Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
361/19.8T8VVD.G1
Relator: MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Descritores: DANO BIOLÓGICO
VALOR INDEMNIZATÓRIO
EQUIDADE
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/11/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO DA A. PARCIALMENTE PROCEDENTE (RECURSO PRINCIPAL). APELAÇÃO DA R. IMPROCEDENTE (RECURSO SUBORDINADO)
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I – O dano biológico, porque incidente sobre o valor humano, em toda a sua dimensão, em que o bem saúde é objecto de um autónomo direito básico absoluto, deve ser reparado mesmo que a afectação da pessoa do ponto de vista funcional não se traduza em perda efectiva do rendimento do trabalho.
II - Nos casos, em que não há diminuição do estatuto remuneratório profissional, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» .
III – Entre os danos merecedores da tutela do direito inclui-se necessariamente o dano corporal em sentido restrito, caracterizado como o prejuízo de natureza não patrimonial que recai na esfera do próprio corpo, dano à integridade física e psíquica: as dores físicas, ‘o pretium ou quantum doloris’ possíveis de verificar através da extensão e gravidade das lesões e complexidade do seu tratamento clínico; e morais, traduzidas pelas aflições, desgostos, angústias e inquietações.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

1-Relatório

A. M., contribuinte número ………, residente na Rua d…, Ponte de Lima, veio intentar contra “Seguradoras ..., S.A”, com sede na Avenida …, em Lisboa, a presente acção declarativa, pedindo a condenação da ré ao pagamento da quantia de € 43.338,40, acrescida de juros de mora, contados à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da propositura da acção até efectivo pagamento, e ainda a quantia que, por força dos factos alegados nos artigos 261.º a 268.º da petição inicial, vier a ser fixada em decisão ulterior ou que vier a ser liquidada.
Alega, em síntese, para o efeito, que, no dia 31 de Outubro de 2016, pelas 18,10 horas, na Estrada Nacional n.º 201, ao quilómetro n.º 57,420, na freguesia de ..., concelho de Vila Verde, ocorreu um acidente de viação, em que o veículo automóvel de matrícula QO embateu no CF, no qual a A. seguia como passageira, causando-lhe lesões corporais, bem como danos morais que concretiza, com lesões a quantificar em futura liquidação.
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Citada, a ré contestou, confirmando, desde logo, a celebração do alegado contrato de seguro automóvel, bem como a assunção de responsabilidade pelas consequências do acidente, embora impugnando alguns dos valores peticionados e desconhecimento de algumas das despesas alegadas, pedindo, assim, a improcedência da acção ou apenas a sua procedência parcial.
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Em resposta, e em síntese, a autora negou a pré-existência de qualquer patologia à data do acidente, concluindo pela improcedência da matéria de excepção.
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Por requerimento apresentado sob a ref.ª 9168910, a autora veio ampliar o seu pedido no que toca às despesas médicas e medicamentosas resultantes de tratamento das lesões sofridas com o acidente em discussão e efectuadas após a propositura da acção, o que veio a ser deferido.
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Dispensada a realização da audiência prévia, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, determinou-se e realizou-se a perícia, tendo sido junto aos autos o respectivo relatório.
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Realizada a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual a autora veio novamente ampliar o seu pedido no que toca a despesas médicas e medicamentosas resultantes de tratamento das lesões sofridas com o acidente, foi, de igual forma, deferido o requerido, após o que foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, por provada, e, consequentemente, condenou a ré, Seguradoras ..., S.A. (hoje, X Seguros, SA), a pagar à autora, A. M., a quantia de € 9.240,79 (nove mil, duzentos e quarenta euros, setenta e nove cêntimos), a título de danos não patrimoniais, acrescida dos juros calculados, à taxa legal, desde a decisão até integral pagamento.
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II - Objecto do recurso

A A., não se conformando com o teor dessa decisão veio recorrer, concluindo nos seguintes termos:

Danos não patrimoniais
1. O montante total fixado a este título afigura-se insuficiente a ressarcir de forma adequada e na justa medida dos danos sofridos pela Autora.
2. Chamam-se à colação, com especial pertinência para a presente questão, os factos provados 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 67 e 68 da respectiva rubrica.
3. Os danos não patrimoniais comprovadamente sofridos pela Autora, reflectidos na factualidade supra destacada, são de relevante gravidade e devem ser objecto de adequada e justa compensação pecuniária.
4. De entre os factos supra citados, destaca-se, com pertinência para este capítulo indemnizatório, o facto de a Autora ter sofrido severas lesões corporais, incluindo traumatismo cervical dorsal e lombar; a assistência hospitalar, o período de convalescença em casa, em repouso absoluto; os vários tratamentos, exames, consultas e fisioterapia a que foi sujeita, e os incómodos inerentes a tal sujeição e às deslocações para tais compromissos; o intenso susto no momento do acidente; o período prolongado com dores intensas; as severas limitações de mobilidade e actividade da vida pessoal e profissional de que passou a padecer; os transtornos e angústia por que passou em todo os eventos relacionados com as consequências do acidente; o quantum doloris em grau 3; o período de défice funcional temporário parcial; o défice funcional permanente de 2 pontos e esforços suplementares que passou a ter de realizar no desempenho da sua actividade profissional; a diminuição biológica permanente e definitiva que sofreu e que reflectirá até ao final da sua vida; o profundo desgosto causado por todos os factos supra.
5. Atenta a factualidade provada e vertida supra, afigura-se insuficiente a indemnização fixada em primeira instância para a compensação dos danos não patrimoniais sofridos - 5.000,00 - a qual, pela sua extensão e gravidade, conforme resulta dos factos provados, deve ser também alterada e fixada em valor não inferior a 15.000,00.

Danos patrimoniais
6. Reitera-se e subscreve-se tudo quanto é vertido na douta sentença recorrida quanto ao preenchimento, no caso dos autos, dos pressupostos da ressarcibilidade do dano patrimonial futuro a favor da Autora, em função da actividade profissional que desempenha, e da incapacidade permanente de 2 pontos de que ficou a padecer.
7. Não pode no entanto a Autora conformar-se com o valor arbitrado a este título - € 4.000,00 (quatro mil euros), atento os factos provados pertinentes para esta matéria e que reflectem as sequelas de que ficou a padecer e os esforços acrescidos que o mesmo obrigam à Autora de forma perene em toda a sua carreira, bem como os factos atinentes à actividade profissional e vencimento da Autora, a sua (jovem) idade,
8. Tudo devendo ser ajustado segundo critérios de equidade ao caso concreto na específica quantia indemnizatória a fixar.
9. No caso em apreço e perante a factualidade dada como provada e que se dá por reproduzida, tal montante não pode julgar-se inferior a 20.000,00 (vinte mil euros), o que se requer.
10.Decidindo de modo diverso, fez a sentença recorrida má aplicação do direito aos factos provados e violou, além de outras, as normas dos artigos 483º, 496º.,. 1, 562º. e 564º., nºs. 1 e 2, do Código Civil.
11.Quanto ao restante que não posto em crise nas presentes alegações de recurso, deve manter-se o doutamente decidido pelo Tribunal de Primeira Instância.

Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e proferindo-se, em sua substituição, Douto Acórdão, que esteja em conformidade com as conclusões supra-formuladas, com o que se fará, J U S T I Ç A.
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A Ré apresentou as suas contra-alegações, concluindo e resumindo nos seguintes termos:

I- A verba arbitrada para compensação dos danos morais da Autora é excessiva e deve ser reduzida.
II- A autora não foi submetida a qualquer internamento hospitalar, não teve que se submeter a qualquer intervenção cirúrgica, os tratamentos a que se submeteu consistiram em acompanhamento médico e algumas sessões de fisioterapia e obteve a consolidação médico-legal cerca de 6 meses após o acidente, mas apenas esteve em situação de incapacidade total para o trabalho durante 10 dias.
III- Por outro lado, segundo se provou, o quantum doloris atribuível é de, apenas, 3 pontos uma escala de 1 a 7, o que não revela que tenha passado por um sofrimento particularmente intenso.
IV- Não existe, no caso, qualquer dano estético ou prejuízo sexual.
V- Por outro lado, deve ser tido em consideração que o dano biológico da Autora, que não tem, no caso, evidente e comprovada repercussão patrimonial, será indemnizado autonomamente, pelo que não pode ser novamente compensado enquanto dano moral.
VI- Face ao exposto e salvo o muito e devido a compensação fixada na douta sentença para os danos morais sofridos pela Autora deve ser reduzida e não ampliada, nos termos que a Ré sustentou no seu recurso subordinado
VII- A indemnização arbitrada à Autora pelo seu dano biológico é ajustada, não se justificando a sua ampliação.
VIII- Como resulta da prova produzida no decurso da ação, as sequelas de que a Autora é portadora são compatíveis com o desempenho da sua atividade habitual, implicando esforços suplementares
IX-Visto tudo o que acabou de se dizer, parece seguro afirmar que não está provado que as sequelas de que a Autora ficou portadora acarretarão no futuro qualquer efetiva perda de rendimentos.
X- É já, no entanto, possível afirmar que a autora, porque ficou afetada por sequelas, sofreu um dano biológico, consistente numa afetação permanente da sua integridade física, o qual tem de ser indemnizado.
XI- Nestes casos, o critério fundamental para a fixação da indemnização é a equidade, ainda que com recurso a elementos coadjuvantes.
XII- Entre eles estarão, por exemplo, as tabelas financeiras de cálculo de danos patrimoniais que se repercutam no futuro, a comparação dos valores atribuídos noutras decisões judiciais emcasos análogos eos critérios estabelecidos nalegislação respeitante à quantificação das indemnizações devidas pelas Seguradoras na fase extra-judicial em resultado de um acidente de viação.
XIII- Recorrendo às regras das portarias 377/2008 e 679/2009, a compensação da A pelo dano biológico de 2 pontos ascenderia a valor entre 1 621,08€ e 2 000,7€ (cfr tabela IV da portaria 679/09).
XIV- Assim, nesse pressuposto, seria, no caso, adequada a verba de 1765,00€, a qual, se atualizada tendo em conta o salário mínimo do ano de 2016 (530€), ascenderia a 2 321,22€.
XV- Neste ponto importa referir que a Ré não pode concordar com o critério utilizado pelo julgador paracorreção do valor daindicadaportaria, por viada ponderaçãodosalário médio de 870€.
XVI- É que a fixação da indemnização tendo por base um determinado salário, que a Autora nem sequer auferia, não tem qualquer justificação, na medida em que pressupõe aquela perda de rendimentos que não foi demonstrada.
XVII- De todo o modo, estando em causa um mero critério coadjuvante na fixação da indemnização, não é desajustada a ponderação que o julgador, nem o valor a que chega com base neste elemento.
XVIII- Já numa outra vertente, considerando as tabelas financeiras destinadas a calcular o dano patrimonial futuro, alcançamos o valor indemnizatório de4 538,49€, seutilizada a tabela financeira da portaria 679/2009 (650€ x 14 meses x 0,02 = 182€ x 24,936812 = 4 538,49€) e de 3 132,77€, se utilizada a tabela de capitalização constante da portaria 11/2000(650€ x 14 meses x 0,02 = 182€ x 17,213 = 3 132,77€).
XIX- Perante todos os elementos coadjuvantes acima invocados e uma vez que não está demonstrada uma efetiva perda de rendimentos, entende a recorrente que é adequada a verba fixada na douta sentença para o dano biológico da Autora, a qual se deve manter
XX- Assim, também nesta parte não deve ser dado provimento ao recurso interposto pela Autora.
XXI- Em qualquer caso, seria sempre excessiva e injustificada a verba pretenda pela Autora.
Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença e decidindo-se antes nos moldes apontados, como é de inteira e liminar JUSTIÇA
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Apresentou, ainda, a Ré recurso subordinado, concluindo e resumindo da seguinte forma:

I- Dos factos dados como provados decorre que foi concedido à Autora, entre 4 e 13 de novembro de 2016, um período de incapacidade temporária.
II- Porém, não se provou que, nesse período, a Autora não tenha, de facto, exercido a sua atividade profissional e, sobretudo, que não tenha auferido os correspondentes rendimentos.
III- Não é de afastar a possibilidade de alguém, a quem um médico reconheceu uma situação de incapacidade temporária, tenha, nem que seja com maior esfoço, exercido a sua profissão nesse mesmo período.
IV- No caso, como se provou, a Autora, entre 31/10 e 03/11/2016, exerceu a sua profissão, quando é de admitir que estivesse até na fase aguda da doença e em condições que seriam, ainda mais, impeditivas do que as que se verificavam dias depois, entre 4 e 13 de novembro de 2016.
V- Mas, ainda que se quisesse retirar dos factos provados que a Autora não trabalhou entre 4 e 13 de novembro de 2016, de forma alguma se pode concluir que, nesse período, a sua entidade patronal não lhe pagou a correspondente retribuição.
VI- Também aqui importa colocar a hipótese da entidade patronal da Autora, por algum motivo que não se apurou, ter-lhe pago a retribuição no período de incapacidade.
VII- De resto a própria autora, a pessoa que sofreu as indicadas perdas salariais, alegou na sua PI que estas apenas ascenderam a 217,67€ e ainda que recebeu 84,21€ a título de subsídio de doença.
VIII- Ainda que se entendesse que esta alegação não corresponde a uma confissão, não poderia o Tribunal deixar de questionar como pôde a autora equivocar-se na quantificação das suas perdas salariais, quando foi a própria quem, na primeira pessoa, as sentiu.
IX- Mas, mais do que a própria alegação da Autora, importa atender ao seu recibo de vencimento, que a Autora juntou como Doc 29 com a sua contestação
X- Como se vê deste documento, a Autora não estava muito equivocada quando afirmou que as suas perdas salariais ascenderam a 217,67€, na medida em que, efetivamente, no mês de novembro de 2016, a sua entidade patronal descontou-lhe 246,72€ na sua retribuição mensal e não o valor de 325€ atribuído na douta sentença.
XI- Face ao exposto, entende a exponente que, na verdade, não se provou que a Autora, no período de 10 dias em que lhe foi concedida incapacidade temporária, tenha, efetivamente, sofrido perdas salariais.
XII- Assim, perante a factualidade dada como provada, entende a Ré que não seria devida à Autora qualquer quantia a esse título.
XIII -Porém, por respeito à verdade e uma vez que o recibo de vencimento da Autora atesta realidade complementar em relação ao que resulta dos factos provados, considera a Ré que deve considerar-se que esta, no período em causa (10 dias), deixou de auferir a quantia de 246,72€, que lhe foi descontada pela sua entidade patronal.
XIV- E, tendo-se provado que recebeu da segurança social a quantia de 84,21€, a indemnização por perdas salariais deve ser reduzida para 162,51€.
XV- Assim, face às razões invocadas, deve ser revogada a douta sentença na parte em que atribuiu à Autora a quantia de 240,79€, fixando-se a indemnização por perdas salariais em 162,51€
XVI- A verba arbitrada para compensação dos danos morais da Autora é excessiva e deve ser reduzida.
XVII- A autora não foi submetida a qualquer internamento hospitalar. não teve que se submeter a qualquer intervenção cirúrgica, os tratamentos a que se submeteu consistiram em acompanhamento médico e algumas sessões de fisioterapia e obteve a consolidação médico-legal cerca de 6 meses após o acidente, mas apenas esteve em situação de incapacidade total para o trabalho durante 10 dias.
XVIII- Por outro lado, segundo se provou, o quantum doloris atribuível é de, apenas, 3 pontos uma escala de 1 a 7, o que não revela que tenha passado por um sofrimento particularmente intenso.
XIX- Não existe, no caso, qualquer dano estético ou prejuízo sexual.
XX- Por outro lado, deve ser tido em consideração que o dano biológico da Autora, que não tem, no caso, evidente e comprovada repercussão patrimonial, será indemnizado autonomamente, pelo que não pode ser novamente compensado enquanto dano moral.
XXI- Face ao exposto e salvo o muito e devido respeito, entende a recorrente que seria mais adequada a compensar o sofrimento físico da Autora a verba de 2.500,00, para a qual se pede que seja reduzida a compensação pelos danos morais devida à Autora.
XXII- E ainda que se entenda que tal valor não é adequado a compensar os danos morais sofridos pela Autora, o que não se admite, sempre se imporia a redução do valor arbitrado para quantia inferior, o que, subsidiariamente, se requer.
XXIII- A douta sentença sob censura violou as normas dos artigos 566º e 496º do Cod Civil
Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença e decidindo-se antes nos moldes apontados, como é de inteira e liminar JUSTIÇA
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III-O Direito

Como resulta do disposto nos art..ºs 608.º, nº. 2, ex vi do artº. 663.º, n.º 2, 635.º, nº. 4, 639.º, n.os 1 a 3, 641.º, n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem das conclusões que definem, assim, o âmbito e objecto do recurso.
Assim, face às conclusões das alegações de recurso, importa ponderar sobre os valores fixados a título de indemnização pelos danos sofridos pela A. em consequência do acidente que sofreu.
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A – Fundamentação de facto

1. No dia 31 de Outubro de 2016, pelas 18,10 horas, ocorreu um acidente de viação na Estrada Nacional n.º 201, ao quilómetro n.º 57,420, na freguesia de ..., concelho de Vila Verde, em que foram intervenientes os veículos automóveis ligeiro de passageiros de matrícula HU, CF e QO (doravante denominados HU, CF e QO).
2. O veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula HU era propriedade de B. D., residente na Rua …, nº. … Braga, e na data referida em 1., era conduzido pelo próprio.
3. O veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula CF era propriedade de S. S., residente na Rua …, Ponte de Lima e na data referida em 1. era conduzido pelo próprio.
4. Em 10 de Agosto de 2013, a autora contraiu casamento com S. S., sem convenção antenupcial.
5. Em 24 de Fevereiro de 2015, S. S. adquiriu, por compra, o referido veículo de matrícula CF.
6. O veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula QO era propriedade de V. C., residente na Rua …, Vila Verde e, na altura do acidente, era por ele próprio conduzido.
7. A Estrada Nacional nº. 201, no local do evento descrito em 1., configura um troço de recta, com um comprimento superior a trezentos (300) metros e piso asfaltado.
8. No referido local, a faixa de rodagem da Avenida … apresentava e apresenta uma largura de 5,50 metros.
9. Na data referida em 1., o tempo estava bom e seco.
10.Na mesma data, o pavimento encontrava-se limpo, seco e sem ondulações, fissuras ou buracos.
11.A Estrada Nacional nº. 201 estava, como está, afecta ao trânsito automóvel, em dois sentidos de marcha, dividindo-se em duas hemi-faixas de rodagem distintas, com uma largura de 2,75 metros, a situada do lado Norte, destinada ao trânsito que desenvolve a sua marcha no sento Nascente-Poente, ou seja Prado-Ponte de Lima, 2,75 metros, a situada do Sul, destinada ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido Poente-Nascente, ou seja, Ponte de Lima-Prado.
12.A separar essas duas hemi-faixas de rodagem, a Estrada Nacional nº. 201 apresentava e apresenta, no eixo divisório da sua faixa de rodagem, uma linha pintada a cor branca, sem soluções de continuidade (LINHA CONTÍNUA – MARCA M1).
13.Pelas duas margens, a faixa de rodagem apresentava e apresenta bermas, destinadas ao trânsito de peões, com uma largura de um metro, cada uma, e delimitadas com uma linha de cor branca, sem quaisquer soluções de continuidade (LINHAS DELIMITADORAS CONTÍNUAS – MARCAS M19).
14.Pelas duas margens, a Estrada Nacional n.º 201, quer no local do evento, quer antes de lá chegar, para quem circula em qualquer dos seus dois sentidos de marcha, é marginada, de forma ininterrupta, por casas de habitação e outras edificações, todas elas com os respectivos acessos a deitar directamente para a faixa de rodagem.
15.O evento descrito em 1. ocorreu numa zona situada entre as placas, fixas em suporte vertical, com a inscrição “...” (SINAL N1a).
16.Do local descrito em 1. avistam-se as faixas de rodagem da Estrada Nacional, em toda a sua largura, quer no sentido Nascente – em direcção a Prado -, quer no sentido Poente – em direcção a Ponte de Lima -, ao longo de uma distância superior a cento e cinquenta (150) metros.
17.Essa distância é ditada pela existência de curvas existentes, nos dois extremos do sector de recta que a Estrada Nacional nº. 201 configura, tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Prado-Ponte de Lima.
18.Para quem circula pela Estrada Nacional nº. 201, no sentido Poente-Nascente, ou seja, Prado-Ponte de Lima, consegue avistar-se o local do evento descrito em 1., em toda a largura das duas faixas de rodagem, a uma distância superior a cento e cinquenta (150) metros.
19.No dia 31 de Outubro de 2016, pelas 18,10 horas, o HU transitava pela Estrada Nacional nº. 201, no sentido Poente-Nascente, ou seja, Prado-Ponte de Lima, em direcção à vila de Ponte de Lima.
20.Circulava pela metade direita da faixa de rodagem da Estrada Nacional nº. 201, tendo em conta o seu indicado sentido em direcção à vila de Ponte de Lima.
21.Ao chegar ao local descrito em 1., o condutor, B. D., deparou com uma fila de trânsito imobilizada, à sua frente.
22.Por isso, reduziu a velocidade de que seguia animado e imobilizou a sua marcha, parando o HU na metade direita daquela faixa de rodagem da Estrada Nacional nº. 201º, no sentido Prado-Ponte de Lima, a cerca de três metros da parte traseira do veículo automóvel que se encontrava imobilizado imediatamente à sua frente e que integrava a fila de trânsito que aí se encontrava imobilizado.
23.Nas mesmas circunstâncias de tempo, o condutor do CF que transitava pela Estrada Nacional nº. 201, no sentido Prado-Ponte de Lima, na retaguarda do HU, reduziu também a velocidade que imprimia ao veículo e imobilizou a sua marcha na retaguarda do HU, e na metade direita da faixa de rodagem da Estrada Nacional nº. 201, tendo em conta o seu indicado sentido de marcha Prado-Ponte de Lima.
24.Nas mesmas circunstâncias de espaço e tempo, o QO transitava pela Estrada Nacional nº. 201, no sentido Prado-Ponte de Lima, à retaguarda do CF.
25.O seu condutor não parou o veículo, embatendo, com a parte da frente do veículo que dirigia, contra a parte traseira do CF, que se encontrava parado, conforme descrito em 23.
26.O embate ocorreu sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Nacional nº. 201, tendo em conta o sentido de marcha Prado-Ponte de Lima.
27.Como consequência directa e necessária desse embate, o CF foi projectado e impulsionado para a sua frente, no sentido Poente, em direcção à vila de Ponte de Lima, embatendo na parte traseira do HU.
28.Este embate ocorreu sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Nacional nº. 201, tendo em conta o seu indicado sentido de marcha Prado-Ponte de Lima.
29.Para quem circula pela Estrada Nacional n.º 201, no sentido Prado-Ponte de Lima, a uma distância de duzentos metros do local descrito em 1. depara-se, nas duas margens, com um sinal fixo em suporte vertical, de forma circular, com uma orla vermelha e fundo branco, sobre o qual se encontra, pintada a cor preta, a inscrição “50” (proibição de exceder a velocidade máxima de cinquenta (50,00) quilómetros por hora – sinal c13).
30.O condutor do QO comunicou à ré o descrito evento, a qual, após averiguação, aceitou a responsabilidade pelas consequências do mesmo, suportando a quantia de 1.137,43 €, relativa aos danos sofridos pelo CF.
31.No âmbito dos autos de inquérito nº. 58/17.3GAVVD, do D.I.A.P. de Vila Verde, foi deduzida acusação contra o condutor do QO, V. C., imputando-se-lhe a prática de crime de ofensa à integridade física, por negligência, p. e p. pelo artigo 148.º, n.º 1, com referência ao disposto pelo artigo 69.º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal.
32.No âmbito dos referidos autos constituiu-se assistente a autora, A. M..
33.Na data do evento referido em 1., a autora seguia, como passageira, do CF, sentada no banco da frente do veículo, ao lado do condutor e levando, apertado e junto ao corpo, o cinto de segurança.
34.A autora foi transportada, de ambulância, para o Hospital de Braga, onde se constatou a ausência de ferimentos e de dores à apalpação abdominal e da grelha costal, bilateral, mobilização dos quatro membros, dor na região cervical e lombar.
35.Efectuados exames radiológicos não se detectaram sinais de traumatismo. 36.No próprio dia teve alta medicada, com analgésicos, que tomou.
37.Foi-lhe concedido um período de incapacidade para o trabalho entre 4 e 13 de Novembro de 2016.
38.Após o evento, a autora passou a frequentar o Centro de Saúde de …, onde lhe foi prescrita medicação analgésica e anti-inflamatória, que tomou.
39.Em Dezembro de 2016, a autora teve uma consulta na Clínica …, S.A., em Viana do Castelo, por conta e a expensas da ré.
40.Foi-lhe prescrita uma Ressonância Magnética (RMN), que revelou uma discreta protusão póstero-mediana do disco C4-C5.
41.Na dita clínica foi prescrito tratamento de Medicina Física de Reabilitação (MFR) – Fisioterapia, em 10 sessões.
42.A autora obteve consulta na Clínica de Reabilitação do …, Lda., em Ponte de Lima, onde, em Março de 2017, se submeteu a tratamento de Medicina Física de Reabilitação (MFR) – Fisioterapia, ao longo de trinta (30,00) sessões.
43.No momento do acidente, e nos instantes que o precederam, a autora sofreu um susto e, dado o seu carácter imprevisto e súbito e a sua incapacidade de lhe escapar, receou pela própria vida.
44.Como consequência directa e necessária do embate, resultaram no corpo da autora dores nas regiões do corpo atingidas e ao nível da coluna lombar e cervical.
45.A autora sofreu os efeitos dos R.X., no Hospital de Braga.
46.E sofreu incómodos e as dores inerentes ao tratamento de Medicina Física de Reabilitação (MDR) – Fisioterapia -, a que se submeteu.
47.Em consequência do embate, a autora apresenta cervicalgia residual, sem lesão de cariz traumático documentada, despertada pelos esforços e pelas mudanças climatéricas, implicando medicação ocasional.
48.A consolidação das lesões ocorreu a dia 10 de Abril de 2017.
49.Em consequência do evento e das lesões e suas sequelas, a autora sofreu: a. um défice funcional temporário total de 1 dia;
b. um défice funcional temporário parcial de 161 dias;
c. uma repercussão temporária na actividade profissional total de 19 dias;
d. uma repercussão temporária na actividade profissional parcial de 143 dias.
50.A autora sofreu um “quantum doloris” de grau 3 em 7.
51.A autora sofre de um défice permanente da sua integridade físico-psíquica de 2 pontos em 100.
52.A repercussão permanente nas actividades físicas e de lazer é de 1 ponto em 7.
53.À data do evento, a autora exercia a profissão de operária fabril, por conta da sociedade “Y – INDÚSTRIA DE COMPONENTES AUTOMÓVEIS, S.A.”, com sede na Zona Industrial da …, concelho de Ponte de Lima, que se dedica à montagem de air bags, para volantes, destinados à indústria da construção automóvel.
54.A autora exerce a referida profissão apenas aos fins-de-semana. 55.Desempenhava todas as tarefas inerentes à sua profissão que exigem que permaneça, ora na posição de pé, ora na posição sentada, em trabalhos manuais e à máquina, ao longo de oito horas, e ainda que ande de um lado para o outro, no interior das instalações fabris, no transporte de matérias primas e de produto acabado.
56.Exigem ainda que rode o tronco e a coluna lombar dorsal e cervical, para a esquerda e para a direita e no sentido antero-posterior, que faça força com os membros superiores, com o tórax e com a coluna lombar, dorsal e cervical, para transportar as matérias primas e os produtos acabados.
57.Auferia, a título de retribuição mensal, um ordenado-base de 535,00, subsídio de alimentação de € 3,15/dia, horas extraordinárias e trabalho nocturno de € 2,06, complemento de salário de € 26,00 e subsídio de turno de € 135,00, a que acrescem subsídio de férias e de subsídio de Natal, num total de cerca de € 650,00 (seiscentos e cinquenta euros).
58.A autora recebeu, entre o dia 7 e o dia 13 de Novembro de 2016, a título de subsídio de doença, pela Segurança Social, a quantia de € 84,21 (7 dias x 12,03 €).
59.Após o evento, a autora passou a necessitar de fazer intervalos de descanso, para recobrar forças e para aliviar as dores na coluna lombar e cervical.
60.Na altura do evento, a autora dedicava-se aos trabalhos domésticos na sua casa de habitação para o agregado familiar constituído por ela própria, pelo seu marido e um filho do casal, nascido a - de Dezembro de 2015.
61.A autora confeccionava e servia as refeições, para todos os elementos do agregado familiar, lavava, passava a roupa a ferro, arrumava essa roupa, varria e arrumava a sua casa de habitação, limpava o pó dos móveis e cuidava do filho, ao longo de um período de tempo de cerca de 8 horas/dia, todos os dias, incluindo fins de semana e feriados.
62.O exercício da actividade doméstica exige-lhe manter-se de pé, para varrer e aspirar, fazer força e esforço com a coluna lombar, dorsal e cervical, com o tórax e com os membros superiores, para fazer e mudar as camas mudar a roupa das camas, passar a roupa a ferro, limpar vidros, remover os móveis, limpar o pó, e transportar os sacos das compras para abastecimento da sua casa de habitação.
63.A autora nasceu no dia - de Agosto de 1989. 64.Era uma mulher ágil, robusta e dinâmica.
65.Praticava, com regularidade, caminhadas, e fazia ginástica de manutenção, em tapetes e máquinas, no Ginásio Club Náutico de ….
66.Padecia de protusão postero-mediana do disco de C4-C5, que molda o saco tecal, sem compressão da medula e hemangioma no corpo de D3 sem significado clínico.
67.Está limitada nas caminhadas ao ar livre com a facilidade com que o fazia antes do evento, o que lhe causa desgosto.
68.O défice Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica que afecta a autora permite-lhe desempenhar a sua profissão e actividade doméstica mas implicam esforços suplementares e sofrimento físico.
69.A autora efectuou os dispêndios seguintes:
a. 3 certidões da Conservatória do Registo Automóvel, 51,00 €; b. 3 certidões de nascimento e casamento, 20,00 €;
c. 1 certidão da Participação de Acidente de Viação, 75,00 €.
d. em 18 de Julho de 2018, em medicamentos, 30,94 €;
e. em 13 de Dezembro de 2016 e 9 de Julho de 2018, em taxas moderadoras, 28,00 €;
f. Em 2019, em medicamentos, € 29,19;
g. Em 2019, em taxas moderadoras, € 28,00;
h. Em 2019, em fisioterapia, € 360,00;
i. Em 2019, em serviços de enfermagem, € 18,00;
j. Em 2020, em serviços de fisioterapia, € 80,00.
70. Por escrito, titulado pela apólice n.º ……32, a ré aceitou o ressarcimento dos danos causados a terceiros com a circulação do QO.
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Factos não provados

A) Em consequência directa e necessária do embate, a autora sofreu traumatismo da coluna lombar, traumatismo da coluna dorsal, traumatismo da coluna cervical, traumatismo da região torácica, protusão discal da coluna cervical, a nível de C4 e C5, com adormecimento dos dois membros inferiores.
B) Como consequência directa e necessária do embate, resultaram no corpo da autora dores nas regiões do corpo atingidas e ao nível da coluna dorsal e do tórax.
C) A autora obteve uma consulta médica da especialidade de Fisiatria, na Clínica “F.”, em Ponte de Lima.
D) A autora já não consegue carregar e transportar objectos pesados.
E) Os efeitos do rx são causa do aparecimento de doenças do foro oncológico, nas regiões do corpo em que incidem os respectivos feixes (tratamentos com radiação ?!)
F) A autora ficou impossibilitada para a prática de ginástica de manutenção/Ginásio/Tapetes e máquinas.
G) As lesões sofridas e as sequelas delas resultantes determinaram:
a. um período de tempo de doença de seis dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Absoluta Geral – Défice Funcional Temporário Total;
b. um período de tempo de doença de cento e cinquenta e três dias com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Parcial Geral - Défice Funcional Temporário Parcial;
c. Um período de tempo de doença de cento e três dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Profissional Total – Período de Repercussão Temporária na Actividade Profissional Total;
d. Um período de tempo de doença de cinquenta e seis dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Profissional Parcial – Período de Repercussão Temporária na Actividade Profissional Parcial;
e. um “Coeficiente de Dano” de grau 3, numa escala de 0 a 4;
f. uma Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de Lazer de grau 2, numa escala de 0 a 5;
g. uma Incapacidade Parcial Permanente Geral, de 03,00% - 03,00 Pontos (no mínimo) (Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica);
h. uma Incapacidade Parcial Permanente Profissional, para o trabalho, de 03,00% - 03,00 Pontos - (no mínimo)
H) As dores sofridas vão afligir a autora até ao fim da sua vida, afectando-a quando se encontra em repouso, quando se encontra sentada, quando se encontra deitada, quando se encontra de pé, quando caminha, quando sopesa, quando conduz e é transportada em veículos automóveis.
I) O que faz com que tenha necessidade de recorrer à ingestão e toma de medicação analgésica e anti-inflamatória, de modo regular e até ao fim dos seus dias.
J) A autora ficou dependente de ajudas medicamentosas (analgésicos e anti-inflamatórios) e de Tratamento de Medicina Física de Reabilitação (MFR) – Fisiatria -, em sessões, de 6 em 6 meses, ao longo de toda a sua vida.
K) Uma mulher empregada doméstica auferia e aufere, na freguesia de …, concelho de Ponte de Lima, à data do evento, por um período de tempo de oito (08,00) horas por dia, um salário de 08,00 horas x 5,00 €.
L) Em simultâneo, beneficiava e beneficia de, pelo menos, uma refeição principal (almoço) e de um lanche, diários.
M) Na presente data, a autora trabalha, em regime de “part-time”, na Pizaria …, na vila de Ponte de Lima, ao longo de uma média de 4 horas/dias, durante doze (12) dias por mês, com o que aufere um rendimento do seu trabal ho de (5 h/horas x 4 horas x 12 dias) 240,00 €/mês.
N) Ao longo do período de tempo de dois meses, a autora viu-se impossibilitada de exercer a sua referida actividade de doméstica, na sua casa de habitação.
O) Viu-se na necessidade de recorrer aos serviços e trabalhos da sua mãe M. P., a qual, ao longo desse período de tempo de dois meses executou, para a autora, todas as tarefas domésticas e cuidou, ainda, do filho da autora, durante 8 horas/dia.
P) A partir da data do evento, a autora deixou de poder exercer a sua referida profissão de Operária Fabril, bem como, a sua actividade doméstica, como antes era capaz, em consequência das lesões sofridas e das sequelas delas resultantes e da Incapacidade Parcial Permanente, para o trabalho, de 03,00% - 03,00 Pontos (no mínimo) – Défice Funcional Permanente da Integridade Físico Psíquica -, de que ficou a padecer.
Q) A autora passou a necessitar da presença, da ajuda e do auxílio de colegas de trabalho e de profissão e de terceiras pessoas, que a passaram a ajudar e a substituir em tarefas que não pode já executar, ou não pode executar sozinha, quer desempenho da sua profissão de Operária Fabril, quer no desempenho da sua actividade doméstica.
R) Por essa razão, passou a produzir um rendimento do seu trabalho muito inferior àquele que produzia antes do evento, quer no desempenho da sua profissão de Operária Fabril, quer no desempenho da sua actividade doméstica, na sua casa de habitação.
S) A autora vai continuar a necessitar, no futuro, ao longo de toda a sua vida, de contratar terceiras pessoas, que lhe executem as tarefas domésticas mais pesadas e que exijam o dispêndio de maior esforço físico e/ou que a auxiliem na execução de todas essas tarefas, que a Autora não consegue já executar, ou não consegue executar sozinha.
T) Tudo isso, em consequência das lesões sofridas no evento e das sequelas delas resultantes, nomeadamente, ao nível da coluna lombar, dorsal e cervical, do tórax e dos membros superiores.
U) E, ainda, da ajuda e o auxílio de terceiras pessoas, na execução de tarefas mais pesadas e que impliquem o dispêndio de mais intenso esforço físico.
V) Acresce que a Autora não se encontra, ainda, completamente curada, nem clinicamente estabilizada.
W) O seu estado clínico vai agravar-se, tanto no aspecto funcional como situacional.
X) Vai necessitar, ao longo de toda a sua vida, de obter permanentes e periódicas consultas médicas da especialidade de clínica geral, de ortopedia e de fisiatria.
Y) A autora vai ter necessidade de se submeter a intervenções cirúrgicas e a mais sessões de Medicina Física de Reabilitação (MFR) – Fisioterapia -, ao longo de toda a sua vida.
Z) No final, a Incapacidade Parcial Permanente, para o trabalho, Défice Funcional Permanente da Actividade Físico-Psíquica de, pelo menos 03,00 pontos -, de que ficou a padecer, vai ficar ainda mais agravada.
AA)A autora despendeu no relatório médico a quantia de € 410,00 e ainda o montante de € 150,00 em combustível em deslocações em viatura própria.
BB)A lesão descrita no ponto 65. é consequência directa e necessária do embate descrito no ponto 1.
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B – Fundamentação Jurídica

Não se pondo em causa a atribuição da responsabilidade do acidente ao segurado da Ré, importa apurar se os valores fixados pelo Tribunal a quo quanto ao dano biológico e pelos danos não patrimoniais devem ser de montante superior, como pugna a A., ou se estes últimos devem ser reduzidos, como defende a Ré, e bem assim se ocorre qualquer erro no cômputo do valor respeitante ao período de incapacidade temporária devido pelas perdas salariais peticionadas pela A.
Começando pelo dano biológico que a A. pede que seja fixado em valor não inferior a 20.000,00€, em vez dos 4.000,00€, que a Ré foi condenada a pagar-lhe, importa considerar que a sua tutela encontra o seu substrato último, no âmbito do direito civil, no art. 25.º n.º 1 da CRP, que considera inviolável a integridade física das pessoas, e no art. 70,º n,º 1 do CCivil, que protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral, atendendo ao corpo humano, na sua amplitude física e moral, integrando a sua constituição físico-somática, a componente psíquica e as relações fisiológicas, como um bem jurídico protegido perante terceiros.
Daí que “o responsável pelo dano biológico, porque incidente sobre o valor humano, em toda a sua dimensão, em que o bem saúde é objecto de um autónomo direito básico absoluto, deve repará-lo, em qualquer caso, mesmo que se prove que a vítima não desenvolvia qualquer actividade produtora de rendimento” (Ac. do STJ de 23/11/2010, já mencionado, que cita o acórdão do STJ de Itália, n.º 7101, de 6/7/1990, publicado na “Rivista de Giurisprudenza in Tema di Circolazione e Transporto”, 1991, pg. 644; bem como, nesse mesmo sentido, o estudo de José Borges Pinto, intitulado “Notas sobre o Dano Corporal e a Perícia Médico-Legal”, de Fevereiro de 2007, disponível em Compilações Doutrinais, no site da Verbo Jurídico).
Assim, mesmo que a afectação da pessoa do ponto de vista funcional não se traduza em perda efectiva do rendimento do trabalho, releva o designado dano biológico, determinante de consequências negativas a nível da actividade geral do lesado, decorrente da afectação funcional que a incapacidade sempre lhe trará (Ac. STJ de 23.11.2006 disponível em www.dgsi.pt e Ac. STJ de 12.10.2006, Revista n.º2461/06 – 2.ª Secção).
Onde tem surgido alguma divergência é no enquadramento deste dano: enquanto uns o consideram e quantificam como dano autónomo (um «tertium genus»), outros integram-no no dano patrimonial ou no dano não patrimonial, conforme dele decorra ou não perda ou diminuição dos proventos profissionais do lesado (veja-se, a título de exemplo, os Acórdãos do STJ de 23/11/2010 e de 17/05/2011, que defendem a autonomização daquele dano, e o Acórdão de 26/01/2012, que é contra esta autonomização).
Acontece que, na perspetiva dos danos patrimoniais decorrentes da afectação da integridade físico-psíquica, há muito que é quase unânime a jurisprudência no sentido de que “o dano biológico derivado de incapacidade geral permanente, de cariz patrimonial, é susceptível de justificar a indemnização por danos patrimoniais futuros independentemente de o mesmo se repercutir na vertente do respectivo rendimento salarial” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 4.10.2007 – Relator Salvador da Costa; a confirmá-lo, entre muitos outros, Acórdão do mesmo Tribunal de 05.12.2017 – Relatora Ana Paula Boularot) e ainda de que, não sendo imprescindível que o lesado passe a auferir um salário inferior em consequência da incapacidade sofrida, para que o dano biológico seja indemnizado como dano patrimonial é necessário (e bastante) que tal incapacidade, com repercussões no exercício da actividade laboral habitual, nomeadamente por força da necessidade de esforços suplementares ou acrescidos, “constitua uma substancial restrição às possibilidades/oportunidades profissionais à sua disposição, constituindo, assim, fonte actual de futuros lucros cessantes” (Acórdão da Relação do Porto de 27.02.2012).

Nos casos, como o ora em apreço, em que não há diminuição do estatuto remuneratório profissional, há que avaliar, em concreto, da previsibilidade da verificação de uma perda patrimonial futura, quer através da repercussão na carreira, quer, ainda, na perda de capacidade competitiva num mercado de trabalho cada vez mais caracterizado pela precariedade do emprego e pela preterição dos mais fracos.
“Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável - e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, - erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais” (cfr. Acórdão do STJ de 10.10.2012, Relator Lopes do Rego).
Na jurisprudência mais recente do Supremo Tribunal de Justiça, assinala-se que “em caso de não verificação de incapacidade permanente para a profissão habitual, a consideração do dano biológico servirá para cobrir ainda, no decurso do tempo de vida expectável, a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, mesmo fora do quadro da profissão habitual ou para compensar custos de maior onerosidade com o desempenho ou suprimento dessas atividades ou tarefas, assumindo assim uma função complementar.” (Acórdão do STJ de 16.06.2016 – Relator Tomé Gomes).

Ora, no caso concreto, as sequelas apresentadas pela Autora, quantificadas em termos de défice funcional em 2 pontos, que são compatíveis com o exercício da actividade profissional e doméstica habituais, mas implicam esforços suplementares, permitem, de per si, perspetivar perdas patrimoniais próximas ou previsíveis, dado que, sendo a A. funcionária fabril, necessário se torna, tal como se logrou demonstrar, que permaneça, ora na posição de pé, ora na posição sentada, em trabalhos manuais e à máquina, ao longo de oito horas, e ainda que ande de um lado para o outro, no interior das instalações fabris, no transporte de matérias primas e de produto acabado, e, ainda, que rode o tronco e a coluna lombar dorsal e cervical, para a esquerda e para a direita e no sentido antero-posterior, que faça força com os membros superiores, com o tórax e com a coluna lombar, dorsal e cervical, para transportar as matérias primas e os produtos acabados.
Por outro lado, há que ter em conta que o denominado défice funcional permanente (anteriormente designado de incapacidade geral permanente) se destina a medir algo bem mais lato e, por isso, necessariamente, diverso do rebate profissional, pelo que se impõe, necessariamente, que, a par da referida quantificação do défice funcional, se entre em consideração com a conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado a fim de se avaliar a gravidade dos concretos esforços acrescidos e das possíveis perdas patrimoniais daí resultantes.
Como tal, posto isto, importa, agora, fixar o valor indemnizatório, com recurso à equidade (nº 3 do artigo 566.º, do Cód. Civil), por ser o único critério legalmente previsto (STJ 14.12.2016, Relatora – Graça Trigo), sem se descurar nunca que esse recurso à equidade não afasta a exigência de que o julgador – aquando da fixação da indemnização – tenha em consideração as decisões judiciais que fixem indemnizações similares, o que é exigido por uma interpretação e aplicação uniformes do direito (artigo 8º, nº 3, do Código Civil), por “necessidade de observar as exigências do princípio da igualdade” (Acórdão do STJ de 11.12.2012, in dgsi, em que figura como Relatora - Isabel Pais Martins).
Nessa medida é de ponderar, no âmbito desse juízo equitativo, aos seguintes factores: a idade do lesado; o seu grau de incapacidade geral permanente; as suas potencialidades de aumento de ganho - antes da lesão -, tanto na profissão habitual, como em profissão ou actividade económica alternativas, aferidas, em regra, pelas suas qualificações; a conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado, assim como de actividades profissionais ou económicas alternativas (tendo em conta as competências do lesado)” (cfr. Acórdãos do STJ de 07.04.2016 e de 16.03.2017 – Relatora Graça Trigo).
No âmbito do aludido esforço para satisfazer as referidas exigências do princípio da igualdade – que pressupõe tratar como igual o que é igual e como desigual o que é desigual –, defende-se no Acórdão da Relação de Lisboa de 22.11.2016 (Relator - Pires de Sousa) que, nas situações “em que não ocorre uma perda efectiva de ganho mas o lesado tem de fazer um maior esforço para obter o mesmo rendimento, cremos que - no cálculo da indemnização - não deve ser relevado o vencimento anual do lesado. Na verdade, a integridade psicofísica é igual para todos (Artigos 25º, nº1, da Constituição e 70º, nº1, do Código Civil) de modo que, no cálculo da indemnização, não deve ser relevada a situação económica do lesado sob pena de violação do princípio da igualdade consagrado no Artigo 13º, nº1 e nº2 da Constituição”.
No mesmo sentido, pode ler-se no Acórdão do STJ de 06.12.2017 (Relator Tomé Gomes): “Neste tipo de situações, a indemnização reparatória não deve ser calculada com base no rendimento anual do lesado auferido no âmbito da sua atividade profissional habitual, já que o sobredito défice funcional genérico não implica incapacidade parcial permanente para o exercício dessa atividade, envolvendo apenas esforços suplementares nesse exercício”; “Em tais casos, a solução seguida pela jurisprudência do STJ é a de fixar um montante indemnizatório por via da equidade, ao abrigo do disposto no artigo 566.º, n.º 3, do CC, em função das circunstâncias concretas de cada caso, segundo os padrões que têm vindo a ser delineados, atentos os graus de gravidade das lesões sofridas e do seu impacto na capacidade económica do lesado, considerando a expetativa de vida ativa não confinada à idade-limite para a reforma”.
Há ainda que ter presente que, como se lê em recente Acórdão do STJ (de 19.04.2018 – Relator António Joaquim Piçarra): “o recebimento de uma só vez do montante indemnizatório não releva actualmente como em tempos não muito recuados já relevou, tendo em conta que a taxa de juro remuneratório dos depósitos pago pelas entidades bancárias é muito reduzido (cerca de 0,5%), o que implica, por si só, a elevação do capital necessário para garantir o mesmo nível de rendimento”.
Por último, constitui entendimento jurisprudencial reiterado que a indemnização a arbitrar por tais danos futuros deve partir da esperança média de vida (e não apenas da duração da vida profissional activa do lesado, até este atingir a idade normal da reforma, aos 65 anos), já que, como é evidente, “a perda de capacidade geral de ganho tem repercussões negativas ao longo de toda a vida do lesado. Quer porque, prejudicando a sua carreira contributiva, vem a reduzir, ou até a excluir, a pensão de reforma, quer porque sempre condicionará a possibilidade de obtenção de ganhos no exercício de actividades económicas alternativas (isto é, não estritamente profissionais) a realizar para além da idade da reforma” (STJ 01.03.2018, Relatora – Graça Trigo).
Assim, no caso concreto, importa ponderar que a lesada passou a padecer de um défice funcional de 2 pontos – que não só a acfetarão no desempenho da sua actividade profissional como no de múltiplas actividades potencialmente geradoras de lucros que ao longo da sua vida poderá vir a realizar –, consubstanciado nas sequelas já apontadas.
Adicionalmente é de sopesar que o referido Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 2 pontos é compatível com exercício das actividades habituais, mas implica esforços suplementares, importando, pela profissão que exerce e trabalhos domésticos que realiza uma componente física inegável, bem se compreendendo, pois, que as referidas sequelas de que ficou a padecer tenham uma repercussão significativa nas funções que exerce, e, bem assim, que a Autora tinha 27 anos, à data da consolidação das lesões.
Em conjugação, por outro lado, importa considerar, não apenas o tempo de vida activa, mas a esperança média de vida das mulheres, que nesta altura, é de cerca de 83 anos para as mulheres, bem como o facto de, face aos juros bancários actualmente praticados, a antecipação dos rendimentos não aportar hoje em dia as vantagens que noutras épocas justificavam a redução do quantitativo necessário à reparação deste dano.
Relativamente às indemnizações que têm sido fixados a título de dano biológico decorrentes de défices funcionais permanentes da integridade físico-psíquica de baixo índice, apontam-se como exemplo os seguintes casos, todos disponíveis no site da dgsi:
- Incapacidade de 3 pontos, compatível com a actividade habitual, embora implicando esforços suplementares para o exercício da actividade profissional à data do embate, mas não já para o exercício da actual actividade, 19 anos de idade, indemnização de € 8 500,00 (Acórdão de 20-12-2017, Revista n.º 871/12.8TBPTL.G1.S1- 1.ª Secção, Roque Nogueira (Relator) Alexandre Reis Pedro Lima Gonçalves;
- Incapacidade de 2 pontos, 15 anos de idade, indemnização de € 6 000,00 (Acórdão de 16-03-2017 - Revista n.º 294/07.0TBPCV.C1.S1 - 2.ª Secção - Maria da Graça Trigo (Relatora), Bettencourt de Faria e João Bernardo;
- Incapacidade de 5 pontos, compatível com o exercício da actividade profissional, 32 anos de idade, indemnização de € 10.000,00 (Acórdão de 02-06-2016, Revista n.º 959/11.2TBSJM.P1.S1 - 7.ª Secção, António Joaquim Piçarra (Relator) *, Fernanda Isabel Pereira, Olindo Geraldes;
- Incapacidade de 2 pontos, compatível com actividade profissional, embora com limitações, 25 anos de idade, indemnização de € 11.000,00 (Acórdão de 02-06-2016, Revista n.º 6244/13.8TBVNG.P1.S1 - 2.ª Secção, Álvaro Rodrigues (Relator), Bettencourt de Faria, João Bernardo;
- Incapacidade de 3 pontos, compatível com actividade habitual, com esforços suplementares, 42 anos de idade, indemnização de € 15.000,00 (Acórdão de 07-04-2016 - Revista n.º 121/12.7T2AND.P1.S1 - 2.ª Secção, Oliveira Vasconcelos (Relator), Fernando Bento e Távora Victor;
- Incapacidade de 4 pontos, implicando esforços suplementares numa actividade normal, 10 anos de idade, indemnização de € 12.500,00 (Acórdão de 11-02-2015, Revista n.º 3329/09.9TBVLG.P1.S1 - 1.ª Secção, Martins de Sousa (Relator), Gabriel Catarino, Maria Clara Sottomayor.
Assim, tudo ponderado, de acordo com um critério de razoabilidade e equilíbrio, julgamos ajustada a indemnização de € 7.500,00 para compensar o dano biológico.
Já, relativamente aos danos não patrimoniais, é orientação da jurisprudência que tal compensação não pode ser simbólica nem miserabilista, devendo, antes, ser significativa, mas não exorbitante nem excessiva.
Trata-se, pois, como é sabido, de prejuízos insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens que não integram o património do lesado, que apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta, então, uma satisfação mais do que uma indemnização, sem cunho ou feição reparatória, antes meramente compensatória (atribuição de uma soma em dinheiro com vista a proporcionar ao lesado ou seus familiares satisfações que de alguma maneira os façam esquecer a dor ou o desgosto provenientes do acto ilícito que sofreram).
Entre os danos merecedores da tutela do direito inclui-se necessariamente o dano corporal em sentido restrito, caracterizado como o prejuízo de natureza não patrimonial que recai na esfera do próprio corpo, dano à integridade física e psíquica: as dores físicas, ‘o pretium ou quantum doloris’ possíveis de verificar através da extensão e gravidade das lesões e complexidade do seu tratamento clínico; e morais, traduzidas pelas aflições, desgostos, angústias e inquietações.
Contudo, a natureza destes danos impõe que, a seu respeito, não se fale de indemnização, mas apenas de compensação, através da qual se proporcionará ao lesado meios que lhe permitam usufruir momentos de prazer e alegria que, tanto quanto possível, contrabalancem o dano sofrido, tal como se referiu já.
Segundo Prof. Mota Pinto, in “Teoria Geral do Direito Civil”, pág. 86, sempre que se trate de compensar a dor física ou a angústia moral, sofrida pelo lesado, atender-se-á ao critério pelo qual a quantia em dinheiro há-de permitir alcançar situações ou momentos de prazer bastantes para neutralizar, na medida do possível, a intensidade dessa respectiva dor, sem descurar que a obrigação de ressarcir os danos morais tem mais uma natureza compensatória do que indemnizatória.
Ora, na quantificação dos danos não patrimoniais, há que ter sempre em atenção as semelhanças e dissemelhanças das situações factuais de cada caso, na medida em que são geralmente tais elementos que fundamentam as discrepâncias registadas, tendo em conta que a diferença dos factores a ter em consideração varia muito de um caso para o outro.
Importa, por outro lado, ter sempre presente também que, quando se trata de formular juízos equitativos, há sempre uma margem de discricionariedade, apesar da preocupação de observância do princípio da igualdade e da uniformização de critérios.
Contudo, como tem decidido pacificamente a nossa Jurisprudência, «não devendo confundir-se a equidade com a pura arbitrariedade ou com a total entrega da solução a critérios assentes em puro subjectivismo do julgador, deve a mesma traduzir a “justiça do caso concreto, flexível, humana, independente de critérios normativos fixados na lei”, devendo o julgador ter em conta as regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida» (Acs. do STJ de 10-02-2008 in CJ/STJ, t. 1, pg. 65 e de 23.10. 2008 (Relator, Cons. Serra Baptista, P.º 08B2318 in www.dgsi.pt).
Ora, tendo em conta os contornos do caso concreto em conformidade com o supra evidenciado, os critérios legais e mesmo jurisprudenciais a ter também em consideração em casos análogos (como disso é exemplo o recente Acórdão do TRG de 27/05/2021 com o n° processo 5911/18.4T8BRG.G1), julgamos ser de manter a indemnização arbitrada.
Por último, em recurso subordinado considera ainda a Ré/recorrente que o valor devido a título de perdas salariais deveria ser reduzido à quantia de 162,51€, tendo em conta ter a A. recebido da segurança social o valor de 84,21€.
Ora, na sentença considerou-se que desenvolvendo a sua profissão apenas aos fins-de-semana, concretamente no fim-de-semana de 5/6 e 12/13 de Novembro de 2016, e auferindo, a título de retribuição mensal, cerca de € 650,00, deixou de auferir a quantia de, pelo menos, € 325,00, pelo que tendo recebido € 84,21, a título de subsídio de doença, deixou de ganhar a quantia de € 240,79.
Tal raciocínio é, pois, o correcto e não aquele que a Ré segue por não se ter logrado provar ter sido outro o valor que a sua entidade patronal não lhe pagou naqueles dois fins-de-semana
Nestes termos, procede apenas parcialmente o recurso interposto pela A. e improcede totalmente o recurso subordinado interposto pela Ré.
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V. Dispositivo

Nos termos e pelos fundamentos expostos, os juízes da 2.ª secção cível, deste Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar o recurso interposto pela A. parcialmente procedente, fixando em 7.500,00€ o valor devido a título de dano biológico, revogando, consequentemente, nessa parte, a decisão proferida que, no mais se mantem.
Custas pela A. e pela R. na proporção do respectivo decaimento, quanto ao recurso principal, e pela Ré, quanto ao recurso subordinado.
Registe e notifique.
Guimarães, 11.11.2021
(O presente acórdão foi elaborado em processador de texto pela primeira signatária sem observância do novo acordo ortográfico, a não ser nas transcrições que a ele tenham atendido, e é por todos assinado electronicamente)

Maria dos Anjos S. Melo Nogueira
Desembargador José Carlos Dias Cravo
Desembargador António Manuel Antunes Figueiredo de Almeida