Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
162/17.8T8VPC.G1
Relator: JOAQUIM BOAVIDA
Descritores: OCUPAÇÃO DE IMÓVEL
DETENÇÃO SEM OPOSIÇÃO
DANO DA PRIVAÇÃO DO USO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/31/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIAL PROCEDÊNCIA
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- Se o autor, enquanto proprietário e até à data da propositura da acção, não se opôs à detenção do imóvel por parte da ré e nunca antes diligenciou no sentido de usufruir das utilidades da coisa, a simples ocupação não gera obrigação de indemnização por não ter causado um dano patrimonial.

II- Ao propor a acção de reivindicação o autor demonstrou inequivocamente a sua vontade de pôr fim à ocupação ilegítima que a ré vinha fazendo do imóvel e evidenciou que pretendia usufruir das respectivas utilidades.

III- Tendo sido judicialmente interpelada e continuando a deter o imóvel, a ré impede o autor de lhe dar utilização.

IV- Demonstrando-se que «o valor de mercado da renda para a ocupação da fracção» ronda os € 300,00 mensais, isso significa que o Autor consegue arrendá-la por esse valor, pelo que a privação daquele bem, impedindo-o de aproveitar as respectivas utilidades, gera um dano indemnizável.

V- A obrigação de entrega de uma fracção autónoma tem natureza fungível, pois não requer a intervenção insubstituível da devedora e pode ser realizada por terceiros, pelo que não é aplicável o disposto no artigo 829º-A, nº 1, do Código Civil e, assim, não há fundamento legal para a fixação da sanção pecuniária compulsória.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – RELATÓRIO

1.1. H. R. intentou contra Materiais de Construção X, Lda., acção declarativa, sob a forma de processo comum, pedindo a condenação desta a:

a) Proceder à entrega imediata da fracção autónoma compropriedade do Autor por si ocupada e melhor identificada no artigo [rectius, no artigo 2º - fracção autónoma designada pela letra “H” do prédio sito na Quinta ..., freguesia e concelho de ..., inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ..., e descrita na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº .../19940831-H (1)] da petição inicial, totalmente livre e desembaraçada e em boas condições de utilização.
b) Indemnizar o Autor e a sua consorte pela ocupação da mesma, à razão de € 500,00/mês, que nesta data se liquida em quantia não inferior a € 20.000,00, cabendo até 31.06.2017, decorrentes do uso e fruição da fracção autónoma por ela ilegalmente ocupada, cabendo ao Autor uma indemnização não inferior a € 10 000,00;
c) Pagar o valor indemnizatório, decorrente da mesma causa, calculado a partir de 01.07.2017, à mesma razão de € 500,00/mês, apenas a favor do Autor em virtude de ter passado a ser o exclusivo proprietário da fracção autónoma ocupada pela Ré;
d) Pagar uma sanção pecuniária compulsória não inferior a € 500,00 por cada mês de atraso na entrega da fracção autónoma ao Autor.
Mais requereu a intervenção principal provocada, como autora nos presentes autos, da sua consorte e comproprietária da mesma fracção autónoma, A. S..
Para fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese, que juntamente com a sua sobrinha A. S. é dono em comum e na proporção de ½ para cada um, das fracções autónomas designadas pelas letras “H” e “D”, destinadas a comércio e garagem, respectivamente, do prédio urbano sito Quinta ..., freguesia e concelho de ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ....
Sucede que a Ré, pelo menos desde 01.02.2014, vem ocupando a fracção H e nele tem instalado um comércio de drogaria e materiais de construção, sem a autorização do Autor e sem qualquer título para o efeito.
Com tal ocupação a Ré causa ao Autor prejuízo não inferior a € 500,00 mensais, rendimento que obteria caso arrendasse a referida fracção.
A partir de 31.07.2017 a fracção pertence em exclusivo ao Autor.
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A Ré contestou e requereu a intervenção principal provocada de A. J., confirmando que ocupa a fracção, mas alegando que em 30.01.2014 celebrou com o dito A. J., que sempre considerou como proprietário daquela fracção, um contrato de arrendamento para comércio, tendo como objecto aquela fracção urbana, pelo valor de € 300,00 mensais.
Em Fevereiro de 2016, contactou o Autor e predispôs-se a pagar-lhe metade da renda, mediante a celebração de um contrato de arrendamento, o que este não aceitou.
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Foi deferida a intervenção principal provocada de A. S. e de A. J..
Citados os Chamados, apenas A. J. interveio nos autos, invocando a caducidade do direito do Autor por via do disposto no artigo 1282º do Código Civil e alegando que adquiriu as fracções referidas pelo Autor a J. N. e mulher, A. L., por escritura pública de compra e venda outorgada no Cartório Notarial de ..., em 01.10.1996. Em virtude de dificuldades económicas, o Chamado transmitiu tais fracções ao Autor e à Chamada A. S..
Sucede que o Autor nunca tomou posse de tais fracções, por se tratar de negócio fictício, sendo que o Chamado sempre continuou a utilizá-las como se tratando do seu proprietário.
Alega ainda que o Autor sempre disso teve conhecimento, pelo que ao vir agora exigir a sua restituição actua em abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium.
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Notificado da contestação do Chamado, o Autor peticionou a condenação do interveniente A. J. como litigante de má-fé.
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1.2. Foi proferido despacho-saneador, definido o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

Realizada a audiência de julgamento, proferiu-se sentença a julgar a acção parcialmente procedente e a decidir:

«- Condenar a Ré Materiais de Construção X, Lda. a proceder à entrega imediata e livre de pessoas e bens ao Autor da fracção autónoma designada pela letra “H”, destinada a comércio, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, Loja nº 2, composta por sala ampla, com entrada pela avenida de expansão urbana, e terraço, com a área de 116,50m2, valor patrimonial de €33.966,93, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Quinta ..., freguesia e concelho de ..., encontra-se inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ..., descrita na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº .../19940831-H e inscrita pela Ap. 2830 de 04/12/2017 a favor do Autor.
- No mais, absolver a Ré Materiais de Construção X, Lda. dos pedidos formulados pelo Autor.
- Absolver integralmente o interveniente A. J. dos pedidos formulados pelo Autor, incluindo o de condenação deste como litigante de má-fé».
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1.3. Inconformado, o Autor interpôs recurso de apelação da sentença e formulou, a terminar as suas alegações, as seguintes conclusões:

«a) ALTERAÇÃO DA MATERIA DE FACTO PROVADA E NÃO PROVADA

1. Face ao que se julga demonstrado na primeira parte destas alegações, salvo sempre melhor entendimento, a decisão recorrida não esteve bem no julgamento e apuramento dos factos provados, devendo, por isso, ser alterada a factualidade dada por provada na douta decisão recorrida.
2. Assim, conforme à prova produzida, quer por confissão da ré nos artº 14º, 15º, 16º, 28º da contestação, quer pelas suas declarações de parte prestadas pelo sócio-gerente O. B., pelas testemunhas A. F., O. E. e C. F. (registos áudio parcialmente transcritos, nos termos acima considerados), deve considerar-se provado:
3. Que o autor algum tempo depois de a ré, em 1 e Fevereiro de 2014, ter ocupado a sua fracção autónoma e de nele ter começado a explorar o seu negócio de drogaria e de materiais de construção, a contactou a reclamar de tal ocupação e a informou que o interveniente A. J. não era dono da mesma, nem tinha poderes para a arrendar, tendo, na mesma altura, pedido para ela lhe pagar a renda a ele.
4. Deve, também ser julgado provado: que a ré, na sequência do contacto do autor mencionado na conclusão precedente, se apercebeu da “embrulhada” em que estava metida, tendo contactado o seu advogado para resolver o problema ficando, em meados de Dezembro de 2014, conhecedora do problema e dos seus contornos, incluindo da existência de um litigio judicial entre o interveniente A. J. e o autor objecto do Procº nº 742/12.9 TBVLP).
5. O que resulta demonstrado face à prova produzida, quer por confissão da ré nos artº 14º, 15º, 16º, 28º da contestação, quer pelas suas declarações de parte prestadas pelo sócio-gerente O. B., pelas testemunhas A. F., O. E. e C. F. (registos áudio parcialmente transcritos acima nos termos aí referidos)
6. Deve, ainda, ser julgado provado: que a renda ou valor locativo da fracção autónoma do autor abusivamente ocupada pela ré, no período compreendido entre o início do ano de 2014 e até à presente data é de valor não inferior a 400,00 €.
7. O que resulta comprovado pelas declarações de parte prestadas pelo autor, e pelo depoimento das testemunhas A. F., O. E. e C. F. (registos áudio parcialmente transcritos acima nos termos aí aludidos).

b) APLICAÇÃO DO DIREITO AOS FACTOS

8. Face ao alegado, considerando toda a factualidade já dada por provada na douta decisão recorrida, á qual deve acrescer a que se refere nas conclusões precedentes, entendemos que se verificam comprovados todos os pressupostos de facto e de direito para considerar que a ocupação da fracção autónoma do autor pela ré é ilegal e abusiva por se fundar num contrato de arrendamento ilegal, inválido e ineficaz para legitimar tal ocupação por ser celebrado com quem não era seu proprietário e carecia de poderes para dele dispor legitimamente, o que esta deveria ter cuidado de averiguar antes de celebrar tal contrato com o interveniente A. J..
9. Sendo tal ocupação, também, abusiva e de má fé, porque a ré foi contactada pelo autor, algum tempo após ela ter ocupado a fracção e lhe informou que o A. J. não era o seu dono e que o arrendamento acordado com ele era ilegal,
10. Pedindo-lhe, ainda, que lhe pagasse a renda a ele que era dono, e não àquele que não era dono, nem tinha poderes para a arrendar, tendo a ré, mesmo depois de meados de Dezembro de 2014, quando já conhecia todos os contornos do problema, continuado com essa ocupação ilegal e a pagar a renda ao referido A. J., o que sucedeu até Julho de 2017, já depois da citação para os termos da presente acção.
11. No caso em apreço, não procede a conclusão de que o autor se não interessou em defender o seu direito de propriedade sobre a fracção em causa e em dela fazer uso ou dela retirar o respectivo aproveitamento e benefícios.
12. Ao contrário do que consta da douta sentença recorrida, apesar de o autor residir em …, no Algarve, logo que soube da ocupação contactou a ré para informar da situação ilegal em que se encontrava e para lhe pagar a renda a ele e não a A. J. que não era dono, nem tinha poderes para a arrendar a fracção, tendo a ré, ficado ciente de toda esta “embrulhada” em meados de Dezembro de 2014.
13. Mesmo depois dessa altura, o autor não deixou de preocupar e de se envolver na defesa do seu direito de propriedade. Além de o tentar fazer por via extrajudicial e por intermédio dos advogados de ambas as partes (registo áudio acima transcrito), e continuou a contactar a ré para solucionar o problema sempre que se deslocava a ..., nomeadamente por causa do referido litígio judicial com o dito A. J. (procº nº 442/12.9TBVLP), que só ficou concluído em 2016 e por causa da acção especial de divisão da compropriedade da fracção autónoma movida à sua consorte e chamada A. S., concluída em Maio de 2017, com a sua aquisição da parte dela, reunindo a totalidade o direito de propriedade sobre a dita fracção (nº 6, dos factos provados na douta sentença).
14. Portanto, nesta parte, afigura-se pouco ponderada e avisada a conclusão de que uma das razões para a não atribuição da peticionada indemnização, resulta da conformação e da falta de interesse revelados pelo autor em defender a sua propriedade, evidenciando uma “actuação”, na douta decisão recorrida considerada “negligente”, “pelo que teria de concluir-se que constitui um abuso da sua posição para vir apenas nesta fase exigir uma indemnização apenas nesta fase exigir uma indemnização pela ocupação do imóvel.”
15. Indemnização essa, que deve levar em consideração a demonstração de que o valor locativo da fracção ocupada pela ré desde 1 de Fevereiro de 2014, face á prova produzida em julgamento, nos termos questionados neste recurso, deve ser considerado - também com apelo às regras da experiência comum e a juízos de equidade - de valor não inferior a 400,00 € mensais, por isso, superior aos €300,00 mensais fixados no nº 4, dos factos provados na douta sentença recorrida.
16. Face ao antes afirmado, salvo sempre o devido respeito por diversa e melhor opinião, a Mtª Juiz do Tribunal a quo não esteve bem na posição que adoptou, ao não condenar a ré a indemnizar o autor, pois, em casos idênticos ao aqui em apreço, a posição doutrinária e jurisprudencial firmada ao longo de dezenas de anos, corresponde ao que ficou sintetizado no sumário do acórdão do STJ 683/2003 relatado pelo Conselheiro Abrantes Geraldes: A privação do uso de um bem decorrente de ocupação ilícita importa, em regra, na existência de um dano de que o lesado deve ser compensado. Ainda que não se tenha provado que durante o período de privação o proprietário teria arrendado o imóvel por uma determinada quantia, não está afastado o seu direito de indemnização que considere o valor locativo do imóvel e, se necessário, pondere as regras da equidade.”
17. Como se demonstrou a ré não tem qualquer direito que lhe permitisse a ocupação do imóvel. Parafraseando a acima citada jurisprudência: “No entanto, nas situações em que tal vínculo existe, ou seja, exista um contrato de arrendamento válido entre proprietário e ocupante, uma vez findo o contrato, por qualquer causa, o locatário é legalmente obrigado a pagar ao locador uma indemnização à forfait, nos termos do art. 1045°, do C.C., em medida correspondente à renda convencionada, a qual é elevada ao dobro em caso de mora, tratando-se de uma obrigação de génese legal que nem sequer está dependente da prova da existência de uma utilização lucrativa que o proprietário daria ao locado, bastando a falta de cumprimento oportuno da obrigação de restituição do bem. Assim, e por maioria de razão, se o ordenamento jurídico protege as situações anteriormente descritas, não se encontra motivo algum para uma diferenciação de tratamento que acabasse por beneficiar terceiros alheios ao contrato de arrendamento, apesar de a sua actuação provocar na esfera jurídica [o] proprietári[o] os mesmos reflexos que, face ao disposto no art. 1045°, do C.C., justificam a indemnização à forfait, por isso, não pode deixar de se reconhecer [ao Apelante] o direito de indemnização peticionado.(...)”
18. Assim sendo, salvo sempre o devido respeito por melhor opinião deve ser revogada a douta decisão recorrida e ser a ré condenada a indemnizar pelos prejuízos da ocupação ilegal da fracção autónoma aqui em apreço para a exploração comercial como loja de drogaria e de materiais de construção retirando todos os benefícios e lucros de tal ocupação e privando o autor de o poder fazer.
19. Indemnização que, tendo em consideração o antes afirmado, deve ser calculada à razão do valor locativo da fracção autónoma em apreço de valor não inferior a 400,00 € mensais, e contada desde de 1 de Fevereiro de 2014 até à sua efectiva desocupação e entrega ao autor totalmente livre e desembaraçada A qual, na presente data, se líquida em 15 200,00€, sendo nos primeiros 38 meses calculada à razão de 200,00€ até ao mês de Maio de 2017, por, até essa data, o autor só ser proprietário de ½ da fracção, e, entre Maio de 2017 e a data da sua efectiva entrega, pelo seu valor total de 400,00€/mês.
20. Ou, caso assim se não entenda, o que só por mera hipótese se concebe, deve a ré, pelas mesmas razões, ser condenada a indemnizar o autor tendo em consideração que o valor locativo da fracção desde 1 de Fevereiro de 2014, data do início da sua ilegal e abusiva ocupação e até à presente data, é – como considerado provado em 1ª instância - de valor não inferior 300,00 € por mês, liquidando-se, nesta data, a quantia de 11 400,00 € (38 meses x 150,00 € =5 700,00€) + (19 meses x 300,00 € = 5 700,00€)
21. Ao que deve acrescer, ainda, juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, calculados sobre o valor locativo mensal apurado, relativo a cada mês em que a aludida ocupação ilegal se vem mantendo.
22. Nesta parte, sempre se dirá, que querendo, sempre a ré poderá exigir ao interveniente A. J. tudo quanto ele dela recebeu indevidamente além de dever de a ter de ressarcir pelos danos que lhe causou por, fraudulentamente e de má fé, se arrogar dono de uma fracção que lhe não pertencia e a levar a outorgar um contrato de arrendamento para o qual não dispunha de poderes ou legitimidade.
23. Deve, ainda, ser a ré condenada em sanção compulsória em valor equivalente ao do valor locativo da fracção por si ilegalmente ocupada, contando pelo menos, a partir da data da sua citação para os termos da presente acção.
Efectivamente, se antes já sabia ser seu dever, depois da citação bem sabia que estava a causar custos acrescidos ao autor, quer com a manutenção da sua ocupação ilegal e de má-fé, quer com os custos acrescidos inerentes à necessidade de o autor ter de recorrer aos meios judiciais para defender o seu direito de propriedade demandando a desocupação da fracção e a indemnização pelos prejuízos sofridos.
24. Finalmente, pelas razões invocadas na acção e acima aludidas o interveniente A. J. deve ser condenado como litigante de má-fé pois, ao invés de reconhecer a ilegalidade do seu procedimento, ainda faltou à verdade e veio tentar manipular o tribunal invocando factos e argumentos que sabia não terem cabimento na presente acção - a maior parte deles por sentença e acórdão transitado em julgado no Procº nº 442/12.9TBVLP - sabendo que na origem do litígio subjacente está o seu comportamento fraudulento e de má-fé na invocação de uma qualidade de proprietário que não era e na celebração de um contrato de arrendamento para que não tinha nem legitimidade nem poderes legais para o fazer.
25. Deste modo, contando com o douto suprimento deste venerando Tribunal da Relação, estamos certos, será feita Justiça!».
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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O Recorrente, por requerimento de 17.06.2019 (referência 32742810), veio «desistir do Recurso de Apelação que interpôs e foi admitido contra o interveniente A. J. concluindo pela sua condenação como litigante de má fé, extinguindo-se, nesta parte, a instância».
Atenta a desistência parcial do recurso, foi julgada extinta a instância do presente recurso na parte em que se apreciava a absolvição do «interveniente A. J. dos pedidos formulados pelo Autor, incluindo o de condenação deste como litigante de má-fé», prosseguindo o recurso para a apreciação dos demais fundamentos relativamente à Ré.
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Foram colhidos os vistos legais.
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1.4. QUESTÕES A DECIDIR

Em conformidade com o disposto nos artigos 635º, nºs 2 a 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso. Por outro lado, os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, não podendo o tribunal ad quem analisar questões que não foram anteriormente colocadas pelas partes ao tribunal a quo. Em matéria de qualificação jurídica dos factos a Relação não está limitada pela iniciativa das partes - artigo 5º, nº 3, do CPC.

Neste enquadramento, são questões a decidir:

i) Erro no julgamento da matéria de facto;
ii) Se o Autor tem direito a uma indemnização pela ocupação que a Ré faz, desde 01.02.2014, da fracção autónoma de que aquele é dono;
iii) Se a Ré deve ser condenada no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de € 500,00 por cada mês de atraso na entrega da fracção autónoma ao Autor.
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II – FUNDAMENTOS

2.1. Fundamentos de facto

A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos:

1. A fracção autónoma designada pela letra “D”, destinada a garagem, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Quinta ..., freguesia e concelho de ..., encontra-se inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ..., descrita na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº .../19940831-D e inscrita pela Ap. 2830 de 04/12/2017 a favor do Autor.
2. A fracção autónoma designada pela letra “H”, destinada a comércio, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, Loja nº 2, composta por sala ampla, com entrada pela avenida de expansão urbana, e terraço, com a área de 116,50 m2, valor patrimonial de € 33.966,93, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Quinta ..., freguesia e concelho de ..., encontra-se inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ..., descrita na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº .../19940831-H e inscrita pela Ap. 2830 de 04/12/2017 a favor do Autor.
3. A Ré ocupa a fracção autónoma referida em 2 desde 1 de Fevereiro de 2014 e nele tem instalado um comércio de drogaria e materiais de construção.
4. O valor de mercado da renda para a ocupação da fracção referida em 2 ronda os € 300,00 mensais.
5. O Autor teve conhecimento da ocupação referida em 3 por parte da Ré desde tal data.
6. O Autor adquiriu a totalidade das fracções autónomas referidas em 1 e 2 por sentença judicial proferida a 30/05/2017 no âmbito do processo de divisão de coisa comum que correu termos sob o nº 266/16.4TVPC do Juízo de Competência Genérica de ....
7. A 30 de Janeiro de 2014 a Ré e o interveniente A. J. subscreveram o documento designado “Contrato de arrendamento para Comércio”, constante de fls. 19-20 dos autos e que aqui se dá por reproduzido, tendo como objecto a fracção referida em 2.
8. O interveniente A. J. sempre se arrogou dono da fracção, tendo consigo as chaves da mesma e tendo antes da celebração do contrato de arrendamento mostrado à Ré o imóvel.
9. A Ré sempre considerou aquele A. J. o legítimo proprietário do imóvel arrendado.
10. Posteriormente, a Ré teve conhecimento de que o interveniente A. J. tinha um litígio judicial com o aqui Autor, que corria termos sob o n.º 442/12.9TBVLP neste tribunal.
11. Nele se discutindo a validade de uma escritura de compra e venda incidente sobre a fracção referida em 2 e celebrada entre o A. J. e o ora Autor.
12. A Ré pagou a renda ao interveniente A. J. no montante de € 300,00 de Fevereiro de 2014 a Julho de 2016.
13. A partir de Agosto de 2016 e até Junho de 2017 a Ré passou a pagar apenas metade da renda ao interveniente A. J., no montante de € 150,00.
14. Desde Julho de 2017 que a Ré não paga qualquer valor pela ocupação da fracção referida em 2.
15. A Ré está na disposição de pagar ao Autor a partir de Março de 2016 a quantia de € 150,00 mensais.
16. O interveniente A. J. adquiriu as fracções referidas em 1 e 2 a J. N. e mulher, A. L., por escritura pública de compra e venda outorgada no Cartório Notarial de ..., em 1 de Outubro de 1996.
17. A 30 de Março de 1998 o interveniente A. J. contraiu um empréstimo junto do BANCO ..., no valor de 5.000.000$00 (25.000,00 €), tendo então subscrito uma livrança desse montante e com vencimento em 30 de Maio de 1998.
18. O interveniente A. J. subscreveu uma outra livrança no valor de 3.333.605$00 (16.627,95 €), que se comprometeu pagar ao mesmo banco até 7 de Abril de 1998.
19. No dia 2 de Abril de 1998, no Cartório Notarial de ..., foi outorgada a escritura de compra e venda de ½ indivisa das referidas fracções autónomas designadas pelas letras “D” e “H”, nela figurando como vendedor o interveniente A. J. e como comprador o Autor, à data casado com a O. E., pelo preço global de 3.000.000$00 (14.963,94 €).
20. A ½ da fracção “D” tinha um valor real de 3.000,00 € e a ½ da fracção “H” o valor real de 24.250,00 €.
21. O Autor sabe que o interveniente A. J. continuou a utilizar as fracções referidas em 1 e 2 de acordo com a sua vontade, afectando-as e destinando-as como muito bem entendeu, procedendo ao pagamento das respectivas contribuições perante o Estado e suportando todas as outras despesas associadas à conservação, manutenção e fruição das ditas fracções.
22. O interveniente A. J. continuou a constar na Repartição de Finanças de ... como sendo o proprietário das fracções.
23. O interveniente A. J. e a sociedade A. M., Unipessoal, Lda., subscreveram o documento designado “Contrato de arrendamento para comércio”, constante de fls. 70-v-72 dos autos e que aqui se dá por reproduzido, datado de 6 de Novembro de 2010, tendo como objecto as fracções referidas em 1 e 2.
24. O Autor tinha conhecimento dos factos referidos em 7 e 23.
25. O interveniente A. J. actuou perante a Ré sociedade como proprietário da fracção “H” referida em 1, à vista de todos, de forma pública e sem a oposição de quem quer que seja.
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Factos não provados:

O Tribunal a quo considerou não provados os seguintes factos:

A. Se o Autor procedesse à exploração da fracção referida em 2 em qualquer negócio, nomeadamente de stand de automóveis, restauração, drogaria, materiais de construção, obteria como contrapartida uma quantia de € 500,00 mensais.
B. A Ré pagou ao interveniente A. J. a quantia de € 300,00 até Fevereiro de 2016, data em que teve conhecimento de que a decisão proferida naqueles autos n.º 442/12.9TBVLP tinha transitado em julgado, absolvendo o aqui autor do pedido de nulidade da escritura de compra e venda de 1/2 do prédio dos autos, celebrada com o A. J..
C. Após o trânsito daquela acção, em Fevereiro de 2016, contactou o autor e predispôs-se a pagar-lhe metade da renda, mediante a celebração de um contrato de arrendamento, o que este não aceitou.
D. Como não estava em condições de honrar nenhum desses compromissos com o Banco ..., passou a haver o risco penhora do respectivo património.
E. Sendo as fracções em apreço o único património que o réu dispunha susceptível de garantir o cumprimento das obrigações assumidas perante esse banco.
F. As suas dificuldades económicas eram do conhecimento de um amigo muito próximo e com quem desabafava, que acabou por aconselhá-lo a transferir esse património para terceiros.
G. Equacionada esta hipótese, logo se pôs a questão de saber para quem haveriam de fazer a transferência de propriedade dessas fracções.
H. A transferência teria de ser feita para alguém de absoluta confiança do réu, ou seja, alguém que depois estivesse disposto a repor a situação anterior.
I. Daí que se tenha sugerido o cunhado do réu para intervir como comprador das ditas fracções, mais precisamente, o autor.
J. Porém, receando-se que este pudesse aproveitar-se da situação, não devolvendo as ditas fracções, o mesmo amigo sugeriu, para segurar melhor as coisas, que doasse à filha menor ½ indivisa de cada uma daquelas fracções, transferindo-se a outra ½ para o autor.
K. Tal sugestão foi aceite pelo réu e obteve a aprovação do autor, estando todos cientes que o negócio a realizar-se se destinava a proteger aquelas fracções de eventuais penhoras por dívidas ao Banco ..., única e simplesmente.
L. Todos sabiam que o negócio a realizar seria um negócio fictício. M. O interveniente A. J. não pretendeu vender a ½ indivisa dessas fracções, nem o autor as pretendeu comprar.
N. A transacção referida em 19 (2/4/1998) foi feita por valor muito inferior ao valor real das fracções.
O. O preço declarado na escritura referida em 19 não foi pago pelo autor nem foi recebido pelo réu.
P. Nunca o autor tomou posse das fracções adquiridas, nem praticou quaisquer actos típicos de quem é proprietário delas.
Q. O interveniente procedeu ao pagamento das referidas dívidas ao Banco ..., evitando a sua venda judicial.
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2.2. Do objecto do recurso

2.2.1. Da impugnação da decisão da matéria de facto

2.2.1.1. Em sede de recurso, o Recorrente impugna a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal de 1ª instância.
Estão efectivamente atribuídos à Relação poderes de reapreciação da matéria de facto no âmbito de recurso interposto, que a transformam num tribunal de instância que também julga a matéria de facto, garantindo um duplo grau de jurisdição.

Para que a Relação possa conhecer da apelação da decisão de facto é necessário que se verifiquem os requisitos previstos no artigo 640º do CPC, que dispõe assim:

«1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3. O disposto nos nºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do nº 2 do artigo 636º».

No fundo, recai sobre o recorrente o ónus de demonstrar o concreto erro de julgamento ocorrido, apontando claramente os pontos da matéria de facto incorrectamente julgados, especificando os meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida e indicando a decisão que, no seu entender, deverá ser proferida sobre a factualidade impugnada.
Em todo o caso importa enfatizar que não se trata de uma repetição de julgamento, foi afastada a admissibilidade de recursos genéricos sobre a decisão da matéria de facto e o legislador optou «por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente» (2).

Delimitado pela negativa, segundo Abrantes Geraldes (3), o recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto será, total ou parcialmente, rejeitado no caso de se verificar «alguma das seguintes situações:

a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (arts. 635º, nº 4, e 641º, nº 2, al. b);
b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados (art. 640º, nº 1, al. a);
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação».
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2.2.1.2. Aplicando os aludidos critérios ao caso que agora nos ocupa, verifica-se que o Recorrente não cumpriu os ónus estabelecidos no citado artigo 640º do CPC.

Por um lado, nas conclusões das alegações do recurso o Recorrente não especifica os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados - art. 640º, nº 1, al. a), do CPC. Limita-se a indicar, nas conclusões 3ª («Que o autor algum tempo depois de a ré, em 1 e Fevereiro de 2014, ter ocupado a sua fracção autónoma e de nele ter começado a explorar o seu negócio de drogaria e de materiais de construção, a contactou a reclamar de tal ocupação e a informou que o interveniente A. J. não era dono da mesma, nem tinha poderes para a arrendar, tendo, na mesma altura, pedido para ela lhe pagar a renda a ele»), 4ª («Deve, também ser julgado provado: que a ré, na sequência do contacto do autor mencionado na conclusão precedente, se apercebeu da “embrulhada” em que estava metida, tendo contactado o seu advogado para resolver o problema ficando, em meados de Dezembro de 2014, conhecedora do problema e dos seus contornos, incluindo da existência de um litigio judicial entre o interveniente A. J. e o autor objecto do Procº nº 742/12.9 TBVLP» e 6ª («Deve, ainda, ser julgado provado: que a renda ou valor locativo da fracção autónoma do autor abusivamente ocupada pela ré, no período compreendido entre o início do ano de 2014 e até à presente data é de valor não inferior a 400,00 €», os factos que, no seu entender, devem ser considerados provados.
Afirmar que um facto deve ser considerado provado não é mais do que indicar o resultado final pretendido. Para além de indicar o resultado finalístico, é necessário especificar, nas conclusões, o que se está a impugnar na decisão da matéria de facto, quais os pontos de facto erroneamente julgados provados ou não provados.
Ignora-se, por não terem sido indicados nas conclusões, quais dos 42 (quarenta e dois) pontos de facto, objecto da decisão da sobre a matéria de facto, o Recorrente considera incorrectamente julgados.
Como é sabido, as conclusões exercem a importante função de delimitação do objecto do recurso. É pelas conclusões que se identificam as questões suscitadas. São essas questões que constituem o objecto do recurso e sobre as quais vai incidir o julgamento pelo tribunal ad quem. Além disso, essa delimitação é relevante para o recorrido poder exercer o contraditório, através da resposta às alegações do recorrente.
A falta de identificação dos pontos de facto impugnados redunda numa omissão de delimitação do objecto do recurso, o que impossibilita o pleno exercício do contraditório. Como é que o recorrido consegue contra-argumentar se não sabe qual é o ponto de facto impugnado? O recorrido só consegue responder a uma impugnação se souber, através das conclusões das alegações do recorrente, quais os pontos de facto impugnados. Se não sabe o que o recorrente está a impugnar não consegue pronunciar-se adequadamente sobre a apelação de facto.
Por razões de objectividade e de certeza, têm de constar das conclusões os concretos pontos de facto sobre que incide a impugnação.
Não tendo cumprido o disposto no artigo 640º, nº 1, al. a), do CPC, a impugnação da decisão da matéria de facto deve ser rejeitada.

Por outro lado, para além da especificação dos pontos de facto incorrectamente julgados, é necessário indicar que concreta alteração ou modificação deve ser introduzida na decisão proferida sobre a matéria de facto, o que pode ser feito na motivação das alegações. Trata-se, por exemplo, de indicar se o ponto de facto A deve ser dado como provado, se o facto B deve ser considerado como não provado, se o facto C deve ter uma diferente redacção, se deve considerar-se como provado um facto relevante sobre o qual o tribunal a quo não se pronunciou, etc.
Repare-se que a alínea c) do nº 1 do artigo 640º do CPC não alude a “resultado” da impugnação, mas sim «a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas». Tem um sentido amplo, pelo que exige que o recorrente indique que decisão deve ser proferida sobre o ponto de facto expressamente impugnado, nos termos que anteriormente se explicitaram.
A impugnação envolve sempre o cumprimento de três ónus, necessariamente interdependentes: delimitação rigorosa e clara dos concretos pontos de facto impugnados, especificação dos meios probatórios que impõem decisão diversa da recorrida e indicação da decisão que deverá ser proferida sobre a factualidade impugnada.

No caso dos autos, ao não especificar quais dos 42 pontos de facto está concretamente a impugnar, o Recorrente não deu cumprimento ao primeiro ónus. Quanto ao terceiro ónus, só num aspecto foi tratado pelo Recorrente: apenas relativamente ao ponto 4 dos factos provados é que se sabe qual o concreto resultado pretendido (4), mas sem que a especificação do ponto impugnado conste das conclusões, como é exigido. Para além disso, não se sabe quais os demais pontos que terá querido impugnar e também não indica que alterações devem ser introduzidas nesses pontos que não especificou nas conclusões.

Assim, com os fundamentos atrás explicitados, rejeita-se a impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
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2.2.2. Reapreciação de Direito

2.2.2.1. Da indemnização

O Autor reivindicou nesta acção um imóvel e pediu que a Ré fosse condenada a proceder à respectiva entrega (restituição), alegando que esta o tem vindo a ocupar sem autorização do Autor e sem título que a legitime para o efeito.
Por não ter sido impugnado, transitou em julgado o segmento da sentença que condenou a Ré a proceder à imediata entrega ao Autor da fracção autónoma designada pela letra “H”, destinada a comércio, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, Loja nº 2, composta por sala ampla, com entrada pela Avenida de Expansão Urbana, e terraço, com a área de 116,50 m2, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Quinta ..., freguesia e concelho de ..., inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ... e descrita na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº .../19940831-H.
Concluiu-se na sentença que a Ré não tem legitimidade para ocupar o imóvel reivindicado pelo Autor, uma vez que o contrato de arrendamento que invocou não foi celebrado com o legítimo proprietário da fracção em causa, que agora é apenas o Autor e, na data da celebração do contrato, era o Autor e a Chamada A. S..
Portanto, estamos perante uma ocupação de uma fracção autónoma sem título, ilegítima e, pelo menos desde que foi proposta a acção (26.06.2017) e a Ré citada para a mesma, contra a vontade do Autor.
Posto isto, suscita-se a questão de saber se o Autor tem direito a ser indemnizado «pela ocupação da fracção autónoma», em virtude de a Ré estar no «uso e fruição da mesma» desde 01.02.2014.
Na petição inicial peticionou-se uma indemnização de € 500 por cada mês de ocupação, enquanto no âmbito do recurso se reduziu tal montante a € 400 por mês.
Poderíamos agora desenvolver a discussão, algo estéril, sobre a natureza do dano aqui em causa e se a mera privação do uso da coisa é indemnizável. A sentença enunciou correctamente as correntes jurisprudenciais que se perfilam a esse respeito e optou por uma delas. Importa apenas salientar que muitas das decisões judiciais que integram as referidas correntes jurisprudenciais foram proferidas em processos em que se discutia a privação do uso de veículo decorrente de um acidente de viação, situação que, como se verá, não tem inteira similitude com a dos autos.

A sentença concluiu que o Autor não tem direito a ser indemnizado essencialmente por duas razões:

a) «O Autor não provou que efectivamente conseguiria arrendar a fracção caso tivesse a sua disponibilidade, tendo ainda resultado não provado que “Se o Autor procedesse à exploração da fracção referida em 2 em qualquer negócio, nomeadamente de stand de automóveis, restauração, drogaria, materiais de construção, obteria como contrapartida uma quantia de € 500,00 mensais.”»;
b) «A própria conduta do Autor demonstra que este se vinha conformando com a utilização do imóvel que lhe pertencia por parte da Ré, já que resultou assente que este teve conhecimento da ocupação da sua fracção desde 2014, sendo que apenas no ano de 2017 veio reivindicar a sua propriedade».

A obrigação de indemnizar pode emergir de diversas fontes (5). O Recorrente, tanto na petição inicial como nas alegações do seu recurso, não indica a fonte de que emergirá o direito de indemnização que invoca. Porém, atentos os termos em que estruturou a petição inicial, será a responsabilidade civil por factos ilícitos.
Dispõe a esse respeito o artigo 483º, nº 1, do Código Civil, que «aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação».
Para que alguém incorra nesta modalidade de responsabilidade civil é necessário que se verifique um facto ilícito, mas ainda outros pressupostos: culpa (imputação do facto ao lesante), dano e nexo de causalidade entre o facto e o prejuízo.

No que respeita aos danos patrimoniais, há a considerar que quem se encontra constituído na obrigação de indemnizar deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (artigo 562º do Código Civil), compreendendo-se nessa reparação não só o prejuízo causado nos bens ou nos direitos já existentes na titularidade do lesado à data da lesão – danos emergentes –, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência do facto lesivo, mas a que ainda não tinha direito à data da lesão – lucros cessantes (art. 564º, nº 1, do Código Civil).
O princípio geral, nos termos do artigo 562º do Código Civil, que preside à obrigação de indemnizar, é a reconstituição do lesado na situação hipotética que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação – é a chamada teoria da diferença (reposição das coisas no estado em que estariam se não se tivesse produzido o dano - princípio da reposição natural).
Por outro lado, há que ressarcir, segundo o artigo 563º do Código Civil, os danos que o facto ilícito tenha ocasionado e que se traduzam nos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.
Na responsabilidade civil a regra é o recurso à reparação natural, porém, se esta não for possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor deve a indemnização fixar-se em dinheiro, como impõe o artigo 566º, nº 1, do Código Civil.
A ideia subjacente às mencionadas regras normativas assenta, fundamentalmente, em se pretender colocar o lesado na situação em que estaria se não fora a lesão. É nisto que reside o essencial do problema da indemnização.

No caso dos autos importa determinar se o Autor sofreu algum dano patrimonial em consequência da ocupação que a Ré faz do prédio desde 01.02.2014, seja na modalidade de dano emergente ou na de lucros cessantes.
A situação dos autos tem algumas particularidades.
Em primeiro lugar, o Autor nunca esteve na posse da fracção autónoma. Desde que em 02.04.1998 o Chamado A. J. vendeu ao Autor ½ indivisa da fracção, o referido A. J. continuou a utilizá-la de acordo com a sua vontade, afectando-a e destinando-a como muito bem entendeu, procedendo ao pagamento das respectivas contribuições perante o Estado e suportando todas as outras despesas associadas à conservação, manutenção e fruição da dita fracção. Tinha as chaves da fracção, arrendou o imóvel por duas vezes a quem bem entendeu e actuou sempre como proprietário, à vista de todos, de forma pública e sem a oposição de quem quer que seja.
Em segundo lugar, o Autor tinha conhecimento dos dois contratos de arrendamento que sucessivamente, em momentos temporais diferentes, foram celebrados relativamente à fracção autónoma de que agora é o único proprietário.
Em terceiro lugar, o Autor não demonstrou ter interpelado a Ré, antes da propositura da acção, para proceder à entrega da fracção.

Neste quadro factual há que cindir a situação em dois períodos temporais: antes e depois da propositura da acção.
Antes de ter proposto a acção e de a Ré ter sido citada para a mesma é difícil de conceber a existência de um dano na esfera jurídica do Autor. Como é que se pode dizer que o Autor sofreu um prejuízo se nunca anteriormente se opôs à detenção da fracção por parte da Ré? É que o dano não é um evento abstracto ou virtual sem exteriorização prática. O dano patrimonial consubstancia sempre um resultado negativo na esfera jurídica do lesado em consequência do evento lesivo: se não fosse a lesão o lesado estaria numa situação melhor, ou porque os seus bens ou direitos não teriam sofrido um prejuízo ou porque não obteve os benefícios com que legitimamente podia contar. Se o evento lesivo gera no património do lesado uma desvantagem susceptível de avaliação pecuniária então há dano patrimonial juridicamente relevante.
Ora, até à propositura da acção, devido à inacção do Autor, não é possível afirmar a existência de um dano patrimonial. Não se pode dizer que deixou de beneficiar das utilidades da coisa pois nunca diligenciou no sentido de poder delas usufruir. Nesse sentido, não foi privado da respectiva utilização e não sofreu uma desvantagem no seu património: a realidade provada no processo não demonstra que o Autor pretendia utilizar a fracção, designadamente para aí passar a exercer o comércio ou para a arrendar um terceiro.
Por isso, relativamente a esse período temporal, a sentença tem de ser confirmada.

Vejamos agora o segundo período temporal, ou seja, aquele que decorre desde a propositura da acção.
Na sentença entendeu-se que o Autor não provou que efectivamente conseguiria arrendar a fracção caso tivesse a sua disponibilidade, bem como que, no caso de proceder à exploração comercial da loja, obteria como contrapartida uma quantia de € 500,00 mensais.
Por isso, concluiu-se que inexistia dano.
No nosso modo de ver, a questão deve ser equacionada doutra forma.
Em primeiro lugar, com a propositura da presente acção o Autor demonstrou inequivocamente a sua vontade de pôr fim à ocupação ilegítima que a Ré vinha fazendo da fracção e que pretendia usufruir das suas utilidades. Tendo sido judicialmente interpelada e continuando a deter o imóvel, a Ré privou o Autor do que era seu, impedindo que este lhe desse a utilização que bem entendia.
Em segundo lugar, o Autor manifestou o propósito, através de uma forma inequívoca, de proceder à utilização da fracção, retirando dela as respectivas utilidades ou vantagens. Quer usufruir da fracção e tem esse direito.
Em terceiro lugar, ficou provado que «o valor de mercado da renda para a ocupação da fracção» ronda os € 300,00 mensais. Na sentença argumenta-se que isso é insuficiente, na medida em que «o Autor não provou que efectivamente conseguiria arrendar a fracção caso tivesse a sua disponibilidade».
Há aqui um certo equívoco. Parece preconizar-se que o Autor tinha que demonstrar, nesta acção, que já havia alguém interessado no arrendamento da loja por € 300,00 mensais. Trata-se de uma exigência probatória que redundaria numa prova diabólica ou extremamente onerosa, na medida em que não tendo a disponibilidade da loja é muito difícil encontrar um interessado para uma loja ocupada e que não se sabe, no momento em que se propõe a acção, se algum dia vai ficar livre e desimpedida para arrendamento. Nesse circunstancialismo, dificilmente alguém se dispõe seriamente a contratar e, sobretudo, pela renda inerente ao valor de mercado. Trata-se, por isso, de um exercício de pura especulação, que na sua aplicação prática conduz geralmente a uma “prova construída”.
O Autor demonstrou o que relevava provar: qual «o valor de mercado da renda para a ocupação da fracção», que é de € 300 por mês. Se tem um tal “valor de mercado”, ou seja, no mercado de arrendamento, isso significa que o Autor consegue arrendá-la por esse valor. Só não conseguiria arrendá-la se não tivesse esse valor, mas um inferior, todavia não é isso que resulta de tal facto.
Depois, não estamos a abordar uma hipótese abstracta, mas algo que a própria realidade dos autos se encarrega de evidenciar. É que a fracção foi efectivamente arrendada à Ré, por um terceiro, contra o pagamento de uma renda mensal de € 300,00. Se foi arrendada por aquele valor e o mesmo até corresponde ao “valor de mercado”, então é legítimo concluir que o Autor tem a possibilidade de conseguir arrendar a sua fracção por € 300,00 mensais. Tal conclusão ainda mais surge reforçada pelo facto de a Ré ter afirmado na contestação que está na disposição de regularizar um arrendamento por esse valor.
Aliás, se sairmos do círculo dos juristas, qualquer outra pessoa se interrogaria sobre a lógica que conduz à improcedência do pedido do Autor nesta parte. A fracção estava arrendada à Ré contra o pagamento de uma renda mensal de € 300,00, o seu valor no mercado de arrendamento é de € 300,00 por mês, o Autor está ilegitimamente privado de um imóvel que é seu e que pretende ter na sua disponibilidade, quem a ocupa deixou de pagar qualquer valor como contrapartida pela ocupação e está disposta a continuar usufruir da fracção mediante o pagamento da renda de € 300,00, e, mesmo assim, o Autor não tem direito a qualquer quantia por estar privado do bem e não conseguir dispor do mesmo. Isto, salvo o devido respeito, não só é incompreensível para o cidadão comum como também não tem fundamento legal.
Portanto, a partir de Julho de 2017, o Autor tem direito a ser indemnizado pela Ré no valor de € 300,00 por cada mês que perdure a ocupação do imóvel.
*
2.2.2.2. Da sanção pecuniária compulsória

Na conclusão 23ª das alegações do seu recurso, o Recorrente suscita ainda a questão de dever «ser a ré condenada em sanção compulsória em valor equivalente ao do valor locativo da fracção por si ilegalmente ocupada, contando pelo menos, a partir da data da sua citação para os termos da presente acção. Efectivamente, se antes já sabia ser seu dever, depois da citação bem sabia que estava a causar custos acrescidos ao autor, quer com a manutenção da sua ocupação ilegal e de má-fé, quer com os custos acrescidos inerentes à necessidade de o autor ter de recorrer aos meios judiciais para defender o seu direito de propriedade demandando a desocupação da fracção e a indemnização pelos prejuízos sofridos».
Na petição inicial o ora Recorrente havia peticionado a condenação da Ré no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de € 500,00 por cada mês de atraso na entrega da fracção autónoma ao Autor, nos termos do artigo 829º-A do Código Civil.
Estabelece o artigo 829º-A, nº 1, do Código Civil que «nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso».
Pela sanção prevista no artigo 829º-A do Código Civil, o juiz adita à condenação principal uma condenação pecuniária acessória que se distingue de uma indemnização, pois que, visando incitar o devedor ao cumprimento da obrigação, não tem carácter indemnizatório. O essencial está em que a referida sanção pecuniária destina-se a induzir o devedor a cumprir e a acatar a decisão judicial.
Porém, para que o devedor possa ser condenado numa sanção pecuniária compulsória é indispensável que esteja em causa uma obrigação de facto infungível. Isto porque o campo de aplicação das sanções pecuniárias compulsórias limita-se às prestações de facto não fungíveis.
A prestação diz-se fungível, quando pode ser realizada por pessoa diferente do devedor, sem prejuízo do interesse do credor. Será infungível se o devedor não puder ser substituído no cumprimento por terceiro (6). A regra é a prestação ser fungível, por estatisticamente dominante, e como tal foi consagrada no artigo 767º, nº 1, do Código Civil.

No caso dos autos está em causa a obrigação de entrega de uma fracção autónoma.
Tal obrigação, sendo uma prestação de facto, não é infungível, pois não requer a intervenção insubstituível da devedora, ora Recorrida. Não é uma obrigação de facere de carácter pessoal, ou seja, cuja realização requer necessariamente a intervenção da Recorrida e esta é insusceptível de ser substituída por outrem. Atesta a conclusão de que é uma obrigação fungível a circunstância de ser susceptível de execução específica.
Como bem se salienta na sentença, «tratando-se de coisa determinada, não se vê obstáculo a que essa entrega – e a realização da respectiva prestação – se possa fazer mediante a utilização do processo executivo para entrega de coisa certa (como se prevê no artº 827º do C.Civil, depois desenvolvido nos arts. 859º e seguintes do NCPC), sem necessidade de qualquer medida compulsória adicional incidente sobre o próprio obrigado e tendente ao cumprimento por este da sua obrigação».

Em suma: a obrigação de restituição, que impende sobre a Recorrida, pode ser realizada também por terceiros, em sua substituição, visto que, no cumprimento da obrigação, não estão em causa as qualidades específicas do devedor. Assim, tal obrigação é de natureza fungível.
Sendo a obrigação fungível, não é aplicável o disposto no artigo 829º-A, nº 1, do Código Civil, pelo que não há fundamento legal para a fixação da sanção pecuniária compulsória.
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2.3. Sumário

1 – Se o autor, enquanto proprietário e até à data da propositura da acção, não se opôs à detenção do imóvel por parte da ré e nunca antes diligenciou no sentido de usufruir das utilidades da coisa, a simples ocupação não gera obrigação de indemnização por não ter causado um dano patrimonial.
2 – Ao propor a acção de reivindicação o autor demonstrou inequivocamente a sua vontade de pôr fim à ocupação ilegítima que a ré vinha fazendo do imóvel e evidenciou que pretendia usufruir das respectivas utilidades.
3 – Tendo sido judicialmente interpelada e continuando a deter o imóvel, a ré impede o autor de lhe dar utilização.
4 – Demonstrando-se que «o valor de mercado da renda para a ocupação da fracção» ronda os € 300,00 mensais, isso significa que o Autor consegue arrendá-la por esse valor, pelo que a privação daquele bem, impedindo-o de aproveitar as respectivas utilidades, gera um dano indemnizável.
5 – A obrigação de entrega de uma fracção autónoma tem natureza fungível, pois não requer a intervenção insubstituível da devedora e pode ser realizada por terceiros, pelo que não é aplicável o disposto no artigo 829º-A, nº 1, do Código Civil e, assim, não há fundamento legal para a fixação da sanção pecuniária compulsória.
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III – DECISÃO

Assim, nos termos e pelos fundamentos expostos, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, decide-se:

a) Revogando nessa parte a sentença, condenar a Ré a pagar ao Autor uma indemnização no valor de € 300,00 por mês, desde Julho de 2017 até efectiva entrega ao Autor da fracção autónoma designada pela letra “H” do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Quinta ..., freguesia e concelho de ..., inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ... e descrita na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº .../19940831-H;
b) No mais, manter a sentença recorrida.
Custas na proporção do decaimento.
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Guimarães, 31.10.2019
(Acórdão assinado digitalmente)

Joaquim Boavida (relator)
Paulo Reis (1º adjunto)
Joaquim Espinheira Baltar (2º adjunto)


1. Correcção introduzida por esta Relação.
2. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição, Almedina, 2018, pág. 163. No mesmo sentido Francisco Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, vol. II, Almedina, 2015, pág. 463.
3. Ob. cit., págs. 168 e 169.
4. O Recorrente fez constar da motivação das alegações: «Concluindo, nesta parte, salvo sempre o devido respeito por opinião em contrário, deve ser alterada a douta decisão recorrida na parte em que considerou que o “valor de mercado da renda para a ocupação da fracção referida em 2 ronda €300,00 mensais (nº 4 dos factos provados), dando, antes, como facto provado: - Que a renda ou o valor locativo da fracção autónoma do autor ocupada pela ré, desde 1 de Fevereiro de 2014 até à presente data é de valor não inferior a 400,00€ por mês».
5. V. Antunes Varela, Das Obrigações em geral, vol. I, 5ª edição, Almedina, págs. 834 e 835.
6. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 5ª edição, Almedina, 1986, pág. 90.