Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
285/12.6TBBRG.G1
Relator: ANTÓNIO SOBRINHO
Descritores: SEGURO DE GRUPO
CLÁUSULA DE EXCLUSÃO
DEVER DE COMUNICAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/25/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I. No âmbito de seguro de grupo, sendo demandada apenas a seguradora, pode esta opor ao aderente determinada cláusula de exclusão do risco, por a obrigação do dever de informação recair exclusivamente sobre o tomador de seguro.
II. Inexiste responsabilidade objectiva da seguradora por actuação negligente do tomador de seguro.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:


I – Relatório;

Recorrente(s): M… (A.);
Recorrido(s): “S…, S.A.” (Ré);

*****
Pedido:
Na presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, os autores pediram a condenação da Ré a pagar-lhe a si ou ao “Banco…, S.A.” as quantias de €51.600,00 e €25.000,00, por a tanto ascender o capital em divida de dois empréstimos por si contraídos à data em que, mercê da doença do foro cardíaco e psíquico, ficou absolutamente impossibilitado de trabalhar, bem como a pagar-lhe a si o valor das prestações mensais e dos encargos que desde então vem suportando, cujo montante global à data da propositura da acção ascendia a €5.401,00, todas acrescidas de juros de mora, contados à taxa legal, desde Fevereiro de 2011, data em que interpelou a Ré, até efectivo e integral pagamento.
Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença em que se julgou a acção procedente e, em consequência, se condenou a Ré a pagar ao “Banco…, S.A.” as quantias de €53.734,48 (cinquenta e três mil, setecentos e trinta e quatro euros e quarenta e oito cêntimos) e €20.874,04 (vinte mil, oitocentos e setenta e quatro euros e quatro cêntimos), deduzidas das prestações de amortização de capital pagas desde Fevereiro de 2011 até à data em que forem liquidados os empréstimos correspondentes, cujos montantes deverá restituir ao A., acrescidos de juros de mora, contados à taxa legal, desde a data em que cada uma dessas prestações foi paga até efectivo e integral reembolso, bem como a reembolsar o A. dos prémios referentes ao seguro de grupo associado ao primeiro empréstimo pagos após a comunicação do sinistro e até à regularização deste e da parte do prémio único do seguro associado ao segundo empréstimo proporcionalmente correspondente aos períodos de vigência do contrato após a comunicação do sinistro e até ao termo do prazo de amortização acordado, aqueles acrescidos de juros de mora contados desde as datas em que cada um dos prémios tiverem sido pagos e esta desde Fevereiro de 2011.
*****
Inconformada com tal decisão, dela interpôs recurso a ré, em cuja alegação formula, em suma, as seguintes conclusões:

1. De acordo com a fundamentação constante da sentença recorrida, o Tribunal a quo considerou que, não tendo a Seguradora ora Recorrente, conforme lhe competia, provado que foi cumprida a obrigação de comunicação adequada e efectiva das cláusulas submetidas à subscrição ou aceitação, a consequência é a exclusão da referida cláusula, sendo que no entendimento da ora Recorrente tal obrigação incumbe ao tomador do seguro.
2. Estando perante uma situação de seguro de grupo em que é invocada a existência de uma cláusula contratual geral, a sua não comunicação prévia e respectiva explicação do seu teor ao aderente, o ónus da prova relativamente a tal facto impende sobre o tomador do seguro, de acordo com a repartição do ónus da prova - artigo 4.° do Decreto-Lei 176/95, de 26.Julho, actual artigo 78.° do DL 72/2008, de 16 de Abril e pelo artigo 342.° do Código Civil.
3. Deste modo, ao seguro de grupo aplicam-se as regras específicas do ramo que estiver em causa e, como se trata de um contrato de seguro grupo, aplicam-se as regras constantes no DL 176/95, de 26 de Julho.
4. Todavia, considerando que os contratos de seguro, sendo contratos de natureza formal, são contratos de adesão, estão como tal sujeitos ao regime instituído pelo Dec. Lei 446/85, de 22 de Outubro, conforme entendeu o Tribunal a quo.
5. Assim, nos termos do artigo 5° n.°1 do referido diploma, as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las, comunicação esta que deve ser realizada de modo adequado para que se torne possível o seu conhecimento por quem use de comum diligência, (n.°2 do mesmo preceito). Acrescenta o n.°3 do referido artigo 5° que o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas gerais.
6. Por outro lado, para além de tal comunicação, deve o contraente que a estas cláusulas recorra, informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos, (art.°6° do diploma em causa).
7. Ora, a referida disposição legal (artigo 6.º) não refere expressamente, conforme avança a sentença de que ora se recorre, que cabe à Seguradora Recorrente o dever de explicar verbalmente as cláusulas do contrato de seguro.
8. Pois, quem tinha o dever de informar do teor das cláusulas é o tomador do seguro (Banco), que foi quem negociou o seguro de grupo com a seguradora e quem concedeu o crédito aos autores.
9. Note-se que, o teor do clausulado do contrato de seguro de grupo é discutido entre duas entidades (Banco e Seguradora) que em matéria de poder económico e social se equivalem.
10. Pelo que, nas relações entre Tomador e Seguradora não há contrato de adesão, na medida em que os termos do contrato de seguro de grupo são negociados entre ambas as entidades, podendo cada uma delas, em todas as cláusulas, discutir o respectivo conteúdo.
11. O momento de adesão apenas surge com a inclusão dos segurados: aí sim temos a aceitação do conteúdo contratual por parte dum dos intervenientes contratuais.
12. Sendo certo que, esse momento contratual de adesão é absolutamente alheio à pessoa da Recorrente Seguradora, uma vez que todas as relações que se desenvolvem são entre o tomador do seguro e os segurados.
13. De facto, convém ter presente que o seguro é feito em benefício essencialmente do Tomador (o Banco é o beneficiário essencial) logo é absolutamente excessivo penalizar a seguradora pelo incumprimento praticado por quem, verdadeiramente, é o dono do negócio (o Tomador).
14. O Banco actua por si próprio, em seu próprio nome, no seu próprio interesse, por sua própria conta, como Tomador de Seguro e Beneficiário e é nessa qualidade que ele está obrigado a informar o Segurado do teor das cláusulas contratuais.
15. No presente caso, a obrigação de explicar os termos das cláusulas insertas no contrato de seguro ao segurado aderente incidia sobre o tomador do seguro (Banco) e não sobre a Ré Seguradora, conforme sugere a sentença ora recorrida.
16. Assim, não tendo o autor demandado a instituição de crédito tomadora do seguro, não pode ser oposta à seguradora demandada a violação do dever de comunicação e informação do conteúdo das cláusulas contratuais gerais.
17. Face ao que antecede, resulta claro que o dever de comunicação das cláusulas contratuais constante do artigo 4.° do DL 176/95 destina-se a que o aderente conheça antecipadamente o conteúdo contratual, i.e., as cláusulas a inserir no negócio.
19. Incumbindo o ónus da prova da comunicação ao contraente que submete as cláusulas ao segurado, o que no regime dos contratos de seguro de grupo recaí sobre o tomador do seguro, conforme expressamente resulta do n.° 2 do artigo 4.° do citado DL 176/95.
20. Assim, se o Autor alegou nos presentes autos que nunca lhe foram comunicadas as cláusulas de exclusão do contrato de seguro, cujo dever impende sobre o tomador do seguro (o Banco), deveriam ter demandado, igualmente, o Banco.
21. Sendo que, iniciada a instância, o douto Tribunal a quo pode promover oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção, bem como à justa composição do litigio (artigo 265.º n.º 1 e 3 do C.P.C.). O que não se fez!
22. De acordo com o enquadramento jurídico da factualidade dos presentes autos, caberia ao tomador do seguro — o Banco — o ónus da prova do cumprimento do dever de comunicação e de informação relativa ao conteúdo das cláusulas contratuais, nomeadamente a cláusula de exclusão prevista no contrato a que aderiu o Autor.
23. Não estando no processo o Banco responsável pela violação e não podendo a demonstrada omissão, com influência modificativa no âmbito de coberturas do contrato de seguro, ser imputada à Recorrente Seguradora, não existe fundamento para se manter a condenação desta a pretexto de lhe estar vedado opor ao aderente a omissão do tomador do seguro e suas consequências em sede de responsabilidade.
24. O Tribunal recorrido fez uma incorrecta interpretação e aplicação das normas em apreço, mais concretamente as referentes nos artigos 5.º, n.º 3, 6.º do DL 446/85, de 25 de Outubro, artigo 4.º n.º 1 do Decreto-Lei 176/95, de 26.07, artigo 342.º do Código Civil.
Pede que se revogue a sentença proferida e, em consequência, ser determinada válida a cláusula contratual do contrato de seguro.

*****

Foram apresentadas contra-alegações a pugnar pela confirmação do julgado.

II – Delimitação do objecto do recurso; questão a apreciar;

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos do artº 639º, do Código de Processo Civil (doravante CPC).

A questão suscitada pela recorrente é:

a) Ónus do dever de informar a cargo do tomador do seguro;

Colhidos os vistos, cumpre decidir.


III – Fundamentos;

1. De facto;

A factualidade dada como assente na sentença recorrida é a seguinte:

1 - Por escrito outorgado em 16 de Agosto de 2007, o “Banco…, S.A.” concedeu ao A. e à sua mulher, M…, um empréstimo, na modalidade de abertura de crédito em conta, no montante de €60.000,00, destinado a obras de beneficiação em habitação própria permanente, a liquidar em 240 prestações mensais, iguais e sucessivas de capital, juros, calculados à taxa inicial de 6,594%, actualizada trimestralmente de acordo com a Euribor a 3 meses, e imposto de selo – cfr. doc. de fls. 60 a 72, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
2 - Para garantia das responsabilidades emergentes desse empréstimo, o A., agindo na qualidade de procurador e em representação de A… e G…, e a mulher constituíram hipoteca, devidamente registada, a favor do mutuante sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Ribeira de Pena sob o n.º 3324/Cerva;
3 - Por exigência do mutuante e igualmente para garantia do reembolso da quantia emprestada, o A. aderiu a um contrato de seguro, denominado “Vida Habitação Plus – Seguro de Vida Grupo 2 Cabeças” celebrado entre aquele, como beneficiário, e a Ré, titulado pela apólice n.º 15.000001 e cujo certificado, com o n.º 305759, veio a ser emitido em 15 de Outubro de 2007 – cfr. docs. de fls. 74 a 80, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
4 - Nos termos desse certificado, a Ré garantia o pagamento ao “Banco…, S.A.” do capital em divida do empréstimo em caso de “morte ou invalidez total e permanente por doença ou acidente” sobrevindas à pessoa segura;
5 - De harmonia com a cláusula 4ª das condições especiais da apólice referente à cobertura complementar de invalidez total e permanente por doença ou acidente, a seguradora, ora Ré, “não garante o pagamento das importâncias seguras”, além do mais, se o sinistro for devido a “doenças psiquiátricas (de qualquer natureza) de que a Pessoa Segura seja portadora”;
6 - Por escrito outorgado em 4 de Março de 2010, o “Banco…, S.A.” concedeu ao A. e à sua mulher, M…, um empréstimo no montante de €21.500,00, de que estes se confessaram solidariamente devedores, a liquidar em 240 prestações mensais, iguais e sucessivas, de capital, juros, calculados à taxa inicial de 7%, actualizada trimestralmente de acordo com a Euribor a 3 meses, e imposto de selo – cfr. doc. de fls. 91 a 105, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
7 - Para garantia das responsabilidades emergentes desse empréstimo, o A., agindo na qualidade de procurador e em representação de A… e G…, e a mulher constituíram nova hipoteca, devidamente registada, a favor do mutuante sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Ribeira de Pena sob o n.º 3324/Cerva;
8 - Por exigência do mutuante e igualmente para garantia do reembolso da quantia emprestada, o A. e a mulher celebraram com a Ré um contrato de seguro, denominado “Vida Habitação Plus Prémio Único – Seguro de Vida Individual 2 Cabeças”, em benefício daquele, titulado pela apólice n.º 15.374379, com início de vigência em 4 de Março de 2010 – cfr. doc. de fls. 203 a 211, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
9 - Nos termos desse contrato, a Ré garantiu o pagamento ao Banco… do capital em divida do empréstimo em caso de “morte ou invalidez total e permanente” por doença ou acidente sobrevindas à pessoa segura;
10 - Mais consta das respectivas condições especiais que a seguradora, ora Ré, não garante o pagamento de indemnizações por invalidez total e permanente decorrente, além do mais, de “doenças psiquiátricas (de qualquer natureza) de que a pessoa segura seja portadora”;
11 - Aquando da subscrição da proposta que deu origem ao seguro a que se reportam os itens antecedentes, o A. assinou o item em que, sob a epígrafe, “Declaração de Saúde”, constava, em caracteres impressos, que não sofria nem tinha sofrido até àquela data de qualquer doença ou limitação física e que não seguia qualquer tratamento médico – cfr. doc. de fls. 163 a 165;
12 - Em data não concretamente apurada, anterior a 2 de Setembro de 2009, o A., que já vinha apresentando um quadro ansioso crónico desde meados de 2008, foi acometido por uma depressão nervosa associada a uma marcada componente ansiosa com repercussão notória na esfera cognitiva e relacional, a qual lhe determinou dificuldade em controlar os impulsos, quer ao nível laboral, quer ao nível familiar, bem como limitação psico-motora, isolamento social, alterações do ritmo de sono/vigília e tendências suicidas;
13 - Essa síndrome resultou do acumular de experiências vividas como guarda prisional;
14 - No decurso do ano 2010, porque sentisse mal-estar e cansaço, o A. fez exames ao coração que vieram a revelar problemas de insuficiência cardíaca e hipertensão, mais concretamente “alterações ecocardiográficas compatíveis com cardiopatia hipertensiva e insuficiência cardíaca diastólica”;
15 - Na sequência de uma Junta Médica a que foi submetido em 28 de Janeiro de 2011, o A. foi considerado incapaz para o exercício da sua actividade profissional por “depressão major com quadro ansioso grave e cardiopatia isquémica”;
16 - Em Fevereiro de 2011, o A. comunicou à Ré a incapacidade que alegadamente lhe sobreviera e instou-a a liquidar os empréstimos pendentes, liberando-o do pagamento das prestações correspondentes;
17 - A Ré recusou libertar o capital dos empréstimos que então se encontrava em dívida, alegando que a doença de que o A. alegadamente padecia estava excluída do âmbito de cobertura dos seguros;
18 - Aquando do preenchimento da proposta que deu origem à apólice referida no item 11 do presente elenco, o A. omitiu o quadro de depressão nervosa de que já então padecia;
19 - Aquando da adesão ao seguro de grupo e da subscrição da proposta do seguro individual, o A. confiou que, sobrevindo a sua invalidez ou morte, a Ré liquidaria ao “Banco…, S.A.” o capital em dívida dos empréstimos a que os mesmos estavam associados;
20 - Posteriormente, o A. chegou a demonstrar perante os funcionários do “Banco…, S.A.” a vontade de cancelar o seguro de grupo associado ao primeiro empréstimo, por ser mais oneroso do que produtos semelhantes doutras seguradoras, o que só não fez porque aqueles funcionários, com o argumento de que o dito seguro era mais completo do que os concorrentes, de tal o dissuadiram;
21 - A partir de Fevereiro de 2001, o A. continuou a suportar as prestações de amortização de ambos os empréstimos e a pagar os prémios do seguro de grupo (o prémio do seguro individual, no montante de €1.486,82, foi integralmente liquidado de uma só vez);
22 - Em 1 de Fevereiro de 2011, o capital em dívida no âmbito dos referidos empréstimos era de €53.734,48 e de €20.874,04, respectivamente.
*
MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA:
Não se provou que à data da subscrição do boletim de adesão ao seguro de grupo referido na alínea C) e da subscrição da apólice referida na alínea H), o A. e a mulher tivessem sido devidamente informados sobre todas as cláusulas desses seguros, incluindo as respectivas condições gerais e especiais, de que, concomitantemente, lhes foram entregues cópias, e que tivessem ficado cientes de todas elas, incluindo a de que ficava excluída da cobertura dos seguros a incapacidade total e permanente decorrente de doença psiquiátrica.
Não se provou igualmente que, se tivesse tido conhecimento de que o A. padecia de depressão, a Ré não teria aceitado celebrar o contrato de seguro associado ao segundo empréstimo ou tê-lo-ia celebrado em condições diversas.

*****

2. Apreciação fáctico/jurídica;

a) Ónus do dever de informar a cargo do tomador do seguro;

No caso em apreço estamos perante um contrato de seguro de adesão, relativamente ao contrato de seguro denominado “Vida Habitação Plus – Seguro de Vida Grupo 2 Cabeças”, e um contrato de seguro individual, relativamente ao contrato de seguro denominado “Vida Habitação Plus Prémio único – Seguro de Vida Individual 2 Cabeças”.
No âmbito do objecto do recurso está em causa a não responsabilidade da seguradora, única que foi demandada, com o argumento de que não há contrato de adesão entre aquela e o tomador do seguro, que a seguradora é alheia ao momento contratual de adesão, que o seguro é feito em benefício do tomador (o Banco), que não tendo sido este demandado, não pode ser oposta à seguradora demandada a violação do dever de comunicação e informação do conteúdo das cláusulas gerais, que esse dever de informação impendia exclusivamente sobre o tomador de seguro, com quem o aderente contratou.
Trata-se de questão relativamente à qual, em matéria jurisprudencial, tem havido divergências[1] (ora considerando-se que esse dever recai também sobre a seguradora, ora entendendo-se que recai apenas sobre o tomador de seguro), pese embora o Acórdão de revista excepcional do STJ de 25.06.2013, proc. 24/10.0TBVNG.P1.S1, ter acolhido, em jeito de sinopse daquelas posições jurisprudenciais, a argumentação de que, num seguro de grupo, a seguradora, enquanto única demandada, pode opor ao aderente/segurado determinada cláusula de exclusão do risco, por a omissão do dever de informação e esclarecimento ser exclusivamente imputável ao tomador de seguro, “não se comunicando ou transmitindo os efeitos de tal omissão culposa à própria seguradora, em termos de amputar o contrato da cláusula não devidamente informada ao aderente”.
Não se descura que, em matéria de contratos de adesão em grupo, do ramo vida, como o presente, prepondera a sua massificação, sendo o aderente o elo mais fraco (quiçá fruto da sua menor pressão lobista), menos informado e mais vulnerável ao nível de equilíbrio de prestações, aquando do contrato de adesão.
Todavia, como emerge claramente, quer do artº 4º, nºs 1 e 2, do Dec.Lei nº 176/98, de 26.07, quer dos artºs 78º, nºs 1 e 2, 87º e 88º do Dec.Lei nº 72/2008, de 16.04 (doravante LCS), que regulam especificamente o dever de informar nos seguros de grupo, esse ónus cabe apenas ao tomador de seguro, no binómio tomador de seguro-segurado, sendo notória a opção legislativa no sentido de excluir dessa obrigação o segurador, a menos que haja um pedido do segurado – cfr. artº 78º, nº 4, da LCS – ou exista uma estipulação expressa nesse sentido – cfr. artº 4º, nºs 4 e 5 do Dec.Lei nº 176/98, de 26.07.
Assim, no âmbito do seguro de grupo estamos perante uma ‘relação tripartida’ cujo regime especial se sobrepõe ao regime-regra das cláusulas contratuais gerais, sendo que é sobre o tomador de seguro – e não sobre a seguradora - que incide o dever de comunicação e de informação sobre o teor das cláusulas de exclusão incluídas no contrato.
Nesta vertente, importa ainda não ignorar a tipologia própria do contrato de adesão.
Na verdade, enquanto que a relação segurador-tomador se cinge estritamente à celebração de um contrato de seguro entre aqueles, o seguro de grupo traduz-se no seguro de um conjunto de pessoas ligadas entre si e ao tomador do seguro por um vínculo ou interesse comum.
Ou seja, no primeiro caso, o acento tónico está em que o contrato-base de seguro se realiza entre o segurador (que assume a cobertura do risco) e o tomador (que transfere o risco a troco de pagamento de um prémio), não agindo este juridicamente como intermediário, auxiliar ou comissário da seguradora, aquando da adesão concreta das pessoas seguras – cfr. artºs 500º e 800º do Código Civil.
Por outro lado, o segurado/aderente interliga-se com as demais pessoas do grupo ao tomador.
E a omissão do dever de informação em causa não deixa de ser uma falta ao nível do contrato de adesão, na relação contratual tomador versus segurado.
Daí que se defenda que não é repercutível na esfera jurídica da seguradora tal vício na formação do contrato subscrito pelo aderente, relativo à aludida omissão do dever de informação por parte do banco/tomador de seguro, por forma a alterar aquela relação contratual de base entre seguradora-tomador de seguro e “em termos de ter de ser por aquela assumido um risco acrescido, não contemplado nas cláusulas inseridas naquele contrato” (neste sentido, o citado Acórdão do STJ de 25.06.2013, proc. 24/10.0TBVNG.P1.S1).
Em resumo, no âmbito de seguro de grupo, sendo demandada apenas a seguradora, pode esta opor ao aderente determinada cláusula de exclusão do risco, por a obrigação do dever de informação recair exclusivamente sobre o tomador de seguro.
Inexiste, assim, responsabilidade objectiva da seguradora por actuação negligente do tomador de seguro.
Pelo que se deixa aduzido, procede a apelação.


Sumariando:
1. No âmbito de seguro de grupo, sendo demandada apenas a seguradora, pode esta opor ao aderente determinada cláusula de exclusão do risco, por a obrigação do dever de informação recair exclusivamente sobre o tomador de seguro.
2. Inexiste responsabilidade objectiva da seguradora por actuação negligente do tomador de seguro.


*****

IV – Decisão:

Em face do exposto, acordam os Juizes da 1ª Secção Cível deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação e, por consequência, revogar a decisão recorrida, improcedendo a acção.


Custas pelos apelados.
Guimarães, 25 de Setembro de 2014
António Sobrinho
Isabel Rocha
Moisés Silva
_____________
[1] Neste sentido, vide Acórdãos do TRL de 26.02.2013, proc. 411/10.3TBTVD.L1-7; do TRG de 19.10.2010, proc. 1989/09.0TBBRG.G1; do TRP de 25.10.2012, proc. 24/10.0TBVNG.P1. Em sentido contrário, os Acórdãos do STJ de 29.05.2012, proc. 7615/06.1TBVNG.P1, de 21.02.13, proc. 267/10.6TBBCL.G1.S1 e de 25.06.2013, proc. 24/10.0TBVNG.P1.S1,si.pt todos in dgsi.pt