Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
| ||
Relator: | FRANCISCA MICAELA MOTA VIEIRA | ||
Descritores: | INCUMPRIMENTO DO REGIME DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES MAIORIDADE LEGITIMIDADE ACTIVA | ||
Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 10/15/2015 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO CÍVEL | ||
Sumário: | 1. O progenitor a quem foi confiada a guarda do filho não perde a legitimidade para continuar a exigir do outro, em incidente de incumprimento o pagamento das prestações alimentares vencidas e não pagas durante a menoridade do filho, após a maioridade deste. 2. As prestações vencidas durante a menoridade não se convertem em crédito próprio do filho após a maioridade deste, mantendo o progenitor a quem o menor ficou confiado legitimidade, em nome próprio ou em representação do filho, para as exigir do outro progenitor. 3. Esta é a solução que respeita, por um lado, o regime jurídico vigente (cf., nomeadamente, art.ºs 1905º e 1909º, do Código Civil; 181º da OTM e 989º do NCPC, correspondente ao art. 1412º, n.º 2, do Código de Processo Civil de 1961, e que, por outro lado, salvaguarda a ligação entre “a lei e a vida real”, conferindo aos normativos legais aplicáveis “um sentido mais justo e mais apropriado às exigências/interesses da vida”. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães: 1- Relatório S…, em representação das menores M… e A…, actualmente residentes na Travessa…, Barcelos, propôs o presente Incidente de Incumprimento de Regulação das Responsabilidades Parentais contra J…, residente na Rua…, Barcelos. Alegou, para tanto, que por decisão transitada em julgado proferida no processo nº 3702/2013 da Conservatória de Registo Civil de Barcelos, datada de 11/07/2013 foi decretado o divórcio por mútuo consentimento entre requerente e requerido, tendo sido homologado o acordo das responsabilidades parentais das menores M… e A…, filhas da requerente e requerido, nascidas, respetivamente em 28 de Janeiro de 2002 e 11 de Janeiro de 1996, mediante o qual, o pai se comprometeu a pagar a título de alimentos para cada menor a quantia de € 100,00 (cem euros), mediante depósito ou transferência bancária para a conta da requerente com o NIB… do Banco … a efetuar até ao 10 de cada mês. Mais alega estarem em dívida quantias a título de alimentos e termina, pedindo o pagamento da quantia de € 100,00 devida a título de alimentos à menor M… quer das prestações vincendas no valor global de € 1.490,00 quanto às duas menores requerendo que seja efetuado o desconto a efetuar pela entidade patronal do requerido que identifica. Por despacho proferido a 6 de Maio de 2015 o tribunal a quo absolveu o requerido da instância quanto às prestações alimentícias vencidas e não pagas à A…, que, entretanto atingiu a maioridade, com base na afirmada ilegitimidade ativa da requerente, recorrente nos presentes autos. A requerida interpôs recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação e com subida em separado – arts 644º, nº1, 645º, nº2 e 646º, nº1, do CPC e art. 185º, nº1, da OTM. Foram colhidos os vistos legais. Cumpre apreciar e decidir. A Exequente funda o recurso formulando as seguintes conclusões : I Questão Prévia: da Nulidade da Sentença 1 ° - Salvo melhor opinião, resulta da leitura da douta sentença que os fundamentos expostos na decisão estão em completa contradição com a decisão proferida, pois o tribunal " a quo" na decisão agora em crise menciona uma série de acórdãos que demonstram e atestam a legitimidade da recorrente para intentar a presente acção em nome da filha maior A…, pelo que, a conclusão lógica no presente silogismo e que seria vertida na decisão era a de considerar a recorrente parte legítima na presente acção. 2° - Mas tal não sucedeu, pois a Mma. Juiz "a quo" decidiu-se pela absolvição do recorrido por entender que a recorrente carece de legitimidade activa processual, pelo que, os fundamentos da decisão estão em clara oposição com a decisão. 3° - Se assim não se entender, somos forçados a concluir que a douta sentença é ambígua e a decisão ininteligível, por não se conseguir vislumbrar os argumentos que conduziram à absolvição do recorrido, pelo que, salvo melhor opinião, a douta sentença é nula, nos termos do artigo 615°, n. ° 1, aI. c) do C.P.C. II - O Recurso 4° - A recorrente não se conforma com a douta sentença proferida nos presentes autos, a qual considerou a recorrente parte ilegítima nos presentes autos, absolvendo o recorrido no que concerne às prestações alimentícias vencidas e não pagas à filha A…. 5° - O fundamento de recorribilidade do presente recurso versa sobre a questão da legitimidade ou ilegitimidade activa da recorrente para intentar os autos de acção de incumprimento das responsabilidades parentais em nome da menor A…. 6° - Nos presentes autos, recorrente pretendeu provar o incumprimento pelo requerido da sua obrigação de pagamento de valores atinentes a pensão de alimentos devidas a filha de ambos durante a menoridade desta. 7º - Na verdade, a recorrente durante a menoridade da filha A…, teve, pelo menos nos períodos de tempo alegados nos autos de 1ªa instância, de prover sozinha ao sustento e assistência desta, conforme alegou em sede da petição, sob o artigo 21 ° do referido articulado. 8°_ Pelo que, a recorrente tem legitimidade processual activa e interesse em agir em representação da filha A…, para a instauração contra o recorrido de acção de incumprimento. 9° - Indica-se ainda que, o recorrido não efectuou o pagamento da pensão de alimentos devida à A…, durante e só a sua menoridade, e assim esta não podia estar por si em juízo nos autos de 1ª instância, tendo em conta a causa de pedir e pedido aí formulados, pelo que, foi a recorrente, durante a menoridade da A…., que providenciou sozinha ao sustento desta, tendo ela assim legitimidade activa, interesse em agir e utilidade na procedência dos autos de 1 a instância, subrogando-se à sua filha. 10°- Não negamos que, a questão referente à legitimidade do progenitor com quem o menor residiu, para reclamar as prestações vencidas e não pagas durante a sua menoridade, quando ele já é maior, é uma questão não isenta de controvérsia. 11 ° - No entanto, sobre este assunto quer a doutrina, como a Jurisprudência são unânimes em considerar que a recorrente possui legitimidade activa processual para intentar a presente acção de incumprimento. 12° - Helena Gomes de Melo, João Raposo, Luís Carvalho, Manuel Bargado, Ana Leal e Felicidade Oliveira dizem-nos "que a legitimidade para reclamar as prestações vencidas na pendência da menoridade dos descendentes recai sobre o progenitor com quem o menor reside (ou progenitor guardião), mesmo após a maioridade do filho, pois as prestações vencidas na sua menoridade nao se convertem em crédito próprio deste. Assim, só o progenitor que não recebeu as prestações alimentares poderá executar o progenitor obrigado a alimentos para receber essas prestações ou prosseguir a lide já iniciada na menoridade e na qual não conseguiu obter pagamento até à maioridade do filho". - Helena Gomes de Melo, João Raposo, Luís Carvalho, Manuel Bargado, Ana Leal e Felicidade Oliveira in «Poder Paternal e Responsabilidades Parentais», Quid Juris, 2a edição, pago 96. 13° - No que concerne a nossa jurisprudência, para além dos acórdãos citados e reproduzidos em sede de alegações, salientamos o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 29-01-2015, que expressamente diz o seguinte: "I - Apesar de o filho comum ter entretanto atingido a maioridade, tem legitimidade activa para o incidente de incumprimento referente a prestações de alimentos vencidas durante a sua menoridade, o progenitor com aquele convivente - se o requerido não cumpriu o dever de contribuir para o sustento do filho será de presumir que foi a requerente quem custeou, na totalidade, as respectivas despesas, cabendo-lhe receber as quantias em dívida. II - Nas mesmas circunstâncias existe interesse em agir por parte da requerente. - cfr. Ac. da Relação de Lisboa, datado de 29-01-2015, in http://www.dgsi.pt/jtrl.processo 1717114:8TMLSB¬B.Ll-2 14° - No contexto assinalado e atentos os argumentos transcritos, afigura-se-nos não ser de negar, no caso concreto, legitimidade à recorrente para deduzir o presente incidente. 15° - O aqui recorrido, estava obrigado consoante acordo homologado por decisão transitada em julgado pela Conservadora do Registo Civil de Barcelos, a pagar as prestações mensais fixadas e destinadas aoo sustento e educação da filha comum que vivia com a aqui recorrente; sendo a filha, então, menor, o pagamento era feito à requerente. 16° - Ora, se o requerido não cumpriu o dever de contribuir para o sustento da filha - então menor - será de presumir que foi a recorrente quem custeou, na totalidade, as respectivas despesas, cabendo-lhe receber as quantias em dívida, a tal não obstando ter ocorrido, entretanto, a maioridade do filho. 17°- Assim sendo, a requerente tem legitimidade processual - interesse directo em demandar o requerido. 18° - Assim mal andou o Exmo. Senhor Juiz a quo em ter considerado que a recorrente carece de legitimidade activa nos presentes autos, tendo sido violadas as disposições legais constantes dos artigos art. 30° do C.P.C. e art. 592° C.C .. Pugna pela revogação da sentença recorrida, em conformidade com o atrás exposto, devendo-se considerar a recorrente parte legítima nos presentes autos no que concerne às prestações alimentícias da filha A…, tudo com as legais consequências devidas. Não foram apresentadas contra –alegações. Foram colhidos os vistos legais.. Atento o acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar e decidir, a alegada nulidade da decisão, por alegada contradição entre os fundamentos e a decisão, e decidir se a maioridade do filho retira ao progenitor a quem foi confiada a guarda a legitimidade para exigir o pagamento das prestações vencidas e não pagas durante a menoridade daquele fixadas no âmbito da regulação do poder paternal ( ou das responsabilidades parentais, segundo a designação adoptada pelolegislador / Lei nº 61/2008, de 31-10. II - O Direito. Quanto à alegada nulidade da decisão consubstanciada na alegada contradição dos fundamentos expostos na decisão com a decisão proferida diremos o seguinte. Dispõe o artigo 615º, nº1, alínea c) do CPC que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão . Compulsados os autos, nomeadamente as considerações e referências feitas no despacho recorrido a jurisprudência vária sobre a questão suscitada ( consubstanciada em saber se a maioridade do filho retira ao progenitor a quem foi confiada a guarda a legitimidade para exigir o pagamento das prestações vencidas e não pagas durante a menoridade daquele fixadas no âmbito da regulação do poder paternal) e a decisão, afigura-se-nos que o entendimento adoptado pelo Mmº Juiz a quo está contido no parágrafo que passamos a reproduzir : “Entendo, no seguimento do que foi defendido no Ac. ReI. Porto de 29.11.84, CJ 1984, 50, p. 255 que "a mãe a quem foi confiado um filho menor que, entretanto, atingiu a maioridade, tem legitimidade para exigir do pai as pensões que este se obrigou a pagar para alimentos desse filho, se as mesmas se venceram durante a menoridade". Mas isto no pressuposto de que a acção ou incidente já estão pendentes antes de atingir a maioridade”. Quanto às restantes considerações feitas na decisão a propósito de outros acórdãos, entendemos que as mesmas foram feitas apenas para ilustrar que o entendimento maioritário da jurisprudência era no sentido de conferir à mãe a quem foi confiado um filho menor que, entretanto, atingiu a maioridade, tem legitimidade para exigir do pai as pensões que este se obrigou a pagar para alimentos desse filho, se as mesmas se venceram durante a menoridade. Contudo, conforme refere a decisão recorrida o tribunal a quo entendeu que essa legitimidade da mãe estava restrita aos casos em que a ação ou incidente já estão pendentes antes de o menor atingir a maioridade. Destarte, afigura-se-nos não estar verificada a invocada nulidade da sentença. Urge, pois atentar na outra questão suscitada pelo presente recurso, sendo que, a factualidade a atender e que resulta dos autos é a seguinte: 1-Por decisão transitada em julgado proferida no processo nº3702/2013 da Conservatória de Registo Civil de Barcelos, datada de 11/07/2013, foi decretado o divórcio por mútuo consentimento entre requerente e requerido, tendo sido homologado o acordo das responsabilidades parentais das menores M… e A…, filhas da requerente e requerido, nascidas, respetivamente em 28 de Janeiro de 2002 e 11 de Janeiro de 1996, mediante o qual o pai se comprometeu a pagar a título de alimentos para cada menor a quantia de € 100,00 (cem euros) para cada menor, mediante depósito ou transferência bancária para a conta da requerente com o NIB… do Banco … a efetuar até ao dia 10 de cada mês. 2- No presente incidente a requerente alega estarem em dívida quantias a título de alimentos e termina, pedindo o pagamento da quantia de € 100,00 devida a título de alimentos à menor M… quer das prestações vincendas no valor global de € 1.490,00 quanto às duas menores requerendo que seja efectuado o desconto a efetuar pela entidade patronal do requerido que identifica. 3- Os presentes autos foram instaurados em 13 de Fevereiro de 2015 . 4 – A A… atingiu a maioridade em 11 de Janeiro de 2014, pelo que, , à data da instauração do presente incidente a A… já era maior . Sendo esta a factualidade a atender importa desde já referir que, não negamos ser objecto de controvérsia a questão colocada referente à legitimidade do progenitor com quem o menor residiu, para reclamar as prestações vencidas e não pagas durante a sua menoridade, quando ele já é maior. E desde logo as disposições legais a convocar estão contidas nos arts 1874º, 1877º, 1878º, nº1, e 1879º, todos do C. Civil. /CC. Como vimos, está em causa o valor das prestações de alimentos vencidas até à maioridade do filho, em cumprimento de acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais homologado por decisão do Conservador do Registo Civil Competente, relevando agora a verificação do incumprimento da obrigação de prestar alimentos a cargo do requerido- art.ºs 181º e 189º, da OTM e 1118º e 1412º, n.º 2, do CPC de 1961]. Porque uma das filhas da requerente, atingiu a maioridade, importa saber se a recorrente mantém a qualidade de credora, como tal figurando no título (a decisão que regulou o poder paternal e fixou a pensão alimentar) e se pode continuar a exigir o pagamento do crédito nos mesmos termos em que lhe era facultado durante a menoridade do filho. O dever de prestar alimentos aos filhos menores recai sobre ambos os pais que, em conjunto, estão onerados com a obrigação de contribuir para o sustento, manutenção e educação dos descendentes menores. Trata-se de uma manifestação do conteúdo do poder paternal (das responsabilidades parentais) a que estão sujeitos os filhos até à maioridade ou emancipação (art.ºs 1874º, 1877º, 1878º, n.º 1 e 1879º, do Código Civil/CC). Quando os pais do menor não convivam maritalmente, ou tenha cessado essa coabitação, o exercício das responsabilidades parentais deve ser regulado judicialmente, sendo que na constância do matrimónio, o exercício das responsabilidades parentais pertence a ambos os pais (art.ºs 1901º, n.º 1 e 1905º a 1909º, do CC, na redacção conferida pela Lei n.º 61/2008, de 31.10). Nas situações, como sucedeu no caso dos autos, em que os pais estão divorciados e não habitam na mesma casa, o Conservador do Registo Civil Competente homologa os acordos dos progenitores sobre o destino do filho, o regime de visitas do progenitor a quem não tenha sido confiado, os alimentos devidos ao filho e a forma de os prestar; e o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente (cf. art.ºs 1905º e 1906º, do CC, na redacção da Lei n.º 61/2008, e 174º e 180º, da OTM). Se, relativamente à situação do menor, um dos progenitores não cumprir o que tiver sido acordado ou decidido, pode o outro requerer ao tribunal as diligências necessárias para o cumprimento coercivo (art.º 181º, n.º 1, da OTM). O beneficiário da prestação alimentar é o menor, mas é o progenitor a quem foi confiado que goza da respectiva titularidade, agindo em substituição processual, parcial, representativa do menor. Age em nome próprio e, por isso, é parte processual.[8] Vide J. P. Remédio Marques, Algumas Notas Sobre Alimentos..., FDUC – Centro de Direito de Família, 2, págs. 297 e seguinte É ao progenitor com a guarda do menor (com quem ele reside habitualmente) que cabe a legitimidade para, em substituição processual do menor, pedir os alimentos, a sua alteração ou exigir o cumprimento coercivo da obrigação. Por conseguinte, se o progenitor condenado a entregar ao outro prestações a título de alimentos devidos ao filho menor não cumpre, este fica onerado e passa a custear despesas que obrigavam aquele (custeia os encargos com o sustento e a educação do filho na totalidade), despesas que só ele pode exigir do devedor, seja no exercício de um direito próprio, seja, quando assim se entenda, por via sub-rogatória (art.º 592º, n.º 1, do CC). Por isso, satisfeita unilateralmente a obrigação, compreende-se que só quem efectivamente a cumpriu possa exigir do co-obrigado os encargos a que esse cumprimento deu origem e lhe assista legitimidade para exigir a parte dos encargos que, na repartição efectuada, o outro obrigado deixou de lhe prestar. A recorrente será, por isso, a titular dos alimentos fixados ao filho enquanto menor, seu beneficiário, e, também por isso, será ela a titular do direito de continuar a exigir do progenitor as prestações que este lhe não entregou durante a menoridade do filho, nos termos fixados na decisão da Conservatória do Registo Civil que homologou os acordos dos progenitores quanto ao destino dos menores, alimentos e forma de os prestar. Numa outra perspectiva, posicionados no contexto da acção em geral, poder-se-á dizer que a recorrente tem “legitimidade” na medida em que tem interesse directo em demandar, atenta a utilidade que lhe advirá do prosseguimento da presente ação e com vista à verificação de uma situação de incumprimento por parte do requerido- (art.º 30º do NCPC), e, recolocados no âmbito do presente incidente, atento o alegado incumprimento por banda do pai e a correlativa contribuição acrescida, em idêntica medida, por parte da progenitora, esta não deixa de assumir a posição de credora - daí, também, a sua “legitimidade”. Por conseguinte, afigura-se-nos, no seguimento da jurisprudência maioritária que a recorrente poderá reclamar ou renunciar à exigência dessas prestações vencidas, sem as quais proporcionou ao menor as condições de vida que teve por convenientes ou possíveis, prestações que, salvo o devido respeito por opinião em contrário, dada a natureza da obrigação alimentar relativa a menor a expensas do progenitor, não se apresentam como convertíveis em crédito próprio do filho após a maioridade deste. – neste sentido, especialmente, o acórdão da Relação de Coimbra de 28-01-2014- processo nº89/90.1TBPMS-A.C1, aqui parcialmente reproduzido e o acórdão do STJ de 25.3.2010-processo 7957/1992.2.P1.S1. Ou seja, as prestações vencidas durante a menoridade não se convertem em crédito próprio do filho após a maioridade deste, mantendo o progenitor a quem o menor ficou confiado legitimidade, em nome próprio ou em representação do filho, para as exigir do outro progenitor. Esta solução respeita, por um lado, o regime jurídico vigente (cf., nomeadamente, art.ºs 1905º e 1909º, do Código Civil; 181º da OTM e 989º do NCPC, correspondente ao 1412º, n.º 2, do Código de Processo Civil de 1961, e, por outro lado, salvaguarda a ligação entre “a lei e a vida real”, conferindo aos normativos legais aplicáveis “um sentido mais justo e mais apropriado às exigências/interesses da vida”. Conclui-se, assim, que a recorrente tem legitimidade para instaurar o incidente de incumprimento de responsabilidades parentais, previsto no art. 181º, nº1, da OTM, relativamente às prestações de alimentos devidos até à maioridade da sua filha, A…, acolhendo-se, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso. III. Pelo exposto, os Juizes do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em revogar o despacho recorrido, reconhecendo-se a legitimidade da recorrente em demandar nos presentes autos de incidente de incumprimento das responsabilidades parentais no que concerne às prestações alimentícias da filha A… vencidas e não pagas até à maioridade desta última. Sem custas. Notifique e registe. Guimarães, 15-10-2015 Francisca Micaela da Mota Vieira Fernando Fernandes Freitas António Figueiredo de Almeida |