Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6209/17.0T8GMR.G1
Relator: CRISTINA CERDEIRA
Descritores: EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
REGIME APLICÁVEL
JUSTA INDEMNIZAÇÃO
PERÍCIA / LAUDO MAIORITÁRIO
SOLO APTO PARA CONSTRUÇÃO
CÁLCULO DO VALOR DO SOLO EXPROPRIADO
ÍNDICE DE CONSTRUÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/13/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I) – Apresentando o processo de expropriação um cariz marcadamente técnico, e não dispondo o juiz de conhecimentos especiais na área a que respeita a perícia, necessita que os peritos lhe forneçam elementos concretos que o habilitem a fixar a justa indemnização, não estando em condições de sindicar o juízo científico emitido pelos peritos, salvo em caso de erro manifesto ou de critério legalmente inadmissível ou desadequado.

II) - Pese embora a força probatória da perícia no processo de expropriação seja fixada livremente pelo Tribunal (artº. 389º do Código Civil), tem-se entendido que neste tipo de processo, sendo a peritagem obrigatória e traduzindo-se a avaliação do bem expropriado num problema essencialmente técnico, o Tribunal deve aderir, em princípio, aos pareceres dos peritos, dando preferência ao valor resultante desses pareceres, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, quando não sejam coincidentes, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo Tribunal quando haja unanimidade entre eles, porquanto este é o meio de prova que melhor habilita o julgador a apurar o valor do bem expropriado, com vista à atribuição da justa indemnização.

III) – Na verdade, para além da presumida competência técnica que se lhes reconhece, a posição assumida pelos peritos nomeados pelo Tribunal é aquela que, em princípio, oferece maiores garantias de independência, imparcialidade e objetividade, face ao distanciamento que mantêm em relação às partes e aos interesses em litígio, estando, por isso, em melhores condições de, com objetividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização.

IV) - Havendo laudos periciais divergentes, o facto de se dever dar preferência ao dos peritos oficiosamente escolhidos, não significa uma irrestrita vinculação ao laudo maioritário, já que o Tribunal pode introduzir-lhe ajustamentos, fazer correções, colmatar falhas ou seguir o laudo ou critérios diferentes, se os tiver por mais justos, de acordo com outros critérios técnicos, objetivamente sustentados, ou com os elementos probatórios que possuir.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

Nos presentes autos de expropriação por utilidade pública, em que é expropriante Município X e expropriados Herdeiros de J. F., por deliberação da Assembleia Municipal X de 28/11/2016, publicitada em Edital nº. …/2016 de 29/11/2016, publicado no Diário da República – 2ª Série, nº. 235, de 9/12/2016, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação da parcela de terreno nº. 6 (13), com a área de 2.448,80 m2, necessária para a construção do “Parque de Estacionamento de ...”, a desanexar do prédio urbano sito na Rua da …, da União de Freguesias de …, concelho de Guimarães, inscrito na matriz sob o art°. 259 e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº. …/20170920.

Em 19/01/2017 foi realizada a vistoria ad perpetuam rei memoriam (doravante VAPRM), conforme auto de fls. 94 a 99, tendo a tomada de posse administrativa da dita parcela pela entidade expropriante ocorrido em 12/04/2017 (fls. 114).

Efectuada a arbitragem, por acórdão arbitral de 25/09/2017, os árbitros, por unanimidade, depois de classificarem o solo da parcela expropriada como “solo apto para a construção”, utilizando o critério de avaliação definido no artº. 26º do Código das Expropriações (doravante CE), atribuíram à referida parcela, com a área de 2.448,80 m2, o valor global de € 146.024,80 a título de indemnização pela expropriação, sendo € 127.949,80 relativo ao valor do terreno da parcela e € 18.075,00 ao valor das benfeitorias correspondentes a dois muros de vedação em alvenaria de granito – um muro com 3,5 m de altura e 60 m de comprimento e outro com 1,5 m de altura e 45 m de comprimento (fls. 120 a 131).

A entidade expropriante procedeu ao depósito das quantias de € 87.673,33 em 25/01/2017 e € 58.351,47 em 2/11/2017, que totalizam o montante fixado em sede de arbitragem (fls. 107 e 137).

Por decisão judicial de 17/11/2017, foi a propriedade da dita parcela de terreno nº. 6 (13) adjudicada à entidade expropriante (fls. 140).

Inconformado com a decisão arbitral, o expropriante Município X dela interpôs recurso para o tribunal de comarca, pretendendo que o valor da indemnização pela parcela expropriada seja fixado em € 68.496,40, não obstante a sua classificação como solo apto para construção, alegando para tanto que a área da parcela a expropriar é de 1.913,17 m2, o índice de ocupação máxima do solo é de 1,3 m2/m2, o custo unitário de construção constante da Portaria nº. 353/2013 de 4/12 para a Zona II é de € 700,24/m2 de área útil [e não de “área bruta” como, certamente por lapso, é referido nas suas alegações] e o coeficiente de valorização de terreno a considerar não pode ser superior a 13%, aceitando a aplicação das percentagens previstas no nº. 7 do artº. 26º do CE num total de 10%.

Mais alega que seria necessário considerar um encargo na ordem dos 10% para reforço das infra-estruturas que servem o prédio, que são manifestamente insuficientes para servir quaisquer edificações futuras e possíveis no local, bem como um factor correctivo resultante da inexistência de risco e de esforço inerente à actividade construtiva não superior a 5%, considerando o estado degradado do prédio, a sua localização, a pouca procura de área construída e o excesso relativo à área construída na cidade X.

Refere, ainda, que não devem ser consideradas quaisquer benfeitorias (muros), uma vez que ao eventual valor que estas trouxessem ao prédio teriam de ser descontados os custos de demolição, para se tornar possível qualquer eventual edificação de acordo com as condições do PDM e as regras do RGEU.

Por sua vez, A. C. também interpôs recurso da decisão arbitral, na qualidade de expropriado, suscitando a questão prévia da titularidade da parcela de terreno objecto de expropriação, bem como do prédio do qual será destacada, alegando que a mesma tem sido atribuída pela entidade expropriante aos Herdeiros de J. F., quando na realidade o recorrente é o único e legítimo proprietário daquele prédio, por o mesmo lhe ter sido legado, como comprova o registo de propriedade entretanto efectuado na Conservatória do Registo Predial ..., conforme certidão já junta a fls. 138 dos autos, sendo ainda comprovado pela titularidade da caderneta predial urbana junta a fls. 139, devendo, doravante, ser considerado como único e legítimo proprietário do aludido prédio, requerendo que sejam declarados a seu favor os depósitos já efectuados, bem como o valor diferencial que vier a resultar a final como a devida justa indemnização.

Pretende que o valor da justa indemnização seja fixado em € 692.082,71, sendo € 674.007,71 correspondente ao valor do solo da parcela expropriada com a área de 2.448,80 m2 e € 18.075,00 ao valor atribuído às benfeitorias no acórdão de arbitragem, alegando, em síntese, que:

- o acórdão de arbitragem não observou o disposto no n.° 3 do artº. 28° do CE, calculando o valor da indemnização sem respeitar o destino possível do prédio e, consequentemente, da parcela expropriada, numa utilização económica normal, à data da publicação da DUP, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data;
- naquele acórdão de arbitragem considerou-se, sem qualquer fundamentação, em oposição ao disposto no artº. 72° do Regulamento do PDM (no qual se permite a ocupação do solo com um índice de 1,0 m2/m2), que o actual índice de ocupação, constituído por uma área de ocupação de 401,37 m2 numa área total de terreno de 3.061,4 m2, não seria passível de aumento;
- o valor do solo da parcela expropriada foi erradamente calculado com base no índice de ocupação de 0,41 m2/m2, sendo que deveria ter sido calculado por aplicação do disposto no n°. 3 do artº. 28° do CE, com a aplicação da metodologia prevista no artº. 26° do mesmo diploma, por lhe ser superior, considerando um aproveitamento económico normal a utilização da área total do terreno com a construção de um edifício de apenas 3 pisos acima do solo, com um índice de ocupação de 0,8 m2/m2;
- aceita as percentagens expressas no acórdão de arbitragem relativas aos n°s 6 e 7 do artº. 26° do CE, com um somatório de 22,5% (= 0,225), bem como o valor de referência adoptado para valor da área bruta de construção (€ 629,27/m2), não questionando assim o coeficiente de conversão de área útil em área bruta de 0,90 aplicado, no laudo de arbitragem, ao preço de € 699,19/m2 (área útil), e a dedução de 10% considerada pelos Srs. Árbitros como factor correctivo pela inexistência de esforço inerente à actividade construtiva;
- será de considerar uma dedução de 10% para os efeitos previstos nos n°s 8 e 9 do artº. 26° do CE.

Refere, ainda, que as benfeitorias existentes na parcela e descritas no relatório da vistoria ad perpetuam rei memoriam terão que ser consideradas como “benfeitorias úteis”, não apenas porque não têm que ser demolidas para a construção do edifício que seria possível edificar, como lhe acrescentam valor por se tratar de muros de vedação do terreno, considerando aceitável o valor de € 18.075,00 atribuído às mesmas no acórdão de arbitragem.

Admitidos ambos os recursos por despacho de fls. 180vº, que também atribuiu “ao expropriado a indemnização de € 68 496,40 quanto à parcela nº. 6 (13), montante sobre o qual se verifica acordo das partes”, apenas o expropriado apresentou resposta, alegando que o valor da justa indemnização pela expropriação da parcela terá que situar-se entre os valores indicados nos pontos 27 e 28 da resposta (ou seja, entre € 728.363,10 e € 1.213.938,50), resultantes da metodologia sustentada pelo recorrente Município X, corrigida dos parâmetros respeitantes à área da parcela expropriada (que é de 2.448,80 m2 e não 1.913,17 m2 indicada pelo expropriante Município X) e ao índice de utilização do solo (que corresponderá ao índice de ocupação do solo multiplicado pelo número de pisos que seja possível edificar com a área de implantação estabelecida, em conformidade com a cércea admissível pelos regulamentos em vigor) admitido pelo PDM (situado entre 0,8 m2/m2 e 1,0 m2/m2), ainda que na sua aplicação minimalista (0,8 m2/m2 x 3 pisos = 2,4 m2/m2), devendo a qualquer daqueles valores ser sempre acrescido o valor das benfeitorias, calculado no acórdão de arbitragem em € 18.075,00.

Realizada a avaliação da parcela expropriada, foi elaborado o respectivo relatório com as respostas aos quesitos apresentados pelo expropriado A. C., subscrito por todos os Peritos (fls. 223 a 235), no qual:

- os Peritos indicados pelo Tribunal fixaram o valor total da indemnização em € 337.451,41, correspondente ao somatório do valor do solo da parcela expropriada e das benfeitorias nela existentes (€ 319.372,50 + € 18.075,00), entendendo que não deverá ser atribuída qualquer indemnização pela desvalorização da parte sobrante, uma vez que esta assegura proporcionalmente os mesmos cómodos que oferecia todo o prédio;
- o Perito indicado pelo expropriante entendeu que o valor total da justa indemnização a atribuir deve ser de € 148.865,41, sendo € 130.790,41 referente ao valor do solo da parcela expropriada e € 18.075,00 respeitante às benfeitorias, não havendo lugar à desvalorização da parte sobrante pela mesma razão referida pelos Peritos do Tribunal;
- o Perito indicado pelo expropriado considerou que o valor total da justa indemnização a atribuir deve ser de € 613.244,36, resultante do somatório do valor do solo da parcela expropriada (€ 551.300,26), do consensual valor das benfeitorias (€ 18.075,00) e do valor da depreciação da parte restante do prédio (€ 43.869,10).

Do relatório pericial foram apresentados pelo expropriado e pela entidade expropriante pedidos de esclarecimentos, tendo o Perito indicado pelo expropriado prestado os esclarecimentos constantes de fls. 256 a 260 e os Peritos indicados pelo Tribunal e pelo expropriante prestado os esclarecimentos insertos a fls. 267 a 272 dos autos.

Ambas as partes apresentaram as suas alegações, nos termos do artº. 64º, nº. 1 do CE, nas quais a entidade expropriante concorda com o valor do solo da parcela expropriada indicado pelo seu Perito (€ 130.790,41), sustentando ainda que nos cálculos indicados não se considera o valor das benfeitorias mencionadas atendendo ao custo da sua demolição, e o expropriado conclui pelo valor de € 614.073,14 como sendo aquele que corresponde à justa indemnização, sendo € 552.129,04 correspondente ao valor do solo da parcela, € 18.075,00 respeitante às benfeitorias e € 43.869,10 pela depreciação da parte sobrante.

Em 19/11/2018 foi proferida sentença que decidiu julgar:

- Totalmente improcedente o recurso apresentado pelo expropriado;
- Parcialmente procedente o recurso apresentado pela expropriante, fixando em € 141.788,23 (cento e quarenta e um mil, setecentos e oitenta e oito euros e vinte e três cêntimos) o valor da indemnização a pagar por esta ao expropriado pela expropriação da parcela n.º 13 com a área de 2.448,80 m2, valor esse a actualizar de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, sobre esse montante a partir da data da publicação da declaração da utilidade pública e até 06.12.2018 e sobre € 76.791,98 desde essa data até à data do trânsito em julgado da presente decisão.

Inconformado com tal decisão, o expropriado A. C. dela interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]:

1 - O Recorrente considera que a decisão de 1ª instância não é suscetível de fixar, no concreto em análise, a justa indemnização que se mostra devida em virtude da expropriação por utilidade pública da parcela de que é proprietário.
2 - Efetivamente, cotejando a sentença recorrida constatamos que existem lapsos evidentes no que tange ao julgamento realizado quanto a elementos concretos de natureza pericial e a contradições quanto à utilização do terreno para construção.
3 - Ao considerar o solo expropriado como apto para construção e considerar no cálculo do seu valor o índice resultante da construção já existente na parte sobrante, sem admitir que nada mais pode ser construído, a sentença é contraditória.
4 - Não existe qualquer justificação na sentença recorrida para não considerar índice de utilização do solo considerado no Laudo dos Peritos do Tribunal, sem que este se apoie em critérios legalmente inadmissíveis ou desadequados.
5 - Nessa medida, urge acautelar o valor da justa indemnização (de € 506.877,11) que assiste ao Expropriado, atribuindo¬lhe o valor que resulta da aplicação do índice de construção indicado no seu Laudo pelos Srs. Peritos do Tribunal (1,68), suprindo-se a deficiência identificada.

Termina entendendo que deve ser dado provimento ao presente recurso e, nessa conformidade, revogada a decisão proferida, substituindo-se a mesma por outra que, respeitando os diferentes pontos que antecedem, fixe em conformidade a justa indemnização devida pela expropriação por utilidade pública ao Expropriado, no valor de € 506.877,11.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido por despacho de fls. 342.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.


II. FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, tendo por base as disposições conjugadas dos artºs 608º, nº. 2, 635º, nº. 4 e 639º, nº. 1 todos do Novo Código de Processo Civil (NCPC), aprovado pela Lei nº. 41/2013 de 26/6.

Nos presentes autos, o objecto do recurso interposto pelo expropriado, delimitado pelo teor das respectivas conclusões, circunscreve-se à questão da determinação do montante da indemnização devida pela expropriação da parcela nº. 6 (13) identificada nos autos, concretamente no que respeita à não aplicação, no cálculo do valor do solo expropriado feito na sentença recorrida, do índice de utilização do solo indicado no laudo de peritagem pelos Peritos do Tribunal.

Na sentença recorrida foram considerados provados, com relevância para a decisão da causa, os seguintes factos [transcrição]:

a) Por deliberação da Assembleia Municipal X, publicada no DR II Série n.º 235, de 09.12.2016, foi declarada, a pedido da Câmara Municipal X, para construção da obra “Parque de Estacionamento de ...”, a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação da parcela n.º 13, com a área de 2.448,80 m2, inscrita na matriz predial urbana sob o art. 259.º (parte), (então) omissa na Conservatória do Registo Predial, pertença da herança indivisa aberta por óbito de J. F.;
b) A parcela referida em a) corresponde à maior parte do logradouro do prédio situado na Rua de …, da união de freguesias da … da cidade X, inscrito na matriz com uma área total de 2.901 m2; (cfr. auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam a fls. 94ss e acórdão arbitral de fls. 120ss)
c) A Rua da … situa-se em núcleo urbano, central e histórico da cidade X; (cfr. auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam a fls. 94ss, acórdão arbitral de fls. 120ss e relatório de avaliação a fls. 223ss);
d) Na Rua da ... predominam edifícios centenários de 3 / 4 pisos, ocupados, por vezes, com comércio e serviços no r/c; (cfr. acórdão arbitral de fls. 120ss e relatório de avaliação a fls. 223ss)
e) A Rua da ... encontra-se dotada de: (cfr. auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam a fls. 94ss, acórdão arbitral de fls. 120ss e relatório de avaliação a fls. 223ss – ver resposta ao quesito 3)
- Pavimento em calçada;
- Rede de abastecimento de água;
- Rede de saneamento;
- Rede de distribuição de energia eléctrica;
- Rede de drenagem de águas pluviais;
- Rede de distribuição de gás;
- Rede telefónica;
- Estação depuradora, em ligação com a rede de saneamento;
f) Num raio de 2.000 m em relação à zona onde se localiza a parcela expropriada situam-se a biblioteca municipal, estação dos Correios, bancos, central de camionagem, estação ferroviária, hospital, tribunais, Câmara Municipal, museus, escolas de todos os graus de ensino, espaços comerciais; (cfr. relatório de avaliação a fls. 223ss)
g) Não se observam focos de poluição significativos na zona onde se situa a parcela expropriada; (cfr. relatório de avaliação a fls. 223ss)
h) No prédio de onde foi destacada a parcela expropriada encontra-se construído um edifício destinado a habitação com 3 pisos (r/c, 1.º andar e águas furtadas), com uma área de implantação de 401,37 m2, em razoável estado de conservação à data da v.a.p.r.m., com as paredes exteriores de granito ao nível do r/c e 1.º andar e com os pavimentos e paredes divisórias interiores em madeira; (cfr. auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam a fls. 94ss e relatório de avaliação a fls. 223ss quanto à área de implantação)
i) Na parcela expropriada encontram-se ainda edificados dois muros de alvenaria de granito, um ao longo da sua extrema sul, com cerca de 3,5 m de altura e 60 m de comprimento, e outro ao longo da sua extrema poente, com cerca de 1,5 m de altura e 45 m de comprimento; (cfr. auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam a fls. 94ss)
j) A construção do “Parque de Estacionamento de ...” implicou a demolição dos muros referidos em i); (cfr. auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam a fls. 94ss)
k) Para efeitos de PDM a parcela expropriada está inserida em zona definida como “Solo Urbanizado – Espaços Centrais” e “Zona de Protecção” sujeita a condicionantes “Património Mundial – Zona Especial de Protecção” e “Monumento Nacional – Zona Especial de Protecção”; (cfr. acórdão arbitral de fls. 120ss e relatório de avaliação a fls. 223ss)
l) Os índices de construção no quarteirão onde se insere a parcela expropriada oscilam entre os 0,10 e os 3,5; (cfr. acórdão arbitral de fls. 120ss)
m) A arbitragem realizada no âmbito da fase administrativa fixou em €146.024,80 o valor da justa indemnização a atribuir ao expropriado; (cfr. acórdão arbitral de fls. 120ss)
n) Os Exmos. Srs. Árbitros classificaram a parcela expropriada como “solo apto para contrução”, levaram em consideração um índice de construção de 0,41 [decorrente da divisão do produto da multiplicação da área de implantação - €401 m2 – pelo n.º de pisos – 3 – pela área total do prédio - 2.901 m2 = 401 m2 x 3 : 2.901 m2], com um preço de construção de €629,27/m2 [decorrente da aplicação de um coeficiente de conversão de área bruta em área útil de 0,9 (90%) ao valor fixado pela Portaria 353/2013], um índice relativo à localização e qualidade ambiental da parcela de 13% do custo de construção, o factor de 9,5% ante as infra-estruturas existentes e ainda a aplicação de um coeficiente de 10% relativamente à inexistência de risco inerente à actividade construtiva, pelo que chegaram a um valor/m2 de €52,25; (cfr. acórdão arbitral de fls. 120ss)
o) Entendem os Srs. Árbitros que o sobrante do prédio não sofrerá qualquer depreciação pela expropriação; (cfr. acórdão arbitral de fls. 120ss)
p) Os Exmos. Srs. Peritos que procederam à avaliação da parcela expropriada classificaram unanimemente a parcela expropriada como “solo apto para contrução”; (cfr. relatório de avaliação a fls. 223ss)
q) Os Exmos. Srs. Peritos indicados pelo Tribunal que procederam à avaliação da parcela expropriada fixaram em €337.45,41 [tratar-se-á de um lapso de escrita, pois ter-se-á pretendido dizer “€ 337.451,41”, em face do teor do relatório de avaliação que se encontra junto a fls. 223 a 235], o valor da justa indemnização devida ao expropriado; (cfr. relatório de avaliação a fls. 223ss)
r) Os Exmos. Srs. Peritos indicados pelo Tribunal que procederam à avaliação da parcela expropriada levaram em consideração um índice de construção de 1,68 [decorrente da divisão da área total de construção do Parque de Estacionamento de ... – 14.500 m2 – pela área total expropriada para construção do Parque – 8.650 m2], um preço de construção de €397,08/m2 [decorrente da divisão do valor de adjudicação da obra, acrescido de IVA - €5.757.597,01 – pela área total de construção do Parque de Estacionamento de ... – 14.500 m2], um índice relativo à localização e qualidade ambiental da parcela de 13% do custo de construção, o factor de 10% ante as infra-estruturas existentes [as mencionadas em e) e ainda a existência de passeios em toda a extensão da parcela] e ainda a aplicação de um coeficiente de 15% relativamente à inexistência de risco inerente à actividade construtiva, pelo que chegaram a um valor/m2 de €130,42; computaram ainda os srs. Peritos indicados pelo Tribunal no montante indemnizatório a quantia de €18.075 a título de indemnização por benfeitorias [decorrente da aplicação de um preço/m2 de €70/m2 para o muro de 60 metros de comprimento por 3,5 m de altura e de um preço de €50/m2 para o muro de 45 metros de comprimento por 1,5 m de altura]; (cfr. relatório de avaliação a fls. 223ss)
s) Quer os Exmos. Srs. Peritos indicados pelo Tribunal que procederam à avaliação da parcela expropriada, quer o Exmo. Sr. Perito indicado pela entidade expropriante entenderam inexistir qualquer desvalorização da parte sobrante do prédio de onde foi destacada a parcela expropriada; (cfr. relatório de avaliação a fls. 223ss)
t) O Exmo. Sr. Perito indicado pela entidade expropriante que procedeu à avaliação da parcela expropriada fixou em €148.865,41 o valor da justa indemnização devida ao expropriado; (cfr. relatório de avaliação a fls. 223ss)
u) O Exmo. Sr. Perito indicado pela entidade expropriante que procedeu à avaliação da parcela expropriada levou em consideração um índice de construção de 0,41 [decorrente da divisão do produto da multiplicação da área de implantação - 401 m2 – pelo n.º de pisos – 3 – pela área total do prédio - 2.901 m2 = 401m2 x 3 : 2.901 m2], um valor de construção de €629,27/m2 [decorrente da aplicação ao valor de referência estabelecido na Portaria 353/2013 – €699,19/m2 – de um índice de conversão de 10% de área útil para área bruta], um índice relativo à localização e qualidade ambiental da parcela de 13% do custo de construção, o factor de 10% ante as infra-estruturas existentes [as mencionadas em e) e ainda a existência de passeios em toda a extensão da parcela] e ainda a aplicação de um coeficiente de 10% relativamente à inexistência de risco inerente à actividade construtiva, pelo que chegou a um valor/m2 de €53,41; computou ainda o sr. Perito indicado pela entidade expropriante no montante indemnizatório a quantia de €18.075 a título de indemnização por benfeitorias [decorrente da aplicação de um preço/m2 de €70/m2 para o muro de 60 metros de comprimento por 3,5 m de altura e de um preço de €50/m2 para o muro de 45 metros de comprimento por 1,5 m de altura]; (cfr. relatório de avaliação a fls. 223ss)
v) O Exmo. Sr. Perito indicado pelo expropriado que procedeu à avaliação da parcela expropriada fixou em €613.244,36 o valor da justa indemnização devida ao expropriado; (cfr. relatório de avaliação a fls. 223ss)
w) O Exmo. Sr. Perito indicado pelo expropriado que procedeu à avaliação da parcela expropriada levou em consideração um índice de utilização 1,83 (1) [decorrente da consideração de um índice médio de ocupação de 0,61 m2/m2, obtido pela divisão da área do quarteirão onde se insere a parcela expropriada ocupada com edificações - 30.546 m2 – pela área total do quarteirão – 49.781 m2 – medidos em ortofotomapa georreferenciado, índice médio esse que foi multiplicado pelo n.º de pisos dos edifícios que ladeiam aquele que está edificado no sobrante do prédio de onde foi destacada a parcela expropriada – 3], um valor de construção de €629,27/m2 [decorrente da aplicação ao valor de referência estabelecido na Portaria 353/2013 – 699,19/m2 – de um índice de conversão de 10% de área útil para área bruta], um índice relativo à localização e qualidade ambiental da parcela de 13% do custo de construção, o factor de 10% ante as infra-estruturas existentes [as mencionadas em e) e ainda a existência de passeios em toda a extensão da parcela] e ainda a aplicação de um coeficiente de 15% relativamente à inexistência de risco inerente à actividade construtiva; computou ainda o sr. Perito indicado pelo expropriado no montante indemnizatório a quantia de €18.075 a título de indemnização por benfeitorias [decorrente da aplicação de um preço/m2 de €70/m2 para o muro de 60 metros de comprimento por 3,5 m de altura e de um preço de €50/m2 para o muro de 45 metros de comprimento por 1,5 m de altura] e ainda o valor de €43.869,10 a título de desvalorização da parte sobrante, por entender que o logradouro, por ficar reduzido a uma área de 210,83 m2, reduz os cómodos do sobrante no que toca a iluminação, ventilação e salubridade [valor alcançado por entender que o mesmo corresponde a 15% do valor da construção actual, atribuindo-se-lhe um valor de 50% do valor de referência - €699,19/m2 – à área matricial bruta de construção – 836,57 m2]; (cfr. relatório de avaliação a fls. 223ss)
x) Na opinião dos Exmos. Srs. Peritos indicados pelo Tribunal e do Exmo. Sr. Perito indicado pela entidade expropriante o sobrante não sofre qualquer desvalorização por força da expropriação, já que por a parcela se situar a norte do prédio a iluminação, ventilação e salubridade do sobrante em nada ficará afectada (cfr. esclarecimentos a fls. 267ss).
a)
*
Apreciando e decidindo.

Antes de passarmos à análise do recurso propriamente dito, importa exprimir a nossa concordância com a sentença recorrida ao considerar aplicável ao caso dos autos o Código das Expropriações aprovado pela Lei nº. 168/99 de 18/9 (com as alterações introduzidas pelas Leis nºs 13/2002 de 19/2, 4-A/2003 de 19/2, 67-A/2007 de 31/12 e 56/2008 de 4/9), tendo em conta a data da publicação da declaração de utilidade pública (DUP) da presente expropriação, sendo aquela data o momento pertinente para efeitos de determinação da legislação aplicável à fixação da indemnização devida, por ser aí que surge, para o expropriado, o direito de crédito indemnizatório (cfr. acórdãos da RL de 22/11/2007, proc. nº. 4072/2007-2 e da RP de 17/04/2008, proc. nº. 0831654, ambos acessíveis em www.dgsi.pt).

Nesta conformidade, aplica-se, “in casu”, o Código das Expropriações aprovado pela Lei nº. 168/99 de 18/9, por ser o diploma vigente à data da publicação da DUP, sendo este CE de 1999 a que doravante se fará referência.

A expropriação por utilidade pública pode definir-se como “a relação jurídica pela qual o Estado, considerando a conveniência de utilizar determinados bens imóveis em fim específico de utilidade pública, extingue os direitos subjectivos constituídos sobre eles e determina a sua transferência definitiva para o património da pessoa a cujo cargo esteja a prossecução desse fim, cabendo a esta pagar ao titular dos direitos extintos uma indemnização compensatória” (cfr. Prof. Marcelo Caetano, in Manual de Direito Administrativo, Vol. II, 9ª ed., Almedina, Coimbra, pág. 1020).
Implicando a mesma uma alienação forçada de um bem, rege-se por dois princípios constitucionais: verificação de um interesse público, legitimamente declarado, e a obrigação de indemnizar o expropriado.
Estando consagrado constitucionalmente o direito de propriedade privada (artº. 62°, nº. 1 da CRP), a privação desta por acto de autoridade administrativa e por motivo de utilidade pública impõe à entidade expropriante o pagamento de indemnização adequada ou de justa indemnização (artº. 62°, n°. 2 da CRP e artºs 1º e 23°, nº. 1 do CE), tendo esta de corresponder a um valor pecuniário que remova os danos patrimoniais resultantes da expropriação.
O direito à inerente indemnização está intimamente ligado à expropriação. A indemnização deriva ou funda-se no princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos: ou seja, a indemnização tem por escopo colocar o cidadão que sofreu a ablação resultante do acto expropriativo em posição idêntica à dos demais cidadãos que, nas mesmas circunstâncias, não foram atingidos por esse sacrifício patrimonial.
Sem a contrapartida de uma adequada compensação pelo prejuízo decorrente para o expropriado do acto expropriativo, deixará de haver expropriação para haver espoliação ou confisco (cfr. acórdão da RL de 13/10/1987, CJ. Ano XII - Tomo 4. pág. 150).
Como salienta Fernando Alves Correia (in As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, 1992, pág. 129), o dano patrimonial suportado pelo expropriado é ressarcido de forma integral e justa, se a indemnização corresponder ao valor comum do bem expropriado, ou, por outras palavras, ao respectivo valor de mercado ou ainda ao seu valor de compra e venda, permitindo-lhe, assim, com o mesmo montante, adquirir, se quiser, outro bem idêntico ou semelhante e assegurando-lhe a inalterabilidade do activo da sua situação patrimonial pela substituição daquele bem pelo respectivo valor equivalente, proporcionando-lhe dinheiro suficiente para assegurar a adequada substituição do bem de que foi privado e prevenindo com isso a violação do princípio da igualdade dos particulares perante os encargos públicos e da imparcialidade da actuação da Administração perante os bens particulares.
Este critério do “valor venal” ou do “justo preço”, isto é, a quantia que teria sido paga pelo bem expropriado se tivesse sido objecto de um livre contrato de compra e venda, é seguido pela quase generalidade dos ordenamentos jurídicos.
Igualmente a indemnização para ser justa terá de corresponder ao valor normal que no mercado atingem os bens equivalentes ao bem expropriado (cfr. Meneses Cordeiro e Teixeira de Sousa, in Expropriação por Utilidade Pública, Parecer na CJ. Ano XV - Tomo V, pág. 22 a 30)
Ademais, tem vindo a ser repetidamente decidido pelo Tribunal Constitucional que só o critério do valor real em condições normais de mercado assegura o princípio constitucional da justa indemnização (cfr. acórdão do TC nº. 408/2008 de 31/07/2008, proc. nº. 291/07 - 2ª Secção, citado no acórdão do STJ de 31/01/2012, proc. nº. 5253/04.2TBVNG, acessível em www.dgsi.pt).
O princípio da justa indemnização tem de ser visto em concreto e à luz dos diferentes interesses a conjugar, devendo o expropriado receber aquilo que conseguiria obter pelos seus bens se não tivesse havido expropriação, não devendo acrescer ao preço assim delineado qualquer contrapartida pelo eventual inconveniente daí resultante atinente à alienação não querida pelo proprietário.
Por outro lado, os critérios definidos por lei e destinados a encontrar a justa indemnização têm de respeitar os princípios materiais da Constituição - igualdade e proporcionalidade - não podendo conduzir a indemnizações irrisórias ou manifestamente desproporcionadas à perda do bem expropriado (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, 2007, pág. 808 e 809; acórdão do TC nº. 115/88 de 1/06/1988, BMJ nº. 378 - pág. 121, citado no acórdão da RE de 19/06/2008, proc. nº. 697/08-2, acessível em www.dgsi.pt).

A este propósito referem Francisco Calvão e Fernando Jorge Silva (in Código das Expropriações – Anotações adaptadas ao Novo Código de Processo Civil, Novembro de 2013, Coimbra Editora, pág. 171 e 172) o seguinte:

«Consabidamente, o princípio da igualdade (artigo 13º da CRP) desdobra-se, por sua vez, em dois planos, o da igualdade no plano das relações internas e ao nível das relações externas. O primeiro não autoriza que particulares posicionados numa situação idêntica recebam indemnizações substantivamente diversas, impondo critérios uniformes de determinação da indemnização. O segundo está virado para a dimensão da igualdade perante os encargos públicos, ao determinar a admissibilidade de o direito de propriedade privada ser sacrificado por exigências de interesse público, não podendo permitir que o particular afectado não seja compensado de forma justa, sob pena de a sua posição jurídica ser tratada de forma discriminatória, obstando, por essa via, a um tratamento desigual entre expropriados e não expropriados. (…)
Paralelamente, o princípio da proporcionalidade (artigo 266º, n.º 2 da CRP) obriga, como atrás se salientou, a que o sacrifício imposto ao expropriado seja adequado ao interesse público em presença – concretizando, são de excluir indemnizações irrisórias ou excessivas.»
Para tanto, haverá que recorrer, desde logo, ao artº. 23º, nº. 1 do CE, que estabelece o critério geral para a fixação da justa indemnização.
De acordo com este dispositivo legal, a justa indemnização, em matéria de expropriação, visa apenas – insiste-se – “ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data”, e não compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante.
Para a obtenção do valor real e corrente numa situação normal de mercado, ou seja, para se alcançar a falada justa indemnização, define o Código das Expropriações em apreço um conjunto de critérios referenciais, elementos ou factores de cálculo, que variam conforme o objecto da expropriação sejam solos (aptos para construção ou para outros fins) ou edifícios ou construções, sendo essencial que seja feita uma correcta identificação/classificação do imóvel expropriado e o cálculo do seu valor, ao abrigo do disposto nos artºs 24º a 28º do citado Código (neste sentido vide, entre outros, acórdão do STJ de 31/01/2012, proc. nº. 5253/04.2TBVNG e acórdãos da RE de 24/05/2007, proc. nº. 2626/06-3 e de 19/06/2008, proc. nº. 697/08-2, todos acessíveis em www.dgsi.pt).
Dever-se-á, deste modo, levar em consideração as condições de facto e elementos de valorização existentes no prédio expropriado à data da publicação da declaração de utilidade pública, relevando, entre outras, a respectiva localização, a área e características do terreno, a sua potencialidade edificativa e aptidão agrícola (artºs 25º a 27º do CE), a proximidade dos centros urbanos e vias de comunicação, ponderando-se, de igual forma, o facto da expropriação se reportar ao prédio no seu todo ou apenas a uma parcela deste (artº. 29º do CE), com eventual desvalorização da parte não abrangida pela expropriação.
O montante da indemnização, prescreve o artº. 24º, nº. 1 do CE, calcula-se com referência à data da declaração de utilidade pública, sendo actualizado à data da decisão final do processo de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação.
São estas, em síntese, as orientações doutrinais e jurisprudenciais que nos são oferecidas para a definição de justa indemnização.
Tendo em vista a determinação do valor de um terreno expropriado, como acontece no caso em apreço, a lei classifica e valoriza os solos, consoante a sua vocação - isto é, o seu destino económico - em “solo apto para construção” e “solo para outros fins” (artº. 25º, nº. 1 do CE), sendo o primeiro aquele que se integra em qualquer das alíneas do n°. 2 do citado artº. 25º do CE e o solo para outros fins o que não se encontra em qualquer das situações previstas nessas alíneas (artº. 25º, n°. 3 do CE).

Feitas estas considerações de carácter geral, vejamos o caso em apreço.

Conforme se alcança dos autos, o relatório arbitral classificou a parcela expropriada como “solo apto para construção”, atenta a sua situação e descrição, classificação essa mantida por todos os Peritos que subscreveram o Relatório de Avaliação e que foi acolhida na sentença ora sob escrutínio nos seguintes termos:

«Ora, consignaram quer o sr. Perito que procedeu à v.a.p.r.m., quer os srs. Árbitros, quer os Srs. Peritos nomeados em sede de avaliação [cfr. supra 1. al. k)] que, de acordo com o PDM de X, a parcela a expropriar encontra-se inserida “Solo Urbanizado – Espaços Centrais” e “Zona de Protecção”, sendo que o prédio da qual essa parcela foi destacada se situa em arruamento dotado de pavimento em calçada, rede de abastecimento de água, rede de saneamento, rede de distribuição de energia eléctrica, rede de drenagem de águas pluviais, rede de distribuição de gás, rede telefónica e estação depuradora, em ligação com a rede de saneamento [cfr. supra 1. al. e)].
Assim sendo, a parcela expropriada não poderá deixar de ser classificada como “solo apto para construção” (art. 25.º/2/al. a) e c) CExp).»
Constata-se, pois, que ambas as partes aceitam a classificação da parcela expropriada como “solo apto para construção” dada pelos Peritos que subscreveram o laudo de peritagem e acolhida na sentença recorrida, tanto mais que esta matéria nem sequer é abordada no único recurso que foi interposto – o recurso do expropriado.
Insurge-se o expropriado contra a sentença recorrida na parte em que, no cálculo do valor do solo expropriado, aderiu ao critério utilizado pelos Srs. Árbitros e pelo Sr. Perito indicado pelo expropriante e considerou um índice de utilização do solo (vulgarmente denominado índice de construção ou coeficiente de ocupação do solo) de 0,41 m2/m2, alegando que a sentença é contraditória ao considerar o solo expropriado como apto para construção e no cálculo do seu valor utilizar o índice resultante da construção já existente na parte sobrante – ou seja, o índice 0,41 que resulta do quociente entre a área de construção existente na parcela sobrante por não incluída na expropriação e a área total do prédio, na qual se inclui a área não expropriada e a parcela de terreno objecto da expropriação - o que significaria que na área expropriada nada mais poderia ser construído, uma vez que o índice de construção se encontrava esgotado, sendo, porém, reconhecido pelos Srs. Peritos do Tribunal que o expropriante está a levar a cabo na parcela expropriada uma construção cujo índice é de 1,68 m2/m2, não existindo, em seu entender, qualquer justificação para o Tribunal recorrido, na sentença em apreciação, não ter aplicado o índice de utilização do solo considerado no laudo dos Peritos do Tribunal (1,68), tanto mais que o mesmo não excede o valor admitido pelo Regulamento do PDM de X (0,8 m2/m2 x 3 pisos = 2,40 m2/m2) ou o valor de referência da envolvente indicado pelo Perito do expropriado no relatório de peritagem (0,61 m2/m2 x 3 pisos = 1,83 m2/m2).

Defende, pois, o recorrente que lhe seja atribuída uma indemnização no montante total de € 506.877,11 resultante da aplicação do índice de construção indicado pelos Srs. Peritos do Tribunal no laudo de peritagem (1,68 m2/m2), corrigindo-se, assim, o cálculo desenvolvido na sentença recorrida para fixação do valor do solo da parcela expropriada, nos seguintes termos:

1,68 m2/m2 x € 630,22/m2 x 0,23 x (1-0,15) = € 206,99/m2
€ 206,99 x 2.448,80 m2 = € 506.877,11

Vejamos se lhe assiste razão.

Conforme se alcança dos autos, no laudo arbitral os Srs. Árbitros levaram em consideração um índice de construção de 0,41 m2/m2 [decorrente da divisão do produto da multiplicação da área de implantação - 401 m2 – pelo n.º de pisos – 3 – pela área total do prédio - 2.901 m2, ou seja, 401 m2 x 3 pisos : 2.901 m2], com um custo unitário de construção de € 629,27/m2 de área bruta [decorrente da aplicação de um coeficiente de conversão de área útil em área bruta de 0,90 (1-0,10=0,90) ao valor fixado pela Portaria nº. 353/2013 de 4/12 - € 699,19 x 0,90 = € 629,27], um índice relativo à localização e qualidade ambiental da parcela e aos equipamentos existentes na zona de 13% do custo de construção (artº. 26º, nº. 6 do CE), o factor de 9,5% correspondente às infra-estruturas urbanísticas existentes (artº. 26º, nº. 7 do CE) e ainda a aplicação de um coeficiente de 10% relativamente à inexistência de risco e de esforço inerentes à actividade construtiva (artº. 26º, nº. 10), pelo que chegaram a um valor unitário de terreno de construção de € 52,25/m2 da seguinte forma:

0,41 m2/m2 x € 629,27 € x 0,225 x (1-0,10) = 52,25/m2

Aplicando este valor unitário do solo à área da parcela expropriada, os Srs. Árbitros fixaram o valor desta em € 127.949,80 (€ 52,25/m2 x 2.448,80 m2), ao qual adicionaram o valor de € 18.075,00 referente às benfeitorias existentes no local (dois muros em alvenaria de granito), tendo atribuído ao expropriado uma indemnização no montante total de € 146.024,80 (€ 127.949,80 + € 18.075,00) pela expropriação da parcela nº. 6 (13).

O expropriante, no seu recurso da decisão arbitral, considerou (certamente, por lapso) uma área de 1.913,17 m2 quando a área da parcela expropriada indicada na DUP é de 2.448,80 m2 e contestou:

- o índice de construção aplicado no laudo arbitral, defendendo a aplicação de um índice de ocupação máxima do solo de 1,3 m2/m2;
- a aplicação do factor correctivo de 10% relativamente à inexistência de risco e esforço inerente à actividade construtiva, sustentando a fixação desse coeficiente em 5%, por entender que o prédio se encontra em estado de degradação e a sua localização não ser favorável, mormente pela pouca procura de área construída;
- a inclusão das benfeitorias mencionadas no laudo arbitral (muros), por entender que ao valor que estas eventualmente trouxessem ao prédio teriam de ser descontados os custos de demolição, para se tomar possível qualquer eventual edificação de acordo com as condições do PDM e as regras do RGEU.

Nesse recurso, o expropriante aceitou a aplicação dos coeficientes de valorização do terreno previstos nos nºs 6 e 7 do artº. 26º do CE, num total de 23% - sendo 13% relativo à localização e qualidade ambiental (nº. 6) e 10% correspondente às infra-estruturas existentes (nº. 7) - e considerou a aplicação do valor de referência para o custo unitário da área útil de construção previsto na Portaria nº. …/2013 de 4/12 para a Zona II (onde se integra …) de € 700,24/m2, quando no laudo arbitral surge como custo médio de construção o valor de 699,19 m2/m2 (área útil) convertido para € 629,27/m2 de área bruta, mediante a aplicação do coeficiente de conversão de área útil em área bruta de 0,90 (coeficiente esse que não foi posto em causa pelo expropriante), bem como a dedução de 10% para obviar a despesas para reforço das infra-estruturas que servem o prédio (artº. 26º, nºs 8 e 9 do CE), não contemplada no relatório de arbitragem, tendo ainda aplicado o factor multiplicativo de 0,2 que apenas se pode explicar como uma referência ao que dispunha o n.° 5 do art.° 25° do Código das Expropriações aprovado pelo DL 438/91 de 9/11, revogado pela versão do Código das Expropriações aprovada pela Lei n.° 168/99 de 18/9, factor esse que não foi levado em consideração pelos Srs. Árbitros no seu laudo arbitral, e tendo sido eliminado nos termos acima referidos, não é aplicável “in casu”.

Deste modo, no recurso da decisão arbitral, o expropriante defendeu que o valor do terreno da parcela expropriada deveria ser o resultante dos seguintes cálculos:

1913,17 m2 x 1,3 m2/m2 x € 700,24/m2 de área bruta x 0,23 x 0,90 x 0,95 x 0,2 = € 68.496,40, sendo este o montante que deveria ser fixado como indemnização pela parcela expropriada.

Por sua vez, o expropriado, no seu recurso da decisão arbitral, também contestou o índice de construção de 0,41 m2/m2 aplicado pelos Srs. Árbitros, alegando que este não conduz ao valor real e corrente da parcela de terreno de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, e não está em conformidade com a regulamentação em vigor, designadamente com as disposições do Regulamento do PDM de X, que no seu artº. 72º estabelece que o índice de ocupação para a zona definida como “Solo Urbanizado – Espaços Centrais” não deve ser superior a 0,8 m2/m2, incluindo as edificações eventualmente existentes, admitindo, no entanto, em casos justificáveis, a utilização de um índice de ocupação superior até 1 m2/m2.

Defendeu o expropriado, no recurso da decisão arbitral, a utilização de um índice de construção de 2,4 m2/m2, resultante da multiplicação do índice de ocupação de 0,8 m2/m2, permitido pelo PDM de X, pelo número de pisos que constitui a cércea dominante (3 pisos), aceitando, no entanto:

- as percentagens expressas no relatório de arbitragem relativas aos n°s 6 e 7 do artº. 26° do CE, com um somatório de 22,5% (= 0,225);
- o valor de referência adoptado como valor da área bruta de construção (€ 629,27/m2), não questionando, assim, o coeficiente de conversão de 0,90 aplicado, no laudo de arbitragem, ao preço de € 699,19/m2 de área útil;
- a dedução de 10% considerada pelos Srs. Árbitros como factor correctivo pela inexistência de esforço inerente à actividade construtiva;
- o valor de € 18.075,00 atribuído no relatório de arbitragem às benfeitorias existentes na parcela (muros de vedação).

Entendeu, ainda, o expropriado ser de considerar uma dedução de 10% para os efeitos previstos nos n°s 8 e 9 do artº. 26° do CE, a qual, como já se referiu, não foi contemplada no laudo arbitral.

Como tal, no recurso da decisão arbitral, o expropriado defendeu que o valor unitário do solo da parcela expropriada deveria ser calculado nos seguintes termos:

Valor/m2 de solo = 0,8 m2/m2 x 3 pisos x 0,225 x € 629,27/m2 x (1-0,10) x (1-0,10) =
= € 275,24/m2.

Sendo de 2.448,80 m2 a área da parcela objecto de expropriação, o valor do solo da mesma seria de € 674.007,71 (€ 275,24 x 2.448,80 m2), ao qual deveria ser adicionado o valor das benfeitorias consideradas no relatório de arbitragem (€ 18.075,00), fixando o valor da justa indemnização em € 692.082,71.
Conforme se alcança do Relatório de Avaliação constante de fls. 223vº a 235 e dos esclarecimentos prestados pelos Srs. Peritos a fls. 255, 256, 259, 260 e 267 a 272, no caso dos autos não existe qualquer divergência entre os cinco Peritos no que respeita à classificação da parcela expropriada como solo apto para construção e à inclusão na indemnização das benfeitorias constituídas pelos muros de vedação, atribuindo-lhes o valor de € 18.075,00, aceitando assim o que consta do relatório de arbitragem.
Existe, ainda, concordância de todos os Peritos quanto à fixação da percentagem de valorização do terreno em 23% (divergente da arbitragem que fixou em 22,5%), por aplicação dos parâmetros previstos no artº. 26º, nºs 6 (13%) e 7 (10%) do CE, referindo no Relatório de Avaliação que a aplicação de tal percentagem teve em conta “a análise ponderada das características de localização, qualidade ambiental e equipamentos existentes na envolvente, suficientemente retratadas no relatório da VAPRM, bem como as infraestruturas existentes no arruamento com o qual o prédio confina”.
Ademais, nenhum dos Peritos que subscreveu o Relatório de Avaliação junto aos autos se insurgiu contra o coeficiente de conversão de área útil em área bruta de 0,90 (1-0,10) utilizado pelos Srs. Árbitros como parâmetro.
Todavia, existe divergência entre os Srs. Peritos que procederam à avaliação da parcela expropriada quanto ao critério ou método utilizado no cálculo do valor do solo expropriado classificado como “solo apto para construção”, designadamente no que concerne ao índice de construção, ao valor unitário do custo da construção, ao factor correctivo previsto no artº. 26º, nº. 10 do CE, ao valor do solo da parcela expropriada e à depreciação da parte sobrante do prédio.
Assim, no que concerne ao índice de construção do solo, analisando o Relatório Pericial, constatamos que os Peritos indicados pelo Tribunal levaram em consideração um índice de construção de 1,68 m2/m2 [decorrente da divisão da área total de construção do Parque de Estacionamento de ... – 14.500 m2 – pela área total expropriada para construção do Parque – 8.650 m2], determinado em função da edificação que a entidade expropriante irá construir na parcela expropriada, e estando a mesma a construir uma edificação destinada a parque de estacionamento colectivo, no cálculo são utilizadas as áreas dessa mesma construção – ou seja, 8.650 m2 correspondente à área abrangida pela totalidade da intervenção, incluindo acessos, e a área total de construção de 14.500 m2.

Ademais, nos esclarecimentos prestados pelos Srs. Peritos do Tribunal a fls. 268 a 272, estes justificaram a não aplicação do índice de ocupação de 0,8 admitido pelo PDM e uma cércea de 3 pisos já existente no local e na zona envolvente, da seguinte forma:

“Da análise efetuada ao PDM de X, os Peritos verificaram que o índice de ocupação máximo de 0,8 mencionado no mesmo seria impossível de atingir atendendo a todas as condicionantes existentes como a interioridade, necessidade de cumprir alinhamentos, áreas a ceder a domínio público, afastamentos, áreas necessárias à construção de infraestruturas, dado tratar-se de uma parcela correspondendo ao logradouro de um edifício existente, que se localiza no interior de um quarteirão, não se depreendendo de uma forma automática qual a capacidade construtiva da parcela ou mesmo se terá capacidade construtiva.
Face ao exposto e à dificuldade em definir uma capacidade construtiva e atendendo aos princípios gerais da DUP, nomeadamente o princípio da legalidade, entenderam os Peritos designados pelo Tribunal que a forma de calcular o valor da justa indemnização seria através dos índices de utilização utilizados pela entidade expropriante na edificação a executar na sequência da expropriação”.

Por sua vez, o Perito indicado pela entidade expropriante levou em consideração um índice de construção de 0,41 m2/m2 [decorrente da divisão do produto da multiplicação da área de implantação - 401 m2 – pelo n.º de pisos – 3 – pela área total do prédio - 2.901 m2, ou seja, 401 m2 x 3 pisos : 2.901 m2], referindo no relatório que face à área de implantação do edificado (401 m2) e a cércea dominante no arruamento (rés do chão + 2 pisos), resultaria uma área de construção de 1.203 m2 (401 m2 x 3 pisos), o que para a área de terreno que compõe o prédio (2.901 m2) resulta num índice de construção de 0,41 m2/m2 (1.203 m2 : 2.901 m2), valor este considerado pelo Perito como sendo aquele que corresponderá à capacidade máxima admitida para o terreno num aproveitamento económico normal e que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação de acordo com as leis e os regulamentos em vigor.
Por outro lado, o Perito indicado pelo expropriado levou em consideração um índice de construção de 1,83 m2/m2 [decorrente da utilização de um índice médio de ocupação de 0,61 m2/m2 verificado no quarteirão em que se localiza a parcela expropriada, obtido pela divisão da área do quarteirão ocupada com edificações - 30.546 m2 – pela área total do quarteirão – 49.781 m2 – medidas em ortofotomapa georreferenciado, índice médio esse que foi multiplicado pelo número de 3 pisos, por ser esta a cércea dominante nos edifícios que ladeiam aquele que está edificado na parte sobrante do prédio de onde foi destacada a parcela expropriada], conforme melhor explanado nos esclarecimentos prestados por aquele Perito a fls. 256 dos autos.

Divergem, também, os Srs. Peritos quanto ao valor unitário do custo da construção admitida para o local, porquanto:

- os Peritos designados pelo Tribunal consideraram, no seu cálculo para determinação do valor da indemnização, o valor unitário do custo da construção de € 397,08/m2 de área bruta, resultante da divisão do valor total da adjudicação da obra que o expropriante está a executar no local (ou seja, € 5.757.597,01 com 6% de IVA incluído) pela área total de construção do Parque de Estacionamento (14.500 m2), tendo relativamente a esta matéria aqueles Peritos prestado os esclarecimentos constantes de fls. 268 a 272, no sentido de que «entenderam que, uma vez a construção a executar tratar-se de um parque de estacionamento não seria justo utilizar custo da habitação, pois nesse caso poderiam existir outras condicionantes que não foram aqui consideradas como por exemplo a necessidade de reforço de infraestruturas. Entenderam assim que, o custo de construção deveria ser o real da obra a executar mantendo-se coerentes com o critério seguido para a obtenção da capacidade construtiva (…)», referindo, ainda, que «nos termos do n.° 4 do Art.° 26.° do Código de Expropriações “… o valor do solo apto para a construção calcula-se em função do custo da construção …”, não considerando por isso quaisquer outros valores que não sejam custos diretos de construção»;
- já os Peritos designados pelo expropriante e pelo expropriado estão de acordo quanto à aplicação do valor de referência estabelecido na Portaria nº. 353/2013 de 4/12 que, para a Zona II (onde se integra X), segundo alegam, fixa o valor do custo unitário de construção em € 699,19/m2 de área útil, de que resulta o valor de € 629,27€/m2 de área bruta - o que é coincidente com o valor unitário de área bruta indicado na arbitragem - se aos € 699,19/m2 (valor unitário para cálculo de área útil) aplicarmos o coeficiente de conversão de área útil em área bruta de 0,90 aceite quer pelos Srs. Árbitros, quer pelos Srs. Peritos acima referidos (€ 699,19/m2 x 0,90 = € 629,27/m2) e não impugnado pelos Peritos do Tribunal.

A divergência quanto ao factor correctivo pela inexistência de risco inerente à actividade construtiva previsto no artº. 26º, nº. 10 do CE é manifestada apenas pelo Perito indicado pelo expropriante, o qual considera adequado o valor de 10% (à semelhança, aliás, do que haviam feito os Srs. Árbitros), contrariamente aos demais Peritos (indicados pelo Tribunal e pelo expropriado) que entenderam ser de fixar o coeficiente de 15%, “tendo em conta a localização, dimensão e tipo do produto imobiliário”, acrescentando os Peritos do Tribunal nos esclarecimentos prestados a fls. 268 a 272 que “um parque de estacionamento é um produto imobiliário com um retorno a longo prazo, implicando um maior risco”.

Relativamente ao valor do solo da parcela expropriada, considerando as posições defendidas pelos Peritos que realizaram a avaliação da dita parcela acima explanadas e os cálculos por eles efectuados, constam do respectivo relatório de peritagem os seguintes valores:

a) – Peritos do Tribunal:

Valor unitário do solo da parcela:
€ 397,08 x 1,68 m2/m2 x 0,23 x 0,85 = € 130,42/m2
Sendo a área da parcela expropriada de 2.448,80 m2 e o valor unitário do solo de € 130,42/m2, o valor do solo daquela parcela será de € 319.372,50 (2.448,80 m2 x € 130,42/m2).

b) – Perito do expropriante:

Valor unitário do solo da parcela:
0,41 m2/m2 x € 629,27/m2 x 0,23 x (1 - 0,10) = € 53,41/m2
Valor do solo da parcela expropriada:
2.448,80 m2 x € 53,41/m2 = € 130.790,41

c) – Perito do expropriado:

Valor do solo da parcela expropriada:
2.448,80 m2 x 0,23 x 1,83 m2/m2 x € 629,27/m2 x (1-0,15) = € 551.300,26

No tocante à depreciação da parte sobrante do prédio, apenas o Perito do expropriado foi de parecer que, devido à expropriação da quase totalidade do logradouro do edifício existente na parte sobrante, o mesmo ficou limitado a uma área de 210,83 m2, sendo afectado no que respeita à salubridade, iluminação e ventilação, entendendo que “o valor da depreciação corresponderá a 15% do valor da construção actual, atribuindo-lhe um valor unitário de 50% do valor de referência (€ 699,19/m2) à sua área matricial bruta de construção (836,57 m2)”.
Importando, assim, o valor da depreciação do edifício situado na parte restante do prédio, em € 43.869,10 (€ 699,19/m2 x 0,50 x 0,15 x 836,57 m2).
Conforme se alcança dos autos, nenhum dos outros Peritos nem os Srs. Árbitros foram desse entendimento, tendo considerado que a parte sobrante assegura proporcionalmente os mesmos cómodos que oferecia todo o prédio. Aliás, em sede de esclarecimentos os Peritos do Tribunal e do expropriante referiram que o Parque de Estacionamento de ... situa-se a norte do edifício existente na parte sobrante do prédio, pelo que não poderá vir a afectar a exposição solar ou salubridade daquele edifício.

Neste contexto, constam do Relatório de Avaliação os seguintes cálculos do montante da indemnização devida pela expropriação da parcela nº. 6 (13):

I) – Peritos do Tribunal:

Valor do terreno da parcela - € 319.372,50
Valor das benfeitorias - € 18.075,00
Montante total da indemnização - € 337.451,41

II) – Perito da expropriante:

Valor do terreno da parcela - € 130.790,41
Valor das benfeitorias - € 18.075,00
Montante total da indemnização - € 148.865,41

II) – Perito do expropriado:

Valor do terreno da parcela - € 551.300,26
Valor das benfeitorias - € 18.075,00
Valor da depreciação da parte sobrante do prédio - € 43.869,10
Montante total da indemnização - € 613.244,36

O Tribunal “a quo”, na sentença recorrida, discordou do índice de construção utilizado pelos Peritos do Tribunal que subscreveram o laudo maioritário e ainda do valor unitário do custo de construção indicado no relatório de peritagem por cada um dos Peritos.

Com efeito, no que se refere ao índice de construção a considerar no cálculo do valor do solo da parcela expropriada, entendeu-se na sentença recorrida “como mais razoável o critério utilizado pelos Srs. Árbitros e pelo Sr. Perito indicado pelo expropriante” - ou seja, 0,41 m2/m2, porquanto “nos termos do art. 26.º/1 CExp, o valor do solo apto para construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e regulamentos em vigor à data da publicação da DUP (art. 24.º/1 CExp). Não é – nem pode ser – erigível em critério a concreta obra que a entidade expropriante levará a cabo na parcela expropriada”.

No que toca ao valor unitário do custo de construção, estabelece o artº. 26º, nº. 5 do CE que “Na determinação do custo da construção atende-se como referencial aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada”.
Tendo o Tribunal “a quo” considerado que este dispositivo legal seria suficiente para afastar o valor de referência utilizado pelos Srs. Peritos do Tribunal que realizaram a avaliação, reiterando que “não é – nem pode ser – erigível em critério definidor do preço a concreta obra que a entidade expropriante levará a cabo na parcela expropriada”.

Nesta conformidade, aquele Tribunal adoptou, no cálculo do montante da indemnização, o valor de referência estabelecido na Portaria nº. 353/2013 de 4/12, que fixa para a Zona II (onde se insere X) o valor do custo de construção em € 700,24/m2 para a área útil.

Em nosso entender, haverá que fazer o seguinte reparo ao Laudo de Arbitragem e ao Relatório de Peritagem:

Quer os Srs. Árbitros, quer os Srs. Peritos do expropriado e da entidade expropriante que realizaram a avaliação, certamente por lapso, indicaram o valor do custo de construção de € 699,19/m2 para a área útil, como sendo o valor referencial constante da Portaria nº. 353/2013 para a Zona II, quando na verdade esse valor é de € 700,24/m2, conforme correctamente indicado na sentença recorrida, sendo este o valor a considerar, pois terá influência no valor do custo de construção de área bruta, após a aplicação do coeficiente de conversão de área útil em área bruta e, consequentemente, no valor da indemnização a atribuir ao expropriado.
Por outro lado, na sentença sob censura foi considerado o coeficiente de conversão de área útil em área bruta de 0,90 (1-0,10), aceite quer pelos Srs. Árbitros no laudo de arbitragem, quer pelos Srs. Peritos do expropriado e do expropriante no Relatório de Avaliação, e não questionado pelos Srs. Peritos do Tribunal. Assim, aplicando o aludido coeficiente de conversão de 0,90 aos € 700,24/m2 de área útil, obtém-se o valor € 630,22/m2 de área bruta (€ 700,24/m2 x 0,90 = € 630,22/m2) referido na sentença, e não o valor de € 629,27/m2 de área bruta que, certamente por lapso, foi indicado no laudo de arbitragem e pelos Peritos do expropriado e do expropriante no relatório de peritagem.
Ademais, o Tribunal “a quo”, no cálculo do valor do solo da parcela expropriada, acolheu o coeficiente de valorização do terreno fixado por todos os Peritos no relatório de peritagem em 23%, por aplicação dos critérios insertos no artº. 26º nºs 6 (13%) e 7 (10%) do CE.
Quanto ao factor correctivo pela inexistência de risco inerente à actividade construtiva previsto no artº. 26º, nº. 10 do CE, foi acolhida, na sentença recorrida, a posição dos Peritos do Tribunal e do expropriado que subscreveram o laudo maioritário nesta matéria e respectivos esclarecimentos constantes de fls. 268 a 272, ao aplicar “in casu” o coeficiente de 15%, adoptando assim o critério seguido pela maioria dos Peritos, em detrimento da posição assumida pelo Perito do expropriante que fixou tal coeficiente em 10%, à semelhança do que haviam feito os Srs. Árbitros no laudo de arbitragem.

No seguimento do acima exposto, consta da sentença recorrida o seguinte cálculo do valor do solo da parcela expropriada:

0,41 m2/m2 x € 630,22/m2 x 0,23 x (1 – 0,15) = € 50,52/m2
€ 50,52 x 2.448,80 m2 = € 123.713,38

Na sentença recorrida foi acolhida, ainda, a posição defendida por todos os Peritos que subscreveram o Relatório de Avaliação, incluindo os indicados pelas partes – e que já havia sido considerada pelos Srs. Árbitros no respectivo laudo – no sentido de contabilizarem as benfeitorias (muros de vedação) já existentes no logradouro do prédio à data da declaração de utilidade pública, tendo o Tribunal “a quo” aceite o valor de € 18.075,00 indicado quer pelos Srs. Árbitros, quer pelos Srs. Peritos que procederam à avaliação da parcela expropriada, como indemnização por essas benfeitorias, não tendo o Tribunal “a quo” considerado qualquer depreciação da parte sobrante do prédio, seguindo nesta parte a posição assumida pelos Peritos do Tribunal e do expropriante.

Desta forma, na sentença ora sob censura o valor total da indemnização a pagar ao expropriado foi fixado em € 141.788,23 (€ 123.713,38 + € 18.075,00), a ser actualizado de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, sobre aquele montante a partir da data da publicação da DUP até 6/12/2018 e sobre € 76.791,98 (€ 141.788,38 - € 64.996,40 correspondente à quantia já transferida para o expropriado) desde 6/12/2018 até à data do trânsito em julgado da sentença.

Sobre a actualização da indemnização refere-se na sentença recorrida o seguinte:

«Nos laudo arbitral e relatório de avaliação, os srs. Árbitros e Peritos (com excepção dos indicados pelo Tribunal) utilizaram, no cálculo do valor da parte da parcela expropriada classificada como “solo apto para construção”, o valor do custo de construção previsto na P353/2013, que era aquela que se encontrava em vigor à data da DUP.
Daqui inferimos que o valor da parcela expropriada foi calculado com referência à data da publicação da declaração de utilidade pública, pelo que há que proceder à actualização do valor indemnizatório calculado.
Atente-se, ainda, na orientação constante do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 7/2001, in DR I Sèrie de 25.10.2001: “Em processo de expropriação por utilidade pública, havendo recurso da arbitragem e não tendo esta procedido à actualização do valor inicial, o valor fixado na decisão final é actualizado até à notificação do despacho que autorize o levantamento de uma parcela do depósito. Daí em diante a actualização incidirá sobre a diferença entre o valor fixado na decisão final e o valor cujo levantamento foi autorizado.”

Resulta de fls. 203 que foi transferida para o expropriado uma parte da quantia que lhe havia sido arbitrada (€64.996,40) por sobre ela se verificar acordo.
Assim sendo a actualização da indemnização devida ao expropriado incidirá sobre €141.788,38 a partir da data da publicação da declaração da utilidade pública e até 06.02.2018 (cfr. fls. 203) e sobre €76.791,98 (€141.788,38 - €64.996,40) desde essa data até à data do trânsito em julgado da presente decisão.»
A entidade expropriante não interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, o que significa que se conformou com o valor da indemnização arbitrada ao expropriado e, consequentemente, com os critérios adoptados no respectivo cálculo.
Somente o expropriado interpôs recurso da sentença, insurgindo-se apenas contra o facto do Tribunal “a quo”, no cálculo do valor do solo expropriado, ter aderido ao critério utilizado pelos Srs. Árbitros e pelo Sr. Perito indicado pelo expropriante e considerado um índice de construção de 0,41 m2/m2, pretendendo que seja aplicado o índice de construção de 1,68 m2/m2 utilizado pelos Srs. Peritos do Tribunal, nos termos e pelas razões atrás explanadas, o que certamente terá repercussões no valor da indemnização a fixar pela expropriação da parcela nº. 6 (13).

Como tal, pretende o recorrente que lhe seja atribuída uma indemnização no montante total de € 506.877,11 resultante da aplicação do índice de construção indicado pelos Srs. Peritos do Tribunal (1,68 m2/m2), corrigindo-se, assim, o cálculo desenvolvido na sentença recorrida para fixação do valor do solo da parcela expropriada, da seguinte forma:

1,68 m2/m2 x € 630,22/m2 x 0,23 x (1-0,15) = € 206,99/m2
€ 206,99 x 2.448,80 m2 = € 506.877,11

No Relatório de Avaliação é unanimemente reconhecido pelos Srs. Peritos do Tribunal que a entidade expropriante está a levar a cabo na parcela expropriada uma construção cujo índice é de 1,68 m2/m2.
Cotejando a sentença recorrida, constatamos que o Tribunal “a quo” considera que o expropriante deve indemnizar o expropriado com um valor que tem por base, no seu cálculo, o índice de construção de 0,41 m2/m2, para nele proceder a uma edificação cujo índice é de 1,68 m2/m2, o que se nos afigura algo contraditório.

Resulta da sentença sob escrutínio que o Tribunal “a quo” adoptou, no cálculo do montante da indemnização a fixar ao expropriado, os seguintes parâmetros:

- a percentagem de valorização do terreno por aplicação dos critérios insertos no artº. 26º, nºs 6 e 7 do CE, utilizada por todos os Peritos que subscreveram o Relatório de Avaliação (23%);
- o valor de referência do custo de construção estabelecido na Portaria nº. 353/2013 de 4/12 para a Zona II (€ 700,24/m2 para a área útil) e o coeficiente de conversão de área útil em área bruta de 0,90, aceite quer pelos Srs. Árbitros, quer pelos Srs. Peritos da entidade expropriante e do expropriado (embora com indicação de um valor incorrecto, não correspondente ao efectivamente indicado na dita Portaria) e não questionado pelos Srs. Peritos do Tribunal, coeficiente esse que aplicado ao correcto valor unitário de construção de área útil (€ 700,24/m2) conduziu ao valor de € 630,22/m2 de área bruta referido na sentença;
- o factor correctivo pela inexistência de risco inerente à actividade construtiva previsto no artº. 26º, nº. 10 do CE utilizado pelos Peritos do Tribunal e do expropriado (15%);
- a inclusão das benfeitorias (muros de vedação) já existentes no logradouro do prédio à data da DUP, acolhendo a posição unanimemente defendida pelos Peritos que procederam à avaliação da parcela expropriada (e que já havia sido considerada no laudo arbitral) e aceitando o valor de € 18.075,00 indicado pelos Srs. Árbitros e por todos os Peritos que subscreveram o Relatório de Avaliação.

Perante o quadro supra descrito, afigura-se-nos que assiste razão ao expropriado, ora recorrente, ao considerar que não existe qualquer justificação para o Tribunal recorrido não ter sufragado a posição maioritária dos Peritos do Tribunal plasmada no relatório de peritagem, quanto à utilização do índice de construção de 1,68 m2/m2 por eles considerado no cálculo do montante da indemnização, tanto mais que o mesmo não excede o valor admitido pelo Regulamento do PDM de X (0,8 m2/m2 x 3 pisos = 2,40 m2/m2) ou o valor de referência da envolvente indicado pelo Perito do expropriado no Relatório de Peritagem (1,83 m2/m2).

Como vimos, o Tribunal recorrido fundamenta a sua decisão de afastar o índice de construção de 1,68 m2/m2 utilizado pelos Srs. Peritos do Tribunal, na consideração de que "Não é - nem pode ser - erigível em critério a concreta obra que a entidade expropriante levará a cabo na parcela expropriada" porque "o valor do solo apto para construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e regulamentos em vigor à data da DUP".
Porém, conforme se alcança da “Memória descritiva e justificativa” que integra o projecto de arquitectura da construção que originou a DUP, junta a fls. 37 a 43 dos autos, a edificação em causa consiste num parque de estacionamento automóvel coberto com 3 pisos úteis (não ultrapassando assim a cércea dominante na envolvente), que certamente observa as leis e regulamentos em vigor. E se a iniciativa da sua construção coube ao expropriante, que para essa finalidade expropriou os terrenos necessários, poderia também ter sido iniciativa de qualquer entidade privada em terreno de sua propriedade, podendo, pois, considerar-se que a construção do aludido parque de estacionamento levada a efeito pelo expropriante representa um aproveitamento económico normal.
Assim, tendo o Tribunal “a quo” adoptado o critério seguido por todos os Peritos que subscreveram o Relatório de Peritagem relativamente a determinados parâmetros, ou pela maioria desses Peritos (constituída pelos Peritos do Tribunal e do expropriado) quanto a outros, nos termos acima enunciados, por uma questão de coerência e conformidade com o entendimento dominante que vem sendo seguido pela nossa jurisprudência sobre a força probatória do laudo pericial maioritário quando haja disparidade entre os Peritos, ou do laudo dos Peritos nomeados pelo Tribunal em caso de divergência entre estes e os demais Peritos, deveria o Tribunal “a quo” ter considerado, no cálculo do montante da indemnização, o índice de construção de 1,68 m2/m2 utilizado pelos Srs. Peritos do Tribunal, sufragando também nesta parte a posição maioritária plasmada no relatório pericial.
Como é sabido, a perícia constitui um meio de prova de natureza técnica na medida em que ao perito, para além da narração dos factos que percepciona, está também cometida a tarefa de apreciar ou valorar esses factos de acordo com os especiais conhecimentos técnicos que possui na matéria e que o julgador não domina.
O Código das Expropriações, com vista à determinação do valor do bem objecto da expropriação, prevê a intervenção de peritos em todas as fases do processo, sendo que a obrigatoriedade da diligência pericial deriva essencialmente da complexidade técnica da avaliação das várias espécies de bens e, por isso, da necessidade de colaboração de pessoas com conhecimentos técnicos específicos.
No entanto, apresentando o processo de expropriação um cariz marcadamente técnico, e não dispondo o juiz de conhecimentos especiais na área a que respeita a perícia, necessita que os peritos lhe forneçam elementos concretos que o habilitem a fixar a justa indemnização, não estando em condições de sindicar o juízo científico emitido pelos peritos, salvo em caso de erro manifesto ou de critério legalmente inadmissível ou desadequado (cfr. acórdãos da RC de 31/05/2011, proc. nº. 1197/05.9TBGRD, da RL de 7/07/2009, proc. nº. 61/1996 e da RG de 1/06/2017, proc. nº. 1446/09.4TBBCL, todos acessíveis em www.dgsi.pt).
Acresce que o Código das Expropriações estabelece para o efeito regras especiais, uma vez que esta avaliação é efectuada por cinco peritos, designando cada parte um perito e sendo os três restantes nomeados pelo Tribunal e escolhidos de entre os que constam da lista oficial (artº. 62º, nº. 1, al. a) e nº. 3 do citado diploma legal).
Ora, os peritos e árbitros constantes das listas oficiais estão sujeitos às especiais regras de recrutamento e às condições de exercício de funções - quer no âmbito dos procedimentos anteriores à declaração de utilidade pública quer no âmbito do processo de expropriação – que se encontram previstas no DL 125/2002 de 10/5, que aprovou o Estatuto dos Peritos Avaliadores (doravante EPA) – ou seja, os peritos que integram a lista oficial estão sujeitos a especiais exigências e impedimentos, com vista a acautelar a sua qualidade técnica e a garantir a sua isenção e imparcialidade.
Por fim, devem proceder à elaboração dos laudos periciais de acordo com as normas legais e regulamentares aplicáveis e devem fundamentar claramente o cálculo do valor atribuído (artº. 21º do EPA), donde decorre, por exigência legal, que têm de se pautar por critérios objectivos.
Muito embora constitua entendimento pacífico na jurisprudência dos Tribunais Superiores que no processo de expropriação a força probatória da perícia é fixada livremente pelo Tribunal (artº. 389º do Código Civil), tem-se entendido que neste tipo de processo, sendo a peritagem obrigatória e traduzindo-se a avaliação do bem expropriado num problema essencialmente técnico, o Tribunal deve aderir, em princípio, aos pareceres dos peritos, dando preferência ao valor resultante desses pareceres, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, quando não sejam coincidentes, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo Tribunal quando haja unanimidade entre eles, porquanto este é o meio de prova que melhor habilita o julgador a apurar o valor do bem expropriado, com vista à atribuição da justa indemnização.
Na verdade, para além da presumida competência técnica que se lhes reconhece, a posição assumida pelos peritos nomeados pelo Tribunal é aquela que, em princípio, oferece maiores garantias de independência, imparcialidade e objectividade, face ao distanciamento que mantêm em relação às partes e aos interesses em litígio, estando, por isso, em melhores condições de, com objectividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização (cfr. acórdãos da RC de 15/01/2013, proc. nº. 637/10.0TBSEI, de 14/02/2012, proc. nº. 550/09.3TBVIS e de 14/12/2010, proc. nº. 4714/07.6TBVIS, da RL de 31/05/2012, proc. nº. 763/1994 e de 22/11/2012, proc. nº. 2352/08.5TJLSB e da RG de 20/02/2014, proc. nº. 1128/08.4TBFLG e de 10/04/2012, proc. nº. 2167/08.0TBFLG, todos acessíveis em www.dgsi.pt).
Partilhamos da posição defendida no acórdão desta Relação de 27/09/2018 (proferido no proc. nº. 4090/11.2TBGMR), onde se refere que “sem prejuízo da força probatória da perícia ser fixada livremente pelo tribunal – art. 389º do Cód. Civil –, no processo de expropriação a perícia assume uma particular relevância – evidenciada até pela circunstância de se tratar de diligência obrigatória, nos termos do artigo 61º, nº 2 do CE – de tal forma que podemos, seguramente, afirmar que as conclusões apresentadas pelos peritos – unanimemente ou por maioria, preferindo-se as que provêm dos peritos nomeados pelo tribunal, pela maior equidistância relativamente às partes – só devem ser afastadas quando se constata que foram elaboradas com base em critérios legalmente inadmissíveis ou desadequados, ou quando se nos deparam erros ou lapsos evidentes, que importem correcção” (neste sentido vide também acórdão da RG de 1/06/2017, proc. nº. 1446/09.4TBBCL, ambos acessíveis em www.dgsi.pt).
Também neste sentido se pronunciou o acórdão da Relação de Coimbra de 12/03/2013 (proc. nº. 1412/08.7TBCVL) citado no acórdão desta Relação de 9/11/2017 (proc. nº. 1445/09.6TBBCL) ambos acessíveis em www.dgsi.pt, no qual se refere que “apesar de o juiz não estar vinculado aos laudos apresentados pelos peritos e apesar de ter o dever de os analisar criticamente, verificando, designadamente, a sua conformidade com os critérios legais, a verdade é que, no que toca às questões técnicas que constituem o cerne da avaliação, o julgador não estará, por regra, habilitado a contrariar as conclusões dos peritos e a formular o seu próprio juízo técnico.
Assim, existindo laudos divergentes e não possuindo o juiz quaisquer conhecimentos ou elementos concretos que lhe permitam aferir qual deles tem melhor aptidão para alcançar o valor da justa indemnização, justifica-se que considere ou adira ao laudo maioritário ou ao laudo dos peritos do Tribunal por se dever presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos, reunindo maior consenso, terão maior aptidão para atingir aquele objectivo ou que os peritos do Tribunal, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objectividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização.”
Assim, havendo laudos periciais divergentes, o facto de se dever dar preferência ao dos peritos oficiosamente escolhidos, não significa uma irrestrita vinculação ao laudo maioritário, já que o Tribunal pode introduzir-lhe ajustamentos, fazer correcções, colmatar falhas ou seguir o laudo ou critérios diferentes, se os tiver por mais justos, de acordo com outros critérios técnicos, objectivamente sustentados, ou com os elementos probatórios que possuir (cfr. acórdãos da RC de 1/03/2005, proc. nº. 2738/04 e da RL de 31/05/2012, proc. nº. 763/1994, acessíveis em www.dgsi.pt).

Reportando-nos ao caso “sub judice”, e no seguimento do que atrás se deixou dito, quanto à competência técnica dos peritos e árbitros constantes das listas oficiais, tanto mais que estão sujeitos a um rigoroso processo de recrutamento e a especiais exigências e impedimentos no exercício das suas funções, com vista a acautelar a sua qualidade técnica e a garantir a sua isenção e imparcialidade, não vislumbramos quaisquer razões para pôr em causa os conhecimentos técnicos, a independência, a imparcialidade e a objectividade dos Peritos do Tribunal (que integram as listas oficiais de peritos e avaliadores) e, consequentemente, o índice de construção que utilizaram na fórmula de cálculo do montante da indemnização plasmada no Relatório de Avaliação com a qual ambas as partes se conformaram, conforme pretendido pelo ora recorrente, face ao seu distanciamento em relação às partes em litígio.
Ademais, não tendo sido carreados para os autos outros elementos de prova que ponham em causa, de forma consistente, o índice de construção indicado no laudo maioritário subscrito pelos Peritos do Tribunal, é razoável que se tome esse índice como base de cálculo, e não as posições divergentes assumidas pelos Peritos do expropriado ou da entidade expropriante quanto a essa matéria.
Em face do acima exposto, entendemos que deve ser corrigido o cálculo desenvolvido na sentença recorrida para fixação do valor do solo da parcela expropriada, por forma a nele ser considerado o índice de construção de 1,68 m2/m2 indicado pelos Peritos do Tribunal no seu laudo maioritário (em vez do índice de construção de 0,41 m2/m2 utilizado pelos Srs. Árbitros e pelo Sr. Perito do expropriante), que relativamente a esta parte se encontra devidamente fundamentado, não existindo razões para se duvidar da isenção e imparcialidade dos Srs. Peritos subscritores do mesmo.

Nesta conformidade, o cálculo do valor do solo da parcela expropriada passa a ser o seguinte:

1,68 m2/m2 x € 630,22/m2 x 0,23 x (1-0,15) = € 206,99/m2
€ 206,99 x 2.448,80 m2 = € 506.877,11

Conforme resulta das alegações de recurso e respectivas conclusões, o expropriado/recorrente pretende que lhe seja atribuída uma indemnização no montante total de € 506.877,11 – considerando-se que neste montante já estará contemplado o valor das benfeitorias indicado pelos Srs. Peritos no Relatório de Peritagem, uma vez que o recorrente nada refere relativamente ao adicionamento do valor atribuído às benfeitorias existentes na parcela expropriada (muros de vedação), indicando apenas o montante de € 506.877,11 como sendo o valor da justa indemnização pela expropriação da parcela, não podendo este Tribunal conceder ao recorrente mais do que ele pede no recurso interposto, dado estar vinculado ao objecto do recurso delimitado por aquele nas conclusões (cfr. artºs 609º, nº. 1 e 635º, nº. 4 do NCPC).
Concluindo, pelas razões atrás expostas, o valor total da indemnização a pagar pela entidade expropriante ao expropriado será no montante de € 506.877,11, alterando-se nesta parte a sentença recorrida, mantendo-se, no entanto, a mesma no que concerne ao modo de actualização do valor da indemnização a pagar ao expropriado, que não foi sequer posto em causa pelas partes.

Nestes termos, terá de proceder o recurso de apelação interposto pelo expropriado.
*
SUMÁRIO:

I) – Apresentando o processo de expropriação um cariz marcadamente técnico, e não dispondo o juiz de conhecimentos especiais na área a que respeita a perícia, necessita que os peritos lhe forneçam elementos concretos que o habilitem a fixar a justa indemnização, não estando em condições de sindicar o juízo científico emitido pelos peritos, salvo em caso de erro manifesto ou de critério legalmente inadmissível ou desadequado.
II) - Pese embora a força probatória da perícia no processo de expropriação seja fixada livremente pelo Tribunal (artº. 389º do Código Civil), tem-se entendido que neste tipo de processo, sendo a peritagem obrigatória e traduzindo-se a avaliação do bem expropriado num problema essencialmente técnico, o Tribunal deve aderir, em princípio, aos pareceres dos peritos, dando preferência ao valor resultante desses pareceres, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, quando não sejam coincidentes, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo Tribunal quando haja unanimidade entre eles, porquanto este é o meio de prova que melhor habilita o julgador a apurar o valor do bem expropriado, com vista à atribuição da justa indemnização.
III) – Na verdade, para além da presumida competência técnica que se lhes reconhece, a posição assumida pelos peritos nomeados pelo Tribunal é aquela que, em princípio, oferece maiores garantias de independência, imparcialidade e objectividade, face ao distanciamento que mantêm em relação às partes e aos interesses em litígio, estando, por isso, em melhores condições de, com objectividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização.
IV) - Havendo laudos periciais divergentes, o facto de se dever dar preferência ao dos peritos oficiosamente escolhidos, não significa uma irrestrita vinculação ao laudo maioritário, já que o Tribunal pode introduzir-lhe ajustamentos, fazer correcções, colmatar falhas ou seguir o laudo ou critérios diferentes, se os tiver por mais justos, de acordo com outros critérios técnicos, objectivamente sustentados, ou com os elementos probatórios que possuir.

III. DECISÃO

Em face do exposto e concluindo, acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente o recurso de apelação interposto pelo expropriado A. C. e, em consequência, revogar a sentença recorrida, fixando em € 506.877,11 (quinhentos e seis mil oitocentos e setenta e sete euros e onze cêntimos) o valor da indemnização a pagar pela entidade expropriante ao recorrente pela expropriação da parcela n.º 6 (13) com a área de 2.448,80m2, valor esse a actualizar de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, sobre esse montante a partir da data da publicação da declaração da utilidade pública e até 6/12/2018 e sobre € 441.880,71 desde essa data até à data do trânsito em julgado da presente decisão.

Sem custas.
Notifique.
Guimarães, 13 de Junho de 2019 (6/5 a 4/6 – baixa médica da relatora)
(processado em computador e revisto, antes de assinado, pela relatora)

(Maria Cristina Cerdeira)
(Raquel Baptista Tavares)
(Margarida Sousa)


1 - No relatório de avaliação aparece referenciado 1,68 por manifesto lapso, como facilmente se conclui pela realização da operação aritmética em causa.