Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1617/17.0T8BGC.G1
Relator: ALDA MARTINS
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
INCAPACIDADE TEMPORÁRIA
SUBSÍDIO DE FÉRIAS
SUBSÍDIO DE NATAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/21/2019
Votação: MAIORIA COM * DEC VOT E * VOT VENC
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
Sumário (elaborado pela Relatora):

No cálculo da indemnização por incapacidade temporária, a retribuição anual a atender é o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade; e, quando a incapacidade for superior a 30 dias, acrescem os valores correspondentes aos subsídios de férias e de Natal proporcionais ao tempo da sua duração.

Alda Martins
Decisão Texto Integral:
1. Relatório

Nos presentes autos de acção declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, em que é sinistrado G. F. e responsável X - Companhia de Seguros, S.A., foi proferida sentença, onde se diz, além do mais:

«2. O regime legal aplicável ao caso em apreço é o que decorre da Lei 98/2009 de 04/09 (NLAT), atenta a data do acidente e o disposto no art. 187º nº 1 desse diploma.
Os critérios de fixação das indemnizações e pensões devidas por incapacidade são os previstos nos artigos 48º, 50º, 71º e 72º da citada lei.

Quanto à indemnização por incapacidade temporária, dispõe o art. 48.º nºs 1 e 4 que esta prestação se destina a compensar o sinistrado, durante um período de tempo limitado, pela perda ou redução da capacidade de trabalho ou de ganho resultante de acidente de trabalho e é devida enquanto o sinistrado estiver em regime de tratamento ambulatório ou de reabilitação profissional. Em caso de incapacidade temporária absoluta, tem o sinistrado direito a uma indemnização diária igual a 70 % da retribuição nos primeiros 12 meses e de 75% no período subsequente [nº 3 al. d) do art. 48º]. De acordo com o art. 50.º nº 1 a indemnização por incapacidade temporária é paga em relação a todos os dias, incluindo os de descanso e feriados, e começa a vencer-se no dia seguinte ao do acidente.

Na incapacidade temporária superior a 30 dias é paga a parte proporcional correspondente aos subsídios de férias e de Natal, determinada em função da percentagem da prestação prevista nas alíneas d) e e) do n.º 3 do artigo 48.º.

Os critérios de determinação da retribuição de base para efeitos de cálculo das prestações legais e a definição do que deve entender-se por retribuição mensal e anual estão estabelecidos no artigo 71º da NLAT. Assim, “A indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente (…) são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente” (nº 1); “Entende-se por retribuição mensal todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios” (nº 2); “Entende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade” (nº 3); “Se a retribuição correspondente ao dia do acidente for diferente da retribuição normal, esta é calculada pela média dos dias de trabalho e a respectiva retribuições auferidas pelo sinistrado no período de um ano anterior ao acidente”(nº 4); “Na falta dos elementos indicados nos números anteriores, o cálculo faz-se segundo o prudente arbítrio do juiz, tendo em atenção a natureza dos serviços prestados, a categoria profissional do sinistrado e os usos” (nº 5); “O disposto nos nºs 4 e 5 é aplicável ao trabalho não regular e ao trabalhador a tempo parcial vinculado a mais de um empregador”(nº 8); por fim “Em nenhum caso a retribuição pode ser inferior à que resulte da lei ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho” (nº 11).

Enquanto no regime estabelecido no art. 26º da Lei 100/99 de 13/09 se estabelecia um critério diferenciado para o cálculo da indemnização por incapacidade temporária e para o cálculo da pensão por morte ou por incapacidade permanente, tendo o primeiro por base a retribuição diária ou a 30ª parte da retribuição mensal ilíquida e o segundo a retribuição anual ilíquida, compreendendo-se nesta o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de férias e de natal e outras retribuições anuais a que o sinistrado tivesse direito com carácter de regularidade, no regime vigente estabelece-se um único critério para o cálculo da indemnização por incapacidade temporária e da pensão por morte ou por incapacidade, critério esse que se baseia na retribuição anual, entendida esta como o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de férias e de Natal e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito coma carácter de regularidade.

Assim sendo, a indemnização diária por incapacidade temporária corresponderá à 365ª parte da retribuição anual. Se, porém, a incapacidade temporária se prolongar por mais de trinta dias, a tal valor acresce a parte proporcional correspondente aos subsídios de férias e de Natal, calculada com base na mesma retribuição anual (art. 50º nº 3 NLAT).

Neste sentido se pronunciou o Acórdão do TRL de 18-05-2016, publicado no sítio www.dgsi.pt.

Ora, está provado que o A. auferia a retribuição mensal de 570,00€, acrescida de subsídio de refeição diário de 5,81€, o que perfaz a retribuição anual de 9.386,02€ 570,00x14+(5,81x22x11)], atentos os critérios estabelecidos no art. 71º da NLAT, sendo esta também a retribuição abrangida pelo contrato de seguro. Tendo o A. sofrido um período de 95 dias de incapacidade temporária absoluta para o trabalho e 17 dias de incapacidade temporária parcial de 20%, e considerando a retribuição anual de 9.386,02€, tem direito à indemnização total de €1.973,66, assim calculada:

- De 18/08 a 20/11/2017 (95 dias de ITA): €1.710,06 (€9.386,02€:365x70%x95);
- Subsídios de Férias de Natal proporcionais a 65 dias de ITA: €192,34 (€9.386,02€:365 x70%x30:365x65x2);
- De 21/11 a 07/12/2017 (17 dias de ITP): €61,20 (€9.386,02€:365x70%x17x20%);
- Subsídios de Férias de Natal proporcionais a 17 dias de ITP: €10,06 (€9.386,02€:365 x70%x30:365x17x20%x2).

Como o A. já recebeu da R. seguradora a quantia de €1.771,27, tem direito à diferença no montante de €202,39.

O montante de 1.771,27€ pago pela Ré ao A. a título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária foi calculado com base no salário anual de 9.386,02, mas não teve em conta a Ré seguradora o valor da parte proporcional correspondente aos subsídios de férias e de Natal relativos ao período excedente a 30 dias de incapacidade a que se refere o art. 50º nº 3 da LAT.

Procede, pois, parcialmente a pretensão do A.

Sobre as quantias em dívida acrescem juros de mora, à taxa legal desde a data do respectivo vencimento, nos termos dos arts. 559º, 798º, 805º n.º 2 e n.º 3, 2ª parte e 806º do Cód. Civil e 50 nºs 1 e 2 e 72º da N.L.A.T.
*
III
Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a presente acção e, em consequência, condeno a R. X - Companhia de Seguros, S.A. a pagar ao A. G. F.:

a) A quantia de €202,39 (duzentos e dois euros e trinta e nove cêntimos) relativa a indemnização por incapacidade temporária em dívida;
c) Juros de mora sobre as prestações em dívida, à taxa legal desde a data do respectivo vencimento.
Custas pela R., na proporção do decaimento.»

A R. seguradora, inconformada, interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões:

« O presente recurso de apelação é interposto da sentença proferida e versa sobre a apreciação da matéria de direito, que foi objeto de apreciação e decisão, pois que, salvo o devido respeito, a sentença recorrida não procedeu a uma correta e justa interpretação e aplicação dos preceitos e valores legais pertinentes.
- A questão a apreciar é simples e resume-se em saber se no caso do sinistrado com a incapacidade temporária superior a 30 dias :
- quando no cálculo da indemnização temporária a retribuição anual é o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescido de subsidio de férias e Natal, se ainda acrescem os valores correspondentes aos subsídios de férias e Natal, conforme defendido na douta sentença estribada no Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 18.05.16 in Proc. 5076/15.3T8LSB.L1-4
ou
- Constando da fórmula de cálculo adoptada a retribuição mensal vezes 14 meses, visto que cada um dos períodos de incapacidade temporária é superior a 30 dias, a base de cálculo da parte proporcional correspondente aos subsídios de férias e Natal já ali se encontra contemplada, pelo que carece de fundamento o cálculo adicional da parte proporcional das incapacidades temporárias superiores a 30 dias correspondente ao subsídio de férias e Natal, conforme defendido no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 25.06.2015 in Proc. 257/07.6TTGRD.Cl.S1.
– A sentença recorrida ao condenar a Ré in casu no pagamento da quantia 202,39€ correspondentes aos proporcionais de férias e Natal pelos períodos de ITA e ITP, quando a indemnização pelas ITs já foram pagas com base na retribuição mensal x 14 meses, não pode manter-se, por fazer uma errada interpretação do disposto nos arts. 50º e 71º da LAT .
Considerando o salário do autor para si transferido de 570,00 € x 14 meses/ano, acrescido de subsidio de refeição de 5,81 x 22 dias x 11 meses/ano, o que perfaz a retribuição anual de 9.386,02 € e os períodos de incapacidade temporária absoluta de 18.08.17 a 20.11.17, no total de 95 dias e de incapacidade temporária parcial de 20% de 21.11.2017 a 07.12.2017 no total de 17 dias, e tendo recebido da recorrente a quantia total de € 1.771,20 € , nada mais tem a pagar a titulo de ITs , pois os proporcionais de férias e Natal já estavam contemplados ou incorporados nos valores pagos .
Na fórmula de cálculo utilizada pela recorrente no pagamento já efectuado e pela Mma Juiz a quo já se encontra incluída (“contemplada”) a proporção devida pelos subsídios de Natal e de férias, bastando atentar na redação “570,00€ x 14”;
O cálculo autónomo do valor devido a título de subsídio de férias e de Natal determina o pagamento em duplicado de tais valores ao trabalhador, um duplo recebimento por este e enriquecimento ilegítimo.
Aliás, dispõe o art. 50º, nº 3 do LAT: “Na incapacidade temporária superior a 30 dias é paga a parte proporcional correspondente aos subsídios de férias e de Natal, determinada em função da percentagem da prestação prevista nas alíneas d) e e) do nº 3 do art. 48º”, pelo que, contrariamente ao que consta na sentença, a parte proporcional correspondente aos subsídios de férias e de Natal “é paga”, e não refere “acresce”.
Aliás, e salvo o devido respeito, a interpretação ao disposto nos arts 50º, nº 3 e 71º, nº 3 da LAT no sentido propugnado na douta sentença, constitui uma duplicação dos subsídios, sendo uma interpretação abusiva e até inconstitucional, porque violadora do princípio da igualdade e constitui uma discriminação negativa para os trabalhadores enquanto tal e superior na condição de sinistrados;
A interpretação que sempre foi e tem sido seguida por unanimidade em todos os tribunais, inclusive pelo Supremo Tribunal de Justiça, está de acordo com o espírito da lei, do sentido legislador e sentido teleológico de que as ITs inferiores a 30 dias devem ser pagas com base na retribuição anual – salário mensal x 12 –, sem os subsídios, e as superiores a 30 dias com base na retribuição anual – salário anual x 12 –, acrescida dos subsídios de férias e de Natal;
10ª Se assim não fosse, salvo o devido respeito, não faria sentido, ou tinha qualquer razão de ser, o disposto no art. 50º, nº 3 da LAT que estabelece exactamente essa diferença;
11ª Uma interpretação no sentido pretendido na douta sentença conduziria no limite que um trabalhador enquanto sinistrado com uma IT superior a 30 dias auferia uma indemnização com base em 16 meses, e se trabalhasse receberia o seu vencimento 14 meses no ano.
12ª Por isso mesmo se estabeleceu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.06.15 relator Pinto Espanhol in Processo nº 257/07.6TTGRD.C1.S1 in www.dgsi.pt/jstj:
“3- Constando da fórmula de cálculo adoptada, o segmento “ € 1.100,00 x 14 meses”, visto que cada um dos períodos de incapacidade temporária é superior a 15 dias, a base de cálculo da parte proporcional correspondente aos subsídios de férias e de natal já ali se encontra contemplada, pelo que carece de fundamento o cálculo adicional da parte proporcional das incapacidades temporárias superiores a 15 dias correspondente aos subsídios de férias e de Natal” - (pese embora seja um acórdão proferido no domínio da LAT anterior, o principio geral de cálculo ou fórmula de cálculo é o mesmo, quer no actual art. 50º, nº 3 da NLAT, quer no domínio do art 43º, nº 3 do anterior RLAT, sendo a única alteração passar de 15 para 30 dias).
13ª Pelo que, deve o acórdão proferido ser revogado, por errada interpretação do disposto nos arts. 23º, al b) , 50º, nº 3 e 71º da Lei 98/2009 de 04.09 e substituída por outra que absolva a ré do pedido.»

Foi apresentada resposta ao recurso, pugnando pela sua improcedência.

O recurso foi admitido como apelação, com efeito meramente devolutivo.

Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, e colhidos os vistos dos Desembargadores Adjuntos, verificou-se em conferência a situação a que alude o art. 663.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, pelo que o acórdão é lavrado pela primeira adjunta.

2. Objecto do recurso

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente – arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil –, a única questão que se coloca a este Tribunal é a do cálculo da indemnização por incapacidade temporária superior a 30 dias.

3. Fundamentação de facto

Os factos materiais relevantes para a decisão da causa são os que resultam do Relatório supra.

4. Apreciação do Recurso

A questão a decidir já foi objecto de algumas decisões judiciais, designadamente:

- do Acórdão desta Relação de Guimarães de 6 de Dezembro de 2018, proferido no processo n.º 399/16.7T8BGC.G1 (disponível em www.dgsi.pt);
- do Acórdão desta Relação de Guimarães de 7 de Fevereiro de 2019, proferido no processo n.º 1223/16.6T8BGC.G1;
- do Acórdão desta Relação de Guimarães de 21 de Fevereiro de 2019, proferido no processo n.º 142-18.6T8BGC.G1.

No presente recurso, semelhantemente ao apreciado nos sobreditos arestos, a Apelante defende que «[a] sentença recorrida ao condenar a Ré in casu no pagamento da quantia 202,39€ correspondentes aos proporcionais de férias e Natal pelos períodos de ITA e ITP, quando a indemnização pelas ITs já foram pagas com base na retribuição mensal x 14 meses, não pode manter-se, por fazer uma errada interpretação do disposto nos arts. 50º e 71º da LAT».

Porém, a Recorrente não tem qualquer razão.

Com efeito, estabelece o regime de reparação de acidentes de trabalho, aprovado pela Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro, no que agora releva:

Artigo 48.º
Prestações

1 - A indemnização por incapacidade temporária para o trabalho destina-se a compensar o sinistrado, durante um período de tempo limitado, pela perda ou redução da capacidade de trabalho ou de ganho resultante de acidente de trabalho.
(…)
3 - Se do acidente resultar redução na capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado, este tem direito às seguintes prestações:
(…)
d) Por incapacidade temporária absoluta - indemnização diária igual a 70 % da retribuição nos primeiros 12 meses e de 75 % no período subsequente;
e) Por incapacidade temporária parcial - indemnização diária igual a 70 % da redução sofrida na capacidade geral de ganho.
(…)
Artigo 50.º
Modo de fixação da incapacidade temporária e permanente
1 - A indemnização por incapacidade temporária é paga em relação a todos os dias, incluindo os de descanso e feriados, e começa a vencer-se no dia seguinte ao do acidente.
(…)
3 - Na incapacidade temporária superior a 30 dias é paga a parte proporcional correspondente aos subsídios de férias e de Natal, determinada em função da percentagem da prestação prevista nas alíneas d) e e) do n.º 3 do artigo 48.º
Artigo 71.º
Cálculo
1 - A indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente.
2 - Entende-se por retribuição mensal todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
3 - Entende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade.
(…)

Retornando ao caso dos autos, e como se expende no Acórdão da Relação de Lisboa de 18 de Maio de 2016, proferido no processo n.º 5076/15.3T8LSB.L1-4 (disponível em www.dgsi.pt), também citado nos arestos desta Relação acima indicados, “(…) atendendo a que no caso os períodos de incapacidade temporária são superiores a 30 dias, face ao preceituado no n.º 3 do artigo 50.º da LAT, deverá proceder-se ao cálculo da parte proporcional das incapacidades temporárias superiores a 30 dias correspondentes aos subsídios de férias e de Natal em função das percentagens das indemnizações devidas pelas incapacidades temporárias.

São pois os referidos preceitos legais que determinam que no cálculo da indemnização temporária a retribuição anual é o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias; e que nas indemnizações temporárias, quando superiores a 30 dias, acrescem valores correspondentes aos subsídios de férias e de Natal proporcionais ao tempo das incapacidades.

Não se considera assim correcto o entendimento da Recorrente quando sustenta que, no caso concreto, o cálculo autónomo dos subsídios de férias e de Natal determina o recebimento pelo sinistrado do valor em duplicado, pois é a própria lei que assim o determina, sendo certo que o valor da retribuição anual terá sempre em conta os referidos subsídios e que, constituindo a indemnização paga mensalmente uma percentagem da retribuição total, o pagamento do proporcional dos subsídios de férias e Natal daquela indemnização sucede apenas nas incapacidades temporárias superiores a 30 dias.

Na verdade, se o sinistrado não recebe a sua retribuição normal por força da sua incapacidade para o trabalho, ainda que temporária, e por isso também os proporcionais dos respectivos subsídios, pelo que não se pode concluir que os recebe em duplicado, como entende a Seguradora/recorrente. Com efeito, tal como resulta do artigo 48.º da LAT, a indemnização por incapacidade temporária para o trabalho destina-se a compensar o sinistrado, durante um período de tempo limitado, pela perda ou redução da capacidade de trabalho ou de ganho resultante do acidente.”

O disposto no n.º 3 do art. 50.º do regime de reparação de acidentes de trabalho, pela sua clareza, não admite outro sentido que não o adoptado na sentença recorrida e nos Acórdãos indicados, em face do estabelecido no art. 9.º do Código Civil, traduzindo-se a pretensão da Apelante numa interpretação revogatória ou ab-rogante que só é admissível quando se reconheça na norma “(…) uma ausência de sentido normativo, em razão de uma contradição insanável nos seus termos ou na sua relacionação com outro preceito (…) Trata-se pois de hipóteses em que não é possível alcançar qualquer sentido aplicativo útil para a norma. Tal conclusão consubstancia o resultado interpretativo e conduz ao reconhecimento de que a norma não encerra um critério normativo de solução, determinando-se pois a sua exclusão” (Comentário ao Código Civil: Parte Geral, coord. de Luís Carvalho Fernandes e José Brandão Proença, UCP, 2014, p. 50).

Ora, na situação em apreço, inexiste qualquer contradição insanável na aplicação simultânea das normas acima transcritas, pelo que fazer tábua rasa da existência com natureza imperativa do citado n.º 3 do art. 50.º, com o pretexto de se tratar de lapso do legislador (não demonstrado, uma vez que, além do mais, a substituição da referência a 15 dias, constante da lei anterior, pela actual referência a 30 dias, evidencia que houve deliberada ponderação na manutenção do preceito), equivaleria a uma inadmissível correcção da actividade daquele.
A opção do legislador, ao determinar que, em caso de incapacidade temporária superior a 30 dias, à indemnização diária calculada com base na retribuição anual acrescem valores a título de subsídios de férias e de Natal proporcionais, é tão legítima como a opção subjacente na lei anterior de não prever a consideração de qualquer valor a título de subsídios de férias e de Natal na indemnização por incapacidade temporária até 15 dias.

Em face do exposto, improcede necessariamente o recurso.

5. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar improcedente a apelação, e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela Apelante.
Guimarães, 21 de Fevereiro de 2019

Alda Martins
Eduardo Azevedo

Voto de Vencido:

Voto vencido nos termos do projeto de que se junta a parte relativa à apreciação de direito:
“Importa saber se no cálculo das indemnizações por incapacidades temporárias superiores a 30 dias, deve, além da consideração do vencimento anual (salário mensal x 14), considerar-se ainda mais dois subsídios de férias e de natal nos termos do artigo 50º, 3 da LAT.
Entendemos que não.
A interpretação que se seguiu conduz em nosso entender a resultado que não pode ser sufragado.
Tendo em conta o anterior regime, onde constava norma em tudo idêntica, o nº 3 do 43º do DL n.º 143/99, de 30 de Abril que regulamentou a L. 100/97, julgamos não ter não ter estado na mente do legislador a alteração do modo de cálculo das prestações devidas por incapacidades temporárias. Daí a idêntica previsão nestas normas.
Contudo o atual artigo 71º não acompanhou o artigo 26º, 1 da L. 100/97.
O Projecto de Lei n.º 786/X/4ª, Separata do DAR, n.º 104, de 30-05-2009, na exposição de motivos dá nota de que “ A regulamentação específica que se propõe não visa romper com o regime jurídico estabelecido quer pela Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, quer pelo Decreto-lei n.º 248/99, de 2 de Julho, quer mesmo pelas disposições normativas constantes no anterior Código do Trabalho entretanto revogadas, mas sim proceder a uma sistematização das matérias que o integram, organizando-o de forma mais inteligível e acessível, e corrigir os normativos que se revelaram desajustados na sua aplicação prática, quer do ponto de vista social, quer do ponto de vista constitucional e legal, como é exemplo o caso da remição obrigatória de pensão por incapacidade parcial permanente.”
Mais adiante dá nota das alterações não se referenciando em nenhum dos itens os critérios de cálculo das incapacidades temporárias, ainda mais no sentido de adicionar não dois subsídios mas quatro.
O resultado da interpretação seguida é que as indemnizações por incapacidades temporárias após 30 dias, passa a ser calculada com base num salário irreal, ou seja, passa a ser calculado com base no salário anual, já incluídos subsídios de férias e de natal, acrescido de mais dois subsídios (mais um de férias e um de natal), em desconformidade com a realidade e sem que resulte da LAT qualquer fundamento aceitável para tal facto.
Se o legislador tivesse pretendido majorar a indemnização tê-lo-ia feito no artigo 48º da LAT, o local próprio para o efeito, onde o faz no nº 3, al. d) relativamente à incapacidade temporária absoluta superior a 12 meses.
Sendo que tal consideração (de mais dois subsídios fictícios) implica violação das normas relativas à responsabilidade - pelo salário real, tomando como referência um salário não transferido – veja-se a apólice uniforme - artigo 10º:
Retribuição segura
1. A determinação da retribuição segura, ou seja, do valor na base do qual são calculadas as responsabilidades cobertas por esta apólice, é sempre da responsabilidade do tomador de seguro, e deverá corresponder, tanto na data de celebração do contrato como em qualquer momento da sua vigência, a tudo o que a lei considera como elemento integrante da retribuição, incluindo o equivalente ao valor da alimentação e da habitação, quando a pessoa segura a estas tiver direito, bem como outras prestações em espécie ou dinheiro que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar a pessoa segura por custos aleatórios, e ainda os subsídios de férias e de Natal.
O legislador, na norma em apreço, nº 3 do artigo 50º da LAT, não expressou devidamente o seu pensamento.
A questão surge porque na lei anterior se referia no artigo 26º da lei 100/97 (atual 71), que " as indemnizações por incapacidade temporária absoluta ou parcial serão calculadas com base na retribuição diária, ou na 30.ª parte da retribuição mensal ilíquida, auferida à data do acidente, quando esta represente retribuição normalmente recebida pelo sinistrado."
A nova lei não contém norma idêntica, referindo que a indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente.
E entende-se por retribuição anual, conforme nº 3 do artigo 71º, o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de natal e de férias, e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com caráter de regularidade.
Noutro passo o atual legislador fez constar do artigo 50ª:
Modo de fixação da incapacidade temporária e permanente
1 - A indemnização por incapacidade temporária é paga em relação a todos os dias, incluindo os de descanso e feriados, e começa a vencer-se no dia seguinte ao do acidente.
2 - A pensão por incapacidade permanente é fixada em montante anual e começa a vencer-se no dia seguinte ao da alta do sinistrado. 3 - Na incapacidade temporária superior a 30 dias é paga a parte proporcional correspondente aos subsídios de férias e de Natal, determinada em função da percentagem da prestação prevista nas alíneas d) e e) do n.º 3 do artigo 48.º
Norma idêntica à do artigo 43º do D.L. 143/99, que tinha a seguinte redação:
Modo de fixação das pensões por incapacidade e indemnizações
1 - As pensões respeitantes a incapacidade permanente são fixadas em montante anual.
2 - As indemnizações por incapacidades temporárias são pagas em relação a todos os dias, incluindo os de descanso e feriados.
3 - Nas incapacidades temporárias superiores a 15 dias é paga a parte proporcional correspondente aos subsídios de férias e de Natal, determinada em função da percentagem da prestação prevista nas alíneas e) e f) do n.º 1 do artigo 17.º da lei.
Ao alterar o modo de fixação da indemnização pelo primeiro período de incapacidade temporária (agora 30 dias), passando a considerar-se o salário anual, que inclui os subsídios de férias e natal, o nº 3 do normativo queda sem sentido, já que o correspondente aos subsídios se encontra já coberto.
Atente-se em que o nº 3 do artigo 50, está em contradição quer com o artigo 71º da LAT quer com o artigo 10º da apólice uniforme. ´
Ora, o que seja a “retribuição atendível” para efeitos de cálculos indemnizatórios por danos decorrentes de sinistros laborais, encontra-se regulado no artigo 71º, onde se refere que a indemnização é calculada com base na retribuição anual, e tal como a define no seu nº 2.
Está regra é postergada pela aplicação do nº 3 do artigo 50º.
Será caso de interpretação abrogativa do citado nº 3, já que contraria o princípio da correspondência entre dano e a indemnização, no que tange ao salário a atender, contradizendo ainda como vimos o disposto no artigo 71º, da mesma LAT, que tange ao mesmo assunto (salário a atender).
Assim aquele nº 3, mantido ao que julgamos por lapso, dado o modelo anterior, não pode ser entendido como pretendendo regular a matéria objeto de regulamentação no artigo 71º, e contradizendo este, deve ser objeto de interpretação abrogativa.
E não se diga que se pretende estabelecer um modo de pagamento, similar ao que ocorre nas incapacidades permanentes (catorze vezes ao ano). É que o modo de pagamento consta do artigo 72º, e como parece manifesto não se pretendeu neste normativo majorar as indemnizações. Assim é que as pensões embora pagas catorze vezes ao ano, o são fruto da divisão da pensão anual por catorze. O facto de o pagamento ocorrer 14 vezes ao ano não altera o valor da indemnização, são catorze como podiam ser doze, mais ou menos, o valor é fixado anualmente de acordo com o salário que resulta do artigo 72º.
Sendo o pagamento das temporárias ao mês, a questão do pagamento de subsídios não se coloca, já que recebe o valor por inteiro (calculado com base no salário anual onde já estão incluídos os subsídios).
A pretender-se que nas temporárias receba também subsídios por ocasião destes, teria a lei então que determinar um modo de pagamento semelhante ao do artigo 72º para as incapacidades permanentes, seja, um pagamento ao mês de acordo com a fórmula; Valor mensal:14X12, pagando-se o valor resultante 14 vezes ao ano. Mas não foi essa a intenção, daí não se prever no artigo 72º tal tipo de pagamento para as temporárias.
Não pode é interpretar-se a lei de forma a ocorrer uma duplicação de indemnização, no caso duplicando os subsídios de férias e de natal.
E não se refira, reportando-se à suspensão do contrato nos termos do artigo 296º do CT, que “nestes casos os sinistrados apenas têm direito ao subsídio de Natal proporcional ao tempo de serviço prestado (arts 263º-2 al.c) do CT), o que corresponde a uma perda ou redução da sua capacidade de ganho devido ao acidente. Redução da sua capacidade de ganho que decorre também do facto do sinistrado não receber a sua retribuição normal por força da sua incapacidade de trabalho” – ver contra alegações.
As normas de acidente de trabalho não visam regular os efeitos de eventual suspensão do contrato, e seria forma muito ínvia e deficiente (basta fazer as contas), de compensar qualquer perda a esse nível, quando o legislador o poderia fazer aumentado as percentagens do artigo 48º. Por outro, não vemos como pode falar-se em perda desses subsídios se o respectivo valor é considerado no cálculo. Questão diversa é o dos montantes indemnizatórios que resultam da aplicação das percentagens constantes do artigo 48º. A opção legislativa foi no sentido de limitar os montantes indemnizatórios, a que não foi alheio o facto de se tratar de responsabilidade pelo risco (…)”

Antero Veiga