Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5319/17.9T8BRG.G
Relator: ROSÁLIA CUNHA
Descritores: PERDA DA COISA USUFRUÍDA
MAU USO DA COISA USUFRUÍDA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/23/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Só a perda total da coisa usufruída constitui causa de extinção do usufruto pois, se a perda for meramente parcial, continua o usufruto na parte restante, como decorre do disposto no art. 1478º, nº 1, do CC.
Tendo ocorrido um incêndio que destruiu apenas a casa de habitação, um anexo com 110 m 2 e 98 metros de muro, mantendo-se as demais edificações que compunham a Quinta, não ocorre a perda total nem a consequente extinção do usufruto com tal fundamento.

II – De acordo com o disposto no art. 1482º, nº 1, do CC, se o abuso, por parte do usufrutuário, se tornar consideravelmente prejudicial ao proprietário, pode este exigir que a coisa lhe seja entregue.

III – Para obter a entrega da coisa usufruída, com base na omissão por parte do usufrutuário de obras de reparação, é necessária a prova de que as reparações omitidas são de natureza ordinária ou, tratando-se de reparações extraordinárias, que as mesmas se tornaram necessárias em virtude de má administração do usufrutuário posto que só estas obras constituem encargo do usufrutuário.
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência na 1ª seção cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

RELATÓRIO

J. F., M. R., C. M. E G. M. intentaram a presente ação declarativa, sob a forma comum, contra F. L. pedindo que se condene o Réu a indemnizar os Autores:

1. pelos danos patrimoniais no montante total de €304.567,17 acrescidos de juros de mora até integral pagamento, pelos seguintes prejuízos:
a) € 35.237,17 referentes ao equipamento e material extraviado;
b) 47.960,00, referentes à cultura destruída e ao não cultivo do prédio;
c) €141.370,00, relativos aos edifícios demolidos, abandonados e mal conservados;
d) € 80.000,00 referentes à mina de água;
2. no valor que lhe foi pago pelas entidades publicitárias que procederam à edificação e fixação de publicidade a liquidar em sede de sentença;
3. pelos danos não patrimoniais no montante global de €10.000,00.

Mais peticionam que o Tribunal ordene:

4. a extinção do usufruto do Réu sob o prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., pela perda total do mesmo, ou, em alternativa,
5. a extinção do usufruto do Réu sob o prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., pelo não cultivo do mesmo por mais de 20 anos, ou, em alternativa,
6. a entrega do prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., aos Autores pelo mau uso no âmbito do art.º 1482,º do C.C.

Como fundamento dos seus pedidos alegaram, em síntese, que são proprietários da raiz ou nua propriedade do prédio urbano, atualmente inscrito na matriz sob o art. ... da freguesia de ..., Barcelos, com a área total de 6435m2, do qual o Réu é usufrutuário desde 06.01.1995.
Com efeito, M. H. e marido A. R., pais do Autor J. F., doaram-lhe em 13.03.1986 a si e à esposa, segunda Autora, metade da nua propriedade conhecida por Quinta ... constituída por casa com dois pavimentos, eirado, estábulo, garagens, adega, arrecadações e quintal, no lugar da ....
Nessa doação foi incluída uma cláusula fideicomissária a favor dos filhos dos donatários, terceiros e quartos autores. O casal M. H. e marido A. R., em 06.01.1995, vendeu metade da nua propriedade e o usufruto total dos prédios identificados que, no conjunto, formam a Quinta ..., ao réu F. L..
No âmbito da ação de divisão de coisa comum que correu termos sob n.º 3608/05.4TBBCL no Tribunal Judicial de Barcelos, 3º Juízo Cível, em 20.01.2014, a dita Quinta ... foi dividida em três partes: parcela C), que foi adjudicado aos Autores (fiduciários e fideicomissários); parcela A), que foi adjudicada ao Réu e a parcela B), considerada indivisível, foi vendida através de propostas em carta fechada ao Réu, tendo o preço de venda sido dividido em partes iguais entre os Autores.
O prédio dos Autores, em 06.01.1995, era composto por edifícios, materiais e culturas com o valor de, pelo menos, €292.127,17, que o Réu destruiu, dissipou e não cultivou.
As edificações, encontravam-se à data (06.01.1995), em bom estado de conservação e valiam pelo menos €200,000,00.
Desde tempos imemoriais que se cultivavam na dita Quinta ... diversas culturas, com o intuito de as vender. O prédio gerava €12.440,00 de frutos anuais e deixou de produzir pelo não cultivo e destruição do prédio pelo Réu.
O prédio dos autores, em 06.01.1995, no seu conjunto de edificações, bens móveis e cultura existente valia, pelo menos, € 292.127,17.
Sucede que o réu impediu e ameaçou os Autores de entrar no prédio no período compreendido entre 06.01.995 e setembro de 2017. Até outubro de 2017 apenas conheciam o estado do seu prédio urbano através do exterior dos muros, aquando das suas visitas a Barcelos, quando eram informados por vizinhos. Foi assim que tiveram conhecimento que o prédio tinha sofrido alterações de cotas, estava cheio de entulho, coberto de silvas e mato e as edificações encontravam-se em ruínas. O cata vento existente no prédio encontra-se em situação de iminente derrocada, constituindo um perigo para pessoas e bens. Souberam que a Câmara Municipal de ... ordenou a reposição das cotas, face ao aterro ilegalmente feito pelo Réu, e a limpeza do prédio e que o Réu nada fez.
Entretanto, após 06.10.2017, os Autores tiveram conhecimento de que tinha havido extravio de equipamento e material, no valor de € 35.237,17 e que o prédio ficou inculto e por isso deixou de gerar o rendimento anual de € 12.440,00. Além disso, o réu destruiu por completo a ramada com ferro em T, arame e esteios em granito, bardos em arame e esteios em granito, custando a reconstituição € 35.520,00.
Em consequência, pelo menos durante 5 anos, os Autores ficarão privados de usufruir da produção da vinha e das árvores de fruto, cifrando-se o prejuízo decorrente da falta de cultivo no indicado período no valor corresponde ao valor da multiplicação do valor da cultura anual de € 12.440,00.
O Réu procedeu, ainda, à destruição de muros de vedação, cubos de granito assentes em massame por força da remodelação de terrenos efetuada; ramadas, os bardos e o caramanchão; não efetuou as obras de reparação ordinárias na garagem e habitação do motorista; não efetuou as obras de reparação ordinárias na vacaria e eira; não efetuou as obras de reparação ordinárias na pocilga; não efetuou as obras de reparação ordinária do anexo destinado ao alambique; não efetuou as obras de reparação ordinárias respeitantes ao catavento que se encontra em risco de derrocada.
A reposição da situação anterior à posse do Réu terá um custo para os Autores de € 200.000,00.
Mais alegam os Autores que o Réu, propositadamente, destruiu a linha de água de mina com nascente a 1 km de distância. É necessário levar a cabo trabalhos de limpeza da mina, abertura e fecho de valas, reparação de condutas, reparação de depósito mãe e reparação do depósito recetor final. A limpeza da mina, abertura e fecho de valas, reparação de condutas, reparação de depósito mãe e reparação do depósito recetor final e todos os trabalhos e materiais necessários a que a água volte a jorrar na propriedade, custa pelo menos € 80.000,00.
O Réu procedeu, também, à edificação de dois outdoors publicitários no prédio dos Autores, contra a sua vontade, provocando alteração do objeto do usufruto, posto que o prédio não tinha qualquer fim comercial. Este facto gerou nos Autores sentimentos de frustração e desrespeito e passaram a recear ir a ... devido ao gozo e comentários depreciativos que se ouviam nos cafés nas imediações do seu prédio. Sofreram de ansiedade privações de sono e perda de apetite por se sentirem tristes, por força da humilhação e gozo impostos pelo Réu.
Desde a data de colocação dos outdoors que os Autores filhos, nunca mais tiveram coragem de se deslocar ao seu prédio, devido aos comentários e vexame que sofriam com tal deslocação. Continuamente, os populares que ali se encontravam comentavam de forma audível que “nem no vosso prédio vocês mandam”.
O comportamento do Réu, enquanto usufrutuário, teve única e exclusivamente a intenção de desvalorizar o prédio, obrigando os coautores a venderem ao “desbarato” o prédio. Aliás, através de interposta pessoa, o Réu apresentou uma proposta de compra da propriedade aos Autores.
O Réu sabe o valor patrimonial e sentimental do prédio para os coautores, atuando com a intenção de destruir por completo o prédio dos Autores, provocando-lhes sentimento de receio, impotência e medo de não conseguir repor a sua propriedade como se encontrava antes do Réu a destruir. Tal sentimento causou profunda revolta e dor nos Autores, pois o seu prédio sempre pertenceu à sua família.
O prédio tem para os autores um valor sentimental não quantificável, pois ali moraram, passaram Natais, Páscoas e deram festas em família e amigos. A conduta do Réu levou os Autores a passarem noites sem dormir; causou discussões no seio familiar; obrigou os Autores a deslocarem-se por diversas vezes a Barcelos.
Consideram que o comportamento do Réu consubstancia um comportamento ilícito, na medida em que não respeitou a vontade e interesses dos proprietários Autores, deteriorando o imóvel por inércia, descuido e destruição. Ainda que a destruição e desvalorização do imóvel fosse devido a causas alheias ao Réu, este, enquanto usufrutuário, tem a obrigação de “avisar o proprietário de qualquer facto de terceiro, de que tenha notícia, sempre que ele possa lesar os direitos do proprietário; senão o fizer responde pelos danos que este venha a sofrer”. O comportamento ilícito do Réu, causou danos na casa, nos cobertos, nos bens imóveis e móveis, bem como na cultura existente no prédio, pelo que a sua conduta afetou a esfera jurídica dos proprietários. Tal conduta é fundamento de extinção do usufruto, seja pela perda total do prédio, seja pela falta de cultivo do prédio por mais de 20 anos, bem como, da peticionada indemnização aos Autores no valor de € 344.567,17, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em decorrência da atuação do Réu.
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Regularmente citado, o réu contestou excecionando a sua ilegitimidade processual para os termos da ação desacompanhado da esposa, com quem casou em 1951 no regime da comunhão geral de bens.
Impugnou também os factos constitutivos alegados pelos Autores. Alegou, em síntese, que o réu e a esposa não são da família dos Autores e celebraram os contratos de compra e venda de metade da propriedade e do usufruto total da Quinta da ... não para irritar o Autor marido, mas porque a propriedade estava à venda. Não tiveram, nem têm, qualquer interesse, intenção, vontade, ou outra qualquer reação para humilhar, ofender, ter amizade, dar-se ou ser das relações dos Autores.
Só após trânsito em julgado da ação de divisão de coisa comum é que os Autores adquiriram a raiz do prédio (urbano) que lhe foi adjudicado por sorteio, sendo certo que o valor que no âmbito dessa ação foi atribuído ao prédio contrasta com aquele que os Autores lhe atribuem nos presentes autos, para mais. Desconhecem os maquinismos, depósito de meio litro, equipamentos e materiais descritos pelos Autores na petição inicial como fazendo parte do prédio adjudicado aos Autores, porque no âmbito do processo de divisão de coisa comum tais bens não foram avaliados nem incluídos na constituição dos lotes em divisão. Não podem, por isso, os Autores pretender receber o que nunca lhes foi atribuído, adjudicado ou sequer objeto de divisão entre proprietários.
Relativamente aos danos não patrimoniais invocados, o réu e a esposa em nada contribuíram para os comentários que lhes tiraram o sono e falta de apetite, Tais danos, a terem acontecido, estão relacionados com as decisões tomadas pelos pais do Autor marido, sogros e avós dos restantes autores, que venderam e receberam o respetivo preço no negócio que colocou os Autores e o réu e esposa como comproprietários naquela Quinta da ..., mas que ainda penalizou mais os Autores ao ser-lhes doada apenas a raiz ou nua propriedade daquele imóvel e, ainda, sujeitou essa doação a uma cláusula de fideicomisso.
O usufruto adquirido pelo réu e sua mulher diz respeito apenas a metade indivisa, ou seja, à metade indivisa dos aqui Autores porque quanto à outra metade não se põe em questão o usufruto porque existe reunião na mesma pessoa (o réu e sua mulher) da raiz e do usufruto.
A ação de divisão de coisa comum que correu termos com o nº 3608/05.4TBBCL no 3º Juízo Cível do então Tribunal Judicial da Comarca de Barcelos foi intentada pelo réu e a decisão transitou em 2014. Nessa ação a adjudicação dos lotes foi feita por sorteio.
O prédio em discussão nos autos foi ainda objeto de mais duas ações. Numa os Autores pediram a declaração de nulidade do contrato de compra e venda dos Réus celebrado com os pais do Autor marido; noutra os Autores receberam da Companhia de Seguros ..., SA, em março/abril de 2010, a quantia de 200.000,00 € relativa a indemnização pelos prejuízos causados no prédio urbano com o artigo matricial ....
Esta ação teve lugar porque, em 15.03.2005, ocorreu um acidente com um camião cisterna de transporte de combustível que destruiu por completo a casa de habitação, bem como anexos e demais construções, os muros e portões da propriedade e toda a envolvência da mesma.
Os Autores intentaram uma ação contra a Seguradora do veículo, a qual correu termos juntamente com a ação intentada pelo réu contra a mesma seguradora. Nessa ação, os Autores participaram ativamente na nomeação de perito e na formulação de quesitos, sendo que, a final, conformaram-se com o teor do relatório pericial.
Um dos quesitos objeto da perícia foi se o embate aludido destruiu o prédio pertença dos autores e respetivos anexos, bem como o muro de vedação, que se encontrava em bom estado de conservação e condições de habitabilidade antes da data do acidente, quesito que mereceu sim como resposta.
Os Peritos, entre eles o nomeado pelos Autores marido e esposa, Engenheiro R. A., informaram o Tribunal que o acidente havia destruído a casa, os anexos, os muros de vedação, tudo que antes se encontrava em bom estado; não ser possível a reconstrução da habitação, atentos os condicionalismos legais resultantes da necessidade de cumprir o afastamento de 20 metros ao eixo da estrada e ainda atestaram a composição da casa principal e anexos.
Entre a data do acidente (13.03.2005) e a data em que foi realizada a transação (12.03.2010) no âmbito do identificado processo, o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, atento o estado de escombros. Desde 15.03.2005 que o prédio “Quinta da ...” deixou de ter qualquer uso por se ter transformado em terreno apto para construção.
A Estradas de Portugal, S.A. expropriou 969 m2 do lote que viria a ser adjudicado aos Autores no processo de divisão de coisa comum. Aquando da posse administrativa da parcela expropriada e seguimento das obras de construção civil no local para construção da rotunda que hoje lá existe, foi adjudicada essa empreitada a uma empresa de obras públicas X – M. P., Construções, Lda.
A identificada empresa instalou o estaleiro de construção civil, com camiões, máquinas de aterro e desaterro, pedras, britas, cimentos, areias e demais, no prédio identificado nos autos. O Réu e esposa não consentiram nessa ocupação e reagiram através de Notificação Judicial Avulsa àquela empresa e aos aqui Autores marido e mulher e instauraram o procedimento cautelar de restituição provisória de posse, que foi julgado procedente. Nesses autos, o legal representante da empresa M. P. Construções, Lda., declarou que foi o Autor marido quem autorizou a instalação do estaleiro no prédio e que não tinham sido informados de que os Réus eram usufrutuários.
Na altura da posse administrativa pela Estradas de Portugal da identificada parcela de terreno e no decurso das obras realizadas pela M. P. Construções, Lda., o Autor marido levou dali todas as pedras do muro de vedação, o que encontrou nos escombros da parte urbana destruída no incêndio, os esteios e ferros de ramadas, todo o piso em cubo de granito, grades em ferro e portões em ferro, e transportou-os para outra propriedade sua.
Quanto aos equipamentos existentes no ano de 1995, não existia alambique a funcionar e nunca produziram vinho. O alambique foi furtado e o Réu marido apresentou queixa à GNR contra desconhecidos.
Quanto à mina de água, os pais do Autor cederam a água ao réu e esposa, permitindo-lhes fazer o negócio dela que bem entendessem, por procuração irrevogável.
Relativamente ao recheio da casa da quinta, quando o réu e esposa celebraram negócio com os pais do autor, a casa não se encontrava habitada. Apresentava-se improdutiva, sem culturas de produção, e mostrando a parte urbana grande necessidade de obras para ser habitada.
O réu marido fez alguns arranjos e inclusive tinha a parte da habitação com uso constante. Contudo, nunca usou a vacaria, a casa do motorista, a adega, o alambique ou o catavento.
O poço de água referido situa-se, atualmente, em terreno expropriado pela Estradas de Portugal. A Cooperativa Elétrica do ..., após o sinistro de 2005, levantou do imóvel os quadros elétricos e demais elementos.
A peritagem levada a cabo na divisão de coisa comum equivaleu os lotes nas condições em que estão hoje acrescidas, apenas, a parte urbana, da parte posteriormente expropriada. O réu e esposa autorizaram a colocação de outdoor na parcela de terreno, mas não foram por qualquer modo contactados pelos Autores, desconhecendo a respetiva opinião sobre os mesmos.
O réu e esposa adquiriram metade da nua propriedade e o usufruto do prédio em discussão nos autos na sequência da publicitação (por placa colocada no prédio) pelos pais do autor marido da venda da propriedade.
Considera que os autores alegam factos contrários à verdade que conhecem e que intentaram a ação bem sabendo a falta de fundamento legal para os pedidos deduzidos, sugerindo que a instauração da presente ação é resposta dos Autores à ação que intentaram contra eles com vista ao recebimento do usufruto corresponde à indemnização que receberam de € 200.000,00 pelos danos ocasionados pelo acidente do camião cisterna.
Conclui com o pedido de condenação dos autores como litigantes de má fé.
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Na sequência da invocação da ilegitimidade, os Autores requereram a intervenção principal provocada de D. C., esposa do réu, para a hipótese de se entender ter havido preterição de litisconsórcio necessário passivo, tendo tal intervenção sido admitida.
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Regularmente citada, D. C., além de fazer sua a contestação apresentada pelo Réu marido, acrescentou que conjuntamente com o marido são partes ilegítimas na presente ação, pois que, tendo origem o usufruto em trespasse, a existir responsabilidade, são os trespassantes aqueles que respondem perante os Autores.
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Os Autores apresentaram resposta e sustentaram que a fonte do usufruto constituiu um contrato de compra e venda, por quem, nessa data, eram os proprietários. Em 06.01.1995 M. H. e marido A. R. passaram a ser novamente proprietários de metade da raiz ou nua propriedade. Concluem, por isso, que não se verifica a situação de trespasse a terceiro regulada no artigo 1444.º do Código Civil, na medida em que a venda do usufruto foi efetuada diretamente pelo proprietário pleno.
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Em sede de audiência prévia foi proferido despacho saneador e julgou-se improcedente a exceção de ilegitimidade processual dos réus.
Definiu-se o objeto do processo e procedeu-se à seleção dos temas de prova.
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Procedeu-se a julgamento e a final foi proferida sentença com o seguinte teor decisório:

“Pelos fundamentos expostos, decide-se julgar improcedente a presente ação e, em consequência:

a) Julgar totalmente improcedente a presente ação e absolver dos pedidos os Réus.
b) Improcedente o pedido de condenação dos Autores como litigantes de má-fé.”
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Os autores não se conformaram e interpuseram o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. Os autores supra identificados, aqui recorrentes, jamais se poderão conformar com a douta decisão do Tribunal a quo uma vez que, a mesma enferma de vícios graves, nomeadamente procede a uma errada valoração dos factos e uma errónea aplicação e interpretação do direito subsumível ao casso em concreto, pelo que, com o devido respeito, que é muito e merecido, a decisão proferida deve ser revogada e substituída por outra que reponha a justiça e legalidade da causa.
2. A douta sentença, com o devido respeito pelo douto Julgador a quo, considera factos provados e não provados sem a conveniente fundamentação, bem como uma errada valoração/interpretação da prova produzida em julgamento que vai além dos limites razoáveis da discricionariedade atinente ao princípio da livre interpretação da prova e da convicção formada pelo Julgador.
3. Pois, atendendo, à prova produzida em julgamento e à prova documental carreada para os autos oportunamente, só se poderá atribuir a decisão proferida nos pressentes autos à errada valorização/interpretação por parte do Julgador a quo..
4. Isto porque, o ónus de prova que cabia aos Autores nunca foi descurado, tanto assim é que, os depoimentos produzidos, quer de parte, quer testemunhais, vão de encontro às provas documentais carreadas para os presentes autos
5. Aliás, tais provas documentais constantes dos autos em conjugação com a perícia efetuada nos mesmos permitiam por si só a procedência total da ação e condenação dos Réus nos termos peticionados, conforme deixaremos demonstrado.
6. Ora, os Autores não concebem, nem se conformam, como é que os seguintes factos 10, 29, 32, 34, 35, 39 e 44 foram conforme explanaremos nos pontos infra.
7. Os Autores não se podem conformar com o facto da douta sentença considerar provado que: “10. O lote urbano (parcela C) foi desanexado do prédio descrito na conservatória predial ... sob o n.º … e, deu origem ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ...º, descrito na conservatória de registo predial ... sob o n.º ..., composto de terreno para construção com a área de 5466, desanexado do prédio ....”
8. Certamente o presente ponto padece de um erro de redação ou lapso de escrita do douto Julgador a quo, pois de outro modo não se pode entender a redação do presente que face ao contante quer dos documentos, quer da petição inicial quer da contestação devia ser dado como assente nos seguintes moldes: 10. O lote urbano (parcela C) foi desanexado do prédio descrito na conservatória predial ... sob o n.º … e, deu origem ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ...º, descrito na conservatória de registo predial ... sob o n.º ..., composto de terreno para construção com a área de 6435m2, desanexado do prédio ....
9. Ora, conforme artigo 37 da petição inicial (fls. 2 a 29 dos presentes autos) “Em 22 de Maio de 2015, o prédio urbano sofreu uma alteração na área total, uma vez que foram expropriados 969m2, passando a ter a área total de 5466m2, conforme consta da descrição, junta em anexo enquanto doc. 9”. (o doc. 9 consta das fls. 46 verso a 48).
10. Aliás, o artigo 37 da Petição Inicial nem tão pouco é impugnado no âmbito da contestação deduzida no âmbito (fls. 122 dos autos) dos presentes autos e, ainda, é junto pelos Réus, o doc. 5 (da contestação), documento esse que atesta o aqui reclamado, isto é, que a parcela C referida no ponto 10 da matéria dada como provada da sentença tinha uma área de 6435m2 e não uma área de 5476m2, sendo esta última área a sobrante em resultada da expropriação de 969m2 – vide ponto 13 da matéria dada como provada da douta sentença – (6445m2-969m2= 5476m2).
11. Aliás, se atendermos às atas onde o Julgador a quo formou a sua convicção (“certidões da ata da conferência de 20.01.2014 de fls.44 v a 46, realizada no âmbito do processo de ação de divisão de coisa comum que correu termos sob n.º 3608/05.4TBBCL; da CRP de fls. 52 a 53 v) concluímos o expostos nos parágrafos anteriores.
12. Portanto, o ponto 10 da matéria dada como provada deve passa a ter a seguinte redação:: 10. O lote urbano (parcela C) foi desanexado do prédio descrito na conservatória predial ... sob o n.º … e, deu origem ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ...º, descrito na conservatória de registo predial ... sob o n.º ..., composto de terreno para construção com a área de 6435m2, desanexado do prédio ....
13. Os Autores não se podem conformar com o facto da douta sentença considerar provado que: “Em 15.03.2005 houve um acidente, consubstanciado no capotamento de um camião cisterna de transporte de combustível, que destruiu por completo a casa de habitação, anexos e demais construções, os muros e portões da propriedade e toda a envolvência da mesma do prédio identificado no nº 1.”
14. Na verdade, conforme resulta cristalino de toda a prova produzida em julgamento, bem como a prova documental carreada oportunamente para os autos, sem prejuízo da perícia produzida no âmbito do presente processo, a douta sentença deveria ter dado como provado que: Em 15.03.2005 houve um acidente, consubstanciado no capotamento de um camião cisterna de transporte de combustível, que destruiu por completo a casa de habitação, 1 anexo que correspondia à casa do caseiro e 90 metros de muro que correspondem à parte do muro expropriado para a construção da rotunda, do prédio identificado no nº 1.
15. Isto porque, o douto Tribunal a quo só pode considerar destruídos pelo incêndio, em resultado do acidente rodoviário de um camião cisterna (referido no presente facto), os edifícios que foram efetivamente atingidos pelas mesmas.
16. A este propósito foram juntas diversas provas documentais aos autos pelos Autores, nomeadamente com o requerimento com a referência 29013516, tendo sido tal junção admitida pelo douto despacho com referência 158459229 (“Admito os documentos juntos a fls. 173 a 206...”), não sendo tais documentos tão pouco impugnados pela parte contrária):
f) documentos 22 (Relatório de Peritagem da firma P. V. Lda.,);
g9 23 (Questões formuladas e respondidas pelos peritos no âmbito do processo 1015/08.6TBBCL);
h) 25 (Auto de Participação de Acidente de Viação da GNR);
i) 26 (reporte fotográfico);
j) e 27 (planta com localização dos edifícios e indicação dos atingidos pelo incêndio). – (os documentos referidos nas alienas anteriores são os constantes das fls. 201 verso a 209 dos autos).
17. De frisar que, por força da não impugnação dos documentos juntos com o requerimento suprarreferido, as informações constantes dos mesmos dão-se por assente, confessada, admitida e verdadeira, o que só por si deveria ser suficiente para o douto Tribunal a quo ter decido em sentido diverso.
18. Dos documentos acabados de referir nas alíneas a) a e) resulta claro que o incêndio que deflagrou no prédio apenas exclusivamente afetou:
d) A habitação principal com área total de 596m2 – identificado com a letra F junto à curva no croqui do Auto de Participação de Acidente de Viação da GNR junto como doc. 25 e melhor percetível nos documentos 23, 26 e 27;
e) 1 anexo com área de 110m2 confinante/paredes meias com a habitação principal que correspondia à casa do caseiro, identificado com a letra F junto à curva no croqui do Auto de Participação de Acidente de Viação da GNR junto como doc. 25 e melhor percetível nos documentos 23, 26 e 27;
f) E uma faixa de 90 metros do muro que corresponde à parte expropriada para construção da rotunda.
19. Acresce que, igualmente, resulta dos mesmos documentos que o incêndio não afetou:
f) O Anexo correspondente à garagem e habitação do motorista;
g) O anexo correspondente à vacaria;
h) O anexo correspondente à pocilga;
i) O anexo onde se situava o alambique;
j) As vinhas, pomares e jardins que não foram afetadas pelo incêndio.
20. O documento 17 (fls. 85 a 87 dos autos) contém uma reportagem da televisão ... referente ao incêndio que deflagrou na propriedade em apreço nos autos, é visivelmente notório que o incêndio apenas destruiu a habitação principal, o anexo contiguo correspondente à casa do caseiro e um muro coincidente com a parte do mesmo que foi expropriada para a construção da rotunda, não tendo tal infortúnio (o incêndio) destruído mais nada.
21. Pelo que, mais uma vez se deixa realçado que a decisão relativamente ao facto que se impugna deveria ter sido em sentido diverso.
22. Ora, do Relatório Pericial (fls. 215 a 277 dos autos) consta um quesito completamente esclarecedor sobre a matéria em apreço, quesito esse e respetiva resposta que passamos a citar: “Quesito 1 – Mais se requer ao Sr. Perito que esclareça se os edifícios existentes demonstram sinais de ter sido afetados por um incêndio? Resposta: Não.” (negrito nosso).
23. Mais uma vez, querem os Autores realçar que só a prova pericial que se acaba de chamar à colação seria fundamento suficiente para uma decisão por parte do douto Julgador a quo nos termos aqui reclamados. Ainda para mais, quando a prova pericial vai de encontro à prova documental constante dos autos e não impugnada.
24. Aliás, nunca é demais frisar que os danos causados pelo incêndio no prédio em apreço já foi alvo de diversas peritagens, nomeadamente:
c) peritagem produzida no âmbito do processo 1015/08.6TBBCL (doc. 23 já referido), vide pág. 4, ponto 1 a 5 da base instrutória, onde os peritos respondem que os anexos destruídos correspondem a um anexo com área de 110 m2 e contíguos à habitação.
d) Ainda, no mesmo sentido o relatório de peritagem de P. V. Lda., (doc. 22 já referido), em que refere que a área atingida pelo incêndio corresponde à habitação principal com área de implantação de 298m2, ou seja, área total de construção 596m2 e anexos de 110m2, anexo este que correspondia à habitação de caseiro sendo composto por dois quartos e cozinha.
25. Por fim, o Autor foi contundente ao afirmar que NENHUM dos prejuízos peticionados na presente ação foram causados pelo incêndio.
26. A testemunha dos Réus, J. C., confirma que além da casa principal, anexo (correspondente à casa do caseiro) nada ardeu, pois os outros anexos que os Autores se referem no âmbito da presente ação ficam no interior da propriedade, isto é, distanciados dos muros.
27. Acresce que, a testemunha A. C., testemunha arrolada pelos Réus também comprovou tal situação.
28. Mais uma vez, se frisa que toda e qualquer prova produzida em julgamento, atesta a versão dos Autores, que nenhum dos edifícios/prejuízos reclamados no âmbito da presente ação foram provocados pelo incêndio, ao contrário do que o facto dado erroneamente como provado faz crer.
29. Portanto, o facto em apreço dado como provado, deve passar a ter a seguinte redação: Em 15.03.2005 houve um acidente, consubstanciado no capotamento de um camião cisterna de transporte de combustível, que destruiu por completo a casa de habitação, 1 anexo que correspondia à casa do caseiro e 90 metros de muro que correspondem à parte do muro expropriado para a construção da rotunda, do prédio identificado no nº 1.
30. Os Autores não se podem conformar com o facto da douta sentença que ora se recorre ter dado como provado que “ (…) no relatório pericial, subscrito unanimemente pelos peritos, foi respondido o quesito: “(…) O embate aludido destruiu o prédio pertença dos Autores e respetivos anexos, bem como o muro de vedação, que se encontrava em bom estado de conservação e condições de habitabilidade antes da data do acidente?
R: sim.”
31. Ora, o Eng. R. A., perito no outro processo que este quesito se refere e neste processo testemunha, prestando o seu depoimento, tendo explanado de forma cristalina que os anexos a que se referia a peritagem que subscreveu era referente aos anexos atingidos pelo incêndio e não todos os anexos, conforme passamos a transcrever:
32. Ora, conforme é patente do seu depoimento, a testemunha explanou que a palavra anexos no contexto da perícia realizada no âmbito do processo que foram partes os aqui Autores e Réus contra a seguradora …, reportava-se apenas aos anexos afetados pelas chamas e não a todos os anexos.
33. Pelo que, os anexos em causa correspondem a 1 anexo com área de 110m2 confinante/paredes meias com a habitação principal que correspondia à casa do caseiro, identificado com a letra F junto à curva no croqui do Auto de Participação de Acidente de Viação da GNR junto como doc. 25 e melhor percetível nos documentos 23, 26 e 27.
34. Tais declarações estão em consonância e reforçam a credibilidade das declarações de parte do Autor, declarações essas que passamos a citar:
35. Ora, não podem restar dúvidas que todas as testemunhas que depuseram sobre o assunto foram explícitas ao afirmar que o incêndio apenas danificou os anexos em causa correspondem a 1 anexo com área de 110m2 confinante/paredes meias com a habitação principal que correspondia à casa do caseiro
36. Mais, o relatório pericial (fls. 215 a 277 dos autos) produzido nos presentes autos atesta que, os edifícios existentes não apresentam sinais de ter sido atingidos pelo incêndio (vide Quesito 1, do Item denominado “Do incêndio”, pág. 32, do Relatório) – vide a este respeito a transcrição efetuada no ponto A.3.2 (a propósito do ponto 29 da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo erradamente dado como provado).
37. Portanto, o ponto 32 dos factos dados como provados deverá passar a ter a seguinte redação: (…) no relatório pericial, subscrito unanimemente pelos peritos, foi respondido o quesito: “(…) O embate aludido destruiu o prédio pertença dos Autores e respetivos anexos, bem como o muro de vedação, que se encontrava em bom estado de conservação e condições de habitabilidade antes da data do acidente? R: sim. Sendo que o anexo que o relatório se refere é 1 anexo com área de 110m2 confinante/paredes meias com a habitação principal que correspondia à casa do caseiro, identificado com a letra F junto à curva no croqui do Auto de Participação de Acidente de Viação da GNR junto como doc. 25 e melhor percetível nos documentos 23, 26 e 27 (fls. 201 verso a 209 verso).
38. Os Autores, em razão da prova documental carreada para os Autos, bem como da prova testemunhal produzida em julgamento, não se podem conformar que o douto Tribunal a quo tenha dado como provado que: “Entre a data do acidente (em13.03.2005) e a da realização da transação (12.03.2010) no âmbito do processo identificado em 30., o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, atento o estado de escombros.”
39. A redação do presente quesito, tendo em conta a prova resultante dos autos deveria ser: A partir da data que o Réu marido comprou o usufruto do prédio (em 06.01.1995) até à presente data, o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, em virtude dos Réus não cuidarem, utilizarem e cultivarem o mesmo.
40. Ora, não deixa de ser verdade que os Réus deixaram o prédio ao abandono entre a data do acidente (em13.03.2005) e a da realização da transação (12.03.2010), no âmbito do processo identificado em 30, mas o quesito da forma que está redigido dá entender que foi, apenas e só, entre essas datas que prédio ficou ao abandono, e essa não corresponde à verdade provada em julgamento.
41. Em abono da verdade, importa frisar que os Réus nunca em momento algum cuidaram, utilizaram ou cultivaram o prédio identificado em 1, pelo menos na parte que hoje cabe aos Autores por força da ação de coisa comum.
42. De todo modo, importa ainda frisar que ainda que o prédio não fosse apenas cuidado/cultivado entre os intervalos temporais fixados pelo douto Tribunal a quo, tal facto devia-se não aos escombros mas à falta de zelo e cuidado dos Réus, pois conforme demonstra provado pelo alegado na impugnação dos factos dos 2 pontos que a este antecedem (A.3.2 e A.3.3) o incêndio apenas afetou a zona junto à estrada nacional, pelo que jamais impediria o cultivo ou utilização da parte remanescente do prédio.
43. Ora, o douto Tribunal a quo nunca poderia fazer fé nas declarações de J. L., pois o mesmo afirma que o Autor foi visto a levar pedra, portões e outros bens, pois o seu testemunho é indireto.
44. Além do mais, a mesma testemunha refere passar na quinta com muita frequência quando na verdade questionada, no entanto, não sabe se a quinta possui à data catavento ou não, não sabe onde o mesmo se localizava ou se o mesmo foi alvo da expropriação, mas quanto a quem levou as pedras e demais materiais, inclusive o catavento, afirma com certeza.
45. Pelo que, o depoimento da presente testemunha deve ser de todo desvalorizado, até porque ficou patente no seu depoimento o seu interesse no desfecho da presente ação, o que é natural na medida que é filho dos Réus.
46. Continuando, conforme doc. 14 (fls. 57 a 61 verso dos autos) junto aos autos, pág. 9, pode ver-se nitidamente uma foto da catavento tirada da estrada nacional que a testemunha em apreço passa regularmente. Igualmente pode verificar-se que face às suas dimensões é impossível não nos apercebermos da existência do catavento. Tal catavento existe até á data de hoje conforme atesta o Relatório Pericial (fls. 215 a 277 dos autos) produzido nos presentes autos (vide Quesito 1 a 23 do Item denominado “catavento”, pág. 26 a 22, do Relatório).
47. Relativamente à testemunha J. C. o mesmo refere aquando do incêndio destruiu todo o lote de terreno dos Autores.
48. No entanto, tal não poderia estar mais longe da verdade, conforme atesta o relatório pericial (a este respeito vide argumentação aduzida nos pontos A.3.2 e A.3.3), bem como, conforme comprova o vídeo constante do doc. 17 (fls. 85 a 87), que mais a baixo se refere.
49. Por fim, relativamente às testemunhas dos Réus, L. F., neta dos Réus, refere que a casa era dotada de luz e que faziam na mesma almoçaradas e jantaradas na vindima e tempo da poda.
50. No entanto, conforme documento junto aos autos em sede de audiência de julgamento, emitido pela Cooperativa Elétrica do … (fls. 287. A 292 dos autos), é comprovado que na data do incêndio não existia qualquer ligação ativa na propriedade dos Autores. Aliás, tal documento refere não ter registo de ligação desde janeiro de 1995, no entanto, referem que tal facto se pode dever aos registos serem bastante antigos.
51. Certo é que, as testemunhas apresentadas pelos Réus apresentam lacunas e contradições que vão para além da livre convicção do Julgador, pelo que deveriam ser de todo desvalorizadas pelo Douto Tribunal a quo.
52. Antes sim, deveriam ser valorizados os depoimentos do Autor e das testemunhas dos Autores que se encontram em consonância com os meios de prova carreados para os autos e produzidos nos autos.
53. Acresce que, o Relatório Pericial (fls. 215 a 277 dos autos) produzido nos autos é inequívoco, pois, no mesmo o perito afirma, sem margem para dúvidas, que os edifícios não sofreram quaisquer obras de reparação ao longo dos anos o que provocou que os mesmos se encontrem no estado deteriorado que se encontram. Igualmente refere que o prédio não apresenta sinais de cultivo. Sendo que, para ambos os casos o perito refere que apenas não consegue precisar desde quando é que o prédio foi deixado ao completo abandono, mas afirma que se ao longo dos anos fossem feitas reparações ordinárias neste momento não seriam necessárias as obras que os Autores peticionam.
54. Mais concretamente:
h) O Relatório em apreço refere que os edifícios existentes não apresentam sinais de ter sido atingidos pelo incêndio (vide Quesito 1, do Item denominado “Do incêndio”, pág. 32, do Relatório);
i) Igualmente o perito diz que a garagem e habitação do motorista se encontra parcialmente destruída sem condições de segurança para a sua utilização com risco de iminente derrocada do telhado por falta de manutenção, afirmando inclusive que o edifício apresenta sinais de abandono por mais de 20 anos (vide Quesito 1, 2, 7, e 23 do Item denominado “Garagem e habitação do motorista”, pág. 9, 10 e 12, do Relatório);
j) Mais refere que no que concerne à vacaria e eira a mesma apresenta sinais de vandalismo e falta de obras de conservação, existindo vários vidros partidos, as condutas de água em PVC estão cortadas, sem os respetivos passadores de corte e torneiras, sem instalação elétrica em virtude da mesma ter desparecido, apresentando portanto sinais de abandono por mais de 20 anos (vide Quesito 1a 23 do Item denominado “vacaria e eira”, pág. 13 a 16, do Relatório);
k) Acresce que o perito refere relativamente à pocilga que a mesma se encontra degradada e vandalizada com sinais de abandono por mais de 20 anos (vide Quesito 1 a 15 do Item denominado “pocilga”, pág. 17 a 19, do Relatório).
k) O perito relativamente ao alambique que o mesmo se encontra com sinais de abandono por mais de 20 anos (vide Quesito 1 a 23 do Item denominado “alambique”, pág. 19 a 22, do Relatório);
l) Por fim, relativamente ao catavento refere que o mesmo precisa de intervenção urgente não tendo sido pintado ou reparado ao longo dos últimos 20 anos (vide Quesito 1 a 23 do Item denominado “catavento”, pág. 26 a 22, do Relatório).
m) De frisar que relativamente a todos estes itens o perito refere que se fossem efetuadas as obras de reparação ordinárias, previstas no âmbito do RGUE, art.º 89.º, n.º1, o edifício não se encontraria degradado conforme se encontra.
55. Ora, conjugado o relatório pericial com a prova testemunhal supratranscrita, não podem restar dúvidas: os Réus fizeram um mau uso do prédio desde que compraram o usufruto, os Réus não cultivaram o prédio desde essa data, consequentemente, os Réus provocaram a perda total do prédio pelo não cuidado.
56. Aliás, o próprio Tribunal a quo considerou provados nos factos 22 e 23 dos factos dados como provados que os Réus nunca efetuaram quaisquer obras nos edifícios.
57. Além do mais, o Doc. 17, (fls. 87 a 87 dos autos) juntos aos Autos com a Petição Inicial em formato CD, contêm uma reportagem da televisão ... referente ao incêndio que deflagrou na propriedade em apreço nos autos. Ora, no decorrer da mesma reportagem é dito pelos vizinhos que são entrevistados que a propriedade de encontrava totalmente desabitada desde a morte de M. C. (tio do Autor marido) (vide vídeo a partir do minuto 3.42 a 6.15). O que por si só deverá ser suficiente para considerar que a propriedade nunca foi cultivada nem utilizada pelos Réus, pois não podemos ter um testemunho mais isento do que o de alguém que jamais imaginou ver o seu testemunho reproduzido num julgamento que lhe é totalmente alheio, como é o caso dos vizinhos que foram entrevistados pela televisão…. Importa ainda realçar que tal documento não foi impugnado com a contestação, pelo que se dão por confessados e verdadeiros os factos nele contidos.
58. Tal vídeo corrobora de forma integral o depoimento do Autor J. F., depoimento esse supratranscrito.
59. Portanto, em razão de tudo o que se acaba de expor, o presente ponto deve passar a ter a seguinte redação: A partir da data que o Réu marido comprou o usufruto do prédio (em 06.01.1995) até à presente data, o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, em virtude dos Réus não cuidarem, utilizarem e não cultivarem o mesmo.
60. Os Autores não podem de forma alguma conformar-se com o facto dado como provado que a seguir se passa a transcrever: “Desde 15.03.2005 que o prédio “Quinta da ...” deixou de ter qualquer uso por se ter transformado terreno apto a construção.”
61. Em primeiro lugar, o prédio só vê o seu uso alterado por força da divisão de coisa comum, divisão essa que apenas surte efeitos com o transito em julgado da respetiva ação, o que apenas acontece em 20.01.2014, pelo que jamais se poderá dar como provado que foi pela alteração do uso do prédio para urbano que o prédio “Quinta da ...” deixou de ter uso desde 15.03.2005. Assim, só pelo que se acaba de se expor o presente ponto da matéria dada como provada deve ser alterado.
62. Além do mais, o presente ponto colide com o ponto 34 (“Entre a data do acidente (em13.03.2005) e a da realização da transação (12.03.2010) no âmbito do processo identificado em 30., o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, atento o estado de escombros.”). Ora, por um lado o douto Tribunal a quo considerou provado no ponto 34 que o prédio ficou ao abandono entre 13.03.2005 e 13.03.2010 por força dos escombros existentes no mesmo, enquanto que, no ponto 35 (ponto que agora se rebate) entende que o prédio deixou de ter uso desde 13.03.2005 (mesma data que o incêndio) porque o prédio alterou a aptidão/fim. Tais pontos estão em contradição nítida, na medida que para o mesmo período temporal atribuem duas causas distintas para o mesmo facto: o abandono do prédio.
63. Mais, o douto Julgador a quo, com o devido respeito que é muito e merecido, confunde dois conceitos, por um lado o uso/fim de um prédio e por outro com a obrigação dos usufrutuários de um prédio serem obrigados a entregar ao proprietário no mesmo estado que o mesmo se encontrava quando o mesmo lhe foi entregue.
64. Conforme ficou dado como provado, o prédio foi entregue aos Réus em bom estado de conservação, cultivado e ajardinado, pelo que terá de ser devolvidos aos Autores no mesmo estado.
65. Ora, na data em que o prédio foi entregue aos Réus, o mesmo estava afeto à exploração agrícola, nomeadamente vinha. Logo esse cultivo podia e devia ser efetuado e em nada alterava ou prejudicava o direito dos Réus, enquanto que o inverso, isto é, o não cultivo prejudica e prejudicou os Autores.
66. Mais, o prédio só altera a aptidão em 20.01.2014, pelo que não se concebe o porquê de pelo menos até essa data os Réus não terem cultivado o prédio. Certo é que, o não cultivo do mesmo prejudicou os Autores e em nada beneficiou os Réus. É que, se ao menos, os Réus justificassem o não cultivo na medida que, uma vez que o prédio alteou o seu fim, pretendiam construir no mesmo, tal até podia colher algum tipo de fundamento. De outro modo, a atitude dos Réus só pode ser entendida como um abandono completo do prédio com intuito único e exclusivo de prejudicar os Autores, desvalorizando o prédio dos mesmos, de forma a obrigar os mesmos a vender ao desbarato o prédio.
67. Portanto, o presente ponto da matéria dada como provada deve ser alterada e passar a ter a seguinte redação: Desde da data que o Réu marido comprou o usufruto do prédio (em 06.01.1995) até à presente data, o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, em virtude dos Réus não cuidarem, utilizarem e cultivarem o mesmo.
68. Ou, caso assim não se entenda o que apenas se admite por mera hipótese académica, o ponto em apreço deverá ser a seguinte redação: Desde 20.01.2014 até à presente data, o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono por parte dos Réus, em virtude do terreno se ter transformado em apto para construção.
69. Os Autores não se podem conformar com o facto de ter sido dado como provado que: “Aquando da posse administrativa pela Estradas de Portugal da identificada parcela de terreno e no decurso das obras realizadas pela tal M. P. Construções, Lda., o Autor marido levou dali e transportou-os para outra sua propriedade suas: todas as pedras do muro de vedação face à estrada nacional; -todas as pedras; os esteios e ferros de ramadas e outros lá existentes; -o piso em cubo de granito existente no local; - grades em ferro, - portões em ferro”.
70. O facto do presente ponto ter sido dado como provado, só se poderá admitir a um lapso por parte do douto Julgador a quo. De outro modo, não consegue conceber, compreender, a decisão proferida quanto a este facto. Aliás, a douta Sentença afirma que: “A primeira testemunha referiu ter conhecimento que um camião, sob as ordens do autor marido levou pedra, portões em duas folhas de ferro, estanho e tudo o que lá se encontrava, factos que foram presenciados pelo seu irmão mais novo e pelo pai. A segunda testemunha, declarou ter visto o Autor marido a remover e levar consigo as pedras, portões e grades.” – vide pág. 39 da douta sentença. As testemunha que o Julgador se refere no trecho que acabamos de transcrever são J. L. e L. F..
71. Tal não corresponde de todo ao que resulta dos depoimentos.
72. Ora vejamos; relativamente “os esteios e ferros de ramadas e outros lá existentes; -o piso em cubo de granito existente no local; - grades em ferro, - portões em ferro” é impossível que o Autor os pudesse ter levado da propriedade aquando da posse administrativa. Isto porque, consta dos autos quer por prova documental, quer por prova testemunhal, a expropriação acontece em 2015 e os trabalhos de construção da rotunda e reconstrução do muro junto à mesma decorrem durante 2015. Ora, se atentarmos ao doc. 14 (fls. 57 a 61 verso) junto com a Petição inicial, nomeadamente nas fotos juntas com esse documento, verificamos que em 2013 inexistiam os esteios e ferros de ramadas e outros lá existentes; -o piso em cubo de granito existente no local; - grades em ferro, -portões em ferro”.
73. Pelo que, jamais poderia ser dado como provado que o Autor, J. F., aquando da posse administrativa pelas Estradas de Portugal levou ou retirou do prédio os elementos referidos no parágrafo anterior. No entanto, importa frisar e realçar que, o Autor J. F., não retirou por si ou através de interposta pessoa qualquer dos elementos referidos no facto dado como provado que agora se contesta. Aliás, não houve uma única testemunha durante todo o julgamento que tenha respondido que viu o Autor J. F. ou alguém a seu mando a retirar o que quer que fosse. Algumas testemunhas do Réu limitaram-se, conforme passamos a transcrever, que poderia ter sido ele, no entanto, quando questionadas se viram ou tem a certeza, afirma que não viram, nem sabem.
74. Se atentarmos ao depoimento de J. C., o mesmo demonstra apenas saber que os materiais em causa (todas as pedras; os esteios e ferros de ramadas e outros lá existentes; -o piso em cubo de granito existente no local; - grades em ferro, - portões em ferro”) foram levados do local, não sabendo para onde foram, nem sabendo precisar por quem foi. Apenas sabe dizer que viu ser levado na presença do Sr. J. F., aqui Autor. Ora, é natural que o Autor estivesse presente durante as obras de expropriação do seu prédio, a sua presença não significa que as pedras e outros materiais carregados fossem carregados para a sua quinta ou a seu mando.
75. Agora, quanto ao testemunho de L. F., a mesma afirma claramente que não sabe se foi o Autor marido, J. F., que levou “todas as pedras do muro de vedação face à estrada nacional; -todas as pedras; os esteios e ferros de ramadas e outros lá existentes; -o piso em cubo de granito existente no local; - grades em ferro, - portões em ferro”. A testemunha afirma, ainda, que não sabe se foi alguém a seu mando que levou os bens em causa. Mais, a testemunha afirma que não conhece os carros das pessoas em apreço. Em conclusão, apenas podemos afirmar com total certeza que a testemunha sabe que os materiais em causa desapareceram da propriedade mas não faz a mais pequena ideia como, através de quem u tão pouco para onde foi.
76. Por fim, J. L., filho dos Réus, deve ser de todo desvalorizado, até porque ficou patente no seu depoimento o seu interesse no desfecho da presente ação, o que é natural na medida que é filho dos Réus.
77. Assim, é forçoso concluir que não houve um único depoimento que fosse credível, que fizesse prova, que afirmasse sem margem para dúvidas que os materiais em causa fossem levados pelo Autor da sua propriedade.
78. Portanto, o presente facto deve ser dado como não provado, ou, alternativamente, deve passar a ter a seguinte redação: Aquando da posse administrativa pela Estradas de Portugal da identificada parcela de terreno e no decurso das obras realizadas pela tal M. P. Construções, Lda., despareceram da propriedade - todas as pedras do muro de vedação face à estrada nacional; -todas as pedras; os esteios e ferros de ramadas e outros lá existentes; -o piso em cubo de granito existente no local; - grades em ferro, -portões em ferro.
79. Os Autores não se podem conformar com o facto de ter sido dado como provado que “O poço de água situa-se no terreno expropriado pela Estradas de Portugal..”.
80. Ora, várias testemunhas referiram a existência de um ou mais poços no prédio em apreço nos autos, mas a verdade é que só uma delas opinou onde o poço se deveria localizar (“deve estar”), mais concretamente a testemunha J. C..
81. Sucede que, o douto Tribunal a quo para a decisão do presente facto não deveria ter formado a convicção na presente testemunha. É certo que é o único depoimento que precisa o local onde se situa o poço, mas apresenta contradições ao longo de todo o seu depoimento. Nomeadamente, no que ao presente facto concerne, a testemunha presume que o poço “deve estar” ali, mas na verdade não sabe.
82. O Tribunal não pode, nem deve formar a sua convicção em presunções que não as legais.
83. Pois, a verdade é que o poço está aterrado, conforme resulta do depoimento do Autor marido.
84. Ora, conforme se pode ver pelos ofícios da Câmara Municipal de ..., constantes de doc. 14 (fls. 57 a 61 verso) junto com a PI., o aterro foi levado a acabo pelo usufrutuário, aqui Réu, e foi realizado na parte do prédio mais interior, local onde existiam antes os jardins.
85. Pelo que o presente facto deve ser dado como não provado, ou, em alternativa deve passar a ter a seguinte redação: O poço de água situa-se no terreno que foi aterrado pelo Réu.
86. Os Autores não se conformam, nem conseguem percecionar como é que os factos b, d, e, f, g, h, i, j, k, w, yy, zz,, bbb, ccc, ddd, eee, fff, ggg, hhh, iii, jjj, lll, mmm, nnn,ooo, ppp, qqq e rrr foram dados como não provados:
87. Os Autores não se podem conformar com o facto Tribunal a quo ter considerado como não provado que: b) “a habitação do motorista era habitável e habitada, tinha água canalizada do poço existente no prédio;
88. Ora, o relatório pericial (fls. 215 a 277 dos autos) realizado no âmbito dos presentes autos a propósito do facto b) dado como não provado, considerou que existem indícios de que o edifício possuía rede de saneamento e abastecimento de água (vide resposta aos quesitos 17 e 19 do item Garagem e habitação do motorista). Igualmente, o perito considerou que o edifício possuía instalação elétrica (vide resposta aos quesitos 15 e 16 do item Garagem e habitação do motorista). Mais, pelas respostas aos quesitos 3, 5, 8, 9, do item Garagem e habitação do Motorista é forçoso concluir que o edifício era dotado de janelas, porta e telhado. Por fim, o mesmo considerou que o edifício em apreço esteve ao abandono por mais de 20 anos (vide resposta ao quesito 26 do item Garagem e habitação do motorista).
89. Ora, se o edifício em apreço não foi afetado pelo fogo (vide resposta ao quesito 23 do item Garagem e habitação do motorista), se o edifício não estivesse ao abandono por mais de 20 anos e se fosse cumprimento o estipulado no RGEU, o edifício encontrar-se-ia em condições de uso e habitabilidade, é forçoso concluir que a habitação do motorista era habitável.
90. Igualmente, se o edifício em apreço possuía rede de saneamento e abastecimento de água é forçoso concluir que o prédio tinha água canalizada.
91. Ora, tendo em conta que o prédio não era servido pelos serviços públicos de água, tendo em conta que a única água existente no prédio provinha do poço sito no prédio e de uma mina situada no exterior do prédio dos Autores, era forçoso o Tribunal a quo concluir que a habitação do motorista era servida por água proveniente do poço ou da mina de água que servia o prédio, pois não haveria outra força do edifício ser servido por água.
92. Agora passemos à análise da prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento.
93. O Autor em sede de declarações de parte disse que todo prédio, inclusive a casa do motorista, tinha sofrido obras de reconstrução de forma a toda a propriedade se encontrar em perfeito estado de utilização e conservação. Aliás, refere que o seu tio viveu lá até à sua morte. Ora, o tio do Autor J. F. faleceu no mesmo ano que a propriedade foi entregue aos Réus a título de usufruto, pelo que se toda a propriedade foi alvo de obras e se encontrava em perfeito estado de conservação é forçoso concluir que a habitação do motorista era habitável.
94. Mas, o depoimento do Autor não foi o único a pronunciar-se sobre o estado da propriedade aquando da entrega da mesma aos Réus. Ora vejamos o depoimento da testemunha A. G..
95. A testemunha em apreço explicou ao Tribunal que foi ele quem executou as obras contratadas pelo tio do Autor J. F.
96. O presente depoimento confirma tudo o que foi afirmado pelos Autores, mas não fica por aqui, pois a presente testemunha ainda diz que as obras levadas a cabo pelo tio do Autor J. F. incidiram sobre toda a propriedade e sobre seus edifícios deixando os mesmos em perfeito estado de forma a que as gerações futuras não se vissem obrigadas a gastar dinheiro durante alguns anos.
97. Mas a prova testemunhal não fica por aqui, pois a testemunha de nome R. A., confirmou tudo o até agora afirmado.
98. Este último testemunho afirma sem margem para dúvidas que a quinta sofreu obras, a quinta era dotada de água, que os edifícios que encontravam na propriedade se encontravam em perfeito estado de conservação e eram habitáveis.
99. Posto tudo o que se acaba de expor, deve dado como provado que a habitação do motorista era habitável e habitada, tinha água canalizada do poço existente no prédio.
Os Autores não se podem conformar com o facto Tribunal a quo ter considerado como não provado que: g) os muros encontravam-se em bom estado de conservação, sem quaisquer sinais de deterioração; h) piso encontrava-se bom estado de conservação, limpo e sem sinais de deterioração;”
101. A respeito dos presentes pontos que se esperam ver alterados a prova testemunhal é completamente esclarecedora.
102. O Autor em sede de declarações de parte disse que todo prédio, inclusive os muros e o piso, tinha sofrido obras de reconstrução de forma a toda a propriedade se encontrar em perfeito estado de utilização e conservação. Aliás, refere que o seu tio viveu lá até à sua morte. Ora, o tio do Autor J. F. faleceu no mesmo ano que a propriedade foi entregue aos Réus a título de usufruto, pelo que se toda a propriedade foi alvo de obras e se encontrava em perfeito estado de conservação é forçoso concluir que a habitação do motorista era habitável.
103. Mas, o depoimento do Autor não foi o único a pronunciar-se sobre o estado da propriedade aquando da entrega da mesma aos Réus. Ora vejamos o depoimento da testemunha A. G..
104. A testemunha em apreço explicou ao Tribunal que foi ele quem executou as obras contratadas pelo tio do Autor J. F..
105. O presente depoimento confirma tudo o que foi afirmado pelos Autores, mas não fica por aqui, pois a presente testemunha ainda diz que as obras levadas a cabo pelo tio do Autor J. F. incidiram sobre toda a propriedade e sobre seus edifícios deixando os mesmos em perfeito estado de forma a que as gerações futuras não se vissem obrigadas a gastar dinheiro durante alguns anos.
106. Mas a prova testemunhal não fica por aqui, pois a testemunha de nome R. A., confirmou tudo o até agora afirmado.
107. Este último testemunho afirma sem margem para dúvidas que a quinta sofreu obras e que mesma se encontravam em perfeito estado de conservação, o que implica que os seus muros e piso se encontrassem em perfeito estado.
108. Pelo que, deve ser dado como provado que:g) os muros encontravam-se em bom estado de conservação, sem quaisquer sinais de deterioração; e queh) piso encontrava-se bom estado de conservação, limpo e sem sinais de deterioração;
109. Os Autores não se podem conformar com o facto Tribunal a quo ter considerado como não provado que: d) “na fonte corria água límpida e própria para consumo humano;e) na mina de água jorrava água límpida e própria para consumo humano;f) do poço de água jorrava água límpida e cristalina para rega das culturas existentes na quinta;”
110. De forma a evitar a repetição constante no que concerne à existência de água na quinta remete-se para os pontos anteriores das conclusões recurso, isto no que respeita unicamente à prova da existência de água na quinta.
111. No remanescente, isto é, relativamente à qualidade da água e às propriedades, bem como à sua utilização, o depoimento do Autor, é corroborado pelo documento 15 (fls. 62 dos autos) junto com a Petição inicial, onde se pode ler que o Autor refere nas suas declarações.
112. Mais, se atendermos ao relatório pericial (fls. 215. 277 dos autos) verificamos que os edifícios existentes na quinta eram servidos de rede de água, igualmente, consta do relatório que há um depósito situado no terraço da vacaria que receberia água da mina (vide a este respeito relatório pericial (fls. 215 a 277 dos autos), resposta ao quesito 1 do item água da mina).
113. Obrigatoriamente é forçoso concluir que esta água, ou seja, a água existente na quinta teria de servir para o consumo humano e para rega de cultivo, de outa forma não faria qualquer sentido o tio do Autor J. F. gastar imenso dinheiro para ir buscar água a uma mina situada a mais de 1km da propriedade tendo que efetuar obras de canalização por baixo da estrada nacional 204 (vide quesitos 12 e 14 do item Água da Mina), ou que motivo levar o mesmo a construir a fonte que consta documento 15 (fls. 62 dos autos).
114. Por tudo o exposto, deve se dado como provado que: d) “na fonte corria água límpida e própria para consumo humano; e) na mina de água jorrava água límpida e própria para consumo humano; e f)do poço de água jorrava água límpida e cristalina para rega das culturas existentes na quinta;”
115. Os Autores não se podem conformar com o facto Tribunal a quo ter considerado como não provado que: i) “as ramadas com Ferro em T, apresentavam perfeito estado de conservação; j) os bardos em arame e esteios em granito serviam para dar o suporte necessários às arvores de fruto para as mesmas crescerem adequadamente; k) o caramanchão encontrava-se em bom estado de conservação; w) as culturas da Quinta da ..., referidas nos factos provados nº 18., fossem destinadas à produção para o mercado;”
116. No que aos presentes factos respeita, relativamente à prova do estado de conservação de tudo o constante nos respetivos pontos remetemos para as transcrições e alagações efetuadas nos pontos anteriores.
117. Relativamente ao facto w, as declarações do Autor são confirmadas pelo depoimento de R. A., bem como tendo em conta o constante da douta Sentença (“Das declarações de parte vindas de referir, conjugadas com o depoimento da indicada testemunha e relatório pericial indicado, deram ao Tribunal a imagem global da Quinta da ... como uma propriedade bem cuidada, agricultada e com produção de fruta e vinha destinada à venda,embora não se conseguisse perceber, por falta de prova produzida nesse sentido, as concretas quantidades produzidas e fluxo económico gerado com tais vendas.”) é impossível os Autores compreenderem como é possível que o ponto w da matéria dada como não provada não tenha sido dado como provado. Aliás, a argumentação do tribunal representa um contrassenso. Isto porque, uma coisa é não ser possível apurar as quantidades económicas ou o fluxo económico gerado das vendas outra coisa completamente diferente é decidir que não se destina a produção quando isso resulta inequívoco da prova produzida.
118. Assim, os Autores compreendem que o Tribunal a quo concluam verificar-se um problema de quantificação, quer quanto à quantidade quer quando ao fluxo económico gerado pela venda, mas não podem admitir que se dê como não provado que as culturas em apreço não tivessem como destino a produção de mercado.
119. Em razão dos depoimentos referidos é forçoso concluir que devem ser dados como provados os seguintes factos:i) as ramadas com Ferro em T, apresentavam perfeito estado de conservação; j) os bardos em arame e esteios em granito serviam para dar o suporte necessários às arvores de fruto para as mesmas crescerem adequadamente; k) o caramanchão encontrava-se em bom estado de conservação; e w) as culturas da Quinta da ..., referidas nos factos provados nº 18., fossem destinadas à produção para o mercado;.
120. Os Autores não se podem conformar com o facto Tribunal a quo ter considerado como não provado que: bbb) “O facto nº 26., dos factos provados causou frustração aos Autores. ccc) (…) sentiram-se desrespeitados e enganados. ddd) Os Autores receavam deslocar-se ... devido ao gozo e comentários depreciativos que se ouviam nos cafés nas imediações do seu prédio.eee) Os Autores sofreram de ansiedade, privações de sono e perda de apetite por se sentirem tristes, por força da humilhação e gozo impostos pelo Réu. fff) Desde a data de colocação dos outdoors, os Autores filhos perderam a coragem de se deslocarem ao seu prédio, devido aos comentários e vexame que sofriam por ocasião de tais deslocações. ggg) Continuamente, os populares que ali se encontravam comentavam de forma audível que “nem no vosso prédio vocês mandam”. hhh) Os Autores entristeceram-se, sentiram perturbações de ansiedade, sono e falta de apetite. iii) A colocação de outdoors pelo Réu provocou a alteração do objeto do usufruto, designadamente, porque o prédio não tinha qualquer fim comercial; jjj) O comportamento do Réu, enquanto usufrutuário, teve única e exclusivamente a intenção de desvalorizar o prédio, obrigando os coautores a venderem ao “desbarato” o prédio; lll) o Réu tenha conhecimento do valor patrimonial e sentimental do prédio para os coautores. mmm) “O Réu atuou com a intenção de destruir por completo o prédio dos Autores. nnn) A atuação do Réu provocou aos Autores sentimento de receio, impotência e medo de não conseguir repor a sua propriedade como se encontrava antes do Réu a destruir; ooo) (…) causou profunda revolta e dor nos Autores, pois o seu prédio sempre pertenceu à sua família. ppp) A conduta do Réu levou os Autores a passarem noites sem dormir;qqq) (…) causou discussões no seio familiar; rrr) (…) obrigou os Autores a deslocarem-se por diversas vezes a Barcelos.”
121. A respeito dos factos transcritos, conforme é natural que aconteça, a prova é feita mediante depoimento de parte, depoimento este que foi realizado pelo Autor J. F. relativamente, aos danos morais e frustração sofridos pelos Autores, sendo confirmado por R. A. e por A. G., que deixaram bem claro que os Autores tinham receio de ir ao prédio em razão das ameaças do Réu marido, conforme passamos a transcrever:
122. Assim, o Tribunal a quo deveria ter dado como provado os factos seguintes: bbb) “O facto nº 26., dos factos provados causou frustração aos Autores; ccc) (…) sentiram-se desrespeitados e enganados. ddd) Os Autores receavam deslocar-se ... devido ao gozo e comentários depreciativos que se ouviam nos cafés nas imediações do seu prédio. eee)Os Autores sofreram de ansiedade, privações de sono e perda de apetite por se sentirem tristes, por força da humilhação e gozo impostos pelo Réu. fff) Desde a data de colocação dos outdoors, os Autores filhos perderam a coragem de se deslocarem ao seu prédio, devido aos comentários e vexame que sofriam por ocasião de tais deslocações. ggg)Continuamente, os populares que ali se encontravam comentavam de forma audível que “nem no vosso prédio vocês mandam”.hhh) Os Autores entristeceram-se, sentiram perturbações de ansiedade, sono e falta de apetite. iii) A colocação de outdoors pelo Réu provocou a alteração do objeto do usufruto, designadamente, porque o prédio não tinha qualquer fim comercial; jjj) O comportamento do Réu, enquanto usufrutuário, teve única e exclusivamente a intenção de desvalorizar o prédio, obrigando os coautores a venderem ao “desbarato” o prédio; lll) o Réu tenha conhecimento do valor patrimonial e sentimental do prédio para os coautores. mmm) “O Réu atuou com a intenção de destruir por completo o prédio dos Autores. nnn) A atuação do Réu provocou aos Autores sentimento de receio, impotência e medo de não conseguir repor a sua propriedade como se encontrava antes do Réu a destruir; ooo) (…) causou profunda revolta e dor nos Autores, pois o seu prédio sempre pertenceu à sua família. ppp) A conduta do Réu levou os Autores a passarem noites sem dormir; qqq) (…) causou discussões no seio familiar; e rrr) (…) obrigou os Autores a deslocarem-se por diversas vezes a Barcelos.
123. Pelo que devem ser alterados os factos dados como provados no sentido de serem retificados nos termos requeridos, ou assim não se entendendo, devem ser alterados para não provados como supra explanado, e igualmente devem alterar-se a resposta dos factos dados como não provados para provados como o exposto, e consequentemente, deve a Douta Sentença ser revogada e substituída por outra que julgue a ação totalmente procedente por provada.
124. Por fim, o Tribunal a quo, com a devida vénia, faz uma errada interpretação do direito no que concerne ao usufruto que cabe aos Autores, por morte A. R., pois entendeu, que a morte do mesmo atribuía o direito de acrescer à esposa, em vez da extinção a favor dos Autores da parte do usufruto que lhe cabia.
125. Entendeu, portanto, que a venda do usufruto ao Réu era um trespasse, o que não corresponde à verdade, conforme se comprova pelas respectivas escrituras juntas aos Autos.
126. Igualmente, tendo em conta a provada dada como provada deveria ter considerado procedente o pedido identificado na retro alínea c) (a entrega do prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., aos Autores pelo mau uso no âmbito do art.º 1482ª do C.P.C.” (negrito e sublinhado nosso).)
127. Mais, considerou que a alteração do fim económico do prédio em razão da ação de divisão de coisa comum que recaiu sobre o prédio é fundamento válido para o não cultivo do mesmo, o que colide com a obrigação legal dos usufrutuários entregarem aos proprietários o prédio sem alterar a substância ou diminuir o valor do prédio que lhes foi entregue.
128. O Tribunal a quo, com o devido respeito que lhe é merecido, entendeu que “O que significa que o falecimento de A. R. em 24.01.2014, no estado de casado, não alterou em nada o direito dos Autores até então existente, uma vez que só por morte da viúva se extingue o direito de usufruto”.
129. Uma vez que, considerou (novamente erradamente) que “O usufruto dos doadores era simultâneo e sucessivo”, o que significa, que os usufrutuários entram na titularidade dele segundo a ordem do título e após a cessação do direito do usufrutuário precedente, ou seja, há um usufrutuário depois do outro.
130. No entanto, o usufruto só era, conforme resulta da matéria provada, simultâneo e sucessivo em relação à escritura de 13.03.1986 em que M. H. e marido A. R. doaram a raiz ou a nua propriedade aos seus filhos M. A. e J. F. – vide ponto 5 al.a) da matéria dada como provada.
131. Ora, na escritura realizada em 06.01.1995, em que M. H. e marido A. R. revogaram a doação ao filho M. A. e esposa, tendo na mesma data (06.01.1995) vendido metade da raiz ou nua propriedade e o usufruto total dos prédios a F. L. (Réu marido),
132. NÃO HÁ QUALQUER MENÇÃO EM QUE OS DOADORES RESERVAM PARA SI O USUFRUTO SIMULTÂNEO E SUCESSIVO DESSES BENS, reservando desde logo metade do usufruto que lhes pertence do prédio inscrito na matriz sob o artigo … urbano, e … e …, rústicos – vide ponto 5 al.a) em confrontação com pontos 7 e 8 da matéria dada como provada.
133. Assim, ao revogarem a doação ao seu filho M. A. e esposa, M. H. e marido tornam-se, ainda que por momentos, proprietários plenos, ou seja, proprietários da raiz e titulares do usufruto total dos prédios.
134. Pelo que, deixam apenas de ser proprietários plenos quando, no mesmo dia, vendem metade da raiz e usufruto total dos prédios ao Réu marido.
135. Assim, o entendimento do Douto Julgador a quo está errado quando julga que “Não se pode afirmar, por isso, que os doadores foram alguma vez proprietários plenos da quinta em apreço nos autos, porque isso não sucedeu.”.
136. Motivo pelo qual deve ser considerado que: a. são os Autores titulares de metade do usufruto em razão da morte de A. R.; b. não assiste à esposa M. H. qualquer direito de acrescer, por não se estar perante qualquer usufruto simultâneo e sucessivo.
137. Portanto, no caso dos autos, não se verifica a situação de trespasse a terceiro regulada no artigo 1444.º do Código Civil. Na medida que, a venda do usufruto foi efetuada diretamente pelo proprietário pleno.
138. Assim, a parte da douta sentença que considera que os Autores não são usufrutuários de 50% do prédio em virtude do falecimento A. R. uma vez que a esposa deste, M. H., tem direito de acrescer na medida que o contrato de compra e vende de usufruto entre estes últimos e o Réu se trata de um trespasse de usufruto, deve ser revogada, e, consequentemente, substituída por outra que declare que os Autores são titulares de metade do usufruto em razão da morte de A. R. e que não assiste à esposa M. H. qualquer direito de acrescer, por não se estar perante qualquer usufruto simultâneo e sucessivo e/ou trespasse.
139. Por outro lado, há que atender à não desobrigação de cultivo do prédio em razão da alteração do fim/capacidade do mesmo
140. Erradamente o Julgador a quo considerou que os Réus a partir do momento que o prédio ficou dotado de capacidade construtiva e viu alterado o seu fim ou destino económico, deixaram de ter obrigação de cultivar e/ou ajardinar.
141. Em primeiro lugar sempre se dirá que conforme resulta da matéria dada como provada os Réus deixaram de cultivar o prédio em 2005 (apesar de conforme deveria constar da matéria dada como provada o mesmo nunca foi agricultado/cultivado após os Réus terem adquirido o usufruto do mesmo), imediatamente após o incêndio.
142. Ora, o prédio em apreço nos autos apenas viu alterado o seu fim com o desfecho da ação de divisão de coisa comum, o que apenas aconteceu em 2014, pelo que, pelo menos até aí, o prédio teria de ser agricultado/cultivado.
143. Mais, o facto de um prédio ser dotado de capacidade construtiva, não impede que o prédio seja cultivado/agricultado no que concerne ao logradouro.
Pois, o prédio que foi adjudicado aos Autores na ação de divisão de coisa comum, prédio esse que se discute nos presentes autos, era dotado de diversos edifícios, bem como era dotado de arbustos, macieiras, videiras e jardins bem tratados.
144. Ora, os Réus, enquanto usufrutuários tem o poder de uso e fruição do prédio, no entanto, também tem o dever de não descurar ou alterar o estado em que o mesmo se encontra. Assim, os mesmos ao não cultivar/agricultar os jardins, pomares e vinhas que lhes incumbia, deveriam ver extinto o usufruto pelo seu não cultivo.
145. Assim, conforme é alegado e comprovado pela perícia, o prédio demorará pelo menos 5 anos no que concerne à cultura e jardins para voltar ao estado em que se encontrava aquando da entrega do mesmo aos usufrutuários, pelo que não podem os Autores ser onerados com tal prejuízo em virtude de apenas e só o fim económico/capacidade do prédio ter sido alterada em razão da ação de divisão de coisa comum.
146. Pelo que, deve a douta decisão do Tribunal a quo ser revogada, e, consequentemente, ser substituída por outra que declare extinto o usufruto a favor dos Réus.
147. Por fim, relativamente, ao Mau Uso do Prédio o douto Tribunal a quo desconsiderou por completo o mau uso do prédio, que no caso em apreço se verifica por omissão dos deveres de cuidado da propriedade de que os Réus tinham usufruto total (até 24.01.2014), prédio esse que é propriedade dos Autores. Os Réus, conforme resulta demonstrado da matéria dada como provada, bem como da matéria que se espera ver alterada em razão do presente recurso, diminuíram o valor do prédio, danificaram e deram mau uso ao prédio por omissão dos deveres de cuidado, nomeadamente: deveres de limpeza do prédio, deveres de cultivo do prédio e obrigação de proceder às reparações ordinárias.
148. Ora próprio Tribunal a quo considerou provados nos factos 22 e 23 dos factos dados como provados que os Réus nunca efetuaram quaisquer obras nos edifícios, no entanto, entendeu que face essa realidade os Réus não deveriam ser condenados à extinção do usufruto do Réu sob o prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., pela perda total do mesmo, ou em alternativa, à entrega do prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., aos Autores pelo mau uso no âmbito do art.º 1482ª do C.P.C.” (negrito e sublinhado nosso).
149. Ora, dispõe o art. 1476.º do Cód. Civil sobre as causas de extinção do usufruto. Entre estas não figura o “mau uso”. A este propósito, esclarece o enunciado do art. 1482.º do Cód. Civil (mau uso por parte do usufrutuário) que “o usufruto não se extingue, ainda que o usufrutuário faça mau uso da coisa usufruída”.
150. Estabelece, ainda, a artigo acabado de referir que, “se o abuso se tornar consideravelmente prejudicial ao proprietário, pode este exigir que a coisa lhe seja entregue, ou que se tomem as providências previstas no artigo 1470.º, obrigando-se, no primeiro caso, a pagar anualmente ao usufrutuário o produto líquido dela, depois de deduzidas as despesas e o prémio que pela sua administração lhe for arbitrado”. O prejuízo considerável referido na lei dirige-se ao direito de propriedade, isto é, refere-se a uma agressão à propriedade - e não, por exemplo, a direitos de personalidade do proprietário.
O valor (real consistência) do direito de propriedade é atingido pelo uso que o usufrutuário dá à coisa. A norma em causa tutela, pois, a “segurança do direito de propriedade”
151. O “prejuízo considerável do proprietário dar-se-á, sem dúvida, quando a cousa usufruída se encontrar em tal estado que, no fim do usufruto, o proprietário não poderá receber as mesmas quantidade e qualidade de frutos, que no início do usufruto se podiam colhêr”
152. No limite, poder-se-á aceitar que os fins do uso, quando sejam ilícitos, desonestos ou criminosos, possam constituir uma forma relevante de “mau uso” - se puderem afetar, por exemplo, o valor locativo do bem -, mas não a mera ocorrência de comportamentos ilícitos no interior de um imóvel, estranhos ao fim que lhe é dado (meramente habitacional).
153. “embora os códigos estrangeiros façam, no geral e a título exemplicativo, os tipos de actos reveladores do mau uso, o artº 1482º abstevese intencionalmente de o fazer, limitando-se a apontar, em termos bastante vagos, para o efeito desses actos sobre o direito do proprietário, mais referindo que é matéria em que se julgou conveniente não coarctar a necessária liberdade de apreciação do tribunal em face das circunstâncias concretas da situação, muito variáveis de caso para caso. Desde a falta de obras de conservação, a omissão de reparações ordinárias, não prevenção de certos riscos...” (negrito e sublinhado nosso).
154. Assim é entendimento que, apesar do legislador não ter previsto taxativamente quais as causas que por mau uso do prédio por parte do usufrutuário importam à entrega do prédio ao seu proprietário, é unânime que quando se verificar um prejuízo considerável, sendo este provado em julgamento deverá o usufrutuário ser condenado a proceder à entrega do prédio.
155. No presente caso, quer quanto da matéria que foi dada como provada resultam claros prejuízos consideráveis por negligência e omissão de deveres de cuidado, sem prejuízos dos factos cuja alteração se requer por intermédio do presente recurso, e, ainda assim, o Tribunal a quo considerou improcedente o pedido de entrega do prédio formulado pelos Autores.
156. O Relatório Pericial (fls 215 a 277 dos autos) efetuado no âmbito dos presentes autos é unânime ao afirma que se fosse cumprido o dever de conservação por parte dos Réus e fossem realizadas as obras de reparação ordinárias os edifícios não se encontrariam degradados e em risco de derrocada com forma se encontram.
157. Mais, só o facto dado como provado n.º 34, isto é, “entre a data do acidente (em13.03.2005) e a da realização da transação (12.03.2010) no âmbito do processo identificado em 30., o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono ...” seria o bastante para que a decisão do douto Tribunal a quo fosse em sentido diverso da decisão proferida. Conformes o Autores defendem, alegam e provaram, essa não é a verdade, pois o prédio sempre esteve ao abandono desde que os Réus tomaram o prédio de usufruto, mas de todo modo, é inadmissível que durante o lapso de tempo dado como provado no âmbito dos presentes autos o prédio tenha estado em completo abandono.
158. Aliás, nesse período, não existia qualquer razão para não se proceder ao cultivo do prédio ou às reparações ordinárias/dever de conservação dos anexos (vacaria, pocilga, alambique, casa do motorista, garagem, catavento), pois, conforme se deixou melhor explanado nas alegações do presente recurso a respeito do ponto 32 dos factos dados como provados (vide A.3.2.), só a casa principal, a casa do caseiro (anexo) e 90 metros do muro foram afetados pelo incêndio provocado pelo acidente.
159. Ora, conforme postula o Artigo 1472.º, sob a epigrafe “Reparações ordinárias”, no seu n.º 1 estabelece que “Estão a cargo do usufrutuário tanto as reparações ordinárias indispensáveis para a conservação da coisa como as despesas de administração”. Por sua vez o n.º 3 do citado preceito estipula que “O usufrutuário pode eximir-se das reparações ou despesas a que é obrigado, renunciando ao usufruto.”. Posto isto, verifica-se que o douto Tribunal a quo em razão da matéria dada como provada deveria ter considerado que os Réus estavam obrigados a proceder às reparações ordinários dos edifícios durante o período do usufruto de forma a evitar que os anexos existentes no prédio se encontrem praticamente em ruínas e em risco de derrocada eminente dos telhados e paredes como esclarece a perícia.
160. Aliás, ainda que por mera hipótese académica se entendesse que os Réus, enquanto usufrutuários, não seria obrigados a proceder às reparações/obras necessárias no prédio em virtude de serem de caracter extraordinário, certo é que no caso, de se terem tornado necessárias por virtude da sua má administração. Ora, no causo dos autos foi o que efetivamente aconteceu, os Réus deixaram o prédio ao abandono como resulta da matéria dada como provado. Conjugando os factos de o prédio ter sido entregue em bom estado de conservação aos Réus, o Relatório Pericial (fls. 215 a 277 dos autos) considerar que os prédios as edificações existentes (não afetadas pelo incêndio) não sofreram quaisquer obras de manutenção/reparação e o facto que os edifícios se encontraram em risco de derrocada iminente, é forçoso concluir que os Réus fizeram má utilização – A este propósito vide Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 13-12-2001, proc. n.º 0131488, disponível em dgsi.pt.
161. A este propósito os Autores alegaram e provaram como lhes competia, pelo que não se percebe a douta sentença que ora se recorre ao absolver os réus do pedido de entrega do prédio pelo seu mau uso. Aliás, o próprio Tribunal a quo considerou provados nos factos 22 e 23 dos factos dados como provados que os Réus nunca efetuaram quaisquer obras nos edifícios.
162. Além do mais, nesse período o prédio dos Autores ainda não se tinha sofrido a alteração para parcela urbana, pelo que não se existia qualquer razão para o não cultivo do mesmo. Em boa verdade, os Autores, entendem, conforme já deixaram patente nas suas alegações que, a alteração do fim económico do prédio de rústico para urbano em nada importa ao cultivo ou não do prédio, pois os Réus, enquanto usufrutuários, tem de entregar o prédio aos Autores, no mesmo estado que este lhes foi entregue. Logo, se o prédio quando lhes foi entregue era ajardinado, tinha árvores de fruto e vinha, o prédio tem de ser entregue nesse estado. No entanto, a explanação que se acaba de fazer efetuou-se com o intuito de frisar que a argumentação da douta sentença que ora se recorre não tem nexo, ao não considerar que neste período os Réus não fizerem um mau uso do prédio, pois o argumento que estariam desobrigados ao cultivo pela alteração do fim económico do prédio não colhe fundamento neste período.
163. Por tudo o agora exposto, deve a douta decisão proferida que ora se recorre ser revogada, e, consequentemente, ser alterada por uma que condene os Réus entregarem o prédio aos Autores pelo mau uso nos termos do art.º 1482.º do Código Civil.

TERMOS EM QUE,

Deve dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença, com as legais consequências, substituindo-se por outra que declare:

a) a extinção do usufruto do Réu sob o prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., pela perda total do mesmo, ou em alternativa,
b) extinção do usufruto do Réu sob o prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., pelo não cultivo do mesmo por mais de 20 anos, ou em alternativa,
c) a entrega do prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., aos Autores pelo mau uso no âmbito do art.º 1482ª do C.P.C.”
*
Os réus contra-alegaram tendo apresentado as seguintes conclusões:

“1) A sentença proferida nestes autos, em primeira instância, não merece as críticas e reparos trazidos a este recurso mostrando-se conforme os factos e a eles aplicando corretamente o direito.

Em suma: decidiu bem

2) Os recorrentes não cumpriram o ónus de concluir de forma sintética e apresentaram 163 longas conclusões que mais não são que a repetição, in totum, de tudo quando antes tinham escrito
3) Os réus adquiriram em 1995 metade da raiz e a totalidade do usufruto do prédio genericamente designado como Quinta da ... aos pais do autor J. F.
4) Estes, antes desta venda, haviam doado a raiz ou nua propriedade do mesmo prédio aos seus dois filhos, o aqui autor e seu irmão M. A.
5) Reservando para si o usufruto simultâneo e sucessivo desses bens doados
6) E antes de celebraram a venda supra referida em 3) os pai do autor J. F. revogaram a doação do filho M. A., o que lhes permitiu a venda nas condições referidas em 3) aos ora réus F. L. e mulher
7) No ano de 2005 os ora réus / recorridos, intentaram contra o aqui autor J. F. e mulher, uma acção de divisão de coisa comum que correu termos com o número 3608/05.4TBBCL do 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Barcelos
8) Acção essa que terminou na divisão da “Quinta da ...” em 3 lotes A,B e C), um deles vendido (lote B) por meio de propostas em carta fechada e adquirido pelo ora réu F. L..
9) Os outros dois lotes (A e C) sorteados entre autores e réus (da presente acção), tendo sido adjudicada a parte urbana aos aqui autores (lote C) no ano de 2014 e a parte rustica (lote A) na mesma data aos ora réus.
10) Estes dois lotes tiveram valor equivalente, atribuída em peritagem no âmbito do processo de divisão de coisa comum, atento o facto de a parte urbana ter sido considerada como terreno para construção e sem construções, em consequência do acidente de viação sofrido no ano de 2005 pela propriedade
11) Acidente de viação ocorrido em 15 de março de 2005, consubstanciado no capotamento de um camião cisterna de transporte de combustível, que destruiu por completo a casa de habitação, anexos e demais construções, os muros e portões da propriedade e toda a envolvência da mesma
12) E por causa disso os ora autores/ recorrentes receberam, como sua parte desses estragos, da depreciação da parte urbana da propriedade e, no fundo, da transformação daquele “lote” em apenas terreno para construção, da seguradora Companhia de Seguros ..., SA, a quantia de 200.000,00 €
13) Mesmo que qualquer responsabilidade ou culpa dos ora recorridos tivesse causado dano no prédio adjudicado aos autores, ora recorrentes (o que apenas por hipótese de retórica se consente ser possível), seria o usufrutuário (a mãe, avó e sogra dos autores) quem responderia por esses danos
14) Sendo certo que adquirida em 1995 pelos ora recorridos, usufruída em pleno durante 10 anos pelos mesmos (até 2005), a parte urbana esteve em escombros até 2010 e foi adjudicado aos autores em 2014
15) Tudo quanto consta nas longas conclusões trazidas pelos recorrentes aos autos em nada infirma o constante da sentença aqui posta em crise
16) Que assim se deve manter, improcedendo o recurso apresentado”
*
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito devolutivo.
*
Foi proferido despacho que considerou não haver motivo para rejeição do recurso por falta de conclusões nem se justificar o convite ao aperfeiçoamento das mesmas.
*
Foram colhidos os vistos legais.

OBJETO DO RECURSO

Nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC, o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado ao Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso, sendo que o Tribunal apenas está adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso.
Nessa apreciação o Tribunal de recurso não tem que responder ou rebater todos os argumentos invocados, tendo apenas de analisar as “questões” suscitadas que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, excetuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.
Por outro lado, o Tribunal não pode conhecer de questões novas, uma vez que os recursos visam reapreciar decisões proferidas e não analisar questões que não foram anteriormente colocadas pelas partes.

Neste enquadramento, as questões relevantes a decidir, elencadas por ordem de precedência lógico-jurídica, são as seguintes:

I – alteração da matéria de facto;
II – extinção do usufruto sobre o prédio por perda total;
III – extinção do usufruto sobre o prédio por não cultivo há mais de 20 anos;
IV – entrega do prédio por mau uso.

FUNDAMENTAÇÃO

FUNDAMENTOS DE FACTO

Na 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos:

1. Em 16.06.1973, A. B. vendeu por escritura pública a A. R. e mulher M. H., a raiz ou a nua propriedade dos seguintes prédios:
a) Casa com dois pavimentos, eirado, estabulo, garagens, adega, arrecadações e quintal, no lugar da ..., a confrontar do Norte com M. O. e do poente com estrada municipal, prédios descritos na conservatória de registo predial do concelho ... sob n.º ... e seis e ..., no livro B – 95, e inscrito na matriz sob o artigo ... urbano, e ... e ..., rústicos;
b) Campo ..., de lavradio, descrito na citada conservatória sob o n.º ..., no livro B 187, e inscrito na matriz rústica sob o artigo ....
c) O conjunto dos prédios antes identificados formam a denominada Quinta da ....
2. A venda referida em 1., incluiu a água do subsolo.
3. Na mesma escritura, A. B., vendeu o usufruto vitalício, dos identificados prédios a M. C. e mulher e E. C..
4. E. C. faleceu em 19.11.1983, sobrevindo-lhe marido M. C..
5. Em 13.03.1986 M. H. e marido A. R. doaram a raiz ou a nua propriedade aos seus filhos M. A. e J. F.. Na escritura de doação foi acordado entre os outorgantes que:
a) extinguindo-se o usufruto de M. C., fosse qual fosse o motivo, os doadores reservam para si o usufruto simultâneo e sucessivo desses bens, reservando desde logo metade do usufruto que lhes pertence do prédio inscrito na matriz sob o artigo ... urbano, e ... e ..., rústicos;
b) cada um dos donatários fica obrigado a conservar a parte que lhes é doada dos bens descritos, por sua morte, a favor dos respetivos filhos.
6. Em 20.09.1994, faleceu M. C..
7. Em 06.01.1995, M. H. e marido A. R. revogaram a doação ao filho M. A. e esposa.
8. Na mesma data (06.01.1995) venderam metade da raiz ou nua propriedade e o usufruto total dos prédios identificados em 1., a F. L. (Réu marido).
9. No âmbito da ação de divisão de coisa comum que correu termos sob n.º 3608/05.4TBBCL no Tribunal Judicial de Barcelos, 3º Juízo Cível em 09.07.2013 retificada em 20.01.2014, a dita Quinta da ... foi dividida em três partes:
a) lote rústico do prédio denominado Quinta da ... - parcela A), que foi adjudicado ao Réu;
b) prédio indivisível - parcela B) foi vendido por meio de propostas em carta fechada ao Réu;
c) lote urbano do prédio denominado quinta da ... - parcela C), foi adjudicado aos Autores).
10. O lote urbano (parcela C) foi desanexado do prédio descrito na conservatória predial ... sob o n.º … e, deu origem ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ...º, descrito na conservatória de registo predial ... sob o n.º ..., composto de terreno para construção com a área de 5466, desanexado do prédio ....
11. O lote rústico (parcela A) foi registado na conservatória de registo predial ..., mantendo a descrição n.º … da descrição
12. Em 24.01. 2014, faleceu A. R..
13. Em 22.05.2015, foram expropriados 969m2 do prédio identificado em 9.c).
14.O prédio identificado em 1., era 06.01.95 era composto pelas edificações seguintes: a) garagem e habitação do motorista; b) vacaria e eira no piso superior; c) pocilga; d) anexo destinado a alambique; e) catavento; f) poço de água; g) fonte; h) mina de água com nascente a 1 km de distância, com depósito mãe e depósito recetor final; i) muros de 1 metro e 1,5 metros; j) o piso térreo era calcetado em cubos de granito assentes em massame e guias em granito; k) bardos em com arame e esteios em granito; l) ramada com ferro em T, arame e esteios em granito; m) um caramanchão; n) casa principal, casa de caseiro e arrumos.
15.Tais edificações, encontravam-se, em 06.01.1995, em bom estado de conservação.
16. A habitação do motorista, garagem, vacaria, eira no piso superior, pocilga, anexo destinado ao alambique, caramanchão e catavento encontravam-se funcionais.
17. Existiam dois cedros com muitas dezenas de anos.
18. O prédio denominado Quinta da ... em 06.01.1995, era composto por vinha em ramada com ferro em T.
19. Na data da doação referida em 5) aos Autores, existiam no prédio identificado em 1., os equipamentos seguintes:
a) caramanchão;
b) portões de ferro no interior do prédio;
c) alambique em cobre.
20. A Câmara Municipal de ... notificou o Réu para repor as cotas do terreno do prédio identificado em 1), na sequência de um aterro por si realizado sem licenciamento;
21. (…) ordenou ao Réu a limpeza do prédio.
22. O Réu não efetuou as obras de reparação:
23.a) na garagem e habitação do motorista;
b) vacaria e eira;
c) pocilga;
d) anexo destinado ao alambique,
e) catavento que se encontra em risco de derrocada.
f) a habitação do motorista, vacaria e eira, pocilga, anexo destinado ao alambique, demandam obras com o custo estimado de € 53.300,00 (13.050€ + €31.200,00 + €4850,00 + €4.200).
24. A mina necessita de trabalhos de limpeza, abertura e fecho de valas, reparação de condutas, depósito mãe e do depósito recetor final.
25. A limpeza da mina, abertura e fecho de valas, reparação de condutas, reparação de depósito mãe e reparação do depósito recetor final e todos os trabalhos e materiais necessários a que a água volte a jorrar na propriedade, tem o custo estimado de € 35.500,00 + IVA.
26. Os Réus colocaram dois outdoors publicitários no prédio identificado em 9.b) e 10.
28. Os autores receberam da Companhia de Seguros ..., SA, em março/abril de 2010 a quantia de € 200.000,00 a titulo de indemnização pelos danos causados no prédio urbano com o artigo matricial ...º identificado em 1), pelo acidente ocorrido em 15.03.2015.
29. Em 15.03.2005 houve um acidente, consubstanciado no capotamento de um camião cisterna de transporte de combustível, que destruiu por completo a casa de habitação, anexos e demais construções, os muros e portões da propriedade e toda a envolvência da mesma do prédio identificado no nº 1.
30. Na ação intentada pelos Autores contra a Companhia de Seguros ..., S.A (proc. nº 1015/08.6TBBCL do 3º Juízo Cível do extinto Tribunal Judicial da Comarca de Barcelos, que correu termos juntamente com ação intentada pelos Réus contra a mesma seguradora, proc. nº 692/08.6TBBCL do mesmo juízo e Tribunal), foi realizada perícia.
31. (…) o perito nomeado pelo Autor marido e esposa foi o Eng. R. A..
32. (…) no relatório pericial, subscrito unanimemente pelos peritos, foi respondido o quesito: “(…) O embate aludido destruiu o prédio pertença dos Autores e respetivos anexos, bem como o muro de vedação, que se encontrava em bom estado de conservação e condições de habitabilidade antes da data do acidente? R: sim.”
33.(…) que não era possível a reconstrução da habitação, atentos os condicionalismos legais resultantes da necessidade de cumprir o afastamento de 20 metros ao eixo da estrada e ainda atestaram a composição da casa principal e anexos.
34. Entre a data do acidente (em 15.03.2005) (1) e a da realização da transação (12.03.2010) no âmbito do processo identificado em 30., o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, atento o estado de escombros.
35. Desde 15.03.2005 que o prédio “Quinta da ...” deixou de ter qualquer uso por se ter transformado terreno apto a construção.
36. As Estradas de Portugal, S.A., expropriaram 969 m2 do lote que viria a ser adjudicado aos Autores no processo de divisão de coisa comum que correu termos sob o nº 1145/15.8T8BCL do Juízo Local Cível de Barcelos, Juiz 1.
37. Aquando da posse administrativa da parcela expropriada e no seguimento das obras de construção da rotunda atualmente lá existente, a empreiteira obras públicas X - M. P., Construções, Lda., instalou o estaleiro de construção civil, aparcou camiões, máquinas de aterro e desaterro, pedras, britas, cimentos, areias e demais, no prédio identificado nos autos.
38. Os Réus instauraram o procedimento cautelar de restituição provisória de posse (processo nº 1919/14.7TBBCL do 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Barcelos), que foi julgado procedente.
39. Aquando da posse administrativa pela Estradas de Portugal da identificada parcela de terreno e no decurso das obras realizadas pela tal M. P. Construções, Lda., o Autor marido levou dali e transportou-os para outra sua propriedade suas:
- todas as pedras do muro de vedação face à estrada nacional;
- todas as pedras;
- os esteios e ferros de ramadas e outros lá existentes;
- o piso em cubo de granito existente no local;
- grades em ferro,
- portões em ferro,
40. O alambique foi furtado e o Réu marido apresentou queixa à GNR contra desconhecidos.
41. Os pais do Autor marido cederam a água ao réu, permitindo-lhe fazer o negócio dela que bem entendesse, por procuração irrevogável lavrada no dia 7.03.1995 no Cartório Notarial do Marco de Canaveses.
42. Quando os Réus celebraram negócio com os pais do Autor residiam em Marco de Canaveses, não se encontrando a casa da Quinta da ... habitada.
43. A propriedade no seu conjunto apresentava-se sem culturas de produção.
44. O poço de água situa-se no terreno expropriado pela Estradas de Portugal.
45. A peritagem – levada a cabo na divisão de coisa comum equivaleu os lotes nas condições em que estão hoje acrescida, apenas, da parte urbana posteriormente expropriada.
46. Os Réus tiveram conhecimento pela publicidade feita no prédio identificado em 1., (placa a dizer vende-se) que a propriedade se encontrava à venda e, nessa sequência vieram a adquirir metade da nua propriedade e o usufruto do prédio em discussão nos autos.

Foram considerados não provados os seguintes factos:

a) as edificações descritas em 14. dos factos provados valessem em 06.01.1995 pelo menos €200,000,00;
b) a habitação do motorista era habitável e habitada, tinha água canalizada do poço existente no prédio;
c) a habitação do motorista, garagem, a vacaria e a eira no piso superior, a pocilga, o anexo destinado ao alambique, caramanchão e catavento encontravam-se sem qualquer sinal de deterioração;
d) na fonte corria água límpida e própria para consumo humano;
e) na mina de água jorrava água límpida e própria para consumo humano;
f) do poço de água jorrava água límpida e cristalina para rega das culturas existentes na quinta;
g) os muros encontravam-se em bom estado de conservação, sem quaisquer sinais de deterioração;
h) piso encontrava-se bom estado de conservação, limpo e sem sinais de deterioração;
i) as ramadas com Ferro em T, apresentavam perfeito estado de conservação;
j) os bardos em arame e esteios em granito serviam para dar o suporte necessários às arvores de fruto para as mesmas crescerem adequadamente;
k) o caramanchão encontrava-se em bom estado de conservação;
l) a vinha, facto provado 18.a, tinha uma produção anual de 2500 quilos e, por conseguinte, que essa produção tivesse o valor de mercado €1.500,00;
m) existia um pomar com 47 macieiras;
n) (…) setenta e oito (78) pessegueiros;
o) (…) quatro (4) laranjeiras em bardo com arame e esteios em granito;
p) (…) uma (1) ameixoeira em bardo com arame e esteios em granito;
q) (…) cinquenta (50) limoeiros em bardo com arame e esteios em granito;
r) (…) um (1) castanheiro em bardo com arame e esteios em granito;
s) Na doação aos Autores referida em 5) tivessem sido incluídos os seguintes equipamentos: quatro (4) os bancos de jardim em granito com 1,5 de comprimento, com valor de mercado atual de €2.000,00;
t) (…) a mesa redonda de jardim em granito com 1,5 m de diâmetro, com o valor de mercado atual de €400,00;
u) (…) seis (6) vasos em betão a encimar pilares em granito, com um valor de mercado atual de € 300,00;
v) (…) o caramanchão do facto provado 19.e, tivesse cobertura em estrutura de madeira, incluindo escadas e guardas laterais em betão moldado;
w) as culturas da Quinta da ..., referidas nos factos provados nº 18., fossem destinadas à produção para o mercado;
x) os cedros referidos no facto provado 18.b, tivessem cerca de 70 cm de diâmetro no tronco e cerca de 80 anos de idade e o valor atual de mercado €800,00 ano.
y) Na doação aos Autores referida em 5) tivessem sido incluídos os seguintes equipamentos e materiais/utensílios agrícolas: moinho elétrico, em pedra, com um valor de mercado atual de €1.500,00;
z) alambique em cobre, com o valor de mercado atual de €5.000,00;
aa) maquina de extrair leite, com valor de mercado atual de €1.000,00
bb) equipamento de lavagem e de desinfeção da vacaria, com valor de mercado atual de €350,00;
cc) motores de rega com 5 cavalos, com valor de mercado atual de €800,00;
dd) vasilhame de transporte de leite, com valor de mercado atual €250,00;
ee) um depósito de 500ml, frese, grade, arado e atrelado de engatar o trator, com valor atual de €5.000,00;
ff) dois (2) motores de rega com 5 cavalos, com valor de mercado atual de €800,00;
gg) dois (2) tubos plásticos com 7 metros para sucção de água do poço, com valor de mercado atual de € 210,00;
hh) duas (2) pinhas em cobre em poço de água, com valor de mercado atual de €300,00;
ii) um (1) tubo plástico com aspersores incorporados (metros lineares), no valor de €1.500,00;
jj) uma (1) prensa, com valor atual de mercado de €800,00;
kk) alfaias agrícolas, enxadas, pás, gadanhos, forquilhas, engaços e motosserra, com valor atual de €1000,00.
ll) O prédio dos Autores em 06.01.1995, no seu conjunto de edificações, bens móveis e cultura existente, tivesse o valor, pelo menos, de €292.127,17.
mm) O réu impediu e ameaçou os Autores de entrar no prédio no período compreendido entre 06.01.995 e setembro de 2017.
nn) O estado prédio urbano através do exterior dos muros, aquando das suas visitas a Barcelos;
oo) (…) quando eram informados por vizinhos que ali passavam,
pp) (…) através da Câmara Municipal de ....
qq) Até outubro de 2017 Autores apenas tiveram conhecimento que o prédio tinha: sofrido alterações de cotas, estava cheio de entulho, coberto de silvas e mato e as edificações encontravam-se em ruínas; rr) (…) o cata vento existente no prédio encontra-se em mau estado de conservação.
ss) Foram extraviados equipamentos do prédio descrito em 1., no valor de €35.237,1 por culpa dos Réus.
tt) O prédio urbano gerava €12.440,00 de frutos anuais e deixou de produzir pelo não cultivo e destruição do prédio por parte do Réu.
uu) O Réu destruiu por completo a ramada com ferro em T, arame e esteios em granito, bardos em arame e esteios em granito.
vv) A reconstituição da situação anterior relativa às culturas custará aos Autores de €35.520,00.
ww) Pelo menos durante 5 anos os Autores ficarão privados de usufruir da produção da vinha e das arvores de fruto.
xx) O Réu destruiu muros de vedação;
yy) (…) cubos de granito assentes em massame por força da remodelação de terrenos efetuada;
zz) (…) ramadas, os bardos e o caramanchão,
aaa) O Réu, propositadamente destruiu a linha de água de mina com nascente a um (1) km de distância.
bbb) O facto nº 26., dos factos provados causou frustração aos Autores.
ccc) (…) sentiram-se desrespeitados e enganados.
ddd) Os Autores receavam deslocar-se ... devido ao gozo e comentários depreciativos que se ouviam nos cafés nas imediações do seu prédio.
eee) Os Autores sofreram de ansiedade, privações de sono e perda de apetite por se sentirem tristes, por força da humilhação e gozo impostos pelo Réu.
fff) Desde a data de colocação dos outdoors, os Autores filhos perderam a coragem de se deslocarem ao seu prédio, devido aos comentários e vexame que sofriam por ocasião de tais deslocações.
ggg) Continuamente, os populares que ali se encontravam comentavam de forma audível que “nem no vosso prédio vocês mandam”.
hhh) Os Autores entristeceram-se, sentiram perturbações de ansiedade, sono e falta de apetite.
iii) A colocação de outdoors pelo Réu provocou a alteração do objeto do usufruto, designadamente, porque o prédio não tinha qualquer fim comercial;
jjj) O comportamento do Réu, enquanto usufrutuário, teve única e exclusivamente a intenção de desvalorizar o prédio, obrigando os coautores a venderem ao “desbarato” o prédio;
kkk) (…) através de interposta pessoa apresentou propostas de compra da propriedade aos Autores;
lll) o Réu tenha conhecimento do valor patrimonial e sentimental do prédio para os coautores.
mmm) O Réu atuou com a intenção de destruir por completo o prédio dos Autores.
nnn) A atuação do Réu provocou aos Autores sentimento de receio, impotência e medo de não conseguir repor a sua propriedade como se encontrava antes do Réu a destruir;
ooo) (…) causou profunda revolta e dor nos Autores, pois o seu prédio sempre pertenceu à sua família.
ppp) A conduta do Réu levou os Autores a passarem noites sem dormir;
qqq) (…) causou discussões no seio familiar;
rrr) (…) obrigou os Autores a deslocarem-se por diversas vezes a Barcelos.
sss) Os Réus tivessem, além da providencia cautelar (facto provado em 38.) procedido à notificação judicial avulsa, entre outro, dos ora Autores marido e mulher
ttt) No procedimento cautelar referido nos factos provados em 38. o legal representante da empresa M. P. Construções, Lda., declarou que o Autor marido autorizou a instalação do estaleiro no prédio e que não tinham sido informados de que os Réus eram usufrutuários.
uuu) Em 1995, não existia alambique a funcionar e nunca produziram vinho.
vvv) A Cooperativa Elétrica do ... após o sinistro de 2005 levantou do imóvel os quadros elétricos e demais elementos.
www) O réu marido fez alguns arranjos e inclusive tinha a parte da habitação com uso constante.
xxx) A limpeza da mina, abertura e fecho de valas, reparação de condutas, reparação de depósito mãe e reparação do depósito recetor final e todos os trabalhos e materiais necessários a que a água volte a jorrar na propriedade, custa pelo menos €80.000,00
yyy) A reposição da situação anterior à posse do Réu tenha um custo para os autores de €200.000,00.
zzz) O alambique em cobre, tivesse o valor de mercado atual de €5.000,00.
aaaa) A colocação outdoors publicitários no prédio identificado em 9.b) e 10 tenha sido contra a vontade dos autores.

FUNDAMENTOS DE DIREITO

Cumpre apreciar e decidir.

I – Alteração da matéria de facto

Dispõe o artigo 662.º n.º 1 do C.P.C. que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
A norma em questão alude a meios de prova que imponham decisão diversa da impugnada e não a meios de prova que permitam, admitam ou apenas consintam decisão diversa da impugnada.

Por seu turno, o art.º 640.º do C.P.C. que tem como epígrafe o “ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, dispõe que:

1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”

Como se escreveu no Acórdão deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 19.6.2019 (in www.dgsi.pt):

Importa referir que no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade do julgador ou da prova livre, consagrado no n.º 5 do artigo 607º do CPC (…), segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em conformidade com a convicção que tenha formado acerca de cada um dos factos controvertidos, salvo se a lei exigir para a prova de determinado facto formalidade especial, ou aqueles só possam ser provados por documento, ou estejam plenamente provados, quer por documento, quer por acordo ou confissão das partes.
Sobre a reapreciação da prova impõe-se assim toda a cautela para não desvirtuar, designadamente o princípio referente à liberdade do julgador na apreciação da prova, bem como o princípio de imediação que não podem ser esquecidos no convencimento da veracidade ou probabilidade dos factos. Não está em causa proceder-se a novo julgamento, mas apenas examinar a decisão da primeira instância e respetivos fundamentos, analisar as provas gravadas, se for o caso, e procedendo ao confronto do resultado desta análise com aquela decisão e fundamentos, a fim de averiguar se o veredicto alcançado pelo tribunal recorrido quanto aos concretos pontos impugnados assentou num erro de apreciação.
Em suma, a alteração da matéria de facto pelo Tribunal da Relação tem de ser realizada ponderadamente, em casos excecionais, pontuais e só deverá ocorrer se, do confronto dos meios de prova indicados pelo recorrente com a globalidade dos elementos que integram os autos, se concluir que tais elementos probatórios, evidenciando a existência de erro de julgamento, sustentam, em concreto e de modo inequívoco, o sentido pretendido pelo recorrente. Tal sucede quando a convicção do tribunal de 1.ª instância assentou em erro tão flagrante que o mero exame das provas gravadas revela que a decisão não pode subsistir.

Tendo por base estes critérios, analisemos então se a matéria de facto deve ser alterada nos termos pretendidos pelos recorrentes.

Os recorrentes pretendem que o facto provado nº 10 que tem a seguinte redação:

10. O lote urbano (parcela C) foi desanexado do prédio descrito na conservatória predial ... sob o n.º … e, deu origem ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ...º, descrito na conservatória de registo predial ... sob o n.º ..., composto de terreno para construção com a área de 5466, desanexado do prédio ...

passe a ter a seguinte redação:

10. O lote urbano (parcela C) foi desanexado do prédio descrito na conservatória predial ... sob o n.º … e, deu origem ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ...º, descrito na conservatória de registo predial ... sob o n.º ..., composto de terreno para construção com a área de 6435m2, desanexado do prédio ....

Em suma, discordam da área do prédio considerando que a mesma é de 6435 m2 e não de 5466 m2, como foi dado como provado, uma vez que esta última área decorre do facto de ter ocorrido a expropriação de uma parte do prédio com área de 969 m2.

Analisando a certidão da CRP que se encontra junta aos autos como documento nº 9 da p.i. verifica-se que efetivamente os recorrentes têm razão quanto a este ponto, o qual nem sequer foi questionado pelos réus na sua contestação.
Com efeito, resulta dessa certidão que, aquando da divisão de coisa comum, que ocorreu em 20.1.2014 (cf. certidão junta aos autos como doc.7 da p.i.), a área do imóvel era de 6 435 m 2 e que foi expropriada a área de 969 m2, pelo que a área passou a ser de 5 466 m 2.

Assim, impõe-se reformular a redação do facto nº 10 como se segue:

10. O lote urbano (parcela C) foi desanexado do prédio descrito na conservatória predial ... sob o n.º … e deu origem ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ...º, descrito na conservatória de registo predial ... sob o n.º ..., composto de terreno para construção com a área de 6435m2, desanexado do prédio .... Em 22 de maio de 2015, este prédio sofreu uma alteração na área total, uma vez que foram expropriados 969m2, passando a ter a área total de 5466m2.
*
Os recorrentes pretendem que o facto provado nº 29 que tem a seguinte redação:

29. Em 15.03.2005 houve um acidente, consubstanciado no capotamento de um camião cisterna de transporte de combustível, que destruiu por completo a casa de habitação, anexos e demais construções, os muros e portões da propriedade e toda a envolvência da mesma do prédio identificado no nº 1

passe a ter a seguinte redação:

29. Em 15.03.2005 houve um acidente, consubstanciado no capotamento de um camião cisterna de transporte de combustível, que destruiu por completo a casa de habitação, 1 anexo que correspondia à casa do caseiro e 90 metros de muro que correspondem à parte do muro expropriado para a construção da rotunda, do prédio identificado no nº 1.

Do relatório de peritagem feito pela P & V – P. V., Lda. e do relatório de peritagem efetuado no âmbito das ações que foram intentadas contra a seguradora com vista à indemnização dos danos sofridos com o incêndio causado pelo camião cisterna (documentos juntos com o requerimento ref. 7029362, de 2.5.2018) resulta que o incêndio apenas atingiu a casa de habitação, um anexo com 110 m2 e 98 metros de muro.
Resulta também das fotos juntas com esse requerimento, que não foram impugnadas, que existiam outras edificações que não foram atingidas pelo incêndio, como seja, a casa do motorista, a vacaria, a pocilga e o alambique.
Do relatório da perícia feita nestes autos consta que a garagem e habitação do motorista, a vacaria, a pocilga e o alambique não foram atingidos pelo incêndio de 2005 (cf. quesitos 26, 23, 15 e 23 relativos a tais edificações).
Consta ainda desse relatório, na parte relativa ao incêndio, que os edifícios existentes não demostram sinais de ter sido afetados pelo incêndio de 2005 (cf. quesito 1).
Esta afirmações estão em consonância com os depoimentos de várias testemunhas que referiram que só as edificações da parte da frente do prédio foram afetadas pelo incêndio, sendo que as demais edificações que se situam na parte mais interior não sofreram danos, designadamente as testemunhas R. A., A. C., J. L. e J. C..
Assim sendo, estes elementos probatórios impõem a alteração do facto provado nº 29 que passará a ter a seguinte redação:

29. Em 15.03.2005 houve um acidente, consubstanciado no capotamento de um camião cisterna de transporte de combustível, que destruiu por completo a casa de habitação, 1 anexo com 110 m2 que correspondia à casa do caseiro e 98 metros de muro que correspondem à parte do muro expropriado para a construção da rotunda, do prédio identificado no nº 1.
*
Os recorrentes pretendem que o facto provado nº 32 que tem a seguinte redação:

32. (…) no relatório pericial, subscrito unanimemente pelos peritos, foi respondido o quesito: “(…) O embate aludido destruiu o prédio pertença dos Autores e respetivos anexos, bem como o muro de vedação, que se encontrava em bom estado de conservação e condições de habitabilidade antes da data do acidente? R: sim.”

Passe a ter a seguinte redação:

32. (…) no relatório pericial, subscrito unanimemente pelos peritos, foi respondido o quesito: “(…) O embate aludido destruiu o prédio pertença dos Autores e respetivos anexos, bem como o muro de vedação, que se encontrava em bom estado de conservação e condições de habitabilidade antes da data do acidente? R: sim. Sendo que o anexo que o relatório se refere é 1 anexo com área de 110m2 confinante/paredes meias com a habitação principal que correspondia à casa do caseiro, identificado com a letra F junto à curva no croqui do Auto de Participação de Acidente de Viação da GNR junto como doc. 25.

O facto 32 contém a transcrição do que consta do relatório pericial que está junto aos autos.
O que os recorrentes pretendem que se acrescente não é um facto, mas antes uma interpretação ou explicação do alcance do que consta relatório, o que não é admissível a nível factual. Para efeitos de interpretação do que consta desse relatório sempre se terá de recorrer ao provado no facto 29 supra alterado.
Assim sendo, considera-se que é de manter a redação do facto provado 32.
*
Os recorrentes pretendem que o facto provado nº 34 que tem a seguinte redação:

34. Entre a data do acidente (em 15.03.2005) e a da realização da transação (12.03.2010) no âmbito do processo identificado em 30., o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, atento o estado de escombros.

passe a ter a seguinte redação:

34. A partir da data que o Réu marido comprou o usufruto do prédio (em 06.01.1995) até à presente data, o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, em virtude dos Réus não cuidarem, utilizarem e cultivarem o mesmo.

O tribunal procedeu à audição integral das declarações de parte do autor J. F. e de todos os depoimentos prestados pelas testemunhas na audiência de julgamento. Igualmente analisou todos os elementos documentais que se mostram juntos aos autos.
Do conjunto destes elementos probatórios referidos não resulta de forma alguma a veracidade do facto que os recorrentes pretendem que seja introduzido relativo ao abandono desde 6.1.1995.
A sentença, na parte relativa à fundamentação da matéria de facto, contém uma súmula das declarações de parte e dos depoimentos das testemunhas. Da audição a que se procedeu verifica-se que tal súmula corresponde efetivamente ao que foi declarado pelas pessoas inquiridas. Da referida súmula, para a qual se remete para evitar a transcrição integral, conclui-se que, de modo algum, se pode considerar que de tais meios probatórios resulte que o prédio está ao abandono desde 6.1.1995, data em que foi adquirido pelo réu. Nenhuma testemunha fez tal afirmação. Ao invés, fizeram declarações contrárias, afirmando que, até ao incêndio, o réu usava a casa de habitação, embora não morasse nesse local, fazia a vindima, semeava milho, contratava pessoas para fazerem trabalhos agrícolas na propriedade, fazia festas de aniversário na casa, fazia almoços e jantares aquando da vindima, tendo apenas cessado a utilização após o incêndio ocorrido em 2005. Do mesmo modo, não resulta dos elementos documentais juntos aos autos que o réu tivesse o imóvel ao abandono desde 6.1.1995 e não o usasse.
Assim, revistos todos os meios de prova produzidos, formula este Tribunal da Relação uma convicção em tudo coincidente à do Tribunal a quo.
Com efeito, a fundamentação constante da sentença recorrida é clara e consistente, tendo o tribunal a quo esclarecido como formou a sua convicção, como valorou a prova, como a articulou, e qual a análise crítica a que a submeteu.
Deste modo, porque em sede de julgamento da impugnação da decisão de facto, há de o Tribunal da Relação evitar introduzir alterações quando não seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de um erro de apreciação da prova relativamente aos concretos pontos de facto impugnados, e porque os considerandos invocados pelos apelantes não têm o valor suficiente para conduzir e forçar este Tribunal a introduzir alterações na decisão de facto, inevitável é manter a decisão proferida pelo tribunal a quo e relativa à matéria do facto 34.
*
Os recorrentes pretendem que o facto provado nº 35 que tem a seguinte redação

35. Desde 15.03.2005 que o prédio “Quinta da ...” deixou de ter qualquer uso por se ter transformado terreno apto a construção.

Passe a ter a seguinte redação:

35. Desde a data que o Réu marido comprou o usufruto do prédio (em 06.01.1995) até à presente data, o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, em virtude dos Réus não cuidarem, utilizarem e cultivarem o mesmo.

ou então:

35. Desde 20.01.2014 até à presente data, o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono por parte dos Réus, em virtude do terreno se ter transformado em apto para construção.

Quanto à primeira redação proposta a mesma é exatamente igual à redação que os recorrentes propunham que fosse dada ao facto 34. Ora, já acima se analisou e indeferiu tal pretensão por o facto aí contido não resultar dos elementos probatórios que constam dos autos. Pelas mesmíssimas razões expostas a propósito do facto 34, entende-se que o facto 35 não pode ser alterado no sentido pretendido pelos recorrentes.

Quanto à segunda redação proposta a mesma não pode ser admitida porque no facto 35 a expressão utilizada de “terreno apto para construção” não se refere à noção de classificação jurídica do solo, mas antes à noção comum de solo onde apenas se podia construir, na sequência de as construções anteriormente aí existentes terem ficado em escombros, como referido no facto 34.
Tal conclusão alcança-se da leitura conjugada dos arts. 22º e 23º da contestação onde são alegados os factos que dão origem aos nºs 34 e 35.
Ao invés, a redação proposta pelos autores refere-se à classificação jurídica do solo, e daí ser referida a data de 20.1.2014, que é a data em que se realizou a adjudicação na ação de divisão de coisa comum.
A redação proposta pelos autores refere-se a matéria diferente, além de que, ao implicar um conceito jurídico, não pode constar do acervo factual.
Assim sendo, indefere-se a pretendida alteração do facto provado 35.
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Os recorrentes pretendem que o facto provado nº 39 que tem a seguinte redação:

39. Aquando da posse administrativa pela Estradas de Portugal da identificada parcela de terreno e no decurso das obras realizadas pela tal M. P. Construções, Lda., o Autor marido levou dali e transportou-os para outra sua propriedade suas:

- todas as pedras do muro de vedação face à estrada nacional;
- todas as pedras;
- os esteios e ferros de ramadas e outros lá existentes;
- o piso em cubo de granito existente no local;
- grades em ferro,
- portões em ferro,

seja dado como não provado ou, a não se entender assim, que passe a ter a seguinte redação:

39. Aquando da posse administrativa pela Estradas de Portugal da identificada parcela de terreno e no decurso das obras realizadas pela tal M. P. Construções, Lda., desapareceram da propriedade.

Quanto a esta matéria pronunciaram-se as testemunhas J. L., filho do réu, e L. F., neta do réu.
Ambas as testemunhas confirmaram que os materiais em questão foram levados do prédio e não foi o réu que os levou ou mandou levar. Quanto a quem os levou, J. L. refere que não viu, mas foi-lhe relatado pelo irmão e pelo pai, que presenciaram tais factos, que os materiais tinham sido levados por ordem do autor para uma propriedade sua. Por sua vez, L. F. referiu que viu camiões a retirarem materiais do local e que viu o autor presente enquanto tais operações decorriam, por isso acha que foi por sua ordem que os materiais foram retirados.

Não existem outros depoimentos testemunhais que contrariem esta versão.
Também não existe nenhum documento relativo a esta matéria.
O tribunal a quo fundamentou a sua convicção quanto ao facto 39 precisamente no depoimento das testemunhas indicadas.
Ora, como já referido no supra citado Acórdão deste Tribunal, de 19.6.2019, “a alteração da matéria de facto pelo Tribunal da Relação tem de ser realizada ponderadamente, em casos excecionais, pontuais e só deverá ocorrer se, do confronto dos meios de prova indicados pelo recorrente com a globalidade dos elementos que integram os autos, se concluir que tais elementos probatórios, evidenciando a existência de erro de julgamento, sustentam, em concreto e de modo inequívoco, o sentido pretendido pelo recorrente. Tal sucede quando a convicção do tribunal de 1.ª instância assentou em erro tão flagrante que o mero exame das provas gravadas revela que a decisão não pode subsistir.
Os depoimentos destas testemunhas sustentam a versão que foi dada como provada e não existem outros elementos probatórios que imponham a tomada de decisão diversa.
Como tal, não se justifica que o facto provado 39 seja dado como não provado ou que seja alterada a sua redação.
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Os recorrentes pretendem que o facto provado nº 44 que tem a seguinte redação:

44. O poço de água situa-se no terreno expropriado pela Estradas de Portugal

seja dado como não provado ou, a não se entender assim, que passe a ter a seguinte redação:


44. O poço de água situa-se no terreno que foi aterrado pelo Réu.

A única testemunha que depôs sobre esta matéria foi J. C., genro do réu. O mesmo referiu que a rotunda ocupou parte do tanque e do poço. Prestou um depoimento que nos pareceu credível e isento, pese embora a relação de afinidade que tem com o réu.
Não há outros depoimentos que contrariem esta versão, nem elementos documentais que comprovem o contrário.
Assim, e com base nos critérios que se acabaram de expor a propósito do facto 39, uma vez que o depoimento desta testemunha sustenta a versão que foi dada como provada e não existem outros elementos probatórios que imponham a tomada de decisão diversa, não se justifica que o facto provado 44 seja dado como não provado ou que seja alterada a sua redação.
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Relativamente aos factos dados como não provados e que os recorrentes pretendem que sejam dados como provados, começamos por fazer a análise do valor das declarações de parte prestadas, por se tratar de matéria que vale de forma transversal para todos os factos.
Consideramos que as declarações de parte prestadas pelo autor a propósito da veracidade de diversos factos não são suficientes para, desacompanhadas de outro meio de prova, dar como provados os factos em questão.
Perfilhamos, sobre esta matéria, a tese do princípio de prova segundo a qual as declarações de parte não são suficientes por si só para estabelecer qualquer juízo de aceitabilidade final, podendo apenas coadjuvar a prova de um facto desde que em conjugação com outros elementos de prova.
Com efeito, as declarações de parte que não importem confissão, na medida em que são produzidas por um sujeito processual que tem um interesse manifesto e direto no litígio, são declarações que, por princípio, se têm de reputar como interessadas, parciais e não isentas, não podendo considerar-se suficientes para, desacompanhadas de qualquer outro elemento probatório, sustentarem a prova de factos que são essenciais à procedência da ação.
Assim sendo, embora o autor tenha confirmado diversos factos dados como não provados, entendemos que as suas declarações não permitem a prova dos mesmos, na medida em que tais factos lhe são favoráveis.
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Os recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto b), que foi considerado não provado, o qual tem a seguinte redação:

b) a habitação do motorista era habitável e habitada, tinha água canalizada do poço existente no prédio.

Da leitura do relatório pericial na parte que incidiu sobre a garagem e habitação do motorista, designadamente dos quesitos 1 a 27, não se pode de forma alguma concluir que a habitação do motorista era habitável e muito menos habitada.
Tal não é afirmado em nenhum desses quesitos e do que aí consta não se pode presumir que a casa era habitável e ainda menos que era habitada. De referir que algumas das respostas aos quesitos não contêm a afirmação perentória que os recorrentes lhe atribuem, tendo-se o perito limitado a dizer que admite que sim. Admitir que sim é admitir uma possibilidade, o que não é equivalente a afirmar que sim.
Quanto à existência de abastecimento de água e rede de saneamento, o perito não afirmou que sim, apenas admitiu que sim, como decorre das respostas aos quesitos 17 a 19, sendo que a resposta ao quesito 19 decorre de informações prestadas pelo autor ao perito.
As testemunhas não confirmaram a veracidade deste facto.
Inclusive a testemunha A. G., ao contrário do afirmado pelos recorrentes, não referiu que fez obras na garagem e casa do motorista, antes afirmou que fez obras na casa principal.
O que se pode retirar de útil dos elementos probatórios que contam dos autos é o que já foi dado como provado nos factos 14 a 16; onde já consta que a garagem e habitação do motorista em 6.1.1995 se encontrava em bom estado de conservação e funcional.
Assim sendo, não existem nos autos elementos probatórios que imponham que este facto deva ser dado como provado.
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Os recorrentes pretendem que sejam dados como provados os factos d), e) e f), que foram considerados não provados, os quais têm a seguinte redação:

d) na fonte corria água límpida e própria para consumo humano;
e) na mina de água jorrava água límpida e própria para consumo humano;
f) do poço de água jorrava água límpida e cristalina para rega das culturas existentes na quinta;

Dos elementos documentais e prova testemunhal, resulta, sem grande esforço, que existia água na quinta. Porém, não há nenhuma testemunha que confirme que a água era límpida, cristalina e própria para consumo humano e para rega.
Assim sendo, não existem nos autos elementos probatórios que imponham que estes factos devam ser dados como provados.
*
Os recorrentes pretendem que sejam dados como provados os factos g) e h), que foram considerados não provados, os quais têm a seguinte redação:

g) os muros encontravam-se em bom estado de conservação, sem quaisquer sinais de deterioração;
h) piso encontrava-se bom estado de conservação, limpo e sem sinais de deterioração;

As testemunhas invocadas pelos recorrentes para dar como provados estes facto, a saber R. A. e A. G., não se pronunciaram especificamente sobre os muros e o piso. Falaram apenas do estado da quinta em termos gerais. A. G. afirmou que fez obras de recuperação da quinta porque M. C., tio do autor, queria deixar a quinta recuperada para que os familiares não tivessem que ter despesas com a mesma, sendo que as obras incidiram sobre a casa principal, catavento e alambique. Não aludiu aos muros ou ao piso.
Não se pode concluir com segurança das afirmações genéricas destes depoimentos qual o concreto estado dos muros e do piso.
O que se pode retirar de útil dos elementos probatórios que contam dos autos é o que já foi dado como provado nos factos 14 e 15; onde já consta que existiam muros com 1 metro e 1,5 metros e que o piso térreo era calcetado em cubos de granito assentes em massame e guias de granito e que, em 6.1.1995, encontravam-se em bom estado de conservação. O mais que excede esta afirmação e que é referido nas als. g) e h) está por demonstrar.

Assim sendo, não existem nos autos elementos probatórios que imponham que estes factos devam ser dados como provados.
*
Os recorrentes pretendem que sejam dados como provados os factos i), j), k), e w) que foram considerados não provados, os quais têm a seguinte redação:

i) as ramadas com Ferro em T, apresentavam perfeito estado de conservação;
j) os bardos em arame e esteios em granito serviam para dar o suporte necessários às arvores de fruto para as mesmas crescerem adequadamente;
k) o caramanchão encontrava-se em bom estado de conservação;
w) as culturas da Quinta da ..., referidas nos factos provados nº 18., fossem destinadas à produção para o mercado;

Relativamente al i) referente às ramadas já consta dos factos 14 e 15 que, em 6.1.1995, existia ramada com ferro em T, arame e esteio em granito que estavam em bom estado de conservação.
Bom estado e perfeito estado de conservação não são expressões sinónimas.
Como já se referiu, a propósito das demais edificações, as testemunhas não aludiram com este grau de pormenor ao estado das ramadas.
O que se pode retirar de útil dos elementos probatórios que contam dos autos é apenas o que já foi dado como provado nos factos 14 e 15. O mais que excede esta afirmação e que é referido na al. i) está por demonstrar.
Assim sendo, não existem nos autos elementos probatórios que imponham que este facto deva ser dado como provado.

Quanto à alínea j), valem aqui as considerações que se acabaram de fazer acerca das alíneas g) e h), ou seja, a veracidade deste concreto facto não resulta de nenhum documento nem foi confirmado pelas testemunhas inquiridas que depuseram sobre esta matéria.

Relativamente à al. k) referente ao caramanchão já consta dos factos 14 e 15 que, em 6.1.1995, existia um caramanchão que estava em bom estado de conservação.
Como tal, a al. k) tem que ser eliminada dos factos não provados, não se justificando a sua inclusão nos factos provados, sob pena de repetição, porque a mesma já resulta dos factos 14 e 15.

Quanto à al. w) a mesma remete para o facto 18, portanto refere-se à vinha. Do conjunto de depoimentos prestados não é possível concluir com segurança que a vinha se destinava à produção para o mercado pois nesta expressão tanto se pode englobar a venda das uvas como fruta como a venda das uvas para produção de vinho. Ninguém esclareceu concretamente qual o destino das uvas nem há documento que o ateste. Porém, é seguro que as uvas não eram para consumo próprio, mas sim para venda, pois todas as testemunhas que depuseram sobre esta matéria confirmaram tal destino.

Por isso, entende-se que a al. w) dos factos não provados deve ser eliminada e o facto provado nº 18 deve passar a ter a seguinte redação:

18. O prédio denominado Quinta da ..., em 06.01.1995, era composto por vinha em ramada com ferro em T. que se destinava à venda.
*
Finalmente, os recorrentes pretendem que sejam dados como provados os factos bbb, ccc, ddd, eee, fff, ggg, hhh, iii, jjj, lll, mmm, nnn, ooo, ppp, qqq e rrr que foram dados como não provados os quais têm a seguinte redação:

bbb) O facto nº 26., dos factos provados causou frustração aos Autores.
ccc) (…) sentiram-se desrespeitados e enganados.
ddd) Os Autores receavam deslocar-se ... devido ao gozo e comentários depreciativos que se ouviam nos cafés nas imediações do seu prédio.
eee) Os Autores sofreram de ansiedade, privações de sono e perda de apetite por se sentirem tristes, por força da humilhação e gozo impostos pelo Réu.
fff) Desde a data de colocação dos outdoors, os Autores filhos perderam a coragem de se deslocarem ao seu prédio, devido aos comentários e vexame que sofriam por ocasião de tais deslocações.
ggg) Continuamente, os populares que ali se encontravam comentavam de forma audível que “nem no vosso prédio vocês mandam”.
hhh) Os Autores entristeceram-se, sentiram perturbações de ansiedade, sono e falta de apetite.
iii) A colocação de outdoors pelo Réu provocou a alteração do objeto do usufruto, designadamente, porque o prédio não tinha qualquer fim comercial;
jjj) O comportamento do Réu, enquanto usufrutuário, teve única e exclusivamente a intenção de desvalorizar o prédio, obrigando os coautores a venderem ao “desbarato” o prédio;
lll) o Réu tenha conhecimento do valor patrimonial e sentimental do prédio para os coautores.
mmm) O Réu atuou com a intenção de destruir por completo o prédio dos Autores.
nnn) A atuação do Réu provocou aos Autores sentimento de receio, impotência e medo de não conseguir repor a sua propriedade como se encontrava antes do Réu a destruir;
ooo) (…) causou profunda revolta e dor nos Autores, pois o seu prédio sempre pertenceu à sua família.
ppp) A conduta do Réu levou os Autores a passarem noites sem dormir;
qqq) (…) causou discussões no seio familiar;
rrr) (…) obrigou os Autores a deslocarem-se por diversas vezes a Barcelos.

Da audição integral de todos os depoimentos prestados na audiência não resulta minimamente provada a matéria atrás referida, pois nenhuma testemunha a confirmou com esta extensão e pormenor. As testemunhas que depuseram sobre esta matéria limitaram-se a fazer afirmações genéricas em que referem que o assunto da Quinta não era abordado porque era um assunto que incomodava o autor e do qual este não gostava de falar. Quanto aos demais autores ninguém se referiu.
Aliás, das transcrições dos depoimentos de R. A. e A. G. que constam das alegações resulta evidente que os mesmos não confirmam de forma alguma a veracidade dos alegados factos.
Assim sendo, não existem nos autos elementos probatórios que imponham que estes factos devam ser dados como provados.
*
Tendo em conta as alterações que se vêm de introduzir, e que se assinalarão a negrito, a matéria de facto a ter em conta para a decisão a proferir é a seguinte:

1. Em 16.06.1973, A. B. vendeu por escritura pública a A. R. e mulher M. H., a raiz ou a nua propriedade dos seguintes prédios:
a) Casa com dois pavimentos, eirado, estabulo, garagens, adega, arrecadações e quintal, no lugar da ..., a confrontar do Norte com M. O. e do poente com estrada municipal, prédios descritos na conservatória de registo predial do concelho ... sob n.º ... e … e ..., no livro B – 95, e inscrito na matriz sob o artigo ... urbano, e ... e ..., rústicos;
b) Campo ..., de lavradio, descrito na citada conservatória sob o n.º ..., no livro B …, e inscrito na matriz rústica sob o artigo ....
c) O conjunto dos prédios antes identificados formam a denominada Quinta da ....
2. A venda referida em 1., incluiu a água do subsolo.
3. Na mesma escritura, A. B., vendeu o usufruto vitalício, dos identificados prédios a M. C. e mulher e E. C..
4. E. C. faleceu em 19.11.1983, sobrevindo-lhe marido M. C..
5. Em 13.03.1986 M. H. e marido A. R. doaram a raiz ou a nua propriedade aos seus filhos M. A. e J. F.. Na escritura de doação foi acordado entre os outorgantes que:
a) extinguindo-se o usufruto de M. C., fosse qual fosse o motivo, os doadores reservam para si o usufruto simultâneo e sucessivo desses bens, reservando desde logo metade do usufruto que lhes pertence do prédio inscrito na matriz sob o artigo ... urbano, e ... e ..., rústicos;
b) cada um dos donatários fica obrigado a conservar a parte que lhes é doada dos bens descritos, por sua morte, a favor dos respetivos filhos.
6. Em 20.09.1994, faleceu M. C..
7. Em 06.01.1995, M. H. e marido A. R. revogaram a doação ao filho M. A. e esposa.
8. Na mesma data (06.01.1995) venderam metade da raiz ou nua propriedade e o usufruto total dos prédios identificados em 1., a F. L. (Réu marido).
9. No âmbito da ação de divisão de coisa comum que correu termos sob n.º 3608/05.4TBBCL no Tribunal Judicial de Barcelos, 3º Juízo Cível em 09.07.2013 retificada em 20.01.2014, a dita Quinta da ... foi dividida em três partes:
a) lote rústico do prédio denominado Quinta da ... - parcela A), que foi adjudicado ao Réu;
b) prédio indivisível - parcela B) foi vendido por meio de propostas em carta fechada ao Réu;
c) lote urbano do prédio denominado quinta da ... - parcela C), foi adjudicado aos Autores).
10. O lote urbano (parcela C) foi desanexado do prédio descrito na conservatória predial ... sob o n.º 350 e deu origem ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ...º, descrito na conservatória de registo predial ... sob o n.º ..., composto de terreno para construção com a área de 6435m2, desanexado do prédio .... Em 22 de maio de 2015, este prédio sofreu uma alteração na área total, uma vez que foram expropriados 969m2, passando a ter a área total de 5466m2.
11. O lote rústico (parcela A) foi registado na conservatória de registo predial ..., mantendo a descrição n.º … da descrição
12. Em 24.01. 2014, faleceu A. R..
13. Em 22.05.2015, foram expropriados 969m2 do prédio identificado em 9.c).
14.O prédio identificado em 1., era 06.01.95 era composto pelas edificações seguintes: a) garagem e habitação do motorista; b) vacaria e eira no piso superior; c) pocilga; d) anexo destinado a alambique; e) catavento; f) poço de água; g) fonte; h) mina de água com nascente a 1 km de distância, com depósito mãe e depósito recetor final; i) muros de 1 metro e 1,5 metros; j) o piso térreo era calcetado em cubos de granito assentes em massame e guias em granito; k) bardos em com arame e esteios em granito; l) ramada com ferro em T, arame e esteios em granito; m) um caramanchão; n) casa principal, casa de caseiro e arrumos.
15. Tais edificações, encontravam-se, em 06.01.1995, em bom estado de conservação.
16. A habitação do motorista, garagem, vacaria, eira no piso superior, pocilga, anexo destinado ao alambique, caramanchão e catavento encontravam-se funcionais.
17. Existiam dois cedros com muitas dezenas de anos.
18. O prédio denominado Quinta da ..., em 06.01.1995, era composto por vinha em ramada com ferro em T. que se destinava à venda.
19. Na data da doação referida em 5) aos Autores, existiam no prédio identificado em 1., os equipamentos seguintes:
a) caramanchão;
b) portões de ferro no interior do prédio;
c) alambique em cobre.
20. A Câmara Municipal de ... notificou o Réu para repor as cotas do terreno do prédio identificado em 1), na sequência de um aterro por si realizado sem licenciamento;
21. (…) ordenou ao Réu a limpeza do prédio.
22. O Réu não efetuou as obras de reparação:
23.a) na garagem e habitação do motorista;
b) vacaria e eira;
c) pocilga;
d) anexo destinado ao alambique,
e) catavento que se encontra em risco de derrocada.
f) a habitação do motorista, vacaria e eira, pocilga, anexo destinado ao alambique, demandam obras com o custo estimado de € 53.300,00 (13.050€ + €31.200,00 + €4850,00 + €4.200).
24. A mina necessita de trabalhos de limpeza, abertura e fecho de valas, reparação de condutas, depósito mãe e do depósito recetor final.
25. A limpeza da mina, abertura e fecho de valas, reparação de condutas, reparação de depósito mãe e reparação do depósito recetor final e todos os trabalhos e materiais necessários a que a água volte a jorrar na propriedade, tem o custo estimado de € 35.500,00 + IVA.
26. Os Réus colocaram dois outdoors publicitários no prédio identificado em 9.b) e 10.
28. Os autores receberam da Companhia de Seguros ..., SA, em março/abril de 2010 a quantia de € 200.000,00 a titulo de indemnização pelos danos causados no prédio urbano com o artigo matricial ...º identificado em 1), pelo acidente ocorrido em 15.03.2015.
29. Em 15.03.2005 houve um acidente, consubstanciado no capotamento de um camião cisterna de transporte de combustível, que destruiu por completo a casa de habitação, 1 anexo com 110 m2 que correspondia à casa do caseiro e 98 metros de muro que correspondem à parte do muro expropriado para a construção da rotunda, do prédio identificado no nº 1.
30. Na ação intentada pelos Autores contra a Companhia de Seguros ..., S.A (proc. nº 1015/08.6TBBCL do 3º Juízo Cível do extinto Tribunal Judicial da Comarca de Barcelos, que correu termos juntamente com ação intentada pelos Réus contra a mesma seguradora, proc. nº 692/08.6TBBCL do mesmo juízo e Tribunal), foi realizada perícia.
31. (…) o perito nomeado pelo Autor marido e esposa foi o Eng. R. A..
32. (…) no relatório pericial, subscrito unanimemente pelos peritos, foi respondido o quesito: “(…) O embate aludido destruiu o prédio pertença dos Autores e respetivos anexos, bem como o muro de vedação, que se encontrava em bom estado de conservação e condições de habitabilidade antes da data do acidente? R: sim.”
33.(…) que não era possível a reconstrução da habitação, atentos os condicionalismos legais resultantes da necessidade de cumprir o afastamento de 20 metros ao eixo da estrada e ainda atestaram a composição da casa principal e anexos.
34. Entre a data do acidente (em 15.03.2005) (2) e a da realização da transação (12.03.2010) no âmbito do processo identificado em 30., o prédio em apreço nos autos ficou ao abandono, atento o estado de escombros.
35. Desde 15.03.2005 que o prédio “Quinta da ...” deixou de ter qualquer uso por se ter transformado terreno apto a construção.
36. As Estradas de Portugal, S.A., expropriaram 969 m2 do lote que viria a ser adjudicado aos Autores no processo de divisão de coisa comum que correu termos sob o nº 1145/15.8T8BCL do Juízo Local Cível de Barcelos, Juiz 1.
37. Aquando da posse administrativa da parcela expropriada e no seguimento das obras de construção da rotunda atualmente lá existente, a empreiteira obras públicas X - M. P., Construções, Lda., instalou o estaleiro de construção civil, aparcou camiões, máquinas de aterro e desaterro, pedras, britas, cimentos, areias e demais, no prédio identificado nos autos.
38. Os Réus instauraram o procedimento cautelar de restituição provisória de posse (processo nº 1919/14.7TBBCL do 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Barcelos), que foi julgado procedente.
39. Aquando da posse administrativa pela Estradas de Portugal da identificada parcela de terreno e no decurso das obras realizadas pela tal M. P. Construções, Lda., o Autor marido levou dali e transportou-os para outra sua propriedade suas:
- todas as pedras do muro de vedação face à estrada nacional;
- todas as pedras;
- os esteios e ferros de ramadas e outros lá existentes;
- o piso em cubo de granito existente no local;
- grades em ferro,
- portões em ferro,
40. O alambique foi furtado e o Réu marido apresentou queixa à GNR contra desconhecidos.
41. Os pais do Autor marido cederam a água ao réu, permitindo-lhe fazer o negócio dela que bem entendesse, por procuração irrevogável lavrada no dia 7.03.1995 no Cartório Notarial do Marco de Canaveses.
42. Quando os Réus celebraram negócio com os pais do Autor residiam em Marco de Canaveses, não se encontrando a casa da Quinta da ... habitada.
43. A propriedade no seu conjunto apresentava-se sem culturas de produção.
44. O poço de água situa-se no terreno expropriado pela Estradas de Portugal.
45. A peritagem – levada a cabo na divisão de coisa comum equivaleu os lotes nas condições em que estão hoje acrescida, apenas, da parte urbana posteriormente expropriada.
46. Os Réus tiveram conhecimento pela publicidade feita no prédio identificado em 1., (placa a dizer vende-se) que a propriedade se encontrava à venda e, nessa sequência vieram a adquirir metade da nua propriedade e o usufruto do prédio em discussão nos autos.
*
Caraterização do direito de autores e réus e modo de aquisição

Antes de entrar na análise das questões do recurso, considera-se importante caracterizar os direitos de autores e réus sobre o imóvel quanto ao modo de aquisição, visto que existe discordância sobre esta matéria.
Vejamos, então, o que resulta dos factos provados, conjugados com as escrituras que se encontram juntas aos autos.
O prédio denominado Quinta da ... encontra-se descrito no facto provado nº 1 e permaneceu com esta composição até ser objeto de divisão na ação de divisão de coisa comum em 20.1.2014.

Por escritura de 16.6.1973, a Quinta da ... foi vendida e dessa venda resultaram os seguintes direitos:

A) A. R. e M. H. adquiriram a raiz ou nua propriedade;
B) M. C. e E. C. adquiriram o usufruto.

Nesta escritura de aquisição ficou expressamente a constar que o usufruto é vitalício e “se extingue em relação a metade à morte de um dos usufrutuários”.

Em 19.11.1983 morre a usufrutuária E. C..
Assim, a metade do usufruto que lhe pertencia extinguiu-se.

Com a extinção deste usufruto decorrente da morte de E. C., a Quinta da ... fica na seguinte situação:

A) A. R. e M. H. ficam proprietários plenos de metade (devido à extinção da metade do usufruto de E. C.) e com a raiz ou nua propriedade da outra metade;
B) M. C. fica com o usufruto de metade.

Em 13.3.1986 é feita a escritura de doação aos filhos M. A. e J. F..

Os direitos existentes são os descritos.

A. R. e M. H. doaram aos filhos M. A. e J. F. a raiz dos bens. Reservaram para si o usufruto simultâneo e sucessivo dos bens quando se extinguir o usufruto de M. C. e reservaram também para si a metade do usufruto que lhes pertence. Esta metade do usufruto referida na escritura é a metade que pertencia a E. C..

Decorrente da escritura de doação, a situação da Quinta da ... em 13.3.1986 é a seguinte:

A) M. A. e J. F. são proprietários de raiz, na proporção de metade para cada um;
B) A. R. e M. H. são usufrutuários de metade;
C) M. C. é usufrutuário de metade.

Em 20.9.1994 faleceu M. C..

A sua metade do usufruto reverte para A. R. e M. H., por força do convencionado na escritura de doação de 13.3.1986.

Em 20.9.1994, a situação da Quinta é a seguinte:

A) M. A. e J. F. são proprietários de raiz, na proporção de metade para cada um;
B) A. R. e M. H. são usufrutuários da totalidade.

Em 6.1.1995 é feita a escritura de revogação da doação de metade da propriedade de raiz que tinha sido feita a M. A. em 1.9.1986.

Nesta data, e após esta revogação, a situação da Quinta é a seguinte:

A) A. R. e M. H. são proprietários de metade da raiz (devido à revogação da doação de metade que tinha sido feita a M. A.);
B) J. F. permanece proprietário de metade da raiz;
C) A. R. e M. H. são usufrutuários da totalidade.

Em 6.1.1995 A. R. e M. H. vendem ao réu F. L. os direitos que possuíam sobre a Quinta, ou seja, vendem-lhe metade da raiz e a totalidade do usufruto.

Após esta venda, a situação da Quinta passa a ser a seguinte:

A) J. F. é proprietário de metade da raiz;
B) F. L. é proprietário de metade da raiz;
C) F. L. é usufrutuário da totalidade.

Quando, em 6.1.1995, A. R. e M. H. ficam proprietários de metade da raiz e usufrutuários da totalidade tal equivale a dizer que são proprietários plenos de metade e usufrutuários de metade.
Com efeito, estando reunidas nas mesmas pessoas a propriedade e o usufruto tal implica a extinção do usufruto, nos termos do art. 1476º, nº 1, al. b), do CC, e por consequência, a vigência da propriedade plena.
Assim, quando transmitem ao réu F. L. os direitos que tinham, tal implica que vendem metade da propriedade plena e metade do usufruto.
A venda do usufruto a terceiro pelo usufrutuário denomina-se trespasse e é admitida pelo art. 1444º, do CC, onde se estabelece que o usufrutuário pode trespassar a outrem o seu direito, definitiva ou temporariamente.
Assim sendo, o negócio celebrado entre A. R. e M. H. e F. L. constitui uma venda na parte relativa a metade da propriedade plena e um trespasse na parte relativa a metade do usufruto.

Após a venda, e atenta a qualificação jurídica descrita, a situação da Quinta é a seguinte:

A) J. F. é proprietário de metade da raiz;
B) F. L. é proprietário pleno de metade;
C) F. L. é usufrutuário de metade.

Em 20.1.2014, em ação judicial de divisão de coisa comum, a Quinta foi dividida em três parcelas:

Parcela A - Lote rústico adjudicado ao réu F. L.;
Parcela B - Lote indivisível comprado pelo réu F. L.;
Parcela C - Lote urbano tendo sido adjudicada aos autores a raiz ou nua propriedade.

Assim, nesta data, a raiz ou nua propriedade da parcela C passou a pertencer aos autores e o réu continua usufrutuário da mesma.

Em 24.1.2014, faleceu A. R.. Tendo em conta que se concluiu pela existência de um trespasse de usufruto feito por este e por M. H. ao réu, importa analisar se este falecimento tem alguma influência no usufruto do réu.

Como supra se referiu, na escritura de doação de 13.3.1986 A. R. e M. H. reservaram para si o usufruto simultâneo e sucessivo dos bens.
Tal significa que, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 1441º e 1442º, do CC, o usufruto só se extingue à morte do último usufrutuário. Portanto, com a morte de A. R., o usufruto fica a pertencer a M. H., por força do direito de acrescer estabelecido no art. 1442º, do CC. Consequentemente, a morte de A. R. em nada afetou o direito de usufruto de que o réu é trespassário.

II – Extinção do usufruto sobre o prédio por perda total

Os autores entendem que deve ser declarada a extinção do usufruto por perda total.

Como é sabido, usufruto é o direito de gozar temporária e plenamente uma coisa ou direito alheio, sem alterar a sua forma ou substância (art. 1439º, do CC).
Tal direito extingue-se pelas causas elencadas nas als. a) a e) do nº do art. 1476º, do CC, designadamente pela perda total da coisa usufruída.
Só a perda total é causa de extinção do usufruto pois se a perda for meramente parcial, continua o usufruto na parte restante, como decorre do disposto no art. 1478º, nº 1, do CC.
Se a coisa usufruída se transformar noutra que ainda tenha valor, embora com finalidade económica distinta, o usufruto continua sobre essa coisa (art. 1478º, nº 2, do CC).
No caso em apreço, o usufruto do réu refere-se, até à divisão da coisa comum, à Quinta ....
Tal Quinta foi objeto de um incêndio, em 15.3.2005. Porém, mercê de tal incêndio, a Quinta não ficou totalmente destruída pois o incêndio apenas atingiu e destruiu a casa de habitação, um anexo com 110 m 2 e 98 metros de muro (facto 29). Mantiveram-se as demais edificações que se encontram descritas em 14.
Como tal, por via do incêndio não ocorreu a perda total, mas tão só a perda parcial, pelo que não há lugar à extinção por perda total.
Não existe qualquer outro facto provado do qual se possa concluir que ocorreu a perda total.
Em 2014, a Quinta foi dividida em 3 parcelas, tendo sido adjudicada aos autores a raiz ou nua propriedade da parcela C. Assim, o usufruto do réu passou a incidir sobre esta parcela.
Consequentemente, resta concluir não ter ocorrido qualquer perda total do prédio, não havendo por isso causa de extinção do usufruto.

III – Extinção do usufruto sobre o prédio por não cultivo há mais de 20 anos

Constitui causa de extinção do usufruto o seu não exercício durante 20 anos, qualquer que seja o motivo (art. 1476º, nº 1, al. c) do CC).
Entendem os autores que esta situação se verifica.
Ora, analisando os factos provados, com interesse para a esta questão apenas se provou o que consta dos factos 34 e 35, ou seja, que o prédio esteve ao abandono após o acidente ocorrido em 15.3.2005 e que, desde essa data, deixou de ter qualquer uso.
Ora, por referência a 15.3.2005 é manifesto que ainda não se completaram 20 anos de não uso.
Resta assim concluir, sem necessidade de mais considerações, que não se verifica a extinção do usufruto com tal fundamento.

IV – Entrega do prédio por mau uso

Finalmente, pedem os autores que o prédio lhes seja entregue por mau uso por parte do réu.
Sobre esta matéria dispõe o art. 1482º, do CC, que o usufruto não se extingue, ainda que o usufrutuário faça mau uso da coisa usufruída; mas se o abuso se tornar consideravelmente prejudicial ao proprietário, pode este exigir que a coisa lhe seja entregue, ou que se tomem as providências previstas no artigo 1470.º, obrigando-se, no primeiro caso, a pagar anualmente ao usufrutuário o produto líquido dela, depois de deduzidas as despesas e o prémio que pela sua administração lhe for arbitrado.
Vejamos, então, se se pode concluir pela existência de abuso consideravelmente prejudicial ao proprietário.
Provou-se que aquando da aquisição do usufruto por parte do réu as edificações existentes na Quinta estavam em bom estado de conservação e a habitação do motorista, a vacaria, eira, pocilga, anexo do alambique, caramanchão e catavento estavam funcionais (factos 14 a 16).
Provou-se igualmente que o réu não efetuou as obras de reparação nessas edificações que necessitam de obras com o custo estimado de € 53 300.
Finalmente, provou-se que a mina necessita de trabalhos de limpeza, abertura e reparação cujo custo é de € 35 500 + IVA (factos 24 e 25).
Estes factos poderiam classificar-se como uma situação de abuso, por omissão das obras de conservação e reparação necessárias.
Sucede que só estão a cargo do usufrutuário as reparações ordinárias indispensáveis para a conservação da coisa e as despesas de administração, sendo que não se consideram ordinárias as reparações que, no ano em que forem necessárias, excedam dois terços do rendimento líquido desse ano (art. 1472º, do CC).
Já quanto às reparações extraordinárias, as mesmas constituem encargo do proprietário, a menos que tais reparações se tenham tornado necessárias por má administração do usufrutuário (art. 1473º, nº 1, do CC).
Do conjunto de factos provados, o tribunal não consegue determinar se as reparações que o réu não fez são reparações ordinárias ou extraordinárias, sendo que só as primeiras estão a cargo do usufrutuário, sendo as segundas encargo do proprietário (art. 1473º, do CC).
Por outro lado, embora se tenha provado que o prédio ficou ao abandono desde 2005, não está estabelecido, face ao acervo factual provado, o necessário nexo de causalidade entre esse abandono e o estado em que as edificações se encontram por forma a permitir a conclusão de que, mesmo sendo reparações extraordinárias, estariam a cargo do usufrutuário por decorrerem da sua má administração.
Por isso, não se pode concluir pela existência de um abuso por via da omissão de realização de obras de reparação.
Quanto ao não cultivo do prédio também não existem elementos factuais que permitam concluir que o mesmo constitui um abuso consideravelmente prejudicial ao proprietário, tanto mais que se provou que, quando os réus adquiriram a Quinta ..., a casa não se encontrava habitada e a propriedade no seu conjunto encontrava-se sem culturas de produção (factos 42 e 43).

Pelos motivos expostos, não se verifica a situação prevista no art. 1482º, do CC, não havendo fundamento para ordenar a entrega do prédio aos autores por abuso consideravelmente prejudicial ao proprietário.

Nestes termos, resta julgar a apelação improcedente.

DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida.
Custas da apelação pelos autores.
Notifique.
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Guimarães, 23 de abril de 2020

(Relatora) Rosália Cunha
(1ª Adjunta) Lígia Venade
(2º Adjunto) Jorge Santos



1. Na sentença consta 13.3.2005, o que resulta de lapso de escrita pois o acidente ocorreu em 15.3.2005, facto que resulta da participação do acidente junta aos autos, pelo que se corrigiu a data.
2. Na sentença consta 13.3.2005, o que resulta de lapso de escrita pois o acidente ocorreu em 15.3.2005, facto que resulta da participação do acidente junta aos autos, pelo que se corrigiu a data.