Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5/13.1GBAVV.G1
Relator: ALCINA MARIA DA COSTA RIBEIRO
Descritores: SUBTRAÇÃO DE VALE POSTAL
VALOR DIMINUTO
FURTO SIMPLES
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/19/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I. A subtracção e apropriação de um vale postal, por si só, não torna o arguido dono e/ou legitimo portador da quantia nele titulada. Para efeitos de crime de furto, o valor do vale postal não corresponde àquele que representa.
II. O vale postal é um meio de transferência de dinheiro que confere ao destinatário ou legítimo portador, o direito a haver para si – a ser pago – a quantia que titula, ou como estipula o artigo 1º, do Regulamento do Serviço de Vales de Correio, aprovado pela Portaria nº 536/95, de 3 de Junho, com as alterações da Portaria nº 75/2002 de 22 de Janeiro, «contém uma ordem de pagamento especial que permite efectuar transferências de fundos».
III. O valor da coisa subtraída pelo recorrente (um vale postal de custo inferior a 102€), porque diminuto, desqualifica o furto do vale postal, nos termos dos artigos 202º, al. c) e 204º, nº4, do Código Penal.
V. A conduta do arguido preenche, em concurso real ou efectivo, as previsões dos crimes de furto, falsificação de documento e de burla, respectivamente, previstos e punidos pelos artigos artigo 203º, nº 1, 256 nº 1, alínea c), e 217 nº 1 e 3, do Código Penal.
Decisão Texto Integral: Acordam, os Juízes que compõem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO

1 - Por sentença proferida em 16 de Março de 2015, foi o arguido, Carlos A., condenado pela prática de: 1) um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº1, al. e) do Código Penal, na pena de 11 meses de prisão; b) um crime de burla previsto e punido pelo artigo 217º, nº 1, do Código Penal e c) um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo artigo 256, nº 1, al. c) e nº 3, do Código Penal, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 2 anos e 1 mês de prisão-

2 - Inconformado com esta condenação, impugna-a o Arguido, com as conclusões que se transcrevem:

1. DA PROVA PRODUZIDA NÃO SE PODERÁ DAR COMO PROVADO TER O ARGUIDO PRATICADO QUALQUER CRIME DE FURTO, MUITO MENOS QUALIFICADO, SENDO QUE TAL COMO FUNDAMENTADO NA SENTENÇA, O PERCURSO PERCORRIDO PELO TRIBUNAL SE ALICERÇA EXCLUSIVAMENTE NAS MERAS SUSPEITAS DA SUA EX-MULHER E EM EXERCICIOS DE PROGNOSES DE NORMALIDADE QUE ULTRAPASSAM AS MARGENS DE ERRO, DÚVIDAS E INCERTEZAS EM PROC. PENAL PERMITIDAS E TOLERADAS, SUSPEITAS ESSAS DE QUE ELE POSSUA CHAVE DA CAIXA DE CORREIO MAS AINDA QUE TAL NÃO SE VERIFIQUE TAL CAIXA PERMITE A RETIRADA DA CORRESPONDÊNCIA DO SEU INTERIOR COM A MÃO. DEVENDO SER ABSOLVIDO DE TAL CRIME DE FURTO;

2. E, AINDA QUE TIVESSE OCORRIDO QUALQUER CRIME DE FURTO, SEMPRE A CONSUMAÇÃO E CONDENAÇÃO PELO CRIME DE BURLA ABARCARIA TODOS OS RESTANTES ACTOS PREPARATÓRIOS, INCLUINDO A APOSIÇÃO DO NOME DA DESTINATÁRIA E SEU NO VALE, NÃO PODENDO O ARGUIDO TAMBÉM SER PUNIDO POR CRIME DE FURTO E FALSIFICAÇÃO, DOS QUAIS SEMPRE TERIA DE SER ABSOLVIDO;

3. NO CASO, NÃO PODE O ARGUIDO SER PUNIDO SIMULTANEMANTE PELO CRIME DE BURLA E FALSIFICAÇÃO, POIS TRATANDO-SE DE VALE POSTAL O ARGUIDO PARA BURLAR TEVE NECESSÁRIAMENTE DE FALSIFICAR O DOCUMENTO, OU ENTÃO AO FALSIFICAR ESTAVA JÁ A BURLAR, SER CONDENADO POR AMBOS SIGNIFICA ESTAR A SER DUPLAMENTE SANCIONADO PELA MESMA ACTUAÇÃO (EMPREGAR ARTIFICIO PARA OBTER PROVEITO);

4.ATENTAS AS CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS DE ANTERIOR COMUNHÃO PATRIMONIAL COM A QUEIXOSA, NÃO SE MOSTRA DEMASIADO ELEVADO O GRAU DE NECESSIDADE DE PREVENÇÃO SOCIAL PELOS FACTOS IMPUTADOS;

5.DEVERÁ VALORAR-SE POSITIVAMENTE A PROVA RELATIVA Á SITUAÇÃO PESSOAL DO ARGUIDO CONTIDA NOS PONTOS 1.20 E 1.21 E CONSIDERAR-SE QUE SE MANTÊM INALTERADOS OS PRESSUPOSTOS QUE LEVARAM O TRIBUNAL QUE PROFERIU A SENTENÇA DE 24/11/2014, ALUDIDA NO PONTO 1.35 DA FUNDAMENTAÇÃO, A SUSPENDER A EXECUÇÃO DA CONDENAÇÃO EM PRISÃO SUBORDINADA A REGIME DE PROVA ASSENTE NUM PLANO INDIVIDUAL DE REINSERÇÃO SOCIAL, SENDO QUE DESDE ENTÃO INTERIORIZOU O ARGUIDO A ILICITUDE DA SUA ACTUAÇÃO ATÉ TAL DATA, CUMPRINDO ESCRUPOLOSAMENTE O PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL AÍ DETERMINADO, PELO QUE SE DEVERÃO CONSIDERAR VERIFICADOS OS REQUISITOS ADEQUADOS Á SUSPENSÃO DA PENA, AINDA QUE TAMBÉM SUBORDINADA A INJUNÇÕES DANDO-SE OPORTUNIDADE AO ARGUIDO DE PROSSEGUIR A SUA RESSOCIALIZAÇÃO EM LIBERDADE JUNTO DA SUA FAMÍLIA;

6. ASSIM, ATENDENDO Á PERSONALIDADE DO ARGUIDO, Às CONDIÇÕES DA SUA VIDA COM A COMPANHEIRA E FILHO MENOR DE AMBOS, AO FACTO DE SE ENCONTRAR A MEIO DE UM PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL QUE SE MOSTRA ESTAR A CUMPRIR A SUA FINALIDADE, TRAÇADO NO ÂMBITO DA ALUDIDA SENTENÇA, APLICAR AGORA PRISÃO EFECTIVA SERIA DESBARATAR TODO E QUALQUER EFEITO ÚTIL DO MESMO;

7.ATENTE-SE QUE OS FACTOS PELOS QUAIS AGORA VEM ACUSADO SE CIRCUNSCREVEM A MOMENTO ANTERIOR ÁQUELA SENTENÇA NO ÂMBITO DA QUAL SE MOSTRA EM VIGOR E A SER CUMPRIDO PELO ARGUIDO PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL;

8. AS CIRCUNSTÂNCIAS DA PRÁTICA DO CRIME (RELACIONAMENTO CONJUGAL E PATRIMONIAL RECENTEMENTE CESSADO) NÃO INSPIRA ELEVADA CENSURABILIDADE OU NECESSIDADE DE PACIFICAÇÃO SOCIAL, PELO QUE SE DEVE CONSIDERAR QUE TAL CIRCUNSTANCIALISMO PERMITE E ACONSELHA A SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO;

9. Á SUA CONDUTA EXEMPLAR CUMPRIDORA DO PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL TRAÇADO EM MOMENTO POSTERIOR Á FACTUALIDADE PELA QUAL AGORA É JULGADO ACONSELHA A QUE SE MANTENHAM OS PRESSUPOSTOS INERENTES Á REINSERÇÃO SOCIAL EM LIBERDADE QUE SE ENCONTRAM A SURTIR EFEITOS, MOSTRANDO-SE INJUSTO QUE SEJA O ARGUIDO IMPEDIDO DE PROSSEGUIR COM ESTE.

10. ENTENDEU O TRIBUNAL, E BEM, DAR AO ARGUIDO ATRAVES DA SUSPENSÃO DA PENA DE PRISÃO N,AQUELA SENTENÇA UMA OPORTUNIDADE DE SE INTEGRAR E INSERIR NA SOCIEDADE NÃO SE NOS AFIGURANDO JUSTO QUE JULGADO AGORA, POR FACTOS POUCO GRAVOSOS, LEVADOS A CABO EM MOMENTO ANTERIOR A TAL OPORTUNIDADE, LHE SEJA AGORA PELA PRATICA DESTES DEITADO TUDO A PERDER, COM A NÃO SUSPENSÃO DA PENA, A FIM DE LHE PERMITIR CONTINUAR PERCURSO DE INSERÇÃO E INTERIORIZAÇÃO DA CENSURABILIDAE DOS SEUS ACTOS ANTERIORES QUE SE MOSTRAM A SURTIR EFEITO.

11. A EXECUÇÃO DE PENA DE PRISÃO CONSTITUI A ÚLTIMA RATIO DA POLÍTICA CRIMINAL, E SALVO MELHOR OPINIÃO, MOSTRA-SE, NO CASO CONCRETO, FAVORÁVEL AOS FINS DA PENAS A SUSPENSÃO DA PENA DE PRISÃO QUE SEJA FIXADA AO ARGUIDO, AINDA QUE SUJEITA A INJUNÇÕES, REGRAS OU TRABALHO EM FAVOR DA COMUNIDADE AO QUAL EXPRESSA SUA CONCORDÂNCIA E ASSENTIMENTO;

12. SEM PRESCINDIR

13- FACE Á POUCA GRAVIDADE DOS FACTOS, SEMPRE AS PENAS A QUE O ARGUIDO FOI CONDENADO SE MOSTRAM EXAGERADAS, DEVENDO SER FIXADAS PRÓXIMO DO MÍNIMO DA MOLDURA PENAL, SEMPRE SUSPENSA».

3 – O Ministério Público, em primeira instância, respondeu ao recurso do arguido, pugnando pela manutenção do decidido

4 - O Digno Procurador-Geral Adjunto, no parecer que antecede, pronuncia-se pela improcedência do recurso.

5 - Admitido o recurso na forma e com o efeito devidos, subiram os autos a esta Relação onde, depois de colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II – MATÉRIA A DECIDIR

1. Impugnação da decisão da matéria de facto;

2. Qualificação jurídico-penal dos factos;

3. Concurso dos crimes de furto, burla e falsificação;

4. Dosimetria das penas parcelares;

5. Suspensão da execução da pena de prisão

III – A SENTENÇA RECORRIDA

1. Factos Provados

A primeira instância deu como provados os seguintes factos:

1.1. – Nos últimos dias do mês de Agosto de 2012, a hora não concretamente determinada, o arguido deslocou-se à residência de Maria E., com quem foi casado, sita em Monte…, com o propósito de ali se apoderar de vales postais que se encontrassem no interior da caixa do correio.

1.2. – O arguido já não residia na residência da Maria E. desde 2010, encontrando-se divorciados desde 6 de Dezembro de 2011.

1.3. – Não obstante estes factos, o certo é que mantinha ilegitimamente na sua posse uma chave da supra citada caixa do correio.

1.4. – Porque esta estava fechada à chave, o arguido para a sua abertura utilizou a chave supra indicada, e retirou do seu interior o vale de correio n.º 265579, no montante de €246,38 (duzentos e quarenta e seis euros e trinta e oito cêntimos), endereçado a Maria E., fazendo do mesmo coisa sua.

1.5. – Na posse do vale de correio assim obtido, o arguido propôs-se obter a quantia naquele constante, que sabia não lhe ser devida.

1.6. – Para o efeito, no verso do vale postal, o arguido escreveu o nome da sua destinatária, Maria E. e no espaço destinado ao segundo titular assinou o seu nome, e escreveu o seu número de bilhete de identidade, o que fez com o desconhecimento e contra a vontade daquela, por forma a fazer crer que a destinatária do vale de correio em questão havia autorizado o arguido a proceder ao levantamento da quantia nele titulada.

1.7. – Com o vale assim preenchido, nos primeiros dias do mês de Setembro de 2012, o arguido deslocou-se ao estabelecimento comercial de comércio a retalho, “Mercearia…”, sito em A…, Arcos de Valdevez, que também funciona como posto de correio dos CTT, Correios de Portugal, S.A..

1.8. – Ali, o arguido exibiu a Maria M, que o atendeu, o vale postal com vale de correio n.º 265579, criando nesta a convicção de que ele era o seu legítimo portador.

1.9. – Com efeito, por forma a melhor convencer ao citada Maria M. da sua legitimidade, o arguido exibiu perante aquela o Bilhete de Identidade de que era titular.

1.10. – Assim, e na convicção de que o arguido era efectivamente o legítimo portador daquele vale de correio, a referida Maria M. entregou ao arguido a quantia de € 246,38 (duzentos e quarenta e seis euros e trinta e oito cêntimos). 1.11. – Pela forma supra descrita, o arguido apoderou-se da quantia de €246,38 (duzentos e quarenta e seis euros e trinta e oito cêntimos), causando à destinatária do vale de correio em questão o inerente prejuízo.

1.12. – O arguido bem sabia que o aludido vale de correio lhe não pertencia e que ao dele se apoderar, fazendo-o seu, actuava contra a vontade da sua legítima dona, e que para a abertura do caixa onde o mesmo se encontrava utilizou uma chave que, naquela ocasião, não lhe era permitido possuir.

1.13. – O arguido Carlos A. ao apor no vale de correio referido o nome “Maria E.”, quis fazer constar, dele, como fez, uma assinatura que sabia não ser sua.

1.14. – Mais sabia que ao assiná-lo e preenchê-lo pela forma descrita, colocava em crise a confiança e a credibilidade que tais títulos merecem no tráfego comercial e que a sua conduta era idónea a que terceiros o reputassem como adequado meio de pagamento ou saque, como viria a suceder.

1.15. – Auferiu um benefício pecuniário de €246,38 (duzentos e quarenta e seis euros e trinta e oito cêntimos), a que sabia não ter direito, causando a Maria E. um prejuízo de montante equivalente.

1.16. – Pelo modo supra descrito, o arguido pretendeu e conseguiu que Maria M., a exercer funções por conta dos CTT, Correios de Portugal, S.A., acreditasse que o vale de correio em causa tinha sido emitido pela sua legitima proprietária e, por isso, aceitasse pagar o montante nele titulado, o que nunca teria feito caso soubesse que o mesmo era utilizado contra a vontade da sua dona.

1.17. – Acresce que, com a actuação descrita, o arguido causou um prejuízo ao Estado - para este o prejuízo referente à credibilidade e fé pública de que os vales postais gozam e merecem entre a generalidade das pessoas.

1.18. – O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo ser tal conduta proibida por lei.

Mais se provou que:

1.19. – O arguido veio aos autos solicitar expressamente que a audiência de discussão e julgamento se realizasse na sua ausência, o que foi promovido pelo Ministério Público e foi deferido judicialmente.

1.20. – O arguido desempregado mas procura emprego em oficinas de bate chapas e pintura na zona de …; vive com uma companheira com a qual teve um filho; é ajudado por uma tia e pelo pai da mesma.

1.21. – O arguido tem 34 anos de idade.

1.22. – Por sentença proferida em 17/02/2005, pelo Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 09/03.2GBAVV, transitada em julgado em 04/03/2005, foi o arguido condenado pela prática, em Fevereiro de 2002, de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.º, do Código Penal, na pena de 130 dias de multa, à taxa diária de € 2. Por despacho proferido em 17/01/2006, foi declarada extinta, pelo pagamento, a pena de multa aplicada ao arguido.

1.23. – Por sentença proferida em 28/06/2006, pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Ponte de Lima, no âmbito do Processo Especial Sumaríssimo n.º 129/06.1GTVCT, transitada em julgado em 28/06/2006, foi o arguido condenado pela prática, em 07/03/2006, de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, al. b) do Código Penal, e uma contra-ordenação rodoviária praticada em 08/03/2006, p. e p. pelo artigo 34.º, n.º 1 do DL 522/85, de 31/12, na pena de 200 dias de multa, à taxa diária de € 4, e na coima de € 350. Por despacho proferido em 10/10/2007, foi declarada extinta, pelo pagamento, a pena de multa aplicada ao arguido.

1.24. – Por sentença proferida em 27/09/2006, pelo Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez, no âmbito do Processo Especial Sumaríssimo n.º 134/06.8GTVCT, transitada em julgado em 27/09/2006, foi o arguido condenado pela prática, em 10/03/2006, de um crime de desobediência, p. e p. pelo artigo 348.º do Código Penal, na pena de 50 dias de multa, à taxa diária de € 2,50. Por despacho proferido em 31/01/2007, foi declarada extinta, pelo pagamento, a pena de multa aplicada ao arguido.

1.25. – Por sentença proferida em 19/11/2008, pelo Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 366/06.9TAAVV, transitada em julgado em 12/01/2009, foi o arguido condenado pela prática, em 2005, de um crime de falsificação de boletins, actas ou documentos, p. e p. pelo artigo 199.º, da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, na pena de 160 dias de multa, à taxa diária de € 4.

1.26. – Por sentença proferida em 27/05/2009, pelo Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 348/07.3GBAVV, transitada em julgado em 26/06/2009, foi o arguido condenado pela prática, em Fevereiro de 2007, de um crime de falsificação de boletins, actas ou documentos, p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, al. b) do Código Penal, e de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.º, do Código Penal, praticado em Fevereiro de 2007, na pena única de 400 dias de multa, à taxa diária de € 3. Por despacho proferido em 01/06/2010, foi declarada extinta, pelo pagamento, a pena de multa aplicada ao arguido.

1.27. – Por sentença proferida em 22/02/2012, pelo Tribunal Judicial de Paredes de Coura, no âmbito do Processo Especial Sumaríssimo n.º 124/11.9GAPCR, transitada em julgado em 22/02/2012, foi o arguido condenado pela prática, em 07/06/2011, de um crime de desobediência, p. e p. pelo artigo 348.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 5,50.

1.28. – Por sentença proferida em 05/07/2012, pelo Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 280/11.6GBAVV, transitada em julgado em 10/09/2012, foi o arguido condenado pela prática, em 3 de Junho de 2011, de um crime de furto, p. e p. pelo 203.º, n.º 1, do Código Penal, e de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, al. b) e n.º 3 do Código Penal, na pena única de 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano, subordinada ao cumprimento pelo arguido das seguintes condições cumulativas: de o arguido cumprir um regime de prova e de o arguido pagar a quantia de 200 € (duzentos euros), no prazo de 1 (um) ano, à Santa Casa da Misericórdia de Arcos de Valdevez.

1.29. – Por sentença proferida em 16/10/2012, pelo Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 261/11.0GBAVV, transitada em julgado em 05/11/2012, foi o arguido condenado pela prática, em 26 de Maio de 2011, de um crime de desobediência, previsto e punido, pelo artigo 348.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 110 dias de multa, à taxa diária de 6 €, o que perfaz o total de 660 €.

1.30. – Por sentença proferida em 07/11/2012, pelo Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 169/11.9GBAVV, transitada em julgado em 27/11/2012, foi o arguido condenado pela prática, em 6 de Abril de 2011, de um crime de furto qualificado, previsto e punido, pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, al. f), ambos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano e 2 (dois) meses.

1.31. – Por sentença proferida em 15/11/2012, pelo Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 100/11.1JABRG, transitada em julgado em 05/12/2012, foi o arguido condenado pela prática, em 22 de Fevereiro de 2011, de um crime de incêndio de meio de transporte, previsto e punido, pelos artigos 272.º, n.º 1, al. a) e 23.º do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano e 6 (seis) meses, subordinada ao cumprimento pelo arguido das seguintes condições cumulativas: de o arguido cumprir um regime de prova e de o arguido pagar a quantia de 400 € (quatrocentos euros), no referido período, à Santa Casa da Misericórdia de Arcos de Valdevez.

1.32. – Por sentença proferida em 28/11/2012, pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Ponte de Lima, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 44/12.0GAPTL, transitada em julgado em 16/01/2013, foi o arguido condenado pela prática, em 30 de Dezembro de 2011, de um crime de furto, previsto e punido, pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 220 dias de multa, à taxa diária de 5 €, o que perfaz o total de 100 €.

1.33. – Por sentença proferida em 03/06/2013, pelo Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 693/11.3GBAVV, transitada em julgado em 30/09/2013, foi o arguido condenado pela prática, em 20 de Dezembro de 2011, de um crime de furto qualificado, previsto e punido, pelo artigo 204.º, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de 3 (três) anos.

1.34. – Por sentença proferida em 26/06/2013, pelo Tribunal Judicial de Arcos de Valdevez, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 5/12.9GBAVV, transitada em julgado em 30/09/2013, foi o arguido condenado pela prática, em 30 de Dezembro de 2011, de um crime de furto qualificado, previsto e punido, pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e), ambos do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de 3 (três) anos, subordinada ao cumprimento pelo arguido de um regime de prova assente num plano individual de reinserção social, a elaborar pelos serviços de reinserção social, impendendo sobre o arguido a obrigação de responder a todas as convocatórias que lhe vierem a ser feitas pelo tribunal e pelos serviços de reinserção social relacionadas com a execução de tal plano.

1.35. – Por sentença proferida em 24/11/2014, pela Secção Criminal da Instância Local de Arcos de Valdevez e Ponte da Barca, no âmbito do Processo Comum Singular n.º 658/11.5GBAVV, transitada em julgado em 06/01/2015, foi o arguido condenado pela prática, em Novembro de 2011, em concurso real, de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal, e de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo artigo 204.º, n.º 2, al. e), por referência ao artigo 203.º, nº 1, ambos do Código Penal; na pena única de 4 (quatro) anos e 7 (sete) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, subordinada ao cumprimento pelo arguido de um regime de prova assente num plano individual de reinserção social e da prestação de 200 (duzentas) horas de trabalho a favor da comunidade.

2. Factos não provados

Não se provaram quaisquer outros factos com interesse para a decisão (note-se que o Tribunal não se pronuncia quanto a juízos conclusivos e/ou de direito e/ou repetidos).

IV – O OBJECTO DO RECURSO

1. Da alteração da matéria de facto

Invoca o Recorrente [Conclusão A)], que «da prova produzida não se poderá dar como provado ter o arguido praticado qualquer crime de furto, muito menos qualificado (…)», sugerindo que era sua intenção ver reapreciada a decisão sobre a matéria de facto.

Perante a forma utilizada pelo Recorrente nesta impugnação, há que, previamente, verificar, se estão reunidos os pressupostos de admissibilidade do recurso nesta vertente.

O sistema processual penal vigente consagra, como se sabe, um duplo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, facultando aos sujeitos processuais a possibilidade de reagir contra eventuais erros do julgador na livre apreciação das provas e na fixação da matéria de facto.

A este propósito, rege o artº. 412º, nº 3 do Código de Processo Penal, que impõe ao sujeito processual que impugne a decisão sobre a matéria de facto, a especificação de:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) As concretas provas que imponham decisão diversa da recorrida;

c) As provas que devem ser renovadas.

Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) referidas fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no art. 364º, nº 2, do Código de Processo Penal, devendo o Recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação (art. 412º, nº 4, do diploma que vimos citando).

No caso dos autos, o Recorrente não indica, na Motivação ou nas Conclusões, quais são os factos que, em concreto, foram incorrectamente julgados pelo decisor da primeira instância.

Com efeito, conclui que deveria ser absolvido do crime de furto, porquanto «da prova produzida não se poderá dar como provado ter (…) praticado» aquele ilícito, sem que concretize a factualidade (os pontos de facto) que deveriam ser considerados não provados.

Desconhece-se, pois, de entre os factos que integram o crime de furto, qual ou quais os pontos que o Recorrente pretende, neste recurso impugnar.

Por outro lado, não especifica o recorrente, quais os meios de prova que, em concreto, impunham uma decisão diversa da tomada pela primeira instância.

Esta omissão leva, a nosso ver e salvo melhor opinião, ao não conhecimento deste segmento do recurso do Arguido.

Tal decorre, expressamente da conjugação dos nºs 3 e 4 do art. 417º, nº 3, do Código de Processo Penal que, estabelecem, respectivamente, que:

«Se das conclusões do recurso não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.s 2 a 5 do art. 412º, o relator convida o recorrente a completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de dez dias, sob pena do recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afectada. Se a motivação do recurso não contiver as conclusões e não tiver sido formulado convite a que se refere o n.º 2, do art. 411º, o relator convida o Recorrente a apresentá-lo, em 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado».

Porém, este aperfeiçoamento «não permite modificar o âmbito do recurso que tiver sido fixado na Motivação».

Ou seja, o convite a formular ao Recorrente, quando ocorra a omissão de uma das indicações previstas nos nºs 2 a 5, do art. 412º, do Código de Processo Penal, onde se inclui, o nº 3, al. a) – a que ao caso interessa – só é exigido quando aquela omissão se verifique nas Conclusões.

Contudo, se na própria Motivação não constam os elementos necessários ao cumprimento do nº 3, do art. 412º, do Código de Processo Penal, não há qualquer solicitação ao Recorrente para aperfeiçoar a peça recursal que apresentou.

Neste caso, o recurso é, legalmente, rejeitado, sem que ao recorrente seja dada nova oportunidade para completar as omissões verificadas.

Neste sentido, cf. Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário ao Código de Processo Penal, página 1147, onde se lê:

«A falta de indicação nas conclusões da motivação, das menções contidas nas alíneas a), b) e c), do nº 3 do artigo 412º, não é motivo para rejeição liminar do recurso, mas apenas motivo para convite a “apresentar” ou “completar” as conclusões, nos termos do art. 417º, nº 3 (conjugado com o artigo 412º, nº 3) que acolhe a jurisprudência dos acórdãos do TC nº 288/2000 e 320/2002, este com força obrigatória geral. Ao invés se o recorrente não fez constar na própria motivação os elementos necessários ao cumprimento do disposto no artigo 412º, nº 3 do CPP, há motivo legal de rejeição ou de improcedência do recurso nessa parte, sem que ao Recorrente seja dada a oportunidade de suprir o vício dessa falta (…).

O relator não tem o dever de convidar o recorrente a aperfeiçoar a própria motivação de recurso quanto à matéria de facto (Acórdão do TRL de 20.10.1999, in CJ, 4, 153)».

Ora, in casu, já se disse, o Recorrente não concretizou na Motivação nem nas Conclusões, quais os pontos de facto que considera erradamente julgados pelo tribunal a quo, nem especificou os meios de prova que impunham uma decisão diversa da recorrida.

Tal circunstância impede este tribunal de apreciar esta parte do recurso, nos termos e para efeitos do disposto do art. 412º, nº 3, do Código de Processo Penal.

Acresce que, do texto da decisão recorrida, não se detecta qualquer vício de conhecimento oficioso, como sejam, os do nº2, do art. 412º, do Código de Processo Penal.

É sabido, que resulta expressis verbis deste preceito que os vícios nele referidos – a) a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; b) a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e c)erro notório na apreciação da prova – têm que resultar da própria decisão recorrida, na sua globalidade – do texto da decisão recorrida – sem recurso a quaisquer outros elementos que lhe são externos.

Em conformidade com todo o exposto pode concluir-se que não estão reunidos os pressupostos legais para que esta instância possa modificar a factualidade fixada pelo tribunal a quo.

Improcede, pois, esta pretensão do recorrente, mantendo-se a decisão sobre a matéria de facto proferida pela primeira instância

2. A qualificação jurídica-criminal dos factos

O recorrente foi condenado pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 203º, nº1 e 204º, nº 1, al. e), do Código Penal, com fundamento nos seguintes factos:

Em Agosto de 2012, o arguido deslocou-se à residência de Maria E., com quem foi casado, com o propósito de ali se apoderar de vales postais que se encontrassem no interior da caixa do correio.

O arguido já não residia nessa habitação desde 2010, estando divorciado desde 2010, encontrando-se divorciados desde 6 de Dezembro de 2011.

Não obstante estes factos, o certo é que mantinha ilegitimamente na sua posse uma chave da supra citada caixa do correio.

Porque estava fechada à chave, o arguido para sua abertura utilizou a chave supra indicada, e retirou do seu interior o vale de correio nº 265579, no montante de €246,38€, endereçado a Maria E., fazendo do mesmo coisa sua.

Bem sabia o arguido que o vale do correio não lhe pertencia e que ao dele apoderar-se, fazendo-o seu, actuava contra a vontade da sua legítima dona, e que para a abertura da caixa onde o mesmo se encontrava utilizou uma chave que, naquela ocasião, não lhe era permitido possuir.

Esta factualidade integra, em abstracto, os elementos objectivos e subjectivo do crime de furto previsto e punido pelo artigo 203º, nº1, do Código Penal, na medida em que o arguido/recorrente se apoderou e fez seu, o vale postal que não lhe pertencia, contra a vontade da ofendida (pontos de facto nºs 1.1 e 1.12). O propósito de se obter para si a quantia constante no vale postal surge posteriormente, como resulta do ponto de facto provado nº 1.5 a 1.17).

Por outro lado, quando o arguido retirou o vale postal que se encontrava dentro de uma caixa de correio fechada à chave, preencheu a previsão da alínea e), do nº 1, do artigo 204º, do Código Penal, o que nos levaria ao preenchimento do tipo de furto qualificado, nos termos em que foi condenado.

Contudo, dispõe o nº 4, do mesmo dispositivo legal que:

«Não há lugar à qualificação se a coisa furtada for de diminuto valor».

Como ensina Faria Costa (Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo II, pág. 87), «o comportamento, em princípio susceptível de ser enquadrado como adequada expressão de qualificação, mais não deve do que ser degradado para a integração do crime material. O que é mesmo que sustentar que, em rigor, se está única e exclusivamente perante um furto simples».

O valor diminuto é «aquele que não exceder uma unidade de conta avaliada no momento da prática do facto» (artigo 202º, al. c), do Código Penal).

A Unidade de Conta era, em 2012, de 102,00€ (calculada de acordo com o disposto no Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro; Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro; Portaria n.º 9/2008, de 3 de Janeiro; Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril; Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro e Lei n.º 64-B/2011, referentes aos Orçamentos de Estado relativos aos anos de 2010, 2011, 2012).

O arguido subtraiu um vale postal que titulava a quantia de 246,38€.

Porém, a subtracção e apropriação do vale postal, por si só, não tornava o arguido dono e/ou legitimo portador da quantia de 246,38€.

Com efeito, o vale postal é um meio de transferência de dinheiro que confere ao destinatário ou legítimo portador, o direito a haver para si – a ser pago – a quantia que titula, ou como estipula o artigo 1º, do Regulamento do Serviço de Vales de Correio, aprovado pela Portaria nº 536/95, de 3 de Junho, com as alterações da Portaria nº 75/2002 de 22 de Janeiro, «contém uma ordem de pagamento especial que permite efectuar transferências de fundos».

O vale postal é pago nas estações dos correios ou postos de correio autorizados, ao seu destinatário, podendo ser transmissíveis apenas por um endosso, sendo que o pagamento de faz mediante recibo (artigos 11º e 12º do citado Regulamento).

Ou seja, a apropriação do vale postal, ipso facto, não confere ao seu detentor, o direito à quantia que nele consta.

E, tanto assim é, que o arguido, depois de subtrair o dito vale e já na posse do mesmo, propôs-se aquele a obter a quantia de 246,38€ (facto nº 1.5), com recurso a um esquema que lhe permitia fazer-se passar por um legítimo endossado daquele meio de pagamento, conseguindo, assim que lhe fosse paga aquele montante.

Vale isto para dizer que o valor do vale postal para efeitos do crime de furto não corresponde ao valor que aquele titula. Este só entra na disponibilidade do recorrente, após ter decidido e concretizado forjar o endosso de que se serviu para obter o montante de 246,38€.

Não pode, pois, considerar-se este montante, como sendo o valor da coisa furtada pelo recorrente.

É certo que não se apurou quanto valia documento retirado pelo arguido. Mas não é menos certo que, as regras da experiência comum ditam que um vale postal que representa a quantia de 246,38€, nunca será igual ou superior a 102,00€.

Para tanto, basta consultar o site dos Correios Telégrafos e Telecomunicações de Portugal (CTT), em www.ctt.pt (entidade que emite estes títulos), para se constatar que o preço para transferir uma quantia até 500€, é de 1,48€.

Tanto significa, que o valor da coisa subtraída pelo recorrente (inferior a 102€), porque diminuto, desqualifica o furto do vale postal, nos termos legais expostos.

Cometeu, pois, o arguido um crime de furto simples previsto e punido pelo artigo 203º, nº1, do Código Penal.

3. O concurso entre o crime de furto, burla e falsificação

Defende o Recorrente, que tratando-se de subtracção e falsificação de um vale postal utilizadas unicamente como meio de burlar alguém, os crimes estão, entre si, numa relação de concurso aparente com o crime de burla, devendo, por isso, ser condenando, apenas por este último ilícito.

São conhecidos os debates doutrinários e jurisprudenciais que, desde a vigência do Código Penal de 1982 até hoje, se desenharam sobre esta questão, tendo, inclusivamente, originado a fixação de jurisprudência por parte do Supremo Tribunal de Justiça, da qual realçamos o mais recente, proferido, a propósito da alteração da configuração do crime de falsificação previsto no art. 256º, dada pela Lei 59/2007, de 4 de Setembro, em 5 de Junho de 2013, publicado com o nº 10/2013, no Diário da República, I SÉRIE, nº 131, em, 10.07.2013, pág. 4015, que, não obstante, os votos de vencido, fixou jurisprudência no sentido de que:

«A alteração introduzida pela Lei 59/2007 no tipo legal do crime de falsificação previsto no artigo 256 do Código Penal, estabelecendo um elemento subjectivo especial, não afecta a jurisprudência fixada nos acórdãos de fixação de jurisprudência de 19 de Fevereiro de 1992 e 8/2000 de 4 de Maio de 2000 e, nomeadamente, a interpretação neles constante de que, no caso de a conduta do agente preencher as previsões de falsificação e de burla do artigo 256º, nº 1, alínea a), e do artigo 217º, nº 1, do mesmo Código, se verifica um concurso real ou efectivo de crimes».

Com fundamento, entre outros, nos seguintes argumentos:

«Tratando-se de uma definição ex novo em face de uma nova redacção legal, igualmente é certo que o intérprete não pode relegar para o limbo toda uma evolução jurisprudencial que se suscitou sobre o tema. Evocando a mesma temos um primeiro momento de definição uniformizadora com o Acórdão de Uniformização de 14 de Fevereiro de 1992 que, chamado a pronunciar-se sobre o tema, proclama que são diversos e autónomos, entre si, o bem jurídico violado pela burla e o bem jurídico protegido pela falsificação, que se visam proteger com a incriminação, ou sejam, respectivamente, o património do burlado e a fé pública dos documentos necessária à normalização das relações sociais, como no n.º 4 ficou evidenciado;

A tal conduz o critério teleológico que se deve ter igualmente por adoptado no aludido n.º 1 do artigo 30.º do Código Penal (como aliás se referiu no n.º 4) para se operar a distinção entre unidade e pluralidade de crimes, determinando o conceito de pluralidade de crimes a partir da indagação sobre se o procedimento ou conduta do agente viola ou não disposições que consagram e protegem interesses diferentes.

Consequentemente, a mesma decisão fixou jurisprudência afirmando que, no caso de a conduta do agente preencher as previsões de falsificação, e de burla, do artigo 228.º, n.º 1, alínea a), e do artigo 313.º, n.º 1, do Código Penal, verifica-se concurso real ou efectivo de crimes.

Decorridos alguns anos, face a nova alteração legal, nomeadamente a introduzida pelo Decreto-lei 48/95, novamente é suscitada a apreciação do Supremo Tribunal de Justiça que, chamado a escrutinar a melhor interpretação, reafirmou a posição anteriormente assumida, concluindo que, sendo distintos os bens jurídicos tutelados pelos tipos legais de crime de burla (o património) e de falsificação de documento (que não será tanto a fé pública dos documentos [.] mas, antes, a verdade intrínseca do documento enquanto tal (cf. F. Dias e Costa Andrade “ O legislador de 1982 optou pela descriminalização do crime patrimonial de simulação” Colectânea de Jurisprudência, ano VIII, t. III, p. 23) ou ‘a verdade da prova documental enquanto meio que consente a formulação de um juízo exacto, relativamente a factos que possam apresentar relevância jurídica’ (cf. Malinverni, Enciclopédia del Diritto, vol. XIII, pp. 632-633) e não se verificando, entre eles, qualquer relação de especialidade, subsidiariedade ou consunção nem se configurando nenhum dos crimes em relação ao outro como facto posterior não punível [...] deve continuar a concluir-se que a conduta do agente que falsifica um documento e o usa, astuciosamente, para enganar ou induzir em erro o burlado integra (suposta, naturalmente, a verificação de todos os elementos essenciais de cada um dos tipos), efectivamente, em concurso real, um crime de falsificação de documento e um crime de burla.»,,,,,,,,Por todo o exposto, não se vê qualquer razão para que a doutrina constante do acórdão fundamento deva ser alterada. Impõe-se, contudo, fazer uma actualização na referência aos artigos hoje vigentes.

Conclui a mesma decisão no sentido de uniformizar a jurisprudência na esteira do entendimento anteriormente seguido decidindo que : «No caso de a conduta do agente preencher as previsões de falsificação e de burla do artigo 256º, nº 1, alínea a), e do artigo 217º, nº 1, respectivamente, do Código Penal, revisto pelo Decreto-Lei nº 48/95, de 15 de Março, verifica-se concurso real ou efectivo de crimes.»-(Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 8/2000. DR 119 SÉRIE I-A de 2000-05-23)

Sendo certo que a novidade legislativa justifica a necessidade de uma definição perante a oposição de julgados, não nos podemos alhear da forma como este Supremo Tribunal de Justiça delimitou a questão quer antes, quer depois, da alteração legal. Efectivamente, já após a alteração contida na lei ora em apreço, este Tribunal teve ocasião de se pronunciar diversas vezes sobre o tema e fê-lo no sentido de que não existiam razões para alterar o posicionamento constante do Acórdão de Fixação de Jurisprudência 8/2000.

(…)

Da inovação legislativa consubstanciada na expressão inovadora “ou de preparar, facilitar executar ou encobrir outro crime” encontra respaldo alguma doutrina no sentido de que a mesma tem um significado preciso de consagrar a orientação que, em face do artigo 30 do Código Penal, entende que entre o crime de falsificação e o crime de burla se encontra um concurso aparente de crimes e, nomeadamente, que se configura a existência de uma consumpção. Assim,

Reportando-se à referida alteração, Paulo Pinto de Albuquerque avança, assertivamente, no sentido de que há concurso aparente (consunção) entre o crime de falsificação de documento e o crime de burla ou qualquer outro crime que tenha sido preparado, facilitado, executado ou encoberto por intermédio de documento falso, tendo o legislador propositadamente afastado a jurisprudência dos acórdãos de fixação de jurisprudência do STJ de 19.2.1992 e nº 8/2000…...Refere o mesmo Autor que com efeito, o legislador deixou claro, na revisão do CP de 2007, que a acção típica de falsificação pode ser querida exclusivamente com a intenção de preparar, facilitar, executar ou encobrir um crime, sendo este elemento subjectivo típico parte constitutiva do próprio ilícito subjectivo e não um factor de agravação (como sucede no crime de homicídio). Sendo assim, a punição nestes casos em concurso efectivo redundaria numa dupla punição do mesmo facto. A conclusão é inelutável, em face da opção de política criminal do legislador: o concurso é meramente aparente, sendo a punição do crime-instrumento de falsificação subsidiária da punição do crime-fim.

Pelas mesmas coordenadas se orientam Victor Pereira e Alexandre Lafayette no seu Comentário ao Código Penal. Por seu turno Helena Moniz revisitando um tema já por si anteriormente abordado encontra agora um novo ponto de sustentação na alteração legal referindo que o crime de falsificação de documentos, ainda que o continuemos a entender como um crime que lesa um bem jurídico colectivo, o da segurança e fiabilidade no tráfico jurídico-probatório, é em muitas situações a "arma" utilizada para a prática de um outro ilícito. Isso mesmo acabou por se tomar mais explícito com a redacção dada ao art. 256.°, n.º 1, do Código Penal, pela Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro. Na verdade, agora tomou-se claro que o documento falsificado pode servir para "preparar, facilitar, executar" um crime, ou ainda para "encobrir" um outro crime.

Esta alteração da norma facilita o meu entendimento tradicional - concurso aparente por consumpção. Desde 1993 (O Crime de falsificação de documentos. Da falsificação de documentos à falsidade intelectual) que tenho considerado que aquele que falsifica um documento, utilizando-o para a prática de um crime de burla, independentemente de a falsificação ter sido realizada com esse objectivo ou de ter sido dada essa finalidade ao documento falsificado num momento posterior, só deverá ser punido pelo crime de burla (considerando que a moldura da pena era suficientemente ampla para permitir ter este aspecto em conta aquando da determinação concreta da pena).

Conclui a mesma Autora que não estando nós perante um concurso de normas, mas perante um concurso (aparente) com uma pluralidade de ilícitos, deve haver sempre uma análise caso a caso, para que se possa concluir se, em face da situação concreta e analisando globalmente o comportamento, estamos ou não perante uma unidade global de um único sentido de ilicitude, de desvalor jurídico-social; análise casuística que, afinal, acaba por diminuir o sentido de qualquer acórdão de fixação de jurisprudência o não entendimento de que não obstante serem distintos os bens jurídicos protegidos por ambos os tipos, se impor uma punição da mesma conduta por dois diferentes tipos legais de crime em clara violação do princípio do ne bis in idem.

Assim, a primeira questão que é proposta ao intérprete é a do significado jurídico da expressão agora aditada pela citada Lei. No que respeita, sufragando a lição de Figueiredo Dias, as palavras em que o legislador consagra o comando legal nem sempre se apresentam ausentes de qualquer equivocidade e, pelo contrário, muitas vezes denotam uma natureza polissémica face á qual se impõe a tarefa interpretativa. Por isso, o texto legal se torna carente de interpretação, oferecendo as palavras que o compõem, segundo o seu sentido comum e literal, um quadro de significações dentro do qual o aplicador da lei se pode mover e pode optar sem ultrapassar os limites legítimos da interpretação.…Na verdade, o intérprete move-se no âmbito das possíveis significações linguísticas do texto legal e tem de respeitar o sistema da lei, não lhe quebrando a harmonia, não lhe alterando ou rompendo a sua coerência interna. Só até onde chegue a tolerância do texto, e a elasticidade do sistema, é que o intérprete se pode resolver pela interpretação que dê à lei um sentido mais justo e mais apropriado às exigências de entre as várias acepções que a letra da mesma comporte e o sistema não exclua. É, pois, neste campo que o juiz pode conformar o sentido da norma, valorando as significações pelos critérios da recta justiça e da utilidade prática. No entanto, se é certo que o mesmo interprete está ligado aos juízos de valor – bem como aos sentidos e finalidades – da norma inscritos no pensamento do legislador histórico, é igualmente exacto que o mesmo se deve comprometer com a análise das novas exigências e realidades, entretanto surgidas, as quais não estiveram presentes no espírito originário do feitor da lei. Tal tarefa tem único limite que se consubstancia na impossibilidade de ultrapassar o teor literal da regulamentação e o seu campo de significações adequadas ao entendimento comum e normal das palavras constantes da norma a interpretar.

Como refere Jeschek o sentido da lei, qualquer que ele seja, só pode expressar-se através de palavras. Estas são o objecto primacial da interpretação e, por isso, deve ser sempre respeitado o sentido literal possível como limite extremo da interpretação que tem como índice fundamental a legalidade.

Confrontados no caso concreto com a necessidade de recorrer aos diversos segmentos em que a norma se coloca para determinar o seu conteúdo exacto é permitido atribuir um lugar de eleição á própria vontade do legislador expressa no relatório que constitui o proémio do diploma de inovação legislativa. Por tal forma se respiga a afirmação de que “os crimes de falsificação são objecto de diversas alterações. O conceito de documento de identificação é reformulado, passando a designar-se como documento de identificação ou de viagem e a englobar o cartão de cidadão. No elemento subjectivo especial destes crimes, inclui-se a intenção de preparar, facilitar, executar ou encobrir outro crime. O âmbito das condutas típicas é ampliado, referindo-se os hologramas e quaisquer componentes do documento, bem como o respectivo uso, detenção ou cedência. No caso específico de atestado falso, criminaliza-se a conduta de quem emita o documento ignorando se os factos dele constantes são verdadeiros”.

É indesmentível o intuito do legislador de incluir algo mais no âmbito do tipo legal, nomeadamente aquilo que denomina elemento subjectivo especial. Tal opção de vontade introduz algo de novo no âmbito da questão do concurso de crimes de burla e falsificação?

Estamos em crer que não. Na verdade, fazendo apelo a Figueiredo Dias, em muitos tipos legais de crime existem especiais elementos subjectivos que não pertencem ao dolo do tipo enquanto conhecimento e vontade de realização do tipo objectivo e que todavia, de forma essencial, co-determinam o desvalor da acção e definem a área de tutela típica. Em muitos tipos subjectivos de ilícito, ao dolo do tipo acrescem especiais elementos subjectivos. A distinção entre os elementos pertencentes ao dolo do tipo e os especiais elementos subjectivos do tipo agora em consideração está em que estes, ao contrário daqueles, não se referem a elementos do tipo objectivo de ilícito, ainda quando se liguem à vontade do agente de realização do tipo: o seu objecto encontra-se fora do tipo objectivo de ilícito, não havendo por isso, na parte que lhes toca, uma correspondência ou congruência entre o tipo objectivo e o tipo subjectivo de ilícito . E todavia, refere o mesmo Autor, também estes elementos cumprem a função de individualizar uma espécie de delito, de tal forma que, quando eles faltam, o tipo de ilícito daquela espécie de delito não se encontra verificado.

Adianta Figueiredo Dias que a questão mais delicada suscitada por estes especiais elementos subjectivos (intenções, motivos, pulsões afectivas, elementos da atitude interna) reside no facto de tais elementos, pela sua própria natureza, não serem quase nunca recondutíveis a um qualquer acontecimento exterior mas, pelo contrário, se analisarem em dados e relações puramente ou predominantemente internos; sendo por isso muitas vezes difícil afirmar se um concreto elemento respeita ainda ao tipo de ilícito ou antes ao tipo de culpa.

O critério deve ser que o elemento questionado pertence ao tipo de ilícito se ele serve, ainda, a definição de uma certa espécie de delito e se refere, por esta via, ao bem jurídico protegido, ou se visa ainda caracterizar o objecto da acção, a forma da sua lesão ou uma qualquer tendência relevante para o ilícito.

Também na procura do traço distintivo daquele elemento refere Jeschek que ao dolo adicionam-se com frequência especiais elementos subjetivos do tipo, que são também componentes da ilicitude pessoal da acção, na medida em que caracterizam mais detalhadamente a vontade de acção do autor. Como modificações da vontade típica de acção, oferecem, da mesma forma que o dolo, a estrutura da finalidade e referem-se, como este, ao bem jurídico protegido, ao objeto da acção ou à forma e maneira da sua lesão. As denominações "elementos subjetivos da ilicitude" e "elementos subjetivos do tipo" são equivalentes: a primeira centra-se na inclusão de todo o grupo de elementos nos factores que caracterizam a ilicitude duma classe de delito, enquanto a segunda indica que estes elementos se utilizam na estrutura do tipo.

Normalmente os elementos subjetivos do tipo servem para construir a ilicitude de uma determinada classe de delito, mas também se utilizam, com menor frequência, para desenhar figuras qualificadas ou privilegiadas a partir dum delito base.

Nem todos os componentes dum preceito penal que descobrem factores anímicos são elementos subjetivos da ilicitude. Há que distinguir entre estes e os elementos do tipo de culpa. Decisivos para a delimitação são os critérios que servem para diferenciar com carácter geral entre a ilicitude e a culpa. Assim, os componentes subjetivos dum preceito penal unicamente interessam para a ilicitude quando caracterizam a vontade de acção do autor na medida em que afectam a forma de comissão do facto, o objeto da acção protegida pelo tipo ou o bem jurídico. Constituem, pelo contrário, elementos da culpa todas aquelas circunstâncias que caracterizam com mais precisão a formação da vontade do autor, porquanto situam numa luz mais, ou menos, negativa a sua atitude interna de que nasce a decisão da prática do facto.

Por seu turno Roxin refere que o problema dos elementos subjetivos do tipo não consiste na sua existência, mas na delimitação dos elementos subjetivos especiais da culpa. Não é possível localizar os elementos subjetivos no tipo aduzindo como fundamento que os mesmos fundamentam ou reforçam o juízo de desvalor social sobre o facto pois o início de desvalor social não distingue entre ilicitude e culpa. A ideia fundamental para a delimitação deve ser a circunstância que é decisivo para localizar sistematicamente os elementos subjetivos na ilicitude: a referência ao tipo delictivo. Um elemento subjetivo pode caracterizar o tipo delictivo ao referir-se ao bem jurídico protegido; mas também pode coadjuvar na determinação do tipo delictivo caraterizando o objecto da acção típica. Em contrapartida quando um elemento não se refere ao tipo delictivo, mas unicamente descreve motivos, sentimentos e atitudes internas independentes daquele (e agravantes por regra geral), trata-se de elemento da culpabilidade.

Assim, assumida a natureza e especificidade do elemento especial subjectivo agora introduzido no tipo legal, importa equacionar da sua relevância para o tema que suscita a nossa atenção e aqui temos por adquirido que, se alguma ilação se pode extrair, é a de que o adicionar do segmento de preparação facilitação, execução ou encobrimento de outro crime ao tipo legal deve ser interpretado como o reforço da tutela do bem jurídico caucionado pelo crime de falsificação, afastando a relevância da instrumentalidade, ou do critério do crime meio ou crime instrumento, como determinante da afirmação de um concurso aparente de infracções entre a burla e a falsificação.

Em suma, entende-se que do reforço do elemento subjectivo do tipo não se pode extrair qualquer argumento no sentido de que o legislador pretendeu afirmar o traço comsumptivo entre os dois crimes e, bem pelo contrário, se alguma referência se pode intuir na vontade do legislador é de que o crime de falsificação mantem a sua autonomia, não sendo absorvido, não obstante a circunstância de se destinar a preparar, facilitar executar ou encobrir outro crime”. Na verdade, não pode ser entendida de outra forma a afirmação de que o crime de falsificação se mantem na sua completude, e sem qualquer absorção, não obstante constituir o meio de executar outro crime.

Configurado, assim, o tema da presente unificação de jurisprudência estamos em crer que mantêm inteira validade os pressupostos que informaram as decisões de uniformização que nasceram à luz da anterior redacção do artigo 256º do Código Penal, nomeadamente o Acórdão de 19 de Fevereiro de 1992 e o Assento 8/2000 de 4 de Maio de 2000. Igualmente é linear a conclusão de que a alteração legislativa introduzida pela Lei 59/2007, e relativa ao artigo 256 do Código Penal, não contem qualquer virtualidade que fundamente uma inflexão na interpretação contida nas duas referidas decisões de uniformização de jurisprudência».

Este Aresto vem, assim, resolver a questão da relação de concurso entre o crime de falsificação e burla, julgando-os em concurso efectivo ou real, opinião com a qual concordamos, sendo certo que nenhuma das razões apontadas pelo recorrente a coloca em crise.

No que toca ao crime de furto, não vislumbramos (nem é indicado pelo recorrente), fundamento ou justificação (fáctica ou legal) para caracterizar a subtracção do vale da caixa do correio, como um acto preparatório dos crimes de falsificação e/ou de burla.

Recorde-se que o artigo 30º, nº1, do Código Penal, dispondo que o número de crimes se determina pelo número de tipo de crimes efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente, adopta a unidade ou pluralidade de tipos violados como critério básico da distinção entre a unidade e pluralidade de infracções.

Quando a conduta do agente integra uma pluralidade de infracções, distingue-se, na doutrina e jurisprudência entre concurso real ou efectivo e concurso legal, aparente ou impuro.

Neste último, muito embora, a conduta do agente preencha, em abstracto e formalmente, vários tipos de crime, conclui-se, por via das regras interpretativas, que a conduta concreta integra apenas e só um dos ilícitos violados, afastando os demais.

A pluralidade de infracções, depois de analisados os vários tipos, traduz-se numa mera aparência.

Ou, como ensina Eduardo Correia - Unidade e Pluradlidade de Infracções - muitas normas penais, afectas à descrição dos diferentes tipos, estão entre si numa relação de hierarquia ou subordinação, isto é, têm uma estrutura tal que a aplicação de uma delas exclui, sob certas circunstâncias, a possibilidade de eficácia cumulativa de outras.

Tal acontece, por exemplo, quando entre várias normas incriminadoras, se verificam relações de especialidade ou consumpção.

No concurso efectivo ou real, conduta do agente preenche vários tipos legais, não se excluindo nenhum deles, por via das regras de interpretação. As normas concorrentes aplicam-se todas elas à conduta do agente.

Perante a factualidade apurada, nenhuma dúvida se suscita, que os ilícitos penais praticados pelo arguido (furto, falsificação e burla) se encontram, numa relação de concurso real e não aparente.

Com efeito, os bens jurídicos protegidos por cada um dos tipos em causa são distintos, inexistindo qualquer interdependência entre a realização de cada um deles.

Os factos subjacentes ao crime de furto, ao crime de burla e ao crime de falsificação são diversos entre si, tendo sido praticados com total autonomia. O preenchimento do crime de burla e de falsificação não incluem o preenchimento do crime de furto.

O facto do crime de furto ser cometido como um meio para realizar o crime de falsificação e de burla não lhe retira autonomia.

Donde, inexiste qualquer concurso aparente entre o crime de furto e o de falsificação e o de burla, devendo, por isso, considerar-se, como se fez na decisão recorrida, que o recorrente praticou, em concurso real, os três crimes pelos quais foi condenado.

Carece, assim, de fundamento, o peticionado nas Conclusões nº 2 e 3.

4. Dosimetria da pena

4.1. Penas parcelares

No caso dos autos, o arguido foi condenado na pena de:

- Onze meses de prisão, pela prática de um crime de furto qualificado previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1 e 204º, nº 1, al. e), do Código Penal;

- Três meses de prisão pela prática de um crime de burla previsto e punido pelo artigo 217º, nº 1, do Código Penal.

- Um ano e oito meses de prisão pela prática de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo artigo 256º, nº 1, al. c) e nº 3, do Código Penal.

Insurge-se o recorrente contra a medida concreta de cada uma destas penas, tendo-as por «exageradas» (Conclusão nº 12).

Mas, adiante-se, desde já, que, não fora a alteração da qualificação jurídico-penal do crime de furto qualificado para furto, nenhuma censura mereceriam as penas parcelares fixadas.

Recorde-se que, na determinação da medida concreta da pena, deve o julgador ponderar, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele, designadamente as elencadas nas diversas alíneas do nº 2, do artigo 71º, do Código Penal, a saber:

- As reportadas à execução do facto, desde o grau da ilicitude, o modo de execução, o grau de violação dos deveres impostos ao agente, intensidade da culpa sentimentos manifestados e fins determinantes da conduta [alíneas a), b) e c)];

- As relativas à personalidade do agente: as suas condições pessoais e situação económica, bem como a falta de preparação para manter uma conduta lícita manifestada no facto [alíneas d) e f)];

- As que respeitam à conduta do agente anterior e posterior a facto [alínea e)].

A aplicação de uma pena tem como finalidade, di-lo o art. 40º do Código Penal, a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, sendo que em, caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa.

Como se realça no Acórdão da Relação de Coimbra, de 4 de Maio de 2013 – www.dgsi.pt – citando, a Prof. Anabela Rodrigues e o Acórdão do STJ de 4.7.2006, «a prevenção geral radica, no significado que a “gravidade do facto” assume perante a comunidade, isto é, importa aferir do significado que a violação de determinados bens jurídicos penais tem para a comunidade e satisfazer as exigências de protecção desses bens na medida do necessário para assegurar a estabilização das expectativas da validade do direito ou, por outra forma, a consideração da prevenção geral procura dar “satisfação à necessidade comunitária de punição do caso concreto, tendo-se em conta de igual modo a premência da tutela dos respectivos bens jurídicos».

Ponderando os factos sub judice, temos que:

O grau da ilicitude dos factos, traduzido no modo como o arguido actuou e bem assim no prejuízo patrimonial causado, assume uma relevância mediana.

O dolo do agente é intenso, por revestir a forma mais grave da culpa: dolo directo.

Já o passado criminal do arguido evidenciado nos pontos de facto nºs 1.22 a 1.35 torna prementes as necessidades de prevenção especial.

A conduta delituosa do arguido não ocorreu, fortuita e ocasionalmente, sendo certo que as condenações penais sofridas não foram de molde a afastá-lo da prática de novos crimes.

A reiteração criminosa, bem como a circunstância dos factos a que respeitam a estes autos terem sido praticados, depois de, nesse mesmo ano de 2012, ter duas condenações anteriores, uma por crime de desobediência e outra por crimes de furto e de falsificação de documentos, é demonstrativa de que o Recorrente ainda não interiorizou o desvalor das suas condutas.

Ou seja, a conduta do Arguido manifesta indiferença perante as condenações anteriormente sofridas e total desrespeito pelos valores que as normas incriminatórias, nomeadamente, da falsificação de documento (a segurança e a credibilidade da força probatória de documento destinado ao tráfico jurídico), furto e burla (o património de outra pessoa), querem salvaguardar.

A personalidade do arguido revelada no seu passado criminal e na persistência de cometimento dos mesmos crimes, exige do sistema que a pena a aplicar seja suficiente para que entenda que deve respeito ao direito.

O arguido conta com 34 anos de idade, encontra-se desempregado, vivendo com uma companheira e um filho a cargo, é ajudado por familiares.

Os factos já ocorreram há cerca de 3 anos.

Destas circunstâncias, concluímos que as penas de prisão aplicadas ao arguido pela prática dos crimes de burla e falsificação de documento, se mostram ajustadas às exigências de prevenção geral e especial que acima se aduziram, devendo, por isso ser mantidas.

No que toca ao crime de furto, julgamos adequada às finalidades da punição, uma pena de quatro meses de prisão, dentro da moldura penal abstracta prevista no artigo 203º, nº 1, do Código Penal (um mês a três anos de prisão), na medida em que a opção pela pena de multa se encontra afastada, pelos motivos que constam na decisão recorrida e para os quais remetemos.

4.2. Pena única

A alteração de uma das penas parcelares justifica a reapreciação do cúmulo jurídico das penas aplicadas a cada um dos crimes.

É sabido, porque vem sendo repetidamente afirmado, pela Jurisprudência e pela doutrina, que na medida concreta da pena do concurso - tal como a medida concreta das penas parcelares, se determina em função da culpa do agente e das finalidades da punição – assume especial relevância a apreciação global conjunto dos factos e a personalidade do agente.

Na verdade, decorre do art. 77º, nº1, in fine, do Código Penal, que:

«Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente».

A pena única há-de ser encontrada na moldura abstractamente aplicável à punição do concurso de crimes calculada nos termos do nº 2, do mesmo preceito, tendo como limite máximo, a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias de multa, tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicáveis aos vários crimes.

Ponderadas as penas parcelares aplicadas ao arguido e bem assim o que dispõe o art. 77º, nº 2, a moldura penal abstractamente aplicável é de 1 (um) ano e 8 (oito) meses a 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão.

Dentro desta moldura penal, o quantum concreto da pena única há-de atender, como se disse, ao conjunto dos factos e à personalidade do agente.

Concretizando este exercício, constatamos que o arguido, entre 2005 e 2012, se dedicou, continuadamente, à prática de crimes, em especial, de furto, causando prejuízos a um número elevado de lesados.

A conclusão a retirar desta factualidade é a de que, de um lado, a conduta do arguido não ocorreu, fortuita e ocasionalmente.

Assim, o grau da ilicitude do conjunto dos factos que praticou é elevado, dado o tipo de conexão que existe entre eles.

Por outro lado, as exigências de prevenção geral e especial que na situação concreta se fazem sentir são, também, elevadas, tendo em conta o tipo de crime em causa e a circunstância do arguido ter praticado um grande número de crimes quanto ao património.

A favor do arguido militam as suas condições pessoais.

Os factos praticados pelo arguido revelam uma actividade delituosa reiterada e persistente que se processou em cerca de 2 anos, revelando uma certa tendência para a prática deste tipo de crime.

A personalidade do arguido revelada no seu passado criminal e na persistência de cometimento do mesmo crime, exige do sistema que a pena a aplicar seja suficiente para que entenda que deve respeito ao direito, maxime, ao que salvaguarda do património de terceiros. São estas as exigências da prevenção especial que o caso reclama.

Acresce que, as necessidades de prevenção geral assumem, também, relevância, dada a frequência com que este tipo de crime vem sendo cometido por todo o país.

Ponderados todos estes factos, entendemos como adequada a pena de dois anos de prisão.

5. Da suspensão da execução da pena de prisão

A suspensão da execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos, pode, nos termos do art. 50º do Código Penal, ser suspensa, se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Trata-se, como refere Manuel Lopes Maia Gonçalves – Código Penal Português, 2004, página 202 - de «uma medida penal de conteúdo reeducativo e pedagógico».

Para que se verifique a suspensão da pena, é necessário que o julgador, aquando da decisão, possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente à conduta do arguido, no sentido de que a ameaça da pena seja adequada e suficiente a realizar as finalidades da punição, isto é, a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

Olhada a sentença recorrida, a não opção pela suspensão da pena nos seguintes termos:

«No caso concreto, tendo em conta o extenso historial de conduta criminosa no certificado do registo criminal do arguido inclusive pela prática dos mesmos tipos de crime de furto qualificado a falsificação de documento, tendo já sido diversas vezes condenado em penas de prisão, claramente revelam que o arguido tem graves problemas em adotar uma conduta conforme o direito, mormente em respeitar a propriedade dos outros cidadãos.

Com efeito, o arguido revela uma personalidade totalmente alheada do dever-ser jurídico-penal, ignorando repetidamente as sucessivas advertências que lhe têm sido feitas através de decisões judiciais condenatórias, manifestando o mais profundo desprezo pelas mesmas e pela normatividade jurídico-penal.

A pena de dois anos e um mês de prisão, supra fixada, não poderá, assim, ser suspensa na sua execução, pois os múltiplos antecedentes do arguido não permitem formular qualquer juízo de prognose favorável relativamente ao seu comportamento futuro, além de que a suspensão da execução da pena de prisão poria em crise a normatividade jurídico-penal com a consequente descrença da comunidade na sua validade.

Efetivamente, as vantagens de suspensão de execução da pena têm de ser demonstradas, não se presumindo. Ora, perante os referidos antecedentes criminais do arguido, entre os quais se contam penas de prisão, o tribunal convenceu-se que, in casu, apenas o cumprimento da pena de prisão tutelará de forma suficiente os bens jurídicos atingidos e permitirá a tomada de consciência por parte do arguido de que deve viver em sociedade com obediência ao Direito e sem perpetuação de novos crimes.

Assim, por manifesta inaplicabilidade dos requisitos previstos no artigo 50º, nº1, do Código Penal, determina-se que a pena de prisão aplicada ao arguido não deve ser suspensa na sua execução».

As condenações anteriores são relevantes na medida em que permitem concluir que não constituíram advertência suficiente para afastar o arguido da prática de novos crimes (a vertente negativa da prevenção especial).

No caso, os antecedentes criminais constituiriam um grande obstáculo à atribuição da suspensão da pena ao arguido, atento o longo percurso criminal, contando, agora, com 14 condenações e todas praticamente atinentes a crimes contra o património.

«Por outro lado, a existência de condenação ou condenações anteriores não é impeditiva a priori da concessão da suspensão; mas compreende-se que o prognóstico favorável se torne, nestes casos, bem mais difícil e questionável - mesmo que os crimes em causa sejam de diferente natureza - e se exija para a concessão uma particular fundamentação (...).» [Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 3ª reimpressão, pág. 344. Tal orientação tem também acolhimento jurisprudencial, como se colhe da leitura dos acórdãos do STJ de 17.02.2000 (processo 99P1162) e de 12.12.2002 (processo 02P4196), e acórdão desta Relação de 10.05.2010 (processo 1889/04.0PBGMR.G1)].

Analisando o percurso delituoso do arguido:

O arguido nasceu em 19 de Novembro de 1980, pelo que, à data do primeiro crime, tinha cerca de 21 anos de idade.

O primeiro delito foi cometido em Fevereiro de 2002 e o segundo em 2005. No ano seguinte, 2006, pratica um crime de falsificação de documento (7 de Março) e um crime de desobediência (10 de Março), enquanto em Fevereiro de 2007, comete o crime de falsificação de actas. Por todos estes crimes foi condenado em pena de multa (pontos de facto 1.22 a 1.26).

Não se conhecem práticas de delitos entre 2008 a 2010.

No ano de 2011, o arguido pratica dois crimes de desobediência (em 7 de Junho e em 26 de Maio), um crime de falsificação de documento, um crime de furto simples (3 de Junho), um crime de furto qualificado (6 de Abril), um crime de incêndio de meio de transporte (22 de Fevereiro), um crime de furto simples (30 de Dezembro), um crime de furto qualificado (20 de Dezembro), um crime de furto qualificado (30 de Dezembro), um crime de furto simples e um crime de furto qualificado (Novembro).

O recorrente tem vindo a ser julgado por estes crimes, desde 2012, vindo a ter a primeira condenação em pena de prisão suspensa na sua execução, por sentença proferida em 5 de Julho de 2012, seguindo-se-lhe as demais condenações deste tipo (pontos de facto nºs 1.27 a 1.32).

A última condenação por crimes ainda praticados no ano de 2011 ocorreu em 24 de Novembro de 2014, por sentença transitada em julgado em 6 de Janeiro de 2015, com uma pena de 4 anos e 7 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, subordinada ao cumprimento pelo arguido de um regime de prova assente num plano individual de reinserção social e da prestação de 200 horas de trabalho a favor da comunidade.

Desta forma, em termos de um juízo de prognose favorável de que as condenações não serviram para afastar o arguido de comportamentos delituosos, têm relevância, aqueles que sobrevieram à sentença proferida em 5 de Julho de 2012.

É certo que, segundo resulta dos factos provados, o arguido percorreu o seu caminho de delitos, entre 2005 e 2012, com interregno entre 2008 e 2010. Mas não é menos certo que, quando o arguido praticou os factos pelos quais foi aqui julgado, tinha apenas decorrido cerca de um mês depois da primeira sentença que o condenou na pena de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução. Ou seja, já lá vão cerca de 3 anos, sem que haja notícia de outros ilícitos praticados pelo recorrente.

Donde, se os factos - objecto deste processo -tivessem sido julgados em data anterior às últimas condenações, possivelmente o arguido teria beneficiado de um juízo de prognose favorável, com vista à suspensão da execução da pena de prisão.

Perante todo este quadro factual, também nós, formulámos, ainda, um juízo favorável de que a simples ameaça da pena faça o arguido alterar o seu comportamento

Motivos pelos quais se substitui a pena de prisão pela suspensão da sua execução.

V – DECISÃO

Em face do exposto, acordam os Juízes da Secção Penal desta Relação, em julgar parcialmente provido o recurso interposto por Carlos A. e, consequentemente, condenam o arguido, como autor material e na forma consumada, em concurso real, de:

a) Um crime de furto previsto e punido pelo artigo 203º, nº1, do Código Penal, na pena de 4 (quatro) meses de prisão;
b) Um crime de burla previsto e punido pelo artigo 217º, nº 1, do Código Penal, na pena de 3 (três) meses de prisão;
c) Um crime de falsificação de documento previsto e punido pelo artigo 256º, nº1, al. c) e nº 3, do Código Penal, na pena de 1 (um) e 8 (oito) meses de prisão;
d) Absolvem o arguido da prática de um crime de furto qualificado previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1 e 204º, nº1, al. e), do Código Penal;
e) Em cúmulo jurídico, condenam o arguido, na pena única de 2 (dois) anos de prisão, suspensa na sua execução, por igual período.

Sem tributação (artigo 513º, do Código de Processo Penal).

Guimarães, 19 de Outubro de 2015