Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2806/17.2T8VNF-C.G1
Relator: MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Descritores: AGENTE DE EXECUÇÃO
REMUNERAÇÃO ADICIONAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/11/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I – A remuneração adicional, na medida em que acresce à remuneração fixa devida pela atividade do agente de execução no processo e constitui um prémio pela actividade desenvolvida, sendo instituída como incentivo para que o mesmo tenha uma actividade que potencie a eficácia e eficiência da recuperação e garantia do crédito, só é devida desde que exista um nexo de causalidade entre a concreta actividade desenvolvida e a obtenção, para o processo executivo, de valores recuperados ou garantidos ao exequente.
II- Deste modo, constitui-se o direito a tal acréscimo remuneratório quando, existindo, por um lado, sucesso nas diligências executivas este decorra ou provenha em consequência, decorrência ou como fruto da actividade ou diligências realizadas pelo agente de execução.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I. Relatório

Nos autos de execução ordinária em que é exequente Caixa ... S.A., com sede na Av. … LISBOA, e executados G. B., com domicílio na Rua …-BARCELOS, e outros, foi proferida a seguinte decisão:

-“Ref.ª 9300816 e 9327199: O critério da constituição do direito à remuneração adicional é a obtenção de sucesso nas diligências executivas, o que se verifica sempre que, na sequência das diligências do agente de execução, se conseguir recuperar ou entregar dinheiro ao exequente, vender bens, fazer a adjudicação ou a consignação de rendimentos, ou ao menos, penhorar bens, obter a prestação de caução para garantia da quantia exequenda ou que seja firmado um acordo de pagamento.
No entanto, conforme maioritariamente se vem entendendo, é de recusar a remuneração adicional (art.º 50.º Portaria n.º 282/2013, de 29 de Agosto) ao agente da execução em casos em que haja transação diretamente, na consideração de ser exigível para essa remuneração um nexo de causalidade entre a atividade concreta do agente de execução e a cobrança do crédito exequendo, que em caso de transação alcançada entre as partes não se certifica.
Com efeito, destinando-se a remuneração adicional a premiar o resultado obtido, a dita remuneração adicional só se justifica quando a recuperação ou a garantia dos créditos da execução tenha ficado a dever-se à eficiência e eficácia da atuação do agente de execução, no sentido de a recuperação do crédito exequendo tenha tido lugar na sequência de diligências por si promovidas.
Por isto mesmo o agente de execução não tem direito à aludida remuneração adicional tomando como base de cálculo o valor constante de acordo de pagamento celebrado entre exequente e executado porque se entende que a atividade por aquele desenvolvida é independente e alheia à transação [cfr. neste sentido acórdãos do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO de 10 de Janeiro de 2017 (processo n.º 15955/15.2T8PRT.P1, relator cecília Agante) e de 06 de Maio de 2019 (processo n.º 130/16.7T8PRT.P1, relator Jorge Seabra), do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA de 26 de Setembro de 2019 (processo n.º 6186/15.2T8LSB-A.L1-2, relator Jorge Seabra) e do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA de 03 de Novembro de 2015 ( processo n.º 1007/13.3TBCBR-C.C1, relatora Maria Domingas Simões) e de11 de Abril de 2019 (processo n.º 115/18.9T8CTB-G.C1, relator Manuel Capelo)].
Pelo exposto, julgando-se procedente a reclamação apresentada determino que à nota discriminativa e justificativa apresentada seja retirado o valor de 9.906,43€, refente a remuneração adicional.
Notifique.”.
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II-Objecto do recurso

Não se conformando com a decisão proferida, veio a agente de execução interpor recurso, juntando, para o efeito, as suas alegações, e apresentando, a final, as seguintes conclusões:
i.A Caixa ..., S.A., intentou contra os Executados, devidamente identificados a fls. dos autos, uma execução para pagamento de quantia certa no valor de € 441.372,62, sob a forma ordinária, tendo a mesma como título executivo uma Livrança.
ii.Em virtude de o processo executivo seguir a forma ordinária, a agente de execução/ora recorrente, procedeu à citação prévia dos Executados, nos termos da Lei.
iii.No seguimento da citação prévia, os Executados deduziram Embargos de Executado com o número 2806/17.2 T8VNF-A e requereram a prestação espontânea de caução, no montante equivalente à quantia exequenda acrescida do valor mencionado no artigo 750.º, n.º 3 do C.P.C., em virtude de pretenderem a suspensão da execução.
iv.Em virtude de a caução ter sido considerada idónea o incidente foi julgado procedente.
v.Mediante transação celebrada no apenso de Embargos de Executado vieram as partes por termo à ação executiva.
vi.Os honorários constantes da nota de honorários notificada às partes, nos termos da referida transacção e sobre o valor transaccionado, são devidos à ora recorrente, em virtude de o pagamento apenas ter ocorrido após o prazo para a dedução de oposição, ter sido prestada caução, e no resultado de uma acção executiva em que a ora recorrente exerce as funções de agente de execução, sendo certo que, foi a actuação da agente de execução que desencadeou, necessária e consequentemente, o pagamento coercivo da obrigação não satisfeita voluntária e pontualmente pelos devedores/Executados.
vii.Honorários esses, de resto, que foram até reduzidos por pedido das partes atento o valor do acordo celebrado e que foram para esse efeito considerados.
viii.As competências do agente de execução encontram-se estabelecidas nos artigos 719.º a 723.º do Código de Processo Civil.
ix.Por regra, cabe ao agente de execução efectuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas a secretaria ou sejam da competência do Juiz (artigo 719.º, n.º 9 do C.P.C.).
x.Deve entender-se que o agente de execução exerce funções públicas, nas quais avulta o exercício de autoridade, não estando representante ou mandatário das partes, e, em especial, do exequente.
xi.Aos agentes de execução estão cometidos poderes que interferem com a esfera de terceiros, exercendo funções públicas ou, mais propriamente, funções de autoridade, por isso, a doutrina configura-o como um auxiliar de justiça, pelo que se estará, em termos de conformação jurídica, perante um caso de exercício privado de funções públicas ou, mais incisivamente, perante uma profissão independente, mas pautada por deveres estatutários específicos, aliás, postulados pela natureza pública da função da administração da justiça em que se inscrevem.
xii.A partir dos elementos essenciais da caracterização jus-funcional do agente de execução forçoso considerar que, na prossecução das suas atribuições e no exercício das respetivas competências, prevalece a componente de autoridade do exercício das funções públicas que exerce no âmbito do processo executivo, que o situa "supra-partes".
xiii.Atento o conteúdo funcional do agente de execução e considerando que este profissional não configura legalmente mandatário ou representante das partes, assumindo-se antes como um auxiliar da justiça, importa concluir que não integra o respetivo feixe de atribuições ou competências promover ou celebrar acordos, potenciando a negociação entre as partes com esse desiderato ou, sequer, impulsionar a mediação.
xiv.Exigir-se esta intermediação não só colide, com a regulamentação da remuneração do agente de execução, prevista Portaria n.° 282/2013 de 29/08, como desvirtua a configuração legal do seu Estatuto.
xv.Tendo em conta o conteúdo funcional do agente de execução e justificada a sua caracterização como auxiliar da justiça e não como mandatário ou representante de qualquer das partes, cumpre afirmar que haverá sempre lugar ao pagamento da remuneração adicional mesmo quando a extinção da execução deriva de uma transação ou reestruturação extrajudicial da dívida em que o agente de execução não interveio ou mediou.
xvi.O artigo 50.º da Portaria n.º 282/2013 de 29/08 regulamenta vários aspectos das acções executivas, incluindo os honorários que são devidos ao agente de execução.
xvii. O artigo 50.º da Portaria n.º 282/2013 de 29/08 determina que o agente de execução tem direito a ser remunerado pela tramitação dos processos, atos praticados ou procedimentos realizados de acordo com os valores fixados na tabela do respetivo anexo VII, os quais incluem a realização dos atos necessários com os limites nela previstos.
xviii. Quanto aos processos executivos para pagamento de quantia certa, o artigo 50.º da Portaria n.º 282/2013 de 29/08 estabelece que, no termo do processo, é devida ao agente de execução uma remuneração adicional, que varia em função: a) do valor recuperado ou garantido; b) do momento processual em que o montante foi recuperado ou garantido; c) da existência, ou não, de garantia real sobre os bens penhorados ou a penhorar (n.° 5).
xix. A Portaria n.º 282/2013 de 29/08, define como «valor recuperado» o valor do dinheiro restituído, o entregue, o do produto da venda, o da adjudicação ou o dos rendimentos consignados pelo agente de execução ao exequente ou pelo executado ou terceiro ao exequente e como «valor garantido» o valor dos bens penhorados ou o da caução prestada pelo executado, ou por terceiro ao exequente, com o limite do montante dos créditos exequendos, bem como o valor a recuperar por via de acordo de pagamento em prestações ou de acordo global (n.° 6).
xx.A norma do n.º 12 do artigo 50.º da Portaria n.º 282/2013 de 29/08 estabelece que, nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que haja lugar a citação prévia, se o executado efetuar o pagamento integral da quantia em divida até ao termo do prazo para se opor à execução, não há lugar ao pagamento de remuneração adicional, configurando, pois, por força do normativo aplicável, a única situação em que não haverá lugar ao seu pagamento.
xxi.As soluções adotadas no que concerne à remuneração do agente de execução justificam-se pela necessidade de imprimir clareza e simplicidade na fixação do quantum remuneratório, deixando de existir montantes máximos até aos quais o agente de execução pode acordar livremente com as partes os valores a cobrar e passando, ao invés, a existir tarifas fixas quer para efeitos de adiantamento de honorários e despesas, quer para honorários devidos pela tramitação dos processos, quer ainda pela prática de atos concretos que lhes caiba praticar.
xxii.A fim de promover uma maior eficiência e celeridade na recuperação das quantias devidas ao exequente, reforça-se, precisamente, os valores pagos aos agentes de execução a título de remuneração adicional, que - reitera-se -apenas não é devida numa única situação, claramente enunciada no n.º 12.º da Portaria n.º 282/2013 de 29/08.
xxiii.Cotejando a disciplina do mesmo artigo 50.º da Portaria n.º 282/2013 de 29/08 e do anexo VIII para o qual remete, não se vislumbra como é que se pode extrair, do regime jurídico em vigor, a conclusão de que, sendo a dívida satisfeita ou garantida de modo voluntário, sem intermediação do agente de execução após o momento precisado no n.° 12 da Portaria 282/2013 de 29/08, não há lugar ao pagamento da remuneração adicional, quando é o próprio "legislador" quem esclarece que o que se visa atingir com o pagamento desta componente remuneratória variável é, precisamente, estimular o pagamento integral e voluntário da quantia em dívida bem como a celebração de acordos de pagamento entre as partes, que pretendam pôr termo ao processo, pressupondo que, nesses casos, a recuperação da quantia teve precisamente lugar na sequência de diligências promovidas pelo agente de execução, as quais, naturalmente, só podem configurar diligências executivas que a lei lhe comete, porque são essas, e não qualquer atividade de intermediação, que deve e tem que prosseguir e dar continuidade.
xxiv.É o "legislador" quem esclarece, em perfeita articulação com o regime dispositivo que o artigo 50.º da referida Portaria e o Anexo VIII vêm criar, que só há lugar a dispensa do pagamento de qualquer remuneração adicional ao agente de execução quando, logo no início do processo - portanto até ao termo do prazo para o executado se opor à execução - a dívida seja satisfeita de modo voluntário.
xxv.O n.º 8 do artigo 50.º da Portaria 282/2013 de 29/08 só reforça esta linha de interpretação, porquanto, mesmo em caso de incumprimento do acordo, o ónus que recai sobre o agente de execução é, precisamente, o de elaborar nota discriminativa de honorários actualizada, tendo em consideração o valor efetivamente recuperado, afectando o excesso ao pagamento das quantias que lhe venham a ser devidas e devolvendo, sendo esse o caso e no termo do processo, o saldo a que o exequente tenha direito.
xxvi.Decorre, portanto, inequivocamente, do texto da Portaria n.° 282/2013, de 29 de agosto, que o sistema de remuneração do agente de execução combina remuneração fixa, por ato ou lote de atos praticados, com remuneração variável, cujo cálculo está intimamente ligado ao sucesso da execução, a fim de acautelar dois objetivos fundamentais: garantir uma remuneração mínima que constitua, em qualquer dos casos, incentivo suficiente à realização dos atos e diligências do processo executivo e proporcionar uma remuneração adicional, que estimule a eficiência e a celeridade na realização desses atos e diligências, sendo por isso tão mais reduzida quanto mais demorado for o processo e tardio o seu resultado.
xxvii.Por consequência, não pode deixar de se entender que a redação do artigo 50.º da Portaria 282/2013 de 29/08, e do anexo para o qual remete, impõe o entendimento de que, havendo valor recuperado ou garantido, a remuneração adicional é sempre devida ao agente de execução, excepto numa situação, que a lei expressamente prevê - a de nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que há lugar à citação prévia do executado e este efectua o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução (n.° 12), caso em que a intervenção do agente de execução se restringiu à realização da citação, ato que não é exclusivo nem específico da acção executiva, pelo que se pode entender que a intervenção do agente que é própria da execução coerciva ainda não se iniciou.
xxviii.O critério que releva para a constituição do direito à remuneração adicional é o da obtenção de sucesso nas diligências executivas, sucesso que ocorre sempre que na sequência dessas diligências, realizadas pelo agente de execução, se conseguir recuperar ou entregar dinheiro do exequente, vender bens, fazer a adjudicação ou a consignação de rendimentos, ou ao menos, penhorar bens, obter a prestação de caução para garantia da quantia exequenda ou que seja firmado um acordo de pagamento, sendo certo que neste último caso o sucesso depende (da medida) do cumprimento do acordo (n.º 8).
xxix. Por isso, é mister concluir que o "legislador" apenas excluiu a remuneração adicional nos casos em que a citação antecede a realização as penhoras e o executado efetua o pagamento integral da quantia em divida até ao termo do prazo para se opor à execução, por presumir que nessa situação, não tendo ainda sido realizadas penhoras e devendo estas realizar-se apenas após a concessão de prazo para o pagamento voluntário, a atuação do agente de execução foi totalmente indiferente para a obtenção do pagamento e não gerou qualquer expectativa em relação à remuneração devida pelo seu envolvimento do processo.
xxx.Por consequência, em todas as demais situações em que haja valor recuperado ou garantido, a remuneração adicional é devida, ainda que a extinção da execução decorra de acto individual do executado - (pagamento voluntário), de acto conjunto de credor e devedor (acordo de pagamento) ou mesmo de um acto do próprio credor (desistência da execução, cfr. n.º 2 do artigo 50.º da Portaria n.º 282/2013 de 29/08
xxxi.Pelo que, ante tudo o exposto, o douto Despacho proferido viola os art.º 719.º a 723.º do CPC e o artigo 50.º da Portaria 282/2013 de 29/08, devendo por isso ser revogado.
Nestes termos e nos mais e melhores de Direito que Vossas Excelências não deixarão de, proficientemente, suprir, deve o presente recurso ser provido e, em consequência, ser revogado o Despacho, decidindo-se ser devida a remuneração adicional à aqui recorrente no montante de € 9.906,43 (nove mil novecentos e seis euros e quarenta e três cêntimos), valor esse acrescido de I.V.A. à taxa legal.
Termos em que com a procedência do presente recurso se fará, JUSTIÇA
*
X – A. B., SGPS, S.A., G. B. E M. B., Recorridos, vieram apresentar as suas contra-alegações, concluindo nos seguintes termos:

I.A Douta Decisão proferida nos presentes autos, ora Recorrida, proferida pelo Tribunal da Comarca de Braga – Vila Nova de Famalicão – Juízo de Execução – J1, e decidiu não ser devida a remuneração adicional peticionada no montante de € 9.906,43 apresentada, é de manter in toto.
II.Relativamente aos honorários apresentados pela Ilustre Agente de Execução, nomeadamente, do n. 1 “Honorários e Despesas - Processo” constante da Conta Corrente Discriminada da Execução, vem a mesma indicar o montante de € 9.906,43 a título de “Honorários em função dos resultados obtidos”.
III.Contudo, a remuneração adicional de € 9.906,43, reporta-se à obtenção de sucesso nas diligências executivas, o que não sucede nos presentes autos.
IV.Nos termos do art.º 50.º da Portaria n.º 282/2013 de 29.08, a previsão do pagamento de uma remuneração adicional ao agente de execução pressupõe que a recuperação da quantia tenha tido lugar na sequência de diligências por si promovidas.
V.Contudo, uma vez que a dívida foi satisfeita de modo voluntário, e, sem a sua intermediação, sempre resultaria na dispensa do pagamento de qualquer remuneração adicional.
VI.Aliás, é entendimento maioritário na jurisprudência, a necessidade da existência de um nexo causal entre a recuperação da quantia que serve de base ao cálculo da remuneração adicional e a actividade desenvolvida pelo agente de execução, avaliada à luz das diligências por ele desenvolvidas nesse domínio concreto.
VII.O que não se verifica na situação dos presentes autos, em que as partes chegaram a um entendimento que resulta da transação obtida em sede de embargos.
VIII.Pelo exposto, a agente de execução não tem direito à aludida remuneração adicional tomando como base de cálculo o valor constante da transação, e ainda, porque nenhuma intervenção teve na obtenção do mesmo.
IX.Pelo que, bem andou o Tribunal a quo em entender julgar procedente a reclamação apresentada, determinando que à nota discriminativa e justificativa apresentada fosse retirado o valor de € 9.906,43, referente à remuneração adicional, isto porque, o critério da constituição do direito à remuneração adicional é a obtenção de sucesso nas diligências executivas, o que se verifica sempre que, na sequência da diligências do agente de execução, se conseguir recuperar ou entregar dinheiro ao exequente, vender bens, fazer a adjudicação ou a consignação de rendimentos, ou ao menos, penhorar bens, obter a prestação de caução para garantia da quantia exequenda ou seja firmado um acordo de pagamento.
X.No entanto, conforme maioritariamente se vem entendendo, é de recusar a remuneração adicional (art.º 50.º Portaria 282/2013, de 29 de Agosto) ao agente de execução em casos em que haja transacção irectamente, na consideração de ser exigível para essa remuneração um nexo de causalidade entre a actividade concreta do agente de execução e a cobrança do crédito exequendo, que em caso de transacção alcançada entre as partes não se certifica.
XI.Com efeito, destinando-se a remuneração adicional a premiar o resultado obtido, a dita remuneração adicional só se justifica quando a recuperação ou a garantia dos créditos da execução tenha ficado a dever-se à eficiência e eficácia da actuação do agente de execução, no sentido de a recuperação do crédito exequendo tenha tido lugar na sequência de diligências por si promovidas.
XII.Por isto mesmo o agente de execução não tem direito à aludida remuneração adicional tomando como base de cálculo o valor constante de acordo de pagamento celebrado entre exequente e executado porque se entende que a actividade por aquele desenvolvida é independente e alheia à transacção. (cfr. neste sentido acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 10 de Janeiro de 2017 (processo n.º 15955/15.2T8PRT.P1, relator Cecília Agante) e de 06 de Maio de 2019 (processo n.º 130/16.7T8PRT.P1, relator Jorge Seabra), do Tribunal da Relação de Lisboa, de 26 de Setembro de 2019 (processo n.º 6186/15.2T8LSB-A.L1-2, relator Jorge Seabra) e do Tribunal da Relação de Coimbra de 03 de Novembro de 2015 (processo n.º 1007/13.3TBCBR-C.C1, relatora Maria Domingos Simões) e de 11 de Abril de 2019 (processo n.º 115/18.9T8CTB-G.C1, relator Manuel Capelo).)”
XIII.De tudo quanto vem exposto, não resta senão concluir que no caso sub Júdice não assiste qualquer razão à Recorrente na presente demanda.
XIV.Pelo que dúvidas não restam quanto ao mérito da decisão do Tribunal a quo.
Pelo exposto, deve negar-se provimento ao recurso, confirmando-se a Douta Sentença recorrida, e ser mantida in toto.
Decidindo assim, farão Vossas Excelências, inteira e sã JUSTIÇA!
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O recurso foi recebido como de apelação, com subida imediata, em separado e efeito devolutivo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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III - O Direito

Como resulta do disposto nos artos. 608º., nº. 2, ex vi do artº. 663º., nº. 2, 635º., nº. 4, 639.º, n.os 1 a 3, 641.º, n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem das conclusões que definem, assim, o âmbito e objecto do recurso.
Deste modo, e tendo em consideração as conclusões acima transcritas cumpre apreciar e decidir se é devida à agente de execução a remuneração adicional.
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Fundamentação de facto

A materialidade jurídico-processual enunciada no relatório sob o ponto I.
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Fundamentação jurídica

Entende a recorrente que o mero facto do pagamento, por via da transação celebrada entre as partes no apenso de embargos de executado, ter ocorrido após o prazo para a dedução de oposição, lhe confere o direito à remuneração adiciconal mesmo que não tenha tido intervenção ou sequer mediado o acordo alcançado.
Diferentemente se posicionam os recorridos, ao defenderem que a remuneração adicional pressupõe que a recuperação da quantia tenha tido lugar na sequência de diligências promovidas pelo agente de execução.
Assim, para a decisão a proferir importa ter em conta o que a respeito se preceitua no art. 50.º, da Portaria 282/2013, de 29 de Agosto, que regula a fixação dos honorários do agente de execução.
Ora, da leitura do seu n.º 1, resulta ter-se estabelecido, como princípio geral, que “o agente de execução tem direito a ser remunerado pela tramitação dos processos, actos praticados ou procedimentos realizados de acordo com os valores fixados na tabela do anexo VII da presente portaria, os quais incluem a realização dos actos necessários com os limites nela previstos.”

Para além deste direito geral de remuneração, prevê-se ainda o direito a uma remuneração adicional, nos termos definidos no seu n.º 5, ao prescrever-se que “n[N]os processos executivos para pagamento de quantia certa, no termo do processo é devida ao agente de execução uma remuneração adicional, que varia em função:
a)Do valor recuperado ou garantido;
b) Do momento processual em que o montante foi recuperado ou garantido;
c) Da existência, ou não, de garantia real sobre os bens penhorados ou a penhorar.”.

Tendo em vista a concreta definição de tais conceitos, preceituou-se, logo a seguir, no seu n.º 6, que o que se entende por valor recuperado e garantido, respectivamente nas alíneas a) e b).
Como tal, aponta-se, como «Valor recuperado» o valor do dinheiro restituído, entregue, o do produto da venda, o da adjudicação ou o dos rendimentos consignados, pelo agente de execução ao exequente ou pelo executado ou terceiro ao exequente, e, como «Valor garantido» o valor dos bens penhorados ou o da caução prestada pelo executado, ou por terceiro ao exequente, com o limite do montante dos créditos exequendos, bem como o valor a recuperar por via de acordo de pagamento em prestações ou de acordo global.
Mais se acrescenta, no n.º 9, sempre do preceito em análise, que o cálculo da remuneração adicional se efectua nos termos previstos na tabela do anexo VIII da presente portaria, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
Por último, no n.º 12, expressamente se consigna não haver lugar ao pagamento da remuneração adicional nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que haja lugar a citação prévia quando o executado efectuar o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução.
Daqui decorre que a lei consagra, assim, um sistema misto, constituído por uma remuneração fixa, calculada em função dos actos praticados no processo nos termos da tabela do anexo VII (art. 50.º, n.º 1), e por uma remuneração variável, calculada nos termos da tabela do anexo VIII que constitui a remuneração adicional (art. 50.º, n.º 9).
Ora, colocando-se a questão apenas quanto a esta remuneração, consta desse anexo VIII, que “o valor da remuneração adicional do agente de execução destinado a premiar a eficácia e eficiência da recuperação ou garantia de créditos na execução nos termos do artigo 50.º é calculado com base nas taxas marginais constantes da tabela abaixo, as quais variam em função do momento processual em que o valor foi recuperado ou garantido e da existência, ou não, de garantia real sobre os bens penhorados ou a penhorar”.
Lendo, ainda, o preâmbulo da referida Portaria, atinente a esse tipo de remuneração, “procura-se igualmente estimular o pagamento integral voluntário da quantia em dívida bem como a celebração de acordos de pagamento entre as partes, que pretendam pôr termo ao processo. Para tanto, prevê-se o pagamento de uma remuneração adicional ao agente de execução quando a recuperação da quantia tenha tido lugar na sequência de diligências por si promovidas, ou a dispensa do pagamento de qualquer remuneração adicional ao agente de execução quando, logo no início do processo, a dívida seja satisfeita de modo voluntário, sem a intermediação do agente de execução. Este regime visa, em última linha, tornar mais simples e mais célere a fiscalização da atividade dos agentes de execução, no que respeita a esta matéria em particular, e promover uma mais rápida acção em caso de atuações desconformes” (sublinhados nossos).
Assim, no âmbito deste regime legal, a jurisprudência tem-se dividido no que respeita aos requisitos necessários para que seja devida a remuneração adicional, como nos é dado conta no Acórdão da Relação de Lisboa, de 26.9.2019, Relator Arlindo Crua (in www.dgsi.pt) onde se citam diversos arestos que apreciaram esta matéria, com resumo dos argumentos utilizados em abono de cada uma das duas correntes jurisprudenciais que se formaram sobre a questão.
Assim, e como se refere no acórdão citado, uma corrente jurisprudencial considera que “não é necessária a existência de um nexo causal entre a actividade do agente de execução e a forma de extinção da execução para se reconhecer o direito à remuneração adicional variável”, ao passo que outra corrente entende que “para que seja exigível o pagamento da remuneração adicional ao agente de execução, é mister a verificação de um nexo causal entre a sua actividade e a obtenção, para o processo executivo, de valores recuperados ou garantidos ao exequente”.
Perante estas duas correntes, julgamos também nós, à semelhança do posicionamento adoptado já nesta Relação no Ac. 5149/19.3T8GMR-A.G1, de 24-09-2020, publicado no site da dgsi, ser de sufragar a segunda posição que exige a verificação de um nexo causal entre a actividade do agente de execução e a recuperação de valores como condição para ser devida a remuneração adicional, por ser a que melhor faz jus à interpretação a extrair do citado art. 50.º, de acordo com o disposto no art. 9.º do Cód. Civil, na medida em que não se deve cingir à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada, devendo, na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
Nessa vertente, há que ter em consideração que se trata remuneração extra do agente de execução, bem como o que é referido no preâmbulo da Portaria 282/20913 e o consignado no seu Anexo VIII, de forma conjugada.
Com efeito, e como resulta da própria designação, a remuneração adicional constitui um acréscimo à remuneração normal a que o agente de execução tem direito pela actividade que exerce no processo.
Ora, essa remuneração adicional, como se constata do anexo e seu preâmbulo VIII da Portaria, destina-se a premiar a eficácia e eficiência da recuperação ou garantia de créditos na execução na sequência de diligências promovidas pelo agente de execução.
Situação essa que não se verifica, quando, à semelhança do caso enunciado no n.º 12, do citado art. 50.º, não ocorre essa intermediação do agente de execução.
Portanto, é de concluir, como se faz no acórdão citado, que a remuneração adicional, na medida em que acresce à remuneração fixa devida pela atividade do agente de execução no processo e constitui um prémio pela actividade desenvolvida, sendo instituída como incentivo para que o mesmo tenha uma actividade que potencie a eficácia e eficiência da recuperação e garantia do crédito, só é devida desde que tal finalidade seja concretamente alcançada, ou seja, desde que exista um nexo de causalidade entre a concreta actividade desenvolvida e a obtenção, para o processo executivo, de valores recuperados ou garantidos ao exequente.
Pois, não se perceberia, como lógico, que a remuneração adicional fosse devida de forma automática e sem a intervenção activa desenvolvida pelo agente de execução no resultado alcançado.
Donde, seria logicamente um desvirtuar das finalidades ínsitas a tal acréscimo de remuneração, reconhecer a sua existência e exigibilidade quando o resultado obtido não emerge ou decorre daquela actividade ou diligências, por às mesmas ser alheio, por as mesmas terem-se desenvolvido independentemente da sua vontade ou contributo, por não ter tido qualquer intervenção ou participação naquela recuperação ou garantia do crédito.
Deste modo, constitui-se o direito a tal acréscimo remuneratório quando, existindo, por um lado, sucesso nas diligências executivas este decorra ou provenha em consequência, decorrência ou como fruto da actividade ou diligências realizadas pelo agente de execução.
Ademais a remuneração do agente de execução deve ser proporcional e adequada, eivada de um juízo de razoabilidade e de adequação à sua actividade concretamente desenvolvida, empenho revelado, diligência evidenciada e real contributo para o resultado obtido no respectivo processo executivo (neste sentido aponta-se o referido Acórdão da Relação de Lisboa, de 26.9.2019).
Posto isto, no nosso caso concreto, após consultas a várias entidades e pedidos de informação, realizada a citação prévia, deduzidos que foram embargos à execução, veio, nesses autos, a ser apresentado requerimento do acordo a que chegaram as partes, devidamente homologado, por sentença, que pôs fim ao litígio.
Face à situação concreta, não se pode concluir, nem sequer de forma presumida, que o pagamento decorreu de um qualquer acto da Recorrente.
Assim, não se podendo concluir pela existência de um nexo de causalidade entre a actividade desenvolvida, no caso de consultas, informações e citação prévia, e o valor recuperado, por via do acordo celebrado entre as partes.
Como tal, não estando demonstrada a existência de tal nexo de causalidade, é de concluir que não é devida qualquer remuneração adicional à Recorrente/Agente de execução.
Por conseguinte, tem o recurso de improceder, mantendo-se, consequentemente, a decisão proferida.
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III-Decisão

Nestes termos, acordam os Juízes na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar o recurso improcedente, devendo, em consequência, ser mantida a decisão proferida.
Custas pela recorrente.
Registe e notifique.
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Guimarães, 11.2.2021
(O presente acórdão foi elaborado em processador de texto pela primeira signatária e é por todos assinado electronicamente)

Maria dos Anjos S. Melo Nogueira
Desembargador José Carlos Dias Cravo
Desembargador António Manuel Antunes Figueiredo de Almeida