pessoa, verificada que seja a invalidez absoluta e definitiva por doença para o exercício da profissão, sempre deveria considerar-se nula por abusiva e desproporcionada, no contexto negocial em que é celebrado este contrato de seguro sub iudice: o mesmo aparece na sequência da contratação de um mútuo e como exigência da entidade mutuária, sendo que o risco que se pretende segurar (interesse quer por parte do mutuante, quer por parte do mutuário) é precisamente a incapacidade definitiva e absoluta para o exercício de actividade profissional que lhe permitiria obter rendimentos para honrar o cumprimento do referido mútuo!
Verificando-se por si só essa incapacidade, e, repete-se, tendo em conta o contexto negocial em que se insere a contratação do seguro, a exigência do requisito da necessidade e dependência de terceira pessoa para realização dos actos da vida quotidiana é manifestamente abusiva, excedendo os limites da boa-fé - artigo 15º do D.L. 446/85.

De resto, neste sentido decidiu recentemente o STJ no AC de 27/9/2016 (in www.dgsipt):

I- As condições especiais de um contrato de seguro, pré-elaboradas e destinadas a ser adoptadas por interessados indeterminados, não deixam de ser cláusulas contratuais gerais, e, como tal, estão submetidas aos ditames do DL nº 446/85
II. O carácter abusivo de uma cláusula contratual geral, por atentatória do vector da boa-fé, pode e deve ser conhecido oficiosamente pelo tribunal, precedendo o cumprimento do contraditório.
III. Tal conhecimento oficioso é permitido pelo ordenamento jurídico nacional e foi especialmente pretendido pela Diretiva 93/13/CEE, sendo esta a orientação do Tribunal de Justiça da União Europeia.
IV É abusiva (por atentatória do vetor da boa-fé), proibida e nula a cláusula especial constante das condições de contrato de seguro de grupo destinado ao pagamento do saldo de um empréstimo por crédito à habitação em caso de invalidez absoluta e definitiva do aderente, que exige acrescidamente para a caracterização desse estado de invalidez que o aderente fique na obrigação de recorrer à assistência permanente de uma terceira pessoa para efectuar os actos ordinários da vida corrente.
V Tal cláusula introduz um significativo desequilíbrio contratual entre as partes (na prática esvazia largamente a utilidade do seguro), na medida em que o fim precípuo do dito seguro é obrigar o segurador a pagar ao banco mutuante no caso do aderente ficar impossibilitado de o fazer por si, e esta finalidade satisfaz-se com a própria impossibilidade e sem necessidade do aderente ficar também dependente da referida assistência permanente.
VI. É de entender, face ao que se dispunha no art. 4º do DL 176/95, que era sobre o tomador de seguro, e não sobre a seguradora, que competia obrigatoriamente comunicar ao aderente ao seguro de grupo as coberturas e exclusões constantes das condições gerais e especiais do contrato.
Nestes termos, conclui-se que a condição de que estamos a tratar é nula, não podendo a Ré X - Companhia de Seguros querer fazer-se prevalecer dela. O que é dizer, não pode tal condição ser atendida (exigida) como elemento constitutivo do direito que o Autor veio exercer contra a Ré”.
Celebrado contrato de seguro entre as partes, em que um dos riscos cobertos é a invalidez absoluta e definitiva por doença, ao Autor cabe a prova da sua verificação, por se tratar de facto constitutivo do direito indemnizatório que se arroga (art. 342º, n.º 1 do CC), competindo à seguradora o ónus da alegação e da prova de factos conducentes à exclusão da sua responsabilidade (n.º 2 do art. 342º do CC).

Considerou a sentença recorrida que o A. se encontra em situação de invalidez absoluta e definitiva por doença impeditiva do e para o exercício de qualquer atividade profissional remunerada desde 30/1/2010 e, na sequência disso, declarou-o com fundamento nos factos que resultaram provados, sendo eles que:

- No ano de 2010 o Autor foi acometido de leucemia aguda mielomonocítica/leucemia mielóide aguda diagnosticada em 30/1/2010 (cfr. f.p. nº 20);
- Desde a supra referida data fez tratamentos hospitalares no Hospital e de quimioterapia no IPO/Porto e foi submetido a transplante de medula óssea em 29 de Julho de 2010 (f.p. nº 21);
- Em consequência da doença de que foi acometido o Autor ficou e encontra-se com invalidez e incapacitado para o exercício da sua atividade profissional e de qualquer atividade remunerada, mantendo tratamento de imunossupressão, não sendo de prever remissão completa da patologia base e co- morbilidades associadas (f.p. nº 22);
- Encontrando-se dependente de ajudas técnicas permanentes, tais como medicamentosas, tratamentos médicos regulares e ajudas técnicas (f.p. nº 23);
- Antes de lhe ter sido diagnosticada a doença, o Autor trabalhava como vendedor ambulante e comissionista, atividade que lhe exigia constantes deslocações e movimentação e sujeição ao sol, chuva e intempéries (f.p. nº 24);
- Desde que lhe foi diagnosticada a doença, o Autor cessou a sua atividade profissional e não tem capacidade física para a exercer, nem tem habilitações que lhe permitam exercer qualquer outra atividade (f.p. nº 25);
- Atualmente, o Autor não tem capacidade nem resistência para o exercício de qualquer atividade profissional, não podendo fazer esforços, não podendo apanhar sol nem estar sujeito a diferenças de temperatura (f.p. nº 26);
- Devido ao transplante de medula óssea o Autor encontra-se sob vigilância médica e acompanhamento permanente no IPO, sob imunossupressão e particularmente sujeito e suscetível a infeções, implicando cuidados gerais de proteção e prevenção (f.p. nº 27);
- A sua situação e limitação é permanente e sem possibilidade de melhoria, dado o risco de infeções que corre (f.p. nº 28);
- O Autor encontra-se sem trabalhar, incapaz para o trabalho, reformado por invalidez desde 2013, sendo que até à data da reforma e desde que lhe foi detetada a doença supra referida em 30/1/2010, esteve sem auferir qualquer rendimento e sem capacidade nem hipótese de arranjar trabalho (f.p. nº 29);
- Em consequência da doença e sequelas de que ficou portador o Autor ficou afetado de uma I.P.G. de 66,85000% (f.p. nº 30);
Em face dos factos apurados quanto ao quadro de doença que afeta o A. desde a data em que lhe foi diagnosticada, as consequências dessa doença ao nível da repercussão na atividade profissional, impeditivas, de modo total, do desempenho da sua atividade profissional desde o seu diagnóstico e das sequelas de que ficou portador: uma incapacidade permanente profissional de 66,85%, com incapacidade definitiva para exercer qualquer profissão, dúvidas não surgem de que a garantia do seguro em causa cobre o sinistro sofrido pelo A., ocorrido em 30/1/2010, data a partir da qual se verificou a incapacidade absoluta e definitiva para o exercício de qualquer profissão.
Assim, cumprido se mostra o ónus do segurado de demonstrar ter sido afetado por doença que fez com que ficasse, desde que a mesma lhe foi diagnosticada, com invalidez e incapacitado para o exercício da sua atividade profissional (e até de qualquer atividade remunerada), não tendo habilitações que lhe permitam exercer qualquer outra atividade, e que a sua situação e limitação é permanente e sem possibilidade de melhoria (dado o risco de infeções que corre).
E verifica-se que foi considerado assente que à data das comunicações, e já desde 30/1/2010, que o Autor se encontra, efetivamente, numa situação de invalidez absoluta e definitiva por doença, como bem se decidiu.

Conclui a Recorrente, Ré X - Companhia de Seguros, S.A., que só após a reforma o A. pode acionar a cobertura de invalidez total e permanente, pois que nos termos das condições gerais da apólice é considerada invalidez absoluta e definitiva “a limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria em que, cumulativamente, estejam preenchidos os seguintes requisitos:

a) A pessoa segura fique completa e definitivamente incapacitada de exercer a sua profissão ou de qualquer outra actividade remunerada, compatível com os seus conhecimentos e aptidões;
b) Corresponda a um grau de desvalorização igual ou superior à percentagem definida em condições particulares, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por acidentes de trabalho e Doenças Profissionais em vigor na data da avaliação, não entrando para o seu cálculo quaisquer incapacidades ou patologias pré-existentes;
c) Seja reconhecida previamente pela ISS pela qual a pessoa segura se encontra abrangida ou pelo Tribunal de Trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou instituição de Segurança Social, por junta médica.."
e que encontrando-se o Autor sem trabalhar, incapaz para o trabalho, reformado por invalidez desde 2013 - cfr. ponto 29 dos factos provados -, correspondendo essa situação ao risco assumido pela Ré aquando da celebração do seguro, não estão preenchidos os pressupostos para ser acionada a cobertura de invalidez total e permanente antes de o A. se encontrar reformado ou seja, antes do ano de 2013.
Ora, assim não acontece, pois que, na verdade, a cláusula constante das condições gerais do contrato de seguro de grupo destinado ao pagamento do saldo de um empréstimo por crédito à habitação em caso de invalidez absoluta e definitiva do aderente, que exige, em acréscimo, para a caracterização do estado de invalidez que o aderente seja previamente reconhecido pela ISS pela qual a pessoa segura se encontra abrangida ou pelo Tribunal de Trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou instituição de Segurança Social, por junta médica, com as exigências de verificação cumulativa dos supra mencionados requisitos, também ela, pelas mesmas razões acima referidas relativamente à clausula já declarada nula, não pode deixar de ser considerada abusiva (por atentatória da boa-fé), proibida e nula.
O que acima se decidiu quanto à outra cláusula, tem inteira aplicação a esta.
Efetivamente, relativamente à questão do mencionada dever de informação foram-se desenvolvendo duas correntes jurisprudenciais:
Uma, mais seguida nas Relações mas minoritária no Supremo Tribunal de Justiça, defende que, apesar de impender sobre o banco, tomador do seguro, a obrigação geral de comunicação e explicação das cláusulas do contrato, a mesma não desonera a seguradora, como sustenta o Autor, da obrigação de comunicar e explicar as condições gerais e especiais do contrato de seguro de grupo ao aderente, uma vez que ela é a responsável primeira por essa comunicação no âmbito dos contratos de adesão, conforme decorre do referido artigo 5.°, do RJCCG.
Considera esta corrente que a falta de informação do banco se repercute na R. seguradora, não podendo esta invocar a exclusão de uma cobertura, contida numa cláusula que não haja sido devidamente comunicada ou informada pelo tomador, já que a seguradora e o tomador de seguro prosseguem objetivos lucrativos comuns ou complementares, sendo este angariador na celebração do concreto contrato com os autores (crédito à habitação/seguro de vida, contrato este coligado àquele). Se é o segurado-aderente que contrata em primeira linha com o tomador, é a seguradora que recebe as declarações de adesão ao contrato de seguro e, que considera os segurados/participantes, como integrados ou não ao abrigo das condições estipuladas na apólice. A falta de dever de informação reflete-se no contrato de adesão, na sua conexão com a seguradora, afetando a falta de informação a relação jurídica entre segurador-tomador de seguro, entre segurado-seguradora ou ente tomador de seguro-seguradora (eventual direito de regresso) não deixando a seguradora de responder perante o segurado pela ausência dessa informação por parte do tomador do seguro. Do ponto de vista dos segurados é indiferente saber quem tinha o dever legal de os informar, confiando que tanto a seguradora como o tomador estão obrigados àquele dever e ao cumprimento integral do contrato. O alcance do art.º 4º, nº 1, do Decreto-lei nº 176/95 restringe-se às relações (internas) entre o segurador e o tomador; não colide com o RJCCG, como considera o Autor nas suas contra-alegações. A ratio do preceito foi dirimir eventuais conflitos entre estas duas entidades, estabelecendo uma norma delimitadora suscetível de derrogação por aquelas partes (n° 4 do preceito). O segurado é alheio a esta equação, inferindo-se do preceito, por um raciocínio de exclusão, que não é ao segurado que incumbe o ónus de alegação e prova da ausência de comunicação. Pode convocar-se para a resolução do litígio o RJCCJ, não podendo a seguradora ilibar-se ao pagamento do capital seguro. Os deveres de comunicação e esclarecimento, na íntegra, do conteúdo negocial estão previstos nos art.ºs 5.º e 6.º do Decreto-lei nº 446/85 e resultam diretamente do princípio da boa fé contratual, consagrado no art.º 227.º do Código Civil, estendendo-se a todas as partes dos contratos que tenham poder de impor cláusulas negociais ao consumidor. O art.º 4º do Decreto-lei nº 176/95 não exonera a seguradora perante o aderente. Proteção do aderente enquanto parte mais fraca da relação negocial, desprovida de qualquer poder negocial e princípio de respeito pelos interesses do outro numa ética de cooperação e de solidariedade. Existe uma conexão e interligação funcional entre as várias relações jurídicas em causa, que alteram a fisionomia e a estrutura da relação jurídica entre o banco e a seguradora, regulada em função da proteção dos interesses do aderente. Assim, na perspetiva desta posição, se a atuação da entidade bancária na comercialização de um determinado produto financeiro for suscetível de acarretar a exclusão de cláusulas do contrato de seguro, responderá a seguradora perante o segurado pelas consequências daí decorrentes, sem prejuízo de poder, eventualmente, e em momento subsequente, vir acionar o tomador intermediário pelo prejuízo que tal falta de informação lhe tenha acarretado.
A outra, mais seguida pelo Supremo Tribunal de Justiça, acima referida, sustenta que no tipo de contrato de seguro de grupo contributivo, na modalidade de seguro de vida, de crédito à habitação, nos termos do art.º 4.º do Decreto-lei n.º 176/95, de 27 de julho, recai sobre o tomador de seguro, o banco mutuante, o ónus de informar e esclarecer os segurados aderentes sobre as cláusulas de cobertura e de exclusão do risco assim garantido, não sendo, por regra, oponível à seguradora, pelo segurado, a falta de comunicação daquelas cláusulas.
Esta corrente entende que o dever de informação recai, nos termos do art.º 4º do Decreto-lei nº 176/94, sobre o tomador do seguro, regime que continuou a vigorar, no essencial, no âmbito do Decreto-lei nº 72/2008, de 16 de abril (art.ºs 78º, nºs 1 e 3). Não está legalmente prevista a comunicabilidade à esfera jurídica da seguradora dos efeitos do incumprimento dos deveres legais de informação colocados a cargo do tomador de seguro. O regime especificamente previsto pelo Decreto-lei nº 176/95, 26 de julho, para o contrato de seguro de grupo, afasta a aplicabilidade do regime das cláusulas contratuais gerais, definido genericamente pelo Decreto-lei n.º 446/85, de 25 de outubro, no que é incompatível com aquele. Assim sucede quanto à definição dos sujeitos do dever de informação. Trata-se de um regime especial, fundado na peculiar natureza e estrutura da figura do seguro de grupo, envolvendo uma relação triangular entre os interessados, que se sobrepõe naturalmente ao regime regra das cláusulas contratuais gerais, que impõe ao outro contraente a obrigação de comunicar e explicitar as cláusulas ao aderente. No seguro de grupo este dever está legalmente imposto ao tomador de seguro, pelo que em primeira linha, ele não incide sobre a seguradora, por falta de fundamento normativo, a menos que algo diferente resulte das estipulações das partes. A admitir-se a responsabilização da seguradora pela omissão de um dever de comunicação que obriga o tomador, veria aquela ampliado o leque dos riscos contratados com o banco/tomador de seguro – e com base nos quais vinha sendo calculado o prémio de seguro devido – não por via de uma conduta que lhe fosse direta e pessoalmente imputável, mas exclusivamente com fundamento no incumprimento culposo de um dever legalmente imposto a outro sujeito, o banco/tomador de seguro – por, no caso dos autos, se não conseguir vislumbrar qualquer comportamento deficiente ou irregular que, subjetivamente, se pudesse imputar à própria seguradora. Tal redundaria num fenómeno de responsabilização objetiva da seguradora por um comportamento negligente exclusivamente imputável ao outro contraente, não demandado pela interessada/aderente. O banco/tomador não atua como comissário ou representante legal ou auxiliar da seguradora (art.ºs 500º e 800º do Código Civil), e também não é um intermediário ou um angariador na celebração dos concretos contratos com os aderentes. Não há contacto direto, negociação, entre o aderente e a seguradora.
Isto não significa que o incumprimento do dever de informação seja desprovido de sanção. O Banco é responsável pelos prejuízos que causar ao segurado, como presentemente se estatui no artigo 79º do Decreto-Lei nº 72/2008. O segurado pode demandar o Banco para o responsabilizar, ou para discutir a violação de qualquer outra regra. A circunstância de se não afirmar expressamente a responsabilidade civil do Banco não significa que não sejam aplicáveis as regras respetivas. De qualquer modo, o já citado artigo 4º do Decreto-Lei nº 176/95 dispunha, como sanção, que “
nos seguros de grupo contributivos, o incumprimento do referido no n.° 1 [dever de informação] implica para o tomador do seguro a obrigação de suportar de sua conta a parte do prémio correspondente ao segurado, sem perda de garantias por parte deste, até que se mostre cumprida a obrigação”. A comunicação à seguradora dos efeitos do incumprimento dos deveres legais de informação a cargo do tomador de seguro altera a estrutura e a fisionomia jurídica fundamentais desse tipo negocial, assente numa relação contratual básica estabelecida entre duas entidades (tomador de seguro/seguradora), colocadas em plano de total paridade jurídica (o contrato de seguro acordado entre ambas não pode obviamente configurar-se como contrato de adesão). O nº 5 do art.º 4º do Decreto-lei nº 176/95, de 26 de julho, é claro no sentido de que o dever da seguradora de facultar informações para a efetiva compreensão do contrato existe, mas só é exigível a pedido dos segurados. Para esta corrente, não está vedado à seguradora invocar a seu favor contra os segurados aderentes as cláusulas gerais e particulares sobre o âmbito e exclusões do risco assumido no contrato de seguro, sem que a estes seja lícito contrapor o incumprimento do dever de informação e esclarecimento por parte do tomador do seguro. É ao tomador do seguro que incumbe o dever de informação dos segurados, quanto às “coberturas e exclusões contratadas”, cabendo-lhe igualmente o ónus da prova “de ter fornecido estas informações”, conforme art.º 4º, nº 1 e nº 2 do Decreto-lei nº 176/95, de 26 de julho” (1).
Foi este o entendimento perfilhado no citado acórdão e é também o nosso.
In casu, como vimos, não pode a omissão de informação ser imputada à R. seguradora, já que a lei, na vigência do Decreto-lei nº 176/95, de 26 de julho, aplicável ao caso, já impunha ao tomador do seguro, no seguro de grupo, como se expôs, o dever de informar o segurado sobre as condições do contrato, designadamente sobre o âmbito das coberturas e exclusões e dos direitos e obrigações em caso de sinistro.
Constata-se, porém que, independentemente disso e por se tratar de questão que, até, se coloca previamente àquela e, por isso a apreciar em primeiro lugar, a cláusula em causa não pode ser aplicada in casu, pois que introduz desequilíbrio contratual, significativo, entre as partes nesta relação triangular e esvazia a utilidade do seguro, na medida em que o fim do mesmo é vincular a seguradora a pagar ao banco mutuante, no caso do aderente ficar impossibilitado de o fazer, e esta finalidade satisfaz-se com a própria impossibilidade em si.
Verificada que se mostre a impossibilidade, nenhuma razão justificativa pode existir para a exigência de prévio reconhecimento “pela ISS pela qual a pessoa segura se encontra abrangida ou pelo Tribunal de Trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou instituição de Segurança Social, por junta médica”, o que se revela abusivo, contrário aos ditames da boa fé e injusto, no caso concreto.
Assim, sempre a seguradora se não pode prevalecer da referida cláusula, desconhecida do Autor e com que ele não podia, como vimos, contar.
Tal como se refere no Acórdão anteriormente citado “O aderente é a parte fraca da relação contratual pelo simples facto de lhe serem opostas cláusulas pré-formuladas de aplicação geral, cuja utilização reflete, em regra, uma supremacia do predisponente, senhor do negócio, a que alguns chamam também de “superioridade intelectual”, estando o aderente privado, em desvio ao arquétipo negocial, de participação modeladora no conteúdo do contrato. O uso generalizado, conjuntamente com a forma externa de apresentação (normalmente um texto impresso) desencadeiam automáticas associações de objetividade, imodificabilidade e validade prescritiva ao espírito do aderente, obstaculizando ou removendo eventuais dúvidas quanto à equidade das cláusulas, destilando um efeito psicológico de legitimação que é mais um fator propício à adesão. A inferioridade do aderente é também de ordem motivacional, decorrendo da objetiva falta de interesse em investir tempo e dinheiro numa cuidadosa análise das cláusulas apresentadas, e num eventual estudo de alternativas.
O RJCCG, impondo limites à liberdade contratual, procura, precisamente, garantir, pela ordem jurídica, uma equilibrada composição de interesses (garantia de justeza) ou, pelo menos, obstar a que o utilizador das cláusulas contratuais gerais retire delas vantagens excessivas, dada a falta de participação bilateral no processo auto- regulador. Funciona como contraponto das vantagens que ele retira da uniformização contratual, assegurando uma conformação de conteúdo que atenda minimamente aos interesses de todos quantos se encontram sujeitos a aderir a cláusulas predefinidas, visando uma justa repartição de direitos e deveres entre os contraentes, posta em risco pelos poderes de decisão unilateral com que o predisponente se habilitou”.
Para tal, o RJCCG estatui, no art.º 15º, que são proibidas as cláusulas contratuais gerais contrárias à boa fé.
E o art.º 16º, consagra que Na aplicação da norma anterior devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face da situação considerada, e, especialmente:
a) A confiança suscitada, nas partes, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa, pelo processo de formação do contrato singular celebrado, pelo teor deste e ainda por quaisquer outros elementos atendíveis;
b) O objetivo que as partes visam atingir negocialmente, procurando-se a sua efetivação à luz do tipo de contrato utilizado.
E, como se escreve-se no Acórdão anteriormente mencionado “Citando Sousa Ribeiro (2), que refere Ana Prata (3), “o que está em causa, nesta particular valência da boa fé, é a salvaguarda de uma composição de interesses que não seja excessivamente desequilibrada. […] O controlo do conteúdo constitui-se, assim, como um puro juízo sobre a razoabilidade dos termos contratuais, ponderando a sua repercussão nos interesses das partes. … Divergências para além do razoável, que importem, em benefício do predisponente, uma desvirtuação significativa do equilíbrio dos efeitos contratuais, não são admitidas. […] O controlo do conteúdo mais não é, assim, do que a verificação do modo como esse contraente respeitou, na redacção das cláusulas, o especial dever, que a boa fé lhe impõe, de considerar os interesses dos parceiros contratuais.… o que conta, à luz do princípio da boa fé «para além da aparente simetria dos efeitos jurídicos» é «a efectiva incidência da cláusula nos interesses reais das partes»”.
Há violação do princípio da boa fé se, numa análise objetiva, determinada cláusula contratual se traduzir na violação de expectativas geradas pelo processo de relacionamento e pelos efeitos práticos normais do tipo contratual escolhido, ou seja, entre o contrato-tipo escolhido e o horizonte de expetativas do aderente quanto às consequências vinculativas do contrato, devendo prevalecer a materialidade subjacente ao negócio. Há de relevar a confiança objetiva do aderente, além da sua confiança subjetiva, entre as partes.
A proteção da confiança é indispensável para simplificar o tráfico jurídico, pois a limitação da liberdade contratual do consumidor deve ser compensada pela garantia de que a proteção dos seus interesses não será olvidada. Neste sentido, a contrariedade à boa fé consiste no afastamento da regulamentação legal sem outra razão que não o interesse exclusivo do predisponente. A doutrina salienta que, mais do que a confiança concreta na conduta da outra parte, se protege uma confiança institucional legítima, «a confiança de que a ordem jurídica não abandonará o interesse do consumidor ao arbítrio do predisponente e salvaguardará a necessidade abstrata de o consumidor contratar sem se submeter a regras arbitrárias» (4).
Como corolário da boa fé, não pode ser ignorado na apreciação do conteúdo do clausulado, um juízo de proporcionalidade, só realizável perante um modelo contratual ou, até, em alguns casos, perante um concreto contrato”.

In casu, a Recorrente ao elaborar o contrato de adesão, para além das exclusões, introduziu, com a definição de invalidez absoluta e definitiva, acrescidas exigências cumulativas, limitativas e impeditivas do exercício do direito – tratar-se de “limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria em que, cumulativamente, estejam preenchidos os seguintes requisitos:

a) A pessoa segura fique completa e definitivamente incapacitada de exercer a sua profissão ou de qualquer outra atividade remunerada, compatível com os seus conhecimentos e aptidões;
b) Corresponda a um grau de desvalorização igual ou superior à percentagem definida em condições particulares, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por acidentes de trabalho e Doenças Profissionais em vigor na data da avaliação, não entrando para o seu cálculo quaisquer incapacidades ou patologias pré-existentes;
c) Seja reconhecida previamente pela ISS pela qual a pessoa segura se encontra abrangida ou pelo Tribunal de Trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou instituição de Segurança Social, por junta médica..".
Ora, analisado as finalidades do tipo de contrato de seguro em causa, verificamos que:
- o interesse do segurado é que, numa situação de morte ou de incapacidade para o trabalho, fique assegurado o pagamento dos montantes em dívida no contrato de mútuo celebrado com o Banco;
- o interesse do Banco, tomador do seguro, é ter um reforço da garantia de que o montante emprestado e respetivos juros lhe vai ser pago, acautelando, assim, situações de acrescidas dificuldades na restituição, pelo mutuário.
Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18.9.2014 (5)quem tem o poder de pré-estabelecer os termos dos negócios jurídicos na área onde exerce a sua actividade antecipadamente à própria determinação da contraparte, deve sopesar também os interesses previsíveis dos aderentes, em ordem a atingir um equilíbrio para cuja avaliação as soluções dispositivas ou supletivas constituem um padrão de referência. … Poder-se-á concluir que uma cláusula contratual que não tenha sido objecto de negociação individual é considerada abusiva, quando, a despeito da exigência da boa-fé, der origem a um desequilíbrio significativo em detrimento do consumidor, entre os direitos e obrigações das partes decorrentes do contrato. Ou seja, «uma cláusula será contrária à boa-fé se a confiança depositada pela contra-parte contratual naquele que a predispôs for defraudada em virtude de, da análise comparativa dos interesses de ambos os contraentes, resultar para o predisponente uma vantagem injustificável”.
Ao subscrever o contrato de seguro, qualquer pessoa teria a expetativa de, perante situação de morte ou incapacidade permanente causada por doença, nada poder obstar ao normal funcionamento do seguro e de verificada que estivesse tal incapacidade, nada mais pudesse ser exigido que constituísse entrave formal à realização do direito. O homem médio, o cidadão comum, normalmente avisado, confiaria que essa situação estaria acautelada pelo seguro contratado. E não é normal nem razoável que, face a essa confiança ou legítima expetativa do segurado, validamente, se estabeleçam requisitos cumulativos a limitar o direito, designadamente o invocado pela recorrente nas suas conclusões do recurso. A não se entender assim, o âmbito do contrato de seguro ficaria, injustificadamente, aquém daquilo com que o segurado, legitimamente e de boa-fé, estava a contar.
Assim, entendemos ser clamorosa e manifestamente abusiva a exigência, constante das condições gerais, agora referida pela seguradora para que o risco se pudesse considerar coberto.
O afastamento desta razão última, aventada pela Seguradora para excluir o risco, desenvolve-se como um imperativo ético, uma exigência fundamental de justiça, face à confiança que o A., objetiva e subjetivamente, criou pelo que lhe foi transmitido, pelo sentido global das cláusulas contratuais em causa e pelo normal desiderato do contrato celebrado, sentir que, clamorosamente, se impõe da análise dos factos assentes.
Citando Almeno de Sá, diz-se também naquele Douto Acórdão: “A consecução de um adequado equilíbrio contratual de interesses aparece como o objectivo último desse controlo, objectivo que seguramente não será atingido se o utilizador procurar garantir, de antemão, os seus exclusivos propósitos negociais, sem atender, de forma minimamente adequada, aos interesses da parte contrária. O imperativo do respeito pelo interesse do outro flui directamente da própria intencionalidade que atravessa o princípio da boa-fé, pelo que somos assim levados à necessidade de "ponderação de interesses. (…) Nesta ponderação, haverá de concluir-se por "violação do escopo da norma singular de proibição, se a composição de direitos e deveres resultantes da conformação do contrato, considerado no seu todo, e tendo em conta o quadro negocial padronizado, não corresponder "à medida" do equilíbrio, pressuposto pela ordem jurídica, verificando-se, ao invés, uma desrazoável perturbação desse equilíbrio, em detrimento da contraparte do utilizador (…) Torna-se manifesto que, nesta contraposição de interesses igualmente legítimos, está naturalmente reservado um lugar de destaque para o princípio da proporcionalidade, numa incessante sopesagem e comparação de vantagens, custos, compensações e riscos”.
O A. adquiriu a confiança de que, caso se viesse a encontrar em efetiva situação de invalidez absoluta e definitiva por doença, teria direito de ver a seguradora satisfazer as prestações ainda em falta do contrato de mútuo, sem ter necessidade de aguardar pela reforma, por reconhecimento prévio pela ISS, pelo Tribunal de Trabalho ou por junta médica.
E era também isso o que pretendia a tomadora, pois, a partir do momento em que o mutuário deixasse de poder satisfazer as prestações do mútuo, por incapacidade, o banco encontrava-se salvaguardado com o contrato de seguro celebrado.
A limitação/exclusão da responsabilidade em causa prejudicaria o Autor e favoreceria injustamente, por tal se revelar excessivo e desproporcionado, a Seguradora Recorrente e violaria, por isso, o princípio da boa fé.
Assim, é a referida cláusula abusiva e nula, nos termos dos art.ºs 12º, 15º e 16º, do RJCCG, sendo a nulidade invocável nos termos gerais e, por isso, do conhecimento oficioso - art.º 286º do Código Civil e art.º 24º do RJCCG. Declara-se, pois, a nulidade, o que se faz em conformidade com o já declarado quanto à outra cláusula acima referida e por identidade de razões, e não aplicando ao caso a cláusula em causa.
Deste modo, há que concluir que - por nula e de nenhum efeito a cláusula das Condições gerais do Contrato, na parte em que impõe prévio reconhecimento “pela ISS pela qual a pessoa segura se encontra abrangida ou pelo Tribunal de Trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou instituição de Segurança Social, por junta médica” - a R. está obrigada a responder nos termos da cobertura de seguro como decidido, devendo a sentença ser confirmada.
Verificado que se mostra provado o risco previsto, com que o Autor legitimamente contava, pois que resultou provado nos autos que o Autor se encontra numa situação de invalidez absoluta e definitiva por doença desde 30/1/2010, improcedem, por conseguinte, as conclusões da apelação, não ocorrendo violação de qualquer normativo invocado pela apelante, devendo, por isso, a decisão recorrida ser mantida.
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IV. DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar as apelações improcedentes e, em consequência, confirmam, integralmente, a decisão recorrida.
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Custas pela apelante, pois que ficou vencida – art. 527º, nº1, do CPC.
Guimarães, 30 de novembro de 2017

(Dr. Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha)
(Dr. José Manuel Alves Flores)
(Dr. Sandra Maria Vieira Melo)


1. Acórdão da Relação do Porto de 21/1/2016 Processo 183/14.2T8AGD.P1 in dgsi.net
2. A boa fé como norma de validade, Direito dos Contratos. Estudos, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, págs. 259 a 267.
3. Contratos de Adesão e Cláusulas Contratuais Gerais, Almedina, 2010, pág. 327.
4. Ana Prata, ob. cit., pág. 335, citando Yara Miranda.
5. Proc. 2334/10.7TBGDM.P1.S1, in www.dgsi.pt, citando Joaquim de Sousa Ribeiro, O Problema do Contrato, as Cláusulas Contratuais gerais e o Princípio da Liberdade Contratual, Almedina, 2003, páginas 570 e 579 a 583 e José Manuel Araújo de Barros, in Cláusulas Contratuais Gerais, DL 446/85, anotado, Coimbra Editora, 2010, página 172.