Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1484/20.6T8VRL.G1
Relator: LÍGIA VENADE
Descritores: PROCEDIMENTO CAUTELAR COMUM
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
CORREÇÃO DE ERRO JUDICIÁRIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/17/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I Não é possível, através de um procedimento cautelar comum declaradamente prévio a uma ação de responsabilidade civil extracontratual contra o Estado por ter sido alegadamente cometido “erro judiciário” na decisão de deferimento de um arresto, pedir a paralisação ou levantamento desse arresto.
II A tal desiderato obsta:
- a falta de identidade objetiva, decorrência dos princípios da instrumentalidade e da dependência, entre a tutela que se pretende obter pela via do procedimento e o direito que se pretende efetivar através do pedido a fazer na ação principal;
- a utilização do meio processual desadequado para sindicar uma decisão proferida noutro processo, ou para antecipar o resultado eventualmente favorável de uma oposição ao arresto, a qual tem igualmente caráter urgente.
III Numa ação de responsabilidade civil por “erro judiciário” é seu pressuposto a prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente; num procedimento cautelar prévio à ação essa alegação teria de estar presente por se integrar na “aparência do direito”.
IV Isso não se verifica se não resulta dos autos do procedimento que os requeridos no arresto em causa sequer interpuseram recurso, tendo o arresto sido confirmado e ampliado face a recurso interposto pela requerente do mesmo.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I RELATÓRIO (seguindo de perto o elaborado na 1ª instância).

1ª- SOCIEDADE TURÍSTICA E HOTELEIRA X S.A., com contribuinte fiscal NIPC ........., com sede social na Avenida …, freguesia de … Peso da Régua;
2ª- Y – GESTÃO, ADMINISTRAÇÃO DE BENS E IMÓVEIS S.A., com contribuinte fiscal NIPC ........., com sede social na Avenida … (Residencial C), freguesia de … Peso da Régua;
3ª- IMOBILIÁRIA W S.A., com contribuinte fiscal NIPC ………, com sede social na Quinta do ... – Rua do ..., n.º …, freguesia de ..., ...;
4ª- P. E. - IMOBILIÁRIA S.A., com contribuinte fiscal NIPC ........., com sede social na Quinta ... – Rua do ..., da freguesia de … Peso da Régua;
5ª- R. VINHOS, INTERNACIONAL S.A., com contribuinte fiscal NIPC ........., com sede social na Rua … – Quinta Peso, freguesia de … Peso da Régua;
6ª- SOCIEDADE TURÍSTICA E HOTELEIRA QUINTA DA K LDA., com contribuinte fiscal NIPC ........., com sede social na Avenida ..., freguesia de … Peso da Régua;
7ª- RESIDENCIAL C LDA., com contribuinte fiscal NIPC ........., com sede social na Avenida ..., freguesia de … Peso da Régua;
8º- F. C., natural da freguesia de … no concelho de Armamar, reformado, com contribuinte fiscal NIF …, com Bilhete de Identidade n.º …, viúvo, com residência na Avenida ..., Peso da Régua;
9ª- A. L., divorciada, residente em Av. … Peso da Régua, portador o Cartão de Cidadão número …, com validade até 17/08/2028 e contribuinte fiscal número NIF …;
10º- F. M., divorciado, residente na Avenida ...., Urbanização ...., n.º … Peso da Régua, portador do Cartão de Cidadão número …., com validade até 04/10/2016, e contribuinte fiscal NIF ………;
11ª- B. L., solteira, menor, residente em Rua … Vila Real, portadora do Cartão de Cidadão número …, com validade até 24/08/2028, e contribuinte fiscal número NIF …;
12º- E. L., solteiro, menor, residente em Rua … Vila Real, portador do Cartão de Cidadão
número …, com validade até 06/09/2023, e contribuinte fiscal número NIF ……;
13º- M. A., solteiro, menor, residente em Rua … Vila Real, portador do Cartão de Cidadão número …, com validade até 17/09/2023, e contribuinte fiscal número NIF ……;
14º- R. T., solteiro, menor, residente na Av. ...., Urbanização … Peso da Régua, portador do Cartão de Cidadão número ……, com validade até 24/04/2014, contribuinte fiscal número NIF …….;
15ª- M. T., solteira, menor, residente na Avenida ...., Urbanização ...., n.º … Peso da Régua, portadora do Cartão de Cidadão número ……, com validade até 24/04/2014, contribuinte fiscal número NIF …….;
16º- P. J., natural da freguesia e concelho de Peso da Régua, Economista, com contribuinte fiscal NIF ………, com Cartão de Cidadão n.º ……, casado, com residência na Rua …., da freguesia de … Peso da Régua e;
17ª- S. P., natural da freguesia e concelho de Peso da Régua, Economista, com contribuinte fiscal NIF ………, com Cartão de Cidadão n.º ……, solteira, com residência na Avenida ...., Urbanização …, freguesia de … Peso da Régua, vieram deduzir
PROCEDIMENTO CAUTELAR NÃO ESPECIFICADO ANTECIPATÓRIO À AÇÃO DE CONDENAÇÃO POR VIOLAÇÃO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS, ARTIGOS 17.º, 18.º, 20.º, 22.º e 62.º TODOS DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA E AINDA
POR VIOLAÇÃO DO ARTIGO 391.º DO CODIGO PROCESSO CIVIL (INVOCANDO ERRO JUDICIÁRIO DE PREJUIZO IRREPARÁVEL), contra
ESTADO PORTUGUÊS, representado pelo Digníssimo(a) Procurador(a)-Adjunto(a) da República Portuguesa junto do Tribunal Judicial de Vila Real, e
M. S. D., LDA. sociedade por Quotas, com contribuinte fiscal NIPC …….., domicílio fiscal e sede social no Lugar …., União de freguesias de ..., …, no concelho de ..., 5130-602 ..., formulando a seguinte pretensão:
-Julgar procedente por provado o presente procedimento cautelar, sem citação prévia da 2ª REQUERIDA;
1. De contrário, devendo esta ser notificada (2ª REQUERIDA), para a imediata suspensão da execução do ARRESTO e advertida nas pessoas do senhor Administrador, Agente de Execução e Mandatários;
2. Ordenando a 2ª REQUERIDA a imediata reposição dos BENS MOVEIS que compõem as ADEGAS como de todos os equipamentos, máquinas e acessórios, para não haver mais perdas com as VINDIMAS para o presente ano.
3. Como a advertindo de que, não poderá praticar atos sobre todos os bens imóveis e móveis ARRESTADOS das REQUERENTES, não violando os seus direitos de posse e propriedade, como de atividade mercantil e comercial normal.
Para o efeito, alegaram, em súmula, que no âmbito dos autos de procedimento cautelar de arresto, que correm termos sob o nº 449/20.2T8VRL, deste mesmo Juízo Central Cível da Comarca de Vila Real, foi deferido parcialmente o arresto requerido pela agora requerida M. S. D., Lda. contra os ora requerentes, arresto que foi mantido e ampliado pelo Tribunal da Relação de Guimarães, e cuja concretização vem causando aos requerentes prejuízo irreparável.
Invocam a violação de normas legais na apreciação e deferimento do arresto, nomeadamente a falta de legitimidade da M. S. D., Lda., a prova ilegal aí considerada, devido ao testemunho da testemunha Dr. R. B., advogado de profissão; a prescrição dos créditos reclamados pela requerente no dito procedimento cautelar de arresto; e, ainda, a posse e aquisição por usucapião dos bens arrestados.
Mais pedem a inversão do contencioso.
*
Os requeridos foram citados e deduziram oposição, no sentido do indeferimento do procedimento cautelar.
*
De seguida foi proferida pelo Tribunal “a quo” decisão que concluiu:

“Nos termos e com os fundamentos expostos, na falta de alegação e consequente impossibilidade de prova dos fundamentos necessários, julgo improcedente o presente procedimento cautelar comum, pelo que não decreto a providência cautelar requerida.”
*
Inconformados, vieram os requerentes interpor recurso que terminam com as seguintes
-CONCLUSÕES-(que se reproduzem)

I. A presente apelação recursiva insere-se em duas vertentes:
Uma pelo erro grosseiro da parcial procedência do arresto (originando prejuízos elevados aos requeridos aqui requerentes) violando o artigo 277.ºaI. e) do CPC, artigos 90.º e 128.°, 120.° e 127.º do CIRE e pelo outro, o indeferimento do presente procedimento cautelar violando o artigo 362.° e, 363.° e 364.° do CPC.
II. Com efeito, perante a insolvência da devedora principal R. VINHOS como dos 8°, 9 a e 10° recorrentes, conforme provado, no ilegal arresto, é de aplicar ao caso os artigos 90.º e 128.º do CIRE.
III. E, como alega a M. S. D. ali requerente, se houve simulação destes 8°, 9 ª e 10° no arresto requeridos (para a desconsideração da personalidade jurídica) que, para chamamento dos restantes requeridos, restava ao Administrador da Insolvência intentar a competente asilo conforme, preceitos e artigos 120.º a 127.° do CIRE. Violando assim o douto acórdão no arresto posto em causa nesta providência, os artigos 90.0 e 128.0 e artigos 120.0 a 127.º todos do CIRE.
IV. Tendo violado o douto acórdão recorrido e sentença o instituto da "Inutilidade Superveniente da Lide". Transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a ação declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. º 277º. do CPC.
V. Conforme extensa jurisprudência, que defende que, nos termos dos artigos 90.° e 128.° n.º 1 e n.º 3 ambos do CIRE e artigo 277.° alínea e) do CP C, a inutilidade superveniente da lide acaba naturalmente por ocorrer após trânsito em julgado da sentença que declara o devedor, insolvente com caráter pleno, conforme Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do Processo n° 2435/09ATBMTS.P1.S1, de 20.09.2011, relatado por Garcia Calejo; Processo n° 2209j06.4TBFUN-L1.S1, de 13.01.2011, relatado por Pereira da Silva e Processo n° 2532/05.5TTLSB¬L1.S1, de 25.03.2010, relatado por Pinto Hespanhol; bem como o Acórdão da Relação do Porto, no âmbito do Processo n° 5614/11.0TBVNG.P1 de 15.03.2012, relatado por Filipe Caroço; e o Acórdão da Relação de Lisboa, no âmbito do Processo n° 15/08.0TVLSB.LI-8~ de 10.11.2011, relatado por Carla Mendes; Processo n° 884j09.7TTALM.LI-4, de 16.03.2011, relatado por Natalino Bolas e Processo n° 545jl0ATBBNV.LI-7, de 31.01.2012, relatado por Gouveia de Barros;
VI. que de forma sintetizada o entendimento jurisprudencial segue o entendimento que a prossecução de uma ação declarativa para reconhecimento de crédito sobre o insolvente, significa o desrespeito pelo artigo 90.0 do CIRE e,
VII. atendendo a que assim o credor dessa ação, credor também na insolvência sub-rogado, está a exercer os seus direitos por meios alheios ao CIRE, uma vez que a sentença a proferir na ação declarativa não tem efeitos executivos no processo da insolvência (art.º 128.° n.º 3 do CIRE) enquanto que a sentença de verificação de créditos que julgue aquele crédito verificado, proferida no processo de insolvência já tem efeitos executivos externos (art.º 233.° n.º 1, alínea c) do CIRE).
VIII. Ou seja, o credor não está dispensado de reclamar créditos no processo de insolvência se quer ver o seu crédito reconhecido c com efeitos executivo, tomando-se, assim, inútil a prossecução da lide declarativa que conduz à prolação de uma sentença que não pode ser executada.
IX. Com efeito, flui patentemente do acórdão proferido no arresto que está em flagrante contradição com aqueles, para fundamentar toda a nossa alegação, de forma cristalina vejamos o douto Acórdão Uniformizador por parte do venerando Supremo Tribunal de Justiça. Acórdão n.º 1/2014 - Transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a ação declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art.º 277.º do CPC . Fernandes da Silva (Relator) . DR 39 SÉRIE I de 2014-02-25 - Texto Integral: Diário da República\BTE \ Bases de Dados Jurídicas.
X. No quadro e no domínio da mesma legislação (CIRE e CPC), sobre a mesma questão fundamental de Direito (extinção da lide por superveniente por mera declaração de insolvência da ré), onde antes do acórdão recorrido houve acórdão uniformizador de jurisprudência e com ele o acórdão recorrido se devesse conformar.
XI. Com essa errada interpretação e aplicação da lei o acórdão recorrido do arresto, determinou uma gritante e desaforada desigualdade de tratamento e impediu que as Iª a 7ª requeridas (e restantes requeridos nesse arresto) aqui recorrentes que prosseguissem a sua vida empresarial com gestão diária, que, através do arresto de todos bens imóveis, remoção de bens móveis (equipamentos e máquinas) impediu a vindima de 2020, como de receber os saldos do Instituto do Vinho do Porto (IVDP). Com enormes prejuízos
XII. Essa mesma errada interpretação e aplicação da lei potencia uma forma de denegação de justiça (porque o sacrifício e a depressão paira sobre os 17° requeridos daquele arresto) e impede os cidadãos / requeridos aqui recorrentes de levar a cabo uma vida pacifica, tendo sido criada a ideia errada na Cessionária M. S. D. de um direito que não lhe assiste, perturbando e manietando as requerentes.
XIII. O acórdão recorrido (que nesta providência e recurso se coloca em crise) não utilizou nem a boa doutrina nem a correta jurisprudência, estando em manifesta oposição com os acórdãos referidos como com o Douto Acórdão Uniformizador proferido pelo Douto Supremo Tribunal de Justiça.
XIV. Daqui deflui, que, na decorrência do que se estipula no artigo 90, o do CIRE, os credores da insolvência apenas poderão exercer os seus direitos em conformidade com os preceitos do presente Código, durante a pendência do processo de insolvência, o que significa que, tratando-se como se trata do exercício de um direito de crédito contra os insolventes devedora R. VINHOS e fiadores insolventes 8°, 9a e toa requeridos / requerentes o mesmo poderia e deveria ter sido acionado, quer nos termos do preceituado no artigo 128.0 do CIRE (..), quer, subsequentemente, quiçá, tendo em atenção o normativo inserto no artigo 146. o do mesmo diploma.
XV. Assim como, para sufragar alegada simulação com devolução de bens para as massas insolventes destes 8°, 9a e 10° requerentes / requeridos (de eventual desconsideração da personalidade jurídica) é ao Administrador da Insolvência que compete intentar a ação conforme preceitos e artigos 120.º a)127.º do CIRE.
XVI. Ainda, a douta sentença não vislumbra qualquer prejuízo ou perigo para as recorrentes. Quando foram expostos muitos fundamentos com toda a clareza edis criminados, todos os prejuízos nesta providência. A remoção dos equipamentos e máquinas das ADEGAS impedindo da realização das vindimas, não causa prejuízos?
XVII. O arresto do Benefício (que seria pago pelo Instituto do Vinho de Porto) IVDP de valores expressivos às ali requeridas aqui requerentes, impedidas de usar esses "meios financeiros" para pagamento a fornecedores, Lavradores e outros credores, não causa prejuízos?
XVIII. O bom nome das requerentes ali requeridas que negociam milhares / milhões de euros, que se encontram afetadas pelo arresto ilegal, não causa prejuízo?
XIX. O arresto dos imóveis onde foram intercetados negócios celebrados de compra venda e promessa (Quinta do ...) por três milhões, onde o comprador pretende resolver o negócio, e exige o sinal em dobro, não causa prejuízo?
XX. Viola também o douto Acórdão a Lei no excesso de arresto, de algo peticionado de montante de 5/6 milhões, foram arrestados bens imóveis de 15 milhões conforme, ponto 6r do douto acórdão. FACTOS PROVADOS - PONTO 61º - Bem sabendo que a data as 1º a 4a Requeridas dispunham de património com valor real de mercado superior a 12 (doze) milhões de euros, e que a soma dos respetivos capitais sociais se cifrava em 3.500.000,00€ (Três milhões e quinhentos mil euros).
XXI. Com a presente providência as recorrentes, pretendem que se decrete de forma preliminar, pela entrega dos equipamentos I máquinas removidas e o levantamento do arresto no beneficio junto do IVDP para minorar os prejuízos.
XXII. Contudo, a douta sentença entendeu que não foram apresentados factos e fundamentos que demonstrasse esse prejuízo. Mas, com todo respeito, viu perigo decretando o arresto (e de for. na excessiva) que nem de forma indiciária se vislumbra. A Cessionária M. S. D. sub-rogada resta-lhe cobrar o seu crédito na Massa Insolvente da R. VINHOS onde a Caixa … reclamou créditos.
XXIII. Acresce ainda, que a douta sentença também omitiu pronuncia sobre todas as exceções dilatórias e perentórias. Quanto à probabilidade da existência do direito de crédito da requerente, não obsta à sua consideração neste procedimento cautelar o facto de o mesmo ainda não estar reconhecido pelos Tribunais Portugueses. O contrato de cessão de crédito foi impugnado como está em recurso, ou seja, há data do arresto a requerente M. S. D. não é credora de qualquer requerido.
XXIV. Com efeito, com a declaração de insolvência da devedora principal R. VINHOS onde a Caixa … reclamou créditos depois tendo-os cedido à M. S. D., como a insolvência dos principais requeridos (80, 9" e 100 que alegadamente simularam ações e participais sociais co prejuízo para as massas) no arresto, conduz, por si só, à imediata "inutilidade superveniente da lide" em ação declarativa proposta contra eles por um credor já sub-rogado, até por eventual "litispendência" com o objetivo de ser ressarcido fora do processo de insolvência, não podendo ser um "credor privilegiado" em detrimentos dos restantes.
XXV. As ações declarativas intentadas contra o devedor declarado insolvente seguem o regime contido nos artigos 90.º e 128.º do CIRE que prevê a sua extinção por inutilidade, e sobre eventual interesse para a massa de bens a arrecadar aos 8º, 9ª e 10° requeridos segue o normativo dos artigos 120.0 a 127.° do CIRE ação requerida pelo Administrador da Insolvência, junto do processo falimentar.
XXVI. De contrário, :até à oposição no mesmo arresto que os aqui requerentes ali requeridos irão deduzir, determinar-se o levantamento imediato do "Benefício junto do IVDP) Instituto de Vinho do Porto dos seus créditos que as ta a 73 requerentes detém para solver a suas tesourarias.
XXVII. Ordenar-se de forma imediata a entrega de todos os equipamentos e máquinas "removidas" no auto de arresto; porque, o arresto dos imóveis supera em muito (30 milhões euros) conforme provado nu PONTO 61º FACTOS PROVADOS para garantir o «alegado crédito" da requerida/requerente M. S. D..
XXVIII. Tudo para minorar os prejuízos diários das requerentes que irão deduzir no competente processo.
XXIX. O acórdão recorrido do arresto posto em crise nesta providencia que também se recorre, ao decidir como decidiu, violou por errada interpretação e aplicação da lei, o disposto nos artigos 391.° e 393.° e o artigo 277.° todos do Código de Processo Civil e o disposto nos artigos 90.0 e 128.°, 120.0 a 127.0 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Pedem que se conceda provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença e, consequentemente, deverá determinar-se o imediato levantamento do arresto, com todas as consequências legais.
*
A requerida M. S. D., LIMITADA, apresentou contra-alegações com as seguintes
-CONCLUSÕES-

I. A decisão recorrida não poderia ter outro fim que não a sua total improcedência.
II. O Tribunal a quo andou bem ao considerar que não estão preenchidos os requisitos para o decretamento da providência cautelar requerida.
III. O disposto nos artigos 362.º e 368.º, ambos do Código de Processo Civil são claros quanto aos requisitos para o decretamento de uma providência: i) a provável existência do direito em análise fundado; ii) receio de que outrem cause uma lesão; iii) gravidade dessa lesão; iv) a natureza dificilmente reparável dessa mesma lesão e v); que o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar.
IV. Com o devido respeito, e conforme doutamente decidiu a Meritíssima Juiz a quo, in casu, nenhum destes requisitos se encontra preenchido, pelo que a decisão recorrida é inatacável.
V. Ou seja, da petição apresentada pelas Requerentes, aqui recorrentes, não resulta: “o receio de lesão e sua gravidade”; “a natureza dificilmente reparável dessa lesão”, e que o “prejuízo resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar”.
VI. Para além disso, a sentença recorrida analisa sabiamente o seguinte: “(…) Analisado o requerimento inicial, constata-se que os Requerentes, face à pretensão formulada, não pretendem, desde logo, como referem, instaurar qualquer ação de condenação por erro judiciário de prejuízo irreparável, mas antes, fazer alterar a decisão proferida no procedimento cautelar de arresto que referem, como resulta do facto de pretenderem a inversão do contencioso, o que mais não configura do que a alteração da decisão de arresto proferida no dito procedimento cautelar, para o que o presente procedimento cautelar comum não é o meio próprio, até porque este Tribunal não é um Tribunal de recurso que possa alterar decisões proferidas, no caso, até por um Tribunal da Relação.(…)” – sublinhado nosso.
VII. Mais, para além de não ser tão-pouco o meio próprio, as Requerentes, aqui Recorrentes, não atentam que a decisão que colocam em causa, nada tem a ver com o arresto dos bens móveis e muito menos com o arresto do benefício pago pelo IVDP.
VIII. Porquanto essa decisão resulta de ampliação proferida no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães.
IX. Assim, as recorrentes lançam mão de meio impróprio e não acertam nada decisão que alegadamente se pretendiam “atacar”.
X. Sem prescindir, as Requerentes/Recorrentes para além de não alegarem factos susceptíveis de preencherem os pressupostos para o decretamento de uma providência cautelar,
XI. Os factos alegados consubstanciam lamentáveis inverdades, sem qualquer pudor, tentando induzir o Tribunal em erro!
XII. No entanto, a decisão recorrida é demonstrativa que ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo não se deixou enganar.
XIII. A título de exemplo, as Recorrentes, com vista a uma tentativa de invocar alegado prejuízo, referem a realização de arresto no HOTEL ….
XIV. Sucede que, as recorrentes sabem que, em momento algum, foi realizada qualquer diligência pela naquele local.
XV. No referido hotel não esteve presente em qualquer diligência de arresto nem o Agente de Execução, como também não estiveram presentes mandatários, nem a patrulha da GNR, nem os legais representantes das Recorrentes!
XVI. E, continuando a exacerbar a embuste, com vista a invocar prejuízo, alegam a existência uma taxa de ocupação completa do dito Hotel.
XVII. Ora, as recorrentes sabem, como todos sabemos que, o mundo atravessa uma pandemia originada pela COVID-19, que teve consequências graves na área do turismo, sendo que naquela data o Hotel estaria muito longe de lotação esgotada.
XVIII. As recorrentes alegam ainda um “prejuízo diário” por força do arresto do Benefício do Instituto do Vinho do Porto.
XIX. As recorrentes sabem, porque não têm como não saber, as condições de pagamento do dito benefício.
XX. Ou seja, as recorrentes sabem que ainda não receberam nem podem receber o mesmo, independentemente, da existência de arresto,
XXI. Uma vez que, o mesmo só ocorre em momento posterior à realização das vindimas.
XXII. Assim, mais uma vez não resulta no preenchimento de qualquer pressuposto para o decretamento de providência cautelar.
XXIII. As requerentes/Recorrentes alegam também que, por força do arresto ficou prejudicada a vindima de 2020, o que causou um prejuízo no valor de € 1.2500.000.
XXIV. Não obstante, a verdade é que, a Requerente “R. VINHOS Internacional”, no dia 31 de agosto, ou seja, já após a realização da única diligência de arresto com remoção, confirmou a venda de “vinho generoso tinto colheita de 2020, até 800 pipas, ao preço de € 1050,00 a pipa de 550 litro, confirmando ainda, a venda de cerca de 200.000 litros de DOC Douro 2020, requerendo ainda, que a “Vale … Sociedade Agrícola” lhe fizesse chegar no decurso daquela semana, 2 camiões de aguardente vínica.
XXV. Resultando assim (mais uma) enorme falsidade o que alegam as requerentes/recorrentes.
XXVI. Pelo que, mais uma vez, andou bem o Tribunal a quo.
XXVII. Mas, as recorrentes não ficam por aqui. Há mais.
XXVIII. As recorrentes afirmam descaradamente que o direito de crédito da aqui recorrida (não obstante alegar que é requerente, mas entende-se que se fala da M. S. D.), “não estar reconhecido pelos Tribunais Portugueses”.
XXIX. No entanto, não deixa de ser curioso que as requerentes/recorrentes omitem que as pessoas singulares que detém as participações sociais das sociedades em causa, tenham sido notificados do incidente de habilitação de cessionário deduzido pela aqui recorrida nos respetivos processos de insolvência e nada tenham dito ou alegado,
XXX. Pelo que, as requerentes/recorrentes sabem, porque não têm como não sabe que, com decisão transitada em julgado, a aqui recorrida “M. S. D.” foi habilitada cessionário no âmbito dos seguintes: Proc. 306/15.4T8PRG-Z, que correu os seus termos pelo Juízo de Comércio de Vila Real (Insolvente: F. C.); Proc. 397/18.6T8PRG – F, que correu os seus termos pelo Juízo de Comércio de Vila Real (Insolvente: A. L.); Proc. 6/18.3T8PRG-F, que correu os seus termos pelo Juízo de Comércio de Vila Real (insolvente: F. M.).
XXXI. Ou seja, apenas não transitou em julgado a sentença de habilitação de cessionária que foi objeto de recurso por parte da “Sociedade Agrícola Quinta do R. VINHOS Limitada”.
XXXII. Que, a requerente/recorrente Sociedade Agrícola Quinta do R. VINHOS Limitada, bem sabe não ter qualquer razão ou fundamento jurídico no recurso apresentado.
XXXIII. A aqui recorrida “M. S. D.” adquiriu validamente o crédito em questão, por contrato de cessão de créditos outorgado no dia 20 de Dezembro de 2019, no Cartório Notarial pertencente a P. C., pelo qual adquiriu um conjunto de créditos à sociedade “C. I. - Designated Activity Company”.
XXXIV. Que por sua vez haviam sido adquiridos inicialmente pela sociedade “C. I. - Designated Activity Company” à “Caixa ... S.A.”, por escritura de cessão de créditos celebrada em 04 de Outubro de 2018.
XXXV. Entre os créditos adquiridos pela “C. I. - Designated Activity Company” e posteriormente cedidos à “M. S. D.” encontram-se os créditos concedidos pela “Caixa ... S.A.” à “Sociedade Agrícola Quinta do R. VINHOS Limitada” supra melhor discriminados.
XXXVI. Assim, legitimamente, por força do mencionado contrato de cessão de créditos a aqui recorrida “M. S. D.” tornou-se detentora e credora dos créditos sobre a “Sociedade Agrícola Quinta do R. VINHOS Limitada” que, totalizam, aproximadamente, € 5.752.401,30 (cinco milhões setecentos e cinquenta e dois mil quatrocentos e um euro e trinta cêntimos), e bem ainda dos respectivos juros de mora.
XXXVII. Enfim, isto, apenas para demonstrar que a Meritíssima juiz a quo esteve atenta, não se deixando ludibriar pelas inverdades e inexactidões alegadas pelas Requerentes/Recorrentes,
XXXVIII. Constatando a falta de preenchimento dos pressupostos para decretar uma providência cautelar, concretamente, a requerida pelas aqui Recorrentes.
XXXIX. Designadamente, quando refere que: “(…) Aliás, no caso, não se mostra sequer alegada a probabilidade séria da existência do direito traduzido na ação, proposta ou a propor, que tenha por fundamento o direito titulado (fumus boni júris). (…)”
XL. Assim como, quando menciona na douta decisão recorrida: “(…) Acresce que, os Requerentes também não alegam factos suscetíveis de indiciarem um justo e fundado receio de que outrem, ou seja, os requeridos, cause lesão grave e de difícil reparação ao alegado direito (periculum in mora). (…)”
XLI. Ou, quando, naturalmente, constatou a Meritíssima Juiz a quo, atenta a sua evidência, que:
“(…) os requerentes colocam apenas possibilidades de a segunda requerida vir a praticar atos de alienação relativamente aos bens arrestados, sem que existam quaisquer indícios de que possa vir a ocorrer tal possibilidade, até porque os bens imóveis se mostram registados a favor dos respetivos requeridos.” – sublinhado nosso.
XLII. Ora, esta gritante evidência, tanto mais que as Requerentes se encontram representadas por I. Mandatário, quando fundamentam o seu pedido e justificam o “periculum in mora” baseadas na possibilidade de a requerida/recorrida “M. S. D.”, porventura, poder “de repente prometer vender ou outorga algum negócio, criando a convicção no comprador ser seus os bens arrestados levando-o ao erro e engano”; o que levaria a que as requerentes/recorrentes tivessem “mais diligências e atos jurídicos a praticar, riscos que se agravam se essa alegada e ilegal alienação fosse a uma entidade em pré insolvência”!, é incompreensível.
XLIII. Porquanto, de que forma poderia a aqui Recorrida alienar os bens imóveis arrestados, se os mesmos continuam registados a favor delas próprias?!
XLIV. Assim, em face de tudo o supra exposto, facilmente se conclui que os facos alegados pelas requerentes/recorrentes, são meras considerações que para além de inexactas, não constituem tão pouco um receio de lesão grave e de natureza dificilmente reparável.
XLV. Sem prescindir, e relativamente ao alegado “excesso de arresto” preconizado pelas Requerentes/Recorrentes, refira-se primeiramente que o valor de determinado imóvel, na falta de outros indicadores, terá que balizar-se pelo seu matricial e/ou o valor de mercado para imóveis com características semelhantes em determinada localidade.
XLVI. Se atentarmos no exemplo da Quinta de …, ainda propriedade da Recorrente Sociedade Turística e Hoteleira Quinta da K, Lda., verificamos que um imóvel que para as Requerentes/recorrentes valerá milhões de euros, para um potencial comprador valerá apenas alguns milhares de euros, dado que conforme resulta dos autos em documento junto pelas requerentes/recorrentes, sobre o mesmo terá celebrado o contrato de arrendamento rural em que o valor da renda anual é de apenas € 3.500,00, contrato esse celebrado pelo prazo de 20 anos.
XLVII. Ainda que se perceba o real motivo da celebração do mencionado contrato, a verdade é que tal ónus simulado implica para um potencial comprador um desinteresse na aquisição o pagamento por milhões de euros de um bem, do qual retira um rendimento mensal de €291,67.
XLVIII. Donde resulta que não existe qualquer excesso de arresto, porquanto não é possível retirar com a precisão necessária o valor de cada um dos imóveis arrestados, assim como os ónus que possamos vir a descobrir sobre os mesmos incidem.
XLIX. Em suma, os pedidos deduzidos a final pelas requerentes, aqui recorrentes, no seu requerimento inicial visavam: a imediata suspensão do arresto; a reposição imediata dos bens móveis que compõem as adegas como de todos os equipamentos, máquinas a acessórios para não haver mais perdas com as vindimas deste ano.
L. No entanto, não ocorreu qualquer remoção dos bens móveis que compõem as adegas, com exceção dos bens referidos nos autos de arresto em questão e que, relevância ou impacto nenhum tiveram com as vindimas que foram efetuadas pelas requerentes.
LI. E, relativamente a eventuais atos praticados sobre todos os bens imóveis e móveis arrestados das requerentes, só na imaginação destas e, com um claro atropelo legislativo podem referir tal alegação.
LII. Assim, conforme bem decidiu o Tribunal a quo não existe qualquer probabilidade séria e fundado receio de lesão de um direito e a adequação da providência à lesão iminente.
LIII. De igual modo, também não existe periculum in mora.
LIV. O que por si é demonstrativo da inexistência dos requisitos para o decretamento de uma providência cautelar.
LV. Pelo que, andou bem o Tribunal a quo ao decidir que: “(…) Aliás, nem alegam factos que possam indiciar o justo receio, porque em nada concretizado, de lhes ser causada lesão grave, como não alegam factos dos quais se possa retirar que tal suposta lesão grave seja de difícil reparação, não apresentando quaisquer factos no sentido de que quer o Requerido Estado Português, quer a Requerida M. S. D., não dispõem de meios que, se fosse o caso, permitissem reparar qualquer eventual dano.
Sendo assim, e sem necessidade de outras considerações, verifica-se que não estão preenchidos os requisitos para o decretamento da providência requerida, pelo que a mesma terá de improceder. (…)”
LVI. Em suma, as alegações de recurso das requerentes/recorrentes são, mais uma vez, “uma mão cheia de nada”.
LVII. Repleta de factos distorcidos, falsos, onde atiram contra tudo e contra todos, sem alegar nada consistente com o direito que pretendem acautelar.
LVIII. Com efeito, deve manter-se a falta de alegação e consequente impossibilidade de prova dos fundamentos necessários para o decretamento da providência cautelar requerida nos presentes autos.
LIX. E, em consequência manter-se inalterada a decisão proferida pela Meritíssima Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real.
LX. A sentença assentou correctamente os factos e fez correcta interpretação e aplicação do Direito aos ditos factos, pelo que não violou qualquer preceito legal, nomeadamente, os previstos nos artigos 362.º e 368.º, ambos do Código de Processo Civil.
LXI. Pelo que, andou bem o Tribunal a quo ao decidir de acordo com o que dispõe a Lei, julgando totalmente improcedente o procedimento cautelar comum deduzido pelas aqui Recorrentes.
Mais diz que não deve ser admitido o recurso interposto pelas recorrentes e, consequentemente, deve ser mantida a Sentença recorrida, com as consequências legais.
*
O Ministério Público Junto do respetivo Juízo Central Cível em representação do Estado Português veio apresentar contra-alegações com as seguintes
-CONCLUSÕES-

A. Vem o recurso interposto da Sentença proferida a 09-10-2020 (ref.ª 34772004), na qual se decidiu, em síntese, no dispositivo, que: “(…) na falta de alegação e consequente impossibilidade de prova dos fundamentos necessários, julgo improcedente o presente procedimento cautelar comum, pelo que não decreto a providência cautelar requerida. (…)”;
B. Essa é a única decisão recorrida, cujo âmbito de recurso se encontra delimitado pelas conclusões da motivação e não qualquer outra como pretendem as recorrentes;
C. O Ministério Público já se pronunciou em sede de oposição ao procedimento cautelar instaurado, para onde nos remetemos – ref.as 2376520 e 2376522 (ambas, de 23-09-2020) – e, pese embora o decidido pelo Tribunal a quo, de forma assertiva e clarividente (na nossa humilde perspetiva) vêm mais uma vez as recorrentes pôr em causa a Decisão Sumária proferida por esse Venerando Tribunal da Relação de Guimarães no âmbito do processo n.º 449/20.2T8VRL;
D. Foi proferida Decisão nesse processo n.º 449/20.2T8VRL, a 21 de maio de 2020, cujo dispositivo tem o seguinte teor:
“(…) Nos termos e com os fundamentos expostos, na parcial procedência dos fundamentos alegados pelos requerentes, julgo parcialmente procedente o presente procedimento cautelar, pelo que:
a) Decreto a providência cautelar de arresto, sobre as participações sociais detidas por F. C., A. L. e F. M., nas sociedades requeridas, ainda que indiretamente, nomeadamente, através dos seus filhos e netos, a saber:
1. SOCIEDADE TURÍSTICA E HOTELEIRA X, S.A., Pessoa coletiva com o número fiscal e de matrícula único ........., com sede na Avenida … Peso da Régua;
2. Y – GESTÃO, ADMINISTRAÇÃO DE BENS E IMÓVEIS, S.A., Pessoa colectiva com o número fiscal e de matrícula único ........., com sede na Avenida ... (Residencial C), em … Peso da Régua;
3. IMOBILIÁRIA W, S.A., Pessoa coletiva com o número fiscal e de matrícula único ………, com sede na Quinta do ... – Rua do ..., n.º ...;
4. P. E. – IMOBILIÁRIA, S.A., Pessoa coletiva com o número fiscal e de matrícula único ........., com sede na Quinta ... – Rua do ..., Peso da Régua;
5. R. VINHOS, INTERNACIONAL, S.A., Pessoa coletiva com o número de identificação fiscal e de matrícula único ........., com sede na Rua ...., freguesia e concelho de Peso da Régua;
6. SOCIEDADE TURÍSTICA E HOTELEIRA QUINTA DA K, LDA., Pessoa colectiva com o número de identificação fiscal e de matrícula único ........., com sede na Avenida ..., Peso da Régua, e
7. RESIDENCIAL C, LDA., Pessoa coletiva com o número de identificação fiscal e de matrícula único ........., com sede Avenida ..., Peso da Régua.
b) Julgo improcedente o que mais foi peticionado.
c) Custas pela Requerente (art. 539º, nº 1 do CPC).
d) Notifique e registe. (…)”
E. Nesse processo, a ‘M. S. D., Lda.’ interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, que, considerando o caráter urgente dos autos, proferiu Decisão Sumária (art.º 656.º do C.P.C.) a 15 de julho de 2020, nestes termos: “(…) Em face do exposto, decide-se julgar procedente a apelação, revogando-se a sentença recorrida, quanto à sua alínea b) e ordenando-se o arresto (para além do já decidido na alínea a)) dos bens imóveis identificados no artigo 126.º do requerimento inicial, bem como dos bens móveis das requeridas e do “benefício” pago pelo IVDP às sociedades requeridas. (…)” (sublinhado nosso);
F. Sindicada que foi aquela Decisão proferida, o Tribunal da Relação de Guimarães, ainda alargou o seu âmbito material decisório e concedeu total provimento ao recurso interposto pela ‘M. S. D., Lda.’;
G. Aquela decisão proferida a 21 de maio de 2020, em virtude desta Decisão Sumária, transitou em julgado a 04 de agosto de 2020;
H. Decisões transitadas em julgado apenas podem ser impugnadas por via de recurso extraordinário de revisão, nos termos, efeitos e pressupostos taxativamente enumerados no art.º 696.º do C.P.C.;
I. Não podem as recorrentes pretender com este procedimento cautelar não especificado pôr em causa uma decisão transitada em julgado, nem obter por esta via uma qualquer reponderação do decidido e/ou uma nova decisão em que o erro judiciário que dizem ter sido cometido possa ser agora reparado;
J. Querendo, como aliás até fazem menção na própria petição inicial – por “(…) antecipatório à ação de condenação (…)” - pois que instaurem ação de processo comum, de responsabilidade civil, contra o Estado;
K. No que especificamente aos procedimentos cautelares diz respeito, são dois os meios ao alcance do arrestado para se opor a decisão que decretou o arresto: recorrer da mesma ou deduzir oposição;
L. Com o primeiro pretende-se colocar em causa a legalidade da decisão por falta dos necessários requisitos de direito; no segundo, pretende-se invalidar os fundamentos de facto que serviram de suporte ao decretamento da providência ou obter a redução da mesma aos justos limites;
M. As recorrentes fundamentam este procedimento cautelar não especificado na sua discordância quanto às razões de facto e também jurídicas em que a decisão proferida no processo n.º 449/20.2T8VRL se encontra alicerçada e pretendem colocar em causa matéria de facto anteriormente fixada, bem como as conclusões probatórias e de direito que o Tribunal extraiu, pelo que, ultrapassaram o legalmente admissível;
N. Nesta medida, o presente procedimento cautelar trata-se, no mínimo, de uma situação de inadmissibilidade do conteúdo do requerimento e que acarreta a não consideração de todos os segmentos respeitantes aqueles autos, por violar o caso julgado;
O. O que constitui exceção perentória, de conhecimento oficioso, por se tratar de facto que impede o efeito jurídico dos factos articulados pelas recorrentes e implica a absolvição total do Estado relativamente ao pedido por aqueles formulado (artigo 576.º, n.º3, 579.º, 580.º e 581.º, todos do Código de Processo Civil – doravante, apenas C.P.C.);
P. As recorrentes não pretendem, apesar do que pretensamente alegam, instaurar qualquer ação de condenação por erro judiciário de prejuízo irreparável, mas antes, fazer alterar a decisão proferida no procedimento cautelar de arresto;
Q. Pretendem com o presente procedimento cautelar e agora com o presente recurso fazer alterar por esta via, invertendo o contencioso, a decisão de arresto proferida no processo n.º 449/20.2T8VRL;
R. Este procedimento cautelar comum não é o meio próprio;
S. Este procedimento cautelar comum e este Juízo Central Cível não são um tribunal de recurso, para que, como ilegalmente pugnam as recorrentes, se poder agora, nesta sede, alterar decisões anteriormente proferidas, já transitadas em julgado e, pelo menos uma delas, proferida por um Tribunal Superior, in casu, por esse Venerando Tribunal da Relação de Guimarães;
T. Insistem as requerentes, contra legem, nesta via de recurso, em atacar uma Decisão Sumária proferida por esse Venerando Tribunal da Relação de Guimarães no processo n.º449/20.2T8VRL, já transitada em julgado;
U. As recorrentes pretendem que esse Venerando Tribunal altere num processo diferente, de natureza cautelar, uma Decisão Sumária proferida em momento anterior, num outro processo, já transitada em julgado, também por esse Venerando Tribunal da Relação de Guimarães;

SEM PRESCINDIR,
V. A um qualquer procedimento cautelar tem de estar subjacente e vir alegado, o que não se verifica neste caso, a probabilidade séria da existência do direito traduzido na ação, proposta ou a propor, que tenha por fundamento o direito titulado (fumus boni juris);
W. Com efeito, e como assertivamente (no nosso modesto entendimento) decidiu o Tribunal a quo, o direito invocado pelas recorrentes, será o direito a uma indemnização por erro judiciário (supostamente, de prejuízo irreparável);
X. As recorrentes não alegam factos suficientes suscetíveis de levarem a uma probabilidade séria da existência de tal direito;
Y. Acresce que, naquele processo n.º449/20.2T8VRL, o Tribunal a quo decretou o arresto parcial (apenas sobre as participações socias dos requeridos) e esse Venerando Tribunal da Relação de Guimarães não só manteve a decisão como até alargou o seu âmbito de procedência, porque ampliou o arresto;
Z. Falece o primeiro dos requisitos do procedimento cautelar;
AA. As recorrentes também não alegam factos suscetíveis de indiciarem um justo e fundado receio de que outrem, ou seja, os requeridos, cause lesão grave e de difícil reparação ao alegado direito (periculum in mora);
BB. Falece o segundo, senão primeiríssimo, requisito para o decretamento da providência requerida;
CC. Na nossa humilde perspetiva, bem andou o Tribunal a quo quando decidiu “(…) na falta de alegação e consequente impossibilidade de prova dos fundamentos necessários, julgo improcedente o presente procedimento cautelar comum, pelo que não decreto a providência cautelar requerida. (…)”;
DD. Não violou o Tribunal a quo quaisquer normativos, designadamente, os artigos 90.º, 120.º, 127.º, 128.º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas e 277.º, 362.º, 363.º, 364.º, 391.º e 393.º do Código de Processo Civil;
EE. Não nos merece censura a Sentença proferida pelo Tribunal a quo, com a qual concordamos in totum, devendo a mesma ser mantida e assim improceder o recurso, em todas as suas vertentes de argumentação.
Nestes termos, deverá ser negado provimento ao recurso, confirmando-se, in totum, a Sentença recorrida por nenhum agravo ter feito à Lei e por nenhum reparo nos merecer.
***
Após os vistos legais, cumpre decidir.
***
II QUESTÕES A DECIDIR.

Decorre da conjugação do disposto nos artºs. 608º, nº. 2, 609º, nº. 1, 635º, nº. 4, e 639º, do Código de Processo Civil (C.P.C.) que são as conclusões das alegações de recurso que estabelecem o thema decidendum do mesmo. Impõe-se ainda ao Tribunal ad quem apreciar as questões de conhecimento oficioso que se resultem dos autos.

Impõe-se por isso no caso concreto e face às elencadas conclusões decidir se:

-deve ser revogada a decisão que julgou improcedente o procedimento cautelar e indeferiu a providência requerida.
***
III- MATÉRIA DE FACTO.

A matéria de facto a considerar prende-se tão só com a factualidade alegada pelos requerentes no seu requerimento inicial como fundamento do seu pedido, bem como o teor deste, o que já consta em resumo do relatório “supra” e que resulta da leitura da peça respetiva.
***
IV O MÉRITO DO RECURSO.

O Tribunal recorrido decidiu pela improcedência do procedimento cautelar independentemente da prova que viesse a ser feita relativamente à matéria alegada como seu fundamento (ou causa de pedir), dada a sua manifesta improcedência.
Sem querer repetir o Tribunal recorrido, em sede de enquadramento da decisão a proferir cabe tecer algumas considerações sobre os procedimentos cautelares e concretamente sobre o comum, para depois as aplicar ao caso.
Veremos se tal é possível e se no caso se justifica.
O objetivo das providências cautelares há-de ser o de acautelar o efeito útil da ação –artº. 2º, nº. 2, C.P.C..
As providências cautelares têm a sua justificação no princípio do nosso sistema processual civil segundo o qual a demora de um processo não deve prejudicar a parte (-com maior desenvolvimento vide Marco Carvalho Gonçalves, “Providências Cautelares”, pags. 81 a 91 da 2ª edição). As providências cautelares são medidas que são requeridas e decretadas, tendo em vista acautelar o efeito útil da ação, mediante a composição provisória dos interesses conflituantes, mantendo ou restaurando a situação de facto necessária à eventual realização efetiva do direito. “Tais medidas visam precisamente impedir que, durante a pendência de qualquer ação declarativa (...), que a situação de facto se altere de modo a que a sentença nela proferida, sendo favorável, perca toda a sua eficácia ou parte dela. Pretende-se deste modo combater o “periculum in mora” (o prejuízo da demora inevitável do processo) a fim de que a sentença se não torne uma decisão puramente platónica” -Antunes Varela e Outros, in Manual de Processo Civil, pag. 23 e segs. da 2ª edição.
No Código de Processo Civil existe a figura do processo cautelar comum, “comportando a regulamentação dos aspectos comuns a toda a justiça cautelar. Institui-se, por esta via, uma verdadeira ação cautelar geral para a tutela provisória de quaisquer situações não especialmente previstas e disciplinadas, comportando o decretamento das providências conservatórias ou antecipatórias adequadas a remover o “periculum in mora” concretamente verificado e a assegurar a efectividade do direito ameaçado, que tanto pode ser um direito já efetivamente existente, como uma situação jurídica emergente de sentença constitutiva, porventura ainda não proferida” -preâmbulo do Dec. Lei n.º 329-A/95, de 12/12. O procedimento cautelar comum tem por isso carácter residual, quer no plano das regras adjetivas, quer no plano das providências que nele se podem integrar -cfr. António Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, Procedimento Cautelar Comum, Vol. III, pág. 56.
Ao procedimento cautelar comum aplicam-se os artºs. 362º a 376º do C.P.C..
Refere o nº. 1 do artº. 362º que sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória, concretamente adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado. O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em ação constitutiva, já proposta ou a propor – nº. 2 do mesmo. “Não são aplicáveis as providências referidas no n.º 1 quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas na secção seguinte” – nº 3 do mesmo. A providência é decretada desde que haja probabilidade séria da existência do direito e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão. – nº. 1 do artº. 368º. “A providência pode, não obstante, ser recusada pelo tribunal, quando o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar” –nº. 2.

São então requisitos (de fundo e de forma) necessários ao decretamento desta providência:

1. - Probabilidade séria da existência de um direito (aparência do direito – “fumus bonis juris”).
2. - Fundado receio de que a demora natural na solução do litígio lhe causará uma lesão grave e dificilmente reparável (ao direito que se pretende fazer valer em ação pendente ou a instaurar) –“periculum in mora”; a providência cautelar será o meio adequado a evitar o dano eminente ou o agravamento da lesão.
3. - Desde que o prejuízo resultante de um tal recurso não exceda consideravelmente o dano que, através da providência, se pretenda evitar (-não nos alongaremos nesta matéria, mas pode ver-se neste ponto antes uma causa impeditiva ou extintiva do exercício do direito).
4. - E não cabimento da possibilidade de recorrer a qualquer outro tipo de procedimento cautelar nominado.

Veja-se nesta matéria e a propósito dos requisitos o Ac. da Rel. do Porto de 21/02/2018 (dgsi.pt, relatora Drª Maria de Jesus Pereira).
Estes requisitos são de verificação cumulativa, podendo nas providências nominadas pode ser dispensado um ou outro destes requisitos em concreto.

Refere ainda o artº. 364º (“Relação entre o procedimento cautelar e a ação principal”), que:

“1 - Exceto se for decretada a inversão do contencioso, o procedimento cautelar é dependência de uma causa que tenha por fundamento o direito acautelado e pode ser instaurado como preliminar ou como incidente de ação declarativa ou executiva (negrito nosso).
2 - Requerido antes de proposta a ação, é o procedimento apensado aos autos desta, logo que a ação seja instaurada e se a ação vier a correr noutro tribunal, para aí é remetido o apenso, ficando o juiz da ação com exclusiva competência para os termos subsequentes à remessa.
3 - Requerido no decurso da ação, deve o procedimento ser instaurado no tribunal onde esta corre e processado por apenso, a não ser que a ação esteja pendente de recurso; neste caso a apensação só se faz quando o procedimento estiver findo ou quando os autos da ação principal baixem à 1.ª instância.”.

Daí decorre que as providências cautelares estão necessariamente dependentes de uma ação já pendente ou a instaurar posteriormente, acautelando ou antecipando provisoriamente os efeitos da providência definitiva, na pressuposição de que venha a ser favorável ao requerente a decisão a proferir no processo principal -cfr. António Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, Procedimento Cautelar Comum, Vol. III, pág. 120. Ressalvados ficam os casos da inversão do contencioso em que os efeitos podem via a tornar-se definitivos –artº. 369º d C.P.C. (…).
O objeto da providência há-de, por conseguinte, ser conjugado com o objeto da causa principal, embora tal dependência não imponha perfeita identidade (mesma obra, pags. 120 e 121). A identidade entre o direito acautelado e o que se pretende fazer valer no processo definitivo impõe, pelo menos, que o facto que serve de fundamento àquele integre a causa de pedir da ação principal.
Esta identidade objetiva, no entanto, não tem de ser total, sendo admissível que o objeto da ação principal seja mais amplo que o do procedimento cautelar, abrangendo mesmo outros direitos não salvaguardados pela providência cautelar não especificada.
Nesta matéria veja-se o Ac. da Rel. do Porto de 7/04/2016, disponível no site da dgsi.
Assim, do artº. 364º, nº. 1, C.P.C. resulta que o procedimento cautelar é sempre dependência de uma causa que tenha por fundamento o direito acautelado. Ou seja, tem natureza instrumental relativamente à causa de que depende na medida em que, fundando-se esta em determinado direito, o procedimento cautelar visa assegurar a efetividade desse mesmo direito, é como que uma medida de apoio a este. Assenta num juízo provisório sobre tal direito, que será ou não confirmado na causa principal; quando decreta uma providência cautelar, o tribunal antecipa provisoriamente, mediante apreciação sumária, um julgamento a proferir mais tarde, acautelando ou antecipando os efeitos da providência definitiva no pressuposto de que a decisão definitiva venha a confirmar o juízo provisório. Daí que a providência cautelar esteja para a sentença a proferir no processo principal na mesma relação em que um juízo provisório sobre determinada matéria está para com o juízo definitivo sobre a mesma matéria -cfr. Ac. Rel. Lisboa de 29-03-1990, citado no Ac. da Rel. de Évora de 6/11/2008, ambos disponíveis na dgsi. Por isso, e seguindo a exposição deste Acórdão, é que o objeto do procedimento cautelar deve coincidir, pelo menos parcialmente, com o da ação, ou melhor, o desta deve incluir o daquele. Enquanto objeto da ação é o "direito acautelado" (artº. 364°, nº. 1, C.P.C.), o objeto da providência é o direito ameaçado ou violado. Através da ação principal deve procurar-se tutela para o mesmo direito que se pretendeu preservar por via cautelar. Mais do que isso, através do pedido formulado na ação principal deve o autor pretender decisão cuja efetividade fique diretamente assegurada através da providência solicitada. O que não exclui a possibilidade de a ação versar outros direitos não salvaguardados na providência nem a de os pedidos serem diferentes, porque as finalidades prosseguidas no procedimento cautelar e na ação serem naturalmente diferentes.
Tudo isto foi visto do ponto de vista da identidade objetiva.
Mas deve verificar-se também uma identidade subjetiva entre as partes do procedimento cautelar e as da ação principal.
O autor desta deve ser o titular ativo do direito ameaçado e requerente do procedimento e o aí réu deve ser o sujeito passivo daquele direito e requerido no procedimento (cfr. Rita Lynce de Faria, A Função Instrumental da Tutela Cautelar Não Especificada, 2003, pag. 95).
Se através da ação principal se deve procurar a tutela para o mesmo direito que se pretendeu preservar por via cautelar, isso quer dizer que a tutela é sempre dirigida contra alguém que violou (ou ameaçou violar) o direito.
Daí a justificação da referida identidade subjetiva passiva entre o procedimento cautelar e a ação principal. Seguimos novamente aqui a orientação do citado Acórdão da Rel. de Évora.
Em suma, os princípios da instrumentalidade e dependência são também requisitos a respeitar na propositura de um qualquer procedimento cautelar. E tal pressupõe as referidas identidades objetivas e subjetivas.
Ora, se relativamente à probabilidade da existência do direito a lei contenta-se com a verificação de indícios razoáveis, ou a mera aparência do direito, já quanto ao “periculum in mora” (-a demora e o dano decorrente da demora) exige-se um juízo de certeza que se revele suficientemente forte; cabe ao requerente a alegação e demonstração da gravidade do dano e da sua natureza irreparável ou de difícil reparação; deve assentar em factos concretos e consistentes, valorados objetivamente, bem como a necessidade de ser acautelado por via provisória.
No C.P.C. não se tutelam situações de efetiva e consumada violação, salvo nos casos em que se prevê que a violação prosseguirá de forma continuada ou repetida; prevê-se e previne-se situações suscetíveis de causar lesão grave e dificilmente reparável.
Como se diz na obra de Marco Carvalho Gonçalves, “Providências Cautelares”, 2ª edição (pags. 206 a 208), “visando a providência cautelar evitar a lesão de um direito, esta não pode ser decretada, porque injustificada, se essa lesão já se tiver consumado, salvo se essa lesão fundamentar o receio de ocorrência de outras lesões idênticas e futuras, a produção de lesões de natureza continuada ou repetida, ou o agravamento do dano”.
*
Isto posto, os recorrentes desenvolvem a sua alegação de recurso em duas vertentes:

-por um lado, alegam “o erro grosseiro da parcial providência do arresto” (originando prejuízos elevados aos requerentes, face à decisão confirmada (e ampliado o arresto) por Acórdão desta Relação proferidas no processo nº. 449/20.2T8VRL –invoca a violação dos artºs. 277º, a), C.P.C., 90º, 128º e 127º do CIRE;
-por outro lado, o errado indeferimento do presente procedimento cautelar, violador dos artºs. 362º, 363º, e 364º, do C.P.C..

Vejamos cada um desses pontos de vista.

Previamente teríamos de fazer uma prognose relativamente a qual a ação principal a propor pelos requerentes, face ao alegado, já que este procedimento do modo como está configurado processualmente (-foi mandado desapensar da ação nº. 1073/20.5T8VRL por despacho transitado) tem de ser visto como preliminar de uma ação principal.
No caso esse raciocínio está facilitado porque, face ao alegado, são os requerentes que anunciam o seu propósito de vir a intentar uma ação de responsabilidade civil contra o Estado, por danos no seu património causados pela errada decisão (no seu ponto de vista) proferida no arresto que corre nos autos com o nº. 449/20.2T8VRL.
Ora, se assim é, o juízo de dependência fica imediatamente comprometido, pois que concluindo neste procedimento por um pedido de ordem à 2ª requerida para a suspensão imediata do arresto e reposição dos bens móveis, créditos e outros bens, advertindo-a ainda de que não poderá praticar atos sobre todos os bens imóveis e móveis arrestados das requerentes, não violando os seus direitos de posse e propriedade, como de atividade mercantil e comercial normal, e neste recurso concluindo mais concreta e expressamente pelo pedido de levantamento do arresto; como facilmente se constata, este(s) pedido(s) não pode(m) ser concebido(s) como algo antecipatório ou conservatório do pedido a formular na ação a propor (e, na perspetiva de deferimento da inversão do contencioso que foi requerida, coincidente com o pedido que constituiria a ação principal), face ao desiderato que se pretende obter numa ação de responsabilidade civil extracontratual: uma indemnização visando o ressarcimento de perdas e danos (o que colide com o requerido em sede cautelar e por outro lado com o facto –já resolvido- de terem intentado inicialmente o mesmo por apenso á ação com o nº. 1073/20.5T8VRL).
Aliás diga-se que coisa diferente do ressarcimento -e que os requerentes referem- é “minorar” prejuízos diários provocados, alegadamente, pela execução do arresto decretado, e que irão deduzir no competente processo; uma coisa é antecipar uma reparação, outra é paralisar prejuízos.
Além disso, e relativamente ainda ao primeiro ponto de vista, não podem os requerentes através de uma outra ação, no caso através do procedimento cautelar comum, sindicar uma decisão proferida num outro processo: e é exatamente esse o fim visado neste procedimento, através da providência requerida, ou seja, a ineficácia ou paralisação do arresto decretado.
Não podia o Tribunal “a quo” e não pode este Tribunal de recurso, atuando em 2ª instância face à decisão de improcedência deste procedimento cautelar intentado, apreciar o bem ou mal decidido naquele processo nº. 449/20.2T8VRL, ficando por isso, e sem necessidade de maiores desenvolvimentos, prejudicadas todas as considerações a propósito feitas: simulação para desconsideração de personalidade jurídica, os artigos do CIRE expressamente invocados, a disposição do artº. 277º, e), do C.P.C. relativa à inutilidade superveniente da lide, o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência citado, bem como se houve denegação de justiça, ou a proporcionalidade do arresto tudo como vem melhor sintetizado até à conclusão XV do recurso interposto (e até reapreciação da matéria de facto, prova nula e ilegal, tudo como vem abordado no requerimento inicial).
Ou, se virmos numa outra perspetiva, esta declarada pelos requerentes, não pode este processo servir para antecipar a eventual procedência de uma oposição ao arresto, ou o resultado da ação principal que dirima o litígio entre as partes (relativamente ao qual o arresto serviu como meio de proteção de um direito de crédito que aí se pretende fazer valer –cfr. artº. 391º do C.P.C.).
A lei prevê para cada situação o meio processual adequado, e não se pode através de outra ação invocar o que é argumento a ser utilizado em sede de contestação/oposição, muito menos querendo antecipar o juízo a fazer nessa sede.
Conforme se decidiu nos Acs. das Relações de Coimbra de 8/3/2005 e de Évora de 9/7/2015 (dgsi.pt) a utilização dos meios processuais especificamente previstos na lei não pode ser excluída e preterida por outros mecanismos, por força dos princípios da legalidade, da economia processual e da proibição de atos inúteis (artº. 130º do CPC). A “aceleração” de decisões não pode ser obtida através de procedimento cautelar comum, quando a lei especificamente prevê e regula o ato ou situação em causa –no caso seria (será) a oposição ao arresto, e por isso seria ainda redundante dada a urgência também desta; a oposição ao arresto integra ela própria um processo urgente, pelo que, a assistir razão aos requerentes, não podem estes vir através de um procedimento de igual natureza (urgente) vir invocar o prejuízo decorrente da demora.
No Ac. da Rel. de Évora de 18/10/2018 (dgis.pt) adotou-se uma visão diversa. Todavia, e ainda que se pudesse perspetivar a possibilidade do procedimento ser preliminar da ação/incidente declarativo em que se discutirá o crédito ou os fundamentos que determinaram o arresto, essa perspetiva colide com a intenção/pretensão indemnizatória anunciada neste procedimento cautelar e de que o mesmo será preliminar (“antecipatório à ação de condenação”) e que analisamos como primeiro argumento, e com a característica da urgência da oposição ao arresto que analisamos no segundo argumento.
Excluída a identidade objetiva em qualquer sentido ou interpretação, por mais ampla que fosse, que pudesse ser dado à providência requerida, o presente procedimento terá necessariamente de improceder, ainda que, como decorre da decisão sob recurso, se provasse toda a factualidade alegada pelos requerentes.
Ficam por isso prejudicados todos os restantes argumentos recursivos, que integram em síntese as conclusões XVI a final (que encerram também argumentos já “supra” analisados).
De facto, o Tribunal por força do artº. 608º, nº. 2, C.P.C. aplicável ao Tribunal da Relação por força do artº. 663º, nº. 2, do mesmo C.P.C., não aprecia questões prejudicadas pela solução dada a outras.
Porque, não obstante, tratado pelo Tribunal recorrido e decorrente do segundo ponto de vista do recurso interposto, sempre se adiantará que se a ação principal de que a presente é preliminar consistirá numa ação de indemnização por responsabilidade extracontratual, então, relativamente à “aparência do direito” teríamos de ter presente a alegação dos pressupostos da responsabilidade civil, entre eles o “erro grosseiro” que determinou o arresto infundado (bem como os prejuízos daí decorrentes). E, nessa matéria, à argumentação exposta pelos requerentes opõe-se o disposto no artº. 13º, nº. 2, da Lei nº. 67/2007 de 31/12 (relativa à responsabilidade civil extracontratual do Estado): o pedido de indemnização deve ser fundado na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente.
Conforme já se apreciou e decidiu no Acórdão desta Relação de 1/10/2015, “Tal revogação tem que ser vista como uma condição prévia da ação de indemnização, tendo o legislador estatuído neste preceito uma condição de procedência da ação para efetivação da responsabilidade por erro judiciário. A ausência de revogação da decisão danosa fundada num vício de julgamento qualificável como erro judiciário determina, só por si, a improcedência da ação de responsabilidade – cfr. Carlos Cadilha, Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas anotado, 2.ª edição, Coimbra Editora, anotação 8 ao artigo 13.º, pág. 274, nota 479 e anotação 9 ao artigo 13.º, pág. 276, nota 483 e Luís Fábrica, Comentário ao Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2013, nota 3 ao artigo 13.º, pág. 357, ambos citados no recente Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 363/2015, publicado no DR, 2.ª Série, n.º 186, de 23 de setembro de 2015. Assim sendo, estamos perante um pressuposto da ação indemnizatória, pressuposto esse que determina, só por si, a improcedência da ação, conduzindo à absolvição do réu do pedido, uma vez que impede o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor – artigo 576.º, n.º 3 do CPC.”.
Ora, no processo nº. 449/20.2T8VRL a decisão de 1ª instância foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Guimarães face a recurso interposto pela requerente, conforme decorre da alegação dos recorrentes e das contra-alegações, uma vez que a providência foi ampliada pela Relação. Aos aí requeridos, quando citados (não sabemos se já foram) cabe a possibilidade de recurso, e a possibilidade de apresentar oposição –artº. 372º, nº. 1, C.P.C.. Nos autos não resulta alegada qual foi a atuação dos requeridos, designadamente não resulta o preenchimento daquele dispositivo. Não se pode falar da força do caso julgado material (artº. 619º do C.P.C.) perante os aqui requerentes (ao contrário do sustentado pelo M.P.) porque não sabemos se estes ainda podem ali reagir em via recursória.
Já se pronunciou sobre a constitucionalidade desta norma o Acórdão do Tribunal Constitucional nº. 363/2015, publicado no DR 2ª Série, nº. 186, de 23/09/2015, que decidiu “Não julgar inconstitucional a norma do artigo 13.º, n.º 2 do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei n.º 67/2007, de 31/12, segundo o qual o pedido de indemnização fundado em responsabilidade por erro judiciário deve ser fundado na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente”.

Os argumentos, alguns que também valem para obstar ao objetivo visado neste procedimento (parte destacada a negrito), são os seguintes:

-o artº 22º da Constituição da República Portuguesa reconhece aos cidadãos o direito à reparação dos danos que lhes forem causados por ações ou omissões praticadas por titulares de órgãos do Estado e das demais entidades públicas, ou por seus funcionários ou agentes, no exercício das respetivas funções, reparação essa que deve ser integral e assumida solidariamente pela Administração, mas o mesmo artº. 22º não estabelece os concretos mecanismos processuais através dos quais se há-de exercitar esse direito;
-reconhece-se uma larga margem de conformação ao legislador, quanto à definição dos pressupostos da responsabilidade do Estado, cabendo-lhe densificar os pressupostos da obrigação de indemnizar, não podendo, porém, restringir arbitrária ou desproporcionadamente o direito fundamental à reparação dos danos consagrado no artº. 22º da CRP;
-sabendo que a efetivação da responsabilidade por erro judiciário implica o reexercício da função jurisdicional relativamente à mesma questão de direito ou de facto, constituirá sempre condição necessária da procedência de uma eventual ação de indemnização, a verificação de que a pretensa decisão danosa incorreu num erro de direito, verificação essa que obriga a uma nova apreciação da questão de direito;
-ora, o instrumento para superar e corrigir a incorreção de decisões judiciais, tem de ser o recurso (e reclamação);
-é na própria natureza da função jurisdicional e no modo como o respetivo exercício se encontra estruturado – o sistema de recursos e a hierarquia dos tribunais – que se pode encontrar justificação para uma limitação como a estatuída no nº. 2 do artº. 13.º da Lei nº. 67/2007;
-o que está em causa é a racionalidade sistémica e a coerência institucional: uma decisão judicial definitiva sobre uma dada questão, não deve poder ser desconsiderada por outra decisão judicial, uma vez que inexiste qualquer critério jurídico-positivo para fazer prevalecer a segunda sobre a primeira; menos ainda se poderá admitir que a decisão judicial definitiva sobre uma determinada questão adotada por um tribunal superior possa vir a ser desconsiderada pela decisão de um tribunal hierarquicamente inferior;
-a segurança jurídica, associada às decisões judiciais transitadas em julgado, e a autoridade das decisões dos tribunais superiores, inerente à estrutura hierarquizada do sistema judiciário, constituem bens constitucionais reconhecidos.

Abordaram esta matéria os Acórdãos das Relações de Guimarães 1/10/2015 (cuja súmula do Acórdão do TC aqui seguimos e já citado), de Évora 17/3/2016, e de Lisboa de 9/7/2014 (www.dgsi.pt).
Quanto ao “periculum in mora”, além de outras considerações que se poderiam acrescentar, secundamos as que foram proferidas pelo Tribunal recorrido.
Apenas de acrescentar, face ao teor da conclusão XXIII que o Tribunal recorrido analisou todas as questões que se lhe impunham, e até mais, pois que tendo logo julgado inadequado o meio para o fim visado, ainda assim apreciou e julgou não verificados os pressupostos do procedimento cautelar comum. Não cometeu por isso qualquer nulidade, designadamente que fulmine a sentença de nula face ao artº. 615º, nº. 1, d), C.P.C..
Não sendo por isso nenhum dos argumentos do recurso procedentes, deve manter-se a decisão recorrida integralmente.
***
V I DISPOSITIVO.

Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação em julgar o recurso improcedente e, em consequência, negam provimento à apelação e confirmam a douta decisão recorrida.
Custas do recurso pelos recorrentes (artº. 527º, nºs. 1 e 2, do C.P.C.).
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Guimarães, 17 de dezembro de 2020.
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Os Juízes Desembargadores
Relator: Lígia Paula Ferreira Sousa Santos Venade
1º Adjunto: Jorge dos Santos
2º Adjunto: Heitor Pereira Carvalho Gonçalves

(A presente peça processual tem assinaturas eletrónicas)