Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6432/06.3TBGMR-D.G1
Nº Convencional: JTRG000
Relator: PEREIRA DA ROCHA
Descritores: EXECUÇÃO
OPOSIÇÃO
SENTENÇA
ESTADO-MEMBRO DA UNIÃO EUROPEIA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/18/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Sumário: As questões suscitadas pela Apelante, na por ela denominada oposição superveniente, estão já resolvidas pelas decisões judiciais alemãs definitivas exequendas, o que constitui excepção dilatória obstativa do seu conhecimento e, por conseguinte, obstativa da modificação das obrigações fixadas por aquelas decisões, o que implica a manifesta improcedência da oposição, por esta visar a modificação daquelas obrigações.
Decisão Texto Integral: Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório
Nestes autos de recurso de apelação, é recorrente, A… e é recorrida, B….
O recurso vem interposto do despacho proferido, em 15/05/2009, pelo Juízo de Execução do Tribunal Judicial de Guimarães, na oposição superveniente deduzida pela Recorrente à acção executiva comum n.º 6432/06.3TBGMR contra ela instaurada pela Recorrida, que decidiu indeferir, liminarmente, aquela oposição superveniente e condenou a Opoente nas respectivas custas.
O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
A Apelante sintetizou as alegações nas subsequentes conclusões:
1ª - A decisão em crise não se mostra minimamente clara, evidente ou fundamentada, violando o disposto na a. b) do n.º 1 do art. 668°, quer no plano da fundamentação fáctica, quer do direito, porquanto:
a) dela não se retira o fundamento ou a base legal do decidido, isto porque do decisório não constam as regras de direito em que a decisão assenta, afigurando-se à recorrente que a mesma resulta de uma mera convicção do julgador sem fundamento na lei;
b) não esclarece as razões de facto e de direito de se considerar não existir uma obrigação legal da Exequente em aceitar a interpelação da entrega do fio efectuada quando se encontra pendente um recurso de revista sobre as decisões das Instâncias que incidiram sobre a oposição que a Opoente deduzira à execução.
c) não esclarece qual a correlação existente entre o cumprimento da obrigação da exequente, para o qual foi interpelada, e o cumprimento da obrigação da executada, para o qual foi interpelada judicialmente por via da execução, e porque motivo, circunstâncias ou disposições legais tal correlação impede, ou toma inexigível, o cumprimento daquela na pendência desta.
2ª - A decisão recorrida padece igualmente de nulidade em virtude dos seus fundamentos estarem em oposição com a decisão (aI. c) do n.º 1 do art. 668º do Código de Processo Civil), porquanto apesar de apontar, enunciar e dar por verificados todos os factos que constituem os pressupostos de que depende a aplicação da aI. g) do art. 814º do Código de Processo Civil, surpreendentemente, julga em sentido contrário.
3ª - O entendimento sufragado pelo Tribunal recorrido quanto à não verificação da superveniência dos factos alegados pela recorrente na sua oposição não tem qualquer base legal e não resulta minimamente das disposições legais citadas na sentença.
4ª - Da conjugação das disposições dos arts. 813º e 814º do Código de Processo Civil emerge que quaisquer factos extintivos ou modificativos da obrigação exequenda ocorridos depois do encerramento da discussão podem servir de fundamento à oposição à execução e, por isso, devem ser tomados em consideração pelo Tribunal da execução.
5ª - Da conjugação do disposto nos arts. 813º n.º 3 e al.g) do art. 814º do Código de Processo Civil resulta que, para que a oposição superveniente seja admissível, o facto extintivo ou modificativo da obrigação há-de ser posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e superveniente em relação ao já decorrido prazo de 20 dias concedido para a oposição à execução, quer esta tenha ou não sido deduzida.
6ª - Considerando que a obrigação de entrega da mercadoria por parte da exequente, inserta na sentença apresentada à execução, é uma obrigação pura, o credor (aqui recorrente) tem o direito de exigir a todo o tempo o seu cumprimento (art. 777º n.º 1 do Código Civil), designadamente durante a pendência da oposição à execução deduzida anteriormente.
7ª - Considerando que a exequente vem retardando ilicitamente a prestação da sua obrigação, obrigação essa certa, exigível e líquida, constituiu-se em mora.
8ª - Os factos alegados pela recorrente na sua oposição superveniente, tendentes à verificação e declaração da mora da exequente na entrega da mercadoria e modificação do esquema do cumprimento da obrigação exequenda constituem fundamento de oposição à execução já que consubstancia um facto modificativo de obrigações (cfr. art. 814º aI. g) do Código de Processo Civil) posterior ao encerramento da discussão, e que (mesmo art. 814º aI. e) do Código de Processo Civil) conduz à "inexigibilidade (...) da obrigação exequenda".
9ª - Tendo em conta que tais factos, que servem de fundamento à dedução da oposição superveniente, ocorreram depois do encerramento da discussão no processo de declaração e são supervenientes em relação ao já decorrido prazo de 20 dias concedido para a oposição à execução, a oposição deduzida tem de ser recebida.
10ª - O encerramento da discussão a que se alude na aI. g) do art. 814º do Código de Processo Civil corresponde ao encerramento da discussão no processo declarativo que conduziu à prolação da sentença executada, sendo este coincidente com o encerramento da discussão do aspecto jurídico da causa a que alude o art. 657º do Código de Processo Civil, e tal encerramento da discussão não é confundível com a pendência de oposição à execução deduzida anteriormente, não obstante se tratar de um enxerto declarativo no processo de execução.
11ª - Ainda que assim não fosse, encontrando-se a oposição à execução anteriormente deduzida pela recorrente actualmente em fase de recurso, significando isso que também neste enxerto declarativo a fase de discussão já encerrou, pode a executada arguir, por via de oposição superveniente, quaisquer excepções ocorridas em momento posterior a tal encerramento da fase de discussão.
12ª - Pode a executada impugnar o pedido exequendo formulado pela Exequente com fundamento em factos supervenientes, não se considerando precludidos os seus meios de defesa, porquanto o fundamento da oposição deduzida anteriormente é totalmente diverso do fundamento da oposição superveniente ora deduzida e os factos ora alegados constituem novos factos modificativos da obrigação exequenda. Entendimento contrário violaria o princípio constitucional do acesso ao direito e à justiça (cfr. art. 20º da CRP).
13ª - A oposição superveniente deduzida pela recorrente não é manifestamente improcedente e o entendimento sufragado pelo Tribunal recorrido é contrário à lei e aos mais elementares princípios do processo civil, designadamente da economia processual.
14ª - Sendo a obrigação da parte contrária uma obrigação pura ela é exigível a todo o tempo, estando, por isso, a exequente obrigada a aceitar a interpelação da executada, independentemente se encontrar pendente oposição à execução anteriormente deduzida.
15ª - O conceito de manifesta improcedência enquadra-se na situação de evidência e nitidez da inexistência do direito de que se arroga o autor.
16ª - À executada assiste-lhe o direito de receber da exequente a mercadoria referida na sentença executada, direito que se mostra evidentemente fundado na lei, razão pela qual a oposição deduzida não se enquadra no conceito da manifesta improcedência.
- A decisão em crise viola as disposições conjugadas dos arts. 20° da Constituição da República Portuguesa, arts. 777° n.º 1 do Código Civil e arts. 657°, 663°, 668° n.º 1 aI. b) e c), 813° e 814° do Código de Processo Civil.
Termos em que, na procedência do recurso, deve revogar-se a sentença recorrida, e substituir-se por outra que admita a oposição superveniente deduzida à execução.
A Apelada contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
Por despacho de 22/06/2009, a 1.ª Instância considerou que a decisão recorrida não enfermava da arguida nulidade, por especificar os fundamentos de facto e de direito que a justificam, não ter os seus fundamentos em oposição com a decisão, não enfermar de omissão e/ou de excesso de pronúncia, não se tratar de decisão condenatória, não tendo por isso violado os limites estatuídos pelo n.º 1 do art.º 661.º do CPC.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
Considerando serem as conclusões do recorrente que fixam e delimitam o objecto do recurso, as questões a decidir consistem, em síntese, em saber
- se o despacho recorrido enferma de nulidade;
- se são supervenientes os factos alegados na petição da nova oposição à execução e susceptíveis de modificar a obrigação exequenda e se diverso entendimento viola o princípio constitucional de acesso ao direito e à justiça vertido no art. 20.º da CRP.
II - Fundamentação
A) - Para decisão do recurso consideramos relevante a subsequente factualidade extraída do processo:
1) - No apenso A, em que a Exequente requereu fossem declaradas executórias contra a Executada, no nosso País, a sentença do Tribunal Estadual de Munster, de 22 de Dezembro de 2004, a sentença do Tribunal Superior de Hamm, de 20 de Setembro de 2005 e o despacho de fixação de custas e despesas do processo de 02 de Novembro de 2005, foi proferida, em 06.02.06, a sentença de fls.56 e 57, reformulada de fls.60 a 62 verso desse Apenso, transitada em julgado, após ter sido confirmada pelos Tribunal da Relação de Guimarães e pelo STJ, que declarou a executoriedade na ordem jurídica Portuguesa daquelas sentenças e daquele despacho proferidos por Tribunais alemães;
2) - Consta da referida sentença de 22/12/2004:
«Condenar a Ré a pagar à Autora €106.204,80 (cento e seis mil duzentos e quatro Euros e oitenta cêntimos) mais juros sobre o mesmo montante a partir de 21 de Maio de 2004 e a uma taxa 8 pontos percentuais acima da taxa base, contra a entrega simultânea de 28 paletes com o peso líquido de 14.352 kg de fio Ne 70/3-100% "Indian longstapte cotton twist rawwhite, warp" (algodão indiano branco cru entrançado. teia);
Declarar que a Ré se constituiu em mora na aceitação da entrega da mercadoria supra desde 25 de Fevereiro de 2004;
Condenar ainda a Ré a pagar à Autora € 615,99 (seiscentos e quinze Euros e noventa e nove cêntimos) mais juros sobre esta quantia 8 pontos percentuais acima da taxa base desde 10/9/2004;
Condenar a Ré ao pagamento das custas e despesas do processo;
A sentença é provisoriamente executória contra prestação de garantia no valor de €115 000,00».
3) - Da fundamentação da referida sentença de 22/12/2004 consta:
A necessidade da declaração, requerida nos termos do 20 pedido da Autora, de constituição da Ré em mora na aceitação da entrega, resultante do facto de tal declaração facilitar a execução em caso de condenação a prestações e contraprestações simultâneas (art° 7560 § f do CPC alemão).
4) - Consta da referida sentença de 20/9/2005:
«Entendeu ser de justiça:
Negar provimento ao recurso de apelação interposto pela Ré contra a Sentença de 22/12/2004 do 10 Juízo de Assuntos Comerciais do Tribunal Estadual de Munster;
Condenar a Ré ao pagamento das custas e despesas do recurso;
Declarar a decisão provisoriamente executória;
A Ré pode evitar a execução através da prestação de garantia no valor de 110% do valor a executar com base na decisão, salvo se a Autora antes da execução prestar garantia no valor de 110% do montante a executar na altura».
5) - Nos autos principais, a que a primeira oposição à execução está apensa, a Exequente deu à execução as referidas sentenças e despacho de fixação de custas, formulando o pedido exequendo de €145.631,69, acrescido dos juros vincendos.
6) - A primeira oposição à execução, deduzida pela ora Apelante, invocando a inexigibilidade da obrigação exequenda por a Exequente não ter demonstrado que entregou ou que ofereceu a entrega da mercadoria descrita nas sentenças exequendas e que estas condenaram o Opoente a pagar à Exequente a quantia exequenda contra a entrega simultânea daquela mercadoria e pedindo a condenação da Exequente a pagar-lhe a indemnização de €50.000,00 e, subsidiariamente, a condenação da Exequente como litigante de má-fé, com a indemnização à Opoente de €50.000,00, foi julgada improcedente quanto à invocada causa de inexigibilidade da prestação exequenda e prejudicada quanto ao demais pedido na oposição à execução, por acórdão do STJ de 25/06/2009.
7) – Da fundamentação deste Acórdão do STJ, destacamos:
«Ora, verificando-se das sentenças exequendas que, da parte da executada, há uma situação de mora na aceitação da entrega da mercadoria de que depende o sinalagma por ela própria invocado (entrega da mercadoria em simultâneo com o pagamento desta), esta situação de mora impede a executada de, de novo, poder fazer tal exigência, retendo o pagamento.
A entrega da mercadoria já foi tentada fazer pela exequente à executada, conforme resulta daquelas sentenças, concluindo-se que compete à executada, cuja aceitação está em mora, desde 2004, pelo contrário, antes, apresentando o pagamento, diligenciar pela recepção (porventura, levantamento) - como à frente se verá - da mercadoria».
8) – Na oposição superveniente em apreço, a ora Apelante invocou, essencialmente:
Em 9 de Fevereiro de 2009, enviou à Exequente uma carta interpelando-a para, no prazo de 30 dias, proceder à entrega do fio vendido, uma vez que o pagamento do seu preço já se encontra garantido no processo por garantia bancária;
A Exequente respondeu-lhe, por carta de 2 de Março de 2009, afirmando que a entrega da mercadoria estava dependente do pagamento do preço da mesma, dos juros de mora fixados na sentença alemã calculados até à data em que for feito o pagamento da mercadoria, das despesas de armazenagem em Portugal, parte já compreendida na sentença alemã, da totalidade das custas fixadas pelo Tribunal Alemão, incluindo honorários de Advogado;
Em virtude de julgar ilegais as exigências da Exequente, a Executada respondeu-lhe por carta de 26 de Março de 2009;
A esta carta respondeu-lhe a Exequente, por carta de 8 de Abril de 2009, mais uma vez fazendo depender a entrega da mercadoria do pagamento de valores em que a Executada alegadamente foi condenada pelas sentenças alemãs;
Assim, como diligenciou pelo recebimento da mercadoria contra o seu pagamento, enviando à Exequente duas cartas para esse efeito, pôs termo à sua mora, considerando que a imposição da Exequente em receber todas as supra referidas quantias é ilegítima por das mesmas tal entrega não depender, sendo a Exequente quem agora se constituiu em mora na entrega da mercadoria.
Concluiu pedindo a condenação da Exequente a:
a) - Reconhecer a cessação da mora da Executada ou Opoente;
b) - Reconhecer que ela própria se constituiu em mora na entrega da mercadoria descrita no decisório da sentença que serve de título à presente execução;
c) – Declarada a execução extinta por a obrigação exequenda ser inexigível.
9) – Em pedido de aclaração do referido Acórdão do STJ, a ora Apelante invocou, expressamente, a referida oposição superveniente, cuja cópia a 1.ª Instância já lhe enviara, tendo o STJ exarado, no acórdão de aclaração, que, se por um lado, a oposição superveniente não constituía, em si, objecto do decidido recurso, por outro lado, era possível concluir tratar-se, no essencial, de matéria igual (por repetição) à já discutida e decidida naquele Acórdão, o qual lhe dava cabal resposta.
10) – O despacho recorrido indeferiu, liminarmente, a oposição superveniente, essencialmente, por:
- quanto à invocada inexigibilidade da obrigação exequenda, tratava-se de questão já decidida negativamente no saneador sentença proferido na primeira oposição à execução deduzida pela ora Apelante, confirmada por acórdão da Relação de Guimarães, de que fora interposto recurso de revista para o STJ, ainda pendente;
- a Opoente podia ter exigido à Exequente a entrega do fio contra o pagamento do preço, logo que as sentenças exequendas transitaram em julgado e logo que as mesmas foram julgadas exequíveis na ordem jurídica portuguesa;
- como não estava definitivamente decidida a anterior oposição sobre a exigibilidade da obrigação exequenda não era exigível à Exequente a interpelação que lhe foi feita pela ora Apelante para lhe entregar a mercadoria;
- a questão suscitada pela Opoente respeita à fase do cumprimento da obrigação exequenda, e não à sua exigibilidade, e que a sede própria para impugnar o pedido exequendo seria a oposição à execução já deduzida e em fase de recurso, daí que se hajam precludido todos os meios de defesa da Opoente;
- a oposição superveniente deduzida não cabia na previsão da alínea g) do art.º 814.º do CPC por a fase processual sobre o mérito da obrigação exequenda haver há muito decorrido nos Tribunais alemães, estando agora na fase do seu cumprimento coercivo.
B) – Análise e solução das questões
A Apelante arguiu a nulidade do despacho recorrido, por não estar fundamentado de facto e de direito, por não esclarecer as razões de facto e de direito para a Exequente não ter a obrigação legal de aceitar a interpelação da entrega do fio por estar pendente de recurso a decisão sobre a anterior oposição, por não esclarecer a correlação existente entre o cumprimento da obrigação da exequente, para o qual foi interpelada, e o cumprimento da obrigação exequenda, nem esclarecer o motivo da inexigibilidade daquela obrigação da Exequente na pendência da obrigação exequenda, e por os fundamentos estarem em oposição com a decisão.
Afigura-se-nos não lhe assistir razão.
Na verdade, a fundamentação de facto do despacho recorrido é a síntese do alegado na petição da oposição superveniente, síntese essa que a Apelante não questionou.
E a fundamentação de direito é o entendimento de que o alegado na petição da oposição superveniente não era subsumível à previsão da alínea g) do art.º 814.º do CPC.
E os motivos exarados no despacho recorrido para não ser exigível à Exequente a aceitação da interpelação extra-judicial que a ora Apelante lhe fez, na pendência do recurso interposto da decisão proferida na primitiva oposição à execução, e para não haver correlação entre o cumprimento da obrigação exequenda e o cumprimento daquela obrigação para que fora interpelada, são a existência de decisões judiciais sobre essas questões, nomeadamente de tribunais alemães, já transitadas em julgado e em fase executiva, e a existência de decisões de tribunais portugueses, embora sob recurso, tratando-se, pois, de “res judicata” e, por conseguinte, insusceptível de ser modificado por aquela interpelação, donde a não oposição entre os fundamentos e a decisão proferida pelo despacho recorrido e a manifesta improcedência da oposição superveniente deduzida.
Donde entendermos não enfermar o despacho recorrido das arguidas nulidades.
A interpelação da Apelante, feita à Apelada, por carta de 9 de Fevereiro de 2009, para, no prazo de 30 dias, lhe entregar a mercadoria (fio) contra o pagamento do respectivo preço, já garantido na primitiva oposição por garantia bancária, e as subsequentes respostas, embora sejam naturalmente factos novos, por haverem ocorrido posteriormente ao encerramento da discussão no processo de declaração da obrigação exequenda, que correu seus termos em tribunais alemães, e por haverem ocorrido posteriormente à decisão proferida pela 1.ª Instância na primeira oposição à execução deduzida pela ora Apelante, tais factos naturalmente novos são, no entanto, juridicamente velhos e irrelevantes para modificar ou alterar a obrigação exequenda, bem como para alterar ou modificar a eventual obrigação da Exequente para com a Executada, a qual não está em execução neste processo, donde a afirmação da eventualidade da sua existência acabada de fazer.
E os referidos factos são, juridicamente, velhos e irrelevantes, porquanto o facto entrega/recebimento da mercadoria (fio), em cumprimento do contrato celebrado entre a Apelante e a Apelada e, parcialmente, em execução no processo principal, de que este é apenso, já ocorreu, segundo as decisões alemãs exequendas, em 25 de Fevereiro de 2004, e a ora Apelante declarada em mora, desde então, quanto ao recebimento da mercadoria.
Está vedado aos tribunais portugueses rever o mérito das decisões alemãs exequendas, já declaradas exequíveis na ordem jurídica portuguesa, por decisão transitada em julgado (cfr. art.º 36.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho da União Europeia de 22 de Dezembro de 2000).
As referidas decisões alemãs também decidiram, definitivamente, que as prestações nela estipuladas a favor da Exequente e a cargo da Executada não estavam condicionadas ou dependentes das prestações nela estipuladas a favor da Executada e a cargo da Exequente, podendo, pois, esta exigir, coercivamente, as prestações a que lhe foi reconhecido ter direito sem cumprimento, prévio ou simultâneo, das prestações a que está vinculada para com a Executada.
Desfeita, assim, definitivamente, pelas decisões alemãs exequendas, a interdependência entre a obrigação de entregar a mercadoria e a obrigação de pagar o respectivo preço, carece de direito a interpelação da Executada, feita extra-judicialmente em 09/02/2009, para reatar aquela interdependência e cumprimento simultâneo.
O acabado de afirmar está, claramente, explicitado no acórdão do STJ de 25/06/2009, acima referido.
Acresce estar implícito no conceito de superveniência objectiva a ocorrência do respectivo facto independentemente da vontade da parte que o invoca, o que não ocorre com o facto em que a Apelante funda a oposição superveniente.
Em síntese, as questões suscitadas pela Apelante, na por ela denominada oposição superveniente, estão já resolvidas pelas decisões judiciais alemãs definitivas exequendas, o que constitui excepção dilatória obstativa do seu conhecimento e, por conseguinte, obstativa da modificação das obrigações fixadas por aquelas decisões, o que implica a manifesta improcedência da oposição, por esta visar a modificação daquelas obrigações (cfr. art.ºs 493.º, n.º 2, 817.º, n.º 1, alíneas b) e c), do CPC e art.º 36.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho da União Europeia de 22 de Dezembro de 2000).
Este processo mostra ter sido garantido à Apelante o direito de aceder aos tribunais para defender o seu alegado direito, mediante a dedução da oposição superveniente à execução da obrigação exequenda, acontecendo, porém, pelos fundamentos acima expostos, ser manifestamente improcedente a tutela judiciária por ela pretendida na deduzida oposição superveniente.
Foi, pois, reconhecido à Apelante o direito de acesso ao Tribunal para defesa do seu alegado direito de oposição superveniente à acção executiva, mas, depois, foi-lhe, judicialmente, negado, por manifesta improcedência, o direito subjectivo de que se arrogava à modificação ou à alteração da obrigação exequenda, improcedendo, assim, a invocada violação do art.º 20.º da CRP.
III – Decisão
Pelo exposto julgamos improcedente a apelação e, consequentemente, mantemos o despacho recorrido.
Custas pela Apelante.
Guimarães, 18 de Maio de 2010.
Pereira da Rocha
Henrique Andrade
Gouveia Barros